AS CONTRIBUIÇÕES DA ESCOLA DE MANCHESTER E DA ESCOLA DE CHICAGO PARA A ANTROPOLOGIA URBANA Paloma Oliveira Durante muito tempo, a Antropologia contou com uma grande quantidade de opções de objetos de estudo que se diferenciavam da realidade dos pesquisadores. Bronislaw Malinowski estudou os trobiandeses nas Ilhas Trobiand, localizada no Arquipélago na Papua- Nova Guiné. Franz Boas estudou os esquimós na Baffiland, localizada no Canadá. E. E. Evans-Pritchard estudou os Azandes, que habitavam numa região localizada no alto do Rio Nilo. E assim outros antropólogos também fizeram. No entanto, em decorrência de uma mudança social provocada pelo projeto colonial, pela urbanização e também pela modernização, os objetos de estudos que eram quase sempre povos considerados exóticos e de sociedade simples isoladas em lugares afastados, começaram a ficar escassos. A problemática que se instaurou, naquele tempo, não significava o fim da Antropologia, apesar de ter sido pensada dessa forma por alguns autores, significava uma modificação na escolha do objeto de estudo. Os pesquisadores, a partir disso, passaram a explorar temas que poderiam estar em suas próprias esquinas, dando atenção para o estudo da cidade e complexividade do indivíduo urbano e moderno. As grandes cidades são palco de uma realidade complexa e múltipla em todos os sentidos, como culturais e sociais, e estão em constante transformação. Esta multiplicidade pode se expressar nos traços pessoais, nas ocupações, na vida cultural e nas ideias dos habitantes da comunidade urbana, podendo resultar em separações espaciais dos indivíduos de acordo com essas características (WIRTH in VELHO 1973, p. 99), a diversidade urbana estava bem ali e merecia a atenção antropológica. Diante desse contexto, forma-se uma nova área, conhecida como Antropologia Urbana, tem como suas grandes influências a Escola de Manchester e a Escola de Chicago. A Escola de Manchester exerceu um papel fundamental na resolução de um método etnográfico que desse conta de compreender as novas questões vividas no século XX. Era preciso pensar tão rápido quanto as modificações da vida moderna, a análise situacional definida de forma mais clara por Van Velsen, orientava os pesquisadores a concentrar seus estudos na vida social real, nas quais normas e valores seriam usados de acordo com os indivíduos em determinadas situações sociais. Ou seja, os valores e a própria identidade são mutáveis de acordo com a necessidade. “Uma das suposições na qual a análise situacional está baseada é a de que as normas da sociedade não constituem um todo coerente e consistente. São, ao contrário, frequentemente vagas e discrepantes. É exatamente este fato que permite sua manipulação por parte dos membros da sociedade no sentido de favorecer seus próprios objetivos sem necessariamente prejudicar sua estrutura aparentemente duradoura de relações sociais. Por isso a análise situacional privilegia o estudo das normas em conflito.” (in FELDMAN-BIANCO, 1987a, p. 369) Na modernidade, o homem se modifica constantemente e a Escola entendeu a complexidade presente ali, para eles, as múltiplas situações geravam a necessidade da diversidade de ações morais e sociais por parte dos agentes. Por serem maioria de origem sul-africana, os pesquisadores de Manchester assumiam uma postura política contra o colonialismo e o racismo. Influenciados por Gluckman, era perceptível um caráter e inspiração “manchesteriano” em suas pesquisas. Sobretudo, saíram diversas monografias da Escola de Manchester, tendo como temas os povos africanos, os negros, o sistema de política vertical, as redes sociais e entre outros. A maioria adotou o método de análise situacional, dando ênfase também na observação participante herdada por Malinowski, já que era preciso analisar cada detalhe da complexividade urbana. Parafraseando Fly Peter, é no trabalho antropológico feito nas cidades que podemos ver a influência da Escola de Manchester, atribuindo a total participação na pesquisa de campo com o objetivo de compreender a inserção social do homem de acordo com cada situação específica. Um dos maiores nomes da Escola foi Max Gluckman, que chegou até mesmo a coordenar o instituto por alguns anos, influenciado por funcionais estruturalistas como Evans-Pritchard e RadCliffe Brown, produziu uma de suas mais celebres obras, a qual intitulou de Análise de uma situação social na Zululândia moderna, nela, o autor realiza um estudo sobre as relações entre negros e brancos e como se dava esse convívio apesar de suas diferenças sociais. No entanto, o estudo é feito através da análise da construção de uma ponte feita por engenheiros e trabalhadores zulus. Gluckman nos mostra que a todo momento as diferenças hierárquicas estiveram presentes no local. "Os presentes à cerimônia dividiam-se em dois grupos raciais: os zulus e os europeus. As relações diretas entre estes dois grupos eram predominantemente marcadas por separação e reserva. Enquanto grupos, reuniram-se em ligares diferentes, sendo impossível para eles confrontarem-se em condições de igualdade.” (GLUCKMAN in FELDMAN-BIANCO, p. 242) Para o autor, apesar das diferenças entre os dois grupos, marcada pelos conflitos e posições de hierarquia que demostravam os brancos europeus numa categoria acima dos negros zulus, ambos os grupos eram levados a se organizarem quanto compartilhavam de interesses comuns. A Escola de Chicago é a maior referência da Antropologia Urbana. Num contexto de forte imigração de pessoas vindas de vários locais e desenfreada urbanização no século XX, Chicago se tornou numa cidade com um alto número de habitantes, a estrutura da cidade não deu conta da demanda, o que resultou no aumento da violência, da prostituição, de acidentes, de moradores de rua, de altas taxas de desemprego e de surgimento de grupos segregados. Os estudantes da Escola de Chicago decidiram passar a estudar essas problemáticas, pesquisando a micro e a macroestrutura da cidade. A Escola é conhecida por seu trabalho em conjunto, através da observação participante e sua a preocupação com a cidade, seus pesquisadores analisavam diversos aspectos da vida urbana. “Considero que o aspecto mais rico da Escola de Chicago foram as pesquisas etnográficas urbanas feitas com um modelo de pesquisa tanto qualitativa quanto quantitativa, com trabalho de campo, observação participante, métodos de história de vida, documentos pessoais, surveys, mapas e estatísticas’ (MENDOZA, p. 121) A Escola de Chicago, referência até os dias de hoje, é lembrada por suas diversas contribuições antropológicas acerca do contexto urbano. Ecologia Urbana é um dos conceitos criados por membros da Escola e se tornou uma das bases para o estudo urbano, pois significa a análise do comportamento do homem tendo como ponto de referência a posição dos indivíduos no meio urbano. Tal conceito foi fundamental para o estudo da marginalidade. Além disso, a cidade, transformada em uma espécie de laboratório social dos pesquisadores, foi palco de desenvolvimento de pesquisas notáveis, como a obra de Robert Erza Park, intitulada A cidade: sugestões para a investigação do comportamento humano no meio urbano, que influenciado por Georg Simmel, autor que já falava da complexividade da vida urbana, escreveu sobre a cidade a partir de uma análise que ultrapassava a sua forma física e alcançava seu significado como produto da natureza humana inclusa nas relações das pessoas. Todas as coisas que tendem a ocasionar