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SEBENTA 
 
 
 
 
FISIOLOGIA I 
 
 
 
 
 
 
BERNARDO MANUEL DE SOUSA PINTO 
FACULDADE DE MEDICINA DA UNIVERSIDADE DO PORTO 
 
2011/2012 
Bernardo Manuel de Sousa Pinto ❖Faculdade de Medicina da Universidade do Porto 
Fisiologia I 
2 
 
Índice 
Músculo esquelético……………………………………………………………………...………………4 
Considerações mecânicas e bioquímicas relativas ao processo de contracção muscular………12 
Músculo liso visceral e vascular…….…………………………………………………………………17 
Músculo cardíaco.…………………………….……………...……………………………....…………24 
Actividade eléctrica cardíaca………………………………..….…………….…………...……….......30 
Electrocardiograma……………………...…………………………………...…………………………36 
Ciclo cardíaco.…………………………..………………………..……………………………...………49 
Determinantes da função sistólica…………………...…………………...…………..………….……55 
Determinantes da função diastólica……………………….………...………………...……...………65 
Débito cardíaco e retorno venoso…..……………….……...………………………...……….………71 
Circulação direita. Papel fisiopatológico do ventrículo direito…..…………………………..……78 
Fisiopatologia da isquemia do miocárdio……………..………………...………………….………..82 
Fisiopatologia da insuficiência cardíaca……………………………….………….………….………87 
Hemodinâmica e hemorreologia……….…………...………..…………………………..…...….……93 
Regulação da pressão arterial……….…………………………………….……………..……………96 
Regulação da função vascular………………………...………….………...…………………...……103 
Circulações especiais………………………………………………...………………………...………113 
Microcirculação e vasos linfáticos…………………………………………………..……….………119 
Hematopoiese………………..……………………………………..…...……………...……....………134 
Cinética do ferro……………………………………..……...…….........................…………...………140 
Hemóstase primária………………………………………...…….........................…………...………142 
Hemóstase secundária……………………...………………………..……………….….…....………147 
Fibrinólise…………………………..…………..………………………………………..…....…..……153 
Transdução de sinal a nível celular..………………………………………..……...…...……………156 
Sistema nervoso autónomo…………..……………………………………….………………..……..164 
Regulação da temperatura corporal……….....……………………………………….………….…170 
Ventilação pulmonar……………...……………………...………….……......................…….………178 
Ventilação………………………………………….......…………….…………………………...….…195 
Bernardo Manuel de Sousa Pinto ❖Faculdade de Medicina da Universidade do Porto 
Fisiologia I 
3 
 
Perfusão…….………………………...…………………………...……………....…...…….……….…204 
Trocas gasosas………………………………………………………………………...…....…………..220 
Transporte de gases.………….....…………….……………………..………...………………...….…233 
Regulação da ventilação pulmonar………………...…………………………………….….………245 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Estão incluídos nesta sebenta, resumos de Fisiologia I da Faculdade de Medicina da Universidade do 
Porto acompanhados por ilustrações e esquemas. Desde já agradeço a quem me ajudou na elaboração da 
sebenta, através da correcção de eventuais erros inicialmente presentes, ou através de ideias e sugestões. 
Bom trabalho e votos de sucesso nos exames, 
Bernardo M. Sousa Pinto 
Bernardo Manuel de Sousa Pinto ❖Faculdade de Medicina da Universidade do Porto 
Fisiologia I 
4 
 
Músculo esquelético 
Existem muitas classificações possíveis para os músculos. Contudo, funcionalmente, o mais habitual é 
classificar o músculo como sendo esquelético, cardíaco ou liso. O músculo esquelético é estriado e 
voluntário, enquanto o músculo cardíaco é estriado e involuntário. Por fim, o músculo liso é não-
estriado e involuntário. O facto de o músculo cardíaco e o músculo liso serem involuntários, significa 
que a sua actividade depende da acção do sistema nervoso autónomo. 
 
Fibras musculares 
Os músculos são constituídos por conjuntos 
de fascículos, que por sua vez, são grupos 
de fibras musculares. Cada fibra muscular 
corresponde a uma célula muscular 
esquelética, sendo estas células 
normalmente de grandes dimensões e 
multinucleadas. Cada fibra muscular é 
constituída por múltiplas miofibrilas, cuja 
unidade funcional é o sarcómero. 
Ao nível das fibras musculares, os organelos 
adquirem nomes diferentes dos aplicados 
às restantes células. Dessa forma, o citoplasma passa a ser designado por sarcoplasma, a membrana 
celular é denominada de sarcolema e o retículo citoplasmático é designado por retículo 
sarcoplasmático. 
O retículo sarcoplasmático 
encontra-se na periferia das 
fibras musculares, rodeando-
as, e tem a capacidade de 
libertar cálcio, aquando da 
contracção muscular, e de o 
recapturar, aquando do 
relaxamento muscular. 
Próximo do retículo 
sarcoplasmático encontramos 
invaginações do sarcolema, as 
quais são designadas por 
túbulos T, cujo interior 
corresponde a espaço 
extracelular. As porções do 
1. Fisiologia muscular 
Bernardo Manuel de Sousa Pinto ❖Faculdade de Medicina da Universidade do Porto 
Fisiologia I 
5 
 
retículo sarcoplasmático mais próximas dos túbulos T são designadas por cisternas terminais, 
correspondendo aos locais onde ocorre a libertação de cálcio, algo fundamental para que possa ocorrer 
a contracção muscular. Já as porções longitudinais do retículo sarcoplasmático são contínuas com as 
cisternas terminais e estendem-se ao longo de toda a extensão do sarcómero. Estas porções contêm 
uma grande densidade de ATPase de cálcio (uma bomba de cálcio), algo que se revela fundamental para 
a recaptura de cálcio ao nível do retículo sarcoplasmático e, consequentemente, para o relaxamento 
muscular. 
Ao conjunto de um túbulo T e das suas duas cisternas terminais adjacentes dá-se o nome de tríade, 
sendo que, nos mamíferos, existem ao nível do músculo esquelético duas tríades por sarcómero 
(presentes ao nível da junção entre as bandas I e A). Já ao nível do músculo cardíaco, regista-se a 
presença de uma tríade por sarcómero, nomeadamente ao nível da banda Z. 
Sarcómero 
O sarcómero é a estrutura que se 
encontra por entre duas linhas Z. 
Consequentemente, estas linhas 
unem dois sarcómeros adjacentes. Ao 
nível do sarcómero encontramos dois 
tipos de miofilamentos – os 
miofilamentos grossos (também 
designados, de forma menos correcta 
por miofilamentos de miosina, devido 
ao facto de serem constituídos 
principalmente por miosina) e os 
miofilamentos finos (também 
designados, de forma menos correcta por miofilamentos de actina, devido ao facto de serem 
constituídos, sobretudo por actina). 
Para além da linha Z é ainda possível discriminar a presença de outras bandas no sarcómero. A banda I 
corresponde ao local onde apenas se encontram presentes miofilamentos finos, enquanto, por 
oposição, a banda H corresponde ao local onde apenas existem miofilamentos grossos. A banda H está 
incluída na banda A, que corresponde aos locais de sobreposição dos miofilamentos grossos com os 
miofilamentos finos e de presença exclusiva de miofilamentos grossos. Por fim, ao local onde os 
miofilamentos grossos se unem dá-se o nome de linha M, que corresponde à zona central do 
sarcómero. Esta linha inclui proteínas de importância vital para a organização e alinhamento dos 
miofilamentos grossos, ao nível do sarcómero. 
Os miofilamentos finos têm um comprimento de 1 μm, enquanto os miofilamentos grossos têm um 
comprimento de 1,6 μm. Isto implica forçosamente que o comprimento mínimo do sarcómero será de 
1,6 μm, pois desta forma, o miofilamento grosso não “bate” na linha Z, nem se regista a interdigitação 
dos miofilamentos finos, algo que seria impeditivo do normal funcionamento do sarcómero. Apesar 
disso, os valores para o comprimento óptimo do sarcómero encontram-se no intervalo entre os 2 e os 
2,2 μm. 
Apenas pode ocorrer contracção muscular, quando se verifica à partida a presençade sobreposição 
entre miofilamentos grossos e finos. Se no músculo esquelético, a distensão muscular é limitada pela 
presença das inserções ósseas do músculo, no músculo cardíaco poderia teoricamente ser registada 
uma distensão de tal maneira, que os miofilamentos grossos e os miofilamentos finos deixassem de se 
encontrar sobrepostos. Todavia, tal não acontece, devido à acção da titina. Esta molécula, que é a maior 
Bernardo Manuel de Sousa Pinto ❖Faculdade de Medicina da Universidade do Porto 
Fisiologia I 
6 
 
do organismo, ancora os miofilamentos grossos à linha Z e, ao fazê-lo, regula as propriedades elásticas 
do músculo estriado, impedindo assim que se registe o estiramento excessivo do músculo cardíaco. 
Outra particularidade da titina prende-se com o facto de esta proteína acumular energia, aquando da 
contracção muscular, e libertar energia, aquando do relaxamento muscular. 
 
Miofilamentos 
Os miofilamentos finos são 
predominantemente constituídos 
por uma dupla hélice de F-actina 
(actina filamentar), sendo esta, 
um polímero de G-actina (actina 
glomerular). Ao longo do 
miofilamento fino regista-se 
igualmente a presença de 
nebulina, uma proteína que participa na regulação do comprimento deste tipo de miofilamento. Ao 
nível dos miofilamentos finos encontramos também dímeros de tropomiosina, que se estendem sobre 
todo o filamento de actina, cobrindo os locais de ligação à miosina das moléculas de actina (dessa 
forma, quando o músculo se encontra relaxado, a tropomiosina bloqueia a contracção muscular, ao 
impedir que a actina se ligue à miosina). Cada dímero de tropomiosina encontra-se sobre os “sulcos” 
formados pela dupla hélice de actina, estendendo-se sobre sete moléculas de actina. 
Em cada dímero de tropomiosina é possível encontrar um complexo de troponina, constituído por três 
subunidades (troponina T, troponina C e troponina I) – a troponina T liga-se à tropomiosina, a troponina 
I liga-se à actina (facilitando a inibição da ligação da miosina à actina), enquanto a triponina C se liga ao 
ião cálcio. 
Já o miofilamento grosso é, sobretudo, constituído por miosina. A miosina é formada por um par de 
cadeias pesadas e dois pares de cadeias leves. As cadeias pesadas formam no seu N-terminal uma 
estrutura globular, a qual é designada por cabeça. Essa porção é responsável pela interacção com a 
actina, tendo igualmente capacidade de 
hidrolisar ATP (ou seja, actividade de ATPase). 
Já as cadeias leves estão associadas com a 
secção da cabeça da miosina – as cadeias 
leves alcalinas participam na estabilização da 
região da cabeça, enquanto as cadeias leves 
reguladoras, regulam a actividade de ATPase 
da miosina. A actividade das cadeias leves 
reguladoras, por sua vez, é regulada por 
fosforilação operada por cínases dependentes 
e independentes de cálcio. 
 
Bernardo Manuel de Sousa Pinto ❖Faculdade de Medicina da Universidade do Porto 
Fisiologia I 
7 
 
Alinhamento das cabeças de miosina 
Quando se observa um sarcómero em corte transverso, depreende-se com uma estrutura de grosso 
modo hexagonal, na medida em que cada miofilamento fino se encontra rodeado por três 
miofilamentos grossos e que cada miofilamento grosso se encontra rodeado por três finos. Como num 
mesmo plano (ou seja num “corte transverso”) encontramos três filamentos grossos, concluímos que 
num mesmo plano, cada cabeça de miosina dista 120º da seguinte. Se atendermos agora a uma 
organização tridimensional, constatamos que uma cabeça de miosina dista 14,3 nm da cabeça que se 
encontra no plano adjacente (ou seja, dois planos contendo cabeças de miosina distam 14,3 nm um do 
outro). Contudo, as cabeças de miosina nestes dois planos adjacentes não se encontram alinhadas – elas 
fazem um ângulo de 40º entre si. Dessa forma, uma cabeça de miosina dista 43 nm da cabeça de 
miosina mais próxima que com ela se encontra perfeitamente alinhada (ver cálculos e esquema em 
baixo): 
 
 
 
 
 
 
 
 
 . 
 
Acoplamento excitação/contracção 
As fibras musculares são inervadas por neurónios motores somáticos, cujos corpos celulares se 
encontram no corno anterior da espinal medula. Uma unidade motora é entendida como o número de 
fibras musculares inervadas por um mesmo neurónio, registando-se unidades motoras menores, 
sobretudo ao nível dos músculos que efectuam movimentos mais precisos (tais como os músculos da 
laringe), enquanto as unidades motoras maiores predominam em músculos cujas acções não requerem 
Bernardo Manuel de Sousa Pinto ❖Faculdade de Medicina da Universidade do Porto 
Fisiologia I 
8 
 
tanta delicadeza (tais como os músculos posturais). Contudo, num mesmo músculo existem unidades 
motoras de diferentes dimensões. 
Os neurónios motores, que inervam as fibras musculares, libertam acetilcolina, que interage com 
receptores nicotínicos (um tipo de receptores colinérgicos), que se encontram acoplados a canais de 
sódio dependentes do ligando, levando à génese de um potencial pós-sináptico excitatório que, caso 
atinja o limiar da excitabilidade, se converte num potencial de acção. 
Este potencial chega até ao 
sarcolema, sendo inclusive 
transmitido aos túbulos T. Os 
túbulos T apresentam canais de 
cálcio do tipo L (canais esses que 
são passíveis de ser inibidos por di-
hidropiridinas), que são sensíveis à 
voltagem e se encontram em 
íntimo contacto com os canais 
rianodínicos das cisternas 
terminais do retículo 
sarcoplasmático. Ora, aquando de 
um potencial de acção, a 
despolarização da membrana 
induz a abertura dos canais de 
cálcio do tipo L (por via de 
alterações conformacionais) e, 
subsequentemente, devido a um 
acoplamento mecânico entre os 
dois tipos de canal, os canais 
rianodínicos (também designados 
por canais libertadores de cálcio) 
do retículo abrem e o cálcio 
abandona as cisternas terminais do retículo sarcoplasmático, sendo libertado para o sarcoplasma, algo, 
essencial para a ocorrência de contracção muscular. Este processo descrito é designado por 
acoplamento excitação/contracção. É importante referir que no músculo cardíaco, contrariamente ao 
que se passa no músculo esquelético, parte do cálcio que entra para o sarcoplasma é proveniente do 
meio extracelular. 
Em termos de duração temporal, o potencial de acção 
apresenta uma duração mais longa no músculo cardíaco, 
comparativamente ao músculo esquelético e, como tal, o 
período refractário é maior. Ao potencial de acção, segue-
se a libertação de cálcio pelo retículo sarcoplasmático, 
sendo que mal a concentração de cálcio atinge o seu valor 
máximo no sarcoplasma, este ião começa logo a ser 
recapturado para o retículo sarcoplasmático (contudo, após 
ser libertado, uma parte importante destes iões ficou ligada 
à troponina C, algo essencial para a ocorrência de 
contracção muscular). Mesmo assim, só passados alguns 
milissegundos é que o músculo se começa a contrair.Isto 
significa que num abalo muscular isolado, quando é 
Bernardo Manuel de Sousa Pinto ❖Faculdade de Medicina da Universidade do Porto 
Fisiologia I 
9 
 
atingida a força máxima pelas fibras musculares, já não se verifica a presença da concentração máxima 
de cálcio no sarcoplasma (cuja manutenção seria capaz de activar a contracção muscular na sua 
plenitude). 
Activação das pontes cruzadas pelo cálcio 
O cálcio que entretanto foi 
libertado para o 
sarcoplasma liga-se à 
troponina C. Esta apresenta 
quatro locais de afinidade 
para o cálcio – dois de 
maior afinidade, que se 
encontram sempre ligados 
ao cálcio, e dois de menor 
afinidade, que se 
encontram ciclicamente 
ligados ao cálcio, 
nomeadamente quando há 
libertação de cálcio pelo 
retículo sarcoplasmático. 
A ligação do cálcio à 
troponina C leva a uma 
alteração na conformação 
do complexo de troponina, 
o que está associado ao 
afastamento da troponina I do filamento de actina/tropomiosina e a um maior “afundamento” da 
tropomiosina nos “sulcos da dupla hélice” da actina (por via da troponina T). Este movimento da 
tropomiosina permite a exposição dos locais de ligação da miosina (na molécula de actina), o que 
permite a interacção entre os filamentos de actina e os filamentos de miosina, algo que resulta na 
contracção do sarcómero. 
Bernardo Manuel de Sousa Pinto ❖Faculdade de Medicina da Universidade do Porto 
Fisiologia I 
10 
 
De referir que, a concentração crítica de cálcio no sarcoplasma para que se inicie a activação do 
aparelho contráctil é de 10-7 molares, sendo que a concentração de 10-5 molares de cálcio corresponde a 
uma situação de activação máxima do aparelho contráctil. 
Ciclo das pontes cruzadas 
Durante o ciclo das pontes cruzadas, as proteínas contrácteis do músculo convertem a energia 
resultante da hidrólise do ATP em energia mecânica e, como tal, este processo é a base molecular que 
possibilita a génese de força e movimento nas fibras musculares. 
Foi já descrito como é que a miosina se liga à actina, contudo, caso a miosina ficasse sempre ligada à 
actina, o músculo permaneceria rígido e contraído. Isto é o que se verifica nas primeiras horas que 
decorrem após a morte de um indivíduo (rigor mortis), até começar a ocorrer necrose e putrefacção. De 
facto, a actina tem muita afinidade para a miosina e a ligação que estas estabelecem é muito forte, 
sendo necessária a presença de ATP para “desligar” a miosina da actina. Ora, num indivíduo morto não 
há produção de ATP e, como tal, a actina permanece ligada à miosina e os músculos mantêm-se 
contraídos (para além do ATP ser necessário para que ocorra a dissociação do complexo actina-miosina, 
esta molécula também é essencial que o cálcio volte para o interior do retículo sarcoplasmático). 
Dessa forma, o primeiro passo do ciclo das pontes cruzadas consiste na ligação de uma molécula de ATP 
à cabeça de miosina (que forma um ângulo de 45º com o filamento de actina). Isto permite a 
dissociação do complexo actina-miosina, por diminuição da afinidade entre os dois filamentos. 
Bernardo Manuel de Sousa Pinto ❖Faculdade de Medicina da Universidade do Porto 
Fisiologia I 
11 
 
A cabeça de miosina opera então a hidrólise de ATP, passando a descrever um ângulo recto com o 
filamento de actina. Isto está associado a um aumento da afinidade entre o filamento de actina e o 
filamento de miosina - a cabeça de miosina liga-se então a uma nova posição do filamento de actina, 
formando-se uma ponte cruzada. 
Segue-se a libertação do fosfato inorgânico (resultante da hidrólise do ATP), que se encontrava ligado à 
molécula de miosina, o que leva a nova alteração conformacional da cabeça de miosina (que passa a 
descrever de novo um ângulo de 45º com o filamento de actina) e a um consequente deslizamento do 
filamento de actina no sentido da cauda da miosina, o que gera força e energia. 
Finalmente, ocorre a libertação do ADP (resultante da hidrólise do ATP) que ainda permanecia ligado à 
molécula de miosina - o complexo de actina-miosina volta ao estado rígido inicial, para que uma nova 
molécula de ATP se possa ligar à cabeça da miosina. 
De referir que, numa mesma fibra muscular, as pontes cruzadas não se encontram sempre na mesma 
fase, isto permite que haja sempre pontes cruzadas que se encontrem num estado rígido, que actuam 
“sustendo a força gerada” (de modo análogo a indivíduos que se encontrem a suster uma corda, de 
modo a impedir o seu movimento). É igualmente importante lembrar que a velocidade de contracção 
muscular depende da velocidade de degradação de ATP, ou seja da velocidade da acção ATPásica da 
cabeça de miosina, algo que é regulado pelas cadeias leves reguladoras da miosina. 
Acoplamento inactivação-relaxamento 
O processo principal associado à expulsão de cálcio do sarcoplasma requer a presença de uma bomba 
de cálcio do tipo SERCA (uma cálcio/ATPase), que opera o transporte activo do cálcio para o retículo 
sarcoplasmático, contra o gradiente de concentração. Contudo, a actividade da bomba de cálcio do tipo 
SERCA é inibida por concentrações elevadas de cálcio livre ao nível do lúmen do retículo 
sarcoplasmático. Como forma de evitar essa inibição, o cálcio presente no retículo sarcoplasmático liga-
se à calreticulina e a calsequestrina (estas proteínas têm uma elevada afinidade para este ião), 
registando-se assim também a diminuição da 
sua osmolaridade naquele organelo, o que 
permite minimizar os gastos energéticos para o 
transporte de uma maior quantidade deste ião. 
Alternativamente, parte do cálcio pode ser 
igualmente expulsa para o meio extracelular. A 
célula pode, então, enviar o cálcio para o meio 
extracelular, quer através de um trocador 
sódio/cálcio (este antiporter é designado por 
NCX), quer através de uma bomba de cálcio 
presente na membrana celular (esta é 
designada por PMCA e acopla a saída de cálcio 
e a entrada de um protão para o sarcoplasma, 
com a hidrólise de ATP). Contudo, esta não é a 
forma preferencial de remoção de cálcio do 
sarcoplasma, na medida em que, caso todo o 
cálcio do sarcoplasma fosse removido para o 
meio extracelular, registar-se-ia uma depleção 
nas reservas celulares de cálcio. 
Bernardo Manuel de Sousa Pinto ❖Faculdade de Medicina da Universidade do Porto 
Fisiologia I 
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Considerações mecânicas e bioquímicas relativas ao processo de 
contracção muscular 
A força total gerada por um músculo corresponde à soma das forças geradas por muitas pontes 
cruzadas cíclicas de actina-miosina. O número de pontes cruzadas que ocorrem em simultâneo depende 
substancialmente do comprimento inicial da fibra muscular e do padrão ou frequência da estimulação 
das fibras musculares. Quando a contracção muscular é estimulada, o músculo exerce uma força, que 
tende a aproximar a origem e a inserção muscular – esta força é designada por tensão. 
A tensão muscular registada antes da contracção muscular é designada por tensão passiva, sendo esta 
influenciada pela pré-carga à qual está submetido o músculo. A pré-carga é a carga que se impõe ao 
músculo antes de este se contrair. O aumento da pré-carga leva igualmente a um aumento do 
comprimento do músculo e do sarcómero (tal como acontece quando adicionamos um peso a um 
elástico de borracha – o elástico estica), o que é determinante para influenciar as propriedades activas 
do músculo, caso este seja subsequentemente estimulado (como tal, a pré-carga influencia 
directamente a tensão passiva e, indirectamente, a tensão activa). 
Quando a contracção muscular é estimulada, desenvolve-se uma tensão adicional através dos ciclos das 
pontes cruzadas – a tensão activa (a tensão muscular total correspondeao somatório da tensão passiva 
com a tensão activa). A pós-carga influencia o músculo depois de este se começar a contrair, na medida 
em que esta oferece resistência ao encurtamento do músculo. De referir que quanto maior a pós-carga, 
maior a dificuldade de contracção muscular, pois o músculo precisa inicialmente de força para vencer a 
resistência da pós-carga aplicada e só depois se pode encurtar. 
Contracção isotónica e contracção isométrica 
Existem dois grandes 
tipos de contracção 
muscular concêntrica – 
aquando de uma 
contracção isotónica, 
uma das duas fixações 
musculares é móvel e, 
como tal, a estimulação 
permite uma redução 
do comprimento 
muscular (pois a tensão 
aplicada pelo músculo é 
superior à aplicada pela 
carga). Como esse encurtamento ocorre com carga constante, verifica-se a manutenção do tónus 
muscular. Se o encurtamento do músculo se verificar na ausência de pós-carga, presencia-se uma 
contracção isotónica pura (algo que apenas é presenciado em condições experimentais), enquanto 
numa contracção isotónica pós-carregada, o comprimento do músculo diminui, mas este primeiro tem 
de vencer a resistência oferecida pela pós-carga. 
Já a contracção isométrica está associada a uma imobilidade dos pontos de fixação muscular (e, como 
tal, o comprimento do músculo não varia), havendo somente uma variação na tensão muscular (tónus), 
aquando de uma estimulação. Este tipo de contracção verifica-se quando o músculo não consegue 
vencer a resistência da pós-carga que lhe é imposta e, como tal, não se consegue encurtar. 
Bernardo Manuel de Sousa Pinto ❖Faculdade de Medicina da Universidade do Porto 
Fisiologia I 
13 
 
No que concerne à velocidade de 
encurtamento do músculo, aquando 
de uma contracção isotónica, esta é 
tanto menor, quanto maior for a 
pós-carga aplicada, até que, a partir 
de um determinado valor de 
resistência oferecida pela pós-carga, 
o músculo não se consegue encurtar 
e a passa a ser registada uma 
contracção isométrica. Contudo, é 
importante referir que não importa 
por quanto é ultrapassada a 
capacidade de o músculo se encurtar 
– o músculo entra em contracção 
isométrica, independentemente do 
facto de a resistência oferecida pela 
pós-carga ser 0,1 ou 100% superior! 
É igualmente importante salientar 
que a velocidade de contracção 
máxima (situação teórica de pré-
carga e pós-carga nulas) é a mesma 
para qualquer que seja o 
comprimento de músculo, mas que 
à medida que se aumenta a pós-
carga, um sarcómero cujo 
comprimento inicial seja menor que 
óptimo tem menor capacidade de 
vencer a resistência oferecida pela 
pós-carga. 
Numa contracção isométrica, como 
já foi referido, existe uma relação 
entre a tensão passiva e o 
comprimento muscular (e do 
sarcómero), sendo essa relação de 
natureza exponencial (a tensão 
passiva depende do comprimento 
muscular). Contudo, numa 
contracção isométrica existe 
também uma relação entre o comprimento do sarcómero e a tensão activa desenvolvida pelo músculo. 
Esta tensão é máxima (Lmax), em sarcómeros que apresentem um comprimento óptimo (em sarcómeros 
cujo comprimento se situa entre 2 e 2,2 μm, apresentam melhores interdigitações entre os 
miofilamentos). Sarcómeros com valores de comprimento superiores aos “valores óptimos” registam 
uma área cada vez menor de interdigitações entre os miofilamentos finos e grossos (até que, quando 
deixa de haver interdigitações, a tensão activa desenvolvida passa a ser nula e toda a tensão registada 
corresponde à tensão passiva verificada), enquanto sarcómeros com valores de comprimento inferiores 
registam uma sobreposição cada vez maior entre os miofilamentos finos e uma proximidade cada vez 
maior entre o miofilamento grosso e a linha Z, o que reduz também a tensão activa produzida. 
Bernardo Manuel de Sousa Pinto ❖Faculdade de Medicina da Universidade do Porto 
Fisiologia I 
14 
 
Como o comprimento do sarcómero influencia quer a tensão activa, quer a tensão passiva, pode-se 
dizer que o grau de encurtamento do músculo também varia com o grau de tensão passiva. 
Trabalho e rendimento 
O trabalho realizado ( ) quer aquando contracção isométrica, quer aquando de uma contracção 
isotónica pura, é nulo, sendo que apenas realizam trabalho as contracções isotónicas pós-carregadas. O 
trabalho realizado é passível de ser descrito pela fórmula: 
 
Ora, como numa contracção isotónica pura a força aplicada na contracção ( ) é nula e numa contracção 
isométrica, o deslocamento ( ) é nulo (porque não há variação no comprimento muscular), o trabalho é 
nulo em ambas as situações. 
Como as contracções isotónicas pós-carregadas são as únicas que desempenham trabalho, estas são as 
únicas contracções em que se pode registar o rendimento (potência). Nas contracções isotónicas puras 
e nas contracções isométricas, o rendimento é nulo. Ao nível das contracções isotónicas carregadas, o 
rendimento aumenta inicialmente à medida que se aumenta a carga, sendo máximo quando se atinge 
entre 30 a 40% do pico de tensão necessário para se passar a registar uma contracção isométrica. 
Contracções excêntricas 
As contracções isotónicas são contracções concêntricas, na medida em que se regista um encurtamento 
do músculo, quando este se contrai. Contudo, existem também contracções excêntricas, nas quais se 
verifica um aumento do comprimento muscular na sequência de uma contracção. A título de exemplo, 
quando um indivíduo se encontra a descer escadas, os músculos da região anterior da perna encontram-
se contraídos, mas o seu comprimento aumenta. De referir que as contracções excêntricas são 
registadas frequentemente, quando as cargas associadas são muito elevadas. 
Quer aquando de uma contracção isotónica, quer aquando de uma contracção isométrica, registam-se 
gastos de ATP, devido à ocorrência de ciclos de pontes cruzadas (sendo a velocidade desses ciclos, e, 
como tal, o gasto de ATP, maior nas contracções isotónicas). Todavia, nas contracções excêntricas, 
praticamente não há gastos de ATP – o que se verifica é que ocorre uma contra-rotação adicional do 
filamento de miosina sobre o de actina, seguida de deslizamento. Dessa forma, a contracção excêntrica 
é sempre levada a cabo à conta de estiramento muscular e, por isso, na sequência de contracções 
excêntricas regista-se uma grande frequência de lesões musculares por estiramento (até porque a 
tensão passiva imposta nestes músculos é maior). 
Tétano muscular 
Se em vez de presenciarmos um abalo muscular isolado, aplicarmos um novo estímulo às fibras 
musculares, antes de estas relaxarem completamente, compreendemos que o cálcio volta aos seus 
valores máximos no sarcoplasma, antes de ser completamente recolhido. Quando esta situação ocorre, 
o segundo potencial de acção consegue atingir maior tensão isométrica com o primeiro, na medida em 
que a tensão associada ao segundo estímulo é somada à que ainda restava do primeiro (este efeito é 
designado por sumação). 
Aumentando agora a frequência dos estímulos, de tal modo que os múltiplos estímulos, no seu 
somatório, aumentem significativamente a tensão desenvolvida, podemos obter duas situações – caso a 
frequência dos estímulos não seja ainda suficiente para evitar que o cálcio seja constantemente 
recapturado e recolhido (ainda que parcialmente), presenciamos um estado de tétano imperfeito. 
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Fisiologia I 
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Contudo, quando a frequência dos estímulos é de tal ordem, que se regista uma manutenção dos níveis 
máximos de cálcio no sarcoplasma, presenciamos uma situação de tétano perfeito. Neste estado, osestímulos individuais são indistinguíveis uns dos outros, tal a proximidade temporal com que ocorrem. 
 
Em suma, a quando os potenciais de acção são aplicados a maior frequência, a tensão gerada é maior. 
Esse aumento da tensão muscular gerada, por via do aumento da frequência da estimulação muscular, é 
designado por somatório de frequências. 
Metabolismo muscular e tipos de fibras musculares 
A hidrólise de ATP é fundamental para que possa ocorrer o processo de contracção muscular. As 
reservas de ATP disponíveis do músculo e a conversão de ADP em ATP com concomitante conversão da 
fosfocreatina em creatina fornecem ATP de forma imediata, contudo, o ATP disponibilizado por estas 
vias, apenas consegue manter a contracção muscular durante alguns segundos. 
A glicólise, por sua vez, é um processo que permite obter ATP de forma rápida. Contudo, este é um 
processo anaeróbio e cujo rendimento energético é baixo, ao qual acresce o facto de, recorrendo à 
glicólise, as reservas de glicose se esgotarem rapidamente. Por seu turno, a fosforilação oxidativa é um 
processo aeróbio que permite um maior rendimento energético, sendo teoricamente ilimitado, caso 
seja atingido um equilíbrio entre o oxigénio e a glicose que entram para as fibras musculares e o tempo 
que decorre durante a fosforilação oxidativa. 
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As fibras com grande capacidade de levar a cabo a fosforilação oxidativa, designadas fibras oxidativas 
lentas (fibras musculares do tipo I), como necessitam de uma maior quantidade de oxigénio, exprimem 
uma proteína adicional, a mioglobina, uma proteína similar à hemoglobina, mas que apresenta mais 
afinidade para o oxigénio. A presença de mioglobina confere uma cor avermelhada às fibras oxidativas 
lentas, que têm um menor diâmetro, pois o processo de difusão (que é necessário para o transporte de 
nutrientes) é mais eficaz para distâncias menores. É fácil perceber que as fibras oxidativas lentas 
predominam nos músculos posturais e estão mais desenvolvidas em atletas de resistência, como os 
maratonistas. 
Por outro lado, as fibras glicolíticas rápidas (fibras musculares do tipo II B) adquirem o seu ATP, 
sobretudo, através da glicólise. Estas fibras não apresentam mioglobina, tendo um aspecto mais pálido e 
sendo mais abundantes no ser humano, em comparação com as fibras musculares do tipo II A. De referir 
que estas fibras predominam nos músculos fásicos e que se encontram particularmente desenvolvidas 
nos atletas que desempenham grandes esforços num curto período de tempo, tais como os corredores 
de curtas distâncias ou os levantadores de peso. 
Por fim, as fibras oxidativas rápidas (fibras musculares do tipo II A) apresentam mioglobina e têm cor 
avermelhada. Estas fibras são mais abundantes em animais que têm de fazer contracções rápidas 
durante longos períodos de tempo (por exemplo, as presas), sendo pouco comuns no ser humano. 
A diferença entre fibras musculares rápidas e lentas deve-se também à diferença entre as isoenzimas da 
miosina apresentadas – as fibras musculares rápidas apresentam uma isoenzima rápida, enquanto as 
fibras musculares lentas apresentam uma isoenzima lenta. Paralelamente, a capacidade do retículo 
sarcoplasmático de bombear cálcio é mais elevada nas fibras rápidas, que nas fibras lentas. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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Músculo liso visceral e vascular 
As células musculares lisas são células 
pequenas, fusiformes, mononucleadas (de 
núcleo central) e que a microscópio de luz, se 
caracterizam pela ausência de estriação (e daí, 
o músculo ser designado por liso). Em termos 
fisiológicos, o músculo liso distingue-se do 
esquelético, pelo facto de poder haver 
contracção destas células, sem que haja 
despolarização da membrana e pelo facto do 
cálcio extracelular ser mais importante que o 
intracelular para a contracção muscular. De 
referir que os filamentos presentes no núcleo são de desmina e vimentina. 
Durante muito tempo pensou-se que o músculo liso não apresentava sarcómeros, devido ao facto de 
não apresentar estrias. Contudo, sabe-se agora que o músculo liso é constituído por sarcómeros com 
filamentos organizados, mas que se entrecruzam em várias direcções. Apesar disso, o sarcómero do 
músculo liso é diferente do apresentado pelo músculo esquelético, na medida em que não existem 
linhas Z, mas sim corpos densos ricos em α-actinina (no músculo esquelético, a α-actinina é a proteína 
principal de ancoragem da actina à linha Z). Ao nível dos miofilamentos finos do músculo liso, também 
não existe troponina, nem nebulina. Outra diferença entre o sarcómero dos dois tipos de músculo 
prende-se com o facto de no músculo liso os sarcómeros apresentarem menos miofilamentos grossos. 
Enquanto a contracção no músculo esquelético é regulada pelo miofilamento fino, no músculo liso esta 
é regulada pelo miofilamento grosso, uma vez que a miosina é sintetizada a partir de um gene diferente. 
Dessa forma, a regulação da miosina também é diferente nos dois tipos de músculo. 
A regulação da cadeia de miosina passa pela fosforilação desta proteína, um processo que envolve a 
acção de uma enzima. Dessa forma, o processo de contracção muscular é mais lento no músculo liso, 
mas simultaneamente mais prolongado. Isto permite que o músculo liso se mantenha contraído por um 
mais longo período de tempo, mas sem que ocorram tantos gastos energéticos (existem, contudo, 
excepções, tais como ao nível do músculo liso da íris, que apresenta um processo de contracção 
diferente, sendo caracterizado pelas suas rápidas contracções). 
Diferentes estados fisiológicos de contracção do músculo liso 
O músculo liso é um músculo 
intimamente associado às vísceras e 
aos vasos sanguíneos e, como tal, as 
células musculares lisas podem se 
encontrar em diferentes estados, 
dependendo dos órgãos aos quais 
estão associadas. Existem fibras 
musculares que se encontram 
geralmente contraídas, mas que por 
vezes relaxam, sendo que estas fibras 
estão associadas as esfíncteres (tais 
como o esfíncter esofágico superior). 
Por oposição, existem células que se 
encontram maioritariamente 
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relaxadas e, por vezes, contraem (a título de exemplo, é possível referir os músculos que promovem o 
esvaziamento do estômago ou da bexiga). Existem igualmente células musculares lisas que se 
encontram sempre contraídas, mas cujo grau de contracção varia (por vezes encontram-se mais 
contraídas e por vezes encontram-se menos), tal como acontece com os músculos vasculares, que 
aquando de um aumento de pressão, diminuem a tensão de parede e vice-versa. Por fim, existem 
músculos que participam em movimentos oscilatórios de contracção e relaxamento (tais como os 
movimentos peristálticos), sendo exemplo destas fibras, aquelas presentes ao longo de todo o tracto 
gastrointestinal. 
Inervação e comunicação intercelular entre as células do músculo liso 
O músculo liso não tem placa motora e, como tal, não é inervado por nervos motores. A inervação do 
músculo liso é da competência do sistema nervoso autónomo, sendo que alguns músculos são 
predominantemente inervados pelo sistema nervoso simpático, enquanto outros são sobretudo 
inervados pelo parassimpático. 
Os mecanismos de comunicação intercelular entre as células do músculo liso são mais diversos, que os 
apresentados pelo músculo estriado. Em alguns órgãos, o músculo liso é inervado de forma idêntica ao 
músculo esquelético,onde cada fibra recebe o seu input sináptico. Todavia, cada célula muscular lisa 
pode receber esse input através de mais que um neurónio. As fibras que são inervadas deste modo 
apresentam poucas gap junctions (e portanto, existe pouco acoplamento eléctrico entre essas células 
musculares) e, como tal, podem-se contrair independentemente das suas vizinhas. Dizemos, então, que 
estamos perante músculo liso multiunitário. As fibras musculares multiunitárias são capazes de um 
controlo mais refinado e, como tal, estas são passíveis de ser encontradas na íris, corpo ciliar do olho, 
músculos piloerectores da pele e em alguns vasos sanguíneos. 
Por oposição, as células musculares lisas da maior parte dos órgãos apresentam comunicação 
intercelular extensiva, através de gap junctions. Nem todas as células deste tipo precisam de ser 
inervadas por um neurónio motor, aquando de uma contracção - a presença abundante deste tipo de 
gap junctions permite a comunicação eléctrica entre células vizinhas e, como tal, a contracção 
coordenada de várias células. Como estas fibras se contraem como se fossem uma só, este tipo de 
músculo liso é designado por músculo liso unitário. 
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As sinapses ocorridas ao nível do músculo liso, são feitas en passage, o que permite a libertação de 
neurotransmissores ao longo de toda a fibra muscular (e não num local isolado). Os neurotransmissores 
podem ser libertados mais próximos da fibra muscular, ou mais afastados, sendo que se a libertação de 
neurotransmissores ocorrer a maior distância da célula muscular, maior a área desta, pela qual os 
neurotransmissores se difundem. 
Despolarização celular 
Depois de as fibras musculares serem estimuladas, estas são, na maior parte dos casos, despolarizadas. 
Contudo, a despolarização não tem obrigatoriamente de ocorrer por via de um estímulo eléctrico, 
podendo ocorrer uma despolarização através de um estímulo químico. 
É importante referir que no músculo liso é igualmente possível verificar-se a ocorrência de contracção 
muscular, sem que haja despolarização celular. Este processo é designado por acoplamento fármaco-
mecânico e mobiliza principalmente o cálcio do retículo sarcoplasmático para o sarcoplasma. 
Despolarização por estímulo eléctrico e repolarização 
No músculo liso, a despolarização celular não é directamente induzida pelos canais de sódio. De facto, a 
abertura dos canais de sódio, por consequência de um estímulo, leva à abertura de canais de cálcio 
dependentes de voltagem do tipo L. Estes últimos permitem a entrada de cálcio do meio extracelular 
para o interior da célula, o que gera um potencial de acção, que leva à despolarização da membrana. 
Contudo, uma vez que os canais de cálcio dependentes de voltagem são mais lentos, que os canais de 
sódio, raramente se registam despolarizações em pico. A repolarização da membrana, por sua vez, 
origina-se através da abertura de canais de potássio dependentes de voltagem ou de canais de 
potássio dependentes de cálcio (que abrem, aquando da concentração de cálcio). 
Os potenciais de acção são frequentemente observados no músculo liso unitário, sendo que esses 
potenciais se caracterizam por apresentar uma fase de despolarização mais lenta, bem como uma 
duração mais prolongada, comparativamente ao que acontece no músculo liso. O potencial de acção na 
célula muscular lisa pode se caracterizar por um único pico, pela presença de um pico seguido de uma 
fase de plateau, ou por uma série de picos. Em qualquer um dos casos, a longa fase de despolarização 
do potencial de acção reflecte o longo período de tempo associado à abertura dos canais de cálcio 
dependentes de voltagem. A entrada de cálcio para o sarcoplasma despolariza ainda mais a célula, 
causando assim, a abertura de mais canais de cálcio dependentes de voltagem. De referir que o cálcio 
proveniente do meio extracelular estimula também os canais rianodínicos do retículo sarcoplasmático, 
o que leva a que também ocorra libertação de cálcio do retículo para o sarcoplasma. 
A repolarização das células de músculo liso também é relativamente lenta. Contudo, ainda não se sabe 
se isto se deve a uma lenta inactivação dos canais de cálcio dependentes de voltagem ou, 
alternativamente, a um atraso na activação dos canais de potássio. Em alguns músculos lisos unitários, a 
repolarização sofre um atraso tal, que no potencial de acção verifica-se a presença de um plateau. Esses 
potenciais de plateau ocorrem no tracto urogenital e permitem que a entrada de cálcio se mantenha 
por um maior período de tempo e, consequentemente, que a concentração de cálcio permaneça 
elevada por um maior período de tempo, prolongando-se assim a contracção muscular. 
Despolarização por estímulo químico 
Enquanto a génese de um potencial de acção é essencial para iniciar a contracção do músculo cardíaco e 
do músculo esquelético, muitas células musculares lisas contraem-se, mesmo sendo incapazes de gerar 
um potencial de acção. Os potenciais de acção normalmente não ocorrem no músculo liso multiunitário, 
sendo que, neste músculo a despolarização celular é despoletada através da acção da fosfolipase C. Esta 
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enzima cliva fosfoinositídeos, permitindo a libertação de diacilglicerol e inositol trifosfato (IP3), sendo 
que o se IP3 liga a um receptor específico da membrana do retículo sarcoplasmático. Este receptor é um 
canal de cálcio dependente de cálcio e, como tal, a sua ligação ao IP3 permite a libertação de cálcio do 
retículo sarcoplasmático para o sarcoplasma. 
 
Repreenchimento de cálcio 
A membrana do músculo liso não apresenta túbulos T. Contudo, apresenta caveolae, invaginações 
membranares análogas aos túbulos T, que se encontram próximas do retículo sarcoplasmático. As 
caveolae comunicam com o retículo sarcoplasmático, através dos canais rianodínicos do retículo, bem 
como através do transportador sódio/cálcio e da ATPase de cálcio. 
Quando se verifica um défice de cálcio ao nível do retículo sarcoplasmático (ou seja os níveis de cálcio 
estão abaixo de um valor significativo), o retículo pode captar o cálcio extracelular, através de canais de 
cálcio dependentes do armazenamento, situados, sobretudo, ao nível das caveolae (a este processo se 
dá o nome de repreenchimento de cálcio). Deste modo, a ausência de cálcio extracelular impede a 
contracção do músculo liso, contrariamente ao que se passa com o músculo esquelético. 
Activação da miosina e ciclo das pontes cruzadas 
Os miofilamentos grossos são muito menos abundantes no músculo liso, comparativamente ao músculo 
esquelético. Todavia, esta propriedade está associada a uma melhor interposição entre miofilamentos 
finos e grossos. Ao nível destes miofilamentos grossos encontramos miosina II (miosina do músculo 
liso), que apresenta, na sua cabeça, uma cadeia leve reguladora, que é essencial para a sua activação. 
Quando esta cadeia se encontra fosforilada, a miosina pode-se ligar à actina, enquanto se a cadeia se 
encontrar desfosforilada, a miosina não se liga à actina. 
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O mecanismo das pontes cruzadas é igualmente diferente no músculo liso e no músculo esquelético, na 
medida em que requer uma activação inicial. O primeiro passo dessa activação prende-se com a ligação 
de quatro iões cálcio à calmodulina (a concentração de cálcio no sarcoplasma que despoleta este 
processo é da ordem dos 10-6 molares), uma proteína 
presente no sarcoplasma. De seguida, o complexo 
cálcio-calmodulina activa uma enzimadesignada por 
cínase da cadeia leve de miosina, que, por sua vez, 
fosforila a cadeia leve reguladora da molécula de 
miosina II. A fosforilação dessa cadeia altera a 
conformação da cabeça de miosina, activando-a (ao 
aumentar a sua actividade ATPásica) e permitindo-
lhe, assim, interagir com a actina. Uma vez que este 
mecanismo depende da acção de uma enzima, a 
contracção muscular é mais lenta nas células 
musculares lisas. 
O mecanismo descrito activa os miofilamentos 
grossos do músculo liso, sendo os restantes passos 
deste ciclo, similares aos descritos para o ciclo das 
pontes cruzadas do músculo esquelético. Dessa 
forma, a primeira contracção requer o gasto de duas 
moléculas de ATP – uma para activação da miosina e 
outra para o processo de contracção muscular, 
propriamente dito. 
Relaxamento muscular 
Quando se regista a diminuição dos níveis de cálcio, quer por este estar a ser bombeado para o retículo 
sarcoplasmático (por via da SERCA), quer por este estar a ser expulso para o meio extracelular (por via 
do trocador sódio/cálcio ou da ATPase de cálcio), torna-se necessário desfosforilar a cabeça da miosina, 
de modo a promover o relaxamento muscular. Esta desfosforilação é operada pela fosfátase da 
miosina, que é activada por baixos níveis de cálcio sarcoplasmático. A desfosforilação da cabeça de 
miosina é um processo lento (mais uma vez, por ser de natureza enzimática). 
O processo acima referido não envolve um mecanismo de tudo-ou-nada, ou seja, não temos, num dado 
momento todas as miosinas fosforiladas e noutro todas as miosinas desfosforiladas. De facto, o que se 
verifica é a presença de algumas fases em que as cínases estão mais activas (havendo mais fosforilação 
das cabeças de miosina e, como tal, maior força de contracção muscular) e de outras em que as 
fosfátases se encontram mais activas (registando-se menor força de contracção muscular). 
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Por outro lado, como o tempo de acção das fosfátases é elevado, enquanto ocorre a desfosforilação da 
miosina e o “desligar” do complexo miosina-actina, a força de contracção muscular vai sendo mantida 
por um maior período de tempo. Concomitantemente, uma vez que algumas cínases também se 
encontram activas, vai ocorrendo o estabelecimento de novas pontes cruzadas. Assim sendo, a 
manutenção em simultâneo de cínases e fosfátases em actividade, permite que a contracção seja mais 
prolongada e gaste menos ATP. Isto revela-se particularmente importante para o funcionamento dos 
esfíncteres e dos vasos sanguíneos, visto que o músculo liso associado a estas estruturas tem que estar 
sempre, ou quase sempre contraído. 
 
Regulação da contracção e relaxamento muscular 
Existem duas proteínas que, quando se encontram desfosforiladas, impedem a ocorrência de interacção 
entre a actina e a miosina – a calponina e a caldesmona. A calponina inibe a acção ATPásica da miosina 
(ligando-se à miosina e impedindo a sua ligação à actina), enquanto a caldesmona inibe a actividade 
ATPásica da miosina promovida pela actina (ou seja, liga-se à actina e impede a sua ligação à miosina). 
Aquando da contracção muscular, o complexo cálcio-calmodulina liga-se a estas proteínas e inibe a sua 
acção. Também a proteína cínase C, activada pelo diacilglicerol, inibe à acção da calponina e da 
caldesmona, fosforilando-as. 
Por outro lado, níveis elevados de cálcio activam o sistema Rho/ROCK, que promove a fosforilação da 
fosfátase da miosina (nomeadamente por acção da cínase ROCK), inibindo a sua acção. Isto impede que 
a miosina seja desfosforilada e, como tal, que o músculo se mantenha contraído por um maior período 
de tempo. De referir que uma desregulação deste sistema está na base do desenvolvimento de algumas 
hipertensões arteriais, na medida em que, caso o sistema se encontre hiperactivo, o músculo liso 
vascular se mantém contraído por um maior período de tempo, algo que está associado ao 
desenvolvimento de tensão mais alta. 
Nem sempre a subida dos níveis de cálcio condiciona a contracção. Por vezes registam-se picos 
transitórios de cálcio, que consistem em saídas espontâneas e rápidas de cálcio dos canais rianodínicos. 
Estas saídas condicionam a abertura dos canais de potássio do sarcolema, o que promove a saída de 
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potássio e, consequentemente, 
o relaxamento muscular. Os 
picos transitórios de cálcio são 
promovidos pelo cAMP, que 
também favorece o 
relaxamento muscular, ao 
fosforilar a PKA que, por sua 
vez, fosforila a cínase das 
cadeias leves de miosina (entre 
outras proteínas), inactivando-
a. O cGMP leva também à 
génese de picos transitórios de 
cálcio, ao promover a abertura 
dos canais de cálcio e de potássio. 
Considerações mecânicas 
Ao nível do músculo liso 
distinguem-se dois tipos de 
contracções – as contracções 
fásicas e as contracções tónicas. 
As contracções fásicas são 
rápidas, sendo depressa sucedidas 
por um rápido relaxamento. Estas 
contracções verificam-se, por 
exemplo, ao nível do músculo da 
íris. Já as contracções tónicas são 
lentas, sendo o poder de 
contracção mantido, à custa de 
menores gastos de ATP. 
Verificamos que ao nível das 
contracções tónicas se verifica, 
após a subida dos níveis de cálcio, 
uma descida para níveis 
intermédios, o que permite que a 
força de contracção seja também 
intermédia, constante e mais prolongada. É, contudo, importante referir que a contracção muscular é 
apenas possível para um intervalo de concentrações de cálcio muito restrito, sendo que a fosforilação 
de miosina aumenta substancialmente, quando a concentração de cálcio sobe apenas uma unidade 
logarítimica. 
Caso o músculo liso seja submetido a mais estiramento, este, contrariamente ao músculo esquelético, 
tem capacidade de responder a esse estiramento e de se contrair normalmente. Isto apenas é possível, 
caso as fibras musculares lisas estejam sujeitas a este estiramento durante um certo período de tempo, 
que permita a adaptação e, consequente reorganização, dos miofilamentos de actina e miosina. 
Por outro lado, comparando a tensão com a velocidade, constatamos que para cada ponto de tensão, a 
velocidade de contracção muscular apresentada é muito baixa, até porque a quantidade de ATP gasta é 
muito reduzida. Contudo, não é possível descrever uma única curva velocidade-tensão para este 
músculo, mas sim várias, dependendo dos níveis de cínase e fosfátase activados. 
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Músculo cardíaco 
Mecanismo geral de condução cardíaca 
Ao nível do coração são passíveis de ser encontrados dois tipos de fibras musculares – as fibras 
diferenciadas para a contracção muscular (as quais vão ser abordadas com pormenor neste texto) e as 
fibras diferenciadas para a génese e propagação de um estímulo. São estas últimas fibras que 
permitem que, caso o coração pudesse ser isolado e lhe seja fornecida energia, este continue a contrair-
se espontaneamente (estas células têm capacidade de despolarização automática). Contudo, estes dois 
tipos de fibras “trabalham em conjunto”, motivo pelo qual, se as fibras diferenciadas para a génese e 
propagação de um estímulo sofrerem de algum problema, as fibras diferenciadas para a contracção 
muscular também são afectadas. 
Geralmente, pensa-se no coração como funcionando estritamente em uníssono. Todavia, o que se passa 
de facto é que os ventrículos funcionam como um sincício, enquanto as aurículas funcionam como outro 
sincíciodiferente. Isto deve-se à existência de tecido fibroso a separar as aurículas dos ventrículos, que 
funciona como um isolante, na medida em que não passa nenhum estímulo eléctrico pelo tecido 
fibroso. Assim sendo, um estímulo apenas é transmitido das aurículas para os ventrículos através do nó 
aurículo-ventricular e do feixe de His. 
Para que as aurículas apresentem máxima eficiência hemodinâmica, têm de se contrair primeiro e 
”ajudar no enchimento dos ventrículos”, só depois se podendo dar a contracção ventricular (caso as 
contracções auricular e ventricular ocorressem em simultâneo, as aurículas não conseguiriam ejectar os 
seus conteúdos, antes de se iniciar a contracção ventricular). Este desfasamento é conseguido através 
de um atraso no nó aurículo-ventricular – o estímulo eléctrico é conduzido a alta velocidade (por via do 
tecido de condução), até aquele nó, onde sofre uma desaceleração que permite a contracção das 
aurículas. Após ocorrer a 
contracção auricular, o 
estímulo eléctrico volta a 
propagar-se a alta 
velocidade, de modo a 
chegar rapidamente às 
fibras ventriculares. Isto 
permite que estas fibras 
se contraiam todas 
quase em simultâneo, de 
tal modo que a eficácia 
hemodinâmica do 
coração se torna 
optimizada). 
 
Células musculares cardíacas diferenciadas para a contracção 
Os miócitos cardíacos diferenciados para a 
contracção são ramificados e mais pequenos que 
as células musculares esqueléticas. 
Contrariamente às células musculares 
esqueléticas, que são electricamente isoladas 
entre si, as células do músculo cardíaco 
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encontram-se electricamente 
conectadas por gap junctions. 
Desta forma, quando uma 
célula é estimulada, o 
estímulo propaga-se para 
todas as restantes células. Já 
a ligação mecânica entre as 
células musculares cardíacas é 
assegurada pela presença de 
discos intercalares e 
desmossomas. 
A célula muscular cardíaca 
diferenciada para a 
contracção tem uma 
estrutura similar à célula 
muscular esquelética, todavia, 
regista-se a presença de 
apenas uma tríade por 
sarcómero, que se encontra 
ao nível da linha Z. Também o 
retículo sarcoplasmático da fibra muscular cardíaca não é tão desenvolvido como o retículo da fibra 
muscular esquelética, o que implica que, ao nível das células cardíacas, por vezes sejam registadas 
díades, em vez de tríades (uma díade é constituída por uma cisterna terminal mais um túbulo T). 
Outra diferença entre as células musculares cardíacas e as células musculares esqueléticas prende-se 
com o facto de canais de cálcio de tipo L (também designadas por receptores dihidropiridínicos) 
permitirem a entrada de uma quantidade substancial de cálcio para o sarcoplasma das células cardíacas. 
Isto leva a que se gerem diferenças entre os potenciais de acção registados ao nível do músculo cardíaco 
e do músculo esquelético – verificamos que os primeiros, após a despolarização têm uma fase de 
plateau (ou seja, uma duração mais longa). Contudo, esse plateau apresenta diferentes características, 
consoante a cavidade cardíaca, na qual as fibras se encontram inseridas. 
Acoplamento excitação/contracção 
O potencial de acção do 
músculo cardíaco é 
caracterizado por uma fase 
de despolarização rápida, 
que se caracteriza pela 
entrada de sódio para o 
interior da célula. 
Subsequentemente, verifica-
se uma diminuição na 
permeabilidade de sódio, 
passando os canais do 
estado “aberto” para o seu 
estado “inactivo”. 
Concomitantemente, 
verifica-se a abertura dos 
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Fisiologia I 
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canais de potássio, mas a repolarização é interrompida pela abertura dos canais de cálcio tipo L, que 
permitem a entrada de cálcio para o meio intracelular, o que serve como mecanismo de contrabalanço 
ao movimento do potássio. Desta forma, a célula mantém-se despolarizada, registando-se uma fase de 
plateau. A repolarização da membrana apenas se torna completa, quando os canais de cálcio fecham, na 
medida em que os canais de potássio permanecem abertos. 
A entrada de cálcio proveniente do meio extracelular, por via dos canais de cálcio de tipo L, leva a um 
aumento dos níveis de cálcio no sarcoplasma. Isto promove a abertura dos canais rianodínicos do 
retículo sarcoplasmático, o que por sua vez, leva a que se liberte cálcio do retículo sarcoplasmático para 
o sarcoplasma. Desta forma, este acoplamento excitação/contracção é designado por mecanismo de 
libertação de cálcio induzida pelo cálcio, sendo de natureza electroquímica (no músculo esquelético, 
por sua vez, verificava-se a presença de um acoplamento electromecânico). 
O ciclo das pontes cruzadas é similar no músculo cardíaco e no músculo esquelético, contudo, a 
troponina C do músculo cardíaco apresenta apenas um local de ligação ao cálcio (enquanto a do 
músculo esquelético apresenta dois). 
Remoção de cálcio do sarcoplasma 
Os níveis elevados de cálcio no sarcoplasma activam os mecanismos que levam à extrusão de cálcio. 
Cerca de dois terços do cálcio presente no sarcoplasma são recaptados pelo retículo sarcoplasmático 
por via da SERCA – quando a actividade deste transportador se encontra aumentada, não só o cálcio 
que se encontrava anteriormente no retículo é captado, mas também o cálcio que estava previamente 
no meio extracelular passa para o retículo. Isto leva, como tal, a um aumento das reservas intracelulares 
de cálcio. Por outro lado, cerca de um terço do cálcio presente no sarcoplasma é expulso para o meio 
extracelular por via do trocador (antiporter) sódio/cálcio – quando a actividade deste trocador se 
encontra mais aumentada, verifica-se uma diminuição das reservas intracelulares de cálcio. 
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Fisiologia I 
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Convém referir que menos de 1% do cálcio sarcoplasmático é expulso, ou para o meio extracelular pela 
bomba de cálcio, ou para a mitocôndria. A libertação de cálcio para a mitocôndria tem particular 
interesse, na medida em que, se a concentração deste ião aumentar muito neste organelo (o que se 
pode dever, por exemplo, a menor actividade da SERCA, devido a um défice de ATP), é aberto um poro 
de transição mitocondrial, o que leva à libertação do citocromo c, uma substância que desencadeia a via 
intrínseca da apoptose. De referir que esta situação regista-se, por exemplo, aquando de uma situação 
de enfarte do miocárdio, sendo um dos processos que leva à morte celular nessa condição. 
Efeitos da estimulação simpática 
A estimulação simpática influencia a contracção muscular cardíaca, ao promover a fosforilação do 
fosfolamban. O fosfolamban é uma proteína que, quando desfosforilada, se encontra ligada à SERCA, 
inactivando-a. Por outro lado, o fosfolamban fosforilado desliga-se da SERCA, o que aumenta a 
actividade desta. Ora, isto significa que o fosfolamban fosforilado, ao permitir maior actividade da 
SERCA, leva a que o relaxamento muscular ocorra mais rapidamente e a que o retículo sarcoplasmático 
capte mais cálcio (o que leva a que a contracção seguinte seja mais vigorosa, na medida em que passa a 
ser disponibilizado mais cálcio para o sarcoplasma). 
 
Também a noradrenalina, um neurotransmissor libertado pelo sistema nervoso simpático, aumenta o 
aumento da força contráctil gerada. Esta hormona leva a um aumento da síntese de cAMP, o que está 
associado à fosforilação dos canais de cálcio do tipo L e a um consequente influxo passivo de cálcio para 
o sarcoplasma (sendo como tal, gerada mais força contráctil).Por outro lado, o cAMP produzido 
aumenta a sensibilidade ao cálcio, por parte do aparelho contráctil. 
Desta forma, a estimulação simpática aumenta a contractilidade cardíaca (tornando-a mais vigorosa) e a 
sua velocidade. Diz-se, por isso, que a estimulação simpática tem um efeito inotrópico positivo 
(inotrópico diz respeito à contractilidade) e, simultaneamente, lusotrópico positivo (lusotrópico diz 
respeito ao relaxamento. Como o relaxamento passa a ocorrer mais rapidamente, aquando o efeito diz-
se lusotrópico positivo). 
Considerações mecânicas 
Impossibilidade de tetanização do músculo cardíaco 
O músculo cardíaco em condições fisiológicas não pode ser tetanizado. Isto deve-se ao facto de o 
potencial de acção ser muito longo, prolongando-se por três quartos do tempo de duração do abalo 
muscular. Dessa forma, quando se regista o pico de força, ao nível da contracção muscular cardíaca, o 
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Fisiologia I 
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músculo ainda se encontra 
em período refractário 
absoluto, não sendo 
possível induzir a génese de 
um potencial de acção 
nessa altura. Dessa forma, a 
tetanização do músculo 
cardíaco torna-se 
impossibilitada e as fibras 
musculares cardíacas 
encontram-se num 
processo de contracção e 
relaxamento intermitentes. 
 
Relação tensão-comprimento 
O músculo cardíaco consegue 
responder ao aumento do 
comprimento muscular com o 
aumento da tensão activa 
desenvolvida. É importante 
referir que, apesar da tensão 
activa aumentar, com o 
comprimento do sarcómero, 
este quase nunca excede o valor 
de comprimento óptimo. 
De facto, o aumento do 
comprimento dos miofilamentos 
leva a um aumento da 
sensibilidade das fibras musculares para o cálcio, passando a ser necessária uma menor quantidade de 
cálcio para activar o aparelho contráctil. Isso é possível, na medida em que, aquando do estiramento, 
uma fibra muscular activa mecanossensores, o que leva ao desencadeamento de uma cascata 
intracelular no sentido de aumentar a sensibilidade destas células ao cálcio. O aumento da concentração 
de cálcio no sarcoplasma, leva a que seja desempenhada maior força. Isto explica porque é que aquando 
da contracção crónica do coração contra resistência (pós-carga intensa aplicada), as paredes dos 
ventrículos sofrem um espessamento; enquanto um aumento crónico da pré-carga leva a uma dilatação 
das cavidades cardíacas. 
Outro mecanismo que permite explicar o fenómeno de aumento da tensão activa, aquando do aumento 
do comprimento muscular, prende-se com o facto de, com o estiramento muscular, as fibras musculares 
ficarem mais finas. Isto leva a que diminua a distância entre os miofilamentos grossos e finos e, como 
tal, a probabilidade dos miofilamentos interagirem entre si aumenta. 
Mecanismo de prevenção do estiramento 
O músculo esquelético permite movimentos amplos, contudo, a variação real do comprimento muscular 
é reduzida (devido ao facto de as inserções serem próximas das articulações), ou seja, por exemplo, 
aquando da contracção do bicípite braquial, é possível fazer um amplo movimento de 180º, mas a 
variação real do comprimento muscular é diminuta. Isto implica que a força gerada pelo músculo para 
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Fisiologia I 
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levantar um peso colocado próximo da ponta, seja superior à força gerada para erguer o mesmo peso, 
quando este é colocado próximo da inserção (a título de exemplo, quando se pega num peso, a 
contracção do bicípite braquial torna-se mais facilitada se o peso for colocado próximo do cotovelo, do 
que se for colocado na ponta da mão). Apesar disso, este mecanismo permite que o comprimento dos 
sarcómeros se mantenha sempre próximo dos valores óptimos. 
Contudo, isto não ocorre no músculo cardíaco e, como tal, aquando da ejecção de sangue, as fibras 
musculares contraem-se e o comprimento dos sarcómeros diminui, enquanto, aquando do influxo de 
sangue para o coração, verifica-se um aumento do comprimento dos sarcómeros. Ora, isto poderia 
teoricamente potenciar um grande estiramento das fibras musculares cardíacas, algo que não se verifica 
devido à maior rigidez apresentada pelo músculo cardíaco. 
Esta rigidez deve-se à presença de titina (que é mais rígida nas células musculares cardíacas, 
comparativamente às células musculares esqueléticas), que “obriga” os sarcómeros a actuarem, 
normalmente, em valores de comprimento inferiores aos óptimos – quando o comprimento do 
sarcómero se aproxima dos 2,2 μm gera-se uma tensão passiva tal, que o estiramento ulterior dos 
sarcómeros se torna praticamente interdito. Existem duas isoformas de titina no músculo cardíaco, 
sendo uma delas mais rígida (N2B) e outra mais complacente (N2BA). O miocárdio pode alterar a sua 
rigidez, fazendo variar a proporção destas isoformas de titina e a rigidez de ambas as isoformas pode ser 
alterada por mecanismos pós-traducionais. Isto revela-se importante porque um miocárdio pouco rígido 
oferece pouca resistência ao estiramento, enquanto um miocárdio demasiado rígido leva a dificuldades 
de enchimento do coração. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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Fisiologia I 
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Actividade eléctrica cardíaca 
Diferentes células cardíacas despenham funções diferentes – existem células especializadas para a 
contracção cardíaca (cardiomiócitos) e células especializadas na condução. Contudo, todas estas 
células são electricamente activas. O sinal eléctrico cardíaco normalmente origina-se num grupo de 
células da região superior da aurícula direita, que despolarizam espontaneamente. A partir daí, esse 
potencial propaga-se pelo coração, por ambos os tipos de células. Pela velocidade com que ocorre o 
upstroke, os potenciais de acção podem ser caracterizados como sendo lentos (como ocorre nos nós 
sinusal e AV) ou rápidos (o que se verifica nos miócitos auriculares, fibras de Purkinje e miócitos 
ventriculares). 
Uma vez que a excitação dos cardiomiócitos desencadeia um processo de acoplamento excitação-
contracção, o tempo de propagação de potenciais de acção deve ser altamente regulado, de forma a 
verificar-se uma sincronização da contracção ventricular e, consequentemente, uma ejecção óptima de 
sangue. 
Correntes de membrana 
O tempo de iniciação e a duração do potencial de acção são distintos em diferentes porções do coração, 
o que reflecte as suas diferentes funções. Essas distinções advêm do facto de os miócitos em cada 
região do coração apresentarem um conjunto de canais característicos. Associados a esses canais, 
existem vários tipos de correntes de membrana, responsáveis pelas várias fases dos potenciais 
membranares: 
1. Corrente de sódio (INa) – Responsável pela fase de despolarização rápida do potencial de acção 
nos músculos ventricular e auricular, bem como nas fibras de Purkinje. Ao nível das células do 
nó sinusal e do nó aurículo ventricular não se verifica a presença desta corrente, motivo pelo 
qual elas têm um potencial de acção lento. 
2. Corrente de cálcio - (ICa) – Responsável pela fase de despolarização rápida do potencial de 
acção no nó sinusal e nó AV, despoletando também a contracção dos cardiomiócitos. 
3. Correntes de potássio - Existem três correntes de potássio presentes ao nível da célula. IK é a 
principal corrente responsável pela fase de repolarização do potencial de acção em todos os 
cardiomiócitos e nas células especializadas na condução. Ito determina a fase I do potencial de 
acção dos cardiomiócitos, enquanto a corrente IK1 é a principal estabilizadorado potencial de 
repouso. 
4. Corrente de pacemaker - (If) – Responsável, em parte, pela actividade de pacemaker nas 
células do nó sinusal, células do nó AV e fibras de Purkinje. 
Potencial de acção dos cardiomiócitos 
As células cardíacas especializadas na contracção apresentam um potencial de acção diferente das 
restantes. Este potencial é normalmente dividido em quatro fases separadas: 
0. Fase 0 (Fase de despolarização rápida) – Upstroke do potencial de acção, devido à 
despolarização da membrana, uma vez ultrapassado o potencial limiar dos cardiomiócitos (-
65mV). Este rápido upstroke deve-se à acção das correntes de sódio (INa) e cálcio (ICa). A 
passagem de sódio para o interior dos cardiomiócitos deve-se à abertura dos canais rápidos de 
sódio dependentes de voltagem, enquanto a passagem de cálcio para o meio intracelular 
ocorre por via dos canais de cálcio do tipo L. 
 
2. Fisiologia cardiovascular 
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Fisiologia I 
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1. Fase I (Fase de repolarização rápida/precoce) – Nesta etapa, verifica-se uma ligeira 
repolarização de membrana, que se deve à abertura transitória dos canais de potássio, que 
geram a pequena corrente Ito. Esta etapa, que é muito breve e de muito baixa amplitude, é 
acompanhada pela quase inactivação total das correntes de cálcio ou sódio. 
2. Fase II (Fase de plateau) – Esta fase depende da entrada continuada de cálcio (ou, menos 
frequentemente, de sódio) através dos canais de cálcio do tipo L. Esta entrada de cálcio 
contrabalança a saída de potássio (note-se que, durante a fase de plateau, a membrana tem 
menor permeabilidade ao potássio), gerando-se assim duas correntes antagónicas. É 
importante referir que a fase de plateau é mais proeminente no músculo ventricular, onde os 
potenciais de acção têm uma maior duração, mas também estão associados a uma maior força 
de contracção. 
3. Fase III (Fase de repolarização) – Nesta fase regista-se novo aumento da permeabilidade ao 
potássio. A abertura dos canais de potássio é acompanhada pelo fecho dos canais de cálcio, 
verificando-se a saída de potássio para o meio extracelular. Passam então a estar activas as três 
correntes de potássio, presentes ao nível da célula. 
4. Fase IV (Fase de repouso) – Constitui a fase diastólica eléctrica do potencial de acção. O 
potencial de membrana durante a fase IV é designado por potencial diastólico (sendo que o 
potencial mais negativo registado é designado por potencial diastólico máximo). Nesta fase 
verifica-se a reposição das concentrações originais do sódio (que é expulso dos cardiomiócitos 
por via da bomba de sódio e potássio) e do cálcio (que é expulso das células musculares 
cardíacas por via do trocador Na+/Ca2+, ou por acção da ATPase de cálcio. 
A existência de períodos refractários impede 
que o músculo cardíaco possa ser tetanizado, ou 
que sejam desencadeados batimentos ectópicos 
(algo passível de ser observado em situações 
patológicas, por via da acção de pacemakers 
inapropriados). Isto é fundamental para que 
ocorra o normal funcionamento do coração, que 
tem de se contrair e relaxar ciclicamente, de 
modo a que seja possível que os ventrículos se 
encham de sangue, antes de se contraírem. É 
importante referir que o período refractário 
absoluto é aqui designado por período 
refractário efectivo. 
Aplicações clínicas e farmacológicas 
Em termos clínicos, o conhecimento do modo como se processam os 
potenciais de acção ao nível dos cardiomiócitos é de extrema 
importância. Todos os anos, vários indivíduos no Japão morrem por 
acção da tetrodotoxina. Esta toxina está presente no peixe-balão e a sua 
ingestão é letal, na medida em que bloqueia os canais rápidos de sódio. 
Isto leva a um bloqueio dos potenciais de acção ou a um atraso na sua 
transmissão, o que impede a normal contracção cardíaca. Por outro lado, 
mutações dos canais rápidos de sódio estão associadas a arritmias 
cardíacas, potenciais causadoras de morte súbita. 
Já os canais de potássio têm importância clínica, na medida em que é possível o bloqueio farmacológico 
de alguns destes canais (note-se que existem diversos tipos de canais de potássio), com o objectivo de 
aumentar a duração do potencial de acção e, consequentemente, a lentidão da frequência cardíaca. 
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Propriedades gerais da actividade eléctrica cardíaca 
O coração saudável apresenta duas propriedades fundamentais - a ritmicidade e a automacidade. A 
ritmicidade está associada à presença de um intervalo de tempo igual entre cada duas contracções. Já a 
automacidade prende-se com a capacidade que o coração apresenta de génese de actividade eléctrica 
cardíaca de forma espontânea. De facto, caso toda a inervação do coração fosse removida, mas lhe 
fossem fornecidos nutrientes, este órgão ficaria a bater durante horas fora da cavidade cardíaca. Este 
cenário não é assim tão ficcional 
como parece – quando são feitos 
transplantes cardíacos, a inervação é 
seccionada, de forma a ser possível a 
introdução do coração. Isto faz com 
que o coração dos indivíduos 
transplantados continue a bater, 
embora a frequência cardíaca deixe 
de poder ser modulada pelo sistema 
nervoso autónomo. 
Não só a frequência de contracção 
cardíaca (cronotropismo) é modulada 
pelo sistema nervoso autónomo 
(SNA). Verifica-se que o SNA tem 
capacidade de alterar a excitabilidade 
cardíaca (batmotropismo), a 
capacidade de condução 
(dromotropismo) e a força de 
contracção (inotropismo) – através 
da regulação destas propriedades, o 
SNA consegue modular a 
automacidade cardíaca. 
Tecido de condução cardíaco 
O coração normal apresenta três tecidos intrínsecos de pacemaking – o nó sinusal, o nó AV e as fibras 
de Purkinje. O conceito “actividade de pacemaker” refere-se à capacidade de despolarização 
espontânea (dependente do tempo) que se verifica na membrana celular e leva a um potencial de acção 
(ou seja, necessita da presença ciclos regulares de despolarização e repolarização). Nas células dos nós 
sinusal e AV, a actividade de pacemaker é provocada por mudanças nas correntes IK, ICa e If, enquanto 
nas fibras de Purkinje esta actividade apenas se deve à corrente If. 
Qualquer célula cardíaca com actividade de pacemaker tem capacidade de iniciar o batimento cardíaco, 
sendo que o pacemaker com a frequência mais elevada será aquele que desencadeará um potencial de 
acção que se propagará através do coração. De forma corriqueira pode-se dizer, então, que o 
pacemaker mais rápido define a frequência cardíaca, anulando os efeitos dos pacemakers mais lentos. 
Assim sendo, os pacemakers cardíacos apresentam uma hierarquia, baseada na sua frequência. Como as 
células do nó sinusal, apresentando uma frequência de entre 60 a 100 batimentos por minuto, 
constituem o pacemaker mais rápido, o potencial de acção cardíaco é gerado ao nível das células do nó 
sinusal. 
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Uma vez que as células cardíacas se encontram electricamente acopladas por via de gap junctions, o 
potencial de acção propaga-se de célula a célula, da mesma forma que um potencial de acção se 
propaga ao longo de um único axónio. Um potencial de acção espontâneo originado no nó sinusal é 
então conduzido de célula a célula, através da aurícula direita (pelas fibras internodais), sendo então 
transmitido para a aurícula esquerda. Um décimo de segundo após a sua génese, o sinal atinge o nó 
aurículo-ventricular – o 
impulso não se propaga 
directamente dasaurículas para os 
ventrículos, devido à 
presença do anel fibroso 
aurículo-ventricular. 
Assim sendo, a única via 
possível para o impulso 
se deslocar desde o nó 
aurículo-ventricular, 
passa pelo sistema de 
His-fibras de Purkinje, 
uma rede de células 
especializadas na 
condução, que permite a 
propagação do sinal até 
ao músculo de ambos os 
ventrículos. 
Nó sinusal 
O nó sinusal encontra-se na região superior da aurícula direita, próximo da entrada da veia cava 
superior, sendo o principal local de origem de sinal eléctrico no coração. Isto deve-se ao facto de 
constituir o pacemaker mais rápido do coração, com uma taxa de 60 batimentos por minuto, ou 
superior. Os impulsos eléctricos gerados a este nível apresentam como características intrínsecas a 
ritmicidade (conferida pelas interacções entre as correntes IK, ICa e If) e a automacidade. 
O potencial de acção que se verifica ao nível do tecido de condução especializado, sobretudo ao nível 
dos nós, é diferente do registado ao nível dos cardiomiócitos. Como já foi referido, enquanto nos 
cardiomiócitos se verifica a presença de um 
potencial de resposta rápida, o tecido de 
condução caracteriza-se pela presença de um 
potencial de resposta lenta. 
De facto, ao nível do tecido de condução ocorre 
uma despolarização automática das células que o 
integram (despolarização diastólica espontânea), 
o que está na base da automacidade verificada 
nos impulsos gerados pelo nó sinusal. Parte da 
despolarização espontânea deve-se à presença da 
corrente If. Esta corrente depende da presença de 
um canal de catiões não-específico (canal HCN) 
que é activado aquando da hiperpolarização das 
células com capacidade de pacemaker. Isto 
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Fisiologia I 
34 
 
permite a génese espontânea de uma corrente de despolarização após uma etapa de hiperpolarização. 
A despolarização das células do nó sinusal deve-se também à abertura de canais de cálcio do tipo T, que 
geram uma corrente ICa, que contribui, sobretudo para o upstroke do potencial de acção. Esta 
despolarização rapidamente inactiva a corrente If, verificando-se, subsequentemente, um processo de 
repolarização, com a abertura dos canais de potássio (não se verifica nestas células a presença de uma 
fase de repolarização rápida, nem de uma fase de plateau). À medida que a célula se vai repolarizando, 
os canais de potássio vão começando a fechar até que, quando a célula entra em repouso se verifica 
uma nova abertura dos canais HCN e um novo ciclo se inicia. De referir que o potencial diastólico 
máximo das células do tecido de condução é de -60mV. Este valor, assim como o valor do potencial 
limiar, é menor em módulo nestas células comparativamente aos cardiomiócitos. 
Estas correntes membranares encontram-se sob controlo de agentes locais e de agentes em circulação 
(tais como a acetilcolina, a adrenalina e noradrenalina) e são frequentemente alvos de agentes 
terapêuticos de modulação do ritmo cardíaco (por exemplo, actualmente, existe um fármaco que 
bloqueia os canais que geram a corrente If. Isto não suprime totalmente a despolarização espontânea, 
devido à presença dos canais de cálcio. O que se verifica, de facto, é o atraso da despolarização, o que 
acarreta uma diminuição da frequência cardíaca, ou seja, um efeito cronotrópico negativo). 
Nó aurículo-ventricular 
O nó aurículo-ventricular (AV) encontra-se localizado na aurícula direita, imediatamente superiormente 
ao anel fibroso aurículo-ventricular. Esta localização é extremamente importante, pois permite a 
passagem de um impulso eléctrico proveniente das aurículas para os ventrículos (esta é a única via pela 
qual um impulso eléctrico é transmitido para os ventrículos, porque de resto, estas estruturas 
encontram-se separadas por via de tecido fibroso). 
Assim sendo, normalmente o nó AV é excitado por um impulso proveniente das fibras internodais (vias 
de condução auriculares). Contudo, os impulsos que chegam ao nó AV sofrem um ligeiro atraso, o que 
impede que aurículas e ventrículos se contraiam em simultâneo, algo essencial para que o enchimento 
dos ventrículos ocorra, quando estes se encontram relaxados. É importante referir que o atraso que os 
impulsos sofrem ao chegar ao nó AV se deve ao facto do nó AV (contrariamente às fibras internodais) 
ser caracterizado por um potencial de acção lento, que depende apenas da corrente de cálcio para 
despolarizar. 
Para além dessa função moduladora, o nó AV funciona como um filtro, uma vez que, aquando de uma 
taquiarritmia (ou seja, uma arritmia caracterizada por um maior número de batimentos cardíacos por 
minuto) supra-ventricular, ocorre uma despolarização desorganizada ao nível das aurículas e o nó AV é 
bombardeado com estímulos. Contudo o nó AV transmite apenas alguns desses estímulos aos 
ventrículos, actuando numa tentativa de normalização da condução cardíaca. 
A ritmicidade intrínseca do nó AV depende, tal como a do nó sinusal, da interacção das correntes IK, ICa e 
If. Electricamente, verificam-se igualmente parecenças entre os dois nós – ambos apresentam potenciais 
de acção similares (que se transmitem lentamente) e mecanismos de pacemaker. Contudo, o nó AV não 
é o local principal de origem dos impulsos eléctricos cardíacos, na medida em que apresenta uma 
frequência de pacemaker (40 batimentos por minuto) inferior à registada pelo nó sinusal. Mesmo assim, 
aquando de uma falha do nó sinusal, o nó AV tem capacidade de “assumir o controlo do coração”, 
gerando estímulos eléctricos secundários e actuando como um pacemaker de escape. 
 
 
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Fisiologia I 
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Feixe de His e células da rede de Purkinje 
Os estímulos que chegam ao nó AV deslocam-se até aos ventrículos através do feixe de His, que se 
encontra presente ao nível do septo interventricular e se divide num feixe direito (para o ventrículo 
direito) e num feixe esquerdo (para o ventrículo esquerdo). O feixe esquerdo, por sua vez, divide-se 
geralmente num fascículo anterosuperior e num fascículo posteroinferior. 
O feixe de His contacta com as células da rede de Purkinje, sendo que ambas as estruturas transmitem 
os potenciais de acção de forma muito rápida (mais rápida, que em qualquer outro tecido do coração) 
para ambos os ventrículos. Isto permite que a informação seja transmitida aos ventrículos, 
praticamente, em simultâneo, o que leva a que estes se consigam contrair em uníssono. 
As células da rede de Purkinje apresentam o ritmo de pacemaker mais lento do coração (20 batimentos 
por minuto, ou menos), o que leva a que estas se tornem pacemakers funcionais, apenas se os nós 
sinusal e AV falharem (são por isso, consideradas pacemakers terciários). Contudo, a presença da rede 
de Purkinje como pacemaker principal não é compatível com uma correcta actividade hemodinâmica. 
O potencial de acção das células da rede de Purkinje depende de 
quatro correntes dependentes do tempo e da voltagem – INa (que não 
se encontra presente ao nível das células dos nós sinusal e AV), ICa, IK e 
If. O potencial diastólico máximo para as células da rede de Purkinje é 
de -80 mV. A partir desse potencial de membrana, gera-se uma 
despolarização dependente da corrente If. Caso essa despolarização 
atinja o potencial limiar, ocorre um rápido upstroke, mediado pelas 
correntes ICa e INa, sendo que é esta última que permite que os 
potenciais de acção sejam conduzidos tão rapidamente. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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Fisiologia I36 
 
Electrocardiograma 
O electrocardiograma (ECG) é dos exames complementares de diagnóstico mais utilizados, devido ao 
facto de ser inócuo, versátil e barato. Este exame permite conhecer a orientação anatómica do coração, 
as dimensões das suas cavidades cardíacas, alterações do ritmo e condução cardíacos, o estudo de 
lesões isquémicas (extensão, localização e progressão), a influência de determinados fármacos e os 
efeitos de alterações de electrólitos. 
A obtenção de um ECG é possível através de um aparelho denominado electrocardiógrafo, que 
amplifica e regista os sinais detectados pelos eléctrodos. Estes sinais, apesar de serem detectados à 
superfície do organismo correspondem a potenciais de um campo eléctrico com origem no coração. 
Deflexões 
Os eléctrodos positivos num ECG funcionam de modo análogo a câmaras de vigilância, registando a 
actividade eléctrica do coração sob os seus “pontos de vista”. Assim sendo, quando uma dada onda de 
despolarização se propaga no sentido de um eléctrodo positivo, aproximando-se deste, é registada uma 
deflexão positiva (um traçado para cima da linha de base). Por outro lado, quando uma dada onda de 
despolarização se propaga no sentido oposto ao do eléctrodo positivo, afastando-se deste, é registada 
uma deflexão negativa (um traçado para baixo da linha de base). Isto ocorre, uma vez que ao nível de 
um electrocardiograma são detectadas as diferenças de potencial presentes no exterior da célula. 
A título de exemplo, se uma despolarização se registar da direita para a esquerda, um eléctrodo que 
esteja colocado à esquerda do coração “sente” a onda de propagação do estímulo a aproximar-se de si e 
regista uma deflexão positiva. Pelo contrário, um eléctrodo que esteja colocado à direita do coração 
“sente” a onda de propagação do estímulo a afastar-se de si e regista uma deflexão negativa. O impulso 
de despolarização foi o mesmo, mas foi registado sob dois “pontos de vista” diferentes. 
Quando um eléctrodo se encontra perpendicular à direcção de propagação de um impulso, este regista 
uma deflexão positiva, quando o impulso se aproxima, e uma deflexão negativa, quando o impulso se 
afasta. Isto gera uma deflexão bifásica (porque apresenta duas fases, uma positiva e uma negativa). 
Aquando da repolarização, a distribuição 
das cargas encontra-se invertida 
relativamente à situação de 
despolarização. Dessa forma, um impulso 
de repolarização a propagar-se na mesma 
direcção de um impulso de 
despolarização, produz uma deflexão com 
sentido inverso. Por outro lado, um 
impulso de repolarização que se 
propague na direcção inversa de um 
impulso de despolarização produz uma 
deflexão com o mesmo sentido. 
Obviamente que quando o músculo se 
encontra em repouso a diferença de 
potencial registada é nula e não é 
registada nenhuma deflexão. 
 
Bernardo Manuel de Sousa Pinto ❖Faculdade de Medicina da Universidade do Porto 
Fisiologia I 
37 
 
Amplitude do sinal eléctrico 
A amplitude do sinal eléctrico registado ao nível do ECG depende de vários factores: 
1. Corrente gerada momentaneamente no interior do miocárdio, menos a anulação de forças 
associadas a ondas eléctricas que se propagam em direcções opostas. Isto significa que um 
bloqueio cardíaco é registado num ECG através de uma deflexão com mais amplitude. 
2. Massa miocárdica – Maior massa miocárdica está associada a deflexões com maior amplitude. 
A título de exemplo, a despolarização de um ventrículo hipertrofiado leva ao registo de uma 
deflexão com maior amplitude, comparativamente à despolarização de um ventrículo normal. 
Isto é explicado, porque no ECG são registadas diferenças de potencial existentes no meio 
extracelular. 
3. Factores extrínsecos – Estes factores estão geralmente associados a perdas de sinais eléctricos, 
antes de estes chegarem aos eléctrodos na superfície e devem-se sobretudo aos tecidos que se 
interpõem (nomeadamente os pulmões, o tecido adiposo e a parede torácica). Situações 
anómalas, como um derrame de sangue no pericárdio ou um excesso de tecido adiposo 
contribuem para essas perdas. 
 
Planos e derivações 
Como a electrografia lida com forças eléctricas, esta pode ser considerada vectorial, sendo o sentido do 
vector determinado pelo sentido do potencial eléctrico gerado pelo fluxo de corrente, enquanto o 
comprimento do vector é determinado pela voltagem do potencial. Como num mesmo momento se 
gera uma grande quantidade de forças eléctricas de diferente direcção e magnitude, o normal é registar 
o vector médio, ou seja, o vector resultante da actividade eléctrica na activação cardíaca 
(paralelamente, o vector instantâneo representa o conjunto de forças eléctricas que se propagam pelo 
coração num dado instante). O vector médio pode ser calculado para a fase de despolarização auricular, 
despolarização ventricular e repolarização ventricular. 
Foi referido que os eléctrodos funcionam analogamente a câmaras de vigilância, registando a 
propagação dos vários impulsos sob o seu ponto de vista. Dessa forma, e para ser registado o vector 
médio de forma tridimensional, é necessário o registo da propagação de estímulos em todos os 
sentidos. A colocação de eléctrodos nos membros, permite a determinação do plano frontal (ou seja, 
num plano coronal), isto é, a determinação das forças que se dirigem superiormente ou inferiormente e 
para a esquerda ou para a direita. Por outro lado, a determinação do plano horizontal (ou seja, do plano 
transversal) permite determinar se a propagação de estímulos está a ocorrer em direcção anterior ou 
posterior. 
 
 
Bernardo Manuel de Sousa Pinto ❖Faculdade de Medicina da Universidade do Porto 
Fisiologia I 
38 
 
Determinação do plano frontal e triângulo Einthoven 
A colocação de um eléctrodo no ombro esquerdo, de outro no ombro direito e de um último no púbis 
permite a obtenção de um triângulo equilátero em que o centro (teoricamente) corresponde ao centro 
da actividade eléctrica (triângulo de Einthoven). Na prática, os eléctrodos dos ombros são colocados 
nos respectivos braços, enquanto o eléctrodo do púbis é colocado na perna esquerda – isto não 
interfere com o registo do ECG, na medida em que o potencial eléctrico registado numa extremidade 
será o mesmo, seja qual for o local dessa extremidade, considerando-se, por isso os membros como 
extensões dos ombros e a perna esquerda como uma extensão do púbis. 
A colocação de eléctrodos 
nas regiões mencionadas 
permite obter três 
derivações bipolares (DI, DII 
e DIII), que permitem 
registar potenciais 
eléctricos no plano frontal. 
Em DI, o eléctrodo positivo 
encontra-se no braço 
esquerdo (LA) e, como tal, 
esta derivação regista a 
diferença de potencial entre 
o braço esquerdo (VLA) e o 
braço direito (VRA). Já em 
DII, o eléctrodo positivo 
encontra-se na perna 
esquerda (LL), sendo 
registada a diferença de 
potencial entre a perna 
esquerda (VLL) e o braço direito. Por fim, em DIII, o eléctrodo positivo encontra-se na perna esquerda, 
sendo registada a diferença de potencial entre a perna esquerda e o braço esquerdo. 
Desta forma, podemos concluir que, segundo as leis de Einthoven: 
 
Para determinar o plano frontal são ainda analisadas mais três derivações. Contudo, apesar de estas se 
localizarem nos membros, são unipolares. As derivações unipolares medem a diferença de potencial 
entre um eléctrodo indiferente e um eléctrodo explorador. 
O eléctrodo indiferente é constituído por três fios eléctricos que se encontram ligados entre si a um 
terminal central (que por sua vez está ligado ao pólo negativo do electrocardiógrafo) e cujas 
extremidadeslivres se ligam, simultaneamente, aos eléctrodos do braço esquerdo (LA), braço direito 
(RA) e perna esquerda (LL). Já o eléctrodo explorador liga-se ao membro em que se quer registar o 
potencial. O potencial “verdadeiro” desse membro é obtido através da diferença de potencial entre o 
potencial do membro (registado pelo eléctrodo explorador) e o potencial do eléctrodo indiferente. Uma 
vez que o potencial do eléctrodo indiferente é zero (porque a soma dos três potenciais é considerada 
nula), o potencial obtido pelo eléctrodo explorador corresponde directamente ao valor do potencial 
“verdadeiro” do membro em questão. 
Bernardo Manuel de Sousa Pinto ❖Faculdade de Medicina da Universidade do Porto 
Fisiologia I 
39 
 
Assim, é possível obter as três derivações adicionais – VL, VR e VF. VL corresponde ao potencial 
registado no braço esquerdo; VR corresponde ao potencial registado no braço direito e, por fim, VF 
corresponde ao potencial registado na perna esquerda. As três derivações constituem, no seu conjunto, 
as derivações unipolares não-aumentadas dos membros. 
 
Contudo, a amplitude destas três derivações pode ser aumentada através de uma alteração na técnica 
do registo, que consiste em desligar do terminal central a extremidade que está a ser explorada. Desta 
forma, é possível obter as derivações unipolares aumentadas dos membros – aVL, aVR e aVF; cujo 
conceito é o mesmo. 
Determinação do plano horizontal 
Para determinar o plano horizontal, recorre-se às seis 
derivações unipolares pré-cordiais. O eléctrodo 
indiferente mantém-se ligado às três extremidades já 
referidas, enquanto o eléctrodo explorador varia de 
posição ao longo da parede torácica. A posição das 
derivações pré-cordiais é a seguinte: 
 V1 - Quarto espaço intercostal, imediatamente à 
direita do esterno 
 V2 - Quarto espaço intercostal, imediatamente à 
esquerda do esterno 
 V3 - Equidistante entre V2 e V4 
 V4 – Quinto espaço intercostal, na linha médio-clavicular 
 V5 – No mesmo plano horizontal que V4, na linha axilar anterior 
 V6 – No mesmo plano horizontal que V4,na linha médio-axilar 
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40 
 
Propagação de um impulso eléctrico e registo no ECG 
O impulso eléctrico propaga-se rapidamente a partir do nó sinusal para as aurículas direita e esquerda. 
Aquando da despolarização auricular, as forças eléctricas encontram-se dirigidas inferiormente, para a 
esquerda e anteriormente. A despolarização auricular produz uma onda designada por onda P, que em 
DI, DII, aVF e V3-V6 corresponde a uma deflexão positiva, enquanto em aVR corresponde a uma deflexão 
negativa. Em aVL esta deflexão pode ser positiva, negativa ou bifásica (dependendo da posição 
anatómica do coração), enquanto, por fim, em V1, gera-se uma deflexão bifásica, em que a porção inicial 
é positiva e a porção final é negativa. 
A despolarização auricular progride desde as regiões adjacentes ao nó sinusal até às regiões mais distais 
das aurículas. A repolarização auricular progride também nesse mesmo sentido e, como tal, o vector da 
repolarização tem um sentido oposto, relativamente ao da despolarização e a deflexão desta onda 
gerada (onda Ta) é inversa à deflexão registada pela onda P. Contudo, num ECG, quase nunca vemos a 
onda Ta, porque esta surge em simultâneo com o complexo QRS, que “ofusca a sua presença”. 
O complexo QRS corresponde à despolarização ventricular. A despolarização ventricular ocorre do 
endocárdio para o epicárdio, sendo que a primeira porção do miocárdio ventricular que é activada é a 
porção antero-septal do ventrículo. As forças eléctricas encontram-se, neste momento, dirigidas para a 
direita, superiormente e anteriormente, sendo que, como apenas o septo está a ser despolarizado, as 
voltagens registadas são baixas. Deste modo, regista-se uma pequena deflexão negativa em DI, DII, DIII, 
aVF, aVL e V4-6, enquanto se regista uma deflexão positiva em aVR e V1-2. 
Segue-se a despolarização em força da maior parte da massa dos ventrículos esquerdo e direito. O 
vector resultante desta despolarização dirige-se para a esquerda, inferiormente e posteriormente, 
sendo marcadamente mais influenciado pela actividade do ventrículo esquerdo (pois este tem maior 
massa miocárdica que o direito). Assim sendo, regista-se uma deflexão positiva em DI, DII, DIII, aVF e V4-6 
e uma deflexão negativa em aVL, aVR e V1-2. 
A última região do ventrículo despolarizar é a região posterobasal do ventrículo esquerdo. Aqui, o vector 
resultante dirige-se para a direita e superiormente, o que implica a presença de uma pequena deflexão 
negativa em aVF e V4-6 e uma pequena deflexão positiva em aVR e V1. 
Devido às diferentes fases de despolarização ventricular, o complexo QRS é diferente ao longo das 
várias derivações, nomeadamente em termos dos segmentos que estes apresentam – por exemplo, 
existem complexos QRS constituídos por uma onda Q, uma onda R e uma onda S, mas também existem 
complexos QRS constituídos apenas por uma onda Q e uma onda R. 
 
 
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41 
 
 
A onda Q define-se como a primeira deflexão negativa antes da onda R, que, por sua vez, é definida 
como sendo a primeira onda de deflexão positiva registada no complexo QRS. Já, a onda S define-se 
como a primeira deflexão negativa depois da onda R. 
Por fim, no caso de estar presente uma segunda 
deflexão positiva, esta toma a designação de r’. É 
importante ressalvar que as pequenas deflexões (< 5 
mm) são representadas por letra minúscula, enquanto 
as grandes (>5 mm) são representadas por uma 
maiúscula. 
Assim, a despolarização do septo ventricular em DI 
corresponde à onda q (pois origina uma pequena 
deflexão negativa), enquanto em aVR corresponde à 
onda r (pois origina uma pequena deflexão positiva). 
Como tal, só podemos fazer corresponder uma dada 
onda (Q, R ou S) a uma determinada fase da 
despolarização ventricular, se especificarmos a 
derivação que estamos a considerar. 
Após a despolarização ventricular, ocorre o processo de repolarização ventricular, que gera a onda T. A 
repolarização é um fenómeno que não segue as mesmas vias da despolarização (não sendo um 
fenómeno propagado). De facto, enquanto a despolarização ocorre do endocárdio para o epicárdio, a 
repolarização inicia-se no epicárdio e transmite-se para o endocárdio – crê-se que o endocárdio contrai-
se em último lugar, porque, aquando da contracção ventricular, gera-se uma pressão elevada que reduz 
o fluxo coronário registado ao nível desta camada. O vector médio resultante da repolarização 
ventricular está orientado inferiormente, anteriormente e para a esquerda. Assim sendo, verificamos 
uma deflexão positiva em aVF e V3-6, negativa em aVL e aVR, enquanto em V1-2 tanto podemos registar 
uma deflexão positiva, como uma deflexão negativa. 
Nas derivações pré-cordiais esquerdas é ainda possível distinguir uma pequena onda U, após a onda T. 
Esta onda, que se encontra aumentada em situações patológicas, é de origem desconhecida, podendo-
se dever à recuperação do sistema His-Purkinje, ou à recuperação do miocárdio em áreas sem rede de 
Purkinje. 
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42 
 
Para além das ondas referidas, num electrocardiograma é importante considerar os seguintes 
intervalos: 
1. Intervalo PR: Intervalo de tempo entre o início da onda P e o início do complexo QRS. Apesar 
de este intervalo ser normalmente utilizado para estimar o tempo de condução através do nó 
AV, na verdade este intervalo corresponde ao tempo de condução atravésdas fibras 
internodais, nó AV, feixe de His e respectivos ramos. O seu valor normal varia entre 0,12 e 
0,20s, sendo que valores superiores podem indicar, por exemplo, um bloqueio aurículo-
ventricular de primeiro grau (que implica atrasos na condução); enquanto valores inferiores ao 
normal, devem-se à presença de uma “ponte” de tecido eléctrico, que não passe pelo nó AV e 
que esteja associada a uma condução mais rápida. 
2. Segmento PR: Este segmento encontra-se entre o final da onda P e o início do complexo QRS, 
sendo normalmente isoeléctrico (ou seja, idealmente, o segmento sobrepõe-se à linha de 
base). O tempo ideal deste segmento será inferior a 0,12s. 
3. Intervalo QT: Intervalo de tempo entre o início do complexo QRS e o final da onda T. Este 
intervalo mede a duração com a sístole cardíaca, variando de acordo com a frequência 
cardíaca. 
4. Segmento RS-T (ou ST): Este segmento é medido desde o fim do complexo QRS até ao início da 
onda T, devendo ser isoeléctrico (embora possam existir variações não-patológicas). O 
segmento ST corresponde ao período em que todo o miocárdio se encontra despolarizado, 
pois todos os dipólos em condições normais já desapareceram. Dessa forma, este segmento 
torna-se importante para compreender se existe um fenómeno isquémico no coração. De 
referir que o ponto onde começa o segmento ST e termina o complexo QRS designa-se por 
ponto J. 
5. Intervalo RR: Distância entre duas ondas R consecutivas, que num ritmo sinusal regular deve 
ser igual ao intervalo PP (distância entre duas ondas P consecutivas). 
 
Registo do ECG 
Apesar de ser muito simples, a técnica de registo do ECG requer alguns cuidados, nomeadamente: 
1. O paciente deve estar confortavelmente deitado numa plataforma que suporte todo o seu 
corpo. Deve estar em repouso e relaxado, pois os movimentos musculares podem alterar o 
registo. O paciente deve também estar em jejum, uma vez que as refeições causam alterações 
electrolíticas que podem dificultar a interpretação de um ECG. 
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Fisiologia I 
43 
 
2. Os eléctrodos devem ser desinfectados com álcool e neles deve ser aplicada pasta electrolítica. 
Os eléctrodos deve também estabelecer um bom contacto com a pele. 
3. A máquina deve estar adequadamente calibrada, de modo a reproduzir os registos no papel à 
escala padrão. Caso isso não aconteça, os traçados serão interpretados incorrectamente. 
4. O paciente e a máquina devem estar convenientemente ligados à terra, sendo essa ligação feita 
através da perna direita. 
Cálculo da frequência cardíaca 
O papel electrocardiográfico 
apresenta inúmeras 
quadrículas de 1mm de 
lado, apresentando linhas 
mais carregadas de 5 em 
5mm. O tempo (expresso 
em segundos) é medido no 
eixo das abcissas, enquanto 
o eixo das ordenadas diz 
respeito à voltagem 
(expressa em mV). Como a 
velocidade standard do 
papel é de 25 mm/s, 1 mm 
na horizontal corresponde normalmente a 0,04 s. Por outro lado, 1 mm na vertical corresponde em 
regra a 0,1 mV. 
A partir daqui é possível obter informações quanto à frequência cardíaca – na presença de um ritmo 
ventricular regular a fórmula aplicada é 
 
 
 ou, 
alternativamente, 
 
 
. Contudo, caso o ritmo seja 
irregular, a fórmula aplicada é: 
Ritmo sinusal 
Um ritmo pode ser classificado como sinusal, caso se verifiquem as seguintes condições: 
1. Presença da onda P antes do complexo QRS 
2. Onda P com posição espacial normal (positiva em DI, DII e aVF) 
3. Frequência adequada ao nó sinusal (entre 60 a 100 batimentos por minuto). 
O facto da terceira condição não se verificar não invalida necessariamente que um ritmo possa ser 
classificado como sinusal. De facto, a inspiração aumenta ligeiramente a frequência cardíaca (como se 
“retirasse inervação parassimpática ao coração”) e uma taxa de batimentos por minuto superior pode se 
dever, precisamente a este fenómeno natural, que é mais evidente nas crianças. 
Modificação tri-axial e construção de vectores médios 
O triângulo de Einthoven pode ser modificado, de forma a conseguirmos obter informações acerca do 
eixo eléctrico médio. O eixo eléctrico médio é definido por um vector com origem no centro do 
triângulo de Einthoven, sendo normalmente aplicado ao complexo QRS (embora também possa ser 
aplicado às ondas P e T). 
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44 
 
A modificação tri-axial do 
triângulo de Einthoven 
representa as derivações 
bipolares e unipolares dos 
membros, através dos 
ângulos estabelecidos entre 
as derivações. Por convenção, 
define-se que o pólo positivo 
de DI se encontra a 0º, 
enquanto o seu pólo negativo 
está a 180º. Como aVF é 
perpendicular a DI, o pólo 
positivo de aVF está a 90º, 
enquanto o pólo negativo se 
encontra a -90º. Como as três 
derivações bipolares dos 
membros formam um 
triângulo equilátero, entre si, não admira que quando projectadas em modificação tri-axial, cada 
derivação diste 60º de outra (
 
 
 ). 
Como já foi referido, os vectores médios podem ser calculados relativamente à onda P, complexo QRS e 
onda T, contudo, como a massa ventricular é maior, calculam-se os vectores médios, normalmente em 
função do complexo QRS. 
Cálculo do eixo eléctrico médio 
O cálculo do eixo eléctrico 
médio pode seguir uma 
abordagem geométrica, ou 
pode ser feito por simples 
análise do complexo QRS. 
Seguindo essa última via, 
começamos por determinar 
qual a derivação em que o 
complexo QRS é mais próximo 
de isoeléctrico (ou seja, em 
que as suas ondas estão mais 
próximas da linha de base). 
Depois, achamos derivação 
perpendicular, cuja amplitude 
é igual à amplitude do vector médio. Já o sinal do vector é igual ao sinal do complexo QRS nessa 
derivação perpendicular. 
Na imagem de exemplo (na página seguinte, à direita), constatamos que DI é a derivação mais 
isoeléctrica. Ora, aVF é a derivação perpendicular a DI, logo será aí que vamos achar o eixo eléctrico 
médio. Como o complexo QRS tem sinal positivo em aVF (forma uma deflexão, sobretudo, positiva), 
concluímos que o eixo é de +90º e não de -90º. O vector médio é representado com origem no centro, 
direcção vertical, sentido positivo (dos +90º) e amplitude igual à amplitude do complexo QRS. 
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Fisiologia I 
45 
 
Um eixo eléctrico médio de 90º é 
considerado normal. De facto, 
considera-se que um indivíduo 
com um eixo entre -30º e 110º 
tem um eixo eléctrico normal (o 
que faz todo o sentido, na medida 
em que a onda de propagação da 
despolarização ventricular, que 
num ECG é traduzida pelo 
complexo QRS, ocorre num 
sentido inferior e para a 
esquerda). Já um indivíduo, cujo 
eixo se encontre entre -30º e -90º 
apresenta um desvio esquerdo do 
eixo, algo que se pode dever, por 
exemplo, a uma hipertrofia 
ventricular esquerda. 
Paralelamente, um indivíduo, cujo 
eixo se encontre entre 110º e 180º apresenta um desvio direito do eixo, algo que se pode dever, por 
exemplo, a uma hipertrofia ventricular direita. Por fim, um indivíduo cujo eixo se encontre entre -90º e -
180º apresenta um desvio extremo do eixo. Dessa forma, conhecer o eixo eléctrico do coração revela-
se muito importante para a detecção de situações patológicas. 
 
Condições patológicas 
Arritmia 
Uma arritmia é uma alteraçãodo normal ritmo cardíaco. Existem dois tipos de arritmias - as 
taquiarritmias resultam numa frequência cardíaca mais elevada, enquanto as bradiarritmias resultam 
numa frequência cardíaca mais baixa. 
O mecanismo de reentrada é o principal causador de taquiarritmias. Este fenómeno verifica-se quando 
existe um bloqueio unidireccional, um circuito fechado de condução, em torno do qual se verifica a 
condução de potenciais de acção lentos. O bloqueio unidireccional é um fenómeno que impede a 
transmissão de impulsos num dado sentido, mas permite que estes se propaguem no sentido inverso. 
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Fisiologia I 
46 
 
Gera-se então um movimento de 
reentrância que, caso continue, geralmente 
ultrapassará a frequência de pacemaker do 
nó sinusal. Como o pacemaker mais rápido 
dita a taxa de batimentos cardíacos, as 
reentrâncias são responsáveis por um 
grande número de taquiarritmias. 
Taquiarritmias supra-ventriculares 
As taquiarritmias supra-ventriculares podem se manifestar de dois modos. Quando se verifica a 
presença de múltiplos mecanismos de microreentrada (a uma escala pequeníssima), estamos perante 
um fenómeno de fibrilação auricular, caracterizado pela despolarização em círculo das aurículas. Ao 
nível de um ECG, aquando de um caso de fibrilação auricular, não se verifica a presença de ondas P, 
porque os vários vectores, gerados pelas 
inúmeras despolarizações que ocorrem 
em múltiplos sentidos, anulam-se 
(quando muito, podem ser registadas 
microflutuações não organizadas). 
Apesar de este fenómeno impossibilitar a 
contracção auricular, ele é perfeitamente 
compatível com a vida normal, pois o nó 
AV, sendo bombardeado com estímulos, 
actua analogamente a um filtro, fazendo 
com que seja transmitido um ritmo 
irregularmente irregular aos ventrículos. 
Já num caso de flutter auricular, verifica-
se um fenómeno de macro-reentrada, 
que origina uma despolarização mais 
organizada e com menor frequência, 
comparativamente à situação de 
fibrilação auricular, mas que mesmo 
assim ainda não pode ser considerada 
uma despolarização normal. No ECG, o 
flutter auricular é evidenciado através de 
uma série de ondas serreadas (ondas F) 
em substituição das ondas P. Aquando 
deste fenómeno o nó AV é, mais uma 
vez, bombardeado por estímulos, actuando como um filtro. 
Extrassístoles 
As extrassístoles são definidas 
como sístoles fora de tempo, 
podendo ser classificadas como 
supra-ventriculares, ou 
ventriculares. As extrassístoles 
supra-ventriculares consistem em 
despolarizações automáticas 
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anormais, cujos estímulos provêm das aurículas, nó AV e porção supra-ventricular do feixe de His. Neste 
tipo de extrassístole verifica-se a presença de alterações na onda P, nomeadamente no que concerne ao 
seu tempo de duração (de resto, o trajecto e a despolarização é normal) e verifica-se a presença de 
complexos QRS normais. 
Por seu turno, as extrassístoles 
ventriculares estão associadas a 
despolarizações automáticas 
anormais com origem nas 
células de Purkinje ou porção 
ventricular do feixe de His. Num 
ECG, este tipo de extrassístoles é 
traduzido pela presença de QRS 
bizarros. 
Bloqueios AV 
Os bloqueios AV de 
1º grau caracterizam-
se pela presença de 
um atraso na 
condução AV. Num 
ECG isto traduz-se por 
um prolongamento do 
intervalo PR, cujo intervalo 
de tempo será superior a 
0,20s. Nos bloqueios AV de 
2º grau nem todos os 
estímulos das aurículas 
chegam aos ventrículos. 
Este é um meio-termo 
entre os bloqueios de 1º e 
os bloqueios de 3º grau. 
Os bloqueios AV de 3º 
grau caracterizam-se pela 
ausência de condução 
aurículo-ventricular, o que 
leva a que os estímulos 
gerados na região supra-ventricular não sejam transmitidos aos ventrículos. Assim sendo, nos 
ventrículos, as células da rede de Purkinje geram um pacemaker de escape, que não é compatível com a 
estabilidade hemodinâmica (note-se que estas células têm uma taxa de 20 batimentos por minuto). 
Assim sendo, não é de esperar que num ECG se observem ondas P independentes do complexo QRS, 
que por sua vez, decorre a um ritmo mais lento. 
Síndrome de Wolff-Parkinson-White 
A síndrome de Wolff-Parkinson-White é caracterizado pela presença de uma via de condução acessória, 
por entre as aurículas e os ventrículos. Esta via acessória é mais rápida, sendo composta, não por fibras 
de Purkinje, mas por células musculares, permitindo a condução de um potencial de acção directamente 
das aurículas para o septo ventricular, despolarizando porções de músculo septal mais precocemente do 
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Fisiologia I 
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que se esta 
ocorresse pela via 
tradicional. Como 
resultado, num 
ECG é observada 
uma onda delta 
no início do 
complexo QRS 
(correspondendo 
à despolarização 
inicial ou pré-
excitação) e o 
complexo QRS 
demora mais, não 
havendo deflexões tão acentuadas. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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Ciclo cardíaco 
O ciclo cardíaco é entendido como sendo a sequência de eventos eléctricos e mecânicos que se repete 
em cada batimento cardíaco, sendo a sua duração passível de ser calculada pela fórmula: 
 
 
 
 
Por exemplo, uma taxa de batimentos cardíacos de 75 batimentos por segundo corresponde a um ciclo 
cardíaco de 0,8s. 
Sístole e diástole 
O coração funciona como uma bomba, alternando entre uma fase de enchimento e uma fase de 
esvaziamento. Sob circunstâncias normais, o nó sinusal determina a duração do ciclo cardíaco e as 
propriedades eléctricas do sistema de condução cardíaco, enquanto os miócitos cardíacos determinam a 
duração relativa dos períodos de contracção e relaxamento. 
Em termos clínicos, é comum separar o ciclo cardíaco em duas grandes fases – a sístole diz respeito à 
etapa de contracção ventricular (período que decorre entre o encerramento da válvula mitral até ao 
encerramento da válvula aórtica), enquanto a diástole está relacionada com o relaxamento muscular, 
sendo que, num ciclo cardíaco normal a diástole prolonga-se por um intervalo de tempo maior, 
comparativamente à sístole. Contudo, à medida que a taxa de batimentos cardíacos aumenta (e, como 
tal, a duração do ciclo diminui), o intervalo de tempo ocupado pela diástole diminui mais 
comparativamente ao da sístole. 
A perspectiva clínica tem essa designação pelo facto de a divisão entre sístole e diástole ter correlação 
com a auscultação cardíaca – os sons cardíacos S1 e S2 encontram-se associados ao encerramento das 
válvulas AV e semilunares, respectivamente. Contudo, existe também uma perspectiva fisiológica, que 
considera a diástole como englobando todas as fases em que há diminuição ou menores níveis de cálcio 
citosólico. Assim sendo a “diástole fisiológica” é muito mais longa que a “diástole clínica”. 
Etapas do ciclo cardíaco 
Existem quatro grandes fases neste ciclo, definidas pelo estado de abertura das válvulas cardíacas (a 
saber – fecho da válvula AV, abertura da válvula semilunar, fecho da válvula semilunar e abertura da 
válvula AV). Contudo, costuma-se considerar um número superior de fases, com base não só nos 
estados de abertura das válvulas, mas também nos gradientes de pressão e na velocidade de fluxo 
sanguíneo.Por motivos descritivos, será considerada a perspectiva clínica para assinalar a sístole e a diástole e será 
explicado o que se passa no coração esquerdo (apesar de as etapas do ciclo serem similares nos dois 
lados do coração). 
Contracção isovolumétrica 
Quando os ventrículos começam a despolarizar inicia-se a fase da sístole. Os ventrículos contraem-se e, 
rapidamente, a pressão do ventrículo esquerdo excede a da aurícula esquerda. Como resultado, a 
válvula mitral fecha. Uma vez que a válvula aórtica se encontra fechada, nesta fase, o ventrículo 
esquerdo contrai-se com as válvulas aórtica e mitral fechadas. Como o sangue não tem local para se 
deslocar, verifica-se a presença de uma contracção isovolumétrica que resulta num aumento rápido de 
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Fisiologia I 
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pressão no ventrículo esquerdo. A pressão ao nível desta cavidade acaba por exceder a pressão aórtica, 
o que causa a abertura da válvula aórtica. 
 
Fase de ejecção 
A fase de ejecção inicia-se com a abertura da válvula aórtica. A primeira parte desta etapa é designada 
por fase de ejecção rápida e é caracterizada pela continuação do aumento da pressão ao nível do 
ventrículo. Este aumento de pressão é acompanhado de perto por uma rápida elevação da pressão 
aórtica. Estes aumentos rápidos de pressão são acompanhados por uma redução do volume ventricular, 
à medida que o sangue flui para a aorta. Desta forma, a pressão aórtica continua a subir e, 
eventualmente, excede a pressão ventricular (início da fase de ejecção lenta). 
Apesar da alteração verificada ao nível do gradiente de pressão entre a aorta e o ventrículo esquerdo, as 
valvas da válvula aórtica não fecham de imediato, devido à inércia associada ao fluxo sanguíneo, que 
está na base de uma grande quantidade de energia cinética no sangue. Assim sendo, durante a etapa 
final da fase de ejecção lenta, o decréscimo do volume ventricular torna-se mais lento e quer a pressão 
ventricular, quer a pressão aórtica diminuem acentuadamente. De referir que, durante a fase de 
ejecção, cerca de 70 mL de sangue flui para a aorta, sendo deixados cerca de 50 mL de sangue no 
ventrículo (volume residual). 
Relaxamento isovolumétrico 
No final da fase de ejecção, o fluxo sanguíneo através da válvula aórtica decresce para valores 
extremamente baixos, até que começa a reverter a sua direcção (i.e. gera-se um fluxo retrógrado ou 
negativo). Nesta altura, a válvula aórtica fecha, iniciando-se assim a diástole. O fluxo sanguíneo na aorta 
torna-se de novo positivo (i.e. passa-se a deslocar de novo em sentido anterógrado), pois ocorre um 
aumento de pressão na aorta (em termos gráficos, observamos uma tendência de decréscimo da 
pressão aórtica, a incisura dícrota, interrompida por uma deflexão positiva, a onda dícrota). 
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Uma vez que, quer a válvula aórtica, quer a válvula mitral, se encontram fechadas e o sangue não pode 
entrar o ventrículo esquerdo, o período descrito no parágrafo anterior é designado por fase de 
relaxamento isovolumétrico. De referir que esta fase é caracterizada por uma rápida queda de pressão 
no ventrículo esquerdo. 
Período de enchimento ventricular rápido 
Quando a pressão ventricular cai para níveis inferiores aos da aurícula esquerda, a válvula mitral abre e, 
imediatamente, o volume sanguíneo do ventrículo esquerdo começa a aumentar rapidamente. Inicia-se 
então o período de diástole, cuja duração decresce com aumento da frequência cardíaca (algo 
conseguido, sobretudo, à custa de uma diminuição do período da diastase). 
Durante este período de enchimento ventricular rápido, as pressões na aurícula esquerda e ventrículo 
esquerdo evoluem em paralelo, uma vez que a válvula mitral se encontra amplamente aberta. 
Simultaneamente, a válvula aórtica mantém-se fechada, contudo, a pressão aórtica desce. Isto deve-se 
ao facto do sangue continuar a fluir da aorta proximal à válvula aórtica para regiões mais periféricas, o 
que acarreta a retracção da parede elástica da aorta. 
Diastase 
Durante a diastase, a válvula mitral mantém-se aberta, mas a quantidade de sangue que flui da aurícula 
esquerda para o ventrículo esquerdo é reduzida. Consequentemente, o volume de sangue ventricular 
aumenta lentamente e aproxima-se de uma fase de plateau. As pressões em ambas as cavidades 
(aurícula e ventrículo esquerdo) aumentam ligeiramente, devido ao facto de a pressão nas veias 
pulmonares ser ligeiramente maior, sendo que a pressão auricular continua a superar ligeiramente a 
pressão ventricular, devido ao facto de a válvula mitral se encontrar amplamente aberta e de o fluxo 
entre as duas cavidades ser mínimo. De referir que onda P do electrocardiograma ocorre no final desta 
fase. 
Contracção auricular 
Imediatamente após a diastase, ocorre uma fase de contracção auricular, que leva a um aumento 
variável da quantidade de sangue que entra no ventrículo esquerdo. Num indivíduo em repouso, a 
contracção auricular transfere para o ventrículo esquerdo uma quantidade de sangue que representa 
menos de 20% do volume sanguíneo que chega ao ventrículo, embora durante o exercício físico intenso 
esta percentagem possa atingir os 40%. 
A contracção auricular leva a um ligeiro aumento na pressão intra-auricular e a um aumento comparável 
na pressão e volume ventriculares. Concomitantemente, a pressão aórtica continua a diminuir, como 
resultado do fluxo de sangue para a periferia. 
Diferenças entre o lado esquerdo e o lado direito do coração 
As alterações de volume ocorridas no ventrículo esquerdo são as mesmas que as ocorridas no ventrículo 
direito, uma vez que os outputs cardíacos são teoricamente idênticos nas duas cavidades. Já no que 
concerne aos gráficos de pressão, estes são similares no lado esquerdo e no lado direito, excepto no que 
diz respeito ao facto de as pressões do lado direito serem proporcionalmente menores às registadas no 
lado esquerdo. 
Em termos temporais verifica-se a presença de um desfasamento temporal entre o coração esquerdo e 
o coração direito – a contracção auricular e a abertura da válvula AV ocorre mais precocemente no lado 
direito (pois é lá que se localiza o nó sinusal), mas a primeira válvula AV a encerrar é a válvula mitral. Por 
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outro lado, verifica-se que a abertura da válvula pulmonar antecede a abertura da válvula aórtica, na 
medida em que é necessária mais pressão para que ocorra a abertura da válvula aórtica. Contudo, uma 
vez que o ventrículo esquerdo exerce mais força de contracção, a fase de ejecção ocorre mais 
rapidamente no lado esquerdo, de tal modo que a válvula aórtica encerra primeiro que a válvula 
pulmonar. 
 
Ansas pressão-volume 
Um ciclo cardíaco pode ser representado por um gráfico que represente a pressão em função do volume 
(e não a pressão ou o volume em função do tempo), gráfico esse que toma o nome de ansa pressão-
volume. Apesar do tempo não se encontrar explicitamente presente no gráfico, pode ser feita uma 
análise sequencial dos eventos ocorridos no ciclo, se analisarmos o gráfico no sentido contrário ao dos 
ponteiros do relógio. Todavia, a distância entre dois pontos da ansa não é proporcional ao tempo 
decorrido. 
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Análise das ansas pressão-volume 
A análise da ansa pressão-volume permite concluir que após se dar a ejecção de sangue a partir do 
ventrículo, este não fica totalmente vazio, mas sim com uma determinada quantidadede sangue, a qual 
é designada por volume residual. O volume de sangue que é ejectado a partir dos ventrículos é 
designado por volume de ejecção, sendo que a fracção de ejecção (ou seja, a proporção de sangue que 
é ejectada pelo ventrículo) é calculada pela seguinte fórmula: 
 
 
 
 
O volume de sangue telessistólico é o volume de sangue presente no final da sístole, enquanto o 
volume de sangue telediastólico é o volume de sangue presente no final da diástole e representa o 
“volume de sangue ventricular máximo”. Obviamente que a diferença entre o volume de sangue 
telediastólico e o volume de sangue sistólico corresponde ao volume de ejecção. A partir dessa 
diferença é igualmente possível calcular o débito cardíaco, que consiste no volume de sangue ejectado 
por unidade de tempo. 
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O trabalho de ejecção calculado é calculado através da quantidade de sangue deslocada a uma pressão 
constante (W=Pressão x Volume de sangue). Em termos práticos, o trabalho de ejecção pode ser 
calculado, por via da determinação da área da ansa de pressão. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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Determinantes da função sistólica 
A função cardíaca ventricular é determinada por quatro factores principais intimamente relacionados – 
a pré-carga, a pós-carga, a contractilidade (ou inotropismo) e a frequência de contracção. Contudo, para 
fins descritivos, será feita a análise separada de cada determinante (quer para o músculo isolado, quer 
para o coração intacto). 
Pré-carga 
No músculo isolado, a pré-carga 
é passível de ser definida como a 
tensão aplicada ao músculo 
antes de este iniciar a sua 
contracção, o que determina 
directamente o seu estiramento 
passivo. Ao nível do músculo 
cardíaco, a tensão passiva 
aumenta com o comprimento de 
forma exponencial, ou seja, a 
partir de um dada altura, a 
tensão aumenta 
exponencialmente em resposta a 
pequenos aumentos de 
comprimento, o que impede o 
estiramento excessivo do 
músculo. 
Atendendo à definição de pré-carga, esta deverá ser quantificada antes de ocorrer a contracção 
ventricular, ou seja, ao nível da telediástole. A tensão telediastólica exercida na parede ventricular 
determina o comprimento das fibras musculares em repouso, mas como essa medição é algo difícil, 
assume-se, para simplificar, que a forma do ventrículo esquerdo é, de grosso modo, esférica. Assim, 
calculando a pressão ou o volume telediastólico é possível aplicar a lei de Laplace, (segundo a qual a 
tensão da parede de uma cavidade é directamente proporcional ao seu diâmetro interno e à pressão no 
seu interior, sendo 
inversamente proporcional à 
espessura da sua parede) e 
quantificar a pré-carga. 
Os efeitos da pré-carga são 
passíveis de ser traduzidos 
pela lei de Frank-Starling, 
segundo a qual um aumento 
do volume ventricular 
telediastólico provoca um 
aumento do volume de 
ejecção ou da pressão 
isovolumétrica máxima 
desenvolvida. Isto é, no 
coração intacto, aquando de 
um aumento da pré-carga 
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(correspondente a um aumento do volume/pressão em telediástole), o ventrículo passa a ejectar uma 
quantidade de sangue maior, de tal modo que o volume e a pressão sanguínea em telessístole serão os 
mesmos, qualquer que seja a pré-carga aplicada. Isto é análogo ao aumento do encurtamento muscular 
cardíaco, que ocorre no músculo cardíaco isolado em condições isotónicas, aquando do aumento da 
pré-carga. 
Paralelamente, caso o aumento da pré-carga seja registado em ciclos cardíacos isovolumétricos, ocorre 
um aumento da pressão isovolumétrica desenvolvida. Isto é passível de ser comparado ao maior 
desenvolvimento de tensão, que ocorre no músculo cardíaco isolado, aquando de contracções 
isométricas, por via de um aumento de pré-carga. 
Mecanismos moleculares subjacentes 
Em termos moleculares, aquando de um aumento da pré-carga, verifica-se um aumento da afinidade da 
troponina C para o cálcio e uma facilitação do estabelecimento de pontes cruzadas. Por outro lado, um 
aumento da pré-carga não resulta numa diminuição da função cardíaca, algo que se deve ao facto de a 
rigidez da parede ventricular aumentar exponencialmente a partir de determinados valores do 
comprimento dos sarcómeros (mesmo se a pressão intra-ventricular telediastólica for aumentada para 
valores da ordem dos 100 mm/Hg, o comprimento do sarcómero dificilmente ultrapassa os 2,2 μm). 
Factores determinantes e importância de alterações na pré-carga 
Alterações na pré-carga são essenciais para a regulação da função cardíaca, sendo que estes 
mecanismos de ajuste ocorrem ciclo a ciclo. São vários os factores que determinam alterações na pré-
carga, nomeadamente o retorno venoso, o volume total de sangue e sua distribuição, a função cardíaca 
diastólica e a actividade auricular. Como tal a importância da pré-carga para a regulação cardíaca 
manifesta-se aquando de diversas situações: 
1. Alterações do retorno venoso – Uma alteração do retorno venoso provoca uma alteração da 
pré-carga, o que, por sua vez, leva a ajustes na função cardíaca, nesse mesmo ciclo onde ocorre 
a alteração venosa. Este mecanismo é importante aquando de alterações posturais, do volume 
de sangue, da resistência vascular periférica e aquando dos movimentos respiratórios. 
2. Desequilíbrio do débito dos dois ventrículos – A alteração no volume de ejecção de um dos 
ventrículos leva a que o retorno venoso ao ventrículo contralateral seja afectado, passados 
alguns ciclos cardíacos. O mecanismo de Frank-Starling permite que ocorra um ajuste do débito 
cardíaco ventricular, aquando de alterações do débito cardíaco no ventrículo contralateral. Isto 
impede que quando o débito cardíaco aumenta num ventrículo, se acumule sangue a montante 
do ventrículo contralateral, algo que se revela essencial aquando de várias situações fisiológicas 
(por exemplo, para o equilíbrio do débito dos dois ventrículos durante os movimentos 
respiratórios) ou patológicas. 
3. Reforço da função auricular – A pré-carga é um importante factor determinante para a função 
do músculo da parede auricular, na medida em que quanto maior o volume sanguíneo presente 
nas aurículas antes da sua contracção, mais potente será a contracção auricular (e daí que 
maior retorno venoso resulte também numa contracção auricular mais poderosa), e maior será 
a pré-carga ventricular. Isto revela-se fundamental quando o enchimento ventricular é muito 
dependente da contracção auricular, algo característico do exercício físico, onde a frequência 
cardíaca está aumentada e, consequentemente, o tempo de enchimento ventricular está 
diminuído. 
4. Volume cardíaco inferior ao normal – Quando o volume cardíaco telediastólico é inferior ao 
normal (por exemplo, aquando do exercício físico, quando se verifica um aumento da 
frequência cardíaca e consequente diminuição do tempo de enchimento) o mecanismo de 
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Frank-Strarling continua activo, sendo que, qualquer variação adicional de volume 
telediastólico está associada a uma alteração do volume de ejecção, no mesmo sentido (isto é, 
por exemplo, caso o volume telediastólico aumente, o volume de ejecção também aumenta. 
5. Condições patológicas – Aquando da presença de uma frequência cardíacamuito baixa, ou de 
insuficiência cardíaca, verifica-se um aumento da pré-carga (por via de um enchimento 
ventricular superior ao normal), algo que está associado a um aumento do volume de ejecção 
para valores compatíveis com a vida. 
Pós-carga 
A pós-carga é passível de ser definida, no músculo cardíaco isolado, como sendo a tensão exercida no 
músculo depois de este ter iniciado a sua contracção, isto é, como sendo o somatório das cargas que o 
músculo terá de “vencer” para se encurtar. Aplicando esta definição ao coração intacto, a pós-carga 
pode ser definida como a tensão exercida sobre as fibras da parede ventricular, aquando da ejecção. 
A avaliação da tensão da parede ventricular (pós-carga) é mais difícil comparativamente à da pré-carga. 
Embora a lei de Laplace se mantenha válida, é necessário ter em atenção que a pós-carga não é 
constante, pois ocorre diminuição dos diâmetros ventriculares, variação da pressão interventricular e 
aumento da espessura da parede ventricular. De referir que a avaliação da pós-carga pode ser levada a 
cabo por avaliação da impedância aórtica, embora na prática clínica, essa quantificação precisa esteja 
associada a várias dificuldades de ordem técnica (podendo se proceder à aproximação grosseira da 
quantificação da pós-carga através da medição da pressão arterial sistólica). 
No coração intacto, um aumento da pós-carga está associado a uma diminuição da velocidade e volume 
de ejecção (o que corresponde, no músculo isolado, a uma diminuição da velocidade e grau de 
encurtamento, respectivamente). A pós-carga (e, como tal, a resistência à ejecção) pode ser de tal modo 
elevada, que a ocorrência de ejecção ventricular se torna impossibilitada – a velocidade de ejecção é 
nula e origina-se um ciclo isovolumétrico (o que equivale a uma contracção isométrica do músculo 
isolado). Por outro lado, quando a pós-carga é nula, teoricamente, a velocidade de ejecção é máxima, 
sendo que o valor da velocidade máxima de ejecção, apesar de não ser afectado pela pré-carga, é 
bastante sensível à contractilidade. 
 
Determinantes da pós-carga ventricular 
A pós-carga ventricular esquerda é determinada, no coração intacto, pela resistência vascular periférica, 
pela impedância aórtica, pelas características físicas da parede vascular arterial, pelo volume de sangue 
na aorta e pela viscosidade sanguínea. Por outro lado, a pós-carga ventricular direita é determinada pela 
resistência vascular pulmonar, pela impedância do tronco pulmonar, pelas características físicas da rede 
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arterial pulmonar, pelo volume de sangue na artéria pulmonar e pela viscosidade sanguínea. Para além 
disso, segundo a lei de Laplace, também o diâmetro e a espessura ventricular são componentes 
importantes da pós-carga. Desta forma e, dado que a elevação da pré-carga é determinada pelo 
aumento do comprimento pré-contráctil das fibras musculares do ventrículo, o aumento do volume 
telediastólico aumenta não só a pré-carga, mas também a pós-carga. De referir que, a elevação da pós-
carga ocorre por via da diminuição da espessura da parede ventricular e aumento dos diâmetros 
ventriculares. 
Importância de alterações na pós-carga 
Tal como a pré-carga, também a pós-carga se revela essencial para a regulação da função cardíaca em 
várias situações: 
1. Regulação da pressão arterial – Alterações na pressão arterial estão associadas a alterações da 
pós-carga no mesmo sentido e, como tal, a alterações no sentido oposto do volume de ejecção 
e débito cardíaco (a título de exemplo, o aumento da pressão arterial leva a um aumento da 
pós-carga ventricular, o que está associado a um menor volume de ejecção e a um menor 
débito cardíaco). 
2. Resposta ventricular a um aumento súbito da pressão aórtica – Um aumento súbito da 
pressão aórtica leva a um aumento da pós-carga ventricular, associado a uma diminuição 
imediata do volume de ejecção. Contudo, após o registo deste fenómeno, após alguns ciclos 
verifica-se a recuperação parcial da função cardíaca (mecanismo de regulação homeométrica). 
Este mecanismo de regulação não ocorre à conta de alterações no comprimento muscular, 
embora os processos que lhe estão associados também ainda não estejam completamente 
esclarecidos – alguns autores defendem que ocorre um aumento da contractilidade, secundário 
à elevação da profusão coronária e à recuperação de um isquemia subendocárdica transitória, 
enquanto outros defendem que isto ocorre por via de um aumento da pré-carga, em 
consequência da diminuição do volume de ejecção (mecanismo de Frank-Starling). 
3. Equilíbrio do débito dos dois ventrículos – Tal como a pré-carga, a pós-carga desempenha um 
papel fundamental no equilíbrio do débito dos dois ventrículos; quando um ventrículo diminui 
o volume de ejecção, isso repercute-se através da acumulação de sangue a montante desse 
ventrículo, o que leva a que se verifique um aumento da pós-carga no ventrículo contralateral. 
Esse aumento da pós-carga leva a uma diminuição do volume de ejecção por parte do 
ventrículo e, como tal, ao equilíbrio do débito dos dois ventrículos. 
4. Condições patológicas – O aumento da pós-carga está associado a um agravamento de 
patologias caracterizadas pela diminuição da contractilidade (como a insuficiência cardíaca). 
Isto explica porque é que se registam melhorias em doentes tratados com fármacos que 
diminuem a pós-carga (tais como os anti-hipertensores). 
Contractilidade (inotropismo) 
Alterações do inotropismo, também designado por contractilidade, estão associadas a alterações na 
velocidade e grau de encurtamento ou do desenvolvimento de tensão pelo músculo cardíaco intacto, 
para um determinado nível fixo de pré-carga e pós-carga. Desta forma, um aumento da contractilidade 
está associado a um aumento da velocidade e da capacidade de desenvolvimento de tensão ao nível das 
contracções isométricas; e a um aumento do grau e velocidade de encurtamento muscular, aquando de 
contracções isotónicas. Paralelamente, no coração intacto, não fazendo variar nem a pré-carga, nem a 
pós-carga, um aumento da contractilidade está associado a um aumento da pressão máxima 
desenvolvida nos ciclos isovolumétricos; e a um aumento do volume e velocidade de ejecção nos ciclos 
cardíacos com fase de ejecção. 
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A avaliação da contractilidade requer, 
normalmente, a análise da força, 
comprimento, velocidade e tempo, 
sendo que enquanto no músculo 
isolado, a contractilidade é avaliada 
por via das relações tensão activa-
comprimento e velocidade de 
encurtamento-tensão; ao nível do 
coração intacto costumam-se utilizar 
relações pressão-volume. Analisando 
um gráfico velocidade de 
encurtamento-tensão que compare 
duas situações em que ocorre 
variação de contractilidade mas a 
carga se mantém, constata-se que 
situações de maior contractilidade 
estão associadas a um maior valor da 
tensão máxima passível de ser 
desenvolvida pelo músculo em 
contracção isométrica, bem como a 
uma maior velocidade de 
encurtamento máxima (velocidade 
de encurtamento a carga nula). Este 
último parâmetro é útil como 
indicador da contractilidade na 
medida em que, para além de ser 
sensível a alterações de 
contractilidade, não é influenciado 
pela pré-carga. Já ao nível do coração 
intacto, o declive da relação pressão-
volume telessistólica, também 
designado por elastância máxima, é 
um bom indicador da contractilidade, 
pois este é independente da carga. 
Por análise das ansas pressão-volume 
para situações dediferente 
contractilidade, mas em que a carga 
seja mantida, observa-se que 
aumentos da contractilidade levam, 
não só a um aumento do volume de 
ejecção, como também a maiores 
declives na relação pressão-volume 
telessistólica (como seria de esperar, 
a tendência com que se verificam 
estes fenómenos é oposta, aquando 
de uma diminuição da 
contractilidade). 
 
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Factores determinantes do inotropismo 
A alteração da contractilidade cardíaca é determinante para a modulação da função cardíaca, sendo 
influenciada por diferentes factores tais como: 
1. Sistema nervoso autónomo (nomeadamente por via do sistema nervoso simpático) – Os 
terminais simpáticos do coração libertam catecolaminas, que constituem o mais importante 
factor de regulação da contractilidade miocárdica. Assim sendo, as variações no número de 
impulsos nos nervos cardíacos adrenérgicos estão sobretudo associadas a variações rápidas do 
inotropismo. Por outro lado, a libertação de catecolaminas por parte da medula supra-renal 
tem efeitos cardíacos mais lentos, podendo ter alguma relevância em situações patológicas 
como a insuficiência cardíaca congestiva, ou a hipovolémia. Por fim, o sistema nervoso 
parassimpático induz um efeito inotrópico negativo a nível auricular, desempenhando, 
contudo, um papel pouco relevante no que concerne à contractilidade cardíaca em termos 
gerais. 
2. Endotélio cardíaco – O endotélio cardíaco compreende o endotélio epicárdico e o endotélio 
vascular coronário e é um importante modulador da função cardíaca, desempenhando um 
efeito inotrópico positivo. Os efeitos do endotélio na função cardíaca fazem-se, provavelmente, 
sentir através da libertação de várias substâncias tais como o monóxido de azoto (NO), a 
endotelina 1 (ET1) e a prostaciclina (PGI2). Para além disso, pensa-se que os efeitos cardíacos 
de várias substâncias são influenciados pelo endotélio. Entre essas últimas substâncias 
destaque para os agonistas α1, peptídeo natriurético auricular, vasopressina, 5-
hidroxitriptamina, angiotensinas I e II, ET1 e dadores de NO, tais como o nitroprussiato de 
sódio. 
3. Hormonas – A contractilidade miocárdica é passível de ser influenciada por várias hormonas. 
De entre as hormonas com efeito inotrópico positivo, destaque para as angiotensinas I e II, 
cortisol, vasopressina (ADH), glicagina e hormonas T3 e T4. Já o peptídeo natriurético auricular 
apresenta um efeito inotrópico negativo. Para além da contractilidade, algumas hormonas têm 
capacidade de influenciar a pré-carga, a pós-carga e a frequência cardíaca, sendo que as 
hormonas que conseguem actuar ao nível da carga, fazem-no através de efeitos que exercem 
na vasomotricidade e/ou natriurese. 
Importância de alterações no inotropismo 
As alterações da contractilidade cardíaca têm uma grande influência na função cardíaca, registando-se 
esse tipo de alterações aquando de várias situações fisiológicas e patológicas, nomeadamente: 
1. Alterações hemodinâmicas - Alterações na pressão arterial estão associadas a alterações na 
contractilidade no sentido oposto. A título de exemplo, uma diminuição da pressão arterial leva 
a um aumento da contractilidade (e vice-versa), o que por sua vez, leva a um aumento do 
débito cardíaco e consequente aumento da pressão arterial. 
2. Extra-sístoles e variações da frequência cardíaca – Uma extra-sístole ou um aumento da 
frequência cardíaca aumentam a contractilidade do miocárdio (relação força-frequência) 
3. Alterações metabólicas – Aquando de isquemia, hipoxia ou acidose registam-se alterações 
metabólicas que diminuem a contractilidade e, como tal, a função cardíaca. 
4. Patologia endócrina – Os seus efeitos na contractilidade variam consoante o tipo de hormona 
em questão e os seus níveis plasmática. O hipertiroidismo, o hipotiroidismo e tumores do 
córtex da supra-renal são exemplos de patologias endócrinas que influenciam a 
contractilidade. 
5. Perturbações da estrutura e função cardíaca – Existem duas possibilidades no que toca a 
perturbações da estrutura e função cardíaca. Numa situação de necrose miocárdica (da qual é 
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exemplo a situação de enfarte do miocárdio) verifica-se um aumento compensatório da 
contractilidade da porção do miocárdio que não sofreu necrose. Este mecanismo, juntamente 
com o aumento da pré-carga, entre outros factores, permite a manutenção da função cardíaca 
global. Por outro lado, numa situação de insuficiência cardíaca ocorre uma diminuição da 
contractilidade miocárdica, sendo estimulados outros mecanismos que procurem aumentar a 
função cardíaca. Todavia, em situações graves, a acção destes mecanismos nem sempre é 
suficiente para manter uma função cardíaca que assegure as necessidades do organismo. 
6. Resposta a fármacos – No que concerne à acção dos fármacos sobre a contractilidade cardíaca 
esta pode ser de dois tipos – os fármacos inotrópicos positivos promovem um aumento da 
contractilidade e neles se incluem a cafeína, os glicosídeos, os cardiotónicos e as aminas. Por 
outro lado, os fármacos inotrópicos negativos promovem o efeito inverso e deles são exemplo 
os bloqueadores β, os bloqueadores de canais de cálcio e a maioria dos anestésicos gerais e 
locais. 
Frequência de contracção 
A frequência de contracção, assim como a sequência com que são gerados os potenciais de acção, têm 
importantes implicações ao nível da força desenvolvida ou do grau de encurtamento do músculo 
cardíaco isolado. Assim sendo, um aumento da frequência de contracção está inicialmente associado a 
uma diminuição da força desenvolvida, à qual se segue um período de recuperação da força 
desenvolvida, até que o seu valor consegue ultrapassar o inicial. Deste modo, no cômputo geral, um 
aumento da frequência de contracção tem um efeito inotrópico positivo (relação força-frequência ou 
efeito de Bowditch), cuja exuberância é tanto maior, quanto maior for o aumento da frequência de 
contracção. 
A diminuição inicial da força desenvolvida, que se verifica aquando de um aumento da frequência de 
contracção, deve-se à incompleta recuperação das reservas de cálcio por parte do retículo 
sarcoplasmático e outros locais de armazenamento – durante o relaxamento muscular, embora o cálcio 
seja bombeado activamente para esses locais, é necessário algum tempo (500ms a 800ms) para que o 
cálcio reabsorvido possa estar disponível para ser libertado em resposta a uma próxima despolarização. 
Deste modo, quando ocorre um aumento da frequência de contracção, diminui o tempo entre duas 
contracções sucessivas (que corresponde ao período de recuperação das reservas de cálcio), o que 
explica que se verifique 
uma diminuição da 
quantidade de cálcio 
disponível para a 
contracção. 
Contudo, após se 
verificar este fenómeno, 
regista-se um aumento 
progressivo da força 
desenvolvida, algo que 
se deve ao facto da 
concentração 
intracelular do cálcio 
aumentar gradualmente 
durante a contracção 
muscular. Isto ocorre 
devido ao maior número 
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de despolarizações por minuto registadas, bem como a um aumento do fluxo de cálcio para o 
sarcoplasma em cada despolarização (por via da estimulação da actividade reabsorptiva do retículo 
sarcoplasmático). 
Contracções prematuras 
Por outro lado, contracções prematuras também alteram a função do músculo isolado, por via de 
alterações da cinética do cálcio. Ao estimular prematuramente um músculo, verifica-se umadiminuição 
da força de contracção, tanto mais acentuada, quanto menor o intervalo de tempo entre a contracção 
normal e a contracção prematura. Este fenómeno é análogo à etapa inicial registada aquando de um 
aumento da frequência de contracção, podendo ser igualmente explicado pela incompleta recuperação 
das reservas de cálcio ao nível do retículo sarcoplasmático e de outros locais de armazenamento. 
Todavia, a contracção prematura é sucedida por uma pausa prolongada e por uma contracção muscular 
que desenvolve mais força que 
o normal, verificando-se que, 
no cômputo geral, a presença 
de contracções prematuras está 
associada a um efeito 
inotrópico positivo. De referir 
que esse efeito é tanto mais 
acentuado, quanto mais 
prematura tiver sido a 
contracção extra. Isto é passível 
de ser explicado pelo facto de, 
aquando do período de 
repouso, os locais de 
armazenamento reabsorverem 
uma maior quantidade de 
cálcio, que depois estará 
disponível para ser libertado 
durante a fase de contracção. 
Aumento da frequência de contracção no coração intacto 
Ao nível do coração intacto, o aumento da frequência de contracção induz também um efeito inotrópico 
positivo, através da relação força-frequência, embora de modo menos pronunciado que no músculo 
isolado. Apesar disso, a frequência cardíaca é um dos mais importantes factores que contribui para o 
débito cardíaco: 
 
Apesar do aumento da frequência cardíaca estar associado a um aumento da contractilidade cardíaca, 
este fenómeno está também implicado numa diminuição do tempo de enchimento ventricular. O 
aumento da contractilidade e a diminuição do tempo de enchimento ventricular induzem efeitos 
opostos no volume de ejecção – o primeiro efeito está associado a um maior volume de ejecção, 
enquanto o segundo está associado a um menor volume. Desta forma, quando se avaliam os efeitos da 
frequência no débito cardíaco, convém ter em conta a importância relativa dos vários factores que 
influenciam o volume de ejecção. A título de exemplo, se for colocado um pacemaker que aumente 
amplamente a frequência, o débito cardíaco manter-se-á, de grosso modo, constante, pois diminui o 
tempo de enchimento ventricular e o volume de ejecção diminui. Contudo, numa situação de exercício 
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físico, verifica-se simultaneamente um aumento da frequência cardíaca e um aumento do débito 
cardíaco. Isto porque, embora o volume de ejecção diminua (tal como no exemplo anterior), o retorno 
venoso aumenta. Assim, verifica-se que a frequência cardíaca revela-se fundamental na regulação do 
débito cardíaco, aquando do exercício físico. 
Extrassístoles 
Ao nível do coração intacto, podem-se verificar a presença de extrassístole, cujo efeito é similar ao das 
contracções prematuras no músculo isolado. Isto significa que ao nível da extrassístole, ocorre uma 
diminuição da função cardíaca tanto mais acentuada, quanto mais prematura tiver sido a extrassístole 
(devido à incompleta recuperação das reservas de cálcio). Todavia, tal como ocorre com as contracções 
prematuras, a extrassístole é sucedida por um período de pausa prolongada e por um ciclo cardíaco cuja 
função se encontra aumentada. É importante, contudo, ressalvar que este aumento da função cardíaca 
(designado por potenciação pós-extra-sistólica) não se deve apenas a uma maior libertação de cálcio 
aquando da contracção, mas também ao facto da pausa prolongada propiciar a um enchimento 
ventricular mais eficaz (aumento da pré-carga), que por via do mecanismo de Frank-Starling aumenta a 
função cardíaca. 
Determinantes da frequência cardíaca 
No que concerne aos determinantes da frequência cardíaca, destaque para os dois principais: 
1. Automatismo intrínseco do nó sinusal – Este factor é influenciado por factores tais como a 
temperatura e o metabolismo. De facto, a febre e o hipertiroidismo estão associados a um 
efeito cronotrópico positivo, enquanto a hipotermia e o hipotiroidismo induzem no efeito 
inverso. 
2. Sistema nervoso autónomo – O sistema nervoso simpático está implicado num efeito 
cronotrópico positivo, enquanto o sistema nervoso parassimpático tem um efeito cronotrópico 
negativo. 
Interacções entre determinantes da função sistólica 
1. Interacção pré-carga/pós-carga: No coração intacto, um aumento da pré-carga leva a um 
aumento da pós-carga, através de dois diferentes mecanismos. Em primeiro lugar, a diminuição 
da espessura da parede e o aumento dos diâmetros ventriculares associados ao aumento da 
pré-carga levam, de acordo com a lei de Laplace, a um aumento da tensão de parede 
ventricular, aquando da contracção (aumento de pós-carga). Por outro lado, o aumento do 
volume de ejecção induzido pelo aumento da pré-carga está associado a um incremento da 
pressão arterial e, como tal, ao aumento da pós-carga. Paralelamente, o aumento da pós-carga 
também leva a um aumento na pré-carga, na medida em que a diminuição do volume de 
ejecção leva a um aumento do volume telediastólico (pré-carga) nos ciclos cardíacos 
subsequentes. 
2. Interacção pré-carga/inotropismo: Um aumento da pré-carga tem um efeito inotrópico 
positivo, na medida em que se verifica um aumento da sensibilidade dos miofilamentos ao 
cálcio. Para além disso, uma vez que, aquando de um aumento da pré-carga, se regista um 
aumento da libertação de cálcio pelo retículo sarcoplasmático, verifica-se que elevações na 
pré-carga correspondem a uma maior contractilidade por um maior período de tempo. 
3. Interacção pós-carga/inotropismo: Como já foi referido, um aumento súbito da pós-carga está 
associado a um aumento da contractilidade (efeito de Anrep) de causas ainda mal conhecidas 
(vide supra na página 4 em “resposta ventricular a um aumento súbito da pressão aórtica”). 
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4. Interacção frequência cardíaca/inotropismo: O aumento da frequência cardíaca está associada 
a maiores concentrações intracelulares de cálcio, o que por sua vez está associado a um 
aumento da contractilidade (relação força-frequência). 
5. Interacção frequência cardíaca/pré-carga: O aumento da frequência cardíaca está associado a 
menor tempo de enchimento ventricular e, como tal, a menor pré-carga e a menor volume de 
ejecção. 
Assim sendo, um aumento da pré-carga, da contractilidade ou da frequência cardíaca estão associados a 
uma melhoria da função cardíaca, algo que também ocorre aquando da diminuição da pós-carga. 
Contudo, é necessário ter em conta que todos estes determinantes interagem entre si e, como tal, 
eventuais alterações num destes factores podem ser compensadas por alterações em outros, o que faz 
com que a função cardíaca possa nem ser afectada no cômputo geral. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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Determinantes da função diastólica 
A função diastólica é entendida como englobando os mecanismos relacionados com o enchimento e 
relaxamento ventricular, contrariamente à função sistólica, associada aos mecanismos relacionados 
com a contractilidade (contracção e ejecção ventricular). Deste modo, uma disfunção sistólica é 
definida como sendo uma perturbação da contractilidade (contracção e ejecção), manifestando-se 
através de uma alteração do declive da relação pressão-volume telessistólica (diminui o volume de 
ejecção e a ansa pressão-volume desloca-se para a direita). Por outro lado, aquando de uma disfunção 
diastólica, verifica-se que a relaçãopressão-volume e o volume de ejecção estão preservados, mas que 
as pressões de enchimento se encontram mais elevadas. 
 
Os determinantes da função diastólica incluem o relaxamento ventricular, as propriedades passivas da 
parede ventricular (nas quais se incluem a rigidez miocárdica, a espessura da parede e a gemoetria da 
cavidade ventricular) e factores extrínsecos (nomeadamente estruturas que rodeiam o ventrículo, tais 
como a aurícula esquerda, as veias pulmonares, a válvula mitral; assim como a frequência cardíaca). 
Avaliação da função diastólica 
De forma a proceder à avaliação da função diastólica, procura-se avaliar a velocidade de queda de 
pressão ocorrida dentro do ventrículo, pois a queda de pressão dentro do ventrículo é a manifestação 
hemodinâmica que traduz o relaxamento miocárdico. Existem várias formas de proceder a esta 
avaliação, nomeadamente: 
1. Determinação do tempo que o ventrículo demora a relaxar isovolumetricamente 
(isovolumetric relaxation time) - A vantagem deste método é o facto de ser facilmente 
calculado (pode ser detectado, por exemplo, por via de um electrocardiograma). Contudo, esta 
forma de avaliação está igualmente associada a uma grande desvantagem – o tempo que o 
ventrículo demora a relaxar isovolumetricamente não se deve forçosamente e unicamente a 
variações na velocidade e, como tal, a partir deste método apenas podemos obter inferências 
aproximadas (analogamente, dizer que um indivíduo A demora o dobro do tempo do indivíduo 
B a chegar ao mesmo local, não significa necessariamente que A tenha sido mais rápido que B, 
pois A pode ter percorrido uma distância maior). 
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2. Determinação da velocidade de queda de pressão – A velocidade de queda de pressão é 
determinada através do cálculo da derivada da curva em função do tempo (dP/dt). Assim, a 
velocidade máxima de elevação de pressão é entendida como o dP/dtmáximo, enquanto a 
velocidade máxima de queda de pressão é entendida como o dP/dtmínimo. Este último índice é 
amplamente utilizado na avaliação da função diastólica mas implica uma grande desvantagem, 
que se prende com o facto de a velocidade máxima não reflectir necessariamente a velocidade 
média (analogamente, um indivíduo que se desloque sempre a 60 km/h, mas que acelere 
momentaneamente para 100 km/h tem maior velocidade máxima que outro que se desloque 
sempre a 90 km/h, mas menor velocidade média). 
3. Determinação do declive da curva de pressão – Este é o índice mais fiável. Aquando da 
obtenção de um declive maior, conclui-se que a queda de pressão ocorre mais rapidamente. 
Obviamente que, aquando da obtenção de um declive menor, conclui-se que a queda de 
pressão ocorre mais lentamente. O declive da curva de pressão pode ser feito de muitas 
maneiras – uma vez que a curva de pressão traduz uma função exponencial, é possível aplicar o 
logaritmo da função, obtendo-se uma recta, cujo declive é de fácil obtenção. Contudo, como 
estamos a avaliar uma queda de pressão, o declive obtido é negativo. Assim sendo, para se 
“retirar” a carga negativa, calculam-se, a partir dos declives obtidos, as constantes de tempo 
(Tau), cuja fórmula é: 
 
 
. 
As relações pressão-volume telediastólicas são índices também muito utilizados, mas neste caso, com o 
objectivo de avaliar a complacência e rigidez ventriculares (ou seja, as suas propriedades passivas). 
Determinantes da função diastólica 
Relaxamento 
O relaxamento é o processo através do qual o miocárdio regressa a um estado de força e comprimento 
não submetidos a stress. Ao nível do coração normal, o relaxamento constitui a maior parte do período 
de ejecção ventricular, bem como o período inicial do enchimento rápido. É fácil compreender que se o 
ventrículo relaxar mais rapidamente, atinge pressões ventriculares mais baixas e a passagem de sangue 
das aurículas fica facilitada. Desta forma, a queda de pressão ao nível do ventrículo esquerdo é a 
manifestação hemodinâmica do relaxamento ventricular. 
O relaxamento miocárdico é modulado pela carga, inactivação e não-uniformidade. Os efeitos da carga 
no relaxamento estão dependentes do seu tipo, da sua magnitude, do intervalo de tempo durante o 
qual o ventrículo se encontra submetido à carga. 
Influência da carga no relaxamento miocárdico 
Quando uma pós-carga ligeira ou moderada é imposta numa fase precoce do ciclo cardíaco (carga de 
contracção), verifica-se um atraso no despoletar da queda de pressão ventricular, que é compensado 
pela aceleração com que se regista essa queda (mecanismo de resposta compensatória). Por oposição, 
uma grande elevação da pós-carga, ou uma elevação da pós-carga a ocorrer num período tardio da 
ejecção ventricular (carga de relaxamento), induz um despoletar prematuro da queda de pressão, 
acompanhado por uma maior lentidão registada neste processo, algo que acontece, inclusive, em 
corações saudáveis (mecanismo de resposta descompensatória). Esta maior lentidão pode levar a um 
relaxamento incompleto e, subsequentemente, ao aumento das pressões de enchimento, um fenómeno 
que se torna exacerbado, aquando de um aumento da pré-carga. Ora, isto é o que se verifica ao nível 
dos doentes hipertensos – uma vez que a hipertensão está associada à submissão de uma maior 
quantidade de pós-carga para o ventrículo esquerdo, este mecanismo pode contribuir para a 
exacerbação da disfunção diastólica. 
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Em termos moleculares isto é passível de ser 
explicado pelo facto de o cálcio citosólico regressar 
para níveis quase basais, ainda antes de se registar o 
máximo da força. Ora, a imposição de uma carga mais 
precocemente (carga de contracção), faz com que 
ainda haja cálcio livre para recrutar pontes cruzadas e, 
como tal, cada ponte cruzada não precisa de 
desenvolver força adicional. Adicionalmente, a este 
nível ainda se regista um processo de actividade 
cooperativa, ou seja, o recrutamento de um certo 
número de pontes cruzadas leva ao recrutamento de 
pontes adicionais, o que permite que se verifique a 
presença de menos força por ponte cruzada. Assim 
sendo, aquando da imposição de uma carga de 
contracção, o ventrículo consegue gerar menos 
pressão por um maior período de tempo (verifica-se a 
presença de uma fase de ejecção prolongada contra 
uma maior resistência), mas a velocidade de 
relaxamento é acelerada. 
Por oposição, aquando da imposição de uma carga de relaxamento, verifica-se que já não há mais cálcio 
livre para recrutar mais pontes cruzadas. Assim sendo, cada ponte cruzada “carrega” uma força 
adicional e a velocidade de relaxamento é lentificada, o que gera um efeito descompensador sobre o 
relaxamento do miocárdio. Podem ainda existir situações de cargas mistas. Caso seja aplicada uma 
carga de contracção, mas que seja progressivamente aumentada, esta carga passa a ser designada por 
mista – a velocidade de relaxamento torna-se então muito lenta, sendo que o ventrículo deixa de ter 
tempo de relaxar totalmente, caso as pressões diastólicas não atinjam os valores basais. 
Influência da inactivação no relaxamento miocárdico 
No que concerne à inactivação miocárdica, este processo diz respeito à extrusão de cálcio presente no 
citosol e ao desligar das pontes cruzadas. Assim, os determinantes da inactivação miocárdica incluem os 
mecanismos relacionados com a homeostasia de cálcio e os reguladores dos miofilamentos 
participantes nos ciclos das pontes cruzadas. 
A diminuição da concentração ou da actividade da SERCA podem levar a uma maior lentidão na 
remoçãodo cálcio presente ao nível do citosol. Consequentemente, um aumento dos níveis de 
fosfolamban, uma proteína inibidora da SERCA, leva a um impedimento do normal relaxamento. Deste 
modo, para se dar uma melhoria do relaxamento diastólico, torna-se necessário um aumento do cAMP, 
que actua na fosforilação do fosfolamban, permitindo que o seu efeito inibidor na SERCA seja removido. 
Esta noção é importante em termos clínicos, na medida em que uma hipertrofia ventricular esquerda 
patológica, que surja na sequência de hipertensão, ou uma estenose aórtica, têm como resultado uma 
diminuição da actividade da SERCA e um aumento do fosfolamban, o que se traduz em maiores 
dificuldades de relaxamento. De referir que alterações similares são passíveis de ser observadas no 
miocárdio de pacientes com cardiomiopatia hipertrófica ou dilatada. 
Por outro lado, é necessário ter em consideração os efeitos associados ao desligar das pontes cruzadas 
para o relaxamento miocárdico. De facto, a alteração dos miofilamentos que formam as pontes 
cruzadas, ou da ATPase que possibilita a ocorrência deste ciclo, pode alterar a função diastólica. Desta 
forma, uma vez que aquando de uma situação de isquemia cardíaca, ocorre menor aporte de ATP e 
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oxigénio, a inactivação e relaxamento miocárdico ficam comprometidos, o que leva a maiores 
dificuldades no relaxamento cardíaco. 
Influência da não-uniformidade no relaxamento miocárdico 
O tecido especializado na condução actua de modo a que o coração actue quase em sincronia, ou seja, 
que os dois ventrículos não se encontrem em fases completamente diferentes (por exemplo, um 
ventrículo em contracção e outro em relaxamento). Deste modo, verifica-se somente a presença de uma 
assincronia fisiológica limitada que cria pequenos gradientes para favorecer o enchimento ventricular e 
o encaminhamento do sangue para a câmara de saída do ventrículo. 
Contudo, numa situação patológica, esta assincronia pode ser exacerbada até um nível patológico 
(presença da não-uniformidade). Por exemplo, aquando de um enfarte do miocárdio é possível que se 
verifique a contracção de uma zona ventricular, enquanto, simultaneamente, outra zona ventricular não 
se encontra em contracção, ou encontra-se em distensão. Assim sendo, uma re-extensão precoce e 
assíncrona de um segmento ventricular e uma não-uniformidade regional induzem um despoletar 
precoce da queda de pressão ventricular, que passa a decorrer com maior lentidão, comparativamente 
ao que seria esperado. 
As assincronias patológicas são também passíveis de ser observadas, aquando de bloqueios de ramo. A 
título de exemplo, se ocorrer o bloqueio do ramo esquerdo do feixe de His, o ventrículo esquerdo terá 
que ser estimulado fibra-a-fibra, contrariamente ao direito; o que gera uma grande assincronia. 
Propriedades passivas ventriculares 
As propriedades passivas da parede ventricular são influenciadas pela rigidez ventricular, espessura da 
parede e geometria das cavidades ventriculares. Estas propriedades, apesar de serem denominadas de 
passivas, podem sofrer alterações lentas a longo prazo, inclusive, por acção de hormonas ou estímulos. 
Influência da espessura da parede e geometria das cavidades ventriculares 
A espessura das paredes está intimamente associada ao enchimento ventricular. Assim, quando a 
parede dos ventrículos é mais espessa, verifica-se que o enchimento se processa de modo mais rígido. 
Por outro lado, a quantidade de tecido fibroso ao nível da parede ventricular também condiciona a sua 
rigidez, sendo que ventrículos com mais tecido fibroso (por exemplo, aquando de uma situação de 
fibrose), tornam-se mais rígidos. 
No que concerne à geometria da câmara, aquando da presença de cavidades mais pequenas verifica-se 
a presença de uma menor tensão de parede e, consequentemente, a força gerada pelo ventrículo para a 
distensão também é menor, registando-se assim uma disfunção diastólica. 
Influência da rigidez ventricular 
Os determinantes da rigidez ventricular incluem factores intrínsecos aos próprios cardiomiócitos 
(nomeadamente relacionados com o seu citosqueleto) e à matriz extracelular. O citosqueleto dos 
cardiomiócitos é constituído por microtúbulos, filamentos intermediários (constituídos por desmina) e 
microfilamentos (constituídos por actina), bem como por proteínas endosarcoméricas (nomeadamente 
a titina, α-actinina, miomesina e proteína M), sendo que alterações em algumas destas proteínas 
citosqueléticas têm sido correlacionadas com alterações na função diastólica. 
Pensa-se que a maior parte da força elástica dos cardiomiócitos esteja associada à titina. Quando o 
sarcómero apresenta o seu comprimento muito diminuído, devido à contracção, a titina fica sob tensão, 
verificando-se um fenómeno de recuo elástico, que constitui a base do mecanismo de sucção 
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ventricular, aquando da fase de 
enchimento rápido. Por outro lado, 
aquando da distensão do 
sarcómero, verifica-se a distensão 
da titina, o que impede o sobre-
estiramento do sarcómero. 
A titina encontra-se expressa sob 
várias isoformas que estão 
associadas a diferentes 
propriedades mecânicas e a 
diferentes níveis de rigidez 
ventricular. Quando a isoforma 
predominante é a forma N2B 
verifica-se maior rigidez ventricular. 
Por seu turno, caso a isoforma 
predominante seja a N2BA, então 
verifica-se que o músculo cardíaco é 
mais complacente. Todavia, a titina 
pode sofrer modificação pós-traducional, por via do cálcio e por fosforilação/desfosforilação. Assim, a 
fosforilação da titina, especialmente da isoforma N2B, permite diminuir a sua rigidez (e, como tal, a 
fosforilação de proteínas sarcoméricas pela pKA ocorre num sentido de normalizar a maior rigidez dos 
cardiomiócitos, aquando de uma situação de insuficiência cardíaca). 
 
Alterações na estrutura da matriz extracelular miocárdica também podem afectar a função diastólica. A 
matriz extracelular miocárdica é composta por proteínas fibrilares (tais como o colagénio dos tipos I e III 
e a elastina), proteoglicanos e proteínas da membrana basal (nomeadamente colagénio do tipo IV, 
laminina e fibronectina). Dos componentes supracitados o colagénio é aquele que aparenta 
desempenhar o papel mais importante ao nível da matriz extracelular, no que concerne ao 
desenvolvimento de insuficiência cardíaca. De facto, o colagénio fibrilar presente ao nível da matriz 
encontra-se frequentemente alterado em processos patológicos associados a disfunção diastólica, 
nomeadamente no que concerne à sua quantidade, geometria, distribuição, grau de cross-linkings e 
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proporção entre colagénio do tipo I e colagénio do tipo III. O mecanismo de regulação da biossíntese de 
degradação de colagénio é feito de várias formas, nomeadamente através de: 
1. Mecanismos de regulação transcricional por via de factores físicos (nomeadamente a pré-
carga e a pós-carga), neurohumorais (tais como o sistema renina-angiotensina-aldosterona e o 
sistema nervoso simpático) e de crescimento. 
2. Regulação pós-traducional, incluindo ao nível da formação de cross-links de colagénio. 
3. Degradação enzimática (a degradação de colagénio é da responsabilidade das 
metaloproteinases presentes ao nível da matriz). 
Assim sendo, para além do facto de alterações na síntese, degradação de colagénio, e respectivos 
processos de regulação levarem a alterações da função diastólica e propiciarem o desenvolvimento de 
insuficiênciacardíaca; também a qualidade do colagénio (nomeadamente no que concerne aos cross-
links e à glicação) é essencial para determinar a rigidez miocárdica. 
Para além da ocorrência de modificações pós-traducionais da titina, existem outras evidências que 
sugerem que a rigidez diastólica é activamente modulada. Uma dessas evidências prende-se com o facto 
da interacção entre as pontes cruzadas ocorrer (ao nível da diástole), mesmo a um tónus muscular 
reduzido, quando ocorre baixa produção de cálcio. A rigidez ventricular é também modulada pela carga, 
pela endotelina-1 e pelo óxido nítrico (NO). Aumentos de carga aumentam de forma aguda a rigidez 
ventricular, enquanto a endotelina-1 promove uma diminuição aguda da rigidez miocárdica. 
Factores extrínsecos 
Os factores extrínsecos não são considerados propriamente causas da disfunção diastólica, no sentido 
de não serem intrínsecos ao coração. A título de exemplo, a presença de muito líquido no pericárdio, ou 
de um tumor no mediastino, leva à compressão extrínseca do coração e dificulta o seu enchimento. 
Situações patológicas ao nível dos vasos com ligação ao coração ou ao nível das válvulas (tal como uma 
estenose da válvula mitral) também geram problemas no enchimento ventricular, mas cuja origem é 
extrínseca ao próprio músculo ventricular. 
Frequência cardíaca 
A frequência cardíaca influencia as necessidades miocárdicas de oxigénio e o tempo de profusão 
coronária. Aumentos rápidos da frequência cardíaca aumentam as necessidades de oxigénio por parte 
do miocárdio, mas diminuem o tempo de profusão coronária. Isto permite que uma disfunção diastólica 
isquémica possa ocorrer na ausência de doença coronária, especialmente em corações hipertróficos. 
Para além disso, uma maior frequência cardíaca pode levar a um encurtamento tal da diástole que 
impeça um relaxamento completo por entre batimentos cardíacos, o que resulta numa maior pressão 
de enchimento e consequente disfunção diastólica (o ventrículo não tem assim tempo de encher e, 
como tal, não se regista o seu enchimento completo, apesar de o ventrículo em si poder estar a 
funcionar em pleno). Este fenómeno é passível de ser observado em situações de insuficiência cardíaca 
que, contrariamente a situações normais, podem estar associadas a aumentos na frequência cardíaca 
não co-relacionados com um aumento da frequência cardíaca, ou mesmo co-relacionados com um 
decréscimo. 
 
 
 
 
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Débito cardíaco e retorno venoso 
O retorno venoso é definido como o fluxo de sangue que regressa ao coração. Na maioria dos casos, 
este conceito é utilizado para nos referirmos ao retorno venoso sistémico (ou seja, para o lado direito 
do coração). Uma vez que, em condições fisiológicas, a quantidade de sangue que é enviada para o lado 
direito do coração deve equivaler à fracção de sangue ejectada, e uma vez que os débitos cardíacos do 
coração esquerdo e do coração direito são exactamente os mesmos, o input sanguíneo para o coração 
direito deve equivaler ao output do coração esquerdo. Isto significa que o retorno venoso sistémico 
deve equivaler ao débito cardíaco sistémico. 
O débito cardíaco é 
influenciado por factores 
cardíacos (ou seja, que dizem 
respeito apenas ao coração) e 
nos quais se incluem a 
frequência cardíaca e a 
contractilidade, bem como 
por factores acopladores (que 
dizem respeito que à função 
cardíaca, quer à função 
vascular), nos quais se 
incluem a pré-carga e a pós-
carga. 
Curvas de função vascular 
A pressão auricular direita determina a magnitude 
do enchimento ventricular registado. Por sua vez, a 
pressão arterial direita depende do retorno venoso 
do sangue para o coração. A relação entre o retorno 
venoso sistémico e a pressão auricular direita, bem 
como os diferentes factores que influenciam o 
retorno venoso sistémico, é passível de ser estudada 
através de uma curva de função vascular. Esta curva 
descreve a variação da pré-carga em função do 
débito cardíaco – normalmente a pré-carga é 
avaliada em mm/Hg evidenciando a pressão 
auricular direita, enquanto o débito cardíaco 
equivale ao retorno venoso sistémico (como já foi 
referido, estes dois parâmetros devem ser iguais) e é 
expresso em unidades de volume/unidades de 
tempo. 
Quando, o retorno venoso é nulo, verifica-se a presença de pressões uniformes ao nível das artérias, 
capilares, veias e aurícula direita. Esta pressão é designada por pressão de enchimento sistémica média 
(ponto Pmc do gráfico em cima), rondando os cerca de 7 mm/Hg. De referir que este valor depende do 
volume sanguíneo total e da complacência total. 
Ora, ao aumentar o débito cardíaco, a pré-carga diminui, na medida em que se regista um menor 
volume de sangue ao nível ventricular (ou seja, regista-se um decréscimo da pressão auricular direita), 
sendo que a níveis mais elevados de débito cardíaco, podem se registar inclusive, valores negativos de 
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pressão vascular, devido à presença de mecanismos de sucção ventricular. Não é difícil compreender 
que, em termos práticos, quando se regista um aumento da pressão venosa central, de tal modo que 
esta excede a pressão auricular direita, o sangue flui das grandes veias para a aurícula direita. De modo 
similar, a diminuição do débito cardíaco está associada a uma maior pré-carga, na medida em que a 
quantidade de sangue presente ao nível dos ventrículos é superior. 
Alterações da curva de função vascular 
As alterações do volume circulante (ou seja, da volémia) podem fazer deslocar as curvas de função 
vascular. Desta forma, aquando de um aumento do volume circulante (situação designada por 
hipervolémia e que ocorre, por exemplo, aquando de uma transfusão sanguínea), verifica-se um 
aumento da pressão venosa e, como tal, a curva de função vascular fica deslocada para a direita, mas 
paralela à curva original. Paralelamente, situações de diminuição do volume circulante (episódios de 
hipovolémia, característicos, por exemplo, de situações de hemorragia) deslocam a curva para a 
esquerda, devido à diminuição geral da pressão venosa que se regista. De referir que, as alterações de 
volémia não levam a alterações no declive 
das curvas, na medida em que não são 
induzidas alterações na resistância ou 
complacência dos vasos. 
Alterações no tónus venomotor, ou seja, 
situações de venoconstrição e venodilatação, 
são equivalentes a alterações no volume 
sanguíneo. Assim uma maior complacência 
venosa (venodilatação) reduz a tensão na 
parede venosa, o que acarreta um menor 
retorno venoso, enquanto uma menor 
complacência venosa (venoconstrição) induz 
o efeito oposto. Deste modo, no que 
concerne às curvas de função vascular, 
verificamos em situações de venodilatação 
um deslocamento para a esquerda, 
enquanto, situações de venoconstrição estão 
associadas a um deslocamento da curva para 
a direita. 
A alteração do tónus das arteríolas (ou seja, 
da resistência vascular periférica) apresenta 
um efeito totalmente diferente na curva de 
função vascular. Uma vez que as arteríolas 
contêm apenas uma pequena fracção do 
volume sanguíneo, alterações na resistência 
vascular periférica apresentam um efeito 
muito pouco significativo ao nível da pressão 
média sistémica de enchimento. Deste modo, 
alterações na resistência vascular periférica 
não originam curvas de função vascular 
paralelas à original, mas sim um 
deslocamento divergente a partir do ponto 
em que o débito cardíaco é nulo, isto é, o 
BernardoManuel de Sousa Pinto ❖Faculdade de Medicina da Universidade do Porto 
Fisiologia I 
73 
 
efeito da resistência vascular periférica é tanto mais sentido, quanto maior for o débito cardíaco. Assim, 
a vasoconstrição (ou seja, uma maior resistência vascular periférica) aproxima a curva de função 
vascular do eixo das ordenadas, enquanto a vasodilatação afasta a curva de função vascular deste eixo. 
Isto deve-se ao facto da vasoconstrição reduzir a pressão venosa central, o que diminui a driving 
pressure que favorece o retorno venoso para o coração. Já a vasodilatação favorece o efeito inverso. 
As situações apresentadas são situações experimentais, onde são assumidas alterações puras no volume 
sanguíneo ou no tónus vascular. Todavia, em cenários reais as situações são mais complicadas – a título 
de exemplo, a uma hemorragia segue-se, normalmente, uma situação de vasoconstrição, como forma 
de manter a pressão arterial sistémica. Assim, em situações reais pode ocorrer a alteração simultânea 
do ponto de intersecção com o eixo das abcissas e do declive da curva de função vascular. 
Curvas de função cardíaca 
Tal como existe uma curva de função vascular, 
também se verifica a presença de uma curva de 
função cardíaca que também descreve a variação 
do débito cardíaco em função da pré-carga. Esta 
curva, uma vez que traduz aquilo que se passa em 
termos cardíacos, não é mais que uma aplicação da 
Lei de Starling, todavia, em vez de exprimirmos o 
volume de ejecção em função da pressão auricular, 
passamos a exprimir o débito cardíaco em função 
da pressão auricular. Posto isto, não admira que 
um aumento da pré-carga leve a um aumento do 
débito cardíaco até um determinado limite. 
Alterações das curvas de função cardíaca 
Tal como ocorre nas curvas de função vascular, também ao nível das curvas de função cardíaca se 
verifica que outros determinantes podem influenciar estas curvas, nomeadamente a contractilidade e a 
pós-carga. Assim, uma redução da contractilidade ou um aumento da pós-carga estão associados a uma 
diminuição do débito cardíaco, para um mesmo valor de pré-carga. Por outro lado, um aumento da 
contractilidade ou uma diminuição da pós-carga induzem o efeito oposto. Não admira, portanto, que 
uma diminuição da contractilidade/aumento da pós-carga desloquem a curva de função cardíaca para 
baixo, enquanto um aumento da contractilidade/diminuição da pós-carga deslocam esta curva para 
cima. 
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Fisiologia I 
74 
 
Combinação das curvas de função cardíaca e função vascular 
As unidades das variáveis da curva de 
função cardíaca são as mesmas das variáveis 
da curva de função vascular. Deste modo, 
estas duas curvas podem ser expressas no 
mesmo gráfico. Contudo, enquanto na curva 
de função cardíaca, o eixo dos y 
corresponde ao débito cardíaco, na curva de 
função vascular, o eixo dos y corresponde ao 
retorno venoso. Assim, para representar 
ambas as funções, o que se faz 
normalmente é inverter os eixos da curva de função vascular. Isto é possível, na medida em que, o 
débito cardíaco e o retorno venoso dependem da pressão auricular direita, enquanto a pressão auricular 
direita também depende do retorno venoso e do débito cardíaco. Esta interdependência permite então 
que as variáveis não possam então ser classificadas estritamente como sendo dependentes ou 
independentes. 
A curva de função vascular apenas se intersecta com a curva de função cardíaca num ponto, que 
corresponde ao ponto de equilíbrio para essa circunstância. Isto é importante na medida em que 
pequenas alterações numa das variáveis levam a que a outra se ajuste de modo a que seja de novo 
atingido o equilíbrio. 
Deste modo, um aumento 
transitório na pressão 
auricular direita (tal como 
se verifica no gráfico que 
acompanha este 
parágrafo) pela Lei de 
Starling leva a um 
aumento compensatório 
do débito ventricular 
(ponto B da figura). 
Contudo, 
simultaneamente, o 
aumento na pressão 
auricular direita leva a 
uma diminuição da driving 
pressure para o retorno 
venoso (ou seja, a uma 
menor diferença entre a 
pressão venosa central e a 
pressão auricular direita). Desta forma, o retorno venoso diminui aquando de uma situação como esta 
(ponto B’ do gráfico). Todavia, estes efeitos não duram muito – por um lado, o maior débito cardíaco 
resultante diminui a pressão auricular direita, porque deixa a aurícula direita mais vazia (percurso B-C-A 
da figura), enquanto, por outro, aumenta a pressão venosa central, aumentando a driving pressure para 
o retorno venoso (percurso B’-C’-A do gráfico). Estes mecanismos compensatórios resultantes permitem 
que o ponto de equilíbrio possa ser de novo atingido. Em suma, o sistema cardiovascular apresenta um 
mecanismo intrínseco para contrariar pequenos desequilíbrios entre o input e o débito cardíaco. 
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Fisiologia I 
75 
 
A única forma de produzir uma alteração 
sustentada no débito cardíaco, retorno 
venoso e pressão auricular direita, requer, 
pelo menos, a alteração de uma das duas 
curvas de função. Um aumento da 
resistência vascular periférica (aumento da 
pós-carga), por exemplo, influencia o 
posicionamento das duas curvas (deslocando 
a curva de função cardíaca para a direita e 
fazendo divergir a curva de função vascular), 
sendo atingido novo ponto de intersecção. 
Já a contractilidade apenas afecta as curvas 
de função cardíaca, na medida em que é um 
factor cardíaco (e não um factor acoplador 
como a pós-carga). Assim, um aumento da 
contractilidade (que pode advir, por 
exemplo, da estimulação simpática) está 
associado a maior volume de ejecção, o que 
se traduz numa situação de maior débito 
cardíaco. Ora este maior débito cardíaco 
acaba por implicar uma diminuição da pré-
carga, uma vez que passa a ser removida 
uma maior quantidade de sangue. Esta 
diminuição da pré-carga faz com que se 
atinja um novo ponto de equilíbrio (ou seja, 
um novo ponto de intersecção entre as duas 
curvas), em que ocorre maior débito 
cardíaco para menores pressões de 
enchimento. 
O débito cardíaco é calculado através do 
produto entre a frequência cardíaca e o volume de ejecção. Todavia, uma vez que uma maior 
frequência cardíaca está associada a uma menor tempo (e volume) de enchimento e, 
consequentemente, a um menor volume de ejecção, o efeito final despoletado pelo aumento da 
frequência cardíaca depende da compensação ocorrida pelo volume de ejecção. Assim, um aumento da 
frequência cardíaca nem sempre se traduz num aumento do débito cardíaco – até dado valor, o 
aumento da frequência cardíaca está associado a um maior débito cardíaco, todavia, aumentos 
progressivos da frequência levam a que seja sucessivamente atingida uma fase de plateau e uma fase de 
diminuição do débito cardíaco (isto já aquando de valores muito elevados de frequência cardíaca). 
 
 
 
 
 
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Factores que condicionam o retorno venoso 
O retorno venoso é condicionado por vários factores, nomeadamente: 
1. Gravidade - Quando um 
indivíduo se encontra deitado 
as pressões venosas são 
aproximadamente as mesmas. 
Contudo, quando este se 
encontra de pé, verificamos a 
presença de diferenças 
descaradas nas pressões 
venosas sentidas ao nível das 
várias partes corpo (nos 
membros inferiores, a pressão 
venosa é de 90 mm/Hg, 
enquanto ao nível da cabeça são obtidas pressões de -35 mm/Hg). Esta variação de pressõesexplica porque é que um indivíduo quando se levanta rapidamente pode se sentir tonto – de 
facto, ocorre uma diminuição da pressão venosa na cabeça de cerca de 40 mm/Hg, algo que é 
sentido ao nível de barorreceptores. Por outro lado, quando um indivíduo se coloca de cabeça 
para baixo (por exemplo, quando está a fazer o pino), verifica-se um aumento das pressões 
cerebrais que pode, inclusive, ser perigoso. 
2. Contracção muscular esquelética - A 
contracção muscular é um factor 
determinante para o retorno venoso, uma 
vez que a contracção do músculo 
esquelético promove a propulsão do 
sangue em direcção ao coração. Todavia, 
como o músculo não se encontra 
permanentemente contraído, no caso das 
veias infra-cardíacas, aquando do 
relaxamento muscular, torna-se 
necessário um mecanismo que previna o 
sangue de fluir no sentido oposto ao do 
coração (ou seja no sentido favorecido pela gravidade). Tal mecanismo é assegurado pela 
presença de válvulas, que abrem aquando da contracção muscular e fecham aquando do 
relaxamento, permitindo um fluxo unidireccional do sangue venoso. 
Maiores pressões venosas ao nível dos membros inferiores propiciam a um extravasamento do 
sangue para o fluido extracelular e, como tal, quando os indivíduos se mantêm de pé por muito 
tempo, passam a sentir as “pernas pesadas”. Isto deve-se ao facto de se perderem os 
mecanismos que procuram contrariar esse “peso 
aplicado”, algo que em termos práticos se traduz 
pelo facto de a propulsão muscular não se fazer 
sentir e pelo facto das válvulas venosas, por estarem 
submetidas a uma sobrecarga constante, acabarem 
por ficar ineficientes. 
3. Competência valvular - Aquando de uma 
insuficiência venoso-valvular (por exemplo, em 
situações de veias varicosas), as válvulas não têm 
capacidade de fechar completamente, permitindo 
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Fisiologia I 
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assim que o sangue venoso flua no sentido favorecido pela gravidade, aquando do relaxamento 
muscular. 
4. Respiração - A inspiração está 
associada a uma diminuição da 
pressão intra-torácica por 
expansão da parede torácica. 
Isto favorece, não só a uma 
entrada de ar proveniente do 
meio exterior, mas também o 
retorno venoso 
(consequentemente, na 
sequência de uma inspiração 
verifica-se um aumento da pré-carga no coração direito). Por outro lado, a expiração está 
associada ao fenómeno inverso. 
5. Tónus vascular - Variações do tónus vascular são também determinantes para variações do 
retorno venoso. De facto, aquando de um menor retorno venoso (algo que ocorre, por 
exemplo, ao nível dos membros inferiores, quando um indivíduo sentado se levanta), ocorre 
uma consequente diminuição do débito cardíaco, o que se traduz num decréscimo da pressão 
arterial. A menor pressão arterial é detectada pelos barorreceptores do organismo, sendo 
despoletado o reflexo barorreceptor – este reflexo tem por consequência não só um aumento 
da vasoconstrição arteriolar em 
todos os órgãos excepto o cérebro e 
o coração (o que aumenta a 
resistência vascular periférica ao 
nível destes órgãos), mas também 
um aumento da venoconstrição. 
Ora, o aumento da venoconstrição 
favorece o retorno venoso, actuando 
como mecanismo compensatório da 
situação inicial. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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Circulação direita. Papel fisiopatológico do ventrículo direito 
Apesar de ter sido negligenciado durante muito tempo, o estudo do ventrículo direito tem sido alvo de 
um interesse crescente, na medida em que a análise do ventrículo direito revela-se fundamental no 
prognóstico de algumas doenças cardíacas esquerdas. Por outro lado, conhecer o ventrículo direito 
revela-se essencial para que seja possível um aprofundamento do conhecimento fisiológico da doença 
vascular pulmonar. Todavia, é importante ressalvar que o estudo da função cardíaca é apenas possível, 
devido ao recente desenvolvimento de técnicas imagiológicas. 
A acção do ventrículo direito depende, sobretudo, das condições em que opera, nomeadamente do 
facto da circulação pulmonar funcionar a baixas pressões (a resistência vascular periférica ao nível 
pulmonar é cerca de um décimo da resistência vascular periférica sistémica). Dessa forma, as 
características do miocárdio, tão determinantes para o papel desempenhado pelo ventrículo esquerdo, 
desempenham um papel de menor importância ao nível do ventrículo direito. 
Anatomia do ventrículo direito 
Em termos anatómicos, o ventrículo direito é passível de ser 
dividido em três porções - câmara de entrada, miocárdio 
apical e infundíbulo. Todavia, este ventrículo apresenta uma 
conformação muito complexa, podendo apresentar uma 
forma crescêntica, trapezóide, ou triangular, dependendo da 
secção em que for observado. Esta complexidade anatómica 
deve-se à relação que o ventrículo direito desenvolve com o 
ventrículo esquerdo (a primeira cavidade quase “abraça” a 
segunda), que se mostra crucial para que os dois ventrículos 
se influenciem mutuamente. 
Comparativamente ao ventrículo esquerdo, o ventrículo 
direito apresenta uma reduzida espessura de parede (a sua parede livre apresenta uma espessura que 
varia entre 1 e 3 mm), a válvula AV mais apicalmente localizada, e um miocárdio mais trabeculado. O 
ventrículo direito é menos espesso que o esquerdo, uma vez que o miocárdio do ventrículo direito 
contém apenas duas camadas musculares (uma externa, circunferencial, e uma interna, longitudinal), 
enquanto o ventrículo esquerdo apresenta três (a camada adicional do ventrículo esquerdo é oblíqua, o 
que faz com que os movimentos 
gerados ao nível desta cavidade sejam 
mais complexos, ocorrendo também 
movimentos de torção). 
Por fim, a irrigação principal do 
ventrículo direito provém sobretudo da 
artéria coronária direita e, como tal, 
problemas nesta artéria estão 
associados a complicações no ventrículo 
direito. De referir que a perfusão no 
ventrículo direito ocorre durante todo o 
ciclo cardíaco em condições fisiológicas 
(perfusão sitodiastólica), devido às 
baixas pressões registadas ao nível da 
circunvolução pulmonar. 
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Fisiologia I 
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Fisiologia do ventrículo direito 
O ventrículo direito recebe o sangue venoso proveniente da circulação sistémica, bombeando-o para os 
pulmões. Tanto o retorno venoso para o ventrículo direito, como o fluxo de sangue para os pulmões, 
ocorrem a baixas pressões. Apesar destas particularidades, o débito cardíaco registado ao nível do 
ventrículo direito tem de ser exactamente igual ao que se verifica no ventrículo esquerdo (só assim se 
pode registar uma circulação em série). 
Contracção ventricular direita 
A contracção ventricular direita ocorre de modo sequencial (alguns autores entendem, inclusive, que 
esta circulação ocorre de modo peristáltico), iniciando-se na câmara de entrada, progredindo para 
região apical e, por fim, para o infundíbulo. Já a ejecção de sangue é conseguida através do 
encurtamento longitudinal do maior eixo ventricular (que é passível de ser traçado desde o ápice até à 
artéria pulmonar) e da aproximação da parede anterior ao septo interventricular. 
Ao nível do ventrículo direito a pós-carga registada é menor, comparativamente ao ventrículo esquerdo 
(isto é óbvio, se pensarmos que a resistência vascular pulmonar é também menor). Isto significa que 
aquando da contracção do ventrículo direito, o período de contracção isovolumétrica é muito curto. 
Ditoisto por outras palavras, uma vez que a pressão da artéria pulmonar é muito baixa, a pressão 
ventricular rapidamente a ultrapassa, o que faz com que este período seja tão curto. 
Quando a pressão sentida ao nível do tronco pulmonar ultrapassa a sentida ao nível do ventrículo 
direito, verifica-se uma manutenção do fluxo anterógrado do sangue, algo que ocorre devido à cinética 
do sangue (período de hang-out). Este mecanismo, apesar de se registar em todos os circuitos de baixa 
pressão, também se verifica ao nível do ciclo cardíaco do ventrículo esquerdo. 
Estas características levam a que as ansas pressão-volume 
obtidas para o ventrículo direito sejam, não de natureza 
quadrilateral (como ocorre ao nível do ventrículo esquerdo), 
mas de tipo triangular. Como foi referido, quase não se verifica 
a presença de períodos isovolumétricos e, como tal, nestas 
ansas torna-se difícil obter as verticais linhas isovolumétricas. 
Esta morfologia das ansas permite deduzir que o trabalho 
realizado pelo ventrículo direito seja muito inferior ao registado 
pelo ventrículo esquerdo (isto verifica-se pelo facto de a área das ansas pressão-volume ser menor), 
algo passível de ser explicado pelo facto da pós-carga também ser menor. Com estes dados não é de 
admirar que recém-nascidos cujo ventrículo direito bombeie para a circulação sistémica apresentem 
ansas pressão-volume para o ventrículo direito de morfologia quadrilateral. 
Avaliação da contractilidade 
Para avaliar a contractilidade do ventrículo direito, torna-se difícil achar a o ponto de pressão-volume 
telessistólica. Deste modo, utiliza-se preferencialmente a elastância como parâmetro de avaliação. Em 
termos comparativos, a contractilidade influencia a acção do ventrículo direito, de forma similar ao que 
se verifica no ventrículo esquerdo. 
Resposta à pré-carga 
O ventrículo direito e o ventrículo esquerdo respondem de forma similar a variações da pré-carga, 
aplicando-se a lei de Frank-Starling a ambas as estruturas. Todavia, é necessário ter em conta dois 
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Fisiologia I 
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aspectos, quando se considera o efeito da pré-carga no ventrículo direito – a variabilidade respiratória 
e a interdependência ventricular. 
O facto de o ventrículo direito actuar a menor pressões, faz com que este seja muito mais influenciado 
pelas pressões que o circundam (nomeadamente pelos movimentos respiratórios). De facto, aquando 
de uma inspiração profunda gera-se uma menor pressão intra-torácica, o que origina um maior retorno 
venoso e, consequentemente, um aumento da pré-carga. Paralelamente, uma expiração profunda está 
associada a um aumento da pressão intra-torácica, o que gera um menor retorno venoso e, 
consequentemente, uma diminuição da pré-carga. Todavia, se os pulmões forem insuflados a pressões 
muito elevadas, regista-se também um aumento da pós-carga, devido ao aumento da resistência 
vascular pulmonar. 
Resposta à pós-carga 
Um aumento de pressão na artéria pulmonar surte mais efeitos ao nível do ventrículo direito, 
comparativamente a um aumento de pressão aórtico ao nível do ventrículo esquerdo, uma vez que o 
ventrículo direito apresenta uma menor quantidade de músculo. Esta característica impede o ventrículo 
direito de gerar pressões superiores a 40 mm/Hg de forma aguda. Contudo, quando esta cavidade se 
encontra cronicamente submetida a pós-cargas elevadas, ocorre hipertrofia ventricular, e o ventrículo 
direito passa a ser capaz de gerar pressões superiores a 40 mm/Hg. 
De referir que a resistência vascular pulmonar depende da função respiratória, na medida em que esta 
função está associada a alterações da PaO2 e da PaCO2. 
Interdependência ventricular 
A função do ventrículo esquerdo afecta significativamente a função sistólica ventricular direita, sendo 
que a contracção ventricular esquerda contribui para entre 20% a 40% da pressão sistólica ventricular 
direita e débito cardíaco direito. Esta dependência é possível, sobretudo, através da presença do septo 
interventricular, embora também se deva presença do pericárdio. 
Contudo, a interacção entre os dois ventrículos não é unidireccional (não é por acaso que este 
fenómeno é designado por interdependência ventricular). De facto, verifica-se que o ventrículo direito 
também influencia a actividade do ventrículo esquerdo, embora de forma mais discreta. A título de 
exemplo, aquando da dilatação do ventrículo direito (algo que ocorre numa situação de enfarte desta 
cavidade), a geometria do ventrículo esquerdo sofre alterações, o que leva a que a sua contractilidade 
seja afectada. 
Apesar de o ventrículo esquerdo influenciar amplamente a função ventricular direita, não se pode 
menosprezar o papel da contracção da parede livre do ventrículo direito. De facto, apesar de não ser 
decisiva, a acção da parede livre do ventrículo desempenha um importante papel na determinação do 
volume de sangue a ser ejectado. 
Função diastólica no ventrículo direito 
A função diastólica encontra-se ainda muito pouco estudada ao nível do ventrículo direito, todavia, 
alguns dados já são conhecidos: 
1. O enchimento ventricular direito inicia-se primeiro que o enchimento ventricular esquerdo, 
mas termina depois. 
2. A complacência ventricular registada ao nível do ventrículo direito é maior, comparativamente 
à registada no ventrículo esquerdo. 
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3. Ao nível da diástole ventricular direita, as propriedades activas auriculares adquirem maior 
importância. De facto, aquando de situações de maior pós-carga, torna-se imperativa a 
ocorrência de contracção auricular, de modo a assegurar um correcto enchimento ventricular. 
4. Maior susceptibilidade ao aumento da pressão intra-pericárdica. 
Fisiopatologia do ventrículo direito 
Aquando de uma situação de insuficiência ventricular direita, o coração não tem capacidade de 
assegurar um débito cardíaco suficiente para assegurar as necessidades do organismo (nomeadamente 
ao nível dos pulmões). Esta é uma condição que põe em risco a vida e que é avaliada por um aumento 
da pressão venosa jugular, embora também se manifeste por via da formação de edema periférico. 
Muitas vezes associada a esta condição, verifica-se uma situação de hipertensão pulmonar, 
caracterizada por um aumento de pressão ao nível dos vasos da circulação pulmonar. Os sintomas mais 
comuns incluem fadiga, edema periférico, falta de ar e tosse seca. 
Outro factor de risco para a insuficiência ventricular direita é a presença de disfunção ventricular 
direita, uma vez que pacientes cujo ventrículo direito ejecte uma menor fracção sanguínea apresentam 
menor tolerância ao exercício. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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Fisiologia I 
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Fisiopatologia da isquemia do miocárdio 
A doença coronária é responsável por cerca 
de 20% da mortalidade global, enquanto a 
doença cérebro-vascular apresenta uma 
prevalência menor comparativamente à 
doença coronária, mas uma maior 
mortalidade. Em termos gerais, a 
mortalidade associada às doenças 
cardiovasculares está a diminuir, contudo, 
num futuro próximo é expectável uma 
inversão desta tendência, devido ao 
aumento da prevalência da obesidade, entre 
outros factores. Assim, torna-se 
fundamental conhecer os mecanismos 
fisiopatológicos associados à doença 
coronária. 
Definição de isquemia do miocárdio e conceitos básicos 
Entre 4 a 5% do débito cardíaco 
destina-se para a circulação coronária, 
apesar da massa docoração 
corresponder apenas a cerca de 0,5% 
da massa corporal. O fluxo sanguíneo 
coronário é regulado por via de 
mecanismos locais (que envolvem, por 
exemplo, a adenosina). Estes 
mecanismos de regulação permitem 
que, quando necessário, o coração 
aumente a sua capacidade de fluxo 4 a 
5 vezes. De referir que essa capacidade 
é designada por reserva coronária e é 
útil tanto em condições fisiológicas 
(por exemplo, aquando do exercício 
físico), como em situações patológicas 
(a existência de reserva coronária justifica que, aquando de uma estenose, o coração continue a ser 
irrigado). De referir que a compressão extra-vascular que ocorre durante a sístole leva a que o fluxo 
coronário ocorra, maioritariamente, ao nível da diástole. 
Apesar de uma fracção significativa do débito cardíaco ser direccionada para irrigação cardíaca, o 
coração tem uma elevada taxa de extracção de oxigénio e, como tal, aquando de um aumento das 
necessidades de oxigénio, o coração aumenta preferencialmente a captação de sangue, em detrimento 
de um aumento da quantidade de oxigénio que extrai do sangue. 
Deste modo, o fornecimento de oxigénio ao miocárdio depende quer do fluxo sanguíneo coronário, que 
do conteúdo do sangue em oxigénio. Como é facilmente compreensível, o fornecimento de oxigénio 
ajusta-se às necessidades do miocárdio e, caso esta correspondência não seja assegurada, gera-se uma 
situação de isquemia do miocárdio. A isquemia do miocárdio é então passível de definida como sendo 
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um deficit do fornecimento de oxigénio ou um aumento não correspondido da necessidade do 
miocárdio de oxigénio. 
 A ocorrência destes desequilíbrios, está dependente de vários factores, nomeadamente: 
 
O desenvolvimento de um processo isquémico está frequentemente associado ao desenvolvimento 
subsequente de enfarte agudo do miocárdio. A ocorrência de um enfarte agudo do miocárdio requer, 
não só, a presença de isquemia, mas também a ocorrência de necrose, algo que se verifica na sequência 
de um episódio de isquemia aguda do miocárdio. Assim, enquanto numa situação de isquemia, as lesões 
induzidas nos primeiros vinte minutos são reversíveis, aquelas ocorridas no período de tempo 
subsequente são totalmente irreversíveis, devido à morte celular ocorrida. De referir que, a necrose se 
inicia na região subendocárdica e progride para as restantes regiões miocárdicas e, por isso, quanto 
maior for o período de tempo decorrido, maior será a área que sofre necrose. 
Isquemia de necessidade e isquemia de fornecimento. Correlação com aterosclerose 
A aterosclerose é uma condição que propicia o desenvolvimento, quer de isquemia de fornecimento, 
quer de isquemia de necessidade. Situações nas quais se verifica o impedimento do fluxo de sangue (por 
exemplo, devido à formação de um trombo), estão associadas a isquemia de fornecimento. Já situações 
de obstrução coronária crónica, em que o aporte de oxigénio é suficiente em repouso, mas insuficiente 
aquando de necessidades energéticas aumentadas, estão 
associadas a isquemia de necessidade. 
A presença de placas ateroscleróticas ao nível das artérias 
coronárias leva ao desenvolvimento de fenómenos de estenose 
(ou seja, de estreitamento do vaso), que podem estar associados a 
isquemia de necessidade. Todavia, devido à presença do 
mecanismo de reserva coronária, mesmo aquando de estenoses 
de 60-70%, o fornecimento de sangue para o fluxo coronário 
mantém-se adequado em situações de repouso. De facto, em 
repouso, só quando o fluxo se encontra comprometido em 80-90% 
é que o paciente desenvolve isquemia de necessidade (em 
situações de esforço, esse valor baixa para os 50%). 
Contudo, as placas ateroscleróticas são susceptíveis de ruptura, 
algo que propicia o desenvolvimento de fenómenos de isquemia 
de fornecimento – quando uma placa de uma artéria coronária 
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rompe são activados mecanismos de coagulação, formando-se subsequentemente um coágulo que 
obstrui a artéria e perturba o fluxo sanguíneo. 
É importante referir que as 
placas de aterosclerose são 
distintas no que concerne à 
sua vulnerabilidade à ruptura. 
Placas com uma cápsula 
fibrosa mais fina, com menor 
grau de estenose, com um 
núcleo rico em lipídeos e com 
mais macrófagos são mais 
propensas para a ocorrência 
de fenómenos de ruptura. Já 
as restantes placas, sobretudo 
devido à presença uma maior 
quantidade de tecido fibroso, 
são mais susceptíveis de 
sofrer calcificação e, embora contribuam para um maior grau de estenose (que, muitas vezes, é 
compensada pelo mecanismo de reserva coronária), não levam a um evento “dramático” como a 
ruptura. 
Aspectos clínicos da doença coronária 
Aquando de um fenómeno de isquemia, verifica-se a presença de um deficit de ATP, uma vez que a 
ocorrência da fosforilação oxidativa fica impedida, devido a um menor aporte de oxigénio. Este 
impedimento da obtenção da energia por via aeróbia leva a que o ATP seja obtido em condições 
anaeróbias, com consequente formação de lactato. Este fenómeno traz duas consequências 
importantes – por um lado, o défice de ATP leva ao desenvolvimento de disfunção sistólica e diastólica, 
enquanto a acumulação de lactato está associada a uma acidose intracelular e, subsequentemente, ao 
desenvolvimento de dor. 
O deficit de ATP que advém de um processo isquémico está associado ao desenvolvimento de disfunção 
sistólica - verifica-se o desenvolvimento de mecanismos de hipocinésia, acinésia e discinésia, bem como 
de hipertensão arterial, de cansaço e de hipoperfusão periférica. Apesar disso, verifica-se que as áreas 
miocárdicas adjacentes àquelas que sofreram necrose desenvolvem hipercinésia, numa tentativa de 
desenvolver um mecanismo de compensação. Por outro lado, o deficit de ATP está associado a uma 
maior propensão para o desenvolvimento de arritmias, assim como ao desenvolvimento de disfunção 
diastólica (uma vez que o ATP é essencial para o funcionamento da SERCA, que promove a entrada de 
cálcio para o retículo sarcoplasmático). 
Devido a um menor aporte de oxigénio, verifica-se que fenómenos de isquemia são sucedidos por morte 
celular. Em termos clínicos, quando um doente se apresenta numa situação isquémica torna-se muito 
importante detectar se já ocorreu necrose (de facto, um enfarte é caracterizada pela presença de 
fenómenos de isquemia e necrose). Essa detecção é conseguida através do doseamento de troponina no 
sangue periférico – uma vez que quando os cardiomiócitos sofrem lise vertem alguns dos seus 
componentes para a circulação sanguínea, proteínas como a troponina ou a mioglobina (presentes ao 
nível destas células) constituem importantes marcadores da ocorrência de necrose. 
De referir que, após um enfarte verifica-se a presença de mecanismos de remodelagem na região 
afectada, nomeadamente num sentido de dilatação ventricular. 
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Fisiologia I 
85 
 
Obstrução total e parcial 
A obstrução de uma artéria coronária (considerando, por exemplo, a ruptura de uma placa 
aterosclerótica) pode ser total ou parcial. Esta distinção é importante, na medida em que o tratamento 
administrado difere nas duas situações. Ao nível do electrocardiograma, fenómenos de obstrução 
coronária total são traduzidos por um supra-desnivelamento do segmento ST, enquanto fenómenos de 
obstrução parcial manifestam-se através de um infra-desnivelamento deste segmento, ou através da 
inversão da onda T. 
Apesar disso, ador sentida na sequência de um processo isquémico é de natureza similar, sendo 
caracterizada por uma elevada intensidade, por um ardor com origem retro-esternal, e pelo facto de 
irradiar para o pescoço e membro superior. 
O electrocardiograma como meio auxiliar de diagnóstico em fenómenos isquémicos 
A ocorrência de fenómenos isquémicos está associada a alterações passíveis de ser observadas no 
electrocardiograma, nomeadamente ao nível do segmento ST (que deixa de ser isoeléctrico passando a 
sofrer um desnivelamento) e da onda T. O electrocardiograma é um meio auxiliar de diagnóstico muito 
útil, na medida em que permite deduzir qual a parede do coração que está a sofrer isquemia – 
alterações ao nível das derivações pré-cordiais indicam a ocorrência de um enfarte agudo do miocárdio 
na parede anterior, devido a oclusão da artéria descendente anterior. Por outro lado, caso as alterações 
se registem em DI e aVL, verifica-se a presença de um enfarte agudo da parede lateral do miocárdio, 
algo que se deve a oclusão da artéria circunflexa. Por fim, alterações em DII, DIII e aVF estão associadas 
à oclusão da artéria coronária direita e, consequentemente, a um enfarte da região posteroinferior do 
miocárdio. 
 
Terapêutica associada 
Terapêutica faramcológica 
A ruptura das placas ateroscleróticas despoleta a activação de mecanismos de hemóstase primária e 
secundária e, como tal, em situações deste tipo, administram-se fármacos anti-plaquetários e 
hipocoagulantes. Também as estatinas são amplamente utilizadas na terapêutica, na medida em que 
estas estabilizam as placas de aterosclerose, diminuindo o risco de estas sofrerem ruptura. 
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Fisiologia I 
86 
 
Numa fase aguda de um enfarte é comum administrarem-se bloqueadores β, cujo efeito se prende com 
a inibição da actividade do sistema nervoso simpático sobre os receptores β1. De facto, um aumento do 
tónus simpático produz efeitos cronotrópicos e inotrópicos positivos, que aumentam as necessidades de 
oxigénio do coração. Por outro lado, a diminuição da actividade simpática leva a uma redução da 
frequência cardíaca, o que está associado a um maior tempo de diástole, ou seja, a um maior tempo de 
perfusão coronária. 
Um raciocínio similar justifica a administração de inibidores do eixo renina-angiotensina em indivíduos 
nessa situação. De facto, a angiotensina tem um efeito inotrópico positivo e promove um aumento da 
pressão arterial. Pelo contrário, o óxido nítrico desempenha uma acção vasodilatadora, assim como (de 
forma menos significativa) uma acção anti-plaquetária e anti-trombótica, o que justifica a administração 
de nitratos a indivíduos que se encontrem com um enfarte em fase aguda. 
Terapêutica invasiva 
Aquando da oclusão completa da artéria coronária, esta deve ser de novo aberta (reperfusão da 
artéria). Como tal, procede-se à administração de fármacos activadores do sistema fibrolítico (que 
promovem a dilatação do coágulo) assim como à introdução de um cateter, que é insuflado na artéria 
em questão, com o objectivo de promover a sua dilatação. Alternativamente, também pode ser feito um 
bypass de um outro vaso para a artéria ocluída, ou, em último caso, pode-se introduzir um balão intra-
aórtico, que insufla em diástole e desinsufla em sístole, o que permite aumentar a pressão diastólica de 
perfusão e reduzir a pós-carga, através de um efeito tipo sucção. 
 
 
 
 
 
 
 
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Fisiologia I 
87 
 
Fisiopatologia da insuficiência cardíaca 
Apesar de não existir uma definição 
consensual para a insuficiência cardíaca, 
esta é frequentemente entendida como 
um estado fisiopatológico caracterizado 
por uma anomalia da função cardíaca, 
que causa uma incapacidade de bombear 
sangue de acordo com as necessidades 
metabólicas do organismo (insuficiência 
cardíaca sistólica), ou em que se verifica a 
presença dessa capacidade, mas o 
enchimento ventricular apenas ocorre à 
custa de pressões elevadas (insuficiência 
cardíaca diastólica). Os dois tipos de insuficiência cardíaca também são passíveis de ser distinguidos 
através da morfologia ventricular – situações de insuficiência cardíaca sistólica caracterizam-se pela 
presença de ventrículos dilatados e globosos, enquanto situações de insuficiência cardíaca diastólica 
estão associadas a um aumento da espessura do ventrículo (isto é compreensível, na medida em que 
um ventrículo muito espesso é, consequentemente, menos dilatável). 
A insuficiência cardíaca é frequentemente 
desenvolvida na sequência de doenças valvulares, 
hipertensão arterial, cardiopatias, ou doença 
coronária. Todavia, o “perfil típico de paciente” é 
diferente nos dois tipos de insuficiência cardíaca – 
indivíduos do sexo masculino e/ou com antecedentes 
de enfartes são mais propensos a desenvolver 
insuficiência cardíaca sistólica, enquanto indivíduos 
do sexo feminino, com idade avançada, com 
hipertensão e/ou com diabetes mellitus têm mais 
tendência a desenvolver insuficiência cardíaca 
diastólica. Apesar disso, os sintomas e sinais 
associados à insuficiência cardíaca sistólica são 
similares àqueles associados à insuficiência cardíaca 
diastólica. 
São vários os sintomas apresentados pelos doentes 
que apresentam insuficiência cardíaca, 
nomeadamente: 
1. Cansaço 
2. Dispneia de esforço – A dispneia é definida como sendo um sentido subjectivo de “falta de ar”, 
sendo que, em situações de insuficiência cardíaca, este fenómeno verifica-se devido a uma 
maior acumulação de fluido no espaço intersticial pulmonar. 
3. Ortopneia – A ortopneia é definida como sendo dispneia sentida quando o doente se encontra 
em decúbito. Isto deve-se ao facto de, quando os pacientes se encontram deitados, a força 
gravítica deixar de fazer efeito e mais fluido regressar ao coração. Ora, como o coração se 
encontra pouco capaz de bombear sangue, acumula-se mais fluido no espaço intersticial 
pulmonar. Isto explica porque é que muitos doentes com insuficiência cardíaca muitas vezes 
não conseguem dormir deitados. 
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Fisiologia I 
88 
 
Já no que concerne aos sinais da insuficiência cardíaca, verifica-se a presença de turgescência venosa 
jugular, de edemas nos membros inferiores, de ascite (acumulação de fluido na região abdominal) e de 
derrames pleurais (acumulação excessiva de fluido na cavidade pleural). Os edemas, a ascite e os 
derrames pleurais resultam da acumulação de fluido intersticial nas respectivas regiões, por diminuição 
da função cardíaca. Para além disso, aquando de situações de insuficiência cardíaca, registam-se 
alterações na auscultação cardíaca (presença do som S3) e pulmonar. 
Avaliação dos determinantes da função cardíaca 
No que concerne à avaliação dos determinantes da função cardíaca, uma vez que em situações de 
insuficiência cardíaca o coração se vê incapaz de bombear sangue que assegure todas as necessidades 
do organismo, um doente com disfunção sistólica apresenta uma menor contractilidade, assim como um 
aumento da pré-carga. Contudo, apesar desse aumento da pré-carga, o volume de ejecção é menor, 
porque o ventrículo tem menor capacidade de ejectar sangue. Assim, os indivíduos com disfunção 
sistólica apresentam ansas pressão-volume com largura menor. 
Já um doente com disfunção diastólica mantém a sua contractilidade, contudo, uma vez que o 
ventrículo se encontra mais rígido, para um mesmo volume, a pressão sentida dentro do ventrículo é 
superior. 
 
Disfunção diastólica 
Papel da SERCA 
A disfunçãodiastólica pode se dever a um atraso na recaptação de cálcio para o retículo 
sarcoplasmático, por via da inactivação da SERCA. Ora, uma vez que a actividade da SERCA depende da 
presença de ATP, a disfunção diastólica pode estar associada a um processo de isquemia (em situações 
de isquemia, verifica-se uma diminuição do aporte de ATP). 
Uma vez que o fosfolamban actua por inibição/desinibição da SERCA, e dado que o próprio fosfolamban 
se pode encontrar activo ou inactivo (algo que ocorre por via de mecanismos de 
fosforilação/desfosforilação), actualmente estão a ser estudadas terapias para a insuficiência cardíaca 
que envolvam a alteração do estado de fosforilação do fosfolamban, como forma de promover a 
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Fisiologia I 
89 
 
activação da SERCA. De referir que estão ainda a decorrer investigações no sentido de promover a 
entrada de SERCA para o interior dos cardiomiócitos. 
Aumento da rigidez ventricular: Determinantes e consequências 
O aumento da rigidez ventricular é determinado por 
factores intrínsecos aos cardiomiócitos (que incluem a 
alteração das isoformas da titina, bem como alterações na 
fosforilação desta proteína), mas também por alterações da 
matriz extracelular, nomeadamente por um aumento da 
fibrose da matriz extracelular (a fibrose impede a 
distensibilidade ventricular). 
O aumento da rigidez ventricular acarreta um aumento da 
pressão de enchimento ventricular, o que origina uma maior 
pressão auricular, e o que, por sua vez, leva a um 
incremento da pressão nos capilares pulmonares. Isto 
justifica o extravasamento de fluido para o espaço 
intersticial pulmonar e consequente dispneia nos indivíduos com insuficiência cardíaca. 
Num indivíduo normal, o ventrículo enche, sobretudo, aquando da fase de enchimento rápido, no início 
da diástole (onda E do ecocardiograma). Esse enchimento decresce na fase da diastase, mas volta a 
aumentar na fase de contracção auricular (onda A do ecocardiograma), de tal modo que a razão entre a 
amplitude da onda E e a amplitude da onda A é superior a 1 (
 
 
 ). 
Todavia, num indivíduo cujo relaxamento ventricular esteja atrasado (disfunção diastólica de grau I), o 
enchimento regista-se, sobretudo, ao nível da contracção auricular, na medida em que no início da 
diástole, o ventrículo ainda não se encontra preparado para receber a quantidade de sangue que 
deveria. Deste modo, em situações de disfunção diastólica de grau I, 
 
 
 . 
Em fases mais avançadas da insuficiência cardíaca diastólica, o enchimento ventricular torna-se muito 
dificultado, na medida em que, devido à rigidez ventricular, basta um pequeno influxo de sangue para o 
ventrículo, para que se registe um aumento desproporcionalmente grande da pressão, ao nível desta 
Bernardo Manuel de Sousa Pinto ❖Faculdade de Medicina da Universidade do Porto 
Fisiologia I 
90 
 
cavidade. Em termos de classificação, caso o doente apresente disfunção diastólica e 
 
 
 , então esta é 
classificada como sendo uma disfunção diastólica de grau II. Uma vez que num indivíduo normal a razão 
entre a amplitude de E e a amplitude de A também é superior a 1, este padrão de disfunção diastólica é 
designado por pseudo-normalizado e é muito difícil de distinguir do padrão normal. Por outro lado, caso 
 
 
 , o paciente apresenta um padrão restritivo, ou seja, uma disfunção diastólica de grau III. De 
referir que disfunções diastólicas deste tipo são mais características de indivíduos com disfunção 
diastólica em fase avançada. 
Insuficiência cardíaca sistólica 
A insuficiência cardíaca sistólica resulta da falência da capacidade contráctil do coração e está 
frequentemente associada à ocorrência prévia de um enfarte do miocárdio, na medida em que a 
necrose que advém do enfarte leva a uma diminuição da quantidade de células contrácteis ao nível do 
miocárdio. 
Aquando de situações de insuficiência cardíaca sistólica, o organismo activa uma série de mecanismos 
de compensação que, inicialmente, apresentam um efeito benéfico, mas cuja acção crónica leva a 
efeitos nefastos. Estes mecanismos incluem: 
1. Dilatação ventricular - Numa fase inicial, permite um aumento da pré-carga e, 
consequentemente, um aumento da quantidade de sangue ejectada. 
2. Aumento da vasoconstrição periférica – Uma vez que em situações de insuficiência cardíaca 
sistólica verifica-se uma diminuição do débito cardíaco, de modo a manter a pressão arterial 
constante, o organismo promove o aumento da vasoconstrição periférica, pois este fenómeno 
leva a um aumento da resistência vascular periférica (note-se que: 
 
3. Aumento da retenção renal de sódio e água e activação do sistema nervoso simpático: Estes 
mecanismos promovem a manutenção do débito cardíaco (por aumento do volume 
plasmático), sendo que a activação do sistema nervoso simpático gera ainda um efeito 
inotrópico e cronotrópico positivo. 
O despoletar destes processos deve-se à activação de mecanismos neuro-hormonais que envolvem, 
entre outros, o sistema nervoso simpático, o sistema renina-angiotensina, o sistema da endotelina e o 
sistema dos peptídeos natriuréticos. 
Sistema nervoso simpático 
O sistema nervoso simpático actua promovendo o inotropismo, o cronotropismo, o relaxamento, a 
vasoconstrição periférica, a activação do eixo renina-angiotensina e a reabsorção de água. Todavia, a 
sua acção exacerbada crónica leva ao desenvolvimento de efeitos nefastos, nomeadamente: 
1. Aumento do consumo energético 
2. Aumento da pós-carga 
3. Aumento de um maior risco de arritmias 
4. Promoção da remodelagem ventricular 
Estes efeitos justificam a administração de bloqueadores dos receptores β1 aquando do tratamento de 
indivíduos com insuficiência cardíaca. 
 
 
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Fisiologia I 
91 
 
Sistema renina-angiotensina 
A activação do sistema renina-
angiotensina despoleta efeitos similares 
– verifica-se um aumento do 
inotropismo, maior vasoconstrição 
periférica e um aumento da retenção de 
sódio e água. Contudo, em termos 
crónicos, a activação deste sistema leva a 
situações de hipertrofia e fibrose, a 
remodelagem ventricular e vascular, a 
maior síntese de aldosterona e a uma 
maior propensão para o 
desenvolvimento de edema. 
Estes efeitos justificam a administração 
de IECAs (inibidores da enzima de 
conversão da angiotensina), de 
bloqueadores dos receptores AT1 (aos 
quais a angiotensina II se liga, 
promovendo os efeitos descritos) e de 
inibidores da renina, aquando da 
terapêutica da insuficiência sistólica. Por 
outro lado, o facto de o sistema renina-
angiotensina e o sistema nervoso 
simpático promoverem a retenção de 
água e sódio motiva o uso de diuréticos 
no tratamento de indivíduos com insuficiência sistólica. 
Sistema da endotelina 
A síntese de endotelina também se encontra promovida, aquando de situações de insuficiência cardíaca. 
Esta hormona, ao actuar sobre os receptores ETA, promove a hipertrofia e fibrose ventriculares, assim 
como um aumento da vasoconstrição, do inotropismo, e dos níveis de aldosterona. Todavia, na 
terapêutica da insuficiência sistólica não são utilizados os antagonistas da endotelina, na medida em que 
estes apresentam vários efeitos colaterais. 
Sistema da vasopressina 
Também o sistema da vasopressina se encontra activo em indivíduos com insuficiência sistólica. A 
ligação da vasopressina aos receptores V1 promove a vasoconstrição, enquanto a ligação desta hormona 
aos receptores V2 promove a retenção de água.De referir que, o bloqueio dos receptores V2 já foi 
estudado como prática terapêutica, contudo, este processo não é utilizado, na medida em que 
despoleta vários efeitos colaterais. 
Sistema dos peptídeos natriuréticos 
Por fim, o sistema dos peptídeos natriuréticos também se encontra activo aquando de situações de 
insuficiência sistólica. De entre estes peptídeos, destaque para o peptídeo natriurético B (BNP), que é 
produzido pelas células ventriculares em resposta ao estiramento dos cardiomiócitos. O BNP actua 
como um mecanismo de contra-regulação aos restantes mecanismos, já referidos – de facto, este 
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Fisiologia I 
92 
 
peptídeo inibe a acção do sistema 
nervoso simpático e o sistema 
renina-angiotensina, ao mesmo 
tempo que promove a diurese, a 
natriurese e a vasodilatação 
arterial. Deste modo, actualmente, 
procura-se desenvolver uma 
terapêutica para a insuficiência 
sistólica que passe pela promoção 
dos efeitos do BNP. 
Actualmente, também se está a 
investigar as possibilidades da 
administração de anti-
inflamatórios nos doentes com 
insuficiência cardíaca, na medida 
em que esta perturbação acarreta 
uma grande activação do sistema 
inflamatório. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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Fisiologia I 
93 
 
Hemodinâmica e hemorreologia 
O fluxo sanguíneo (Q) é passível de ser definido como a quantidade de sangue que atravessa um 
determinado local por unidade de tempo (exprime-se por isso em mL/minuto ou L/minuto) e pode ser 
calculado através do quociente entre a variação de pressões (ΔP) e a resistência (R), ou seja: 
 
 
 
 
A pressão corresponde à força exercida pelo sangue por unidade de área da parede de um vaso, 
podendo ser expressa em mm Hg ou cm H2O. Quando se afirma que a pressão de um vaso é de x mm Hg 
ou de y cm H2O significa que a força exercida permite elevar uma coluna de mercúrio x mm, ou uma 
coluna de água y cm, respectivamente. Já a resistência é passível de ser definida como a oposição ao 
fluxo num vaso. As arteríolas são os vasos mais importantes na génese da resistência à ejecção 
ventricular esquerda, devido à elevada quantidade de músculo liso presente nas suas paredes (deste 
modo, as arteríolas são o principal componente da 
resistência vascular periférica). A constrição arteriolar leva 
a um aumento da pressão a montante e a uma diminuição 
da pressão a jusante, enquanto a dilatação arteriolar leva 
ao efeito oposto. Assim, a constrição arteriolar leva a um 
aumento da pressão arterial, mas a uma diminuição da 
pressão dos capilares e veias. 
A velocidade do fluxo (expressa em unidades de distância 
por unidades de tempo) varia ao longo dos diferentes 
tipos de vasos que constituem o sistema cardiovascular, 
mesmo que o fluxo sanguíneo se mantenha. A velocidade 
de fluxo varia inversamente com a área de secção 
transversal agregada. À medida que caminhamos desde a 
aorta até aos capilares, apesar da área de secção 
transversal individual (de cada vaso) diminuir, a área de 
secção transversal agregada (correspondente ao 
somatório das áreas de secção transversal de todos os 
vasos do mesmo tipo) aumenta. Isto explica porque é que 
a velocidade de fluxo é máxima na aorta e mínima nos 
capilares (que apresentam a maior área de secção 
transversal agregada). A lentidão do fluxo capilar constitui 
uma vantagem, na medida em que maximiza o tempo 
disponível para as trocas transcapilares, permitindo que 
todas as trocas entre o eritrócito e o tecido ocorram ao 
longo do primeiro terço do capilar. 
Caracterização do fluxo 
O sangue flui normalmente nos vasos de forma ordenada, descrevendo um fluxo laminar. Este fluxo é 
caracterizado por uma trajectória do sangue paralela à parede do vaso e pelo facto da velocidade do 
sangue ser maior no centro do vaso, comparativamente à periferia. O fluxo é avaliado com base no 
número de Reynolds associado – caso o número de Reynolds seja inferior a 2000, o fluxo diz-se laminar, 
enquanto um número de Reynolds entre 2000 e 3000 diz respeito a um fluxo de transição. Já um 
número de Reynolds superior a 3000 corresponde a um fluxo turbulento, característico do fluxo de 
sangue a altas velocidades, ou por vasos estreitos ou estenosados. O fluxo laminar é o mais eficiente sob 
Bernardo Manuel de Sousa Pinto ❖Faculdade de Medicina da Universidade do Porto 
Fisiologia I 
94 
 
o ponto de vista energético, na medida em que toda a 
energia é gasta na produção de movimento (no fluxo 
turbulento, por seu turno, parte da energia é gasta na 
génese de correntes espirais). De referir que o número 
de Reynolds é passível de ser calculado pela fórmula: 
 
 
 
 
Sendo que, nesta fórmula, corresponde à densidade 
do fluido, D corresponde ao diâmetro do vaso, v 
corresponde à velocidade média do fluxo, e 
corresponde à viscosidade do fluido. 
Viscosidade e shear stress 
O sangue é um fluido viscoso, sendo que a viscosidade depende de vários factores, nomeadamente: 
1. Hematócrito (razão entre o volume de eritrócitos e o volume de sangue) – Uma situação de 
anemia, na qual o hematócrito se encontra diminuído, cursa com menor viscosidade. Por 
outro lado, uma situação de policitemia (em que se verifica um aumento do hematócrito) está 
associada ao fenómeno inverso. 
2. Composição do plasma – A título de exemplo, a viscosidade é proporcional à concentração de 
fibrinogénio. 
3. Diâmetro do vaso – A viscosidade é inversamente proporcional ao diâmetro do vaso. 
4. Temperatura – O aumento da temperatura promove a diminuição da viscosidade, enquanto a 
diminuição da temperatura está associada à precipitação de várias proteínas, o que promove 
um aumento da viscosidade. 
5. Resistência oferecida pelas células – Indivíduos com anemia falciforme apresentam 
eritrócitos com forma de foice, que oferecem mais resistência, comparativamente aos 
eritrócitos normais. 
A viscosidade do sangue leva a que a sua 
passagem através de um vaso gere shear 
stress. O shear stress, também designado 
por força de cisalhamento, corresponde 
ao atrito que o sangue provoca na parede 
dos vasos, ou seja, à força que tenta 
“arrastar” a parede endotelial, à medida 
que o sangue flui. 
O shear stress (τ) é passível de ser 
calculado através da seguinte fórmula: 
 
 
 
 
Isto significa que o shear stress é proporcional à viscosidade do sangue ( ) e ao fluxo sanguíneo (Q), e 
inversamente proporcional à densidade do sangue ( ) e ao cubo do raio do vaso (r). É importante referir 
que o shear stress promove a libertação de factores vasodilatadores e de factores angiogénicos tais 
como o PDGF e o TGF-β, assim como a libertação de endotelina 1 e enzima de conversão da 
angiotensina. 
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Fisiologia I 
95 
 
Propriedades elásticas dos vasos 
O padrão de pressão da circulação atinge valores máximos nas artérias e mínimos nas veias, sendo que a 
maior queda de pressão ocorre ao nível das arteríolas. Já a aorta, é responsável por transformar a 
variação abrupta da pressão ventricular esquerda num padrão mais suave e de pressão diastólica mais 
elevada. 
A compliance (complacência ou capacitância) de um vaso descreve a forma como as variações de 
volume se repercutem em alterações na pressão transmural (diferença entre a pressão no lúmen e a 
pressão externa ao vaso), sendo calculada através da fórmula: 
 
 
 
 
Deste modo, vasos com elevada compliance toleramgrandes alterações de volume sem que daí 
resultem aumentos muito elevados de pressão, enquanto em vasos com baixa compliance acontece o 
oposto. Desta forma, não é de estranhar que as veias tenham maior compliance que as artérias – os 
aumentos de volume ao nível das veias repercutem-se, sobretudo, sob a forma de alterações na 
geometria destes vasos (e não tanto através do aumento de pressão). A compliance é entendida como o 
inverso da rigidez e, visto que a rigidez aumenta nas artérias mais periféricas, a compliance é menor nas 
artérias mais periféricas. Isto explica porque é que para um mesmo fluxo, as artérias mais periféricas 
apresentam um maior pico de pressão máxima (ou seja, uma maior pressão arterial sistólica) e um 
menor valor de pressão mínima (ou seja um valor menor da pressão diastólica) – as mesmas alterações 
de volume produzem alterações de pressão mais pronunciadas. 
Por outro lado, as 
artérias menos rígidas 
(como a artéria aorta) 
são caracterizadas 
pelo seu elastic recoil. 
O elastic recoil diz 
respeito à capacidade 
de armazenar energia 
potencial na sua 
parede durante a 
sístole, e de a 
converter em energia 
cinética durante a diástole (ou seja, o elastic recoil pode ser entendido como a propriedade que induz os 
vasos a regressarem à sua morfologia inicial). Deste modo, o elastic recoil é responsável pela incisura e 
pela onda dícrota presentes na curva de pressão das artérias mais proximais. Uma vez que as artérias 
mais rígidas apresentam menos elastic recoil, as suas curvas de pressão não apresentam incisura nem 
onda dícrota. 
 
 
 
 
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Regulação da pressão arterial 
A pressão arterial é passível de ser definida como a força exercida pelo fluxo sanguíneo por unidade de 
área. A avaliação deste parâmetro pode-se fazer por avaliação directa intravascular, sendo necessária a 
introdução de um transdutor de pressão, ao nível dos vasos. Com isto se depreende que este método é 
altamente invasivo, apesar de permitir a obtenção dos valores de tensão arterial sistólica e tensão 
arterial diastólica com elevada precisão. A tensão arterial sistólica é o valor máximo registado de 
pressão arterial, enquanto a tensão arterial diastólica é o valor mínimo. Assim, na prática clínica 
quotidiana, como forma de registar a tensão arterial sistólica e a tensão arterial diastólica, recorre-se 
frequentemente a métodos menos invasivos, mas também menos precisos, tais como a medição da 
pressão ao nível do pulso. 
Os dois valores obtidos permitem calcular a tensão arterial média. Esta é passível de ser definida como 
sendo a média da pressão efectiva que conduz o sangue aos órgãos sistémicos e é estimada através da 
fórmula: 
 
 
 sendo que a pressão de pulso é calculada através da 
diferença entre a tensão arterial sistólica e a tensão arterial diastólica (ou seja, 
 
 
 . 
A magnitude de um aumento de pressão causada por um aumento de volume arterial depende, não só 
do valor de aumento do volume, mas também da complacência do espaço arterial. A complacência 
(compliance) é passível de ser definida como sendo o inverso da rigidez e, como tal, diminui, à medida 
que os vasos se encontram mais perifericamente. Assim, numa estrutura com complacência nula, 
aquando de uma pequena alteração de volume, regista-se um aumento infinito de pressão; enquanto 
numa estrutura com complacência infinita, o volume pode variar indeterminadamente, sem que haja 
variação na pressão. Ao nível venoso, encontramos uma complacência superior àquela registada ao 
nível arterial, algo que se deve ao facto de variações de volume ao nível venoso se repercutirem mais 
numa alteração de morfologia, que propriamente em alterações de pressão. De referir que a 
complacência diminui progressivamente para os indivíduos mais idosos, uma vez que estes têm, 
normalmente, maior pressão arterial e devido ao facto de a aterosclerose estar associada a maior 
rigidez. 
 
Mecanismos de regulação a curto prazo 
Cada órgão, quer se encontre mais próximo ou mais distante do coração, encontra-se sujeito à mesma 
pressão arterial média, mas controla o fluxo de sangue local, através do aumento ou decréscimo da 
resistência arteriolar local. Assim, enquanto o coração conseguir manter a pressão arterial média, o 
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Fisiologia I 
97 
 
fluxo sanguíneo num leito capilar não afecta o fluxo sanguíneo noutros capilares. Contudo, a questão 
não é assim tão simples – não basta ao coração manter a pressão arterial constante, a pressão arterial 
também se deve encontrar de tal modo elevada, que se torne possível a ocorrência de filtração 
glomerular nos rins, ou que as pressões elevadas ao nível de tecidos de órgãos como o olho possam ser 
ultrapassadas. 
Existem, como tal, dois tipos de vias para regulação da pressão arterial – o mecanismo de regulação 
arterial a curto prazo ocorre numa escala de segundos ou minutos e é feito através de vias neurais, 
tendo como alvos o coração, vasos e medula da glândula supra-renal. Já a regulação da pressão arterial 
a longo prazo ocorre numa escala de horas ou dias, através de vias que têm como alvo os vasos 
sanguíneos e, sobretudo, os rins, no seu controlo do volume do fluido extracelular (desta forma, na 
regulação a longo prazo são activados sistemas neuro-humorais, que envolvem a acção do sistema 
nervoso simpático e do sistema renina-angiotensina). 
Os sistemas de reflexo neural que regulam a pressão arterial média através de mecanismos de curto 
prazo operam através de uma série de mecanismos de feedback negativo, que envolvem sempre: 
1. Um detector – Um sensor ou receptor quantifica a variável a ser controlada e transduz a 
mensagem num sinal eléctrico. Os receptores primários envolvidos nos mecanismos de 
regulação a curto prazo são barorreceptores (receptores de pressão), mais concretamente, 
receptores de estiramento (ou mecanorreceptores), que detectam a distensão das paredes 
vasculares. Já os sensores secundários são designados por quimiorreceptores, detectando 
variações nas pressões sanguíneas de oxigénio e dióxido de carbono, assim como alterações de 
pH. 
2. Vias neurais aferentes – Enviam a mensagem para o sistema nervoso central. 
3. Centro coordenador – Um centro de controlo no sistema nervoso central compara o sinal 
detectado na periferia a um ponto-padrão, gerando um sinal de erro, processando a 
informação e originando uma mensagem que codifica a resposta adequada. Os centros de 
controlo envolvidos nos mecanismos de regulação a curto prazo encontram-se localizados, 
sobretudo, ao nível do bulbo raquidiano, embora haja locais no hipotálamo e córtex cerebral, 
que também exerçam controlo em mecanismos deste tipo. 
4. Vias neurais eferentes – Enviam a mensagem proveniente do centro coordenador para a 
periferia. 
5. Efectores – Elementos que executam a resposta apropriada e alteram a variável a ser 
controlada. Neste caso, os efectores incluem as células musculares cardíacas e de pacemaker, 
as células musculares lisas vasculares das artérias e veias, e a medula da glândula supra-renal. 
Reflexo barorreceptor 
Os barorreceptores desta via reflexa encontram-se presentes ao nível das artérias aorta e carótida 
interna, em locais estratégicos de elevada pressão, sendo por isso designados por barorreceptores de 
alta pressão. Os dois locais mais importantes onde estes receptores se encontram presentes são o seio 
carotídeo e o arco aórtico. Deste modo, um aumento da pressão arterial média leva ao estiramento das 
paredes vasculares nesteslocais, o que causa vasodilatação e bradicardia, enquanto uma diminuição da 
pressão arterial média leva a vasoconstrição e taquicardia. 
O seio carotídeo e o arco aórtico são estruturas muito complacentes, sendo que a parede arterial do 
seio carotídeo contém muitas fibras elásticas, mas pouco colagénio e músculo liso (o seio carotídeo é, 
contudo, mais rígido em indivíduos hipertensos). Os barorreceptores em ambas as estruturas 
encontram-se em terminais de fibras nervosas sensitivas mielinizadas e não-mielinizadas, que se 
encontram por entre as camadas elásticas. Esses terminais exprimem uma série de canais de catiões 
Bernardo Manuel de Sousa Pinto ❖Faculdade de Medicina da Universidade do Porto 
Fisiologia I 
98 
 
não-selectivos (canais 
TRP), que actuam 
como transdutores 
electromecânicos e 
moduladores da 
transdução. Desta 
forma, um aumento da 
diferença de pressão 
transmural alarga o 
vaso e, 
consequentemente, 
deforma os 
barorreceptores. Ora, 
o estiramento destes 
receptores produz uma 
corrente que 
despolariza o receptor, 
gerando um potencial 
de receptor (verifica-
se a génese de uma 
resposta bifásica em resposta ao aumento de pressão, que inclui a presença de um componente 
dinâmico, ou seja, uma grande despolarização inicial; e a presença de um componente estático, em que 
a despolarização ocorre de modo mais discreto). Contudo, é necessário ressalvar que o potencial 
receptor é proporcional ao grau de estiramento, ocorrendo um progressivo recrutamento de 
receptores, com o aumento da pressão. Também é importante referir que os reflexos barorreceptores 
são altamente sensíveis a variações de pressão que ocorram quando a pressão arterial se encontra entre 
os 100 e os 200 mm/Hg. Quando a pressão é superior a 200 mm/Hg é atingido um nível de saturação, 
enquanto para valores de pressão arterial inferiores a 50 mm/Hg, os barorreceptores apresentam 
actividade quase inexistente (todavia, o seio carotídeo, embora seja activado mais precocemente, 
também satura mais precocemente, comparativamente ao arco aórtico). 
Após uma alteração na pressão arterial ter provocado uma alteração na actividade de um nervo 
sensitivo, os sinais são enviados para o bolbo raquidiano. A via aferente para o reflexo do seio carotídeo 
encontra-se ao nível do nervo sinusal, que se junta ao nervo glossofaríngeo (os corpos celulares dos 
aferentes dos barorreceptores carotídeos encontram-se localizados no gânglio petroso deste nervo). Já 
as vias aferentes do reflexo do arco aórtico consistem nas fibras sensitivas do ramo depressor do nervo 
vago, cujos corpos celulares se encontram no gânglio nodoso do vago. 
A maior parte das fibras aferentes provenientes dos dois barorreceptores de alta-pressão projectam 
para o núcleo do tracto solitário (o neurotransmissor associado é o glutamato). Subsequentemente, os 
interneurónios inibitórios que se projectam a partir do núcleo do tracto solitário fazem-no para a área 
vasomotora no bolbo ventrolateral. Os neurónios da área vasomotora promovem tonicamente a 
vasoconstrição e, como tal, aquando de aumentos de pressão, os neurónios inibitórios do núcleo do 
tracto solitário inibem os neurónios da área vasomotora, o que resulta em vasodilatação. Esta via 
contribui então para a componente vascular do reflexo barorreceptor. 
Já os interneurónios excitatórios projectam-se a partir do núcleo do tracto solitário para uma área 
cardio-inibitória, que inclui o núcleo ambíguo e o núcleo motor dorsal do vago (estes últimos 
contribuem para a componente cardíaca do reflexo). Assim, quando a pressão arterial aumenta, os 
neurónios excitatórios do núcleo do tracto solitário estimulam a acção dos neurónios da área cardio-
Bernardo Manuel de Sousa Pinto ❖Faculdade de Medicina da Universidade do Porto 
Fisiologia I 
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inibitória. Por fim, existe 
ainda uma área cardio-
aceleratória, para a qual se 
projectam alguns 
interneurónios inibitórios. 
Como o seu nome indica, a 
estimulação dos neurónios da 
carga cardio-aceleratória leva 
a um aumento da frequência 
e contractilidade cardíaca. 
As fibras simpáticas eferentes 
apresentam os seus corpos 
localizados na coluna 
intermediolateral da espinal 
medula. Os seus neurónios 
pós-ganglionares simpáticos 
associados controlam uma 
grande diversidade de 
funções, sendo que os que 
controlam a pressão sanguínea deslocam-se com os grandes vasos e inervam artérias musculares, 
arteríolas e veias. Um incremento na actividade simpática produz vasoconstrição, enquanto um 
aumento na actividade parassimpática leva a vasodilatação. Todavia, quando o reflexo barorreceptor é 
despoletado, o efeito da vasodilatação é conseguido, sobretudo através de uma inibição da actividade 
do sistema nervoso simpático (e não tanto por activação do sistema nervoso parassimpático). 
Para além dos vasos, estes neurónios pós-ganglionares autónomos actuam ao nível do coração. No que 
concerne ao sistema nervoso simpático, os outputs provenientes dos gânglios cervical médio, estrelado 
e torácicos superiores ramificam-se e formam os nervos cardíacos. Estes exercem um efeito 
cronotrópico positivo (sobretudo 
os nervos cardíacos do lado direito, 
devido à maior proximidade ao nó 
sinusal), dromotrópico positivo e 
inotrópico positivo 
(nomeadamente, por acção dos 
nervos do lado esquerdo). Já no 
que concerne ao sistema nervoso 
parassimpático, a sua acção 
cardíaca é, novamente, secundária 
- as suas fibras deslocam-se por via 
do nervo vago e, ao nível do 
coração, exercem um efeito 
cronotrópico negativo (sobretudo, 
por acção do nervo vago direito, 
pela proximidade com o nó sinusal) 
e um efeito inibidor da condução 
ao nível do nó AV (por acção, 
sobretudo, do nervo vago 
esquerdo). 
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Fisiologia I 
100 
 
Reflexos cardio-pulmonares 
Os barorreceptores localizados em sítios de alta pressão não são os únicos receptores de estiramento 
envolvidos na regulação da circulação por feedback. Os barorreceptores de baixa pressão, que 
consistem em terminais simples de fibras nervosas mielinizadas, encontram-se localizados em sítios 
estratégicos de baixa pressão, incluindo a artéria pulmonar, o local de junção das aurículas com as veias 
correspondentes, as aurículas e os ventrículos. 
 
A distensão desses receptores depende, sobretudo, do retorno venoso para o coração. Dessa forma, 
estes mecanorreceptores detectam a “completude” da circulação, pertencendo a um conjunto maior de 
sensores de volume que controlam o volume circulante efectivo do sangue. Assim, estes receptores 
também ajudam no controlo do débito cardíaco e, como tal, indirectamente, da pressão arterial média. 
Receptores auriculares de baixa pressão do tipo B 
As vias aferentes para os receptores de baixa pressão auriculares do tipo B são similares às vias para os 
barorreceptores de alta pressão, sendo que as fibras associadas se deslocam para o vago e se 
projectam, sobretudo, para o núcleo do tracto solitário (embora também para outros centros 
cardiovasculares do bolbo). As vias eferentes são também similares. Contudo, enquanto um aumento do 
estiramento sentido pelos receptores de alta pressão leva a uma diminuição da frequência cardíaca; o 
aumento do estiramento sentido pelos receptores de baixa pressão eleva a frequência cardíaca (reflexo 
de Bainbridge). Para além disso, o aumento do estiramento dos receptores de baixa pressão leva a um 
decréscimo do output simpático vasoconstritor apenas ao nível do rim. Assim, no cômputo geral, um 
maior estiramento auricular leva a taquicardia e a vasodilatação renal e, consequentemente,regista-se 
um aumento do fluxo sanguíneo renal e um aumento da produção de urina. 
O aumento de produção de urina deve-se também a 
mecanismos não-neurais – as fibras aferentes dos 
receptores auriculares que se projectam para o 
núcleo do tracto solitário também sinaptizam aí com 
neurónios que se projectam para o hipotálamo. 
Consequentemente, verifica-se a inibição da síntese 
de hormona anti-diurética (ADH) por parte do 
hipotálamo (ou seja, a diurese fica promovida). 
Paralelamente, verifica-se um aumento da produção 
do peptídeo natriurético auricular, um vasodilatador 
renal, que actua num sentido de aumentar a 
Bernardo Manuel de Sousa Pinto ❖Faculdade de Medicina da Universidade do Porto 
Fisiologia I 
101 
 
excreção renal de sódio (que está associada a uma subsequente excreção de água). Assim, aquando da 
estimulação dos barorreceptores auriculares também a diurese e a natiurese ficam estimuladas. 
Reflexo de Bainbridge 
O reflexo de Bainbridge é o nome dado à taquicardia causada por um aumento do retorno venoso. O 
aumento do volume sanguíneo, por sua vez, leva a um aumento da actividade das fibras B de baixa 
pressão, durante o enchimento auricular. A via eferente deste reflexo é conduzida pelo sistema nervoso 
autónomo (simpático e parassimpático) para o nó sinusal, que determina a frequência cardíaca. Assim o 
despoletar deste reflexo está associado a um aumento na frequência cardíaca e a efeitos insignificantes 
na contractilidade cardíaca e volume de ejecção. Uma vez que o reflexo de Bainbridge atinge saturação, 
o aumento da frequência cardíaca é maior, aquando de baixas frequências cardíacas basais (ou seja, 
quando o mecanismo é activado num contexto de baixas frequências cardíacas). 
O reflexo de Bainbridge actua como um contrabalanço do reflexo barorreceptor no controlo da 
frequência cardíaca, num sentido em que o aumento do volume circulante (isto é, o aumento do 
retorno venoso e a estimulação dos receptores de baixas pressões) aumenta o débito cardíaco. Por 
outro lado, um menor estiramento auricular tem um efeito muito reduzido na frequência cardíaca, na 
medida em que não está associado ao despoletar do reflexo de Bainbridge. 
Receptores de baixa pressão ventriculares 
Existem também receptores de baixa pressão ao nível ventricular. O estiramento sentido por esses 
receptores leva a bradicardia e vasodilatação, ou seja, verificam-se respostas similares àquelas 
associadas ao estiramento dos receptores arteriais de alta pressão. Todavia, os receptores ventriculares 
não contribuem, de modo significativo, para a homeostasia do output cardíaco. 
Reflexo quimiorreceptor 
Apesar de os barorreceptores constituírem os sensores primários para o controlo da pressão sanguínea, 
também os quimorreceptores periféricos participam neste processo. Contudo, enquanto os inputs 
provenientes dos barorreceptores exercem um efeito negativo no centro vasomotor do bolbo, causando 
vasodilatação; os inputs provenientes dos quimiorreceptores periféricos exercem um efeito positivo no 
centro vasomotor, levando a vasoconstrição, mas também a bradicardia. 
Quimiorreceptores periféricos 
Os quimiorreceptores periféricos localizam-se ao nível do corpo aórtico e corpo carotídeo. Uma queda 
do oxigénio arterial, um aumento de dióxido de carbono, ou um decréscimo do pH estimulam a 
actividade dos neurónios aferentes associados aos quimiorreceptores periféricos. As fibras aferentes são 
transportadas pelos nervos vago e glossofaríngeo até aos centros de controlo, ao nível do bolbo. 
Subsequentemente, a esse nível é induzida uma resposta de vasoconstrição e bradicardia. Apesar disso, 
pacientes com hipoxia (patologia caracterizada por uma menor concentração de oxigénio no sangue), 
Bernardo Manuel de Sousa Pinto ❖Faculdade de Medicina da Universidade do Porto 
Fisiologia I 
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não apresentam bradicardia, mas sim taquicardia. Este aparente paradoxo deve-se ao facto de, numa 
situação de hipoxia, a elevada pressão de dióxido de carbono estimular os quimiorreceptores centrais 
que, independentemente dos periféricos, estimulam a ventilação pulmonar. A ventilação pulmonar, 
para além de levar a uma estimulação dos receptores de estiramento pulmonares, leva à diminuição da 
pressão de dióxido de carbono sistémica. Isto inibe o centro cardio-inibitório e, como tal, leva a que a 
resposta fisiológica para a hipoxia seja a taquicardia. 
Quimiorreceptores centrais 
Os quimiorreceptores centrais encontram-se presentes ao nível do bulbo raquidiano, registando, 
sobretudo, baixos níveis de pH ao nível do encéfalo, sendo normalmente estimulados por um aumento 
do dióxido de carbono arterial. Subsequentemente, a área vasomotora é desinibida, o que se traduz 
num aumento do output simpático e em vasoconstrição. 
Mecanismos de regulação local e mecanismos de regulação central 
A regulação da pressão arterial pode compreender mecanismos locais ou centrais. Os fenómenos de 
regulação local envolvem uma regulação metabólica local, enquanto um fenómeno de regulação da 
resistência vascular periférica central se caracteriza por um predomínio da acção simpática (estando 
associada, por exemplo, à presença de barorreceptores de alta pressão). A predominância de um dado 
tipo de regulação de um dado território vascular depende do órgão em si - enquanto ao nível do 
encéfalo e coração predominam os fenómenos locais, ao nível da pele e territórios esplâncnicos ocorre 
predominância dos fenómenos centrais. Já o tipo de regulação predominante no músculo é mais 
variável. 
 
 
 
 
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Fisiologia I 
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Regulação da função vascular 
Noções de regulação local 
Os vasos são capazes de manter o seu fluxo 
constante, através da regulação da resistência 
que oferecem à passagem de sangue (resistência 
vascular periférica), nomeadamente através de 
alterações no seu diâmetro (a vasoconstrição, 
associada à diminuição do diâmetro, acarreta 
maior resistência vascular periférica, enquanto a 
vasodilatação, pelo contrário, leva à diminuição). 
Este mecanismo de auto-regulação encontra-se 
presente ao nível do rim, encéfalo, coração, 
músculo esquelético, fígado e mesentério, 
variando consoante o tipo de tecido, o tipo de 
vasos envolvidos e com o tempo. 
Existem vários mecanismos de auto-regulação. 
Os mecanismos miogénicos prevalecem em artérias musculares e arteríolas, sendo que aquando de um 
aumento brusco da pressão arterial, ocorre a contracção de muitos vasos, como forma de impedir que 
esse aumento súbito seja transmitido aos outros órgãos. Esta contracção ocorre, na sequência do 
estiramento ao qual são submetidas as células musculares lisas dos vasos, devido à activação subjacente 
de canais sensíveis ao estiramento. Já um decréscimo na pressão arterial leva ao desenvolvimento de 
vasodilatação. 
Por outro lado, existem mecanismos metabólicos de auto-regulação, relacionados com o modo como 
alterações do ambiente metabólico em que as células se encontram influenciam o relaxamento ou a 
contracção das células musculares lisas vasculares. A título de exemplo, o decréscimo na concentração 
de oxigénio, o aumento da concentração de dióxido de carbono, e a diminuição do pH promovem o 
relaxamento das células vasculares musculares lisas causando, deste modo, vasodilatação. Por outro 
lado, em resposta à actividade, as células excitáveis expulsam potássio para o meio extracelular, o que 
também causa vasodilatação. 
Por último, os mecanismos endoteliais estão relacionados com as substâncias vasoactivas libertadas 
pelas células endoteliais, tais como o óxido nítrico (cuja libertação pode ser promovida por um aumentodo shear stress), um potente vasodilatador. 
Convém ter a noção de que a regulação local tem capacidade de influenciar, não só o fluxo sanguíneo 
que chega a determinado órgão, mas também a pressão arterial sistémica, na medida em que a acção 
conjunta e concertada de vasos de menores dimensões repercute-se num mesmo sentido na pressão 
arterial sistémica (a título de exemplo, se grande parte dos vasos de menores dimensões dilatarem, a 
pressão arterial sistémica diminui). 
Mecanismo de remodelagem 
O mecanismo de remodelagem consiste na capacidade que os vasos apresentam de responder de forma 
dinâmica a estímulos crónicos (por exemplo, a angiotensina está associada a uma maior síntese de 
factores tróficos). 
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Fisiologia I 
104 
 
Existem vários tipos de 
remodelagem, sendo que 
cada patologia está 
associada a um tipo 
específico de 
remodelagem. Contudo, 
para classificar 
genericamente a 
remodelagem verificada, 
usam-se duas pedidas – o 
diâmetro do lúmen do 
vaso e a espessura do 
vaso (ou seja, a massa da 
parede do vaso). Desta 
forma, quando se verifica 
um aumento do diâmetro 
luminal, presencia-se uma 
remodelagem para fora, 
enquanto uma diminuição do diâmetro luminal está associada a uma remodelagem para dentro. Por 
outro lado, quando se verifica um aumento da espessura do vaso, a remodelagem diz-se hipertrófica, 
enquanto uma diminuição da espessura corresponde a uma remodelagem hipotrófica. 
Os mecanismos subjacentes à remodelagem são os mesmos que presidem aos mecanismos de curto 
prazo (por exemplo, mecanismos de vasoconstrição e vasodilatação) e, de facto, a remodelagem é 
inicialmente reversível (tornando-se irreversível com o passar do tempo). O facto de haver uma 
coincidência de factores e fenómenos leva a pensar que a remodelagem apenas difere dos mecanismos 
a curto prazo, pelo facto de a exposição aos factores ser mais prolongada. 
Vasoconstrição 
Acção do sistema nervoso simpático 
O sistema nervoso simpático desempenha uma acção vasoconstritora, através da libertação de duas 
catecolaminas - a adrenalina e a noradrenalina (apesar de a dopamina também ser uma catecolamina, 
esta tem pouca relação directa com a vasoconstrição). A adrenalina é produzida ao nível da medula da 
glândula supra-renal, nomeadamente ao nível das suas células cromafins, sendo também o 
neurotransmissor utilizado, aquando da sinapse entre os neurónios pré-sináptico e pós-sináptico do 
sistema nervoso simpático. Já a noradrenalina é usada como neurotransmissor libertado a partir dos 
terminais dos neurónios pós-sinápticos e, como tal, os seus efeitos no sistema cardiovascular são 
maiores. De referir que a síntese destas duas catecolaminas requer a presença da enzima hidroxilase da 
tirosina. 
Existem duas grandes classes de receptores adrenérgicos – os receptores α (divisíveis em duas classes – 
α1 e α2, sendo que cada uma destas classes apresenta várias subclasses) e os receptores β (que também 
apresentam vários subtipos). Os receptores α1 existem em grande quantidade ao nível das células 
musculares lisas dos vasos, encontrando-se ligados à proteína Gq e sendo alvos de ligação de 
catecolaminas. A ligação de catecolaminas aos receptores α1 leva à activação da fosfolipase C, algo que 
está associado a um aumento dos níveis de IP3 e, como tal, à abertura dos canais de cálcio do retículo 
sarcoplasmático dessas células (o que está associado a contracção muscular). 
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Fisiologia I 
105 
 
Por seu turno, os 
receptores α2 estão ligados 
à proteína Gi e a ligação das 
catecolaminas a estes 
receptores está associada a 
uma inibição da 
adenilciclase e subsequente 
diminuição da síntese de 
cAMP, algo que está 
associado quer a 
mecanismos 
vasodilatadores, quer a 
mecanismos 
vasoconstritores. 
Por fim, os receptores β 
encontram-se ligados à 
proteína Gs, existindo duas 
grandes classes deste tipo 
de receptores envolvidas 
em mecanismos de 
vasodilatação/vasoconstriç
ão. A ligação de adrenalina 
aos receptores β1 está associada a um efeito inotrópico positivo, cronotrópico positivo, dromotrópico 
positivo e batmotrópico positivo, ao nível cardíaco, ou seja, a um aumento da contractilidade e da taxa 
de batimentos cardíacos. Isto deve-se ao facto da activação da proteína Gs levar a um aumento dos 
níveis de cAMP, que por sua vez, fosforila a PKA. Esta última intervém na fosforilação (e consequente 
activação) de canais de cálcio de membrana, o que está associado a uma maior entrada de cálcio para o 
meio intracelular e, consequentes efeitos, já referidos. 
Por fim, a adrenalina também se liga aos receptores β2, que se encontram confinados aos vasos 
sanguíneos do músculo esquelético, coração, fígado e medula da supra renal, promovendo a 
vasodilatação (daí que a adrenalina não possa ser considerada um vasodilatador sistémico), bem como a 
broncodilatação (isto faz com que, no tratamento da asma, possam ser utilizados agonistas dos 
receptores β2). 
Dessensibilização e down-regulation 
A acção das catecolaminas ao nível da vasoconstrição é passível de ser regulada por dessensibilização e 
por down-regulation. De facto, a exposição muito prolongada dos receptores β a um determinado 
agonista, está associada a uma dessensibilização a esse sinal (verifica-se que, após um momento inicial 
de ampla resposta, esta diminui para valores quase basais, com a exposição continuada ao agonista). 
Este efeito é passível de se obtido através da fosforilação dos receptores β (por via da cínase de 
receptores dos agonistas β), o que promove a ligação da β-arrestina aos resíduos fosforilados e 
consequente desligamento da proteína Gs do seu receptor. 
O mecanismo de down-regulation (diminuição da quantidade de receptores presentes ao nível da 
membrana, aquando de um excesso de sinalização) é igualmente importante para este mecanismo e a 
sua compreensão (bem como do mecanismo inverso) é fundamental em termos clínicos – quando se 
administram β-bloqueadores, fármacos que bloqueiam os receptores β (com o objectivo, por exemplo, 
de reduzir a pressão arterial), a membrana das células musculares vasculares passa a exprimir uma 
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Fisiologia I 
106 
 
maior quantidade 
destes receptores. 
Ora, quando se 
suprime a 
administração de β-
bloqueadores, a 
maior presença de 
receptores β, leva a 
que menores 
variações da acção do 
sistema nervoso 
simpático levem a 
aumentos mais 
marcados da tensão 
arterial, que podem 
resultar, inclusive, no 
coma e morte. 
Sistema renina-angiotensina 
A angiotensina é um dos vasoconstritores mais poderosos que existe, sendo que a renina é a enzima 
que participa no passo limitante da síntese deste composto. De facto, o angiotensinogénio é um 
composto que no fígado é convertido em angiotensina I, por via da renina, uma enzima segregada pelas 
células granulares justaglomerulares. A angiotensina I é um peptídeo inactivo com 10 aminoácidos e, só 
quando a enzima de conversão da angiotensina actua, clivando os dois aminoácidos de uma das 
extremidades, se forma angiotensina II, um peptídeo de oito aminoácidos que constitui a forma activa 
da angiotensina. 
 
A angiotensina II induz a 
produção de aldosterona ao 
nível do córtex da glândula 
supra-renal, que por sua vez, 
aumenta a retenção de sódio 
ao nível renal. A retenção de 
sódio está associada a uma 
reabsorção de água e, como 
tal, a um aumento do volume 
sanguíneo,o que leva a um 
aumento da pressão arterial. 
A regulação da disponibilidade 
da renina é operada por via do 
sistema nervoso simpático 
(através dos receptores β1), da 
própria angiotensina (através 
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Fisiologia I 
107 
 
de mecanismos de feedback negativo) e do sistema de profusão. Assim sendo, por exemplo, aquando de 
uma hemorragia, verifica-se um aumento da pressão arterial, por aumento da disponibilidade de renina. 
Para além de catabolisar a síntese de angiotensina II, a enzima de conversão da angiotensina também 
degrada a bradicinina, um importante vasodilatador e daí que esta enzima seja um bom alvo para a 
acção de fármacos com o objectivo de reduzir a pressão arterial (nomeadamente as IECA’s). 
Existem dois receptores para a angiotensina, o AT1 e o AT2. O receptor AT1 encontra-se, sobretudo, 
ligado à proteína GQ, mas também às proteínas GI e GS, actuando de modo análogo aos receptores do 
sistema nervoso simpático. Já o receptor AT2 actua de modo quase oposto ao do AT1 (estimulando 
todas as vias antagónicas às activadas pelo AT1) e poderá ser um bom alvo terapêutico no futuro, no 
combate à hipertensão. 
A angiotensina, através da sua ligação ao AT1, pode desenvolver um efeito a longo prazo e muito 
profuso. Quando o receptor AT1 se liga à fosfolipase D, ocorre um prolongamento da acção do 
diacilglicerol e são activadas vias mitogénicas (por exemplo, é activada a síntese de factores de 
crescimento e de proteínas da matriz extracelular). Por outro lado, a ligação do receptor AT1 à 
fosfolipase A2 promove a produção de eicosanóides, que estão associados aos efeitos inflamatórios da 
angiotensina II. Contudo, é necessário referir que o receptor AT1 do sistema renina-angiotensina é 
regulado por down-regulation, analogamente ao que ocorre no sistema nervoso simpático, todavia, o 
mesmo não se verifica para o 
receptor AT2. 
Em termos clínicos é importante 
referir que o sistema renina-
angiotensina se encontra 
relacionado com a aterosclerose, 
pois a ligação da angiotensina ao 
receptor AT1 promove um amento 
da permeabilidade vascular, uma 
maior proliferação celular e maior 
actividade oxidativa por parte dos 
ROS. Por oposição, a bradicinina 
desempenha um papel anti-
aterogénico. 
Endotelina 
A endotelina é o vasoconstritor endógeno mais poderoso, actuando, contudo, a nível local, 
contrariamente ao que ocorre com os dois sistemas descritos anteriormente. Como o seu nome indica, a 
endotelina é sintetizada no endotélio, actuando nos receptores ETA e ETB, por difusão parácrina, sendo 
rapidamente eliminada por via pulmonar e renal (o seu período de semi-vida é muito curto, sendo de 
apenas cinco minutos). 
Existem três tipos de endotelina – ET-1, ET-2 e ET-3, tendo todas elas funções similares e sendo todas 
constituídas por 21 aminoácidos. Paralelamente, todos os tipos de endotelina são sintetizados da 
mesma forma – a pré-pró-endotelina (um precursor inactivo) sofre clivagem por acção de uma 
endopeptidase específica e origina a pró-endotelina (tal como ocorre nas endotelinas, existem três 
classes de pró-endotelinas – pró-endotelina-1, pró-endotelina-2 e pró-endotelina-3) e, como 
expectável, cada classe de pró-endotelina origina a respectiva endotelina, por via da enzima de 
conversão da endotelina. 
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Fisiologia I 
108 
 
 
A produção das diferentes isoformas de endotelinas ocorre em locais diferentes do organismo – a ET-1 é 
sintetizada ao nível das células endoteliais, do rim e SNC, a ET-2 é produzida ao nível do rim e intestino, 
enquanto a ET-3 é produzida ao nível dos neurónios, intestino e glândula supra-renal. De referir que a 
produção deste vasoconstritor pode ser 
induzida por várias hormonas, 
nomeadamente, a vasopressina, a 
noradrenalina e a angiotensina II, bem 
como por vários factores físico-químicos, 
nomeadamente a hipoxia, o shear stress e 
a osmolaridade. 
É importante referir que, quando 
administrada por via endovenosa, a 
endotelina tem um duplo efeito – a sua 
acção directa no músculo induz a 
vasoconstrição, enquanto a sua acção no 
endotélio está associada à vasodilatação. 
Vasopressina 
A vasopressina (ou ADH, hormona anti-diurética) 
é um potente vasoconstritor sintetizado no 
hipotálamo e libertado na hipófise. Esta hormona 
desempenha um papel pouco importante ao 
nível do organismo humano, na medida em que 
os receptores aos quais se liga, de modo a 
promover a vasoconstrição (receptores V1), 
existem no organismo em pequena quantidade. 
Já os receptores V2 existem em maior 
abundância, sendo os receptores aos quais a 
vasopressina se liga, para actuar como anti-
diurética, ou seja, para promover a retenção de 
sódio e água (o que lhe permite responder a uma 
situação de perda de volume sanguíneo, tal como uma hemorragia). 
Outros vasoconstritores 
Existem outros vasoconstritores no nosso organismo, nomeadamente o tromboxano A2, as 
prostaglandinas D2 e E2, os aniões superóxido e a urotensina. Este último elemento encontra-se 
presente ao nível do coração, artérias e rim e apresenta um papel de vasoconstritor e vasodilatador 
(algo que depende do epitélio), variando em função da espécie e do leito vascular. 
 
 
 
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Fisiologia I 
109 
 
Vasodilatação 
Acetilcolina 
A acetilcolina é libertada 
pelos neurónios pós-
ganglionares 
parassimpáticos e, como 
tal, tem normalmente 
um efeito vasodilatador. 
A ligação da acetilcolina 
aos receptores 
muscarínicos M2 
presentes no endotélio 
(que se encontram 
acoplados à proteína Gi) 
promove a libertação de 
óxido nítrico por parte 
das células endoteliais. O óxido nítrico libertado actua nas células musculares lisas vasculares, 
despoletando o relaxamento destas e, como tal, uma resposta vasodilatadora. De referir que a 
acetilcolina também se pode ligar a receptores M2 presentes no coração, onde apresenta um efeito 
inotrópico negativo e cronotrópico negativo. 
Contudo, a actuação directa da acetilcolina nas células musculares lisas, promove uma resposta 
vasoconstritora, através dos receptores muscarínicos M1 e M3. Esses receptores encontram-se 
acoplados a proteína Gq e a sua activação leva à génese de IP3 e diacilglicerol, o que, por sua vez, cursa 
com um maior influxo de cálcio para o sarcoplasma e, subsequentemente, com uma resposta 
vasoconstritora. Em vasos ateroscleróticos, uma vez que o endotélio se encontra lesado, a acetilcolina 
despoleta frequentemente um efeito vasoconstritor, precisamente devido ao facto de se ligar 
directamente a receptores das células musculares lisas vasculares. 
Bradicinina 
A bradicinina actua de modo análogo à 
acetilcolina, na medida em que o seu efeito 
vasodilatador é potenciado pela sua ligação 
aos receptores B2 do endotélio. 
Subsequentemente, as células endoteliais 
produzem óxido nítrico e prostaglandinas que, 
por sua vez, actuam nas células musculares 
lisas vasculares, promovendo o seu 
relaxamento e, como tal, uma resposta 
vasodilatadora. 
A bradicinina é produzida a partir do cininogénio, sendo essa reacção catalisada pela calicreína (uma 
protease que também participa na via intrínseca da coagulação). Como já foi referido, a bradicinina está 
sujeita a degradação por parte da enzima de conversão da angiotensina. 
 
 
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Fisiologia I 
110 
 
Óxido nítrico 
O óxido nítrico (NO) é um 
vasodilatadorque é 
sintetizado ao nível do 
endotélio, mas que actua 
de forma parácrina ao 
nível das células 
musculares lisas 
vasculares, promovendo o 
seu relaxamento. A ligação 
de um agente 
vasodilatador (como 
sendo a acetilcolina, ou a 
bradicinina) a um receptor 
endotelial promove a 
activação da fosfolipase C, 
cuja actividade leva à 
formação de IP3 e 
diacilglicerol. O IP3 
promove a saída de cálcio do retículo endoplasmático, sendo o cálcio necessário para activar a síntase 
do óxido nítrico. Esta enzima, como o seu nome indica, promove a síntese de óxido nítrico que, uma vez 
formado, difunde-se de modo parácrino para as células musculares lisas vasculares próximas, onde 
activa a guanil cíclase. A activação desta enzima promove a formação de cGMP a partir de GTP, sendo 
que o cGMP promove o relaxamento do músculo liso. De referir que existem três classes de síntase do 
óxido nítrico: 
1. Síntase do óxido nítrico do tipo I (neuronal) – A sua activação é promovida pela ligação do 
glutamato às estruturas pós-sinápticas nas células piramidais do hipocampo 
2. Síntase do óxido nítrico do tipo II (indutiva) – Esta isoforma é activada por excreções de 
resposta inflamatória e é a única que não necessita de cálcio para a sua activação. 
3. Síntase do óxido nítrico do tipo III (endotelial) – Única isoforma presente no endotélio 
De entre os vasodilatadores que promovem a síntese de óxido nítrico ao nível do endotélio, destaque 
para a bradicinina, histamina, acetilcolina, substância P, ADP, ATP, serotonina e trombina. Para além 
disso, a produção de óxido nítrico encontra-se favorecida em situações de elevado fluxo sanguíneo ou 
shear stress. 
O óxido nítrico pode ser inactivado pela presença de radicais livres, que o convertem em peroxinitrito, 
uma espécie reactiva. Por outro lado, a dimetilarginina é um inibidor endógeno da síntase de óxido 
nítrico, enquanto a L-arginina pode ser administrada exogenamente, com o intuito de inibir a síntese de 
óxido nítrico. 
Para além da vasodilatação, o óxido nítrico promove um efeito inotrópico negativo, impede a adesão e a 
agregação plaquetária, inibe a secreção de renina e endotelina-1, inibe a proliferação de células 
musculares lisas e de células miocárdicas e promove uma diminuição da permeabilidade vascular, da 
expressão de proteínas aterogénicas, e da oxidação das LDL. 
 
 
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111 
 
Prostaciclina 
A activação da fosfolipase C 
endotelial por parte de um 
agente vasodilatador (como a 
bradicinina, o shear stress, a 
trombina, a serotonina, o PDGF, e 
a IL-1), para além de levar à 
génese de IP3, leva à síntese de 
diacilglicerol. Por sua vez, o 
diacilglicerol activa a PKC, uma 
enzima que promove a activação 
da fosfolipase A2. Esta última 
enzima está envolvida na síntese 
de ácido araquidónico a partir de 
fosfolipídeos, podendo o ácido 
araquidónico gerado seguir uma 
de duas vias alternativas: 
1. Via da lipoxigénase: Promove a formação de leucotrienos, compostos que promovem a 
contracção do músculo liso, nomeadamente ao nível dos brônquios (motivo pelo qual os 
leucotrienos se encontram envolvidos na fisiopatologia da asma). 
2. Via da ciclo-oxigénase: Ao seguir esta via, o ácido araquidónico pode originar prostaciclina 
(também designada por prostaglandina I2, ou PGI2) ou tromboxano A2, sintetizados, 
respectivamente, pela síntase da prostaciclina e pela síntase do tromboxano. A síntese de 
prostaciclina prevalece a nível endotelial, enquanto a génese de tromboxano A2 (um 
vasoconstritor e pró-agregante plaquetário) predomina nas plaquetas. 
Apesar de ser produzida nas células endoteliais, a 
prostaciclina actua de modo parácrino nas células 
musculares lisas vasculares, através da activação da adenil 
cíclase. Ora, a adenil cíclase, por sua vez, promove um 
aumento dos níveis de cAMP, estando o cAMP envolvido no 
relaxamento das células musculares lisas. Deste modo, 
contrariamente ao tromboxano A2, a prostaciclina 
apresenta um efeito vasodilatador e anti-agregante. Para 
além disso, a prostaciclina inibe a proliferação das células 
musculares lisas e promove a fibrinólise (destruição da rede 
de fibrina, formada durante a coagulação). 
A síntese de prostaciclina é inibida pelos radicais livres de 
oxigénio e por anti-inflamatórios não-esteróides (AINEs). 
Os AINEs inibem a ciclo-oxigénase (enzima que converte o 
ácido araquidónico no precursor comum da prostaciclina e 
tromboxano A2), podendo fazê-lo de forma reversível ou 
irreversível. A título de exemplo, a aspirina é um inibidor 
irreversível das duas isoformas da ciclo-oxigénase. 
 
 
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112 
 
Factor hiperpolarizante derivado do endotélio 
O factor hiperpolarizante derivado do endotélio é um agente vasodilatador cuja identidade ainda 
permanece desconhecida. Este factor promove uma resposta vasodilatadora através de mecanismos 
independentes do óxido nítrico e prostaciclina, nomeadamente, nos territórios mesentérico, carotídeo, 
coronário, e renal. A síntese deste factor ocorre ao nível do endotélio, sendo promovida pela 
acetilcolina e pela bradicinina (por activação de uma enzima da superfamília do citocromo P450). 
Subsequentemente, o factor derivado do endotélio produzido actua de modo parácrino nas células 
musculares lisas vasculares, onde promove a abertura dos canais de potássio e, consequentemente, a 
hiperpolarização celular. 
Shear stress 
O shear stress (força de cisalhamento) 
corresponde à força de fricção gerada 
quando uma coluna de sangue passa ao 
longo de uma superfície endotelial 
(podendo ser avaliado através da 
tendência para o fluxo sanguíneo 
“arrastar consigo” as células 
endoteliais). A magnitude do shear 
stress é directamente proporcional à 
viscosidade do sangue e à velocidade 
do sangue, mas inversamente 
proporcional ao raio do vaso. 
No que concerne aos efeitos do shear 
stress, estes envolvem alterações citosqueléticas, a estimulação de canais iónicos sensíveis ao 
estiramento (nomeadamente canais de cálcio e canais de potássio) e a activação da fosfolipase C (o que 
promove a síntese de prostaciclina e óxido nítrico). Assim, aquando de uma situação de shear stress, 
ocorre vasodilatação e, subsequentemente, verifica-se um aumento do raio do vaso sanguíneo em 
causa. Ora, uma vez que o shear stress é inversamente proporcional ao raio do vaso, este aumento do 
raio permite diminuir o shear stress registado. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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113 
 
Circulações especiais 
Circulação cerebral 
Embora a massa do encéfalo corresponda a apenas 2% da massa corporal total, o encéfalo recebe cerca 
de 15% do débito cardíaco no indivíduo em repouso. Mesmo assim, o encéfalo é o órgão menos 
tolerante à isquemia, de tal modo que a interrupção do fluxo sanguíneo para o encéfalo (mesmo que 
num período de segundos) provoca a perda de consciência, sendo que uma situação de isquemia que se 
prolongue por alguns minutos acarreta, muito provavelmente, danos celulares irreversíveis. 
O sangue chega ao encéfalo através das 
artérias carótidas internas e das artérias 
vertebrais (que confluem para formar a 
artéria basilar que, por sua vez, se divide 
para formar as duas artérias cerebrais 
posteriores). As artérias cerebrais 
posteriores, juntamente com as artérias 
carótidas internas, participam numa grande 
anastomose, a qual é designada por círculode Willis. Contudo, existem ainda várias 
anastomoses na superfície do encéfalo, 
sendo estas alimentadas por pequenos 
ramos de distribuição. Essas anastomoses 
permitem a existência de mecanismos de circulação colateral, algo que se revela fundamental caso se 
verifique a oclusão de uma artéria de distribuição (ou de um dos seus ramos). Todavia, caso se verifique 
um grande impedimento do fluxo através de uma artéria carótida interna torna-se quase inevitável a 
ocorrência subsequente de um fenómeno isquémico no hemisfério ipsilateral. 
Barreira hemato-encefálica 
A barreira hemato-encefálica é característica dos capilares encefálicos, prevenindo os solutos presentes 
ao nível do lúmen dos capilares de ter acesso directo ao fluido extracelular do encéfalo. Os solutos 
polares e hidrofílicos difundem-se muito lentamente, enquanto a capacidade das proteínas 
atravessarem a barreira hemato-encefálica é muito limitada (estas restrições explicam porque é que 
muitos fármacos que actuam noutros órgãos ou leitos vasculares não surtem efeito no encéfalo). Já os 
gases e a água difundem-se rapidamente ao longo da barreira hemato-encefálica, enquanto a glicose, 
único substrato energético dos neurónios, atravessa a barreira hemato-encefálica por difusão facilitada. 
De referir que os órgãos circunventriculares correspondem a regiões encefálicas especializadas onde os 
capilares da barreira hemato-encefálica são fenestrados, apresentando muita permeabilidade. 
Regulação do fluxo sanguíneo para o encéfalo 
O crânio é rígido e o seu volume total é fixo, de tal modo que situações de vasodilatação, ou de 
aumentos no volume vascular numa determinada região, deverão ser compensadas por um decréscimo 
do volume do fluido cefalo-raquidiano ou do volume vascular noutras regiões encefálicas. Caso 
contrário, um aumento do volume intra-craniano levaria a um aumento de pressão intra-craniana, o que 
poderia despoletar um quadro de disfunção neurológica. Deste modo, o volume vascular deverá ser 
estritamente regulado, algo que é possível, através de mecanismos de controlo neural, metabólico e 
miogénico. 
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Fisiologia I 
114 
 
O mecanismo de controlo neural não é muito importante, embora o sistema nervoso simpático 
promova a vasoconstrição, enquanto o sistema nervoso parassimpático promova (de forma modesta) 
uma resposta vasodilatadora. De referir que perturbações locais da pressão ou do ambiente químico 
podem estimular a libertação de vasodilatadores, por parte dos terminais nervosos sensitivos (reflexo 
axonal). 
Os mecanismos metabólicos são os mais importantes no controlo da função vascular do encéfalo. De 
facto, aquando de aumentos na actividade (e, como tal, do metabolismo) neuronal, verifica-se um 
aumento na hidrólise de ATP com produção resultante de adenosina, um potente vasodilatador. Por 
outro lado, aumentos da actividade neuronal cursam com hipóxia, hipercápnia e acidose local, o que 
despoleta uma resposta vasodilatadora e subsequente aumento do fluxo sanguíneo para o encéfalo. 
Por fim, os vasos de resistência do cérebro respondem a alterações na sua pressão transmural, sendo 
que aumentos da pressão transmural cursam com vasoconstrição, enquanto a diminuição está 
associada a vasodilatação (mecanismo de controlo miogénico). 
Num sentido de regular o fluxo vascular, verifica-se ainda uma resposta colaborativa local entre 
neurónios, astrócitos e vasos cerebrais, aquando de um aumento da actividade neuronal. De facto, 
parte do glutamato e do GABA libertados durante uma sinapse difundem-se para fora da fenda 
sináptica, actuando em receptores presentes nos pés terminais dos astrócitos. Estes interactuam com 
os capilares sanguíneos, gerando ondas de cálcio que promovem a libertação de vasodilatadores 
poderosos, tais como o óxido nítrico. 
 
Circulação coronária 
O coração recebe cerca de 5% do débito cardíaco em repouso, apesar constituir menos de 0,5% da 
massa total corporal. A irrigação coronária para o miocárdio deriva das artérias coronárias direita e 
esquerda (que se divide perto da sua origem na artéria circunflexa esquerda e na artéria descendente 
anterior esquerda): 
1. Artéria coronária direita: Irriga o ventrículo direito e a aurícula direita 
2. Artéria circunflexa esquerda: Irriga o ventrículo esquerdo e a aurícula esquerda 
3. Artéria descendente anterior esquerda (artéria interventricular anterior): Irriga o septo 
interventricular e porções ventriculares adjacentes 
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115 
 
Estas artérias ramificam-se 
ao longo do coração, 
originando uma densa rede 
capilar. Por outro lado, o 
pequeno diâmetro das 
fibras musculares cardíacas 
favorece a difusão de 
oxigénio para estas células, 
que têm necessidades 
metabólicas muito elevadas. 
De referir que se verifica a 
presença de muitos vasos 
colaterais ao nível das redes 
coronárias arterial e venosa, com o objectivo de assegurar um correcto fluxo sanguíneo, aquando da 
oclusão de um vaso primário. 
Perfusão coronária e ciclo cardíaco 
Apesar de o coração ser a fonte da sua 
própria pressão de perfusão, a 
contracção do miocárdio comprime a 
sua própria irrigação. Deste modo, o 
perfil do fluxo sanguíneo através das 
artérias coronárias depende da pressão 
de perfusão na aorta e da compressão 
extra-vascular que resulta da contracção 
ventricular (nomeadamente da 
contracção do ventrículo esquerdo). 
De facto, o fluxo sanguíneo na artéria 
coronária esquerda pode reverter 
transitoriamente no início da sístole, 
devido à força de compressão gerada 
pelo ventrículo esquerdo em contracção 
isovolumétrica. Contudo, à medida que 
a pressão aórtica aumenta (numa fase 
mais tardia da sístole), o fluxo coronário 
aumenta, embora apenas atinja os seus 
valores máximos durante o início da diástole (quando o ventrículo esquerdo relaxado já não comprime 
os vasos coronários e a pressão aórtica se mantém elevada). Deste modo, apesar do fluxo sanguíneo na 
artéria coronária esquerda apresentar um perfil sisto-diastólico, cerca de 80% do fluxo coronário total 
ocorre em diástole. 
Por oposição, o fluxo sanguíneo na artéria coronária direita ocorre, sobretudo, em sístole, não se 
verificando reversão do sentido do fluxo sanguíneo em protossístole. Isto acontece devido ao facto do 
ventrículo direito desenvolver uma menor tensão de parede e, como tal, não exercer uma força de 
compressão tão grande nos vasos coronários. 
Uma vez que, um aumento da frequência cardíaca se repercute, sobretudo, através da diminuição do 
tempo de diástole, a perfusão coronária esquerda encontra-se diminuída numa situação de taquicardia. 
Num coração saudável, isto não constitui grande problema, na medida em que os vasos coronários têm 
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Fisiologia I 
116 
 
capacidade de dilatar adequadamente. Todavia, aquando de um quadro de doença coronária que 
restrinja o fluxo sanguíneo, um aumento da frequência cardíaca pode pôr em causa a irrigação cardíaca. 
Regulação do fluxo sanguíneo para o coração 
O coração extrai entre 70% e 80% do oxigénio presente no sangue arterial e, deste modo, aquando de 
um aumento das necessidades de oxigénio, o coração aumenta preferencialmente a captação de 
sangue, em detrimento de um aumento da quantidade de oxigénio que extrai do sangue. Uma vez que a 
pressão sanguínea varia normalmente entre limites estritos, a vasodilatação é a única forma de 
aumentar substancialmente o fluxo coronário. A vasodilatação é conseguida, sobretudo, através demecanismos metabólicos locais, envolvendo, nomeadamente, a libertação de adenosina. 
O sistema nervoso autónomo tem também a capacidade de regular o fluxo coronário, embora de forma 
menos decisiva. O sistema nervoso simpático promove directamente a ocorrência de vasoconstrição, 
embora essa resposta seja, por vezes, “mascarada”. De facto, os neurónios pós-ganglionares simpáticos 
também actuam nos receptores adrenérgicos β1 do coração, promovendo um efeito cronotrópico 
positivo e inotrópico positivo. Ora, esse aumento da actividade cardíaca promove um aumento das 
necessidades metabólicas do coração e, como tal, através de mecanismos metabólicos, é despoletada 
uma resposta vasodilatadora compensatória. 
Por outro lado, a activação do sistema nervoso parassimpático promove uma resposta vasodilatadora 
moderada, sobretudo nas vizinhanças do nó sinusal. Deste modo, o efeito do sistema parassimpático é 
preferencialmente sentido ao nível da frequência cardíaca. 
Fenómeno de “roubo coronário” 
Conhecer o modo como a irrigação coronária 
se processa apresenta importância capital em 
termos clínicos. A título de exemplo, os 
fármacos vasodilatadores, embora 
administrados no sentido de aumentar o fluxo 
sanguíneo para o miocárdio, podem acabar por 
comprometer o fluxo coronário. De facto, 
numa situação de isquemia por estenose dos 
vasos coronários, a administração de um 
vasodilatador apenas aumenta o diâmetro dos 
vasos sanguíneos não-estenosados (ou seja, 
dos vasos que irrigam regiões não-isquémicas). 
Isto deve-se ao facto dos vasos a jusante da 
região estenosada já se encontrarem 
maximamente dilatados, não conseguindo 
dilatar mais. Assim, ao promover a dilatação dos vasos não-estenosados, os vasodilatadores levam a que 
esses vasos sejam ainda mais perfundidos e a que os vasos estenosados (e respectivos territórios de 
irrigação) se tornem ainda menos perfundidos (fenómeno de “roubo coronário”). 
Circulação do músculo esquelético 
O fluxo sanguíneo para o músculo esquelético é caracterizado por amplas variações, de acordo com o 
estado de actividade do indivíduo. De facto, o fluxo sanguíneo pode aumentar até 50 vezes, quando se 
passa de uma situação de repouso para uma situação de exercício aeróbio máximo. 
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Fisiologia I 
117 
 
As artérias nutritivas 
para o músculo 
esquelético encontram-
se externamente ao 
músculo, gerando entre 
30 a 50% da resistência 
total ao fluxo 
sanguíneo. Quando as 
artérias nutritivas 
entram no músculo 
esquelético, originam 
arteríolas, que se 
ramificam várias vezes 
até originarem 
arteríolas terminais, 
que são os últimos 
ramos que contêm 
músculo liso e, como 
tal, os últimos ramos 
nos quais ainda existe 
capacidade de controlar 
o fluxo sanguíneo. O conjunto dos capilares alimentados por uma mesma arteríola terminal designa-se 
por unidade microvascular, correspondendo à unidade funcional mais pequena de controlo do fluxo 
sanguíneo. 
Quando o músculo esquelético se encontra em repouso, a sua resistência vascular é elevada, o fluxo 
sanguíneo é reduzido, e a taxa de extracção de oxigénio é reduzida. Todavia, numa fase inicial do 
exercício, verifica-se uma dilatação das arteríolas terminais, algo que permite um aumento do fluxo 
sanguíneo através dos capilares já perfundidos e a abertura de capilares quiescentes. Deste modo, à 
medida que o nível de exercício aumenta, verifica-se um aumento da taxa de extracção de oxigénio e 
uma dilatação de vasos progressivamente mais proximais. De referir que a libertação de substâncias 
vasodilatadoras (tais como a adenosina, o dióxido de carbono, e o potássio) por parte das fibras 
musculares activas é o principal estímulo para uma resposta vasodilatadora. 
Acção do sistema nervoso simpático 
Apesar do sistema nervoso simpático promover a vasoconstrição dos vasos que irrigam o músculo 
esquelético, o elevado shear stress gerado subsequentemente leva a que sejam libertadas substâncias 
vasodilatadoras, estabelecendo-se assim um equilíbrio que permite a manutenção do tónus basal das 
células musculares lisas vasculares. Assim sendo, parece paradoxal que situações de elevada actividade 
muscular (onde ocorre dilatação dos vasos que irrigam o músculo esquelético e, por conseguinte, um 
aumento do fluxo sanguíneo para o músculo) cursem com um aumento da actividade simpática. Este 
aparente paradoxo é passível de ser explicado por três fenómenos: 
1. O aumento da actividade simpática promove vasoconstrição em todos os órgãos excepto o 
coração e o cérebro. 
2. Os efeitos vasodilatadores dos metabolitos libertados pelo músculo esquelético activo superam 
os efeitos vasoconstritores do sistema nervoso simpático. 
3. As substâncias libertadas durante a contracção das fibras musculares (nomeadamente o óxido 
nítrico e a adenosina) podem inibir localmente a libertação de noradrenalina por parte dos 
neurónios simpáticos. 
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Assim, quando vários grupos musculares se encontram em actividade, o sistema nervoso simpático 
actua como árbitro, promovendo vasoconstrição das artérias nutritivas (que se encontram 
externamente ao músculo esquelético e, por isso, não estão sujeitas à influência das substâncias 
vasodilatadoras produzidas pelas fibras musculares esqueléticas), o que estabelece um limite ao fluxo 
sanguíneo disponibilizado para o músculo esquelético e impede que fibras de um só grupo de músculos 
esqueléticos “monopolizem” todo o fluxo sanguíneo. 
“Bomba muscular” 
Durante o exercício, o músculo 
esquelético sofre alterações rítmicas no 
seu comprimento e na sua tensão, de 
modo análogo ao que ocorre no coração 
activo. A contracção do músculo 
esquelético promove o efluxo de sangue 
venoso e impede o influxo de sangue 
arterial. Assim, a contracção muscular 
permite esvaziar as veias, enquanto o 
relaxamento potencia a perfusão capilar 
(devido à redução da pressão venosa) e 
promove o influxo de sangue arterial. 
Este fenómeno de “bomba muscular”, ao 
induzir energia cinética considerável ao 
sangue, consegue gerar até metade da 
energia necessária para a circulação do 
sangue. 
Circulação cutânea 
A pele, que é o maior órgão do corpo humano, encontra-se sobre-perfundida relativamente às suas 
necessidades nutricionais. Desta forma, o controlo metabólico local do fluxo sanguíneo para a pele tem 
uma importância funcional muito reduzida e o fluxo sanguíneo para a pele encontra-se, sobretudo, 
dependente da acção do sistema nervoso simpático – aumentos na temperatura corporal aumentam o 
fluxo sanguíneo para a pele, levando a perdas de calor, enquanto uma diminuição da temperatura 
corporal leva ao efeito oposto. 
A pele apical (que se encontra nas extremidades, nomeadamente no nariz, lábios, orelhas, mãos e pés) 
apresenta uma grande relação superfície-volume que favorece a perda de calor. Nessas regiões é 
possível encontrar uma grande quantidade de anastomoses arterio-venosas, as quais constituem os 
corpos de glomus. Os vasos que intervêm nessas anastomoses encontram-se em paralelo com os 
capilares da pele envolvidos na troca de nutrientes e estão sob intenso controlo neural. De facto, a 
acção do sistema nervoso simpático promove a constrição das arteríolas, vasos anastomósicos e 
vénulas, o que diminui as perdas de calor (deste modo, a acção simpática verifica-se aquando de um 
decréscimo da temperatura corporal). Paralelamente, aquando de um aumento da actividade corporal, 
o tónus simpático diminui e verifica-se uma resposta vasodilatadora (deste modo,não existe 
vasodilatação activa - a vasodilatação é sempre passiva, ocorrendo por inibição da actividade simpática). 
Já ao nível da pele não-apical, quase não se verificam anastomoses arterio-venosas, de tal modo que as 
variações na actividade simpática apresentam um efeito muito reduzido na regulação térmica do 
organismo. 
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Microcirculação e vasos linfáticos 
Os capilares constituem os locais de excelência onde ocorre a troca de gases, água, nutrientes e 
produtos do metabolismo. Na maior parte dos tecidos, os capilares estão associados, exclusivamente, a 
essas necessidades nutricionais. Contudo, noutros, uma grande porção do fluxo capilar é não-
nutricional. A título de exemplo, ao nível dos glomérulos renais, o fluxo capilar forma o filtrado 
glomerular. Por outro lado, ao nível da pele a microcirculação ao nível das anastomoses arterio-venosas 
está associada à regulação térmica. Os capilares também desempenham outras funções, tais como a 
sinalização (transporte de hormonas) e defesa do indivíduo (através do transporte de plaquetas). 
Vasos constituintes da microcirculação 
A microcirculação é definida como sendo 
o conjunto de vasos sanguíneos que se 
encontram entre a arteríola de primeira 
ordem e a vénula de primeira ordem. 
Embora ocorram variações entre órgãos, 
normalmente, os componentes principais 
da microcirculação incluem uma única 
arteríola e uma única vénula, por entre as 
quais se encontra uma rede de capilares. 
Tanto as arteríolas como as vénulas 
apresentam células musculares lisas 
vasculares, sendo que, por vezes, é 
possível encontrar esfíncteres pré-
capilares na transição entre um capilar e 
uma arteríola ou meta-arteríola. Estes 
esfíncteres controlam o acesso do sangue 
até segmentos particulares da rede 
capilar, sendo que a abertura ou o fecho 
de um esfíncter criam pequenas 
diferenças locais de pressão, que podem 
alterar a magnitude do fluxo sanguíneo ou reverter a direcção do fluxo sanguíneo em alguns locais da 
rede. Contudo, é importante ressalvar que o músculo liso associado aos esfíncteres pré-capilares não é, 
normalmente inervado – a acção destes esfíncteres varia, sobretudo, de acordo com alterações das 
condições locais. 
As arteríolas diferem das artérias, uma vez que as primeiras apresentam um raio interno situado entre 5 
e 25 µm, enquanto as segundas apresentam um raio interno superior a 25 µm. Por outro lado, as 
arteríolas apenas apresentam uma única camada contínua de células musculares lisas vasculares. Já as 
metarteríolas são similares às arteríolas, mas o seu comprimento é menor. Para além disso, as células 
musculares lisas vasculares das metarteríolas não são contínuas nem, normalmente, inervadas. As 
metarteríolas funcionam como “vias rápidas” da microcirculação que permitem que o sangue flua, sem 
passar pela rede capilar. 
Os verdadeiros capilares, por sua vez, apresentam um raio interno situado entre 2 e 5 µm, consistindo 
numa única camada de células endoteliais muito finas rodeadas por uma membrana basal, fibras de 
colagénio e, por vezes, pericitos. Algumas células endoteliais apresentam em ambas as superfícies 
inúmeras cavéolas, envolvidas na ligação a ligandos. Por outro lado, o facto das células endoteliais se 
encontrarem altamente envolvidas na endocitose faz com que sejam encontradas a esse nível inúmeras 
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vesículas revestidas por caveolina. Para além disso, o citoplasma das células endoteliais dos capilares é 
rico em vesículas pinocíticas, que contribuem para a transcitose de água e de compostos solúveis em 
água, ao longo da membrana endotelial. De referir que, em alguns casos, as vesículas endocíticas 
encontram-se alinhadas de tal modo que aparentam estar juntas para formar um canal transendotelial. 
Entre as células endoteliais 
encontram-se junções 
inter-endoteliais, que 
permitem que duas 
membranas celulares 
estejam separadas apenas 
por cerca de 10 nm. Apesar 
disso, existem regiões, 
onde o espaço entre as 
células é menor (é de cerca 
de 4nm), pois estas estão 
unidas por junções de 
aderência. É igualmente 
possível encontrar junções 
apertadas entre as células endoteliais, sendo que estas junções são extremamente importantes para 
formar a barreira hemato-encefálica (pois impedem a presença de espaço interendotelial no encéfalo). 
Existem três tipos de capilares, sendo esta classificação baseada na permeabilidade existente ao nível 
destes: 
1. Capilares contínuos: Tipo de capilar mais comum. 
2. Capilares fenestrados: Nestes capilares as células encontram-se perfuradas com fenestrações, 
passagens que atravessam completamente as células, desde o lúmen capilar até ao espaço 
intersticial. Os capilares fenestrados delimitam sobretudo os epitélios, pois são locais onde 
ocorrem grandes fluxos de fluidos e solutos ao longo das paredes capilares. De referir que, por 
vezes, um pequeno diafragma fecha as perfurações das fenestrações. 
3. Capilares descontínuos: Estes capilares apresentam gaps (grandes espaços maiores que as 
fenestrações), sendo passíveis de ser encontrados ao nível dos sinusóides hepáticos, na medula 
óssea e no baço. 
 
Ao nível das suas extremidades distais, os capilares convergem em vénulas (cujo raio interno varia entre 
5 e 25 µm), que transportam sangue para veias de baixa pressão que, por sua vez, fazem o retorno 
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venoso para o coração. As vénulas apresentam uma camada descontínua de células musculares lisas 
vasculares e, como tal, têm capacidade de controlar o fluxo sanguíneo e de estabelecer trocas de 
solutos ao longo das suas paredes. 
Difusão 
Os gases difundem-se de forma transcelular entre as duas membranas e o citosol das células endoteliais 
de um capilar. Embora, por motivos descritivos, a troca de oxigénio seja destacada, convém referir que 
os mecanismos são similares para a troca de dióxido de carbono, apesar de estes últimos ocorrerem 
numa direcção inversa. Em termos gerais, à medida que o sangue arterial (muito rico em oxigénio) 
atravessa um capilar sistémico, o oxigénio difunde-se ao longo da parede capilar, para o espaço 
tecidular, que inclui o fluido intersticial e as células vizinhas. 
Cilindro tecidular de Krogh 
O cilindro tecidular de Krogh é o modelo para as trocas gasosas mais frequentemente aceite. O cilindro 
tecidular corresponde ao volume tecidular ao qual um único capilar fornece oxigénio e, como tal, cada 
cilindro de tecido rodeia um único capilar. De acordo com este modelo, o raio de um cilindro tecidular 
num órgão corresponde, normalmente, a metade do espaço médio intercapilar. Uma vez que a 
densidade capilar é altamente variável entre os tecidos, também a distância intercapilar média 
apresenta grandes variações. Assim sendo, a densidade capilar é maior em tecidos com maior consumo 
de oxigénio (tais como o miocárdio e pulmões) e menor em tecidos com baixo consumo de oxigénio (tais 
como a cartilagem articular). 
 
O modelo de Krogh é útil porque ajuda a prever como é que a concentração de oxigénio (ou pressão 
parcial de oxigénio – PO2) cai ao nível do lúmen ao longo do comprimento do capilar, à medida que o 
oxigénio é expulso para os tecidos adjacentes. De referir que PO2 em qualquer local de um capilar 
depende de vários factores, que combinados, contribuem para a forma e perfis de concentração dentro 
do vaso e do tecido: 
1. Concentração de oxigénio livre no sangue arteriolar que “alimenta”os capilares. Esta 
concentração é proporcional a PO2 nas arteríolas. 
2. Conteúdo de oxigénio de sangue. A quantidade de oxigénio livre no sangue é muito reduzida – 
a maior parte encontra-se ligada à hemoglobina, dentro dos eritrócitos. 
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3. Fluxo sanguíneo capilar (F). 
4. Coeficiente de difusão radial (Dr) - factor 
que preside à difusão de oxigénio para fora 
do lúmen capilar, sendo o mesmo no 
sangue, parede dos capilares (em todo o 
seu comprimento) e tecidos adjacentes. 
5. Raio capilar (rc). 
6. Raio do cilindro tecidular (rt) ao qual o 
capilar está a fornecer oxigénio. 
7. Consumo de oxigénio pelos tecidos 
adjacentes (QO2) 
8. Distância axial (x) ao longo do capilar. 
A diferença entre a concentração de uma 
substância no influxo arterial e no efluxo venoso é 
determinada pela diferença arterio-venosa. A título 
de exemplo, se a concentração de oxigénio arterial 
que entra num tecido for de 20 mL O2/dL de sangue 
e se a concentração de oxigénio venoso que 
abandona o tecido for de 15 mL O2/dL de sangue, a 
diferença arterio-venosa para aquele tecido é de 5 
mL O2/dL de sangue. 
Outra forma de exprimir a quantidade de substância (por exemplo, de oxigénio) que é removida pelos 
tecidos é pela proporção de extracção. Este parâmetro não é mais que a normalização da diferença 
arterio-venosa para o conteúdo arterial da substância e, como tal, a proporção de extracção para o 
oxigénio (EO2) é de: 
 
 
 
 
Fazendo as contas para o exemplo que estava a ser dado, seria obtida uma proporção de extracção de 
0,25 (25%). O que significa, em termos práticos, que o órgão do exemplo remove (e consome) 25% do 
oxigénio que lhe está disponível no sangue arterial. 
Coloca-se então a questão de quais os factores que determinam a extracção de oxigénio. Ora, os oito 
factores que influenciam os perfis de PO2 são precisamente os mesmos que determinam a extracção de 
oxigénio do órgão. De entre esses factores, os mais importantes são o fluxo capilar e o consumo de 
oxigénio pelos tecidos (o que corresponde à exigências metabólicas). De referir que a proporção de 
extracção de oxigénio diminui com o aumento de fluxo sanguíneo (uma vez que ocorre maior 
fornecimento de sangue, os tecidos necessitam de extrair uma menor percentagem de oxigénio para 
satisfazer as suas necessidades) e aumenta com as exigências metabólicas. 
Estas conclusões não são mais que um reajuste da lei de Fick que poderá ser reescrita como: 
 
 
 
 
Lei de Fick 
Apesar da célula endotelial ser altamente permeável a oxigénio e a dióxido de carbono, esta funciona 
como uma importante barreira para a troca de substâncias insolúveis em lipídeos. Os solutos hidrofílicos 
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que são mais pequenos que a albumina apresentam a capacidade de atravessar a parede capilar por via 
de difusão paracelular (entre as junções inter-endoteliais, os pequenos espaços, as fenestrações e as 
gaps, caso estas últimas estejam presentes). 
A quantidade de soluto que atravessa uma área particular de um capilar por unidade de tempo é 
designada por fluxo. O fluxo é proporcional à magnitude da diferença de concentrações que existe ao 
longo da parede capilar e é maior em capilares mais permeáveis. Ora, estes conceitos básicos são 
expressos pela lei de Fick: 
Jx=Px×(Xc-Xif) 
Na fórmula, Jx representa o fluxo do soluto X em moles/(cm
2/s), sendo que esse fluxo é positivo quando 
ocorre fluxo dos capilares para o fluido intersticial. por seu turno, correspondem às 
concentrações de soluto dissolvido no capilar e fluido intersticial, respectivamente. Uma vez que a 
espessura da parede capilar (a) é difícil 
de determinar, utiliza-se um coeficiente 
de permeabilidade (Px) para exprimir a 
razão entre o coeficiente de difusão (Dx) 
e a espessura. Deste modo, o 
coeficiente de permeabilidade exprime 
a facilidade, com a qual um soluto 
atravessa um capilar por difusão. 
Uma vez que, na prática, a área da 
superfície do capilar (S) é por vezes 
desconhecida, torna-se impossível 
calcular um fluxo de um soluto, expresso 
por unidade de área. Assim, é mais 
comum calcular o fluxo de massa (Q), 
que é simplesmente a quantidade de 
soluto transferido por unidade de tempo 
(unidades: mol/s). 
Small pore effect 
A permeabilidade de uma célula endotelial é maior para solutos lipossolúveis (tais como o oxigénio e o 
dióxido de carbono), pois estes têm maior capacidade de se difundir através de toda a célula endotelial, 
comparativamente a solutos hidrossolúveis, tais como o cloreto de sódio, a ureia e a glicose. 
Deste modo, as pequenas moléculas hidrofílicas polares apresentam uma permeabilidade relativamente 
baixa, uma vez que só têm capacidade de se difundirem por via paracelular, através de fendas inter-
endoteliais ou vias aquosas, que constituem apenas uma pequena fracção de toda a área capilar (de 
lembrar que a área é um dos factores que para a permeabilidade celular). Assim, a difusão destas 
pequenas moléculas hidrofílicas por descontinuidades, ou espaços nas junções apertadas (que 
constituem os small pore, cujo raio é de cerca de 10 nm) é designada por small pore effect. Contudo, é 
necessário ter em conta que o efeito do glicocálice na superfície das células endoteliais, ajuda a explicar 
o small pore effect. 
Uma vez que as fendas inter-endoteliais são mais largas nas extremidades venosas dos capilares e que 
as fenestrações são também mais comuns a esse nível, Px aumenta ao longo do capilar. Isto explica 
porque é que numa situação em que a diferença de concentrações transcapilares - fosse a 
mesma, o fluxo de soluto seria, mesmo assim, maior ao nível da extremidade venosa da microcirculação. 
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Pequenas proteínas 
também 
apresentam a 
capacidade de se 
difundirem ao 
longo de fendas 
inter-endoteliais ou 
por via de 
fenestrações. 
Contudo, para além 
do tamanho 
molecular, também 
a carga eléctrica das 
proteínas e de 
outras 
macromoléculas 
constitui um importante determinante do seu coeficiente de permeabilidade aparente. Sob o ponto de 
vista geral, o fluxo de proteínas negativamente carregadas é muito menor, comparativamente àquele de 
macromoléculas neutrais de tamanho equivalente, enquanto as macromoléculas carregadas 
positivamente apresentam um maior coeficiente de permeabilidade aparente. De facto, a presença de 
cargas negativas fixas nas proteínas do glicocálice endotelial impede a passagem de macromoléculas 
com carga negativa e favorece o transporte de macromoléculas com carga positiva. 
O movimento difusivo de solutos é o modo dominante de trocas transcapilares. Todavia, o movimento 
convectivo da água também pode transportar solutos. Este efeito, de menor importância, é designado 
por solvent drag e corresponde ao fluxo de um soluto dissolvido que é feito passar, devido à imensidão 
do movimento do solvente. 
Large pore effect 
As macromoléculas cujo raio excede 1 nm (tais 
como proteínas plasmáticas) têm a capacidade 
de cruzar os capilares, através de fendas 
intercelulares, fenestrações e gaps (quando 
estes se encontram presentes). Contudo, este 
mecanismo de transporte para este tipo de 
moléculas apresenta muito pouca importância. 
As cavéolas são as principais responsáveis pelo 
large pore effect que permite a translocação 
celular de macromoléculas. Assim sendo, a 
transcitosede macromoléculas muito grandes 
por transporte vesicular envolve: 
1. O equilíbrio das macromoléculas dissolvidas no lúmen capilar com as macromoléculas 
presentes na fase fluida, ao nível da vesícula aberta. 
2. A formação da vesícula e a passagem desta para o citosol, onde ocorre fusão com outras 
vesículas 
3. A fusão das vesículas com a membrana endotelial do lado oposto. 
4. O equilíbrio com a fase do fluido extracelular oposto. 
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Apesar de o movimento transcitólico de macromoléculas poder ser designado por fluxo, as leis da 
difusão não presidem à transcitose. É ainda importante referir que a transcitose raramente se verifica ao 
nível do encéfalo – a presença de junções apertadas contínuas contribuem para uma barreira encefálica 
cuja permeabilidade aparente para as macromoléculas é muito inferior. 
Limites à difusão 
Ao nível dos capilares, a difusão de moléculas insolúveis em lipídeos encontra-se restrita a canais 
aquosos ou a poros. Para pequenas moléculas, tais como a água, o cloreto de sódio, a ureia e a glicose, 
os poros dos capilares apresentam baixa restrição à difusão, de tal modo que a difusão dessas 
substâncias se torna tão rápida, que o gradiente de concentração médio ao longo do endotélio capilar 
se torna extremamente pequeno. Assim, quanto maiores são as moléculas insolúveis em lipídeos, mais 
restrita é a sua difusão através dos capilares. A difusão torna-se eventualmente mínima, quando a 
massa molecular das moléculas excede os 60000. Já no que concerne às pequenas moléculas, a única 
limitação ao movimento ao longo da parede capilar é a taxa através da qual o fluxo sanguíneo 
transporta as moléculas para os capilares. Diz-se então que o transporte dessas moléculas é limitado 
pelo fluxo. 
Enquanto, aquando de um grande fluxo sanguíneo, uma pequena molécula ainda consegue estar 
presente num local distal do capilar, uma molécula maior mover-se-ia apenas até um dado ponto, em 
que a sua concentração no sangue se tornaria insignificante. Para além disso, o número de moléculas 
grandes que entram na extremidade arterial de um capilar mas não conseguem passar através dos 
poros capilares iguala o número de moléculas que abandonam a extremidade venosa do capilar. Em 
grandes moléculas, a difusão ao longo dos capilares torna-se o factor limitante (transporte limitado 
pela difusão). Isto significa que a permeabilidade de um capilar a grandes moléculas de soluto limita o 
seu transporte ao longo da parede capilar. 
O movimento de moléculas lipossolúveis ao longo da parede capilar não se encontra limitado aos poros 
capilares, ocorrendo também directamente através das membranas lipídicas de todo o endotélio 
capilar. Consequentemente, as moléculas lipossolúveis movem-se rapidamente por entre o sangue e os 
tecidos. Desta forma, o grau de lipossolubilidade é um bom indicador da facilidade de transferência de 
moléculas lipídicas através do endotélio capilar. 
Transporte por convecção 
Equação de Starling 
A via para o movimento de fluidos ao longo da parede dos capilares é uma combinação das vias 
transcelular e paracelular. As membranas celulares endoteliais exprimem canais activos de aquaporina 
1 (AQP1), que constituem a principal via transcelular para o movimento de água. Já as fendas inter-
endoteliais, as fenestrações ou as gaps, actuam como substrato anatómico para a via paracelular. 
Enquanto o principal mecanismo para a transferência de gases e outros solutos é a difusão, o principal 
mecanismo para a transferência de fluido ao longo da membrana capilar é a convecção. Existem duas 
grandes driving forces para a convecção, nomeadamente a diferença transcapilar de pressões 
hidrostáticas e a diferença de pressão osmótica efectiva (também designada por pressão osmótica 
colóide, ou por diferença de pressão oncótica). 
A diferença de pressões hidrostáticas (ΔP) ao longo da parede dos capilares consiste na diferença entre 
a pressão intravascular (ou seja, a pressão hidrostática capilar, Pc) e a pressão extra-vascular (ou seja, a 
pressão hidrostática do fluido intersticial, Pif). De referir que o termo “hidrostático” inclui todas as 
fontes de pressão intravascular, sendo utilizado como antónimo de “osmótico”. 
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Já a diferença de pressão osmótica 
colóide (Δπ) ao longo da parede capilar 
consiste na diferença entre a pressão 
osmótica colóide intravascular causada 
pelas proteínas plasmáticas (πc) e a 
pressão osmótica colóide extra-vascular 
causada pelas proteínas do fluido 
intersticial e proteoglicanos (πif). Assim, 
enquanto um ΔP positivo tende a repelir a 
água para fora do lúmen capilar, um Δπ 
positivo tende a atrair a água para o lúmen capilar. 
A hipótese de Starling permite descrever o fluxo de volume de fluido (Jv) através da parede de um 
capilar e encontra-se descrita pela seguinte equação: 
 
Esta equação encontra-se concebida de tal modo que o fluxo de água que abandona o capilar é positivo 
e que o fluxo de água que entra no capilar é negativo. 
A condutividade hidráulica (Lp) é a constante de proporcionalidade que relaciona a driving force com o 
Jv, exprimindo a permeabilidade total fornecida pelo conjunto dos canais AQP1 e pela via paracelular. 
Embora de acordo com a lei de van’t Hoff possamos ainda referir que a diferença teórica de pressões 
osmóticas colóides (Δπteoria) é proporcional à diferença de concentrações proteicas (Δ[X]), sabe-se que 
as paredes capilares fazem a extrusão de proteínas de modo imperfeito, de tal modo que a diferença de 
pressões osmóticas colóides observadas (Δπobservado) é, de facto, menor que a diferença teórica. Assim, 
torna-se importante incluir na fórmula o coeficiente de reflexão (σ), que não é mais que o rácio 
Δπobservado/Δπteoria, e que uma forma de descrever como é que uma barreira semi-permeável exclui ou 
“reflecte” um dado soluto X, à medida que a água se movimenta ao longo da barreira, por via de 
gradientes de pressão hidrostática ou osmótica. 
Uma vez que σ é uma proporção, pode adquirir qualquer valor entre 0 e 1. Quando o σ é zero, o 
deslocamento da água leva consigo a totalidade do soluto, que não exerce pressão osmótica ao longo da 
barreira. Contudo, quando σ é 1, a barreira exclui por completo o soluto, à medida que a água a 
atravessa, sendo que o soluto exerce pressão osmótica total. De referir que o σ para as proteínas 
plasmáticas é próximo de 1. Já pequenos solutos que atravessam livremente o endotélio, como os iões 
sódio e cloreto, apresentam um σ igual a zero. Deste modo, a alteração da concentração intravascular 
ou intersticial destas últimas entidades não cria uma driving force osmótica efectiva, ao longo da parede 
capilar. 
 
 
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Forças de Starling 
Filtração e absorção 
A expressão para a driving force na equação de Starling [(Pc - Pif) - σ(πc - πif)] é designada por pressão de 
filtração líquida. A filtração de um fluido a partir de um capilar para o espaço tecidular ocorre quando 
esta pressão de filtração é positiva. No caso especial em que o σ para as proteínas é 1, o fluido que 
abandona o capilar encontra-se livre de proteínas e este processo designa-se por ultra-filtração. 
Por contraste, a absorção de fluido a partir do espaço tecidular para o espaço vascular ocorre quando a 
pressão de filtração líquida é negativa. Ao nível da extremidade arterial dos capilares, a pressão de 
filtração é geralmente positiva, de tal modo que ocorre filtração. Já ao nível da extremidadevenosa, a 
pressão de filtração é geralmente negativa, de tal modo que se verifica a presença de absorção. 
Contudo, existem órgãos que não seguem esta regra. 
Pressão hidrostática capilar 
A pressão sanguínea capilar (Pc), também designada por pressão hidrostática capilar, varia ao nível das 
extremidades arteriolar e venular dos capilares. A título de exemplo, na pele Pc apresenta um valor de 
cerca de 35 mm/Hg ao nível da extremidade arteriolar, e de cerca de 15 mm/Hg ao nível da extremidade 
venular. 
Quando a pressão arteriolar é da ordem dos 60 mm/Hg e a pressão venular é de 15 mm/Hg, a pressão 
médio-capilar não corresponde ao valor médio entre as duas (que neste caso seria de 37,5 mm/Hg), mas 
sim a um valor de apenas 25 mm/Hg. Isto deve-se ao facto de a resistência pré-capilar (a resistência que 
se encontra a montante do capilar, ao nível da terminação das arteríolas) exceder normalmente a 
resistência pós-capilar (a resistência que se encontra a jusante do capilar, ao nível da terminação das 
vénulas). O valor de Pc não é uniforme e varia em função de quatro parâmetros, nomeadamente as 
resistências pré e pós capilar, a localização, o tempo e a gravidade. 
No que concerne às resistências pós e 
pré capilares, quando a resistência pós-
capilar é inferior á pré-capilar, como 
ocorre normalmente, a pressão 
hidrostática dos capilares torna-se mais 
próxima da pressão hidrostática venular, 
do que da pressão hidrostática arteriolar. 
Deste modo, alterações idênticas ao 
nível das pressões hidrostáticas arteriolar 
e venular obtêm efeitos diferentes na 
pressão hidrostática capilar, sendo que a 
alteração na pressão hidrostática venular 
surte mais efeito, que a variação da 
pressão arteriolar (a título de exemplo, 
considerando um Rpos/Rpre de 0.3, um 
aumento de 10 mm/Hg na pressão 
arteriolar apenas aumentaria a pressão 
capilar em 2 mm/Hg, mas o mesmo 
aumento para a pressão venular, 
aumentaria a pressão capilar em 8 
mm/Hg). 
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Já a localização prende-se com os tecidos onde está a ocorrer passagem de fluido. Ao nível dos capilares 
renais são necessárias pressões hidrostáticas capilares elevadas para que ocorra ultrafiltração, enquanto 
os capilares pulmonares apresentam valores baixos de pressão hidrostática capilar, minimizando assim a 
ultra-filtração, que poderia levar à acumulação de fluido de edema ao nível dos espaços alveolares. 
Pressão hidrostática intersticial 
Ao nível do fluido intersticial, a pressão hidrostática (Pif) apresenta um valor ligeiramente negativo (na 
ordem dos -2 mm/Hg). O facto de Pif ser ligeiramente negativo deve-se à remoção de fluido pelos 
linfáticos. Existem, contudo, excepções ao nível dos compartimentos fechados rígidos (como a medula 
óssea ou o encéfalo) e ao nível dos órgãos encapsulados, tais como o rim. Nestas situações P if é positivo, 
pois, no caso dos órgãos encapsulados, a expansão dos vasos de alta pressão empurra o fluido 
intersticial contra a cápsula fibrosa/fáscia, aumentando Pif. Como é de esperar, Pif não varia ao longo das 
extremidades arteriolar e venular dos capilares, todavia, Pif é altamente sensível à adição de fluido para 
o compartimento intersticial (de facto, o aumento de Pif em função do aumento de fluido para o 
compartimento intersticial traduz-se numa relação quase logarítmica). 
Pressão osmótica colóide capilar 
A diferença de pressões osmóticas colóides ao longo do endotélio dos capilares deve-se apenas às 
proteínas plasmáticas, tais como a albumina. A concentração de proteínas total no plasma é de cerca de 
7,0 g/L, ou seja 1,5 mM. De acordo com a lei de van’t Hoff, essas proteínas exerceriam uma pressão 
osmótica de cerca de 28 mm/Hg caso fossem totalmente reflectidas pela parede do capilar (σ=1). Uma 
vez que σ não é 1, mas sim próximo de 1, o valor real da pressão osmótica colóide nos capilares (πc) é de 
cerca de 25 mm/Hg. 
πc não varia consideravelmente ao longo do 
comprimento do capilar. De facto, a maior 
parte dos leitos capilares filtram menos que 1% 
do fluido que entra na extremidade arteriolar, 
de tal modo, que a perda de fluido livre de 
proteínas não leva a uma concentração 
mensurável de proteínas plasmáticas ao longo 
do capilar e não eleva consideravelmente o πc. 
Contudo, πc varia de forma marcada com a 
composição e concentração proteica. 
Também o coeficiente de reflexão para os 
colóides varia amplamente entre os órgãos. 
Deste modo, os valores mais baixos de σ 
encontram-se ao nível dos locais onde existe 
descontinuidade dos capilares (por exemplo, 
ao nível do fígado), valores intermédios 
encontram-se ao nível do músculo e, por fim, 
os valores mais elevados (σ=1) encontram-se 
ao nível dos leitos capilares contínuos e 
apertados do encéfalo. 
As proteínas plasmáticas não actuam somente 
como agentes osmóticos. Uma vez que estas 
proteínas também transportam cargas 
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negativas, pelo efeito de Donnan, ocorre um aumento na concentração de catiões e na pressão 
osmótica colóide, ao nível do lúmen capilar. 
Pressão osmótica colóide do fluido intersticial 
Assumindo que a pressão osmótica colóide do fluido intersticial (πif) será a mesma que a pressão 
osmótica da linfa, conseguimos perceber que, devido ao facto do conteúdo proteico linfático ser 
altamente variável, πif também o é. De facto, πif varia no organismo entre cerca de 3 e 15 mm/Hg. 
Por outro lado, πif aumenta ao longo do eixo do capilar – os valores mais baixos encontram-se ao nível 
da extremidade arteriolar, onde o fluido intersticial recebe fluido livre de proteínas proveniente dos 
capilares, como resultado da filtração ocorrida. Já os valores mais elevados registam-se ao nível da 
extremidade venular, onde o fluido intersticial perde fluido livre de proteínas para os capilares, como 
resultado da absorção capilar. 
Aplicação da equação de Starling 
Através da equação de Starling é então possível calcular a transferência líquida de fluido (Jv) em ambas 
as extremidades de um capilar típico: 
 
A pressão de filtração líquida é então positiva (favorecendo a filtração) ao nível da extremidade 
arteriolar e negativa ao nível da extremidade venular (favorecendo a absorção). No ponto em que se 
atinge um equilíbrio entre as forças de filtração e reabsorção, não se verifica a presença de movimento 
líquido de água ao longo da parede capilar. 
 
A pressão de filtração líquida varia consideravelmente entre alguns tecidos. Por exemplo, ao nível da 
mucosa intestinal, Pc é muito inferior a πc, de tal modo que a absorção ocorre continuamente ao longo 
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Fisiologia I 
130 
 
de todo o comprimento do capilar. Por outro lado, ao nível dos capilares glomerulares, Pc excede πc ao 
nível da maior parte da rede, de tal modo que a filtração pode ocorrer ao longo de todo o capilar. 
Também a condutividade hidráulica (Lp) pode afectar o perfil de filtração/absorção ao longo dos 
capilares – uma vez que as fendas inter-endoteliais se tornam maiores em direcção à extremidade 
venular dos capilares, Lp aumenta ao longo dos capilares, deste a extremidade arteriolar até à 
extremidade venular. Por fim, a filtração líquida de fluido num órgão depende da área da superfície dos 
capilares que estão a sofrer profusão (por exemplo, o exercício físico recruta capilares abertos adicionais 
no músculo, aumentando a área e, como tal, aumentando a filtração). 
Modelo clássico e modelo actual 
As trocas de fluido ao nívelda barreira endotelial de capilares contínuos é mais complexa que o 
considerado pelo modelo clássico (que tem vindo a ser descrito neste texto). De facto, estudos 
experimentais evidenciam que as estimativas de filtração e absorção são consideravelmente superiores 
aos dados obtidos experimentalmente. O motivo pelo qual isto acontece deve-se ao facto de o modelo 
clássico considerar a barreira capilar como uma única barreira separando dois compartimentos 
uniformes bem definidos (modelo altamente simplista). 
Foi então concebido um novo modelo (modelo actual) para colmatar as discrepâncias entre as previsões 
do modelo clássico e os dados experimentais. O modelo actual considera duas características adicionais 
– em primeiro lugar, a barreira primária para a pressão osmótica colóide, ou seja a “membrana 
semipermeável” que reflecte proteínas, mas permite a passagem de água e pequenos solutos, não 
corresponde à membrana de todo o capilar, mas apenas ao glicocálice luminal (nomeadamente a 
porção particular de glicocálice que se sobrepões às fendas paracelulares). Em segundo lugar, a 
superfície do glicocálice que não está voltada para o lúmen não se encontra em contacto directo com o 
fluido intersticial – verifica-se que esta superfície se encontra banhada pelo fluido subglicocalical, de tal 
modo que o fluxo ao longo da barreira glicocalical depende não de Pif e de πif (valores associados ao 
fluido intersticial), mas dos parâmetros comparáveis para o fluido subglicocalical (Psg e πsg): 
 
Durante a ultra-filtração, quando Jv é positivo, Psg é 
superior a Pif, o que permite o movimento do fluido 
desde o espaço subglicocalical para o fluido intersticial, 
ao longo da fenda paracelular. Para além disso, À 
medida que o ultra-filtrado livre de proteínas entra no 
espaço subglicocalical, a pressão osmótica colóide torna-se baixa (πsg<πi). Todavia, o aumento que se 
regista em Psg e a diminuição que se verifica em πsg tendem a opor-se progressivamente à filtração, o 
que explica que no modelo actual esta não seja tão grande, como se pensava. 
Por outro lado, quando Jv é próximo de zero, os parâmetros do fluido subglicocalical (i.e., Psg e πsg) 
encontram-se muito próximos dos seus correspondentes ao nível do fluido intersticial (i.e., Pif e πif) e o 
modelo actual pode ser simplificado para o modelo clássico. 
Por fim, aquando da absorção, quando o Jv é negativo, a água e os pequenos solutos movem-se do 
espaço subglicocalical para o lúmen dos capilares, aumentando a concentração proteica ao nível do 
espaço subglicocalical. O aumento resultante do πsg opõe-se a mais absorção e, de facto, até pode travar 
o progresso da absorção. 
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131 
 
 
Sistema linfático 
Os linfáticos iniciam-se ao nível do interstício como pequenos canais de paredes finas constituídas por 
células endoteliais. Estes vasos linfáticos juntam-se depois para formar vasos linfáticos cada vez 
maiores. Os linfáticos iniciais são similares aos capilares, embora apresentem várias junções inter-
endoteliais que se comportam como microválvulas de um único sentido (válvulas linfáticas primárias). 
Existem ainda filamentos de ancoragem que ancoram os linfáticos iniciais ao tecido conjuntivo nas 
redondezas. Já os vasos linfáticos de maiores dimensões, tal como as veias, também apresentam 
válvulas – as válvulas linfáticas secundárias, que restringem o movimento retrógrado da linfa. 
Ao nível dos linfáticos iniciais, as junções inter-endoteliais apresentam poucas junções apertadas ou 
moléculas de adesão a unir células endoteliais vizinhas. Como resultado, as células endoteliais podem se 
sobrepor umas às outras e actuar como microválvulas de único sentido. Apesar de os linfáticos iniciais 
apresentarem uma aparência colapsada e de não evidenciarem actividade contráctil, o gradiente de 
pressão que se estabelece entre o fluido intersticial e o lúmen do linfático deforma as células endoteliais 
de tal modo que as microválvulas abrem e o fluido entra no linfático inicial durante a chamada fase de 
expansão. De referir que, durante este período de tempo, as válvulas linfáticas secundárias encontram-
se fechadas. 
A pressão externa 
(registada, por exemplo, ao 
nível do músculo 
esquelético), por seu turno, 
leva ao fecho das 
microválvulas, e permite a 
abertura de válvulas 
linfáticas secundárias, o faz 
com que o fluido entre em 
vasos linfáticos de maiores 
dimensões. Esta fase é 
designada por fase de 
compressão. 
Pensa-se que a filtração na 
extremidade arteriolar dos 
capilares exceda a absorção 
que ocorre ao nível da 
extremidade venosa em 
dois a quatro litros por dia. 
Contudo, o fluido não se 
acumula normalmente no 
interstício, porque este 
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132 
 
fluido em excesso e as proteínas se movimentam para os linfáticos. Deste modo, cada dia, os linfáticos 
fazem o retorno para a circulação de entre dois a quatro litros de fluido intersticial. Aquando da 
acumulação de fluido no interstício, verifica-se a presença de um edema. 
Fluxo linfático 
A pressão hidrostática ao nível dos linfáticos iniciais (Plinfa) varia entre -1 e 1 mm/Hg e, sendo a pressão 
média do fluido intersticial mais negativa que estes valores, a driving force para o fluido intersticial se 
deslocar para os linfáticos iniciais prende-se com aumentos transitórios em Pif que a tornam maior que 
Plinfa. 
Deste modo, a adição de fluido ao interstício aumenta a sua Pif, o que aumenta a driving force para a 
entrada do fluido ao nível dos linfáticos. Assim, o fluxo linfático torna-se extremamente sensível a 
aumentos no Pif. O facto do efluxo linfático 
corresponder ao excesso de filtração 
capilar permite, então, que o volume do 
fluido intersticial varie muito pouco. 
Todavia, em situações em que a 
complacência do fluido intersticial é muito 
grande, o aumento de fluido ao nível do 
interstício aumenta pouco a (já elevada) Pif 
e, como tal, o retorno linfático não 
compensa adequadamente o excesso de 
filtração capilar. Isto faz com que o volume 
do fluido intersticial aumente e se forme 
um edema. 
A compressão e relaxamento intermitentes dos linfáticos ocorrem devido à respiração, caminhar e 
movimentos peristálticos intestinais. Quando a Plinfa num segmento a jusante cai para níveis inferiores 
aos que ocorrem num segmento a montante, a aspiração de um fluido produz um fluxo unidireccional. 
Esta sucção é altamente responsável pelos valores subatmosféricos de Pif, que são passíveis de ser 
observados em vários tecidos. 
As pressões nos vasos linfáticos colectores vão aumentando progressivamente ao longo do vaso. Um 
mecanismo miogénico de contracção activa do músculo liso das paredes linfáticas permite dirigir a linfa 
em direcção às veias. Para além deste processo activo, também alguns processos passivos presidem à 
condução da linfa para as veias, nomeadamente a contracção das células musculares esqueléticas, os 
movimentos respiratórios e a contracção intestinal. 
Já as proteínas que entraram no fluido intersticial provenientes dos capilares não têm a capacidade de 
regressar à circulação sanguínea devido ao gradiente químico adverso que se verifica ao longo da 
parede endotelial capilar. A acumulação dessas macromoléculas no interstício permite a criação de um 
gradiente de difusão desde o interstício até à linfa, que complementa o movimento convectivo dessas 
macromoléculas para o sistema linfático. Assim, o retorno proteico de um indivíduo em condições 
normais é de cerca de 100 a 200g de proteínas. A linfa contém também leucócitos(que também se 
deslocaram do sangue para o interstício), mas não contém eritrócitos nem plaquetas. Deste modo, os 
ciclos de compressão e relaxamento linfático não apenas promovem o movimento de fluido, como 
também aumentam a quantidade de linfócitos ao nível da linfa. 
 
 
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133 
 
Circuitos do fluido extracelular 
O fluido extracelular desloca-se por via de três 
ansas convectivas. A primeira é a ansa 
cardiovascular. Assumindo um débito 
cardíaco de 5 litros/minuto, o fluxo convectivo 
de sangue por via da ansa cardiovascular é de 
7200 litros/dia, num indivíduo em repouso. A 
segunda é a ansa transvascular, onde o fluido 
se move para fora dos capilares ao nível da 
sua extremidade arteriolar e o fluido entra 
para os capilares ao nível da sua extremidade 
venular. Não contando com os glomérulos 
renais, que filtram uma grande quantidade de 
fluido, ocorre uma filtração de cerca de 20 
litros de sangue por dia (ao nível da 
extremidade arteriolar) e uma reabsorção de 
entre 16 e 18 L (ao nível da extremidade 
venular). Apesar de estes valores se 
encontrarem sobre-estimados (por 
considerarem o modelo clássico, e não o 
actual), a diferença de 2-4 litros por dia, entre 
o fluido filtrado e o fluido absorvido, é uma 
estimativa razoável do volume da terceira 
ansa de fluido – a ansa linfática. 
Para além das trocas convectivas, as trocas de 
água e solutos por difusão também ocorrem 
ao longo dos capilares. A troca de água por 
difusão ocorre a uma taxa muito superior (80 
000 litros/dia), comparativamente à que 
ocorre por movimento convectivo. Contudo, a 
difusão de água é um processo de troca que 
não contribui consideravelmente para o 
movimento líquido de água, ou seja, todos os dias, 80 000 litros de água difundem-se para fora dos 
capilares e 80 000 litros difundem-se para dentro. 
No que concerne aos pequenos solutos que se difundem ao longo do endotélio capilar, o seu transporte 
é deveras diferente do transporte por ansas convectivas para a água. Relativamente à passagem desses 
solutos para o interstício, a quantidade de soluto que é transportada por filtração, dissolvidos em água, 
é muito menos expressiva, comparativamente à quantidade de soluto que entra por difusão (mesmo 
que parte dos solutos que entrem para o interstício por difusão, se difundam de novo para os capilares). 
O transporte de proteínas ilustra outro padrão de ansas circulatórios. O plasma apresenta cerca de 210 
g de proteínas e o coração bombeia por dia 277 000 g de proteínas por dia, através da circulação. Dessa 
quantidade de proteínas, entre 100 e 200 g de proteínas por dia (correspondentes quase à quantidade 
total de proteínas plasmáticas) atravessam as paredes dos capilares através do large pore system. Uma 
vez que apenas muito pequenas quantidades de proteínas filtradas regressam à circulação, pela 
extremidade venosa dos capilares (cerca de 5 g/dia), quase todas as proteínas filtradas (entre 95 e 195 
g/dia) dependem da ansa linfática convectiva para voltarem à circulação sanguínea. 
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Hematopoiese 
A hematopoiese é o 
processo que permite a 
génese de todos os tipos 
de células presentes ao 
nível do sangue. Devido à 
diversidade de células 
geradas, a hematopoiese 
é um processo essencial 
para a ocorrência de 
muitas funções, que vão 
desde o transporte de 
gases, até à resposta 
imunitária, passando pela 
hemóstase. 
Em termos embriológicos, 
identificam-se já células hematopoiéticas, às três semanas, ao nível do saco vitelino. Já no feto, os 
órgãos preferenciais para a ocorrência de hematopoiese são o fígado e o baço, sendo que aquando do 
nascimento, estes órgãos ainda estão envolvidos na produção de células sanguíneas (embora a esta 
altura, já se verifique a ocorrência de hematopoiese ao nível da medula óssea). 
Na vida adulta, a hematopoiese ocorre ao nível da medula óssea vermelha (que se encontra apenas ao 
nível do osso esponjoso), salvo se houver patologia. Todavia, com o aumento progressivo da idade, a 
medula vermelha, vai sendo substituída por medula amarela, contendo gordura. Para além das células 
hematopoiéticas e sanguíneas, a medula óssea vermelha apresenta ainda células de suporte, tais como 
células endoteliais, células do estroma, 
osteoclastos e osteoblastos. 
As células hematopoiéticas não se encontram 
dispostas de forma desorganizada ao longo 
da medula óssea – à medida que vão sendo 
atingidos sucessivos graus de diferenciação, 
as células vão se aproximando dos vasos, 
onde a disponibilidade de oxigénio é maior. Aí 
essas células vão ocupando nichos centrais. 
Já as stem cells e outras células com um grau 
relativamente baixo de diferenciação 
mantêm-se próximas das trabéculas, 
ocupando nichos medulares. De referir que 
os nichos são ambientes altamente regulados, 
onde ocorre o desenvolvimento de células da 
medula óssea. 
Stem cells 
As stem cells são células totipotentes, histologicamente iguais a linfócitos, que apresentam a capacidade 
de originar famílias de células completamente distintas. Estas células são auto-renováveis e são 
passíveis de diferenciação, sendo que à medida que uma stem cell se diferencia, vai perdendo a sua 
totipotência e as suas capacidades de auto-renovação. Particularizando para a hematopoiese, as stem 
3. Sangue e hemóstase 
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135 
 
cells têm a capacidade de originar todas as linhas celulares hematopoiéticas, ao mesmo tempo que têm 
capacidade de se auto-renovarem. 
Ainda não se sabe muito bem o que faz com que as stem cells se diferenciem ou mantenham a sua 
totipotência. Todavia, existem já duas hipóteses colocadas que procuram responder a essa questão. A 
primeira hipótese propõe que são as propriedades das células envolventes (tais como as células do 
estroma), que fazem com que as stem cells permaneçam totipotentes ou se diferenciem. Contudo, caso 
essa hipótese se verificasse, aquando de um estímulo extracelular demasiado forte, todas as stem cells 
entrariam em diferenciação e, consequentemente, deixaria de haver renovação das células sanguíneas 
(o que estaria associado a uma condição patológica). Assim, a segunda hipótese propõe que o destino 
das stem cells se deve simplesmente ao acaso. 
Em termos estruturais, as stem cells são ancoradas às células de suporte por via do complexo CXCR4 e 
SDF1 (que interagem entre si). Este ancoramento é reversível e, de facto, quando as stem cells se 
diferenciam, o complexo em causa desfaz-se e estas deixam de estar ancoradas. Um dos factores que 
pode promover o desfazer do complexo de ancoramento é o stem cell factor. Este factor é expresso 
pelas células do estroma, e liga-se a um receptor das stem cells. Isto despoleta uma cascata de 
transdução de sinal, cujo segundo mensageiro pode actuar, não só no sentido de desfazer o complexo 
de ancoramento, mas também de induzir a multiplicação das células, de impedir a sua apoptose e de 
promover a produção de hemoglobina a nível celular. 
As stem cells multipotentes, contrariamente às totipotentes, podem ser transportadas até ao sangue, 
mediante certos estímulos, num fenómeno que se designa por mobilização. Todavia, verifica-se um 
equilíbrio entre as células viajantes e as células que estão nas trabéculas, na medida em que a acção de 
certos factores de crescimento promove o regresso das células do sangue para a medula óssea, onde 
passam a ocupar nichos vazios (fenómenode homing). 
 
Eritropoiese 
Os eritrócitos, na espécie humana, são células anucleadas (embora espécies mais primitivas, como as 
rãs, apresentem eritrócitos nucleados) produzidas através de um processo designado por eritropoiese. 
A eritropoiese é altamente regulada através da eritropoietina, uma citocina produzida, sobretudo no 
rim, mas também no fígado (no período de vida fetal verifica-se uma situação inversa). Assim, quando o 
teor de oxigénio se encontra reduzido (tal como ocorre numa situação de anemia), ocorre uma maior 
produção de eritropoietina, o que está associado a um aumento da eritropoiese. Por oposição, quando 
o teor de oxigénio se encontra aumentado, parte da eritropoietina sofre hidroxilação, sendo destruída 
nos proteossomas, o que inibe o processo de eritropoiese. 
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136 
 
A eritropoietina não é totalmente requerida para a determinação das células progenitoras da linhagem 
eritróide. Todavia, esta citocina revela-se essencial para a para a formação dos proeritroblastos, células 
que ainda não apresentam hemoglobina, sendo, por isso, altamente basófilas. Essa basofilia deve-se à 
ocorrência de uma taxa de síntese proteica muito elevada (o RNA e os ribossomas são estruturas 
ácidas). A elevada síntese proteica é essencial para que as células filhas sejam dotadas de todas as 
proteínas que necessitam. 
 
As células a jusante dos proeritroblastos não requerem a presença de eritropoietina. De entre estas, as 
primeiras células da linhagem eritropoiética a apresentar hemoglobina são os eritroblastos 
policromáticos. Estas células originam, subsequentemente, eritroblastos ortocromáticos que, por sua 
vez, geram reticulócitos, aquando da exocitose do seu núcleo. Por fim, a perda de ribossomas e de 
mitocôndrias leva à formação de eritrócitos maduros que são lançados para a circulação sanguínea. 
É importante referir que as células mais diferenciadas da linha eritropoiética, assim como os próprios 
eritrócitos, são estruturas acidófilas. Isto deve-se ao facto de estas células apresentarem uma 
quantidade progressivamente maior de hemoglobina (uma proteína acidófila), que se concentra, 
maioritariamente, à periferia das células. 
Os eritrócitos apresentam um período de vida médio de 120 dias, sendo que a sua destruição ocorre de 
modo muito curioso. De modo a conseguir passar pelos apertados sinusóides do baço, os eritrócitos têm 
de sofrer deformação. Todavia, à medida 
que os eritrócitos vão envelhecendo, a sua 
membrana vai perdendo flexibilidade e, 
como tal, estas células vão perdendo a 
capacidade de se deformarem, até 
chegarem a um ponto em que já nem 
conseguem atravessar os sinusóides do 
baço. Isto actua como um sinal para estas 
células serem destruídas, sendo que as 
substâncias libertadas na sequência dessa 
destruição são todas reaproveitadas. 
Ao nível da eritropoiese são, por vezes, 
produzidas células com defeito (fracção 
eritropoiética ineficaz), sendo que a génese 
dessas células é normal, ocorrendo em 
todos os indivíduos. 
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Leucopoiese 
A leucopoiese é o processo associado à produção dos leucócitos, sendo estimulada por factores como o 
IL-3, o IL-5, o GM-CSF, o G-CSF e o M-CSF. A maturação celular associada à leucopoiese envolve o 
desenvolvimento de grânulos citoplasmáticos que conferem diferentes funções aos vários leucócitos. De 
referir que, apesar de os leucócitos serem células nucleadas, estes apresentam cromatina densa, que se 
encontra maioritariamente sob a forma inactiva. 
 
De grosso modo, pode-se dizer que as 
células leucopoiéticas podem 
apresentar dois comportamentos 
distintos. Enquanto as células mais 
primitivas assumem um 
comportamento mitótico, as células 
mais diferenciadas estão associadas a 
um comportamento maturativo. É 
importante referir que mais do dobro 
das células leucopoiéticas apresenta um 
comportamento maturativo. 
Os leucócitos maduros gerados por 
leucopoiese são libertados para a 
corrente sanguínea, sendo que cerca de 
metade destas células se encontra 
encostada à parede das células 
endoteliais, deslocando-se por 
movimentos do tipo amebóide. Assim, 
apenas a restante metade dos 
leucócitos flui livremente no sangue e, 
por isso, os resultados de contagem de 
leucócitos presentes ao nível dos 
hemogramas dizem respeito apenas a 
cerca de metade dos valores totais dos 
leucócitos existentes. 
Neutrófilos 
O facto de uma quantidade substancial de leucócitos (nomeadamente neutrófilos) se encontrar 
adjacente às paredes das células endoteliais não se deve ao acaso. De facto, essa localização permite 
que estas células entrem de imediato em acção, aquando de uma infecção 
A acção dos neutrófilos ocorre quando estas células libertam os seus grânulos. Os grânulos do tipo A 
(também designados de grânulos primários) apresentam proteases, peroxidases, fosfátases, esterases e 
Cytokine Function
GM-CSF
Stimulates proliferation of a common myeloid progenitor and promotes the production of 
neutrophils, eosinophils, and monocytes-macrophages
G-CSF Guides the ultimate development of granulocytes
M-CSF Guides the ultimate development of monocytes-macrophages/dendritic cells
IL-3 Broad effect on multiple lineages
IL-5 Sustains the terminal differentiation of eosinophilic precursors
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lisozimas. Já os grânulos do tipo B (também 
designados por grânulos secundários) contêm 
isozima, lactoferrina (uma enzima que também 
está presente no leite materno e que actua 
“roubando” o ferro às bactérias, impedindo assim 
que estas se dividam), e fixadores da vitamina 
B12 (estes “roubam” a vitamina B12 às bactérias, 
impedindo a sua proliferação). 
Quando o período de vida dos neutrófilos chega 
ao fim, estes têm obrigatoriamente de sofrer 
apoptose. Aquando da apoptose, os grânulos são 
incorporados em vesículas que, por sua vez, são 
fagocitadas por 
macrófagos. De referir 
que os neutrófilos não 
podem sofrer necrose, 
pois a ocorrência deste 
processo levaria a que o 
conteúdo dos grânulos 
fosse libertado para o 
sangue, o que seria 
altamente perigoso, dada 
a quantidade de enzimas 
“destrutivas” presentes 
ao nível desses grânulos. 
Restantes leucócitos 
Os eosinófilos participam no ataque a 
parasitas, intervindo também em reacções 
inflamatórias e alérgicas. A produção desta 
linhagem de células é estimulada pelo factor 
IL-5. Por seu turno, os basófilos partilham 
de algumas funções dos neutrófilos, 
nomeadamente no que concerne a 
intervenção em reacções alérgicas. 
Já os monócitos são células cuja actividade 
depende da sua transformação noutras 
células, nomeadamente, em macrófagos, 
osteoclastos, células mesoteliais e células reticulares dendríticas. 
No que concerne aos linfócitos, existem duas classes, de acordo com o local onde sofrem maturação. Os 
linfócitos T sofrem maturação ao nível do timo, participando na destruição de células estranhas ou 
infectadas por vírus, activando células fagocitárias e regulando a resposta imune. Já os linfócitos B 
sofrem maturação ao nível da medula óssea, tendo por função a produção de anticorpos. 
 
 
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Trombopoiese 
A trombopoiese é o processo associado à formação das plaquetas. As células precursoras da 
trombopoiese designam-se por megacariócitos. Nestascélulas verificam-se divisões nucleares 
sucessivas, sem concomitante formação de células-filhas. Deste modo, os megacariócitos apresentam 
um citoplasma muito grande e quantidade de DNA múltipla da normal. A fragmentação do citoplasma 
dos megacariócitos origina múltiplas plaquetas, enquanto o núcleo destas células gigantes sofre 
fagocitose. 
 
 
A regulação da trombopoiese deve-se a uma 
proteína designada por trombopoietina 
(TPO), que é produzida no fígado e rim, 
sempre na mesma quantidade. 
Subsequentemente a trombopoietina é 
lançada para o sangue, ligando-se às 
plaquetas. Ora, como a quantidade de 
trombopoietina produzida é constante, 
aquando de uma quantidade elevada de 
plaquetas, estas retêm muita trombopoietina 
e a trombopoiese é inibida. Por outro lado, 
aquando de um reduzido número de 
plaquetas, estas retêm uma pequena 
quantidade de trombopoietina e, 
subsequentemente, a trombopoiese é 
estimulada. De referir que a acção da 
trombopoietina é levada a cabo através da 
regulação do número e tamanho dos 
megacariócitos. 
 
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Cinética do ferro 
O ferro é captado nos enterócitos sob a forma de ião ferroso (Fe2+), de tal modo que o ião férrico (Fe3+) 
presente no lúmen do intestino tem de ser convertido em ião ferroso para ser absorvido. Essa 
conversão é catalisada pela redútase do ferro (Dcytb), que se encontra ancorada ao pólo apical dos 
enterócitos. Subsequentemente, o ião ferroso é transportado para o interior dos enterócitos, através do 
transportador DMT1, sendo que, uma vez presente no lúmen dos enterócitos, o ferro é transportado 
até ao pólo basal, ligado à apoferritina. 
Uma vez chegado ao pólo basal, o ião ferroso é expulso através da ferroportina, sendo convertido (no 
meio extracelular) em ião férrico por via da oxídase do ferro (hepfastina). Esta conversão permite que o 
ião férrico seja transportado na corrente sanguínea ligado à transferrina. Ao nível dos tecidos 
periféricos, o complexo ferro-transferrina liga-se ao TfR (receptor da transferrina), sendo endocitado. O 
ferro captado pode ser armazenado nesses tecidos, ligando-se para isso à ferritina e à hemosiderina (as 
reservas de ferro são particularmente proeminentes no fígado). 
 
Metabolismo do ferro e hematopoiese 
Particularizando para o caso dos eritroblastos, o ferro captado é utilizado na biossíntese do heme, sob a 
forma de ião ferroso. De referir que a produção de heme é essencial para que se dê a síntese de 
hemoglobina, uma proteína essencial para o transporte de oxigénio e que se encontra presente nos 
eritrócitos. 
Por outro lado, quando os eritrócitos são fagocitados pelos macrófagos do baço, estes reciclam o ferro 
que se encontrava presente no eritrócitos – parte do ferro é usado e armazenado (ligado à ferritina) nos 
macrófagos, enquanto o restante é enviado para a corrente sanguínea, onde se liga à transferrina (neste 
caso, a oxídase que converte o ião ferroso em ião férrico designa-se por ceruloplasmina). 
 
 
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Regulação dos níveis de ferro 
Uma vez que níveis excessivos de ferro 
não são desejáveis, torna-se necessário a 
presença de um mecanismo regulador do 
metabolismo do ferro. A hepcidina é uma 
proteína que actua aquando de níveis 
muito elevados de ferro, inibindo a 
ferroportina e, como tal, impedindo que o 
ferro seja lançado para o meio extracelular 
(assim uma menor quantidade de ferro 
chega aos tecidos periféricos para 
constituir reservas). 
Por outro lado, baixos níveis séricos de 
ferro promovem a divisão celular dos 
enterócitos que contêm apoferritina. Isto 
permite que os enterócitos que contêm 
apoferritina migrem para a superfície 
luminal do intestino e, 
consequentemente, que se verifique um 
aumento na capacidade de 
armazenamento de ferro por parte das 
células da mucosa intestinal. Ora, isso 
traduz-se num aumento do transporte de 
ferro para a corrente sanguínea (e, 
consequentemente, uma maior 
quantidade de ferro chega aos tecidos 
periféricos para constituir reservas). 
 
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Fisiologia I 
142 
 
Hemóstase primária 
As maquinarias hemostática e fibrinolítica têm por objectivo assegurar a fluidez do sangue, mas 
simultaneamente que este não se extravasa a partir das paredes dos vasos sanguíneos. De facto, o 
sangue encontra-se normalmente no estado líquido, visto que não contacta com superfícies com cargas 
negativas (tais como o colagénio sob as células endoteliais), que activam uma via de coagulação 
intrínseca; nem com os factores tecidulares que activam uma via extrínseca da coagulação. Para além 
disso, as vias trombolíticas mantêm as vias de coagulação reguladas. De facto, o plasma contém 
proteínas que podem ser convertidas em proteases que destroem a fibrina e, como tal, promovem a lise 
dos coágulos sanguíneos. 
A hemóstase é entendida como a prevenção da hemorragia, sendo conseguida através de quatro 
métodos: 
1. Vasoconstrição 
2. Aumento da pressão tecidular 
3. Formação de um trombo plaquetário (aquando de um sangramento capilar) 
4. Coagulação do trombo formado. 
A vasoconstrição contribui para a hemóstase, na medida em que reduz o fluxo sanguíneo ao nível da 
região lesada. A vasoconstrição é promovida, entre outros, pelos subprodutos químicos do agregado 
plaquetário e da coagulação. Por exemplo, a activação plaquetária promove a libertação dos 
vasoconstritores tromboxano A2 e serotonina. Para além disso, a trombina, um dos principais produtos 
da maquinaria de coagulação, promove a libertação de endotelina-1 por parte do endotélio, sendo a 
endotelina-1 o vasoconstritor fisiológico mais poderoso. 
O aumento da pressão tecidular contribui para a hemóstase, na medida em que diminui a pressão 
transmural (ou seja, a diferença entre a pressão intra-vascular e a pressão tecidular), que é a principal 
determinante do raio dos vasos sanguíneos. Uma vez que existe uma relação entre o fluxo e o raio do 
vaso sanguíneo, um incremento na pressão tecidular de x vezes leva a que o fluxo sanguíneo diminua x4 
vezes! 
Plaquetas 
As plaquetas são corpúsculos celulares 
anucleados de forma discóide (devido à 
presença de microtúbulos) e com uma 
duração que varia entre os sete e os dez 
dias. Estes corpúsculos formam trombos 
ao nível do endotélio vascular, de forma 
altamente controlada, através de um 
processo que inclui as etapas de adesão, 
activação e agregação. 
As plaquetas dispõem de um sistema 
canalicular aberto e de um sistema 
tubular denso. O sistema canalicular 
aberto é análogo às cavéolas do 
músculo liso, permitindo a comunicação 
entre o exterior e o interior das plaquetas. Assim, o sistema canalicular é o local a partir de onde as 
plaquetas libertam os seus grânulos, quando são activadas. 
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Fisiologia I 
143 
 
Já o sistema tubular denso das plaquetas tem por função o armazenamento de cálcio, sendo homólogo 
ao retículo sarcoplasmático do músculo liso. O armazenamento de cálcio ao nível do sistema tubular 
denso ocorre por via de uma SERCA, sendo essencial, na medida em que toda a activação da coagulação 
depende da presença deste ião. 
Adesão 
O fenómeno de adesão consiste na ligação das plaquetas ao subendotélio. As plaquetas normalmente 
não aderem entre si, a outras células sanguíneas, ou às membranas endoteliais. Um dos factores 
preventivospara essa adesão envolve, provavelmente, a presença de cargas negativas na superfície, 
quer das plaquetas, quer das células endoteliais (no caso destas últimas, essas cargas negativas devem-
se à presença de proteoglicanos, nomeadamente do sulfato de heparano). Por outro lado, as células 
endoteliais intactas segregam vários factores que impedem a hemóstase, nomeadamente o óxido 
nítrico e prostaciclinas. 
Deste modo, uma lesão endotelial promove a hemóstase, na medida em que a acção inibitória sobre 
este processo deixa de se fazer sentir. Paralelamente, uma ruptura do endotélio permite que passem a 
ser expostos vários factores que se encontram ao nível do subendotélio. Os receptores plaquetários 
podem se ligar a esses factores, o que permite a adesão de plaquetas entre si ou a outros componentes. 
As membranas das plaquetas apresentam várias glicoproteínas, nomeadamente as integrinas, as 
selectinas e as glicoproteínas ricas em leucina. Todavia, os receptores plaquetários em questão são 
glicoproteínas membranares integrais pertencentes à família das integrinas com duas subunidades (α e 
β) e cujo ligando é do tipo RGD. 
Um dos ligandos para esses receptores designa-se por factor de von Willebrand (vWF) e é produzido 
pelas células endoteliais e pelos megacariócitos (encontramos estes factores ao nível dos corpos de 
Weibel-Palade das células endoteliais, assim como nos grânulos α das plaquetas). Lesões endoteliais 
promovem a libertação e exposição do vWF, ao qual se ligam várias glicoproteínas. Outros factores 
subendoteilais que são expostos, aquando de uma brecha no endotélio, incluem o colagénio, que se liga 
ao receptor Ia/IIa, a fibronectina e laminina, que se ligam ao receptor Ic/IIa, e a vitronectina, que se liga 
ao receptor da vitronectina. 
A primeira glicoproteína a ligar-se ao vWF é a 
glicoproteína VI (que também se liga ao 
colagénio), sendo seguida da glicoproteína Ib 
IX/Ib V. Esta última actua associada ao factor VIII 
(que é transportado pelo wWF, que inibe a sua 
degradação) e permite uma adesão forte das 
plaquetas ao subendotélio, algo particularmente 
importante aquando de uma grande tensão de 
parede (por exemplo, aquando da passagem de 
uma grande quantidade de sangue). Apesar da 
ligação estabelecida ser forte, esta não é de 
natureza covalente, sendo do tipo electrostático e 
requerendo pontes de hidrogénio. 
Activação 
A ligação desses ligandos (ou de outros agentes em particular, tais como a trombina) despoleta uma 
alteração conformacional nos receptores plaquetários, de tal modo que é iniciada uma cascata de 
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Fisiologia I 
144 
 
sinalização 
intracelular, algo que 
leva a um evento 
exocítico, o qual é 
designado por reacção 
de libertação, ou por 
activação plaquetária. 
O modo de activação 
do sistema tubular 
denso é similar ao do 
retículo 
sarcoplasmático ao 
nível do músculo liso – 
a acção da fosfolipase 
C, promove a 
formação de IP3, que 
se liga ao seu 
respectivo receptor, o 
que promove a saída 
de cálcio para o citosol (já o DAG formado promove a exposição de glicoproteína IIb/IIIa na superfície 
plaquetária, bem como a activação da secreção de grânulos, por fosforilação da cínase de cadeia leve da 
miosina). De referir que, tanto a fosfolipase C, como a fosfolipase A2, são activadas aquando da ligação 
do colagénio, do vWF, da adrenalina, da vasopressina e da trombina a receptores específicos. Estes 
factores também inibem a produção de cAMP, um factor anti-hemostático. 
O cálcio é essencial para a activação plaquetária, ao activar a cínase das cadeias leves da miosina (via 
calmodulina) e ao activar algumas proteases que se encontram dependentes da sua acção 
(nomeadamente a calpaína I e a calpaína II), sendo assim essencial para que se dê a reorganização do 
citosqueleto plaquetário. Assim, quanto maiores os níveis intracelulares de cálcio, maior a activação 
plaquetária. 
De facto, a activação plaquetária está associada a descaradas alterações citosqueléticas e morfológicas, 
sendo emitido inicialmente um largo lamelipódio, e ulteriormente, vários pseudópodes. Essa formação 
de pseudópodes é conseguida através de uma despolimerização e repolimerização reorganizada dos 
microtúbulos. 
Após ocorrer a emissão de pseudópodes, regista-se uma contracção plaquetária, algo que permite que 
se dê a libertação de grânulos. Essa contracção está dependente da presença de alterações 
conformacionais na actina. De facto, quando a plaqueta se encontra em repouso, esta apresenta actina, 
sobretudo, na forma G (nesse estado, a polimerização da actina encontra-se inibida pela profilina e pela 
gelsotina). Ora, à medida que se dá a activação plaquetária, uma quantidade progressivamente maior 
de actina polimeriza, passando a constituir F-actina, sendo esta última fundamental para que ocorra a 
contracção plaquetária. De referir que, aquando da contracção, verifica-se que os pseudópodes 
emitidos se mantêm ligados ao citosqueleto, algo que se deve ao facto de a actin binding protein se 
ligar à F-actina e à Ib IX/Ib V. 
Aquando da activação plaquetária é também 
importante de referir que, uma série de 
fosfolipídeos com carga negativa passam da face 
interna da membrana (onde estão por norma) 
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Fisiologia I 
145 
 
para a face externa, por movimentos de flip-flop. Este movimento é essencial para a conversão da pró-
trombina em trombina. 
Grânulos plaquetários 
Como já foi referido, quando as 
plaquetas são activas, estas expulsam os 
conteúdos dos seus grânulos. Existem 
vários tipos de grânulos plaquetários 
que podem apresentar conteúdos 
específicos e/ou não-específicos. Os 
grânulos plaquetários podem ser de 
várias categorias, nomeadamente: 
1. Grânulos α – Estes grânulos contêm três factores hemostáticos (que são moléculas não-
específicas), nomeadamente o vWF, o factor V de coagulação e o fibrinogénio (que constitui a 
forma inactiva da fibrina). Para além disso, os grânulos α também contêm moléculas 
específicas, nas quais se destacam o factor de crescimento das plaquetas, a β-trombiglobulina, 
e o factor plaquetário IV (estes dois últimos factores neutralizam a heparina, que é produzida 
ao nível das células endoteliais e tem efeitos anti-coagulantes). 
2. Grânulos densos – Estes grânulos contêm cálcio, ATP, ADP, serotonina e anti-plasmina. O ADP 
é essencial para promover a adesão e a agregação, enquanto a serotonina se revela 
fundamental para a promoção da vasoconstrição e da agregação plaquetária. 
3. Lisossomas 
4. Inclusões lipídicas 
5. Glicogénio - A presença de glicogénio ao nível das plaquetas é essencial, na medida em que 
estas têm capacidade de catabolisar este polímero, de modo a obter glicose. A glicose obtida 
sofre então um processo de glicólise anaeróbia, a partir do qual é possível obter ATP. 
Amplificação 
Moléculas de sinalização libertadas pelas plaquetas activadas, tais como o ADP, prostaglandinas e o 
tromboxano A2, activam plaquetas adicionais, o que amplifica a activação plaquetária. A ocorrência de 
amplificação está muito associada à acção de duas enzimas – a fosfolipase A2 e a ciclo-oxigénase. A 
fosfolipase A2 hidrolisa a fosfatidilcolina e a fosfatidilserina, levando à formação de ácido araquidónico. 
A ciclo-oxigénase promove a subsequente quebra do ácido araquidónico, formando-se tromboxano A2, 
que é libertado e activa, subsequentemente, a fosfolipase C noutras plaquetas. 
 
Em termos clínicos, a aspirina é um inibidor da ciclo-oxigénase, inibindo assim a coagulação, por 
redução da libertaçãode tromboxano A2. Outro agente anti-plaquetário, o clopidogrel, actua por 
inibição dos receptores para o ADP presentes ao nível da superfície plaquetária. 
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Fisiologia I 
146 
 
Agregação 
A agregação é o fenómeno que permite a 
formação de um coágulo plaquetário, 
sendo que a sua ocorrência depende do 
fenómeno de amplificação. 
Tal como referido anteriormente, o vWF 
libertado por parte das plaquetas activas 
liga-se ao receptor Ib IX/Ib V e à medida 
que são activadas mais plaquetas são 
formadas pontes moleculares por entre 
estas. A activação plaquetária também 
induz alterações conformacionais do 
receptor plaquetário IIb/IIIa, ancorando-o 
ao citosqueleto (por via de vinculina e 
talina) e dotando-o da capacidade de se 
ligar ao fibrinogénio. Deste modo, como resultado da alteração conformacional no IIb/IIIa, o 
fibrinogénio que se encontra sempre presente no sangue forma pontes de ligações covalentes por entre 
as plaquetas, participando assim na formação do coágulo plaquetário. De referir que o vWF e a 
fibronectina também são capazes de se ligar a este receptor. 
Regulação da resposta hemostática 
A resposta hemostática é localizada e confinada ao local onde ocorreu a lesão, na medida em que nas 
regiões adjacentes, alguns inibidores impedem a propagação da resposta hemostática. Assim, nas 
vizinhanças da lesão, verifica-se um aumento dos níveis de cAMP, sendo que o cAMP inibe a fosfolipase 
C, a ciclo-oxigénase, a PKC, a formação de ácido araquidónico e a fosforilação da cínase das cadeias 
leves de miosina, e activa a ATPase Mg2+ e Ca2+. Também a presença de heparina, produzida pelas 
células endoteliais das vizinhanças, é essencial para o impedimento do alastramento da activação 
plaquetária. 
Por outro lado, a guanil 
cíclase desempenha um 
papel essencial na 
contenção da hemóstase ao 
local de lesão endotelial. De 
facto, esta enzima promove 
um aumento da síntese de 
óxido nítrico, o que está 
associado a uma maior 
produção de cGMP. Ora, o 
cGMP inibe a degradação 
do cAMP, ao mesmo tempo 
que impede a mobilização 
de cálcio e, como tal, a 
agregação plaquetária. 
 
 
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Fisiologia I 
147 
 
Hemóstase secundária 
Um coágulo sanguíneo é uma massa semi-sólida constituída por plaquetas e fibrina. Por seu turno, um 
trombo também é um coágulo sanguíneo, apesar de este termo ser normalmente reservado para os 
coágulos intravasculares (e, como tal, um coágulo formado no local de uma lesão da pele não é 
designado por trombo). A composição relativa dos trombos varia consoante o local de trombose. Ao 
nível dos trombos da circulação arterial encontramos uma proporção maior de plaquetas, enquanto os 
trombos da circulação venosa apresentam uma maior proporção de fibrina. 
A activação plaquetária e a formação de coágulos são eventos relacionados, mas distintos, que podem 
ocorrer em paralelo, ou na ausência um do outro. De facto, as plaquetas activadas podem libertar 
pequenas quantidades de alguns factores (tais como o cálcio, o factor V, o factor VIII ou a trombina) que 
participam na coagulação sanguínea. Paralelamente, alguns factores de coagulação (nomeadamente a 
trombina e o fibrinogénio) desempenham um papel muito importante na activação plaquetária. Deste 
modo, as interacções moleculares ao nível da maquinaria envolvida na activação plaquetária e formação 
de coágulos plaquetários ajudam à ocorrência de hemóstase coordenada. 
O sistema cardiovascular normalmente mantém um frágil balanço, evitando dois estados extremos e 
patológicos – por um lado, uma coagulação inadequada levaria ao extravasamento de sangue e, 
consequentemente, a hipovolémia. Por outro lado, uma coagulação hiperactiva resultaria em trombose 
e, em última análise, no término do fluxo sanguíneo. O sistema cardiovascular consegue atingir este 
equilíbrio entre um estado anti-trombótico e pró-trombótico a partir de uma série de componentes da 
parede vascular e do sangue. A promoção de um estado anti-trombótico ocorre naturalmente, ao nível 
das células endoteliais normais. Já a promoção de um estado pró-trombótico está associado a danos 
vasculares, nomeadamente à incapacidade das células endoteliais produzirem factores anti-
trombóticos, e à remoção física ou lesão das células endoteliais, o que permite que o sangue passe a 
contactar com factores trombogénicos que se encontram sob o endotélio. Por outro lado, a activação 
das plaquetas por qualquer um dos ligandos que se liga às plaquetas promove também um estado pró-
trombótico. 
De acordo com a visão clássica, podem ocorrer duas sequências distintas ao nível da coagulação – a via 
intrínseca e a via extrínseca. A via intrínseca é aquela que fica activada, quando o sangue entra em 
contacto com uma superfície carregada negativamente, ao nível de um laboratório (esta via é observada 
quando se coloca sangue num tubo de ensaio de vidro). Já a via extrínseca torna-se activa quando o 
sangue entra em contacto com o material das membranas celulares danificadas. Contudo, em ambos os 
casos, o evento precipitante despoleta uma reacção em cadeia que converte os precursores em factores 
activos que, por sua vez, catalisam a conversão de outros precursores em outros factores activos, e 
assim sucessivamente. 
A maior parte desses “precursores” são zimogénios, que originam proteases de serina designadas por 
“factores activos”. Desta forma, a proteólise controlada participa na amplificação de sinais de 
coagulação. Todavia, estas cascatas não ocorrem ao nível da fase fluida do sangue, onde a concentração 
desses factores é baixa. No caso da via intrínseca, a cadeia de reacções ocorre, sobretudo, ao nível das 
membranas das plaquetas, enquanto no que refere à via extrínseca, as reacções ocorrem, sobretudo, ao 
nível de um “factor tecidular” que se encontra ligado às membranas. Ambas as vias convergem numa via 
comum, que culmina na génese de trombina e, em última análise, na sua “estabilização” em fibrina. 
As proteínas da cascata de coagulação apresentam uma estrutura de domínio distinta, o que inclui 
diferenças a vários níveis, nomeadamente: 
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148 
 
1. Domínio do peptídeo de sinal - necessário para a translocação do peptídeo para o retículo 
endoplasmático, onde o peptídeo sinal é clivado. 
2. Domínio do pró-peptídeo (domínio rico em ácido γ-carboxigultâmico) - Necessário para a 
ligação do cálcio 
3. Domínio do factor de crescimento do tipo epidermal - Essencial para a formação de 
complexos proteicos 
4. Domínios kringle – Estrutura em ansa que é criada a partir de várias pontas dissulfureto, sendo 
essencial para a formação de complexos proteicos e para a ligação da protease ao seu alvo. 
5. Domínio catalítico – Confere a função de protease de serina às proteínas de coagulação. 
Via intrínseca 
A via intrínseca consiste 
numa cascata de reacções 
iniciadas por factores que se 
encontram, todos eles, 
presentes ao nível do sangue. 
Quando contacta com uma 
superfície carregada 
negativamente, tal como o 
vidro, ou a membrana de 
uma plaqueta activa, uma 
proteína plasmática 
designada por factor XII 
torna-se activa, originando o 
factor XIIa (o sufixo “-a” 
indica que esta é a forma 
activa do factor respectivo). 
Uma molécula designada por cininogénio de alto peso molecular (HMWK) é produzida pelas plaquetas 
e pode se encontrar ligada à membrana plaquetária, ajudando a ancorar o factor XII à superfície 
carregada negativamente das plaquetas(como tal, o HMWK actua como co-factor do factor XII). 
Todavia, a conversão do factor XII em factor XIIa operada pelo HMWK é limitada em velocidade. Deste 
modo, quando se regista a acumulação de uma pequena quantidade de XIIa (por acção do HMWK), o 
XIIa formado converte a pré-calicreína em calicreína (contudo, a prolilcarboxipeptidase é a enzima mais 
importante para converter a pré-calicreína em calicreína). Por sua vez, a calicreína acelera a conversão 
do factor XII em factor XIIa (mecanismo de feedback positivo), sendo que este é o único processo da 
coagulação para o qual não é necessária a presença de cálcio (embora seja essencial a presença de 
zinco). Por outro lado, a actividade proteolítica das calicreínas nos cininogénios leva à libertação de 
pequenos peptídeos vasodilatadores, designados por cininas. De referir que a conversão de pré-
calicreína em calicreína também pode ocorrer por auto-activação, aquando do contacto desta com o 
colagénio subendotelial ou por via da acção de uma carboxipeptidase endotelial. 
Subsequentemente, o factor XIIa cliva proteoliticamente o factor XI, convertendo-o em factor XIa. Por 
seu turno, o factor XIa activa o factor IX numa protease - o factor IXa. O factor IXa e os dois produtos a 
jusante da cascata (os factores Xa e, mais importante, a trombina) clivam proteoliticamente o factor VIII 
(que, por ser muito instável, circula ligado ao vWF), desligando-o do vWF e activando-o em factor VIIIa, 
que é um co-factor da reacção subsequente. Assim, os factores IXa e VIIIa, juntamente com o cálcio 
(que, tal como o factor Va e a trombina pode ser originado a partir de plaquetas activas) e com 
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fosfolipídeos carregados negativamente, formam um complexo trimolecular, o qual é designado por 
tenase intrínseca. A tenase converte subsequentemente o factor X numa protease – o factor Xa. 
Via extrínseca 
A via extrínseca é uma cascata 
de reacções de proteases, que é 
iniciada por factores que se 
situam fora do sistema vascular. 
As células não-vasculares 
exprimem uma proteína 
integral membranar designada 
por factor tecidular 
(tromboplastina tecidular ou 
factor III), que é um receptor de 
uma proteína plasmática, 
designada por factor VII. 
Quando ocorre uma lesão no 
endotélio, o factor VII entra em contacto com o factor tecidular que, por via não-proteolítica, activa o 
factor VII em factor VIIa (de facto, todos os factores de coagulação são produzidos no fígado sob a 
forma inactiva, excepto uma pequena quantidade de factor VII, que é produzida na forma activa. Essa 
pequena quantidade de factor VIIa é essencial para que mais factor VII seja convertido em factor VIIa). 
Subsequentemente, o factor VIIa, o factor tecidular e o cálcio formam um complexo trimolecular, 
análogo à tenase. Este complexo cliva proteoliticamente os factores X e IX, o que leva à formação de 
factor Xa e IXa, respectivamente. 
É importante salientar que todo o factor Xa livre é inibido pelo TFPI (inibidor do factor tecidular), algo 
que é potenciado pela heparina. Isto faz com que este factor dificilmente consiga actuar junto às 
plaquetas, onde ocorrerá a via comum. Todavia, esta inibição se verifica para o factor IXa e, por isso, o 
factor IXa proveniente da via extrínseca migra para junto das plaquetas, onde activa o factor X, que 
inicia a via comum. Já o factor Xa formado ao nível do endotélio permanece aí, sendo essencial para a 
activação precoce de uma pequena quantidade de plaquetas que se encontram próximas do endotélio. 
Via comum 
Quer o factor Xa provenha da 
via intrínseca, quer este factor 
provenha da via extrínseca, a 
cascata procede ao longo da via 
comum, que tem como primeira 
protease, precisamente, o 
factor Xa. A trombina, um 
produto a jusante destas 
reacções, converte o factor V 
em factor Va (um factor 
altamente homólogo ao factor 
VIIIa). Os factores Xa, Va, 
juntamente com o cálcio e com 
fosfolipídeos, formam outro 
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Fisiologia I 
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complexo trimolecular, o qual é designado por pró-trombinase. A pró-trombinase, como o seu nome 
indica, actua numa proteína plasmática designada por pró-trombina, para formar trombina (factor IIa) e 
fragmentos de pró-trombina 1 e 2. Os fragmentos de pró-trombina são muito estáveis e, como tal, 
muito úteis na avaliação da coagulação, enquanto a trombina é a protease central da cascata de 
coagulação, sendo responsável por três tipos principais de acções: 
1. Activação de componentes a jusante da cascata de coagulação: A acção principal da trombina 
prende-se com a catalisação da proteólise do fibrinogénio, por via da clivagem da cadeia Aα (o 
que permite a libertação de fibrinopeptídeo A) e da clivagem da cadeia Bβ (o que permite a 
libertação de fibrinopeptídeo B). A libertação de fibrinopeptídeos (que, devido ao facto de 
serem muito mais estáveis que a fibrina são úteis para avaliar a coagulação) resulta na 
formação de monómeros de fibrina, que são ainda solúveis. Os monómeros de fibrina, 
compostos por cadeias α, β e γ, polimerizam espontaneamente para formar polímeros de 
fibrina (que aprisionam algumas células sanguíneas). Por outro lado, a trombina também activa 
o factor XIII em factor XIIIa que, por sua vez, medeia a interacção covalente entre as cadeias α 
e γ dos polímeros de fibrina, para formar uma rede de fibrina estável, ainda menos solúvel que 
os polímeros de fibrina (esse incremento da estabilidade prende-se com o facto de se passarem 
a estabelecer ligações covalentes, em substituição das pontes de hidrogénio). 
2. Mecanismo de feedback positivo em vários níveis da cascata a montante: A trombina pode 
catalisar a formação de nova trombina (a partir da pró-trombina), podendo também catalisar a 
formação dos co-factores Va e VIIIa e do factor XIa, entre outros. 
3. Acções parácrinas que influenciam a hemóstase: Em primeiro lugar, a trombina promove a 
libertação, por parte de células endoteliais, de PGI2, ADP, vWF e activador do plasminogénio 
tecidular. Para além disso, a trombina tem a capacidade de activar as plaquetas a partir do 
PAR-1, um receptor acoplado à proteína G activado por uma protease (sendo que as plaquetas 
activadas promovem a via intrínseca, e estão associadas à génese de mais trombina). Desta 
forma, a trombina é um elemento chave da interacção molecular entre a activação plaquetária 
e a coagulação sanguínea, sendo que ambos os processos são necessários para uma óptima 
coagulação. 
 
Comparação entre via intrínseca e via extrínseca 
A divisão entre “via intrínseca” e “via extrínseca” está a ficar deveras ultrapassada, sendo apenas 
utilizada por motivos pedagógicos. De facto, a coagulação opera através de várias interligações entre as 
vias, quer numa direcção a montante, quer numa direcção a jusante. As várias acções desempenhadas 
pela trombina ilustram perfeitamente a afirmação anterior. Porém este não é o único exemplo - o 
complexo trimolecular [factor tecidular + factor VIIa + cálcio] da via extrínseca também activa os 
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Fisiologia I 
151 
 
factores IX e XI da via intrínseca. Por outro lado, os factores IXa e Xa da via intrínseca têm a capacidade 
de activar o factor VII da via extrínseca. 
Contudo, as evidências clínicas mostram que as reacções da via extrínseca são mais importantes, 
comparativamente às da via intrínseca, para a coagulação. Apesar do factor tecidular se encontrar 
normalmente ausente das células intravasculares, a inflamação pode despoletar a expressão de factortecidular, ao nível dos monócitos periféricos e das células endoteliais. Como tal, num quadro de sepsis, o 
factor tecidular produzido pelos monócitos em circulação inicia uma trombose intravascular. 
Defeitos nos factores de coagulação 
A ocorrência de defeitos em factores de 
coagulação está associada a três tipos de 
situações distintas: 
1. Certos defeitos em determinados 
factores são de tal magnitude que 
são incompatíveis com a vida. 
2. Existem defeitos em factores que são 
compatíveis com a vida, mas que 
estão associados a doenças 
hemorrágicas. Defeitos dos factores 
VII, X, V, VIII, IX e trombina levam a 
este tipo de situação (o defeito do 
factor VIII corresponde a um quadro 
de hemofilia A, enquanto o défice de factor IX está associado a hemofilia B). 
3. Defeitos nos factores da via intrínseca não condicionam doença hemorrágica. 
Por outro lado, défices de vitamina K estão associados a defeitos na coagulação (inicialmente de 
natureza trombótica e, depois, de natureza hemorrágica). Isto ocorre porque, após serem sintetizados 
no fígado, alguns factores de coagulação (trombina, VII, IX e X, proteína C e proteína S) sofrem uma γ-
carboxilação em resíduos essenciais para ligação à membrana plaquetária. Essa carboxilação é 
efectuada por uma carboxílase dependente da vitamina K, que se oxida na reacção, sendo convertida à 
sua forma epóxido (e para ser re-utilizada, a vitamina K tem de ser de novo reduzida). Assim, a ausência 
de vitamina K condiciona a ocorrência de coagulação. 
Acção de anti-coagulantes 
As células endoteliais são as principais fontes dos agentes que ajudam a manter a normal fluidez do 
sangue, permitindo a localização da hemóstase à região lesada. Estes agentes são de dois tipos gerais, 
podendo ser factores parácrinos e factores anti-coagulantes. 
Factores parácrinos 
As células endoteliais geram prostaciclina (PGI2), que promove a vasodilatação e, como tal, o fluxo 
sanguíneo. Paralelamente, a prostaciclina também inibe a activação plaquetária e, como tal, a 
coagulação. Para além disso, as células endoteliais também produzem óxido nítrico (devido à 
estimulação pela trombina). De referir que, através do cGMP, o óxido nítrico inibe a adesão e agregação 
plaquetária. 
 
Bernardo Manuel de Sousa Pinto ❖Faculdade de Medicina da Universidade do Porto 
Fisiologia I 
152 
 
Factores anti-coagulantes 
As células endoteliais também geram factores anti-coagulantes, que interferem com a cascata da 
coagulação. Estes factores inibem os factores de coagulação que se encontram fora do endotélio lesado 
ou fora da região das plaquetas activas. Em termos sumários, estes factores incluem: 
1. Inibidor da via do factor 
tecidular (TFPI): O TFPI é 
uma proteína plasmática 
dependente de cálcio e da 
presença de factor Xa, que 
se liga ao complexo 
trimolecular [factor tecidular 
+ factor VIIa + cálcio] da via 
extrínseca, bloqueando a 
actividade de protease do 
factor VIIa. Por outro lado, o 
TFPI inibe o factor Xa que 
flui livremente no plasma. 
2. Anti-trombina III (AT III): A anti-trombina III liga-se ao factor Xa e à trombina, inibindo-os. A 
heparina e o sulfato de heparano são co-factores da ATIII, sendo que a heparina de baixo peso 
molecular expõe o centro activo da trombina à ATIII, potenciando a sua ligação; enquanto a 
heparina de alto peso molecular, também promove esta ligação, ao ligar-se à anti-trombina e 
trombina. O heparano encontra-se presente ao nível da superfície externa da maior parte das 
células, incluindo das células endoteliais. Por outro lado, os mastócitos e os basófilos 
participam na libertação de heparina. É importante referir que a AT III inibe ainda o factor XI e o 
complexo factor VII-tecidular. 
3. Co-factor II da heparina: A sua acção é similar à da ATIII, mas o seu efeito é menos potente. 
4. Trombomodulina: Este glicosaminoglicano produzido nas células endoteliais apresenta a 
capacidade de formar um complexo com a trombina, removendo-a da circulação e inibindo a 
coagulação. Para além disso, a trombomodulina também se liga à proteína C. 
5. C1-inibidor: Principal inibidor da via intrínseca. 
6. Proteína C: Após a proteína C se ligar ao complexo trombina-trombomodulina (nomeadamente 
ao componente da trombomodulina), esta torna-se activa pela trombina. A proteína C activa 
(Ca) é uma protease que, juntamente com a proteína S, inactiva os co-factores Va e VIIIa, 
inibindo, deste modo, a coagulação. Assim, considera-se a proteína Ca como sendo a principal 
inibidora da trombose na microcirculação. 
7. Proteína S: Co-factor da proteína C. 
Por fim, a fagocitose dos factores de coagulação activos, por parte das células de Kuppfer do fígado, 
também mantém a hemóstase sob controlo. 
 
Bernardo Manuel de Sousa Pinto ❖Faculdade de Medicina da Universidade do Porto 
Fisiologia I 
153 
 
Fibrinólise 
A fibrinólise é o processo que permite a quebra da fibrina estável. Este processo inicia-se com a 
conversão do plasminogénio em plasmina (que corta os fragmentos de fibrina), algo que é catalisado 
por um de dois activadores – o activador de plasminogénio tecidular (t-PA) ou o activador do 
plasminogénio do tipo urocínase (u-PA). 
Via intrínseca da fibrinólise 
A via intrínseca da coagulação promove simultaneamente a fibrinólise (constituindo a via intrínseca da 
fibrinólise), nomeadamente devido à acção dos factores XIIa, XIa e calicreína. Apesar da via intrínseca 
da coagulação ter uma ocorrência muito residual, esta adquire particular importância ao nível da 
fibrinólise (mais até que ao nível da coagulação), nomeadamente para gerar uma resposta precoce. 
A calicreína, o factor XIIa e XIa, activam a conversão do plasminogénio em plasmina, enquanto a 
bradicinina promove a libertação pelo endotélio de um activador do sistema extrínseco da fibrinólise, o 
t-PA. Para além disso, a calicreína converte o u-PA de cadeia simples em u-PA de cadeia dupla, sendo 
esta última a única forma activa do u-PA. 
Via extrínseca da fibrinólise 
A libertação do t-PA e do u-PA, que promovem a 
conversão do plasminogénio em plasmina ao nível da 
via extrínseca da fibrinólise, é promovida pela 
bradicinina, pelo stress, pela pressão, pela trombina, 
pela adrenalina, ou por uma diminuição do fluxo 
sanguíneo. 
O t-PA é uma protease de serina produzida pelas 
células endoteliais. Cada cadeia de t-PA contém duas 
kringles ao nível do seu N-terminal e um motivo 
protease no C-terminal. A t-PA é activa quer em 
cadeia simples, quer em cadeia dupla, embora seja mais activa em cadeia dupla. A sua acção prende-se 
com a conversão do plasminogénio em plasmina, sendo que a presença de fibrina acelera amplamente a 
conversão do plasminogénio em plasmina. 
A acção do t-PA envolve um importante fenómeno de amplificação. O t-PA de cadeia simples promove a 
conversão limitada de plasminogénio em plasmina. A pequena quantidade de plasmina formada, por 
sua vez, promove a formação de t-PA de cadeia dupla, que actua promovendo uma maior génese de 
plasmina. 
Já o u-PA é produzido pelas células endoteliais ou pelas células epiteliais renais, tendo apenas acção 
quando se encontra em cadeia dupla. Para isso, o u-PA de cadeia simples tem de sofrer uma clivagem 
proteolítica, por parte do t-PA (algo que é potenciado pela calicreína e plasmina). Tal como o t-PA, o u-
PA converte o plasminogénio em plasmina, contudo, esta acção requer a ancoragem do u-PA a um 
receptor presente na superfície celular, o qual é designado por receptor activador do u-PA (u-PAR). 
Plasminogénio e plasmina 
O plasminogénio é produzido, sobretudo, ao nível do fígado, sendo uma grande glicoproteína de cadeia 
simples, constituída por uma cadeia pesada com

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