Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Laboratório de Bioquímica da Faculdade de Medicina do Porto rui.fontes@mail.telepac.pt Metabolismos da frutose e da galactose e sua relação com a intolerância hereditária à frutose e a galactosemia clássica Pi Glicose Glicose-6-P Frutose-6-P Frutose-1,6-bisP Di-hidroxi- acetona-P Frutose-1-P Frutose Gliceraldeído Gliceraldeído-3-P ATP ATPATP ADP ADP ADP ADP H2O Pi H2O ATP piruvato Acetil-CoA lactato As enzimas que catalisam a conversão da frutose em frutose- 1-P (cínase da frutose), a cisão desta em di- hidroxiacetona-P e gliceraldeído (aldólase B) e a fosforilação deste em gliceraldeído- 3-P (cínase do gliceraldeído) só existem no fígado, rim e enterócitos. Glicogénio Metabolismo da Frutose A absorção intestinal de frutose é relativamente lenta e não estão descritos sintomas de intoxicação aguda em indivíduos normais quando a frutose é administrada por via oral. Porque a actividade da cínase da frutose é, normalmente, muito maior que a da aldolase B a injecção intravenosa rápida de frutose pode provocar sintomas agudos: dor abdominal, vómitos e hipoglicemia. hepatócito Frutose-1-P ≈ 0 ATP ≈ 2,5 mM ADP ≈ 0, 1 mM Pi ≈ 1 mM Mg2+ livre ≈ 0,7 mM Situação Basal Frutose ≈ 0 Pi ≈ 1 mM Mg2+ livre ≈ 0,7 mM plasma hepatócito Frutose-1-P ≈ 3 mM ATP ≈ 1,5 mM ADP ≈ 0, 1 mM Pi ≈ 0,5 mM Mg2+ livre ≈ 0,9 mM Após injecção IV de frutose Frutose ≥ 1 mM Pi ≈ 0,8 mM Mg2+ livre ≈ 0,9 mM plasma Resultados de Ressonância Magnética Nuclear do Fígado em indivíduos normais e em doença com Intolerância Hereditária à Frutose administrando frutose intra venosa na dose de 0,2 g/kg em 2,5 min. [Boesiger et al. (1994) Ped Res 36: 436] A injecção intra- venosa de frutose provoca efeitos semelhantes nos doentes com deficit de aldolase B (HFI) e nos indivíduos normais mas o efeito é muitíssimo mais prolongado no caso dos doentes com HFI. Frutose-1-P↑ Frutose Gliceraldeído ATP↓ ADP Di-hidroxi- acetona-P A Intolerância Hereditária à Frutose (HIF) é causada por mutações no gene da aldolase B que provocam diminuição marcada da actividade lítica da enzima relativamente à frutose-1-P. Pi↓ Aldólase B Episódios repetidos de crise aguda provocados pela ingestão de frutose pelos doentes com deficit de aldólase B levam a lesão hepática e tubular renal. Glicogénio Glicose-1-P Glicose-6-PGlicose F-1,6-BP Gliceraldeído-3-P DHA-P Frutose-1-P Os doentes com IHF têm episódios agudos de dor abdominal e vómitos quando ingerem frutose ou sacarose. Também pode haver hipoglicemia que é provocada pela acção inibidora da F-1-P na fosforílase do glicogénio e na própria aldólase. Felizmente, os doentes com IHF, mesmo na ausência de aconselhamento acabam por rejeitar (pelo menos alguns dos) os alimentos que contêm frutose… esta dieta limita os danos mas um aconselhamento dietético com exclusão absoluta de alimentos com frutose é sempre útil. A galactose e a N-acetil-galactosamina são, a par com a glicose e outras oses (como a manose, por exemplo) um importante constituinte de glicolipídeos, glicoproteínas e proteoglicanos. Galacto- cerebrosídeo Porção glicídica (glicosaminoglicano) de um proteoglicano Metabolismo da Galactose Globosídeo Glicoproteína Glicose Glicose-6-P Glicose-1-P UDP-Glicose UDP-Galactose ATP UTP PPi ADP A UDP-galactose (e a UDP- N-acetilgalactosamina) é a substância dadora de galactose (ou de N-acetilgalactosamina) na síntese de glicoproteínas, proteoglicanos, glicolipídeos e lactose (na mama da mulher que amamenta). Frutose-6-P glutamina glutamato Glicosamina-6-P N-acetil-Glicosamina-6-P Acetil-CoA UDP-N-acetil-glicosamina UDP-N-acetil-galactosamina N-acetil-Glicosamina-1-P CoA UTP PPi Os resíduos de galactose e N- acetilgalactosamina presentes na UDP- galactose e na UDP-N-acetilgalactosamina são sintetizados endogenamente a partir da glicose. No processo de síntese de glicolipídeos, glicoproteínas e proteoglicanos que contêm resíduos de galactose intervêm galactosil-transférases em que o dador de galactose é a UDP-galactose. Após o nascimento do bebé produz-se na mama da mãe uma proteína (lactalbumina) que se liga à galactosil-transférase e que lhe modifica a especificidade: o substrato aceitador passa a ser a glicose e começa a formar-se lactose. A síntese de UDP-galactose (e de N-acetil-galactosamina) a partir de glicose, a contínua síntese de glicoproteínas, proteoglicanos e glicolipídeos assim como a contínua hidrólise destas substâncias nos lisossomas explica a formação endógena de galactose livre (cerca de 1 a 2 g/dia). H2Olisossomas Outros constituintes das glicoproteínas, proteoglicanos e glicolipídeos 1,5 g de galactose é a quantidade de galactose que existe em 60 mL de leite de vaca ou em 40 mL de leite humano. Qual o destino metabólico normal da galactose (1) produzida endogenamente ou (2) da que se forma no lume intestinal a partir da hidrólise da lactose? Glicose Glicose-6-P Glicose-1-P UDP-Glicose Glicogénio ATP UTP ADP PPi Pi H2OPi CO2 Cínase da galactose Uridil transférase da galactose-1-P As enzimas que permitem a conversão da galactose em glicose-1-P e, por essa via, em glicogénio ou a sua oxidação existem em todos os tecidos mas são mais activas no fígado. Nos tecidos onde existe glicose-6-Pase a galactose pode converter-se em glicose e aumentar a glicemia. 4-Epi- mérase A equação soma que descreve as acções da cínase da galactose, da uridil- transférase da galactose-1-P e da 4-epimérase: Galactose + ATP → Glicose-1-P + ADP ATP ADP Cínase da galactose Uridil transférase da galactose-1-P 4-Epimérase UDP-Glicose Quando há deficit de actividade de uma das 3 enzimas apontadas há aumento da galactose no plasma (galactosemias) que se agrava sempre que o indivíduo bebe leite. A forma mais grave e mais conhecida é o deficit de uridil-transférase da galactose- 1-P: galactosemia clássica… Glicose-1-P NADPHNADP+ Galactitol Àcido Galactónico Xilulose-5-P CO2 Quando há deficit de uridil-transférase de galactose-1-P há acumulação intracelular de Galactose-1-P e acumulação de Galactose nos tecidos e plasma. A galactose é excretada directamente e converte-se parcialmente em galactitol. Redútase das aldoses 1- A patogenia dos sinais e sintomas agudos (“crise tóxica neonatal”: vómitos, recusa alimentar, diarreia, letargia, insuficiência hepática, falência tubular renal e, eventualmente, sepsis e morte) é desconhecida. 2- As cataratas (opacificação do cristalino) são uma consequência da conversão da galactose em galactitol. O seu desenvolvimento é prevenido pela dieta isenta de galactose. O galactitol formado acumula-se no cristalino e tem efeito osmótico… Outra hipótese é que o aumento de consumo de NADPH leve à diminuição de GSH e a stress oxidativo… Patogenia das alterações observadas na galactosemia por deficit de uridil-transférase da galactose-1-P Talvez que a galactose-1-P acumulada em altas concentrações nos órgãos provoque depleção de ATP mas… os modelos animais não confirmam a teoria. Trata-se eficazmente com dieta isenta de galactose. 3- As alterações que persistem ao longo da vida (alterações da fala, baixo QI, disfunção ovárica nas mulheres; são independentes da terapêutica) poderão ser causadas por alterações da glicosilação das glicoproteínas e dos glicolipídeos. Uma das hipóteses é que a causa seja a acção inibidora da galactose-1-P (que está sempre aumentada no citoplasma das células relativamente ao normal; mesmo com dietas restritivas em galactose) nas galactosil-transférases.Gal-1-P compete com UDP-Gal pelo centro activo… A diminuição no teor de resíduos de galactose nas glicoproteínas e glicolipídeos está comprovado… mas a causa do fenómeno é controversa. Bibliografia: 1. Steinmann, B., Gitzemann, R. & van den Berghe, G. (2008) Disorders of fructose metabolism in The online metabolic and molecular bases of inherited disease – OMMBID. (Valle, D., Beaudet, A. L., Vogelstein, B., Kinzler, K. W., Antonarakis, S. E. & Ballabio, A., eds), McGraw-Hill, Inc, New York. 2. Steinmann, B., Santer, R. & van den Bertghe, G. (2006) Disorders of Fructose Metabolism in Inborn Metabolic Diseases (Fernandes, J., Saudubray, J.-M., van den Berghe, G. & Walter, J. H., eds) pp. 135-142, Springer Medizin Verlag, Berlin. 3. Berry, G. T. (2006) Disorders of Galactose Metabolism in Inborn Metabolic Diseases (Fernandes, J., Saudubray, J.-M., van den Berghe, G. & Walter, J. H., eds) pp. 121-130, Springer Medizin Verlag, Berlin. 4. Bosch, A. M. (2006) Classical galactosaemia revisited, J Inherit Metab Dis. 29, 516- 25. 5. Leslie, N. D. (2003) Insights into the pathogenesis of galactosemia, Annu Rev Nutr. 23, 59-80. 6. Yasawy, M. I., Folsch, U. R., Schmidt, W. E. & Schwend, M. (2009) Adult hereditary fructose intolerance, World J Gastroenterol. 15, 2412-3. 7. Fridovich-Keil, J. L. (2006) Galactosemia: the good, the bad, and the unknown, J Cell Physiol. 209, 701-5.
Compartilhar