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1 EPIDEOMIOLOGIA CLÍNICA Monitoria Epidemiologia clínica: “(…) é a ciência que faz predições sobre pacientes individuais utilizando a contagem de eventos clínicos em grupos de pacientes semelhantes e valendo-se de métodos científicos sólidos para garantir que as predições sejam corretas [e com mínimos vieses]” (Fletcher, 2007,p. 21). I. Introdução Base conceitual da epidemiologia: • Epidemiologia descritiva: descreve o evento/estuda a distribuição dos eventos considerando a tríade: tempo, pessoa e lugar. Responde as questões: o que? quando? como? • Epidemiologia analítica: busca os fatores determinantes dos eventos/correlaciona o evento (faz associação). Responde a questão: por que? Propõe a geração de hipóteses explicativas ou relações de causalidade entre uma exposição e um desfecho. Conceitos iniciais: • População – é o conjunto de unidades de análise definido por uma (ou mais) característica em comum. • Amostra – subconjunto representativo, ou seja, conjunto de indivíduos retirados de uma população, a fim de que seu estudo possa fornecer informações importantes sobre aquela população. 2 II. Causalidade e risco A causa de uma doença ou agravo à saúde é um evento, condição, característica ou uma combinação desses fatores que desempenham um papel importante no desenvolvimento de um desfecho em saúde (Bonita, 2006, p.83); - Evento (A) que precede o desfecho (B) de forma frequente, sendo este (A) consistente em intensidade e magnitude; Causa suficiente X Causa necessária • Causa necessária – causa que sem a qual a doença não pode ocorrer/se desenvolver Ex: doenças infecciosas • Causa suficiente – agem em conjunto para provocar uma doença e, se tirar algum fator, a doença ainda assim ocorre Fatores de risco que favorecem o processo de infecção e desenvolvimento da doença. • A doença pode ter uma causa necessária associada a causas suficientes. • Uma causa suficiente geralmente possui diversos componentes; • Em geral, a causa necessária é um destes componentes; • Nas doenças infecciosas sempre há uma causa necessária; • Dificilmente se conhecem todos os componentes das causas suficientes – principalmente, quando se discute uma doença crônica. Ex: Doze horas após um almoço de família, várias pessoas que estiveram presentes deram entrada na emergência de um Hospital Geral com quadro de diarréia e dor abdominal aguda. Alguns indivíduos manifestaram febre. Sentindo a necessidade de investigar mais sobre o evento, os médicos colheram informações sobre o tipo de alimentação que os pacientes ingeriram durante o almoço. Dentre elas, identificou-se uma sobremesa cremosa e uma salada de maionese e frango. Suspeitou-se, por fim, que se tratava de uma intoxicação alimentar por Salmonella. Pergunta-se: Quais são as causas necessárias e suficientes do caso? 3 Logo: • A expressão fator de risco (RR ↑1) é utilizada para descrever fatores que estão associados ao risco (probabilidade) de desenvolvimento da doença, mas que não são suficientes para ocasioná-las; • A expressão fator de proteção (RR ↓1) é utilizada para descrever fatores que estão associados a redução do risco (/probabilidade) de desenvolvimento de determinado evento; 4 III. Estudos observacionais Em um conjunto qualquer de processos, fatos ou fenômenos, podemos identificar 2 categorias de propriedades: as Constantes e as Variáveis. • Constantes - são exibidas por todos os elementos do conjunto de igual forma e, na verdade, foram tomadas como critérios para delimitar conjuntos homogêneos a partir de elementos esparsos. • Variáveis - determinam a maneira pela qual os elementos de qualquer conjunto são diferentes entre si. Utilizadas para atribuir valores aos dados observados. Classificação das variáveis: Quantitativas: Expressas em valores numéricos ou quantitativos, expressam intensidade, frequência, extensão, dimensão, etc. Se divide em: Contínuas – Características mensuráveis que assumem valores em uma escala contínua (na reta real), para as quais valores fracionais fazem sentido. Usualmente devem ser medidas através de algum instrumento. Ex.: peso (balança), altura (régua), tempo (relógio), pressão arterial, idade. Descontínuas (discretas) – características mensuráveis que podem assumir apenas um número finito ou infinito contável de valores e, assim, somente fazem sentido valores inteiros. Geralmente são o resultadode contagens. Ex.: número de filhos, número de bactérias por litro de leite, número de cigarros fumados por dia. Qualitativas: Expressam diferenças substanciais de qualificação. Utilizadas para representaçãode atributos. Ex.: Sexo, local de residência, Ocupação, Raça/Cor, etc. Se divide em: Qualitativa Categórica: empregada para representar categorias ou classes. Ex: Cor dos olhos, sexo, etc. Qualitativa Ordinal: empregada nas situações em que se presume a necessidade de uma ordem, crescente ou decrescente dos resultados. Ex: Grau de escolaridade, categoria salarial, etc. 5 Tipologia dos Desenhos de Investigação em Epidemiologia: Tipologia dos estudos: • Estudos observacionais: Permitem que a natureza determine o seu curso: o investigador mede, mas não intervém sobre o objeto de pesquisa. Não há controle sobre a exposição, só observação. • Estudos experimentais: Também chamados de estudos de intervenção, envolvem a tentativa de controlar / mudar os determinantes de um fenômeno / doença (ex. Tratamento). – Dois grupos são comparados em relação ao fator (tratamento/exposição) que está sendo estudado. Ex.: Um grupo recebe o tratamento e o outro uma terapia alternativa ou placebo. Estudos transversais: • Os estudos transversais ou seccionais medem a prevalência de determinado agravo em determinado momento e, por isso, também podem ser denominados “estudos de prevalência”; • São estudos relativamente baratos e de fácil condução, por meio de um instrumental de coleta de dados primários; • São úteis na investigação de exposições que são características individuais fixas, tais como aspectos socioeconômicos; • Servem também no delineamento de perfis epidemiológicos e, com isso, nas necessidades 6 populacionais. • Respeitados os princípios de validade, este desenho possibilita a generalização de dados para populações similares gera hipóteses explicativas Falácia atomística: • Consiste em conclusões / inferências extraídas de relações no nível individual, refletindo as relações contextuais – de nível macro. • Em se tratando de estudos “particularistas” deve-se ter cuidado para não praticar inferências que incorram nesta falácia; Estudos ecológicos: • Estudo no qual as unidades de observação são as populações ou grupos de pessoas, ao invés de indivíduos; • Estes grupos tomam a forma de uma área definida geograficamente Estado, cidade, setor censitário; • São estudos mais baratos e com coleta de dados mais rápida utilizam as medidas agregadas presentes nos sistemas de informações (ex.: Datasus, IBGE) • Servem para avaliar o papel do contexto social e ambiental na determinação da saúde - medidas coletadas no nível individual muitas vezes não são capazes de refletir adequadamente os processos que ocorrem nonível coletivo (efeitos indiretos) Exemplo: desigualdade social maior mortalidade • Servem para gerar ou testar hipóteses etiológicas explicar a ocorrência do constructo, levando em consideração os efeitos contextuais; 7 • Possibilitam três tipos de mensurações ecológicas: A) Medidas agregadas: medidas resumo de observações feitas em indivíduos (% fumantes, renda média) B) Medidas ambientais: características físicas do lugar onde a população vive C) Medidas globais: atributos de grupos, lugares e organizações (legislação, desorganização social, etc) Falácia ecológica: • Consiste em conclusões / inferências extraídas de relações no nível macro, refletindo as relações contextuais – de nível individual. 8 IV. Estudos de coorte • Longitudinal, observacional e individuado; • Os estudos de coorte também se preocupam com as relações de risco e, por isso¸com as inferências causais; • São estudos prospectivos, onde o pesquisador seleciona um grupo de pessoas a priori saudáveis, classificando-os em dois subgrupos – um exposto a determinado evento e o outro não exposto; • O investigador acompanhará os dois subgrupos durante um período de tempo comparando o desenvolvimento do desfecho de interesse em ambos – caminha no tempo • Estudos prospectivos, sai da exposição no presente e investiga a possível doença (desfecho) no futuro; • Risco: Probabilidade de ocorrer um evento; Interpretando o Risco Relativo 9 • RR = 1 – Indica que a taxa de incidência da doença nos grupos de expostos e não expostos são idênticas indicando que não há associação observada entre exposição e doença. • RR > 1 – Indica associação positiva ou risco aumentado entre os expostos ao fator estudado em relação aos não expostos. • RR < 1 – Indica que há uma associação inversa ou um risco diminuído entre os expostos ao fator estudado é o chamado fator de proteção. 10 V. Estudo do tipo Caso Controle • Observacional, longitudinal e individuado; • Este tipo de estudo se desenvolve a partir da comparação de um grupo de indivíduos com a presença de um fenômeno/evento com um outro grupo de referência sem a presença da variável desfecho; • Avaliamos a probabilidade ou chance de exposição entre casos e os não casos (controles); • A investigação parte do EFEITO para chegar às CAUSAS; • Sai do presente com a doença e investiga a exposição no passado; • Pesquisa RETTROSPECTIVA; • Odds Ratio (OR): compara a proporção de expostos entre os casos com a proporção de expostos entre os não casos; – sempre vê a exposição! 11 VI. Validade, confiabilidade e vieses • Validade = palavra derivada do latim “validus” = forte; • Estudo válido = estudo cujos resultados passam uma mensagem forte; • Estudo livre de erros (desenho, implementação ou análise de dados); Conceitos: • Validade interna: diz respeito ao grau no qual os resultados obtidos na amostra faz inferência na população que deu origem a amostra. • Validade externa: é a extensão na qual os resultados de um estudo são aplicados para pessoas que não participam dele. A validade interna é necessária e mais fácil de ser alcançada mas não garante a validade externa. • Inferência estatística – o objetivo é fazer afirmações a partir de um conjunto de valores representativo (amostra) sobre um universo (população), assume-se que a população é muito maior do que o conjunto de dados observados, a amostra. 12 Validade X Confiabilidade: • Validade: “O que foi medido é o que realmente se pretendia medir?” – PRECISO • Confiabilidade: “A medida pode ser reproduzida por outras pessoas?” – REPRODUTÍVEL Exemplo de confiabilidade: Se utilizarmos o mesmo instrumento em um mesmo paciente, excluídas as condições de variações de uma segunda medição, obteríamos o mesmo resultado, mesmo com examinadores diferentes – reprodutibilidade/ confiabilidade • Uma medida por ser confiável, mas não ser válida. • Ela também pode ser válida, mas não ser confiável. Acaso X Viés: • Acaso (erro aleatório): não interfere na medida final – desvia a média bidireccionalmente; Quanto maior a amostra, menor será o efeito da variação aleatória (acaso), e a medida será mais próxima da verdadeira. - Ou seja, para reduzir o acaso, eu aumento a amostra! • Viés (erro sistemático): desvia a média unidirecionalmente, interferindo no resultado. Está associado ao método e não a amostra! 13 Os erros derivados de um viés não desaparecem com o aumento do tamanho da amostra! KAPPA: • É um teste de concordância INTER e INTRA-observadores (ou integridade) amplamente utilizado, que corrige por concordância o acaso. • Trata-se de um método estatístico para avaliar o nível de concordância ou reprodutibilidade entre dois conjuntos de dados. • É considerado uma dado conservador, portanto, sempre que possível deve ser utilizado. • É bastante utilizado para avaliar a reprodutibilidade de questionários em fase de validação. • O Teste Kappa, é um teste conservador, muitas vezes optase por reportar o Erro Padrão do mesmo. • Para situações raras de acontecer (ou patologias raras) o teste Kappa tende a subestimar o nível de concordância. 14 •Kappa expressa a extensão pela qual a concordância observada excede a que seria esperada pelo acaso (numerador), relativo ao que os observadores poderiam esperar em melhorar suas concordâncias (denominador); • Landis e Koch (1977) classificam os diferentes níveis de concordância (ou reprodutibilidade) conforme mostra tabela a seguir: Tipos de vieses • Viés de seleção: relacionado a forma como os sujeitos foram selecionados. A medida de associação estimada no estudo está distorcida devido ao modo pelo qual os indivíduos são selecionados para compor a população de estudo • Viés de informação: relacionado a forma como a informação foi coletada. A medida de associação estimada no estudo está distorcida devido a erros na forma como a informação sobre a exposição e/ou doença é obtida. • Confundimento ou Situação de Confusão: ocorre quando parte do efeito observado de um fator de exposição resulta da presença de uma ou mais variáveis, que estão relacionadas tanto com a doença sob estudo quanto com a exposição de interesse na base populacional. Esta(s) variável(is) é(são) denominada(s) variável(is) de confundimento, confundidora(s), ou de confusão. A situação de confusão ocorre devido a uma inerente falta de comparabilidade entre populações expostas e não-expostas no que diz respeito aos riscos de adoecer. Os seis pilares na sequência de construção de um estudo epidemiológico: 15 • Validade conceitual: modelo teórico é o primeiro recorte da realidade e tem o objetivo de representar o que se pretende dela extrair. A partir da sua construção, o pesquisador organiza suas idéias em relação ao processo de causação ou determinação da doença/agravo. Além disso, o modelotorna coerentes as indagações de pesquisa, interpretação dos dados e, em última instância, o direcionamento dos achados, identificando os interlocutores precípuos que deles usufruirão. • Validade operacional: estabelecimento de pontes entre o conhecimento empírico (conhecimento adquirido através da observação. É uma forma de conhecimento resultante do senso comum, por vezes baseado na experiência, sem necessidade de comprovação científica) e o quadro teórico (está diretamente relacionado com a pesquisa e, portanto, com a ciência) busca e decisão sobre o instrumental (metodológico/aferição). - Consiste na redução do modelo teórico para o operacional, consistindo em: 1. Escolha do instrumental para captação dos constructos; 2. Uma dimensão Um ou MAIS instrumentos 3. Avaliação da adequação dos instrumentos; OU 4. Elaboração de um novo instrumental Pesquisadores experientes Adaptação transcultural Avaliação das propriedades psicométrica • Validade de domínio: Identificação do contexto do estudo Abrangência inferencial (usam uma amostra aleatória dos dados coletados de uma população para descrever e fazer inferências sobre a população. As estatísticas inferenciais são valiosas quando não é conveniente ou possível examinar cada membro de uma população inteira). - Estudos Particularistas x Abstratos: nos estudos "particularistas", as relações de ocorrência se restringem a uma população específica, ou seja, os resultados da pesquisa não se prestam a generalizações. O domínio do estudo é restrito a priori e a base é formada levando isto em consideração. No desenho de estudos "abstratos", a população fonte das informações está sendo utilizada apenas para captar as relações de ocorrência em geral e não as relações específicas àqueles indivíduos do estudo ou à população que estes representam. Neste tipo de investigação, o domínio do estudo transcende a população fonte. 16 • Validade de comparação: pressupõe-se que haja validade de comparação quando o grupo de não expostos tiver a capacidade de predizer o que teria ocorrido com os expostos, caso estes não fossem expostos. Esta visão assume explicitamente o preceito contrafactual de intercambialidade dos grupos de exposição. Podemos encontrar: Viés de seleção - Também denominado de viés de amostragem; -Um erro no instante da seleção poderá trazer resultados enviesados e, por vezes, anular a consistência dos dados. Exemplos: • Viés da Operação de Amostragem: quando a amostragem pode resultar em uma amostra não- representativa (ex. cadastro da unidade) ou tamanho da amostra insuficiente; • Viés de Auto-seleção: vários motivos fazem com que pessoas se coloquem a disposição para serem incluídas na investigação (“viés do voluntariado” ou “viés do trabalhador sadio”); • Viés das Perdas: ocorrência de substancial proporção de perdas por morte, não-respostas, mudança de endereço, desinteresse, falta de registros adequados, entre outros motivos de abandono, com maior frequência em um dos estratos 17 • Viés de Hospitalização (ou de Berkson): ocorre quando uma população de um hospital ou instituição de saúde pode diferir da população em geral ou de um grupo controle (socioeconômica, patologias privilegiadas). • Viés de Afiliação: pode ocorrer quando são escolhidos para estudo grupos de pessoas com nível de saúde diferente da população em geral: atletas, profissionais selecionados com exames pré-admissionais (viés do “trabalhador sadio”) • Viés de informação: processo de coleta das informações (aferição). Podemos encontrar: Viés de Aferição / Informação / Observação • Viés do Observador: ocorre quando há diferenças sistemáticas na coleta de dados, imputadas ao observador, como: procedimentos de entrevistas e de exame não padronizados, registro de dados incompletos. • Viés da Suspeita Diagnóstica: distorção que ocorre quando se sabe ou se suspeita do verdadeiro estado do indivíduo observado. (coorte: procura-se mais a doença nos expostos; caso-controle: procura-se mais exposição nos casos) • Viés do Instrumento de Coleta de Dados: um instrumento inadequado ou defeituoso confere aos dados coletados valores mais altos ou mais baixos, produzindo um quadro distorcido da realidade. • Viés da forma de Detecção: ocorre em estudos comparativos quando no grupo de estudo é utilizado um instrumento de aferição e no grupo controle um outro instrumento. (diagn. hospitalar X comunidade) • Viés de Recordação (ou de Memória): ocorre em estudos que obtém dados retrospectivamente, onde os indivíduos com a doença tem mais facilidade de recordar situações de exposição. (uso 18 • Viés de Falsa-Resposta (ou Não-Aceitação): ocorre quando indivíduos negam condições embaraçosas ou “invasivas” (drogadição, violência familiar) • Validade de especificação do modelo estatístico: processamento e análise dos dados. IMPORTANTE: Lidando com o Confundimento • Ele ocorre devido a não comparabilidade entre os grupos exposto e não exposto em relação ao risco de adoecer (rompe com a teoria contrafactual). • Outros fatores de risco que não o estudado podem estar presentes em um dos grupos, tornando- os não comparáveis. Estratégias para lidar com o Confundimento • Estratégias preventivas (controle no desenho): – Randomização: seleção aleatória. Tendência a balancear variáveis de confusão conhecidas e desconhecidas! (especialmente em grandes casuísticas) – Restrição: critérios de exclusão. Limitar a população a uma categoria/nível da variável de confusão. – Pareamento: estratégia de seleção de participantes de forma a garantir que a distribuição da potencial variável de confundimento tenha distribuição similar nos grupos de comparação. Introduz automaticamente um Viés de Seleção. Estratégias analíticas (Controle na Análise dos Resultados): – Estratificação: compara-se o valor da medida de efeito de interesse (p.ex., o odds ratio) levando-se em consideração o potencial fator de confundimento (odds ratio ajustado) em cada estrato da variável de confusão. Se diferentes, há confundimento. 19 – Análise multivariada: os possíveis fatores de confusão devem ser listados, com base na revisão da literatura, no modelo teórico e no modelo de análise. Deve-se testar então a associação entre cada fator e a exposição e a doença. Se houver qualquer indício de associação (digamos, p<0,20 ou RR>1,5) com a exposição e também com a doença, o fator deve ser considerado como suspeito e incluído na análise multivariada. 20 VII. Testes diagnósticos • Diagnóstico: processo de decisão clínica baseado de forma consciente, ou não, em uma probabilidade de se estabelecer o fenômeno de ocorrênca; • Neste sentido, é fácil perceber que o estabelecimento de um diagnóstico é um processo, muitas das vezes, imperfeito. Ele resulta em uma probabilidade, ao invés de uma certeza de se estar correto; • Testes diagnósticos podem expressar os seguintes resultados: Acurácia: • É a proporção de acertos (verdadeiros positivos e verdadeiros negativos) em relação a amostra estudada. Classificação: Muito alta: ≥ 0,90 Alta: 0,70 ≤ Ac <0,90 Moderada: 0,50 ≤ Ac < 0,70 Baixa: < 0,50 21 Padrão-ouro:• Padrão-ouro ou padrão de acurácia ou ainda padrão de referência. É o teste que traz uma indicação mais sólida da verdade sobre a doença – presença ou ausência Ex: estudos anatomopatológicos. • A escolha de um outro teste que não seja o padrão-ouro é realizado seguindo alguns critérios fundamentais: – Menor custo; – Menor invasão; – Conveniência pela simplicidade; – Balanceamento entre os riscos de erro de classificação e os benefícios. Sensibilidade e especificidade: • Sensibilidade: proporção de pessoas com a doença e que têm um teste positivo. Capacidade do teste em captar os positivos entre os doentes. Um teste altamente sensível dificilmente deixará de identificar indivíduos que realmente tem a doença. • Especificidade: proporção de indivíduos sem a doença que têm um teste negativo Capacidade do teste em captar os negativos entre os não doentes. S E 22 • Testes sensíveis são úteis nos estágios iniciais de um processo diagnóstico, quando diversas possibilidades podem ser consideradas. Geralmente são mais baratos, mais simples e com menos riscos para o paciente (são testes de rastreamento/Screening); - RASTREAMENTO! • Testes específicos são úteis para “confirmar” um diagnóstico que tenha sido sugerido por outros dados. Um teste específico raramente acusará positividade na ausência da doença. – CONFIRMAÇÃO DE DIAGNÓSTICO! • A Sensibilidade e a Especificadade sofrem um contrabalanço. Geralmente (mas, nem sempre): ↑S ↓E e ↓S ↑E • Para o clínico, o dilema é determinar se o paciente tem ou não a doença, dados os resultados de um teste. • Neste caso, utiliza-se os resultados dos valores preditivos. Valor Preditivo: • O Valor Preditivo responde à pergunta: “se o resultado do teste do paciente for positivo (ou negativo), qual é a probabilidade dele ter (ou não ter) a doença? • Valor Preditivo Positivo (VPP): é a probabilidade de ter a doença em um paciente com um resultado positivo (anormal) do teste; 23 • Valor Preditivo Negativo (VPN): é a probabilidade de não ter a doença em um paciente com um resultado negativo (normal) do teste; • O VPP indica o quanto o clínico pode ficar mais confiante que um resultado positivo confirme a doença. Geralmente é influenciado pela especificidade. • O VPN indica o quanto o clínico pode ficar mais confiante de que um resultado negativo possa descartar a doença investigada. • O Valor Preditivo é determinado pela sensibilidade e especificidade do teste e pela prevalência da doença na população testada. Valor Preditivo e suas relações com a prevalência: • Quanto menor a prevalência do evento, menor será o VPP e maior será o VPN; • Quanto maior a prevalência, maior será o VPP e menor será o VPN; • Portanto, quanto maior o conhecimento da doença e também dos riscos aos quais o sujeito está exposto, maior será a probabilidade de acertos no uso de um teste, principalmente, no diagnóstico! IMPORTÂNCIA DA SEMIOLOGIA! VPP VPN 24 VIII. Ensaio Clínico • Estudo experimental, ou seja, estudos em que o pesquisador manipula o fator de intervenção. • São experimentos epidemiológicos que tem por objetivo investigar os efeitos de uma intervenção; • Os indivíduos são selecionados e alocados em dois grupos comparáveis, a saber: – a. Grupo da intervenção (ou nova intervenção); – b. Grupo dos controles (placebo ou padrão ouro). • Feito isso, ambos os grupos são avaliados e os desfechos comparados. Fases dos Estudos de Intervenção: Fase I. Farmacologia clínica e toxicidade (Estudos de segurança) Objetivo: Avaliar a segurança da droga. Determinar o metabolismo e identificar a Dose Máxima Tolerada (DMT). População: voluntários sadios ou pacientes. Avalia a segurança. Fase II. - Investigação clínica inicial (Estudos pequenos) Objetivo: O medicamento em investigação é administrado a um número maior de pessoas que apresentam uma doença ou condição em particular para avaliar adicionalmente a sua segurança e frequentemente para avaliar a sua eficácia. População: Voluntários doentes Avalia a segurança e a eficácia. 25 Fase III. Avaliação do tratamento em larga escala (Ensaio clínico randomizado) Objetivo: Um número grande de pessoas com a doença ou condição apropriada participam desses estudos. O medicamento em investigação passa por testes adicionais para determinar a sua segurança e a sua eficácia, monitorar efeitos colaterais indesejáveis e compará-lo aos tratamentos comumente usados ou a um placebo. População: Estudo de grande porte. Expõe o indivíduo ao experimento. Avalia a segurança, eficácia e os efeitos colaterais. Fase IV. Vigilância pós-aprovação (pós-comercialização) Objetivo: Efeitos adversos, raros ou a longo prazo. São os estudos realizados depois que um medicamento se torna disponível para prescrição, com a intenção de se obter informações adicionais sobre os riscos, os benefícios e o uso de um medicamento. Precisa aumentar a amostra para identificar os efeitos raros e longo prazo. Alocação ao tratamento: • O processo de randomização tem por objetivo alocar os pacientes nos grupos de tratamento com maior segurança de comparação em relação aos fatores de risco ou de prognóstico – tanto aqueles conhecidos quanto os desconhecidos. – É UMA MEDIDA DE CONTROLE! • A probabilidade de produzir grupos comparáveis aumenta com o tamanho da amostra!!! Principais formar de randomização: • Simples: a mais empregada, na qual os participantes são colocados diretamente nos grupos de estudo e controle, sem etapas intermediárias. Por exemplo, com o uso de uma tabela de números aleatórios, os ímpares vão para o tratamento e os pares para o controle. • Blocos: caracteriza-se pela formação de blocos de número fixo de indivíduos, de igual tamanho, dentro dos quais são distribuídos os tratamentos em questão, bloco por bloco, até que termine o processo de alocação dos participantes da pesquisa. 26 • Pareada: inicialmente são formados pares de participantes e a alocação aleatória é feita no interior do par, de tal forma que um indivíduo receba o tratamento em estudo e o outro o controle. • Estratificada: são formados inicialmente estratos e a alocação aleatória é feita dentro de cada estrato. Ex.: hospital, gravidade da doença, sexo, idade, etc. – Subgrupos dentro daquele grupo. • Por minimização: usa-se inicialmente a randomização simples; após alguns indivíduos terem sido alocados, as características dos grupos são analisadas e os cálculos são refeitos à medida que novos participantes são recrutados, os quais serão colocados em um dos grupos de modo a diminuir as diferenças porventura detectadas ou para manter o equilíbrio já alcançado. Outras medidas de controle: • Mascaramento / Cegamento: objetivo de reduzir os vieses de aferição; – não sabe o que está tomando. Pode ser duplo cego ou triplo cego. • Uso de placebo* • Ensaios tipo cruzados (crossover trials): o mesmo indivíduo participa do grupo de intervenção e do grupo controle em momentos diferentes. – Em um momento faz o uso do placebo e em outro utiliza o medicamento em teste. Medidas de efeito: 27 Interpretando as medidas de efeito: • Risco Relativo (RR): Trata-se de um efeito de proteção/risco. O riscodo grupo tratado equivaleu a ____ % do risco do grupo controle. • Redução Relativa do Risco (RRR) – (Eficácia): A intervenção reduziu em ____ % o número de desfechos em relação ao grupo controle. • Redução Absoluta do Risco (RAR): A intervenção reduziu em ____ % a ocorrência do desfecho em relação a todos os indivíduos submetidos à intervenção. • Número Necessário para tratar (NNT): É necessário tratar ____ indivíduos para se ter 1 melhora. (ou outro evento positivo) 28 IX. Ensaios Comunitários: Programas de Intervenção em Saúde Pública e a conceituação dos estudos: 1. Programas de intervenção em saúde pública: iniciativas que visam modificar uma determinada situação de saúde; – Características dos programas: preventivos ou curativos; – Diferentes tipos de intervenção: produto biológico, modificações ambientais e programas educativos; 2. Ensaios comunitários: são experimentos em que aglomerados de indivíduos são alocados às intervenções; • Nos eventos dependentes existem dois tipos de efeitos (ex. vacinas): - Efeitos diretos: efeitos protetores sobre o indivíduo que recebe a vacina; - Efeitos indiretos: decorrentes da alteração no nível de transmissão do agente infeccioso na população em função de um programa (Herd Immunity); Razões de uso: • A própria natureza da intervenção requer implementação em nível comunitários; • Conveniência operacional; 29 • Considerações éticas; • Aumento da adesão; • Evitar contaminação entre os grupos de intervenção; • Estimar os efeitos indiretos da intervenção. Vantagens: • Permite estimar efeitos diretos, indiretos e totais das intervenções; • Avalia efetividade de intervenções no contexto real; • Desenho fatorial para avaliar interação entre as intervenções. Limitações: • Não é o método de escolha para avaliar eficácia; • Problemas de generalização; • Aspectos metodológicos ainda em desenvolvimento; • Contaminação / dependência espacial; • Problemas éticos. Exemplo de desenho do Estudo: • Objetivo: avaliar se a utilização de colares impreganos com inseticida em cães protege crianças de infecção por Leishmania chagasi; • Métodos: 18 vilas foram pareadas segunda prevalência de infecção préintervenção e alocadas aleatoriamente para receber: 1) colar impregnado a serem colocados em cães; 2) Nenhuma intervenção. • Desfechos: 1) Soroconversão das crianças >1 ano (OR 0.57) 2) Conversão do teste de Montenegro (OR 0.66) 3) Soroconversão canina (OR 0.46)