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1 CAPÍTULO 3 NOÇÕES DE MACROECONOMIA 2 ÍNDICE Generalidades …................................................................................. 04 Conceitos básicos ……………………………………………………………………….…… 05 Estoques e Fluxos ……………………….………………………………………………….. 07 Produto e renda: abordagem preliminar …………………………………..…... 08 PIB e deflator ………………………………………………..…………..……………… 09 PIB e PNB ………………………………………………………….………………………11 Produto potencial e hiato de produto ………………………….……….. 11 PIB e PNB a preços de mercado e a custo de fatores ………..…... 12 Produtos interno e nacional brutos e líquidos ……………………..… 13 Identidades macroeconômicas básicas ………………………………………… 13 Equilíbrio macroeconômico …………………………………………………… 13 Origem dos recursos para investimento …………………………………. 15 Origem dos recursos para financiamento do déficit público ….. 15 Decomposição da renda nacional …………………………………………… 16 Determinação da renda ………………………………………………………………. 17 Síntese do modelo clássico ……………………………………………………. 17 Síntese do modelo keynesiano ………………………………………………. 19 Síntese do modelo ISxLM ………………………………………………………. 23 Outros modelos ……………………………………………………………………… 25 Determinantes do investimento …………………………………………………. 25 Inflação ………………………………………………………………………………….…….…. 27 Tipos de inflação e comentários sobre fatores determinantes … 28 Notas sobre a teoria quantitativa da moeda …….……………….……. 30 Efeitos do processo inflacionário ………………………………………….…. 32 Breve referência à curva de Phillips …………………………….…….……. 33 Metas de inflação …………………………………………….………………….…… 34 Desemprego e emprego …………………………………………….………….….…… 35 Câmbio ………………………………………………………………………..…………….…… 36 Taxa nominal e taxa real de câmbio …………………….…………….…… 37 Regimes cambiais ………………………………………………………………..… 38 Atuação dos governos no mercado exterior …………………………….. 40 Tópicos especiais …………………………..………………………………………….… 40 Dívida pública …………………………………………………………………….…… 40 Algumas notas sobre o crescimento econômico ……………….……… 42 Medida do custo de vida ……………………………………………….………. 43 Elementos do arcabouço institucional e componentes ……………….. 44 Contabilidade nacional …………………………………………..…….……….. 44 Moeda e bancos ……………………………………………………………………….. 44 Breves notas sobre a história da moeda …………………........………. 45 Funções da moeda ……………………………………………….…............…….. 47 Demanda por moeda ………………………………………………..........………. 48 Características da moeda ……………………………………………..........….. 48 Papel dos bancos ........................................................................ 49 Oferta monetária ……………………………………………………............…….. 49 O processo de criação da moeda …………………………………………….. 50 Encaixe técnico ………………………………………………………………………. 51 Base monetária. Política monetária …………………………............…… 51 Mercados financeiros ………………………………………………............……. 52 Alguns comentários à economia brasileira recente ……………….……. 53 3 Sobre a taxa de juro ………………………………………………………........... 53 O Risco‐país ………………………………………………………………….………… 54 Superávit primário …………………………………………….................….. 56 Déficit Público ……………………………………………………...……........……… 57 Política tributária e desigualdade: consumo das famílias …….…… 58 Política tributária: o peso das obrigações sobre setores produtivos ……….………………….……………………................….. 59 Comentários finais ……………………………………………………….................. 62 4 noções de macroeconomia_________________________________ capítulo 3 01. Generalidades Define‐se macroeconomia como o estudo das atividades econômicas por meio da avaliação do comportamento dos agentes econômicos tomados em agregado, isto é, analisando‐se o comportamento dos conjuntos formados por estes agentes. As economias são compostas de três agregados que são os consumidores, os produtores e o governo. Desse modo, distintamente dos estudos microeconômicos, no presente capítulo estudar‐se‐ão os mecanismos que explicam o comportamento de cada um desses três conjuntos sem necessariamente analisar em detalhe o comportamento de cada unidade que os integra. As unidades que compõem os agregados são o indivíduo ou a família formando o agregado dos consumidores; a firma ou outra forma de organização produtiva formando o agregado dos produtores; e os órgãos e entidades públicas, formando o agregado governo. Questões como a determinação do conjunto de todas as riquezas produzidas por uma sociedade, a determinação do nível geral de preços e o que interfere na estabilidade destes, a formação da renda da sociedade, o número total de desempregados, o salário, a taxa de juro, a taxa de câmbio fazem parte, entre outros, do rol dos problemas enfrentados na análise macroeconômica. Cada um desses problemas é representado por uma ou mais variáveis, ditas variáveis macroeconômicas. Em macroeconomia, a agregação não é um processo simples pois depende da variável considerada. A renda total de uma sociedade, por exemplo, resulta da somatória das rendas de todas as famílias, enquanto que a taxa de inflação corresponde a uma média de taxas inflacionárias de uma quantidade razoavelmente grande de setores em cada regiâo. De outro lado, o produto bruto resulta da adição dos incrementos de valor adicionado a cada etapa da cadeia de relações interssetoriais, e, assim, o tratamento a cada variável depende das características desta. As causas e consequências das expansões, recessões e crises econômicas são, também, objeto dos estudos macroeconômicos, sendo os governos, no cumprimento de sua missão de promover o bem estar social, os principais interessados nesses estudos atuando, inclusive, como autor de vários deles. Por isso mesmo, diz‐se que o conteúdo teórico macroeconômico é produzido em dois distintos níveis de abordagem. O primeiro se dá no terreno da explicação, e é útil para esclarecer o comportamento observado no desempenho das variáveis macroeconômicas. A segunda abordagem, da previsão, objetiva antever o comportamento das mesmas variáveis macroeconômicas bem como a reação dos agentes econômicos a esse comportamento. Para tanto, utiliza‐se não somente a 5 análise histórica como também a racionalidade das expectativas e formulações econométricas que ensejam a simulação do comportamento futuro dos agregados econômicos. Os governos são os principais beneficiários da construção do conhecimento macroeconômico. Eles são, também, os produtores de uma vasta quantidade de informações por meio de fatos político‐econômicos, números‐índice e de uma variada gama de estatísticas que conformam uma expressiva parte da matéria‐ prima utilizada pelos economistas e pelas instituições de pesquisa e ensino que consagram o seu esforço à produção do conhecimento macroeconômico. Na primeira das duas condições, isto é, como beneficiários, os governos utilizam tanto os elementos explicativos quanto os de cunho previsional1 para formular e executar as políticas públicas. 02. Conceitos básicos O estudo da macroeconomia implica, como ponto de partida, a definição de uma série de variáveis e indicadores cujos conceitos são sucintamente explorados nesta seção. O comportamento de cada uma das variáveis macroeconômicas afeta a todos os agentes econômicos, direta ou indiretamente. Inicia‐se pelo conceitode renda que é a remuneração dos proprietários de fatores produtivos. Há quatro tipos de renda: salários, lucros, juros e alugueis. O salário é o pagamento feito aos proprietários do fator trabalho. O termo deriva da palavra sal que, historicamente, foi uma mercadoria‐moeda com que se fazia o pagamento pelo trabalho das pessoas2. Os lucros são a remuneração do empresário que, para obtê‐la, faz investimentos e paga salários, além de pagar para obter outros insumos produtivos inerentes à sua atividade empresarial. O empresário tanto aufere lucros como os distribui por meio de dividendos. 1 1 Termo consagrado pelo uso no linguajar dos economistas. 2 Procede de salariu, palavra latina que significa ração de sal. O juro ou preço do dinheiro é a remuneração do capital, resultando da aplicação deste. O capitalista pode ser pessoa física ou jurídica. O empresário, quando opta por fazer aplicação financeira de seu capital ― e não aplicação produtiva em troca de lucro ― recebe, como ganho, o juro. E o aluguel é a remuneração revebida pelo proprietário de bens imóveis, um tipo de riqueza de capital sob a forma de imobilizado. Ao conceito de salário estão relacionadas duas importantes variáveis macroeconômicas: emprego e desemprego. Emprego é a utilização do fator de produção mão de obra ou trabalho; e o desemprego, contrariamente, é a não utilização desse mesmo fator de produção, ou seja corresponde à quantidade de pessoas que não encontra ocupação remunerada. Ambos, emprego e desemprego, podem ser medidos em números absolutos ou por meio de taxas percentuais. A soma desses dois contingentes em uma economia em um dado momento é igual à força de trabalho desta economia. Portanto, a força de trabalho é a parcela da população que está apta e em idade de a trabalhar e que, se estiver totalmente ocupada, caracteriza o pleno emprego. A poupança é parcela da renda de um indivíduo ou família que não é dirigida para o consumo, ou seja, é indicativa de adiamento do consumo. A poupança é a economia feita por um agente econômico, reservando recursos financeiros para necessidades futuras. O consumo é a parte da renda de um indivíduo ou família que se destina aos gastos com a compra de mercadorias e serviços para a satisfação de suas necessidades. São os gastos com alimentação, saúde, transportes, vestuários, educação, recreação, entre outros. O investimento é a aplicação de recursos financeiros poupados para aumentar a capacidade produtiva, isto é, objetivando ganhos nos médio e longo prazos. Tem, portanto, a finalidade da formação de novas riquezas, que são riquezas de capital. Freqüentemente são feitas referências, em economia, a investimento por 6 meio de aplicação de dinheiro em títulos, ações, imóveis e em caderneta de poupança, com o objetivo de se obterem ganhos. O conceito de investimento é, entretanto, mais abrangente, correspondendo, também e em grande medida, a aplicação de capital em empreendimentos produtivos, direta ou indiretamente, como fábricas, infra‐estrutura, obras diversas e outros mais. O Produto Interno Bruto – PIB é a medida de toda a produção realizada em um país ou região durante um dado intervalo de tempo, normalmente de um ano, e corresponde à renda total de todos os bens e serviços que se produziram internamente na economia deste país ou região. O PIB inclui, portanto, a contribuição dos estrangeiros que residem e produzem no país, mas deixa de computar a contribuição dos emigrantes que estão produzindo em outros ambientes econômicos que não o do país. O Produto Nacional Bruto – PNB é um outro conceito de grande relevância no contexto da Análise Macroeconômica. Define‐se o PNB como a medida de toda a produção realizada em um país ou região durante determinado intervalo de tempo, normalmente de um ano, adicionada do saldo líquido dos fatores externos que resulta das receitas recebidas do exterior, deduzidas das receitas enviadas para outros países de acordo com os registros do balanço de pagamentos, adiante comentado. Ambos, PIB e PNB, são fundamentalmente medidas básicas da atividade econômica, porque refletem o tamanho de uma economia, sendo os parâmetros que costumam ser observados desde as primeiras abordagems que se fazem a respeito da economia de um país, estado ou região. Seus respectivos cálculos podem ser feitos pelos preços de mercado dos bens e serviços finais uma vez que estes incorporam os custos sucessivos das etapas anteriores de cada cadeia de relações interssetoriais. Podem, também, ser procedidos seguindo‐se as trilhas dessas cadeias de relações interssetoriais porém com o cuidado de somarem‐se apenas os valores adicionados entre cada etapa e a imediatamente seguinte para evitar‐se a dupla contagem. O Nível Geral de Preços constitui um indicador econômico cujo movimento identifica a inflação ou deflação. No Brasil, o índice de preços mais comum é o Índice de Preços ao Consumidor – IPC, que corresponde à medida do custo de vida3. Dois relevantes conceitos associados ao Nível Geral de Preços são os dos Preços Rígidos e Preços Flexíveis. Os Preços Rígidos são associados à análise de curto prazo, enquanto que os Preços Flexíveis são inerentes à análise de longo prazo. A flexibilidade nos níveis de preços que se observa na análise de longo prazo resulta de novas condições de procura e oferta que vão surgindo com o passar do tempo e que vão modificando as condições de cada mercado parcial4. Inflação é o aumento persistente no Nível Geral de Preços de uma expressiva quanƟdade ― senão de todos ― os bens e serviços. De outro lado, o movimento oposto que os preços podem experimentar, isto é, a queda persistente, corresponde ao fenômeno da deflação. À elevação de preços em um ritmo menor do que o que se observava em período imediatamente anterior dá‐se o nome de desinflação, ou seja, quando se passa a ter uma desaceleração da inflação. Portanto, enquanto a deflação corresponde a uma queda absoluta do nível de preços, a desinflação corresponde a uma redução no ritmo de crescimento destes. Câmbio é a conversão de um valor em uma dada moeda para outra moeda por meio de um multiplicador de troca de moeda. Esse multiplicador é denominado taxa de câmbio. A taxa de câmbio constitui o elemento chave para as atividades de importação e exportação. A importação é a aquisição de bens e/ou serviços de outro país por meio de agentes econômicos do país importador, enquanto que a exportação é a venda de bens e/ou serviços para outro país pela ação de agentes econômicos do país exportador. Em macroeconomia, tanto importação quanto exportação são referidas por uma cifra monetária. No caso das importações, essa 3 Tema abordado na parte final deste capítulo. 4 A expressão mercado parcial é indicativa do mercado individualizado de cada bem ou serviço conforme estudado no Capítulo 2 (Noções de Microeconomia). 7 cifra resulta da soma monetária de todos os bens e serviços adquiridos a agentes econômicos de outros países. No caso das exportações, essa cifra resulta da soma monetária de todos os bens e serviços vendidos, por agentes econômicos, públicos ou privados, a compradores de outros países. A balança comercial e o balanço de pagamentos são conceitos associados ao câmbio. A balança comercial é o registro dasexportações e importações realizadas em determinado período de tempo, normalmente anualizado. Os preços adotados nesse registro não incluem o frete e o seguro das mercadorias (preços FOB5). O balanço de pagamentos corresponde ao registro contábil de todas as transações econômicas de um país com todos os outros países, incluindo as transações correntes e a conta de capital financeira. As transações correntes contêm a balança comercial, a balança de serviços, a balança de rendas e as transferências unilaterais correntes. É na balança de serviços que se procedem aos registros de seguros e fretes, serviços governamentais, alugueis de equipamentos, entre outros. Recessão é a redução significativa porém passageira da atividade econômica. Há várias definições técnicas para recessão, sendo a mais usual a de considerar‐se que uma economia entra em recessão quando vê o seu PIB reduzir‐se por dois trimestres consecutivos. Por outro lado, depressão reflete uma grave crise econômica com drástica e duradoura redução da produção e do consumo. As variáveis macroeconômicas podem ser classificadas como exógenas e endógenas. As primeiras são variáveis de origem externa a determinado processo 5 Os preços FOB (Free on Board) não incluem os custos de embarque, transporte e desembarque entre dois países que mantêm relações comerciais, tampouco os seguros associados às operações de importação e exportação. Distinguem‐se dos preços CIF (Cost, Insurance and Freight) que resultam da soma do preço FOB com os custos com seguros e fretes. Esses conceitos de preços são, também, habitualmente utilizados no mercado de bens domésticos mediante adaptação. Por essa adaptação, por exemplo, se um fabricante produz e vende um equipamento ou bem outro qualquer a um comerciante, entregando‐o na loja do fabricante e, portanto, cobrando o seguro e o frete além do preço do equipamento, o preço é dito CIF ou preço posto‐loja (produto posto na loja do comprador). Mas se, nessa transação, diferentemente, o comprador se responsabilizar pelo transporte e seguro, pagando ao fabricante apenas pelo equipamento, então o preço é FOB ou preço posto‐fábrica (produto posto na fábrica do vendedor). que se esteja analisando e que afetem este processo, enquanto que as variáveis endógenas são variáveis inerentes ao processo ou fenômeno estudado, ou seja, são internas a este. A crise de 2008, nascida nos Estados Unidos produziu variáveis que afetaram, em maior ou menor grau, a economia de outros países. Tais variáveis foram exógenas às economias dos países afetados. Conforme já mencionado, todos os conceitos acima relacionados dizem respeito a um ou mais agregados da economia, caracterizando o caráter macroeconômico da análise. Há, evidentemente, uma série de outros conceitos de interesse dos estudos macroeconômicos afora os citados. Uma significativa parte desses outros conceitos é derivada dos acima enumerados. Por exemplo, a propensão a consumir deriva do conceito de consumo, tanto quanto a propensão a poupar deriva do conceito de poupança. Entretanto, é aos conceitos que integram a relação da presente seção que mais se recorre, o que fez com que a ênfase deste texto recaísse sobre eles. Outros conceitos e variáveis serão objeto de referência na continuação deste capítulo. 03. Estoques e Fluxos Algumas variáveis econômicas podem ser analisadas ou entrar no cálculo de algum tipo de avaliação simplesmente por sua magnitude em dado momento. Essas são chamadas de variáveis de estoque. Por exemplo, a quantidade de papel‐moeda em um país, tanto quanto a população desse país, é um estoque em dado momento que pode se estender por um lapso de tempo menor ou maior. Com a moderna dinâmica econômica, o estoque de moeda em circulação pode manter‐se por várias semanas e mesmo por alguns meses, sem sofrer variação apreciável, dependendo do grau de estabilidade e do ritmo de crescimento da economia. Analogamente, em demografia, tema de recorrência no contexto dos estudos macroeconômicos, pode suceder o mesmo com o estoque da população de uma região em que se observe um balanço zero (na prática, um número muito pequeno) entre nascimentos, mortes, imigração e 8 emigração. De modo igual, a quantidade de pessoas empregadas é uma variável de estoque. Mas há variáveis que implicam a noção de tempo em sua definição. É o que sucede, por exemplo, com o PIB de um país, o qual costuma ser avaliado por ano. Do mesmo modo ocorre com os gastos governamentais desse país, ou, ainda, com o salário do trabalhador uma vez que, neste último caso, há um fluxo mensal ou semanal. A essas variáveis dá‐se a classificação de variáveis de fluxo. A distinção entre estoques e fluxos é importante no trato das variáveis econômicas, não somente no que diz respeito ao entendimento destas como também no que se refere à formulação de soluções para a Política Econômica. Por exemplo, se o fluxo de gastos governamentais aumentar, certamente o fluxo de alguma outra variável econômica também precisará ser aumentado, ao mesmo tempo em que, possivelmente, o fluxo de terceira(s) outra(s) variável(eis) terá que reduzir‐se. Por exemplo, o aumento do salário mínimo pode ser acompanhado da redução do ritmo com que vinha crescendo a inadimplência na praça. Em um outro exemplo, agora relativamente a uma variável de estoque, pode‐se considerar a análise de como o estoque de capital de uma economia afeta o nível de emprego e renda. No processo de análise econômica, é importante ter‐se em mente a natureza da variável, se de estoque ou se de fluxo, pois cada um dos tipos atua com suas características próprias. 04. Produto e renda: abordagem preliminar O agente motor de uma economia é o ser humano que, desde os tempos primitivos, precisou consumir e, para ter o que consumir, também precisou produzir. Caça, pesca e busca de abrigo foram as atividades produtivas dos primórdios do ser humano na Terra. Uma parte do produto da caça e/ou da pesca era consumida imediatamente (função consumo) e outra era guardada para consumo nos dias seguintes (função poupança). Desde o primeiro dia do ser humano no planeta, poupar já significava, como até hoje significa e já foi referido neste texto, adiar uma parte do consumo. Ao mesmo tempo, o ser humano fez, quando necessário, trocas de algo de que dispunha por bens outros de que precisava. A moeda de troca que ele usava para pagar, que era a própria mercadoria de que dispunha, um dia mais tarde veio a dar lugar ao aparecimento da moeda tal como esta se apresenta hodiernamente. Conforme se percebe, essa moeda de troca era fruto do trabalho do ser humano já que se tratava de algo que ele produziu. Nesse caso, a referida moeda de troca usada na transação era parte de sua renda, isto é, parte da renda de sua atividade produtiva. Daí infere‐se que produto é igual a renda! Essa é a primeira identidade macroeconômica, que será indicada do modo seguinte: Y=P, Onde: Y é a renda; e P é o produto, ou produto bruto, podendo ser interno ou nacional. No trato teórico, a unidade de medida, tanto de Y quanto de P, será a moeda, ou dinheiro ou, ainda, também referido como numerário. Na prática, P é o conjunto total da riqueza produzida sob a forma de produtos e serviços heterogêneos, e Y é a remuneração recebida pelas famílias porquanto estas, além de atuarem como agentesdo consumo, também atuam como agentes que realizam a produção para as firmas e outras formas de organizações produtivas. A firma é o principal agente moderno da produção fazendo uso dos fatores produtivos, entre os quais a mão de obra (família). O conceito a fixar, portanto, é o da igualdade entre produto e renda, o que explica o fato de, em inúmeras ocasiões, tomar‐se um pelo outro6. 6 Seguidamente, autores utilizam a notação Y para indicar o produto de uma economia. 9 Há outras identidades macroeconômicas básicas. Para melhor entendimento dessas identidades adicionais, no entanto, expendem‐se, nas sub‐seções imediatamente seguintes, alguns conceitos macroeconômicos da palavra produto. Surgirão, nesse contexto, alguns sub‐conceitos como inflação e deflator, produto interno e produto nacional, produto potencial e hiato de produto, todos de grande relevância na análise macroeconômica. 04.01. PIB e deflator O Produto Interno Bruto é a somatória do valor monetário de todos os bens finais produzidos em um dado país ou região durante um ano, como já referido neste texto. Há uma diferença entre o PIB e o Produto Nacional Bruto – PNB, explicitada mais adiante. Para melhor compreensão da medida do Produto Interno Bruto, suponha‐se a existência de uma hipotética economia na qual somente três bens e/ou serviços finais sejam produzidos, os bens ou serviços A, B e C. Proceder‐se‐á à análise do comportamento dessa economia em dois anos consecutivos, 1 e 2. As quantidades e os preços unitários dos bens e/ou serviços dessa economia, admitidos constantes durante todo o ano 1, são apresentados no quadro da Figura 01. Considere‐se que esta seja a produção de um ano, tomado como exercício financeiro e que corresponda ao ano‐base para determinação do PIB‐ real em anos subsequentes. Fig. 01 – Produto Interno Bruto de uma economia fictícia no ano 1 Bem ou serviço Unid de Medida Quantidade Prç Unitário (u.m.*) Prod. Econ. (u.m.) A ton 180 12,00 2.160,00 B m3 70 60,00 4.200,00 C gl** 82 45,00 3.690,00 Total - - - 10.050,00 * unidade monetária. ** galão O Produto Interno Bruto dessa economia é igual a 10.050,00 unidades monetárias e está calculado em valores nominais, ou seja em valores correntes do exercício financeiro correspondente ao ano 1. Como já referido, esse exercício financeiro, isto é, o ano de 1, é o ano‐base para fins de análise da evolução do PIB‐real, ao longo deste e do ano imediatamente subsequente. Como o ano‐base é o ponto de partida, então o PIB observado nesse ano, igual a 10.050,00 u.m., é, ao mesmo tempo, o PIB‐real e o PIB‐nominal. O ano‐base de uma série para fins de acompanhamento do crescimento de uma economia pode ser qualquer um. É comum que sejam escolhidos anos iniciais de uma série do calendário. Por exemplo, o ano 2000 para a série 2000‐2009; ou o ano 2001, para a década 2001‐ 2010. Entretanto, repete‐se, a escolha de um ano para ser tomado como referência pode recair sobre qualquer um. O que norteia a escolha de um ano‐ base são o objeto e o critério da análise que se pretenda elaborar. Como já referido na seção 02, ao definir‐se o Produto Interno Bruto, arrolaram‐se somente os bens e produtos finais para entrar nessa contagem. Por exemplo, peças de vestuário que não para fardamento de pessoal em organizações são bens finais, e, portanto, entram no cômputo. Camisas, calças, lenços e um sem‐ número de outras mercadorias de consumo final estão também enquadradas nessa condição. Entretanto, os produtos intermediários que servem à fabricação de peças de vestuário como, por exemplo, os tecidos, a linha de costura, os botões e outros complementos, não devem ser computados no cálculo, porque já estão embutidos no custo da mercadoria ou bem final. O fato de incluir no cálculo os produtos intermediários levaria a uma múltipla contagem para a formação do Produto Interno Bruto, aumentando o valor deste de maneira equivocada. Para que não haja, portanto, a múltipla contagem, somente os bens e serviços finais devem compor o quadro de cálculo do Produto Interno Bruto. Alternativamente, no entanto, pode‐se fazer o cálculo do Produto Interno Bruto incluindo‐se as diversas etapas de cada processo, desde que computando‐se apenas o valor adicionado entre uma etapa e a que se lhe segue imediatamente na trama de relações intersetoriais, evitando‐se, assim, a repetição de valores já computados. 10 Suponha‐se, agora, que, no exercício financeiro 2, o Produto Interno Bruto dessa mesma economia seja dado pela tabela da Figura 02, à qual não se acrescentou nenhum produto novo, mas suas respectivas produções (quantidades) e preços se alteraram. Fig. 02 – Produto Interno Bruto da economia fictícia considerada no ano 2 Bem ou serviço Unid de Medida Quantidade Prç Unitário (u.m.*) Prod. Econ. (u.m.) A ton 200 16,00 3.200,00 B m3 80 65,00 5.200,00 C gl** 100 50,00 5.000,00 Total - - - 13.400,00 * unidade monetária. ** galão Comparando‐se as tabelas das referidas Figuras 01 e 02, percebe‐se que houve um incremento de 33% entre os exercícios financeiros de 1 e 2, conforme o cálculo seguinte: Variação (Ano 2/Ano 1) a preços correntes de cada exercício=[(13.400,00/10.050,00)‐1,00].100=33% Sucede que, tendo havido incremento de preços e também de quantidades produzidas, o incremento de 33% no Produto Interno Bruto dessa sociedade é explicado em parte pelo aumento de preços, e em outra parte pelo aumento das quantidades produzidas. A parte do aumento do PIB devida ao aumento de preços corresponde à inflação, enquanto que a parte do aumento do PIB devido ao aumento de quantidades de bens produzidas reflete o crescimento real da economia. Para se determinar que parcela desse percentual cabe a cada uma das alterações mencionadas, pode‐se fazer o cálculo do Produto Bruto Total do ano 2 a preços do ano 1, do que resultarão os valores constantes da tabela da Figura 03. Mediante esse artifício, o incremento do Produto Interno Bruto calculado entre as tabelas das Figuras 01 e 03 terá sido resultante apenas do aumento das quantidades produzidas, e será igual a: Fig. 03 – Produto Interno Bruto da economia fictícia considerada no ano de 2 a preços do ano 1 Bem ou serviço Unid de Medida Quantidade Prç Unitário (u.m.*) Prod. Econ. (u.m.) A ton 200 12,00 2.400,00 B m3 80 60,00 4.800,00 C gl** 100 45,00 4.500,00 Total - - - 11.700,00 * unidade monetária. ** galão Variação (Ano 2/Ano 1) a preços correntes de 1=[(11.700,00/10.050,00)‐ 1,00].100=11,43%, que é o aumento real da atividade econômica. Daí, o aumento devido ao aumento de preços (inflação) será igual à diferença entre o aumento nominal e o aumento real da economia, ou seja: Variação real (Ano 2‐Ano 1)=33,00%‐11,43%= 21,57% À relação (PIB‐nominal/PIB‐real) de um mesmo exercício financeiro dá‐se o nome de Deflator do PIB. No caso presente do ano 2, tendo‐se como ano‐base o ano 1, o Deflator é igual a (13.400,00/11.700,00)=1,145. Por fim, o PIB pode também ser referido a cada indivíduo que integra a sociedade (PIB per capita), bastando, para tanto, que se o divida pela população. Caso a população da hipotética economia acima ilustrada fosse de 1.000 habitantes no ano 1, então o PIB per capita a preços do ano 1 seria: PIB per capita a preços do ano 1=11.700,00/1.000=11,70 u.m./habitanteE, caso a população fosse de 1020 habitantes no ano 2, então o PIB per capita do ano 2, será: PIB per capita do ano 2=13.400/1.020=13,14 u.m./habitante. 11 04.02. PIB e PNB Conforme já referido, o Produto Interno Bruto – PIB é o valor agregado de todos os bens e serviços finais produzidos no território de um país, independentemente da nacionalidade dos proprietários dos fatores de produção. Como já mencionado, excluem‐se, neste caso, as transações intermediárias, cuidado essencial para que seja evitada a multiplicidade na contagem das parcelas do PIB. De outro lado, conceitua‐se como Produto Nacional Bruto – PNB, ao valor do PIB somado algebricamente com a receita líquida dos fatores externos. Os fatores externos são medidos pelo saldo de remessas de rendas do país para fora e de fora para o país. PIB+RLFE=PNB onde: RLFE é a renda líquida de fatores externos. A RLFE, por seu turno, é igual a: RLFE=RR‐RE, onde: RR é a renda recebida do exterior; e RE é a renda enviada ao exterior. Se RE>RR, resultará que RLFE<0 e, conseqüentemente, PNB>PIB. Conforme se percebe, o Produto Nacional Bruto pode ser maior ou menor do que o Produto Interno Bruto, tudo dependendo do saldo entre a renda enviada e a renda recebida do exterior. 04.03. Produto potencial e hiato de produto O Produto Potencial é o nível de PIB correspondente a um estado da economia no qual todos os fatores de produção estão sendo plenamente empregados. Dito de outro modo, é o nível de PIB que corresponde ao limite de crescimento de uma economia sem que surjam desequilíbrios. O PIB potencial é normalmente comparado com o PIB medido (PIB observado), também referido como PIB efetivo, e a diferença entre um e outro é denominada hiato do produto. Trata‐se de um indicador útil na formulação das políticas monetária e fiscal. No primeiro caso, o PIB potencial ― ou mesmo o hiato do produto ― serve para avaliar possíveis pressões de demanda que podem produzir flutuações econômicas, ensejando a antecipação de medidas para contê‐las. Entre as possíveis flutuações econômicas, prioridade é dada à inflação. No caso da política fiscal, o produto potencial é extremamente útil para avaliar‐se o resultado fiscal estrutural do governo. O gráfico da Figura 04 apresenta resultados do PIB potencial brasileiro no período 1992‐2005, a valores de 2004. Uma rápida leitura do mencionado gráfico permite verificar, por exemplo, que o período que se estende entre o segundo semestre de 1994 e o segundo semestre de 1995 foi de expansão econômica uma vez que o hiato do produto apresentou‐ se positivo (linha rosa por cima da linha azul); e, que, contrariamente, o período que vai do terceiro trimestre de 1997 até o quarto trimestre de 2001 foi de contração econômica porquanto o hiato do produto esteve negativo; e, que entre o final do primeiro período indicado nesse exemplo e o início do segundo período utilizado também nesse exemplo, o PIB potencial esteve muito próximo do PIB observado. Essa aderência do PIB observado ao potencial é indicativa de que a economia esteve, no referido período, em um estado próximo ao estado de equilíbrio. 12 O PIB potencial é uma variável de difícil determinação pois refere‐se ao que poderia ter sido produzido se restrições tecnológicas e/ou econômicas fossem removidas ou inexistissem. Uma das hipóteses mais presentes na análise do produto potencial é a de restrições impostas pela inflação uma vez que este fenômeno macroeconômico impede o emprego de todos os fatores de produção em sua plenitude. Fig. 04 – PIB potencial e PIB efetivo da economia brasileira no período 1992‐2005 em termos de números‐índice (ano de 2004=100) Fonte: Souza Jr, J.R. Produto Potencial: conceitos, métodos de estimação e aplicação à economia brasileira. IPEA. Texto para discussão no 1.130. Rio de Janeiro. 2005. Reforça‐se, aqui, o fato de que o produto potencial não é o máximo que se pode conseguir a qualquer custo, isto é, em marcha forçada. Trata‐se, antes, do produto alcançado quando todos os mercados se encontram em equilíbrio de longo prazo. O conceito de PIB potencial ainda experimenta limitações que, por certo, serão superadas com o avanço da pesquisa. Destacam‐se, aqui, duas dessas limitações. A primeira reside no fato de a determinação do produto potencial cingir‐se a uma análise somente do lado da oferta, deixando de considerar a demanda como fator indutor do aumento do investimento, o que retroalimentaria a oferta. E, a segunda, é o fato de a análise não revisitar ou mesmo não aprofundar o conceito de Produtividade Total dos Fatores de Produção, referida como PTF. 04.04. PIB e PNB a preços de mercado e a custos de fatores O produto bruto, interno ou nacional, normalmente é referido a preços de mercado. Os preços de mercado incluem os tributos que são pagos pelas firmas ao produzirem e ao comercializarem seus bens e serviços. No Brasil, esses tributos são, respectivamente, o Imposto sobre Produtos Industrializados – IPI que é um tributo federal, e o Imposto sobre a Circulação de Bens e Serviços – ICMS, que é um tributo estadual.O fato de esses tributos já se encontrarem embutidos nos preços do bens e serviços adquiridos pelo consmidor, são ditos tributos indiretos, representados por II, notação que significa Impostos Indiretos, dado que a maior parte dos tributos é constituída de impostos. Os preços de mercado incluem, também, os subsídios que são uma forma de apoio a determinado setor o qual o governo pretende estimular. O estudo dos subsídios e seus efeitos foi realizado no Capítulo 2, deste Curso. Os preços de mercado são resultado da soma dos preços a custos de fatores com os tributos pagos pelas firmas e deduzidos os subsídios, estes últimos se houver. A expressão do PIB a preços de mercado é: PIBpm=PIBcf+II‐Sbsd De igual modo, conceitua‐se o PNB a preços de mercado e o PNB a custos de fatores, com a seguinte expressão análoga: PNBpm=PNBcf+II‐Sbsd 13 A análise macroeconômica requererá que se considere, em alguns casos, o produto a preços de mercados. Noutros, porém, poderá mostrar‐se necessária a avaliação do produto destacando seus custos de produção daqueles referentes a interferências governamentais como tributos e subsídios. 04.05. Produtos interno e nacional brutos e líquidos Na seção seguinte, serão estudadas as identidades macroeconômicas básicas. Na decomposição do produto, ver‐se‐á que uma das parcelas é o investimento. Quando se faz referência ao investimento sem qualquer restrição, diz‐se estar tratando do investimento bruto. O investimento bruto é composto de duas parcelas: o investimento líquido e a depreciação de ativos já existentes. A depreciação de um ativo reflete o custo da manutenção da capacidade funcional desse ativo. Por exemplo, a manutenção de equipamentos e do prédio de uma fábrica, tanto quanto o recapeamento da camada de asfalto de uma rodovia implicam custos de depreciação. De outro lado, a ampliação do número de equipamentos e/ou do prédio da fábrica bem como a duplicação da rodovia implicam investimento que fazem aumentar esses ativos, correspondendo, portanto, a investimento líquido. No cálculo do PIB, e também do PNB, a parcela de investimento corresponde ao investimento bruto. Se se deduzir a depreciação da parcela do investimento bruto, passa‐se a ter apenas o investimento líquidona formação do produto, e estes deixam de ser os produtos brutos para se tornarem produtos líquidos, respectivamente Produto Interno Líquido (PIL) e Produto Nacional Líquido (PNL). As representações algébricas, para um outro, são: PIL=PIB‐D; e PNL=PNB‐D, onde D é a parcela da depreciação. Por extensão, haverá Produto Interno Líquido a preços de mercado (PILpm), o Produto Interno Líquido a custos de fatores (PILcf), o Produto Nacional Líquido a preços de mercado (PNLpm) e o Produto Nacional Líquido a custos de fatores (PNLcf). 05. Identidades macroeconômicas básicas O estudo das identidades macroeconômicas básicas implica analisar o equilíbrio macroeconômico, a identidade entre poupança e investimento, o financiamento do déficit público e a decomposição da renda nacional. 05.01. Equilíbrio macroeconômico O equilíbrio macroeconômico é alcançado quando oferta e demanda agregadas de bens e serviços se igualam. A oferta agregada de bens e serviços depende da disponibilidade de fatores de produção existente na economia em um dado momento. Em uma perspectiva de curto prazo, admite‐se que as quantidades disponíveis desses fatores sejam constantes oferecendo um determinado nível de produto potencial. O equilíbrio macroeconômico será estudado, nesta seção, para três hipóteses de economia, partindo da mais simples para a mais complexa, esta última a mais aderente à realidade das economias dos países. Essa divisão em três hipóteses de economia, uma primeira, fechada e sem governo, uma segunda, também fechada e com governo, e, a terceira, aberta e necessariamente com governo, não passa de um artifício didático de que se lança mão para que se compreenda melhor o papel do agregado governo (na passagem da primeira para a segunda hipótese) e, em seguida, do comércio exterior (na passagem da segunda para a terceira hipótese). (i) Economia fechada e sem governo Em uma economia fechada e sem governo a oferta se compõe da soma do que é produzido para atender ao consumo (C) com o que é produzido a título de investimento para permitir a continuidade e o crescimento do processo 14 produtivo (I). Nessa mesma economia, a demanda agregada é composta dos bens e serviços que são consumidos (C), acrescidos de uma parcela que corresponde ao que é poupado (S). Daí, a igualdade entre oferta e demanda conduz a C+I=C+S, donde I=S, ou seja, tudo quanto é poupado em uma economia é drenado para investimento. (ii) Economia fechada e com governo Na sub‐seção anterior, considerou‐se uma economia fechada e sem governo. Na presente, analisa‐se uma economia ainda fechada, porém com governo. Não havendo trocas com o exterior, o equilíbrio é alcançado mediante a igualdade da oferta (produto Y) e demanda, agora constituída de três parcelas: consumo (C), investimento (I) e gastos de governo (G), como se segue: Y=C+I+G O governo realiza gastos com a manutenção de suas respectivas estruturas orgânicas, com investimentos de interesse coletivo e com as transferências. Para a manutenção das estruturas, o governo paga salários e outras formas de remuneração a servidores, realiza compras, muitas das quais correspondem a investimento. Por exemplo, quando o governo contrata a construção de uma ferrovia, está realizando um investimento, no caso, um investimento público. Mas quando o governo adquire papel para a produção de documentos, está realizando um gasto de consumo. As transferências representam gastos do governo em favor do bem estar das famílias, com fundos de previdência social e de auxílios de tipos diversos como os valores pagos por meio da Bolsa‐Família e outros programas assistenciais. O total G dos gastos governamentais é sustentado por duas fontes principais que são os tributos (T) e a venda de títulos de sua emissão no mercado financeiro. O governo recorre à emissão de títulos quando há déficit orçamentário, isto é quando T<G. Idealmente, um governo deveria não contrair dívidas e gastar exatamente o montante arrecadado, isto é T=G. Comumente ocorre, no entanto, que desequilíbrios de fases anteriores obrigam governos a contraírem dívida: a dívida pública. Nesse caso, ele precisa ajustar seus custos totais de modo a produzir um superávit, denominado superávit primário que é igual a (T‐G). São os casos em que aparece a desigualdade T>G. O tratamento da questão relativa à magnitude de G e de T diz respeito à política fiscal e não são considerados no modelo de equilíbrio que se analisa nesta seção. Dito de outro modo, G e T são variáveis de controle, controle este que é exercido pelo governo, portanto são variáveis exógenas ao modelo. (iii) Economia aberta e com governo Introduzindo, agora, o conceito de economias abertas, que corresponde ao caso mais geral, sobretudo em um mundo de economia globalizada, surgem as importações e as exportações que precisam ser integradas à expressão do equilíbrio. As importações, cuja notação será M, integram‐se à oferta agregada, isto é, ao membro à esquerda da expressão. E as exportações, cuja notação será X, integram‐se à demanda agregada, ou seja, ao membro à direita da mesma expressão, do que resulta: Y+M=C+I+G+X A expressão acima reflete o lado da economia real, e não a monetária. As importações M (em bens e serviços) se acrescentam ao produto Y (em bens e serviços) compondo a oferta agregada. Analogamente, as exportações X correspondem a demandas exercidas, e atendidas, por agentes econômicos de outros países, também em termos de bens e serviços. Juntamente com o consumo, os investimentos e os gastos de governo, X comporá a demanda agregada. A referida expressão do equilíbrio entre oferta e demanda agregadas considerando uma economia aberta pode ser reescrita do modo seguinte: Y=C+I+G+X‐M 15 A parcela binomial (X‐M) representa as exportações líquidas ou saldo da balança comercial. Essa parcela é simétrica da poupança externa (M‐X), porque, como já mencionado, M é a parte da produção de agentes de outros países que é ofertada na economia do país sob estudo e X é a parte da produção deste país sob estudo que é exportada, isto é, que é comprada por agentes de outros países. A partir dessa expressão, é possível determinar‐se como o investimento é financiado pela poupança e como o excesso de poupança em relação ao investimento pode financiar o déficit público. As duas subseções seguintes mostrarão, respectivamente, como a poupança atua como fonte de recursos do investimento, e como o déficit público pode ser socorrido pelo excesso de poupança privada em relação ao investimento e/ou pela poupança externa positiva. 05.02. Origem dos recursos para investimento Recursos para investimento podem advir de fontes diversas podendo, inclusive, ser providos por empréstimos de curto e longo prazos. A fonte natural de recursos para investimento é, no entanto e como já referido anteriormente, a poupança. A seguir, demonstra‐se o porquê dessa afirmação. Subtraindo‐se C+T de ambos os membros de Y=C+I+G+X‐M, obtém‐se: Y‐C‐T=C+I+G+X‐M‐C‐T, Simplificando‐se, em seguida, o membro da direita e rearranjando‐se os termos de ambos os membros de modo a explicitar I em relação à demais variáveis, tem‐ se: I=(Y‐C‐T)+(T‐G)+(M‐X) Onde: Y‐C‐T corresponde à poupança privada que é a parcela que sobra da renda depois de deduzidos o consumo e os tributos;T‐G corresponde à poupança pública porque é a diferença entre a arrecadação e o gasto total do governo; e M‐X é a poupança externa, porque é a diferença positiva entre o que produziu‐se em outros países e que veio por compra internacional para consumo ou utilização no país sob estudo e o que se produziu neste país sob estudo e que foi levado, mediante venda internacional, para consumo ou utilização em outros países. A expressão portanto é o mesmo que I=Sprivada+Spública+Sexterna, ou, ainda, I=S, A poupança privada corresponde ao saldo remanescente em mãos das famílias e firmas depois de deduzidos as despesas com o consumo e o pagamento dos tributos (obrigações fiscais). A poupança pública corresponde ao saldo do governo em conta corrente e sua formação depende de o governo gastar menos do que arrecada. E a poupança externa equivale ao déficit em transações correntes do balanço de pagamentos. 05.03. Origem dos recursos para financiar o déficit público O déficit público pode ser financiado por meio de recursos de natureza variada. Entre esses, alinham‐se o aumento de tributos, a emissão de títulos da dívida pública, empréstimos, reescalonamento de compromissos já assumidos, vencidos e/ou vincendos por prazos mais elastecidos e, mesmo tratando‐se de um recurso condenável à economia, emissão de moeda. O exame dessas possibilidades faz parte do estudo da economia do setor público, não integrante do promada deste Curso. Idealmente, não deveria haver déficit público uma vez que os governos deveriam gastar exatamente o que arrecadam. Na prática, entretanto, não é o que ocorre, não somente pela imprevisibilidade que assalta alguns gastos governamentais como, por exemplo, uma inesperada epidemia que surge depois que o orçamento público já se encontra em aplicação sem a correspondente 16 provisão para enfrentá‐la. Em outra ordem de exemplo, um eventual desaquecimento da economia que implique significativa redução da arrecadação de tributos. Déficits públicos ocorrem com freqüência, e são os geradores ou fatores de ampliação de dívida pública, normalmente administradas e, quando não quitadas, transferidas de uma gestão de governo para a seguinte. A fonte natural de eliminação do déficit público reside nas poupanças, privada e externa, como se demonstra a seguir. Partindo‐se da expressão Y‐C‐T=C+I+G+X‐M‐C‐T, e explicitando‐se (G‐T) em relação às demais variáveis, encontrar‐se‐á: G‐T=(Y‐C‐T)‐I+(M‐X) Donde: Déficit público=(Spriv‐I)+Sexterna O membro à direita da igualdade acima mostra que é necessário que a poupança privada supere o investimento e/ou a poupança externa seja positiva para que sejam gerados recursos objetivando a eliminação do déficit público. Em outras palavras, em uma economia aberta, o déficit público deve ser financiado por uma composição entre as poupanças privada e externa. Nos tópicos especiais deste Capítulo (seção 11), voltar‐se‐á ao tema da dívida pública, como ela surge e os critérios de seu manejo. 05.04. Decomposição da renda nacional Partindo‐se do Produto Interno Bruto a preços de mercado, a expressão do equilíbrio maacroeconômico geral é: Y=PIBpm=C+I+G+X‐M Donde, decompondo a parcela do investimento em investimento líquido e depreciação, tem‐se: PIBpm=C+Ilíq+D+G+X‐M Deduzindo‐se a parcela da depreciação, passa‐se do Produto Bruto ao Produto Líquido: PILpm=PIBpm‐D=C+Ilíq+G+X‐M, Considerando‐se, em seguida, que PILpm=PILcf+II‐Sbsd, pode‐se explicitar o Produto Interno Líquido a custo de fatores: PILcf=C+Ilíq+G+X‐M‐II+Sbsd, Transformando‐se o Produto Interno Líquido em Produto Nacional Líquido acrescentando‐se ao PILcf a receita recebida do exterior e deduzindo‐se a receita enviada ao exterior: PNLcf=C+Ilíq+G+X‐M+Rre‐Ree‐II+Sbsd. A expressão acima corresponde, por definição, à renda nacional RN. Daí: RN= C+Ilíq+G+X‐M+Rre‐Ree‐II+Sbsd A renda nacional é formada a partir dos salários, juros, lucro e alugueis recebidos pelas famílias. Em continuação, se se deduzirem da renda nacional os lucros retidos pelas firmas, os impostos diretos pagos pelas firmas, as contribuições previdenciárias recolhidas pelas firmas e, ao mesmo tempo, se se acrescentarem as transferências feitas pelo governo e os juros pagos pelo governo, obtém‐se a renda pessoal, ou seja: Rpess= RN= C+Ilíq+G+X‐M+Rre‐Ree‐II+Sbsd‐Lretfirm‐IDfirm‐Cprev+Tr+Jgov Por fim, se se deduzir, da renda pessoal, o imposto de renda pessoa física, chega‐ se à renda pessoal disponível, isto é: Rpessdisp=Rpess‐IRPF. 17 A renda pessoal duisponível se reparte em consumo, poupança, juros e prestações. 06. Determinação da renda A determinação da renda constitui uma das questões centrais da análise macroeconômica, pois a renda de uma economia depende do concurso de vários fatores (variáveis macroeconômicas), alguns dos quais são utilizados (administrados) na formulação da política macroeconômica de um país. A evolução dos estudos sobre a determinação da renda fez com que os avanços fossem dando conformação a diferentes tipos de abordagem ao problema. Essas diferentes abordagens constituem os modelos de análise que serão sintetizados na presente seção. Na sequência, são apresentadas as características principais do modelo clássico, do modelo keynesiano e do modelo ISxLM para uma economia fechada. O estudo do modelo IS e para uma economia aberta é remetida para leitura posterior de parte de alunos(as) que pretenderem se aprofundar nos estudos macroeconômicos. No espaço deste Curso, a base do conhecimento se limita até o modelo ISxLM em economias fechadas porquanto, com esta base assimilada, o(a) estudante tem condições de desenvolver o modelo ISxLM para economias abertas. Esse mesmo comentário é válido para o estudo dos casos especiais dos modelos ISxLM, excluídos deste texto e para o modelo de determinação conjunta de produto e inflação. Inobstante tais exclusões, este capítulo consagra algumas seções ao estudo da taxa de câmbio, da inflação, do desemprego, entre outras que conceituam importantes variáveis macroeconômicas. 06.01. Síntese do modelo clássico O primeiro exercício desenvolvido para explicar o nível de renda de uma economia foi o modelo clássico, que elegeu a quantidade de trabalho como variável determinante do produto. Para tanto, foram alinhadas no modelo as seguintes considerações: (i) os mercados da economia são de concorrência perfeita e tendem a se auto‐ regular; (ii) a oferta gera sua própria demanda (lei de Say7); (iii) o estoque de capital e o nível de tecnologia são constantes; (iv) inexistência de desemprego involuntário; e (v) papel neutro da moeda que atua apenas para refletir os níveis de preços determinado pela demanda agregada. Incorpora‐se às condições ora apresentadas, as quais refletem as simplificações do modelo, a função de produção, da forma: Y=f(K,L,Tg) Onde: Y é o produto ou renda; K é o estoque de capital que, como referido, é cpnstante; L é o estoque utilizado de trabalho, que é a variável do modelo; e Tg é o nível de tecnologia, também considerado invariável. Como todo e qualquer mercado, o de trabalho é comandado por uma função de demanda e por uma função de oferta que são representadas em diagrama de quantidade de trabalho e preço do salário. Analisa‐se, preliminarmente, a demanda. As firmas contratarão mão de obra até determinada quantidade cujo valordo incremento da produtividade seja igual ao salário pago. Essa condicionante pode ser melhor compreendida por meio dos dados do quadro da Figura 05. Nessa tabela, a quantidade de trabalho é representada pelo número de trabalhadores e o produto é dado por uma quantidade física que corresponde à de um produto equivalente de toda a economia, ou seja, a quantidade caso a economia só produzisse um único produto. Além disso, o preço unitário do produto é fixo dado o pressuposto do modelo segundo o qual o ambiente é de concorrência perfeita, e o valor do produto marginal é dado em unidades monetárias. 7 Say, Jean‐Baptiste (1767‐1832), economista francês. 18 O incremento de produto a cada novo trabalhador adicionado corresponde ao produto marginal do trabalho. Por exemplo, ao deixar de operar com dois trabalhadores e admitir o terceiro, o produto evolui de um produto físico de 190 unidades para outro nível de produto físico igual a 270 unidades. O produto marginal dessa mudança de dois para três trabalhadores é de 80 unidades físicas do produto, e o valor desse produto marginal é igual a (80 u.f. x 10 u.m./u.f.)=800 u.m. Fig. 05 – Demanda das firmas por trabalho No de trabalhadores Produto total Y (u.f). Prod. marg. do trabalho (u.f.*) Preço unit do produto (u.m.**) Valor do prod marginal (u.m) 1 100 100 10 1.000 2 190 90 10 900 3 270 80 10 800 4 340 70 10 700 5 400 60 10 600 *Unidade física. ** Unidade monetária. Para demandar o trabalho de três trabalhadores, as firmas estarão dispostas a remunerar cada um dos três por 800 u.m. porque este é o valor monetário acrescentado pelo terceiro trabalhador. A condição de equilíbrio corresponde, portanto, à igualdade entre o salário nominal que é pago eo valor do produto marginal. Em termos algébricos, essa condição é representada por: VPMGL=W Dadas as condições ora apresentadas, o nível de produto, e consequentemente da renda da economia, é definido com base na lei dos rendimentos decrescentes (vide Capítulo 2 deste Curso), considerando‐se a quantidade de trabalho como insumo variável. A quantidade de trabalho é determinada, por seu turno, pelo equilíbrio do mercado de trabalho, resultante da interação de oferta e demanda de mão de obra. Os diagramas da Figura 06 apresentam esse resultado do modelo. O nível de utilização do fator trabalho é transferido do diagrama inferior da referida Figura 06 para o diagrama superior, definindo o produto da economia e, consequentemente, a renda Y. A quantidade de trabalho corresponde à variável independente em ambos os diagramas, enquanto que a variável dependente é a renda no diagrama superior e o salário real no diagrama inferior. Fig. 06 – Produto de equilíbrio no Modelo Clássico 19 Exemplo de aplicação no 01 Determinar o produto bruto de uma economia cuja função de produção agregada é Y=12L2‐0,3L3, e que as funções de demanda e oferta de trabalho sejam respectivamente Wr=80‐L e Wr=20+5L, sendo L expresso em 106 trabalhadores. Solução De Ws=WD, tem‐se 80‐L=20+5L, donde L*=10x10 6. Entrando‐se com o número de trabalhadores encontrado na equação do produto (PIB), tem‐se: YE=900x10 6 u.m. 06.02. Síntese do modelo keynesiano Concebido por Keynes8, este modelo surge no ambiente econômico da grande depressão de 1929 com o objetivo de combater o desemprego que se alastrava nos Estados Unidos e algumas nações europeias. Ao mesmo tempo, é uma crítica ao modelo clássico. Para melhor compreensão, o modelo é estudado em três etapas que consideram: (i) uma economia fechada e sem governo; (ii) uma economia fechada e com governo; e (iii) uma economia aberta, necessariamente com governo. O ponto de partida é a observação de Keynes segundo a qual níveis reduzidos de consumo privado e de investimentos produtivos motivaram o desemprego em 1929. Em 1936, publica sua obra principal A Teoria do Emprego do Juro e da Moeda, na qual demonstra que as decisões de gasto é que determinam o nível de renda. Seguem‐se as etapas da formulação de sua teoria. (i) Economia fechada e sem governo A simulação de uma economia fechada, isto é, sem relações com outros países, e sem governo, dois artifícios que serão removidos na sequência desta seção, faz com que a renda nacional se origine apenas da necessidade das famílias para satisfazerem o seu consumo e, em havendo sobras, guardarem‐nas para necessidades futuras. Essas sobras são a poupança. Genericamente, pode‐se então afirmar que a renda das famílias se distribui em consumo, ou gasto, e poupança, isto é: 8 John Maynard Keynes, economista britânico (1883-1946). Y=C+S, Onde: Y é a renda nacional; C é o consumo; e S é a poupança. Analisa‐se, a seguir, a maneira como a renda das famílias correntemente se distribui entre consumo e poupança. Admita‐se, para tanto, que a tabela da Figura 07 seja indicativa do comportamento da família típica de uma economia fictícia em termos de distribuição da renda auferida, entre consumo e poupança. Fig. 07 – Distribuição da renda de uma família Renda disp. Y Consumo C Poupança S Prop. Mg. a cons. ΔC/ΔY Prop. Mg. a poup. ΔS/ΔY Prop. Méd. cons C/Y Prop. Méd. a poup. S/Y 1000 1200 -200 1,1 -0,1 1,2 -0,2 2000 2300 -300 0,7 0,3 1,15 -0,15 3000 3000 0 0,8 0,2 1 0 4000 3800 200 0,3 0,7 0,95 0,05 5000 4100 900 0,4 0,6 0,82 0,18 6000 4500 1500 0,5 0,5 0,75 0,25 7000 5000 2000 --- --- 0,71 0,29 As necessidades de consumo costumam indicar, quando confrontadas com o nível de renda, a parcela que resta à família para a finalidade de poupar. O consumo de uma família depende do número de seus integrantes, suas faixas de idade, seus hábitos e, evidentemente, de seu nível de renda. Quando a renda de uma família aumenta, o consumo também aumenta, mas quase sempre as alterações observadas nos padrões desse consumo não obedecem a um comportamento estritamente proporcional, ou seja, não há uma linearidade na variação dos gastos. Isso sucede porque a relação entre a propensão média a consumir e a propensão média a poupar sofre alteração quando se altera o nível de renda. O que se mantém constante é a soma das 20 participações relativas dessas duas propensões, que é sempre igual à unidade, ou seja, uma parte da renda de cada família é canalizada para o consumo, e o seu complemento, se houver, é poupado. As variações do que se consome e do que se poupa quando a renda varia, que, para variações elementares da renda, correspondem, respectivamente, a propensão marginal e consumir e propensão marginal a poupar são, também, variáveis macroeconômicas de relevo na análise do equilíbrio da economia. A renda da família aqui considerada é a renda líquida, isto é, o que sobra da renda bruta depois de deduzidos os tributos que a família recolhe ao erário. Analisam‐se, neste modelo de economia fechada e sem governo, as funções Consumo, Poupança e Investimento para, ao final, determinar‐se a expressão do multiplicador keynesiano dos gastos autônomos. ‐ Consumo O consumo da sociedade depende principalmente de quanto lhe resta em termos da renda Y depois de deduzidos os tributos, isto é, C=f(Y‐T), onde T representa os tributos cobrados. Parte dessasobra de renda após o pagamento dos tributos é aplicada em consumo e o restante é poupado. A parte que é destinada ao consumo depende da propensão marginal a consumir das famílias, que corresponde a [dC/d(Y‐T)]. Essa derivada reflete a inclinação em cada ponto da curva de consumo em função da renda disponível, também chamada de Curva da Função Consumo, conforme ilustrado pela Figura 08. A forma corrente da representação da função consumo é C=C.+PmgcY, onde C0 é o consumo autônomo, Pmgc é a propensão marginal a consumir e Y é a renda. Além disso, por mera simplificação de raciocínio, considera‐se que a função de consumo seja linear. Fig. 08 – Curva da função Consumo No gráfico da mencionada Figura 08, a propensão marginal a consumir das famílias corresponde à inclinação da curva de consumo. Por fim, observa‐se que a parte não consumida da renda disponível é levada à poupança que, em última análise, nada mais é, conforme já referido, do que o adiamento do consumo. No Brasil, a proporção do consumo em relação ao PIB vem se reduzindo, tendo passado de um patamar superior a 75% no final dos anos 1940 para aproximadamente 60% nos dias atuais. ‐ Poupança Poupança significa o adiamento do consumo. Como já referido, poupança e consumo se complementam na formação da renda. Para a renda líquida nula, isto é, para Y‐T=0, a poupança é negativa e igual em módulo ao consumo autônomo, posto que, mesmo sem renda, o indivíduo realiza o consumo autônomo. Daí resulta que o gráfico cartesiano do consumo tem o formato mostrado na Figura 09. 21 Fig. 09 – Curva da função Poupança A expressão da curva da função poupança é S=Ca+Pmgs, onde: Pmgs é a propensão marginal a poupar e Pmgs=1‐Pmgc.+ ‐ Investimento Em seu modelo, Keynes não explica esta função, admitindo‐a como autônoma, ou seja: I=Ia. ‐ Multiplicador dos gastos autônomos Substituindo as expressões C=Ca+PmgcY e I=Ia em Y=C+I, tem‐se: Y= Ca+PmgcY+Ia. Explicitando‐se a renda em relação às demais variáveis, chega‐se à expressão: Y=[1/(1‐Pmgc)](Ca+Ia), Onde a expressão entre colchetes é o multiplicador dos gastos autônomos em uma economia fechada e sem governo. Chamando esse multiplicador de ᾳ, e os gastos autônomos de A, tem‐se, finalmente: Y=ᾳGA, e ΔY=ᾳ(ΔA), o que significa que uma variação dos gastos autônomos produz uma variação na renda em uma proporção maior do que a variação de tais gastos, posto que, como Pmgc é sempre menor do que a unidade, o multiplicador ᾳ será sempre maior do que a unidade. Daí resulta uma consequência importante para a formulação da política macroeconômica que é o fato de que um aumento nos gastos autônomos (C e/ou Ia) faz o produto bruto da economia crescer em uma proporção superior a este aumento. Exemplo de aplicação no 02 Dada a propensão marginal a consumir Pmgc=0,60 de uma economia, determine o gasto autônomo capaz de produzir uma variação na renda igual a 2.500 unidades monetárias (u.m.), Se o gasto autônomo com o investimento não variar, qual a variação do gasto autônomo com o consumo? Solução O multiplicador é igual a ᾳ=1/(1‐0,60)=2,5. De ΔY=ᾳ(ΔA), tem‐se ΔA=2500/2,5, donde ΔA=1000. Considerando que ΔA=ΔCa+ΔIa, se ΔIa=0, donde ΔCa=1000. (ii) Economia fechada e com governo A equação do equilíbrio macroeconômico assume a forma seguinte: Y=C+I+G, onde a variável nova em relação ao modelo anterior (economia fechada e sem governo) são os gastos de governo (G). O governo atua realizando gastos para adquirir bens e serviços de interesse público, e com a transferência de recursos monetários para o setor privado. Tais transferências correspondem a aposentadorias, pensões, bolsas‐auxílio, entre outros. Para fazer face a esses custos, o governo arrecada tributos de espécies diversas como, por exemplo, impostos, taxas, contribuições de melhoria e preços públicos. O modelo keynesiano adota o critério segundo o qual tanto os gastos quanto as transferências governamentais sejam autônomos, ou seja. G=Ga e Tr=Tra. Ao mesmo tempo, considera que o governo tribute consoante sua propensão marginal relativa a esta finalidade, isto é, sua propensão marginal a tributar (Pmgt). Em outras palavras, que o montante de tributos seja igual a uma fração da renda dada por: T=Pmgt.Y A renda disponível, Yd, será: Yd=Y‐T+Tr. Considerando a expressão do consumo já estudada no modelo de economia fechada e sem governo, esta passar a ser escrita do modo seguinte: 22 C=Ca+Pmgc.Yd, donde: C=Ca+Pmgc (Y‐T+Tr), donde: C=Ca+Pmgc.Tr+Pmgc[Y‐Pmgt.Y] donde finalmente: C=Ca+Pmgc.Tr+Pmgc[1‐Pmgt.]Y. A expressão acima corresponde à versão da função consumo em uma economia fechada e com governo. Essa expressão indica que quanto maior for a propensão marginal a consumir e menor for a propensão marginal a tributar,tanto maior será o consumo da economia. Para determinar‐se o multiplicador dos gastos autônomos, entra‐se com a expressão de C, acima encontrada, na equação do equilíbrio macroeconômico Y=C+I+G, considerando, como já indicado, que as variáveis I e G sejam autônomas. Daí: Y=Ca+Pmgc.Tr+Pmgc[1‐Pmgt.]Y+Ia+Ga, Isolando os gastos que dependam de decisões autônomas na equação da renda acima: Y‐Pmgc.Tr+Pmgc[Y‐Pmgt.Y]=Ca+ Ia+Pmgc.Tra, donde:] Y={1/[1‐Pmgc(1—Pmgt)]}(Ca+Ia+Ga+Pmgc.Tr). O multiplicador keynesiano será a parte da última expressão que está entre entre chaves, ou seja: β=1/[1‐Pmgc(1—Pmgt)]. A variação da renda será, portanto, igual a: ΔY=β.[Δ(Ca+Ia+Ga+Pmgc.Tra). Exemplo de aplicação no 02 Dadas as propensões marginais a consumir e a tributar, Pmgc=0,55 e Pmgt=0,35, além dos seguintes gastos autônomos: Ia=0,18Y; Ga=1000; Tr=100 e Ca=400. Determine a renda da economia. Solução Cálculo do multiplicador: β=1/[1‐0,55(1‐0,35)]=1,56 A renda ou produto será: Y=1,56[400+0,18Y+1000+(0,55x100] Donde: Y=3.113,00 u.m. (iii) Economia aberta No estudo da economia aberta e com governo, o modelo keynesiano considera que as exportações sejam autônomas (X=Xa) e que as importações sejam compostas de uma parcela autônoma e de uma segunda parcela que depende da propensão marginal a importar, isto é, M=Ma+Pmgm. Dadas essas condições, a renda será: Y=Ca+Pmgc.Tr+Pmgc[1‐Pmgt.]Y+Ia+Ga+Xa‐Ma‐Pmgm. Explicitando‐se a expressão acima em relação a Y, tem‐se: Y={1/[1‐Pmgc(1‐Pmgt)]+Pmgm}.[Ca+(Pmgc.Tr)+Ia+Ga+Xa‐Ma, O multiplicador keynesiano será a parte da última expressão que está entre entre chaves, ou seja: γ=1/[1‐Pmgc(1—Pmgt)+Pmgm]. E variação da renda será: ΔY= γ.[Δ(Ca+Ia+Ga+Pmgc.Tr+Xa‐Ma). Exemplo de aplicação no 03 Dados C=120+0,60Y, Tr=2, Ia=180, Ga=30, Xa=200, M=120+0,10Y, e Pmgt=0,30 determinar a renda de equilíbrio da economia e o multiplicador de gastos. Solução Cálculo do multiplicador: γ=1/[1‐0,60(1—0,30)+0,10] Donde: γ=2,08. A renda será: 23 Y=2,08[120+(0,60x2)+180+30+200‐120‐0,10Y], Donde: Y=706,30 u.m. 06.03. Síntese do modelo ISxLM Este modelo, conhecido pelos nomes de duas curvas (IS e LM), teve sua versão original apresentada por Hicks9 e resulta da evolução da Teoria Geral de Keynes, trazendo como ingrediente novo o mercado monetário. O sistema é organizado, portanto, em dois mercados, o de bens e serviços, representado pela curva IS (investment savings), e o monetário, representado pela curva LM (liquidity preference money)10. O modelo ISxLM é aplicado a economias fechadas ecom governo. Para as economias abertas (necessariamente com governos), o modelo que deriva do ISxLM é ISxLMxBP, onde BP é o Balanço de Pagamentos, indicativo das relações da economia de um país com outras economias. Portanto, a equação do equilíbrio geral macroeconômico é: Y=C+I+G, E os seguintes pressupostos são adotados: ‐ O consumo C segue o mesmo padrão do modelo keynesiano; ‐ O gasto de governo é autônomo (G=Ga); e ‐ O investimento depende da taxa de juro “i”, variando numa proporção inversa à da variação deste conforme se demonstra na seção 07, do presente texto. Daí: C=Ca+Pmgc.Tra+Pmgc(1‐Pmgt)Y; G=Ga; e I=Ia‐θi. Na terceira das condições acima, “θ” é a sensibilidade‐juro da demanda por investimento. Estabelecem‐se, a seguir, as equações e representações gráficas das curvas IS e LM: 9 John Hicks, economista britânico (XXXX‐XXXX).????????????????????? 10 Keynes trabalhou somente com o mercado de bens e serviços (economia real), admitindo que o equilíbrio deste independia do mercado monetário. ‐ Curva IS: Parte‐se do produto (ou renda) de equilíbrio: Y=Ca+Pmgc.Tr+Pmgc(1‐Pmgt)Y+Ia‐θi+Ga Separando‐se, no membro à direita da expressão acima, os gastos que dependem de decisões autônomas, tem‐se: Y[1‐Pmgc(1‐Pmgt)]=Ca+Pmgc.Tra+(Ia‐θi)+Ga Em seguida, chamando‐se os gastos autônomos de A, isto é: Ca+Pmgc.Tra+Ia+Ga, a expressão da renda de equilíbrio se transforma em: Y={1/[1‐Pmgc(1‐Pmgt)]}.(A‐ θi), Onde 1/[1‐Pmgc(1‐Pmgt)]=β, isto é, é o muliplicador keynesiano para uma economia fechada e com governo. Daí: Y=β(A‐θi), que é a equação da curva IS, de primeiro grau em “i” e negativamente inclinada, como mostra a Figura 10. Fig. 10 – Curva IS Colocando a expressão da curva IS na forma da equação reduzida da reta i=f(Y), tem‐se: i=(A/θ)‐(1/βθ).Y 24 donde: i=(1/θ)[A‐(1/β)].Y, que permite observar que, quanto menor o valor de θ (sensibilidade‐juro da demanda por investimento), tanto maior será a inclinação da reta IS e, consequentemente, menor será o impacto da alteração da taxa de juro sobre o nível de renda. ‐ Curva LM Na determinação da curva LM, o pressuposto básico é a existência de apenas dois tipos de ativos financeiros: títulos (que rendem juros) e moeda sonante. Sejam OT a oferta de títulos, M a oferta de moeda, P o nível geral de preços, e W a oferta monetária total (de títulos e moedas). A valores reais, a oferta monetária total é: W/P=(OT/P)+(M/P). Adicionalmente, sejam DT a demanda por títulos e L a demanda por moeda. Analogamente, a demanda monetária total é: W/P=(DT/P)+(L/P). O equilíbrio do mercado financeiro implica: (OT/P)+(M/P)=(DT/P)+(L/P) Donde: [(OT/P)‐(DT/P)]+[(M/P)‐(L/P)]=0 Um rápido exame da expressão acima permite concluir que se o mercado de títulos estiver em equilíbrio, o de moeda também estará e vice‐versa, porque se (OT/P)‐(DT/P)=0, obrigatoriamente (M/P)‐(L/P)=0. Dessa implicação, basta analisar‐se um dos dois mercados. Opte‐se, no caso, pelo mercado de moeda. A oferta de moeda é controlada pelo Banco Central que é a autoridade monetária de cada país. Essa oferta é, em termos reais, M/P. de outro lado, a demanda por moeda, isto é, quanto os agentes desejam manter de sua riqueza em dinheiro, corresponde, em termos reais,a: L/P=λY‐ρi Onde: λ é a sensibilidade‐renda da demanda por moeda; e ρ é a sensibilidade‐juro da demanda por moeda. O equilíbrio do mercado de moeda é dado por: L/P=M/P, donde: λY‐ρi=M/P, donde: i=(1/ρ)[λY‐(M/P)], que é a equação da curva LM. Ela revela que, quanto maior for a variação da renda mantida constante o oferta de moeda M, maior será a taxa de juro “i”. O gráfico da Figura 11 apresenta a curva LM. Fig. 11 – Curva LM A taxa de juro e a renda de equilíbrio resultará da intersecção das duas curvas. Superpondo os diagramas das Figuras 10 e 11, tem‐se o resultado do modelo, ilustrado pela Figura 12. 25 Fig. 12 – Taxa de juro e renda de equilíbrio Exemplo de aplicação no 04 Uma economia tem a seguinte função de consumo: C=0,70(1‐Pmgt)Y. A função de investimento dessa economia é dada por I=2000‐47,5i. Determinar a taxa de juro e o nível de renda dessa economia sabendo‐se que Pmgt=0,25, os gastos do governo são iguais a 755, a função de demanda por moeda é L/P=0,30Y‐50i e a oferta de moeda em termos reais (M/P) é igual a 500. Solução Determinação da curva IS: De Y=C+I+G, tem‐se: Y=0,70(1‐0,25)Y+2000‐47,5i+755, donde Y=5800‐100i; Determinação da curva LM: De L/P=M/P, tem‐se 0,30Y‐50i=500, donde i=0,006Y‐10; Cálculo do equilíbrio ISxLM: De Y=5800‐100i, tem‐se i=58‐0,01Y. Equiparando‐se a taxa de juro dessa expressão (curva IS) com a taxa de juro da expressão da curva LM, isto é: i=0,006Y‐10, encontra‐se i=8% e Y=3000. 06.04. Outros modelos Há, ainda, o modelo ISxLMxBP que é voltado para economias abertas, o qual é construído acrescentando‐se o Balanço de Pagamentos (BP) ao modelo ISxLM. Este modelo não é previsto de ser estudado no presente Curso por falta de espaço. Fica, entretanto, a sugestão ao(à) aluno(a) de, a título de exercício, tentar estruturá‐lo utilizando o mesmo critério adotado no desenvolvimento do modelo ISxLM, mediante a incorporação da relação do país com outras economias. Por fim, e igualmente por falta de espaço, não é previsto estudar‐se, no presente Curso, a determinação do produto em ambiente de variação de preços, isto é, o cálculo conjunto do produto e da inflação. 07. Determinantes do investimento O investimento corresponde à aplicação de capital para gerar nova riqueza. Os empresários investem em novos negócios ou expandem seus negócios correntes em busca de uma maior lucratividade. Investimentos resultam de decisões que dependem basicamente da taxa de juro. Dependem da expectativa do agente investidor em relação ao futuro (expectativa otimista ou pessimista). Dependem, ainda, de confiança no sistema econômico. A confiança está relacionada com alternâncias políticas que possam interferir no sistema econômico pondo em risco, por exemplo, a garantia do direito de propriedade. Como a taxa de juro é a mesma que remunera o capital que é tomado emprestado pelas entidades financeiras, então, ceteris paribus, se a taxa estiver alta, o empresário deixa de canalizar seu dinheiro para o investimento produtivo e o leva para aplicações no mercado financeiro pois auferirá uma remuneração mais alta ensejada por essa elevada taxa de juro. No entanto, se a taxa de juro for baixa, o investimento produtivo se torna atraente desde que o seu retorno, isto é, sua lucratividade seja superior à propiciada pela aplicação financeira. 26 Para melhor compreensão, suponha‐se que em uma economia existam cinco tipos de projetos passíveis de ser realizados pelos agentes econômicos. Denominem‐se esses projetos por Projeto I, Projeto II, Projeto III, Projeto IV e Projeto V. Cada tipo de projeto poderá ser alvo do interesse de uma grande quantidade de agentes (empresários) que, dispondo de recursos ou podendo aportar recursos via empréstimos, terão interesse em investir em um ou mais desses tipos de projeto. Admita‐se que os retornos anuais dos projetos sejam os que se apresentam no quadro da Figura 13. Fig. 13 – Tipos de projeto (fictícios) para interesse em investir PROJETO I II III IV V RETORNO ANUAL (%) 15 10 5 3 2 Caso a taxa de juro real da economia seja, por exemplo, 14%
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