Buscar

Lucas Buril De Macêdo O REGIME JURÍDICO DOS PRECEDENTES JUDICIAIS NO PROJETO DO NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 3, do total de 23 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 6, do total de 23 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 9, do total de 23 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Prévia do material em texto

O REGIME JURÍDICO DOS PRECEDENTES JUDICIAIS NO PROJETO DO NOVO
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL
Revista de Processo | vol. 237/2014 | p. 369 | Nov / 2014
DTR\2014\17948
Lucas Buril De Macêdo
Mestre em Direito pela Faculdade de Direito do Recife - UFPE. Membro da Associação Norte
Nordeste de Professores de Processo. Advogado.
Área do Direito: Processual
Resumo: Com o Projeto do novo Código de Processo Civil (NCPC) em vias de aprovação, há a
expectativa de uma regulação específica dos precedentes judiciais, o que será realizado pela
primeira vez na história do direito brasileiro. Para que o regime dos precedentes não gere confusão
ou para que não seja mal aplicado, é essencial o estudo da teoria dos precedentes, responsável pela
construção das bases para a compreensão e aplicação adequada dos precedentes. O presente
trabalho analisa, sob essa perspectiva, o tratamento dado aos precedentes pelo NCPC, buscando
determinar o seu conteúdo normativo e avaliar as modificações projetadas.
Palavras-chave: Precedentes judiciais - Stare decisis - Projeto do novo Código de Processo Civil.
Abstract: With the Project of new Civil Procedure Code (NCPC) about to be approved, there is the
expectative of a specific regulation of judicial precedents, for the first time in the Brazilian law history.
For the system of precedent does not create confusion or not be misapplied, is essential the study of
the theory of precedents, responsible for building the foundation for understanding and proper
application of the precedents. The present work analyses, under this perspective, the treatment given
to the precedents by the NCPC, trying to determinate its normative content and evaluate the
projected modifications.
Keywords: Judicial precedents - Stare decisis - Project of new Brazilian Civil Procedure Code.
Sumário:
- 1.Introdução - 2.Sucintas noções acerca da teoria dos precedentes obrigatórios - 3.Aspectos gerais
do Projeto do Novo Código de Processo Civil e a proteção da segurança jurídica nas decisões
judiciais - 4.A regulação específica dos precedentes judiciais no NCPC - 5.Considerações finais e
conclusões
Recebido em: 03.03.2014
Aprovado em: 12.08.2014
1. Introdução
O Projeto do Novo Código de Processo Civil tem o mérito de constituir legislação atinada com o atual
estágio constitucional, consagrando expressamente os ditames do Estado Constitucional,
especialmente mediante o recurso aos princípios consagrados na Constituição Federal de 1988.
Muito embora a força da Constituição se imponha independentemente da existência de previsão
expressa, não deixa de possuir um valor simbólico louvável a encampação dos importantes valores
constitucionais, notadamente no Livro I (“Das normas processuais civis”) da Parte Geral do Código,
que, nessas disposições e ao longo de seu texto, preza pela concretização dos princípios da
segurança jurídica, igualdade e dignidade da pessoa humana.1
Nesse quadrante, as técnicas previstas no NCPC voltam-se, a maioria delas, para a proteção desses
princípios mediante a utilização de institutos ligados à padronização decisória, especialmente com o
reforço do precedente judicial. Os precedentes passam a ser um volante que direciona a atividade
processual, em uma perspectiva do todo, com o claro intuito de fornecer maior racionalidade à
atividade jurisdicional.2
Em outras palavras: a procedimentalização da demanda liga-se diretamente à existência de
precedente judicial prévio (perspectiva histórica) ou à necessidade de prolação de um novo
O regime jurídico dos precedentes judiciais no Projeto do
Novo Código de Processo Civil
Página 1
precedente que regule a questão posta e outras afins (perspectiva prospectiva).3
O que se impõe notar, nesse contexto, é que o direito brasileiro, muito embora possua uma afinidade
histórica com institutos do direito norte-americano, não possui qualquer teorização, muito menos algo
sólido, acerca do stare decisis. Para o bom funcionamento dos precedentes obrigatórios, é essencial
que se tenha com claridade os conceitos e técnicas deles imanentes, caso contrário, arrisca-se criar
uma prática confusa e pouco útil, além de, em alguns sentidos, perigosa. Com efeito, não basta a
institucionalização dos precedentes judiciais obrigatórios, é essencial uma teoria dos precedentes
bem construída.4
Parece, portanto, que esse é o momento de construir a teoria do stare decisis brasileira. Cabe à
doutrina e à jurisprudência modelar o substrato indispensável para o bom funcionamento dos
precedentes obrigatórios.
Nesse contexto, o presente trabalho busca fornecer algumas ideias basilares, inicialmente, e, em
seguida, parte para a análise das regras que cuidam especificamente dos precedentes judiciais no
NCPC, fornecendo uma primeira proposta de interpretação adequada e demonstrando a magnitude
que o tema assume para a sistemática processual projetada.
2. Sucintas noções acerca da teoria dos precedentes obrigatórios
Como é evidente, o presente trabalho, por seus limites, não pode fornecer uma teoria geral dos
precedentes judiciais, tarefa de alta complexidade e de extensão incompatível. Todavia, é importante
que algumas linhas gerais sejam traçadas, pois são imprescindíveis para a boa compreensão do
tema, evitando-se erros dialogais, especialmente quanto aos pontos principais aqui abordados.
Primeiramente, deve-se ressaltar que se perspectiva o precedente judicial como fonte de direito:5 isto
é, toma-se a decisão como ato jurídico que tem por eficácia (anexa)6 lançar-se como texto do qual se
construirá uma norma.7 Essa norma, na teoria dos precedentes, é comumente designada de ratio
decidendi.8 Esse é o sentido próprio em que se invoca a palavra precedente, embora seja possível
falar em precedente como norma, em um sentido impróprio e por metonímia, assim como se fala em
“aplicação da lei”, quando, na verdade, quer-se falar em “aplicação da norma da lei”.
Sobre o ponto, é costumeiro afirmar que a única “parte” do precedente que é formalmente vinculante
é a ratio decidendi ou holding.9
O ponto deve ser analisado com a devida cautela.
É importante perceber que a ratio decidendi transcende ao precedente do qual é compreendida, ou
seja, embora a ratio tenha o precedente como referencial ad eternum, seu significado não está
adstrito ao que o juiz lhe deu ou quis dar.10 Não há como se defender que a interpretação do
precedente judicial que dá vazão à sua norma deve ser feita de forma canônica ou literal, muito
embora possa ser corretamente realizada dessa forma em alguns casos.11 Com efeito, deve-se
perceber que a norma do precedente é diferente do texto do precedente, sendo equivocado reduzi-la
à fundamentação ou qualquer combinação de elementos da decisão do qual advém – da mesma
forma que não se deve reduzir a norma legal ao texto da lei.12
Diante dessa perspectiva, a compreensão dos demais conceitos, institutos e técnicas ligados aos
precedentes judiciais toma uma coloração própria. Percebe-se que a maioria dos problemas ligados
aos precedentes judiciais, como o da diferenciação (distinguishing) ou da superação (overruling), são
problemas ligados à interpretação e à argumentação. Não se pode, portanto, querer estabelecer uma
certeza absoluta a priori ligada à aplicação dos precedentes judiciais que, assim como a lei – mas
com notáveis diferenças –, é texto que, interpretado, dá vazão a um significado (norma).
Frise-se: só a partir desse prisma é possível uma construção da teoria dos precedentes séria, capaz
de fornecer boas respostas, em vez de frustração ou autoritarismo, ou mesmo de um retrocesso,
com um retorno incabível à exegese ou ao metodologismo.13
Note-se, por outro lado, que os precedentes judiciais são importantíssimos para garantir
racionalidade ao direito, especialmente na sua atual dimensão.14 Com acréscimos significativos na
criatividade do aplicador, notadamente pelo desenvolvimento dos princípios como normas, é
essencial que se desenvolvauma forma de contenção ou de fechamento desse processo criativo: os
O regime jurídico dos precedentes judiciais no Projeto do
Novo Código de Processo Civil
Página 2
precedentes obrigatórios.15
Isso mesmo: os precedentes são uma forma de garantir limites à atividade criativa dos juízes, e não
de reforçar a criatividade ou de dar mais poderes aos magistrados.16 Aliás, ao se negligenciar a
própria criatividade, acaba-se por dar margem mais ampla de criação, o que acaba por ensejar uma
produção irresponsável de direito jurisprudencial.17
Ao se estabelecer o respeito aos precedentes, de fato, assume-se como premissa o fato de que os
juízes podem criar normas jurídicas;18 todavia, são estabelecidas normas que regulam essa criação,
impondo limites e garantindo racionalidade a esse processo criativo. De fato, ninguém duvida, hoje,
que o STF ou o STJ criam Direito19 – basta visitar alguns julgamentos notórios para perceber –,
entretanto, não se pode permitir que essa criação seja feita de forma desordenada e ilimitada,
possibilitando-se, por exemplo, a construção de normas jurídicas de forma diferenciada no espaço ou
desordenada no tempo. O respeito aos precedentes judiciais é forma relevantíssima de garantir
segurança jurídica, igualdade e eficiência jurisdicional.20
Mais uma noção básica deve ser fornecida: o descumprimento da norma do precedente (ratio
decidendi) não é diferente do descumprimento da norma legal. Perceba-se que, muito embora o
conjunto das fontes do direito seja integrado por elementos de qualidade diversa (Constituição, leis,
precedentes, costumes etc.), o conjunto das normas é sistemático e precisa ser, tanto quanto
possível, racional e coerente. Ora, se norma é significado, é notável que estes, independentemente
das qualidades dos textos, não podem ser logicamente incompatíveis – enfim, afirmar que o direito é
mais do que lógica não equivale a dizer que ele é ilógico.
Nessa toada, a previsão de instrumentos específicos para a aplicação de precedentes judiciais, por
qualquer motivo, é algo que não se deve tolerar. Os precedentes judiciais precisam ser interpretados
e aplicados normalmente, e a colaboração criativa, com a outorga de sentido, deve ser feita na forma
comumente estabelecida pelo sistema jurídico, não se admitindo qualquer forma autoritária de dar a
um único órgão o poder de dar sentido a qualquer texto, reestabelecendo-se os ditames da exegese.
21
Os precedentes judiciais precisam ser compreendidos adequadamente como uma fonte do direito,
que dá espaço para uma ou mais normas (rationes decidendi), e não como instrumentos de outorga
de poder criativo aos juízes – que o possuem independentemente do stare decisis –, mas de fixação
de limites e técnicas para seu exercício, garantindo racionalidade. Nesse quadro, eles não podem
ser aplicados mediante instrumentos específicos ou centralizadores, que busquem mortificar a
interpretação por outros órgãos, o que seria medida vulneradora do Estado Democrático de Direito e
do contraditório, seu corolário processual.
Finalmente, cabem algumas palavras sobre uma das mais importantes características do stare
decisis: a autorreferência.22
Autorreferência é um dever de fundamentação específico, pelo qual o magistrado precisa,
necessariamente, referir-se ao que foi realizado anteriormente pelos seus pares para decidir
adequadamente uma questão similar. Isto é, o Judiciário, ao julgar um caso que já foi por ele mesmo
decidido, precisa referir-se à sua atuação, independentemente de sua decisão confluir ou se desviar
da linha assumida anteriormente. Essa é uma característica essencial para o bom funcionamento do
stare decisis e é capaz de garantir racionalidade e segurança.
Note-se que a autorreferência não impõe o dever de seguir precedentes – isso cabe ao próprio
princípio do stare decisis –, mas se trata de regra jurídica que determina a adequação da
fundamentação aos precedentes pertinentes ao caso. Precisamente, a partir da autorreferência, o
julgador subsequente precisa voltar-se para o que foi decidido anteriormente, seja essa decisão
favorável ao seu entendimento, possibilitando uma fundamentação que se limite a demonstrar a
identidade dos casos, ou contrária, caso no qual será indispensável evidenciar diferenças relevantes
ou trazer fundamentos importantes para não se aplicar o precedente judicial.23
Realmente, o magistrado, ao solucionar um caso, precisa necessariamente fundamentar fazendo
referência aos precedentes que tratem de questões análogas às analisadas. O fato de os
precedentes serem enunciados na fundamentação das decisões e servirem como vetores
argumentativos para a tomada de decisão é uma das principais razões para sua força vinculante.24
Isso não quer dizer que os precedentes judiciais precisarão ser mantidos em todas as hipóteses,
O regime jurídico dos precedentes judiciais no Projeto do
Novo Código de Processo Civil
Página 3
mas que “não é aceitável que o juiz decida desconsiderando as normas dos precedentes e, se
decidir contrariamente a elas, deve, ao menos, justificar adequadamente porque o fez”.25
3. Aspectos gerais do Projeto do Novo Código de Processo Civil e a proteção da segurança
jurídica nas decisões judiciais
O Projeto do Novo Código de Processo Civil tem o mérito de constituir legislação atinada com o atual
estágio constitucional, consagrando expressamente os ditames, especialmente mediante o recurso
aos princípios, do Estado Constitucional. Muito embora a força da Constituição se imponha
independentemente da existência de previsão expressa, não deixa de possuir um valor simbólico
louvável a encampação dos importantes valores constitucionais, notadamente no Livro I (“Das
normas processuais civis”) da Parte Geral do Código, que nessas disposições, e ao longo de seu
texto, preza pela concretização dos princípios da segurança jurídica, igualdade e dignidade da
pessoa humana.26
No quadro em que se insere o NCPC, o Senado Federal publicou, por meio da comissão de juristas
formada para confeccionar o Projeto do Código, a exposição de motivos. Nesse espaço,
consagrou-se expressamente:27
“Com evidente redução da complexidade inerente ao processo de criação de um novo Código de
Processo Civil, poder-se-ia dizer que os trabalhos da Comissão se orientaram precipuamente por
cinco objetivos: 1) estabelecer expressa e implicitamente verdadeira sintonia fina com a Constituição
Federal; 2) criar condições para que o juiz possa proferir decisão de forma mais rente à realidade
fática subjacente à causa; 3) simplificar, resolvendo problemas e reduzindo a complexidade de
subsistemas, como, por exemplo, o recursal; 4) dar todo o rendimento possível a cada processo em
si mesmo considerado; e, 5) finalmente, sendo talvez este último objetivo parcialmente alcançado
pela realização daqueles mencionados antes, imprimir maior grau de organicidade ao sistema,
dando-lhe, assim, mais coesão”.
Muito embora não se tenha alçado a segurança jurídica nos atos jurisdicionais a um dos principais
objetivos do Projeto do novo Código de Processo Civil, a exposição de motivos acabou por dedicar
muitas linhas a enfatizar a preocupação dos juristas idealizadores da nova lei com a tutela da
segurança jurídica e com a uniformidade da jurisprudência. De fato, a preocupação enunciada com
os precedentes judiciais permeia e fundamenta o NCPC.
Consoante se consigna na exposição de motivos, não se pode tolerar diversos posicionamentos
jurisdicionais acerca de uma mesma situação jurídica substancial, em detrimento dos jurisdicionados,
seja em relação aos que estão em situações idênticas e recebem um tratamento menos favorável ou
àqueles que planejaram suas atuações com fundamento na orientação dada pelos tribunais.
Conforme se observou, a insegurança nas decisões judiciais “gera intranquilidade e, por vezes,
verdadeira perplexidade na sociedade”.28
Nessa linha, na versão confeccionada pelo Senado, já no texto do Anteprojetodo novo Código de
Processo Civil, estabelecia-se que “A jurisprudência do STF e dos Tribunais Superiores deve nortear
as decisões de todos os Tribunais e Juízos singulares do país, de modo a concretizar plenamente os
princípios da legalidade e da isonomia”. A disposição foi elaborada em claro prestígio da função
nomofilácica e paradigmática desses tribunais e servia para fornecer, ainda que inadequadamente, a
base legal para a construção de uma teoria brasileira dos precedentes.
Diversos outros dispositivos do Anteprojeto enaltecem o valor dos precedentes judiciais,
preocupando-se, por exemplo, com a mudança de orientação dos tribunais e estabelecendo
expressamente a possibilidade de modulação. De uma análise dos motivos expostos e dos
dispositivos do NCPC, fica patente a aposta nos precedentes judiciais como forma de racionalizar o
direito e tutelar a contento o princípio da segurança jurídica.29
4. A regulação específica dos precedentes judiciais no NCPC
De forma extremamente significativa, o Projeto do novo Código de Processo Civil inaugura regulação
específica destinada ao precedente judicial, que não é realizada no CPC vigente, de 1973, e nem o
fora no Código de Processo de 1939. Trata-se de previsão que demonstra a atualidade do tema e o
atino da comunidade jurídica para a necessidade de disciplinar adequadamente o resultado da
prestação jurisdicional, outorgando-lhe a devida eficácia como ato relevante para a construção do
O regime jurídico dos precedentes judiciais no Projeto do
Novo Código de Processo Civil
Página 4
direito.
Na forma como aprovado na Câmara, o NCPC prevê um capítulo específico, o XV, nomeado “Do
precedente judicial”, no Título I, “Do procedimento comum”, do Livro I, “Do processo de
conhecimento e do cumprimento de sentença”, da Parte Especial.
Primeiramente, cumpre notar que o locus que se designou para a regulação do precedente não foi o
mais adequado.
Com efeito, importantes precedentes podem muito bem ser fixados por decisões tomadas no
cumprimento de sentença ou nos procedimentos especiais. Isso torna a previsão de sua tratativa no
título destinado ao procedimento comum equivocada, por ser redutora. Precedentes judiciais podem
surgir em decisões relativas a qualquer procedimento. Na verdade, a procedimentalização do direito
material é pouco importante para a existência de precedente judicial, que é efeito anexo da decisão
judicial: portanto, ocorrendo decisão, há precedente.30 Sua destinação correta seria, sem dúvidas, a
Parte Geral.
Nada obstante, a parcela do Código em que colocada a regulação dos precedentes não significa
uma barreira instransponível, pelo contrário: trata de um pequeno problema facilmente contornável.
Assim como no CPC vigente aplicou-se comumente disposições sobre o procedimento comum aos
demais, o mesmo há de ser feito quanto aos precedentes no NCPC. De fato, nada obstante os
precedentes judiciais tenham sido tratados em título destinado ao procedimento comum, as normas
relativas a esses dispositivos possuem aplicação para as decisões tomadas em qualquer que seja o
procedimento.31
O tratamento do precedente judicial no Projeto do novo Código de Processo Civil é realizado em três
dispositivos, nos arts. 520, 521 e 522.
O art. 520 determina que “Os tribunais devem uniformizar sua jurisprudência e mantê-la estável,
íntegra e coerente”. Estabelece-se, assim, um dever geral de tutelar a segurança jurídica nas
decisões judiciais, marcadamente nos posicionamentos dos tribunais.
O dispositivo aponta, primordialmente, para a inadmissibilidade de qualquer tribunal sustentar mais
de uma orientação simultaneamente. Obviamente, não se afasta a possibilidade de diferença
temporal entre as rationes decidendi assumidas, desde que com o devido cuidado, mas não é
possível tolerar que o mesmo tribunal, ou mesmo que tribunais distintos, venham a sustentar, ao
mesmo tempo, posições distintas. O tribunal, ainda que dividido em vários órgãos, é um só, e precisa
atuar em conformidade com sua unidade, assumindo uma única posição acerca da mesma questão
jurídica. Além disso, o tribunal precisa estar atento para uma eventual manifestação de dissidência
interna, tomando a responsabilidade de uniformizar a sua orientação, mediante um precedente
adequado para isso. Nesse sentido, estabelece-se o dever de uniformizar.32
Da mesma forma, os tribunais precisam justificar adequadamente a mudança. É igualmente
afrontoso à segurança jurídica a excessiva variação de orientações assumidas pelos precedentes,
ainda que em espaço temporal diferido. A fixação da ratio decidendi precisa ser respeitada pelo
próprio tribunal, evitando a superação do precedente de forma leviana ou incauta. De fato, é preciso
perspectivar que, mesmo ao julgar uma demanda individual, o tribunal está orientando a sociedade,
e tanto os particulares que participam do processo como a comunidade de forma geral possuem o
direito fundamental à segurança. Dessa forma, o dever de estabilidade, consagrado no dispositivo
em comento, exige que se pese a força da segurança quando o tribunal cogite desviar de
posicionamento assumido em um precedente.33
A enunciação de precedentes pelos juízes segue uma mesma linha, que, ainda que não se possa
compreender como retilínea, deve ser, efetivamente, uma só linha. Com isso se quer dizer que os
órgãos judicantes não podem assumir posicionamentos inconsistentes e conflitivos, devendo manter
sua jurisprudência racional, mediante precedentes que, em um primeiro aspecto, dialoguem com o
que foi construído anteriormente, respeitando o dever de autorreferência, e, em um segundo sentido,
é exigido que as decisões, na continuidade ou na alteração, sejam proferidas sem inconsistências
injustificadas entre elas. Impõe-se a integridade das decisões e dos precedentes.34 Em outras
palavras, o Judiciário precisa estar alinhado em sua atuação sob duas perspectivas:
geograficamente, não se autorizando que a mesma situação jurídica seja tratada de forma
O regime jurídico dos precedentes judiciais no Projeto do
Novo Código de Processo Civil
Página 5
injustificadamente diferente por órgãos de locais díspares; e historicamente, precisando respeitar sua
atuação anterior ou justificar a modificação da posição que foi adotada com referência e cuidado com
o passado e suas consequências.35 Pode-se falar, portanto, em um dever de integridade.
Outrossim, o Judiciário, em comando direcionado especialmente aos tribunais, deve ser
compreendido como um só , e, consequentemente, as orientações que são oferecidas aos
jurisdicionados, especialmente pelos precedentes judiciais, não podem ser observadas de forma
particularizada ou destacada dessa realidade.36 Por isso mesmo, os tribunais precisam considerar o
que foi por eles dito anteriormente, e justificar qualquer dissenso, tanto interno, em relação ao órgão
prolator do precedente contrário, como também externo, quando o precedente advir de outro órgão
judicante. Requer-se, também por esse prisma, o dever de autorreferência como dever de
fundamentação específico. Em síntese: o que é enunciado nos precedentes precisa ser
compreendido como um discurso do Judiciário para a sociedade, que precisa ser coerente, ainda
que não siga uma só linha, é essencial que os desvios particulares ou mudanças sejam
substancialmente justificadas, evitando uma verdadeira esquizofrenia do Judiciário. O precedente
judicial insere-se em um contexto mais amplo em que visa garantir coerência e consistência da
atuação dos juízes.37
Consagra-se o dever de coerência.
O art. 520 do NCPC é, certamente, o dispositivo mais importante sobre a teoria dos precedentes
judiciais, fornecendo material suficiente para a construção do stare decisis brasileiro. Com efeito, a
partir da institucionalização dos deveres de uniformização, estabilidade, integridade e coerência,
torna-se pouco crível o funcionamento do sistema jurídico sem o stare decisis. Os deveres
consagradosno Projeto do novo Código de Processo Civil possuem conteúdo normativo suficiente
para a criação institucional dos precedentes obrigatórios.
Peca, entretanto, o dispositivo, em seu § 1.º. O § 1.º do art. 520 do NCPC estabelece que os
tribunais, consoante seus regimentos internos, “devem editar enunciados correspondentes à súmula
da jurisprudência dominante”.
É necessário que as súmulas sejam vistas com a devida atenção.
Precisamente, súmulas não são precedentes judiciais.38–39 Para a criação de um enunciado sumular
é estabelecido um procedimento específico e distinto do processo judicial, que enseja o precedente
judicial.40 Bem vistas as coisas, o precedente é elemento da hipótese fática da norma que permite a
edição da súmula. E só isso. Não é possível confundir os dois institutos, inclusive porque a
necessidade de instituir súmulas ou súmulas vinculantes parte do pressuposto da ausência de força
do precedente, isoladamente e em sua unidade. Há de se perceber: caso o stare decisis brasileiro
estivesse institucionalizado, a importância das súmulas seria reduzida a nada.41
No ponto, é relevante destacar que o enunciado sumular, autorizado pela existência de precedentes,
passa a deter vinculatividade própria. Inclusive, em interessante pesquisa, Leonardo Greco
demonstrou que os enunciados 622, 625 e 626 da súmula da jurisprudência dominante do STF não
guardam correspondência, como era de se esperar, com os acórdãos paradigmas.42 Seguindo essa
linha, Patrícia Perrone Mello analisou as Súmulas Vinculantes 1, 2 e 3, e, embora as duas primeiras
guardem congruência com as decisões de base, na terceira, três dos quatro precedentes invocados
para a autorização da edição do enunciado tratavam da matéria objeto apenas como obiter dictum. A
jurista carioca, nesse contexto, aponta uma autonomia excessiva entre os enunciados sumulares e a
ratio decidendi dos julgados e a inexistência de preocupação com a distinção entre ratio decidendi e
obiter dictum, concluindo pela necessidade de melhorar a operacionalização com as súmulas.43
Desse modo, muito embora o caput do art. 520 forneça todas as ferramentas necessárias para a
construção do stare decisis brasileiro, estabelecendo importantes deveres para o Judiciário, o seu §
1.º consegue fincar uma barreira de difícil transposição para que se alcance um sistema de
precedentes obrigatórios. Ao se investir nas súmulas como método de estabilização da
jurisprudência, reduz-se a importância que, a princípio, viria a ser atribuída ao precedente judicial.
Noutra mão, o § 2.º do art. 520 fixa que “É vedado ao tribunal editar enunciado de súmula que não se
atenha às circunstâncias fáticas dos precedentes que motivaram sua preocupação”.
Muito embora o § 2.º acabe por reduzir os problemas causados pelo primeiro parágrafo do
O regime jurídico dos precedentes judiciais no Projeto do
Novo Código de Processo Civil
Página 6
dispositivo, ele não é suficiente. O seu propósito é evitar que os enunciados sumulares se distanciem
da ratio decidendi dos precedentes que lhe fundamentam, mas, ao contrário de negar a diferença
entre precedente e súmula, serve para afirmá-la: os textos mantêm sua autonomia e os precedentes
perdem a dignidade de referencial normativo.
A súmula vinculante, observada em sua regulação e funcionalização, possui uma faceta claramente
autoritária. O instituto é realizado para impedir a atuação do direito pelos demais órgãos
jurisdicionais, idealizando-os como meros porta-vozes do STF, o que não acontece no stare decisis.
44
De fato, a súmula vinculante enrijece o direito exacerbadamente. Perceba-se que se busca impedir
atividade interpretativa e criativa pelos demais órgãos jurisdicionais.45 Inclusive, o cabimento de
reclamação constitucional, diretamente para o STF, conota essa pretensão. A ideia é que a súmula
vinculante é o ponto final do direito e que não cabe a ninguém – sejam os jurisdicionados, outros
profissionais da área jurídica ou os demais órgãos jurisdicionais – construir a questão, pois é
competência do Supremo estabelecê-la e definir o seu significado definitivo. Exclui-se a participação
mais aberta mediante um procedimento centralizador da interpretação do texto da súmula.46
Entabular toda a riqueza do precedente, diferenciado da lei justamente por sua conexão mais forte
com os fatos da causa, em um enunciado abstrato é impossível, e acaba, além disso, por dificultar
diferenciações ou uma construção ou reconstrução que efetive um real diálogo com a experiência.47
Com as súmulas busca-se excluir discordâncias e, assim, exclui-se a própria possibilidade de
construção dialógica, envolvendo o máximo número de processos – e, consequentemente, de
jurisdicionados, advogados e demais atores jurídicos e sociais –, e paulatina, o que permite que a
decisão absorva o maior número possível de argumentos. Opta-se por eliminar a natural formação
dinâmica do precedente e a flexibilidade ínsita à sua aplicação.48 Com efeito, as súmulas,
especialmente as vinculantes, são muito similares à legislação, o que se torna notável com a
existência de um procedimento próprio para sua enunciação, modificação e alteração.49
A súmula vinculante, embora tenha sido importante para apontar para a criatividade judicial,
reforçando a sua percepção como uma realidade inolvidável, está longe de representar um instituto
característico de um sistema de precedentes.50 Realmente, as súmulas vinculantes não são
condizentes com o stare decisis. Com a fortificação deste, é natural que elas percam sua força e
sejam pouco utilizadas, abrindo caminho para uma prática pautada na importância de uma única
decisão e mais aberta à interpretação e à construção colaborativa e paulatina.
Assim, é natural que a caminhada em direção à fortificação dos precedentes obrigatórios no Brasil
passe pelo esquecimento e supressão das súmulas, vinculantes ou não, instituto que só tem razão
de ser em um sistema que desconsidera o precedente judicial.
Passa-se à análise paulatina do art. 521, caput e seus incisos, do Projeto do novo Código de
Processo Civil, para analisar seus parágrafos depois. O dispositivo, in verbis, determina que:
“Art. 521. Para dar efetividade ao disposto no art. 520 e aos princípios da legalidade, da segurança
jurídica, da duração razoável do processo, da proteção da confiança e da isonomia, as disposições
seguintes devem ser observadas:
I – os juízes e tribunais seguirão as decisões e os precedentes do Supremo Tribunal Federal em
controle concentrado de constitucionalidade;
II – os juízes e os tribunais seguirão os enunciados de súmula vinculante, os acórdãos e os
precedentes em incidente de assunção de competência ou de resolução de demandas repetitivas e
em julgamento de recursos extraordinário e especial repetitivos;
III – os juízes e tribunais seguirão os enunciados das súmulas do Supremo Tribunal Federal em
matéria constitucional, do Superior Tribunal de Justiça em matéria infraconstitucional e dos tribunais
aos quais estiverem vinculados, nesta ordem;
IV – não sendo a hipótese de aplicação dos incisos I a III, os juízes e tribunais seguirão os
precedentes:
a) do plenário do Supremo Tribunal Federal, em controle difuso de constitucionalidade;
O regime jurídico dos precedentes judiciais no Projeto do
Novo Código de Processo Civil
Página 7
b) da Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, em matéria infraconstitucional”.
Primeiramente, é imperioso que se compreenda a relação do dispositivo com o anterior
corretamente. O art. 520 estabelece os deveres gerais de uniformização, estabilidade, integridade e
coerência, que são expressões da segurança jurídica, particularmente a segurança nos atos
jurisdicionais. O art. 521 regula a forma de cumprimento específico do dispositivo. Assim, são
estabelecidos os meios pelos quais os deveres decorrentes da segurança jurídica na atuação judicial
são cumpridos no processo brasileiro.
Todavia, não se pode enxergaressas formas como exaurientes. Sem dúvida, caso elas sejam
suficientes, não é preciso recorrer a outras formas de cumprimento dos deveres estabelecidos. Por
outro lado, caso se tenha alguma situação em que os deveres de uniformização, estabilidade,
integridade e coerência sejam vulnerados, ou parte ou mesmo apenas um deles, é indispensável que
se recorra ao art. 520 para a solução. Em síntese: os deveres gerais de segurança, que são
concretizações do princípio constitucional da segurança jurídica, não podem ser desatendidos,
mesmo que alguma situação não encontre guarida na sua regulação específica, realizada no art. 521
do NCPC. Caso ocorra vulneração à segurança jurídica, o princípio deve ser concretizado e
protegido, exista ou não previsão específica.
Esclarecido esse ponto inicial, deve-se reconhecer que o avanço realizado no NCPC acerca dos
precedentes judiciais foi substancial.
É notável que o Projeto do novo Código cria uma hierarquia entre institutos e precedentes. É dizer,
ao se decidir uma questão, deve-se inicialmente procurar por precedente do STF em controle
concentrado de constitucionalidade, em seguida, para enunciados da súmula vinculante, e, depois,
os precedentes gerados por incidente de assunção de competência ou resolução de demandas
repetitivas ou recursos extraordinário ou especial repetitivos. Não existindo nenhum destes, segue-se
os enunciados da súmula do STF em matéria constitucional e do STJ em matéria infraconstitucional,
e do respectivo tribunal intermediário, respeitando-se essa sequência. Finalmente, não existindo
regulação em qualquer destes, o dispositivo determina o respeito aos precedentes do plenário do
STF em controle difuso de constitucionalidade e da Corte Especial do STJ em matéria
infraconstitucional.
Tirante a crítica às súmulas, fez bem o NCPC em expressamente eleger a hierarquia dos tribunais
como critério para a seleção do precedente aplicável.
Ademais, importa notar que se procurou estabelecer, tanto quanto possível, a fixação da importância
dos precedentes em conformidade com a substância, isto é, com a matéria de que tratem. Dessa
forma, o inciso cuidou de outorgar aos tribunais de justiça a incumbência de determinar o direito
local, mediante seus precedentes do plenário ou do órgão especial. Todavia, a orientação se
mantém: cabendo recurso da decisão que fixa o direito local, e permitindo-se ao tribunal superior
imiscuir-se na análise do direito local, a definição do circuito recursal sobrepõe-se ao tanto
estabelecido no dispositivo.
Finalmente, conquanto inexista previsão do dever de seguir os precedentes das turmas do STJ ou do
STF, caso inexista precedente dos órgãos mencionados no dispositivo, nada justifica que o juiz ou
tribunal intermediário ignore o precedente de alguma das turmas desses tribunais. Com efeito, os
deveres de integridade, de coerência e de estabilidade impõem que os órgãos judicantes que se
encontrem em posição inferior no circuito processual recursal respeitem os precedentes daqueles
que estão acima.
Assim, em respeito à segurança jurídica e à igualdade, é imprescindível que se estabeleça também o
respeito aos órgãos fracionários do STJ e do STF não mencionados no dispositivo, quando inexista
algum precedente dos órgãos mencionados. Em respeito ao tanto estabelecido no art. 520, portanto,
os precedentes dos órgãos do STF e do STJ não mencionados devem ser compreendidos como
seguintes na lista de precedentes a serem seguidos. Dessa forma, depois de verificada a existência
de precedente do plenário do STF, em matéria constitucional, deve-se analisar se alguma das
turmas já resolveu a questão. Igualmente, em matéria infraconstitucional, caso inexista precedente
da Corte Especial do STJ, deve-se perquirir acerca do tratamento da matéria, Seção competente ou
por alguma das turmas.
O regime jurídico dos precedentes judiciais no Projeto do
Novo Código de Processo Civil
Página 8
Seguindo na análise, os primeiros parágrafos do art. 521 cuidam da modificação ou superação dos
precedentes ou de atos de criação de normas jurídicas jurisprudenciais. Estabelecem os §§ 1.º a 6.º:
“§ 1.º A modificação de entendimento sedimentado poderá realizar-se:
I – por meio do procedimento previsto na Lei 11.417, de 19 de dezembro de 2006, quando tratar-se
de enunciado de súmula vinculante;
II – por meio do procedimento previsto no regimento interno do tribunal respectivo, quando tratar-se
de enunciado de súmula da jurisprudência dominante;
III – incidentalmente, no julgamento de recurso, na remessa necessária ou na causa de competência
originária do tribunal, nas demais hipóteses dos incisos II a VI do caput.
§ 2.º A modificação de entendimento sedimentado poderá fundar-se, entre outras alegações, na
revogação ou modificação da norma em que se fundou a tese ou em alteração econômica, política
ou social referente à matéria decidida.
§ 3.º A decisão sobre a modificação de entendimento sedimentado poderá ser precedida de
audiência pública e da participação de pessoas, órgãos ou entidades que possam contribuir para a
rediscussão da tese.
§ 4.º O órgão jurisdicional que tiver firmado a tese a ser rediscutida será preferencialmente
competente para a revisão do precedente formado em incidente de assunção de competência ou de
resolução de demandas repetitivas, ou em julgamento de recursos extraordinários e especiais
repetitivos.
§ 5.º Na hipótese de alteração de jurisprudência dominante, sumulada ou não, ou de precedente, o
tribunal poderá modular os efeitos da decisão que supera o entendimento anterior, limitando sua
retroatividade ou lhe atribuindo efeitos prospectivos.
§ 6.º A modificação de entendimento sedimentado, sumulado ou não, observará a necessidade de
fundamentação adequada e específica, considerando os princípios da segurança jurídica, da
proteção da confiança e da isonomia”.
Superar um precedente significa retirá-lo do ordenamento jurídico como direito vigente, colocando
algo novo em seu lugar. Falar em superação do precedente abrange tanto a exclusão do precedente
em si, como a eliminação de sua ratio decidendi – visto que é possível eliminar uma das normas do
precedente e preservar outra.51 A revogação de um precedente pode se dar de duas formas. É
possível que seja realizada pelo próprio Judiciário, mediante outra decisão, que afirme uma norma
diferente da contida no precedente, superando-a. É também possível que se dê por meio de ato do
legislador, ao dispor em sentido contrário ou mesmo promulgando lei que repita a norma enunciada
em um precedente, quando passa a ser o novo referencial normativo. Os parágrafos colacionados
tratam da superação de precedente judicial pelo Judiciário (overruling).
É importante notar que, nos ordenamentos jurídicos em que não há disposições regulando a
superação dos precedentes judiciais e, mais importante, remediando-a, os precedentes tendem a ser
descartados despercebidamente, e, assim, simplesmente não há como se falar em precedente
obrigatório. Como resultado, os juízes se inclinam, em variada medida, a decidir acerca dos mesmos
fatos jurídicos de forma diferente, tornando, em muitas áreas, o direito jurisprudencial bastante
caótico e confuso. Com efeito, percebe-se que a preocupação do sistema jurídico com a superação
dos precedentes é a maior demonstração da sua importância.52
A regulação da superação (overruling), primeiramente, estabelece o paralelismo entre a formação e
a modificação ou extinção do ato normativo. Assim, súmulas, vinculantes ou não, precisam ser
modificadas mediante seu procedimento específico. Além disso, despontar que súmulas não são
precedentes demonstra a inconveniência da medida: deve-se aplicar o texto como se ele tivesse um
significado unívoco e certo, qualquer compreensão diferenciada deve ser aditada ou editada pelo
tribunal competente.
Com acerto, o NCPC estabelece as modificações contextuais como a principal causa para a
superação de um precedentejudicial. Todavia, ainda que isso em nada prejudique a superação,
O regime jurídico dos precedentes judiciais no Projeto do
Novo Código de Processo Civil
Página 9
deixou de se prever expressamente a hipótese de erro. Parece que isso foi proposital: busca-se a
contenção das modificações constantes da jurisprudência. O dispositivo, entretanto, é meramente
exemplificativo, como não poderia deixar de ser, e não obstaculiza a possibilidade de invocar outros
motivos relevantes para a superação.
É essencial notar que a própria extinção ou modificação do precedente deve, além de respeitar os
requisitos procedimentais-argumentativos, ser congruente com os princípios jurídicos e com as
proposições sociais que determinam o sistema jurídico e a própria superação dos precedentes.53 Isso
significa que a norma que substitui a contida no precedente superado não é criada livremente. Sua
criação está ligada, além de às restrições processuais, aos argumentos permissivos da mudança e
ao próprio ordenamento jurídico, compreendido em sua totalidade, e às proposições sociais que
fundamentam o sistema jurídico. O novo precedente deve ser uma exigência de determinadas
normas materiais, que fazem necessária a sua construção e a sustenta.54 Dessa forma, é
imprescindível compreender, ainda que grosseiramente, que a superação do precedente só é
legítima quando o tribunal nega o precedente para que, assim, sustente o direito.55
Além disso, fixa-se a possibilidade de intervenção nos processos em que se debata a modificação ou
superação de orientação jurisprudencial. A previsão fortalece o amicus curiae, cada vez mais
importante nos tempos atuais, em que cada processo detém certo interesse coletivo.
Ainda sobre a previsão do § 3.º, é de se notar que ela acaba por encartar a possibilidade de se
estabelecer um verdadeiro procedimento para a audição de terceiros. Realmente, é possível que, em
recursos, o STJ ou o STF suscite a possibilidade de superação de um importante precedente, e,
buscando ampliar a participação e fortificar a legitimidade democrática da tese adotada, resolva
instaurar um incidente para ouvir pessoas, entidades ou órgãos contributivos para a solução da
questão.
No que toca à competência para a superação do precedente, nada obstante o dispositivo utilizar a
ideia de preferência do órgão que fixou a ratio decidendi, deve-se entender que só é possível que
outro órgão realize a superação caso se encontre em posição superior na pirâmide judiciária. Caso
contrário, quando a decisão em sentido contrário ao estabelecido é de órgão inferior, não se trata de
superação, mas apenas de decisão em error in judicando ou in procedendo.
Perceba-se que a superação é uma prerrogativa dos tribunais superiores.56 Como o stare decisis
está diretamente ligado à estrutura judiciária e à ordem jurídica processual, nomeadamente à
previsão recursal, a superação dos precedentes judiciais obrigatórios só é permitida para o próprio
tribunal que prolatou a decisão ou para outro que esteja em posição hierárquica superior. Assim, no
stare decisis brasileiro, os precedentes dos tribunais superiores e do STF são obrigatórios, sendo
certo que este pode superar os precedentes daqueles com base em sua competência recursal.
O § 5.º possibilita a superação prospectiva do precedente, em qualquer de suas variações. A
superação dos precedentes precisa necessariamente considerar a segurança jurídica, que incide
para proteger a confiança legítima.57 – 58 Perceba-se: a norma exarada por precedente cria a
expectativa legítima de sua continuidade pelos jurisdicionados, que programam suas relações
jurídicas em conformidade à juris dictio, merecendo proteção, especialmente nos casos em que há
longa linha de decisões que confirmam um precedente originário, tornando bastante improvável a
existência de uma superação.59 Seria um verdadeiro venire contra factum proprium o Judiciário
afirmar que as pessoas devem se comportar de determinada forma e, em seguida, puni-las por terem
agido exatamente da forma por ele determinada. Trata-se de ofensa tão forte à segurança que agride
o próprio Estado de Direito.60
O § 6.º impõe fundamentação adequada e específica para a realização da superação, que deve
seguir as considerações realizadas anteriormente: (i) é preciso que se demonstre a nova norma
estabelecida ou nova orientação como melhor do que a anterior, diante do equívoco desta ou de uma
mudança contextual; (ii) o órgão judicante precisa demonstrar que as razões para a mudança são
mais fortes do que as razões de segurança, que pressionam para a manutenção do precedente; (iii)
caso a mudança seja estabelecida como o caminho correto, o tribunal precisa considerar a existência
de confiança legítima e, sendo o caso, fixar a técnica adequada para sua tutela.61
Problema de menor monta, mas que precisa ser ressaltado, é que o NCPC considera a confiança
legítima como um princípio, o que o faz de forma equivocada. Confiança legítima é um conceito que
O regime jurídico dos precedentes judiciais no Projeto do
Novo Código de Processo Civil
Página 10
representa determinado estado fático no qual incide o princípio da segurança jurídica, determinando
sua tutela.62 Assim, o que se quis dizer, na verdade, foi que o tribunal deve considerar a existência
de confiança legítima como situação fática, para que, por força do princípio da segurança jurídica,
tutele-a, determinando a incidência ou aplicação da nova ratio decidendi apenas a partir de
determinado tempo ou evento.63
Segue-se na análise dos parágrafos do dispositivo, notadamente dedicados a esclarecer a
importante distinção entre ratio decidendi e obiter dictum, agora consagradas legalmente. São eles
os §§ 7.º e 8.º:
“§ 7.º O efeito previsto nos incisos do caput deste artigo decorre dos fundamentos determinantes
adotados pela maioria dos membros do colegiado, cujo entendimento tenha ou não sido sumulado.
§ 8.º Não possuem o efeito previsto nos incisos do caput deste artigo os fundamentos:
I – prescindíveis para o alcance do resultado fixado em seu dispositivo, ainda que precedentes no
acórdão;
II – não adotados ou referendados pela maioria dos membros do órgão julgador, ainda que
relevantes e contidos no acórdão”.
Nos sistemas jurídicos de civil law, justamente por tradicionalmente não se atribuir eficácia
obrigatória aos precedentes, não houve preocupação doutrinária de definir ratio decidendi ou obiter
dictum.64 Isso ocorre no direito brasileiro.65 Todavia, a partir do momento em que se opera com
precedentes, a problematização do que é efetivamente vinculante no precedente passa a fazer
sentido e, assim, a discussão sobre ratio decidendi torna-se uma das mais relevantes. Realmente,
não é possível o funcionamento do stare decisis sem a identificação de qual elemento possui
autoridade no precedente judicial.66
Andou bem o legislador ao não estabelecer qualquer método de definição da ratio decidendi como
correto a priori. Caso o fizesse, tratar-se-ia de dispositivo fadado à ineficácia. A diferenciação entre
ratio decidendi e obiter dictum foi realizada apenas em termos gerais, deixando corretamente à
doutrina o papel de precisar os conceitos.
Uma questão terminológica: perceba-se que o dispositivo menciona, de forma correta, a vinculação
como efeito decorrente da fundamentação no § 7.º, mas os atribui à própria fundamentação no § 8.º.
Trata-se de uma metonímia: o que vincula, na verdade, é a norma decorrente do precedente ou o
elemento determinativo que contém. O precedente é a fonte, é a sua norma que vincula. Nada
obstante, a linguagem justifica-se na tradição, em que comumente fala-se, da mesma forma, em
vinculação à lei, quando o que vincula é a norma dela decorrente, sem quaisquer problemas.
Finalmente, o ponto mais relevante está na percepção do tratamento das súmulas. Há uma
sofisticação no ponto. O dispositivo menciona que a vinculação decorre dos fundamentos
determinantes adotados, tenhameles ou não sido determinados. Ora, o dispositivo busca retirar a
vinculação do texto da súmula e a colocar na fundamentação da decisão que o gerou.
Apesar de o dispositivo ser ineficaz no que toca à súmula vinculante, por sua definição
constitucional, ele é realmente muito importante para a súmula da jurisprudência dos tribunais. Com
efeito, ao se operar mediante o recurso à fundamentação das decisões para determinar o conteúdo
da súmula, fortalece-se a teoria do precedente judicial, em detrimento das súmulas e de seus
enunciados totalizantes.
O dispositivo, portanto, possui um poderoso potencial de modificação na prática das súmulas no
direito brasileiro. Fornecido o material necessário, resta aos aplicadores fazerem um bom uso dele.
O § 9.º trata das distinções. Trata-se de um texto longo que precisa ser compreendido com cuidado.
Consta nele:
“§ 9.º O precedente ou jurisprudência dotado do efeito previsto nos incisos do caput deste artigo
poderá não ser seguido, quando o órgão jurisdicional distinguir o caso sob julgamento,
demonstrando fundamentadamente se tratar de situação particularizada por hipótese fática distinta
ou questão jurídica não examinada, a impor solução jurídica diversa”.
O regime jurídico dos precedentes judiciais no Projeto do
Novo Código de Processo Civil
Página 11
As distinções (distinguishing) são a principal forma de operar com precedentes judiciais, assim como
na legislação os juristas utilizam-se da argumentação a contrario sensu ou da analogia, a fim de
afastar ou atrair o reconhecimento da incidência no caso concreto, a distinção é a forma de evitar ou
trazer a aplicação de um precedente no caso subsequente.67 As distinções consistem na atividade
dos juristas de fazer diferenciações entre um caso e outro.68
A sua previsão legal é supérflua como disposição para a aplicação dos precedentes, porém tem um
importante valor simbólico e didático, levando a que a comunidade jurídica, por força da consagração
na lei, centre suas atenções nos conceitos e técnicas próprios da teoria dos precedentes judiciais.
Importa perceber que, enquanto a superação dos precedentes suscita uma questão de competência,
não podendo ser realizada por todo e qualquer órgão julgador, a distinção pode ser realizada tanto
pelo tribunal do qual emanou o precedente como pelos juízes e tribunais inferiores, vinculados à
norma do precedente. As distinções são o método aplicativo dos precedentes, não se justificando
sua limitação a órgãos específicos – do mesmo modo que é impossível limitar a interpretação da lei a
determinados tribunais ou juízes.
É correto afirmar, portanto, que o método de aplicação dos precedentes é marcado pelas distinções (
distinguishing); conceito de suma importância, pois se trata do mecanismo mais relevante na
concretização do direito jurisprudencial, justamente por ser o que é utilizado com maior frequência.
Nas distinções (distinguishing), o jurista deve operar por meio do raciocínio analógico entre os fatos
do precedente e os do caso presente, identificando quais as diferenças e similitudes, demonstrando
que são substanciais, ou seja, que são juridicamente relevantes. Essa característica da operação
com precedentes faz o processo de sua aplicação essencial e especialmente fundado em analogias,
que moldam e remoldam as normas a partir de cada decisão.69
É relevante perceber, ademais, que é realizada a utilização do termo distinção (distinguishing) em
dois sentidos, um amplo e outro estrito. Distinção em sentido amplo é o processo argumentativo ou
decisional segundo o qual se demonstram diferenças e similitudes entre dois casos, o do precedente
e o subsequente, sob análise. Trata-se do método próprio dos precedentes judiciais.70 Já distinção
em sentido estrito refere-se ao resultado do processo argumentativo, especificamente quando se
chega a efetivamente diferenciar os fatos substanciais do precedente dos do caso seguinte, para
concluir pela não aplicação da ratio decidendi que, a princípio, parecia incidir. Assim, é por meio da
distinção em sentido amplo (processo argumentativo típico dos precedentes judiciais) que se alcança
ou não a distinção em sentido estrito (resultado da argumentação por precedentes no sentido de que
o precedente realmente não é aplicável ao caso concreto, pois há fatos substanciais distintos).
Finalmente, uma questão importante relativa ao dispositivo do NCPC precisa ser analisada com
cuidado.
O texto do dispositivo, buscando ser minudencioso, acabou criando certa confusão. Fala-se que o
juiz ou tribunal, ao realizar a distinção, deverá fazê-lo “demonstrando fundamentadamente se tratar
de situação particularizada por hipótese fática distinta ou questão jurídica não examinada, a impor
solução jurídica diversa”.
Das duas, uma: ou a lei brasileira chamou de distinção a possibilidade de o juízo inferior, com base
em novos argumentos jurídicos, deixar de aplicar o precedente, inovando na teoria dos precedentes;
ou se trata de mera conjugação infeliz de palavras, simplesmente para significar o sentido clássico
de distinção. Parece que a resposta é esta última.
Não é possível que se defenda uma distinção com base em novo argumento jurídico. A distinção é
resultado de uma configuração diferente dos fatos substanciais do caso subsequente. Com efeito, a
existência de um novo argumento pode ser alçada a razão permissiva da superação antecipada no
direito brasileiro, isto é, a possibilidade de órgãos judicantes inferiores superarem um precedente,
independentemente de manifestação da Corte prolatora.71 Muito embora se tenha tal possibilidade
como imprópria e enfraquecedora da teoria dos precedentes, a vontade política tem autonomia e
liberdade para optar por uma configuração desse tipo.
Todavia, não parece que foi isso que o NCPC fez.
O caso é de enunciado diferente que invoque novas questões jurídicas, não abrangidas pelo
precedente judicial obrigatório. Realmente, “questão jurídica não examinada” é, apenas, a
O regime jurídico dos precedentes judiciais no Projeto do
Novo Código de Processo Civil
Página 12
inexistência de precedente que regule a matéria. Sendo assim, invocado precedente que a parte
aduz incidir nos fatos do caso, o magistrado pode demonstrar que se trata de uma questão jurídica
diversa, não abrangida pela ratio decidendi do precedente invocado.
Perceba-se: não é possível que o juiz afaste o precedente por divisar a existência de novo
argumento jurídico, não analisado pelo STJ ou pelo STF, mas pertinente à mesma hipótese fática e à
mesma questão jurídica. Não foi isso que se possibilitou, o que equivale a uma superação
antecipada.
Com efeito, o que se permite é que o juiz afaste o precedente por se tratar de uma questão jurídica
distinta, o que, no mais das vezes, é resultado de alguma diferença fática. Nada obstante, deve-se
notar que é efetivamente possível que, mesmo se tratando dos mesmos fatos substanciais, o
precedente aborde a incidência de norma distinta da que é objeto de discussão no caso
subsequente. Imagine-se, por exemplo, que se invoque precedente que define determinado fato
como ilícito civil para que se alcance a solução de uma demanda subsequente, tratando determinada
conduta como ilícito tributário ou das suas consequências tributárias. O juiz, por uma “questão
jurídica”, estaria autorizado a fazer a distinção.
O dispositivo normativo, portanto, com a pretensão de ser analítico, acabou por ensejar certa
confusão. Não se deve confundir os institutos: ele trata efetivamente de distinção, e não da
possibilidade de superação antecipada de precedente. Ao magistrado é permitido afastar um
precedente que não incide, por tratar de questão jurídica que não equivale à veiculada no
precedente, e nunca afastar um precedente por considerar um argumento novo, não analisado
quando da prolação do precedente, suficiente para esvaziar sua força. Neste último caso, cabe-lhe
apenas ressalvar na decisão sua opiniãopessoal – de muita importância para a reconstrução da
norma jurídica –, todavia, não é permitido que deixe de aplicar o ordenamento jurídico.
Finalmente, colaciona-se para a análise os últimos dois parágrafos, que tratam, respectivamente, da
publicidade e da fundamentação nos precedentes judiciais:
“§ 10. Os tribunais darão publicidade a seus precedentes, organizando-os por questão jurídica
decidida e divulgando-os, preferencialmente, na rede mundial de computadores.
§ 11. O órgão jurisdicional observará o disposto no art. 10 e no art. 499, § 1.º, na formação e
aplicação do precedente judicial”.
Conquanto o dispositivo não o diga expressamente, a publicidade é requisito de eficácia do
precedente judicial. Aliás, ainda que dispusesse de forma contrária, o que não ocorre, tratar-se-ia de
disposição inconstitucional, porquanto só é possível vincular os jurisdicionados a enunciados
normativos que tenham a oportunidade de conhecer, corolário inafastável do direito fundamental à
segurança jurídica e do Estado de Direito.
Só é possível a construção de um sistema de precedentes obrigatórios a partir de instrumentos
eficazes de publicidade das decisões.72 A cognoscibilidade do direito é requisito essencial do
princípio da segurança jurídica e para a concretização do ideal do Estado de Direito, sendo
indispensável que seja possível aos cidadãos conhecer os textos dos quais serão coligidas normas
jurídicas.73 A partir do momento em que se tem a decisão judicial como fonte do direito, é
indispensável inseri-la nesse contexto: do ato judicial será extraída uma norma jurídica que terá
aplicação a todos os jurisdicionados, sendo direito fundamental destes, portanto, tomar
conhecimento apropriadamente do direito que rege suas ações.74
Já o § 11 faz remissão ao dispositivo que trata do contraditório e ao que enuncia os requisitos para
que se considere uma decisão fundamentada. Com os requisitos estabelecidos analiticamente no art.
499, § 1.º, tem-se uma decisão com fundamentos suficientes para a reconstrução adequada da ratio
decidendi. De fato, o NCPC trata com muito cuidado do tema, escamoteado pelos tribunais, que é
um dos mais importantes do direito processual contemporâneo, porquanto é essencial para os
precedentes judiciais, ao constituir o próprio desaguar do contraditório, e, além disso, é onde se dá a
concretização dos princípios e, assim, constitui tema imprescindível para o controle racional da
decisão.
Perceba-se que o dever de fundamentação em sua perspectiva forte, adotada como consequência
do contraditório como influência, faz necessário que o juiz leve em conta os argumentos da parte ao
O regime jurídico dos precedentes judiciais no Projeto do
Novo Código de Processo Civil
Página 13
decidir, sob pena de nulidade.75 Com efeito, a decisão precisa levar em conta todos os argumentos
autônomos levantados pelo sujeito parcial: de nada adianta prever um contraditório forte e, ao final,
possibilitar que o julgador simplesmente desconsidere tudo o que foi aduzido. Ao se inserir o
contraditório como manifestação democrática de influência no ato de poder judicial, impõe-se a
necessidade de observar a regularidade da fundamentação em correspondência direta aos
argumentos utilizados pelos litigantes.76 Além disso, todos os fundamentos para a decisão devem ter
sido oferecidos ao debate das partes.77
De fato, um dos pontos mais importantes para o funcionamento da teoria dos precedentes é a forma
como a decisão judicial é apresentada, isto é, o que é considerado efetivamente cumpridor do
requisito de fundamentação. Deve-se ter em mente que, sem que exista uma adequada
fundamentação das decisões, sequer é possível defender-se uma teoria dos precedentes
obrigatórios. Trata-se de requisito basilar para o funcionamento dos precedentes e do elemento da
decisão mais importante para a compreensão das rationes decidendi.
O art. 522 do NCPC, o último que trata detidamente dos precedentes judiciais, limita-se a decretar
que o incidente de resolução de demandas repetitivas e o julgamento dos recursos especial e
extraordinário repetitivos são considerados casos repetitivos pelo Código. Destaca-se, ademais, em
seu parágrafo único, que o julgamento de casos repetitivos pode ter por objeto tanto questões de
direito material como questões de direito processual.
5. Considerações finais e conclusões
A regulação dos precedentes judiciais, diante desse quadro, foi feita de forma introdutória, pois não
se trata de forma exauriente ou profunda o tema – o que seria um despropósito inescusável e
deletério –, e suficiente, visto que garante todo o arcabouço necessário para que os juristas
construam o stare decisis brasileiro. Ademais, percebe-se que a tratativa foi cautelosa, pois em
nenhum momento fala expressamente de vinculatividade dos precedentes, mas enuncia
imperativamente que os precedentes serão seguidos, invocando um dever de respeitá-los.
Por consequência, pode-se falar que o Projeto do novo Código de Processo Civil inaugura o stare
decisis brasileiro, sendo certo que cabe aos juristas em geral e aos tribunais em especial o seu
desenvolvimento. É certo, boas ferramentas não faltam.
Diversas outras previsões mereceriam destaque, como, e.g., os poderes do relator voltados para a
afirmação dos precedentes, o incidente de resolução de demandas repetitivas, a previsão de
exceção à remessa necessária quando houver entendimento sumulado ou fixado em resolução de
demandas repetitivas e a correta modificação da hipótese de cabimento da ação rescisória,
excluindo-se ofensa à lei e prevendo-se a ofensa à norma jurídica, que pode advir tanto da lei como
do precedente, o novo julgamento liminar pela improcedência, a tutela de evidência, dentre muitos
outros. Todas elas tratam da força dos precedentes em específicas aplicações dos precedentes
judiciais. Caberá à doutrina e à jurisprudência paulatinamente construir e reconstruir o aparato
fornecido pelo NCPC, substancioso para que se alcance o stare decisis brasileiro.
Finalmente, em um apanhado geral do Projeto do novo Código de Processo Civil, percebe-se que se
estabeleceu uma regulação específica dos precedentes judiciais, como deveres gerais, servindo
como forma de concretização da segurança jurídica nas decisões judiciais, e sua tratativa
minudenciosa – que não exclui a possibilidade de complementação. Nesse ponto, o NCPC avançou
bastante, inaugurando tratamento específico dos precedentes judiciais. Todavia, ao regular os
institutos e técnicas específicos, o Projeto de novo Código fica aquém do esperado, outorgando
dignidade especial às súmulas e aos procedimentos abstratos de definição de tese jurídica, o que
afasta os precedentes em sentido estrito, mesmo os mais importantes, das técnicas e institutos de
aceleração do procedimento.
Nada obstante se tratar de uma lastimável perda de oportunidade de afirmar com a devida força a
vontade política de um Judiciário mais coerente, estável e racional, a doutrina e a jurisprudência
podem avançar onde o legislador foi inerme, consagrando também nas técnicas e institutos
analisados o stare decisis brasileiro.
O regime jurídico dos precedentes judiciais no Projeto do
Novo Código de Processo Civil
Página 14
1 CUNHA, Leonardo Carneiro da. O processo civil no Estado constitucional e os fundamentos do
Projeto do novo Código de Processo Civil brasileiro. Revista de Processo, São Paulo: Ed. RT, n. 209,
ano 37, 2012, p. 350-354.
2 Já se concluiu, com base em estudos comparados, que o stare decisis é uma forma de garantir
racionalidade aos sistemas jurídicos, pois garante um incremento de coerência, uniformidade e
integridade na aplicação do direito (BANKOWSKI, Zenon; MACCORMICK, Neil; MORAWSKI, Lech;
MIGUEL, Alfonso Ruiz. Rationales for precedent. In: MACCORMICK, Neil; SUMMERS, Robert S.
(ed.). Interpreting precedents. Aldershot: Ashgate/Dartmouth, 1997. p. 486-487).
3 Geralmente, os precedentes são observados apenas emperspectiva histórica ou retrospectiva, isto
é, ligados ao passado, o que se afigura incompleto, como bem se destacou. Sobre o ponto, cf.
SCHAUER, Frederick. Precedent. Stanford Law Review, vol. 39, 1987, p. 571-605. O jurista
norte-americano preocupa-se em sublinhar a perspectiva voltada para o futuro, isto é, o prisma pelo
qual se olha a decisão do presente como o precedente do futuro, o que serve como guia para o
magistrado. Ressalte-se que Neil Duxbury não concorda integralmente com Schauer. Sua
discordância se dá quanto à existência de uma “obrigação” do magistrado de considerar o futuro,
quando da prolação de sua decisão, justamente por pressupor uma sanção, inexistente no caso.
Conferir, sobre a crítica: DUXBURY, Neil. The nature and authority of precedent. Cambridge:
Cambridge University Press, 2008. p. 4-5.
4 MACCORMICK, Neil. Why cases have rationes and what these are. In: GOLDSTEIN, Laurence
(ed.). Precedent in law. Oxford: Claredon Press, 1987. p. 157. Também destaca o problema,
sobretudo no contexto da utilização cada vez maior dos precedentes no civil law: TARUFFO,
Michele. Processo civil comparado: ensaios. Trad. Daniel Mitidiero. São Paulo: Marcial Pons, 2013.
p. 131. Ressaltando a necessidade de observar a diferença entre conceitos relativos aos
precedentes dos provenientes da perspectiva do caso: MITIDIERO, Daniel. Fundamentação e
precedente – dois discursos a partir da decisão judicial. Revista de Processo, São Paulo: Ed. RT,
ano 37, vol. 206, 2012, p. 75.
5 Nesse sentido: CROSS, Rupert; HARRIS, J. W. Precedent in english law. 4. ed. Oxford: Oxford
University Press. p. 72; MUÑOZ, Martin Orozco. La creación judicial del derecho y el precedente
vinculante. Navarra: Arazandi-Thomson Reuters, 2011. p. 28; TARANTO, Caio Márcio Gutterres.
Precedente judicial. Rio de Janeiro: Forense, 2010. p. 7-8. Aproximadamente: MELLO, Patrícia
Perrone Campos. Precedentes. Rio de Janeiro: Renovar, 2008. p. 63; SANTOS, Evaristo Aragão. Em
torno do conceito e da formação do precedente judicial. In: WAMBIER, Teresa Arruda Alvim (coord.).
Direito jurisprudencial. São Paulo: Ed. RT, 2012. p. 143-145.
6 Sobre eficácia anexa das decisões, ver: SILVA, Ovídio A. Baptista da. Eficácias da sentença e
coisa julgada. Sentença e coisa julgada – Ensaios e pareceres. 4. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006.
p. 88-89; PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Tratado das ações. São Paulo: Ed. RT,
1970. t. I, p. 216-217.
7 “As fontes do Direito põem normas jurídicas. A norma jurídica é, pois, conteúdo da fonte de Direito
por ela enunciada, a fim de determinar seja obrigatória, proibida ou permitida alguma conduta ou
serem especificados certos âmbitos de competência, em dada conjuntura histórica” (COSTA, Adriano
Soares da. Teoria da incidência da norma jurídica. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 2009. p. 29).
8 “Ratio decidendi can mean either ‘reason for the decision’ or ‘reason for deciding’” (DUXBURY,
Neil. The nature and authority of precedent… cit., p. 67).
9 SUMMERS, Robert S. Precedent in the United States (New York State). In: MACCORMICK, Neil;
SUMMERS, Robert S. (ed.). Interpreting precedents. Aldershot: Ashgate/Dartmouth, 1997. p. 370.
10 Aproximadamente: MARINONI, Luiz Guilherme. Precedentes obrigatórios. 2. ed. São Paulo: Ed.
RT, 2011. p. 222-223.
11 Ver, sobre a questão: DUXBURY, Neil. The nature and authority of precedent… cit., p. 59-62.
12 Nesse sentido: MACCORMICK, Neil. Why cases have rationes and what these are… cit., p. 165.
O regime jurídico dos precedentes judiciais no Projeto do
Novo Código de Processo Civil
Página 15
13 Sobre o metodologismo como um formalismo redutivo e deformativo do direito, ver: SALDANHA,
Nelson. Da teologia à metodologia: secularização e crise no pensamento jurídico. Belo Horizonte: Del
Rey, 1993.
14 “Applying lessons of the past to solve problems of the present and future is a basic part of human
practical reason” (MACCORMICK, Neil; SUMMERS, Robert. Interpreting precedents… cit., p. 1.
Igualmente, SCHAUER, Frederick. Precedent… cit., p. 572; BENDITT, Theodore M. The rule of
precedent. In: GOLDSTEIN, Laurence (ed.). Precedent in law. Oxford: Claredon Press, 1987. p. 89. A
ideia aqui adotada segue a linha exposta em: BUSTAMANTE, Thomas da Rosa de. Teoria do
precedente judicial: A justificação e a aplicação de regras jurisprudenciais. São Paulo: Noeses, 2012.
p. 190-205. Assim também: ALEXY, Robert. Teoria da argumentação jurídica. 2. ed. São Paulo:
Landy, 2005. p. 264). Chega-se a afirmar que a importância do precedente está atrelada à natureza
humana, cf. GREY, John Chipman. Judicial precedents. Harvard Law Review, n. 9. 1895-1896, p. 27.
15 Mais precisamente, esse fechamento se dá pelas próprias regras, como bem constrói Marcelo
Neves: “Pode-se dizer que, no processo de concretização normativa, enquanto os princípios jurídicos
transformam a complexidade desestruturada do ambiente do sistema jurídico (valores,
representações morais, ideologias, modelos de eficiência etc.) em complexidade estruturável do
ponto de vista normativo-jurídico, as regras jurídicas reduzem seletivamente a complexidade já
estruturável por força dos princípios, convertendo-a em complexidade juridicamente estruturada, apta
a viabilizar a solução do caso. São dois polos normativos fundamentais no processo de
concretização jurídica, cada um deles se realimentando circularmente na cadeia argumentativa
orientada à decisão do caso. Não há hierarquia linear entre eles. Por um lado, as regras dependem
do balizamento ou construção a partir de princípios. Por outro, estes só ganham significado prático
se encontram correspondência em regras que lhes deem densidade e relevância para a solução do
caso. Essa relação não é harmônica” (NEVES, Marcelo. Entre Hidra e Hércules: princípios e regras
constitucionais. São Paulo: Martins Fontes, 2013. p. XIX-XX). É notável, por outro lado, o importante
papel dos precedentes como referentes normativos para as regras construídas mediante a aplicação
jurisprudencial dos princípios, como reconhece o jurista pernambucano (p. 169).
16 Assim: “Ello se concreta en que cuando ante un órgano jurisdiccional se ofrecen distintas
alternativas jurídicamente razonables para fundamentar la solución de un caso, ya en cuanto la
selección de la fuente normativa, ya en cuanto a la derivación, de dicha fuente, de la norma jurídica
aplicable, dicho órgano sólo podrá elegir aquella alternativa que, en un supuesto esencialmente
iguales, ya fue elegía por una sentencia o sentencias anteriores, constitutivas del precedente o
jurisprudencia vinculante” (MUÑOZ, Martin Orozco. La creación judicial del derecho y el precedente
vinculante… cit., p. 185).
17 Carla Faralli percebeu bem o ponto: “Como una consecuencia de todo esto, los jueces en los
sistemas de civil law tienen que vérselas ahora con problemas similares a los de un judge-made law,
pero sin las características culturales de los paises del common law. La producción legislativa cada
vez más abundante, caótica, continuamente modificada, plagada de fórmulas oscuras de
compromiso, deja abiertos márgenes muy amplios a la ‘creatividad’ del juez” (FARALLI, Carla.
Certeza del derecho o “derecho a la certeza”?. cit., p. 74. Disponível em:
[www3.cirsfid.unibo.it/murst40…/Faralli_new.doc]. Acesso em: 26.02.2014).
18 Como bem coloca Eisenberg, trata-se de uma realidade inevitável, assumam-na ou não os
juristas, estruturem o sistema jurídica em conformidade, ou não. Nas palavras do jurista
estadunidense: “Of course, the judicial establishment of legal rules would occur even if the sole
function of the courts was to resolve disputes. If the courts are to explicate the application, meaning,
and implication of the society’s existing standards in new situations, they cannot simultaneously be
prohibited from formulating rules that have not been previously announced. To begin with, modern
society is in a state of continual change, creating a continual needfor new legal rules to resolve new
issues. Indeed, because of the inevitability of the change, even the application of an old rule to a new
case may constitute a new rule (…). Moreover, even when social conditions have not changed,
previously adopted legal rules must often be discarded because they were wrongly established.
Finally, whether a previously adopted rule covers a given dispute may often depend on the degree of
generality with which the rule was formulated in earlier cases, and that degree is often somewhat
adventitious” (EISENBERG, Melvin Aron. The nature of the common law. Cambridge: Harvard
O regime jurídico dos precedentes judiciais no Projeto do
Novo Código de Processo Civil
Página 16
University Press, 1991. p. 5-6).
19 A questão da criatividade no direito é complexa e padece de um déficit de precisão conceitual em
sua abordagem, dependendo da perspectiva que se adota (assim, MARINONI, Luiz Guilherme.
Precedentes obrigatórios… cit., p. 97). Com “criação” pretende-se significar que se chega
institucionalmente a determinada norma jurídica que pode ser racionalmente atribuída aos elementos
normativos fornecidos anteriormente, mas ainda assim até então inexistente de forma expressa. É
também claro que a constituição, a modificação e a extinção do direito realizadas pelo juiz possuem
limites, que são impostos pelo próprio ordenamento jurídico e que a criação judicial do direito não
significa uma inovação completa, a partir do nada. O direito é construído e reconstruído sempre em
determinado contexto histórico-social, do qual o intérprete não pode se alienar: a norma é gota de
tinta em um copo, e sua cor é assumida em conformidade ao todo. Em interessante passagem do
Sistema, Pontes de Miranda, tendo isso em mente, acaba por dizer que não há atos criativos do
direito: o direito é processo social de adaptação e é forjado pela e na própria sociedade, ao legislador
ou ao juiz cabe reconhecê-lo. A interessante e misteriosa passagem conta com uma analogia
surpreendente: para Pontes, o jurista não cria o direito assim como o arquiteto nada cria,
simplesmente reordena e combina os elementos encontrados na natureza para lhes dar o aspecto de
novo: constrói. Não há aí criação, pois toda substância era anterior ao ato, novidade só há na forma
como se organizou e na função que se deu. O tema é extremamente complexo e sua tratativa
adequada requereria uma pesquisa à parte, que não é o objeto deste trabalho. De toda forma, o
sentido de criação em Pontes não é o mesmo que aqui é utilizado: quer-se dizer com o termo o
reconhecimento de norma jurídica que até então não era reconhecida institucionalmente. Pode-se
dizer que se utiliza, nessa tese, um sentido fraco ou superficial de criação, enquanto Pontes utiliza o
termo em sentido forte ou profundo. Sobre isso, ver, dentre outras passagens, expressamente:
PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Sistema de ciência positiva do direito. 2. ed. Rio de
Janeiro: Borsoi, 1972. t. I, p. 83-84. Ver sobre o tema, com base em estudo comparado, a análise
em: TARUFFO, Michele. Institutional factors influencing precedents. In: MACCORMICK, Neil;
SUMMERS, Robert S. (ed.). Interpreting precedents. Aldershot: Ashgate/Dartmouth, 1997. p.
458-460.
20 Sobre a segurança: BANKOWSKI, Zenon; MACCORMICK, Neil; MORAWSKI, Lech; MIGUEL,
Alfonso Ruiz. Rationales for precedent… cit., p. 487. Quanto à igualdade: MACCORMICK, Neil.
Rhetoric and the rule of law. Oxford: Oxford University Press, 2005. p. 143. Na teoria da
argumentação destaca-se o precedente judicial como corolário da universalidade, representada
juridicamente especialmente pela igualdade, cf. ALEXY, Robert. Teoria da argumentação jurídica…
cit., p. 265. Acerca da eficiência: CARDOZO, Benjamin Nathan. Nature of judicial process. New
Haven: Yale University Press, 1960. p. 149; FARBER, Daniel A. The rule of law and the law of
precedents. Minnesota Law Review, vol. 90, 2006, p. 1.175.
21 É o que se dá, atualmente, com as súmulas vinculantes. No ponto: “O que há aí é um
renascimento (se é que entre nós houve uma morte) dos postulados da escola da exegese, da
crença oitocentista na clareza do texto e mais, no poder racionalizador do mesmo: crê-se que as
Súmulas Vinculantes, por serem Súmulas, tornam ‘claro’ o sentido (verdadeiro) da norma e,
acredita-se que, por serem Vinculantes, impediriam qualquer outra interpretação” (BAHIA, Alexandre
Gustavo Melo Franco. As súmulas vinculantes e a nova escolada da exegese. Revista de Processo,
São Paulo: Ed. RT, ano 37, vol. 206, 2012, p. 364). No mesmo sentido: ABBOUD, Georges. Súmula
vinculante versus precedentes: notas para evitar alguns enganos. Revista de Processo, São Paulo:
Ed. RT, ano 33, vol. 165, 2008, p. 224-226; SILVA, Ovídio A. Baptista da. A função dos Tribunais
Superiores. Sentença e coisa julgada. 4. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 299.
22 “Observe-se, por outro lado, que o estilo de julgamento, no âmbito do common law, é
caracterizado pela ‘autorreferência’ jurisprudencial. Na verdade, pela própria técnica do precedente
vinculante, impõe-se, na grande maioria das vezes, a exigência de que a corte invoque, para acolher
ou rejeitar, julgado ou julgados anteriores. Em outras palavras, a fundamentação de uma decisão
deve, necessariamente, conter expressa alusão à jurisprudência de tribunal superior ou da própria
corte” (TUCCI, José Rogério Cruz e. Parâmetros de eficácia e critérios de interpretação do
precedente judicial. In: WAMBIER, Teresa Arruda Alvim (coord.). Direito jurisprudencial. São Paulo:
Ed. RT, 2012. p. 105).
23 “Here, it seems, we discover the real meaning of ‘binding precedent’: courts might not be bound to
O regime jurídico dos precedentes judiciais no Projeto do
Novo Código de Processo Civil
Página 17
follow the earlier decision of (usually) superior courts on the same facts but, when confronted with
such decisions, they are obliged to deal with them somehow” (DUXBURY, Neil. The nature and
authority of precedent… cit., p. 109).
24 ALEXY, Robert; DREIER, Ralf. Precedent in the Federal Republic of Germany. In:
MACCORMICK, Neil; SUMMERS, Robert S. (ed.). Interpreting precedents. Aldershot: Dartmouth,
1997. p. 30-31.
25 BENDITT, Theodore M. The rule of precedent… cit., p. 97.
26 CUNHA, Leonardo Carneiro da. O processo civil no Estado constitucional e os fundamentos do
Projeto do novo Código de Processo Civil brasileiro… cit., p. 350-354.
27 Brasil – Congresso Nacional. Senado Federal – Anteprojeto do Novo Código de Processo Civil.
Brasília: Senado Federal, 2010, p. 14.
28 Idem, p. 17.
29 Nesse sentido: CUNHA, Leonardo Carneiro da. O processo civil no Estado constitucional e os
fundamentos do Projeto do novo Código de Processo Civil brasileiro… cit., p. 353.
30 Apontando que, quando há decisão, gera-se precedente: MACCORMICK, Neil; SUMMERS,
Robert. Interpreting precedents… cit., p. 1. É importante notar que, nada obstante toda decisão gere
um precedente, nem todo precedente gerado possui eficácia obrigatória ou eficácia persuasiva
significante. Isso se dá, inclusive, porque, para que exista a obrigação de seguir um determinado
precedente, é preciso que um caso análogo subsequente apresente-se, diante do aspecto relacional
característico dos precedentes obrigatórios. Nesse sentido: BANKOWSKI, Zenon; MACCORMICK,
Neil; MARSHALL, Geoffrey. Precedent in the United Kingdom. In: MACCORMICK, Neil; SUMMERS,
Robert S. (ed.). Interpreting precedents. Aldershot: Ashgate/Dartmouth, 1997. p. 323; LARENZ, Karl.
Metodologia da ciência do direito. 5. ed. Lisboa: Calouste Gulbenkian, 2009. p. 611.
Aproximadamente: TUCCI, José Rogério Cruz e. Precedente judicial como fonte do direito. São
Paulo: Ed. RT, 2004. p. 11-12; TARUFFO, Michele; LA TORRE, Massimo. Precedent in Italy. In:
MACCORMICK, Neil; SUMMERS, Robert. Interpreting precedents. Aldershot: Ashgate/Dartmouth,
1997. p. 151. O fato de um precedente, entretanto, não possuir caso análogo não o exclui

Mais conteúdos dessa disciplina