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História da África no século xx Introdução Em 1839, os escravos que saíram da atual Serra Leoa estavam sendo levados (ilegalmente) para Cuba, quando se revoltaram e tomaram o navio. A embarcação ficou a deriva por alguns dias, até que foi interceptada pelos ingleses, que faziam o policiamento das águas do Atlântico, para que o tráfico da carne não ocorresse. Como estavam próximos da costa estadunidense, toda a tripulação foi levada para os Estados Unidos, e lá, começou uma implacável batalha jurídica para decidir qual seria o destino daqueles africanos escravizados. A história verídica é muito interessante e vale a pena ser conhecida mais a fundo. Mas, no que diz respeito ao estudo da história da África no século XX, o que ocorreu no La Amistad aponta as principais mudanças que o tráfico sofreu no século XIX e suas consequências. Ao final desta aula, você será capaz de: 1- Analisar as transformações gerais do tráfico de escravos no século XIX; 2- Listar os impactos das transformações nas sociedades africanas; 3- Relacionar as mudanças do tráfico com a visão imperialista da Europa. História da África no século xx -------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------- História da África no século xx Por que, então, não utilizar as populações ameríndias nessa produção? Essa opção não teria sido menos custosa do que o transporte de africanos? Embora milhares de indígenas tenham sido dizimados ou escravizados pelos colonos europeus, tais populações, em tese, estavam protegidas pela Igreja Católica, que depois de calorosos debates durante as três primeiras décadas do século XVI, havia decidido que os índios da América possuíam alma. Consequentemente, não poderiam ser escravizadas. Veja a decisão do Papa Paulo III, em 1537. É importante destacar que, na época, a Igreja Católica era uma das instituições de maior peso político e moral na Europa. “(...) os ditos Índios, e todos os outros povos que daqui em diante vierem a ser conhecidos pelos cristãos, ainda que estejam fora da fé cristã, podem, livre e licitamente, assenhorar-se, usar e gozar da sua liberdade, como também do domínio de todas as suas coisas, e que não devem ser reduzidos à servidão”. Embora a história demonstre que os colonos europeus, inclusive os padres jesuítas, frequentemente, escravizassem índios, havia de fato a crença de que, por terem alma, os índios eram passíveis de salvação, caso fossem catequizados. Já os negros africanos eram vistos como infiéis, e a única forma que eles tinham de salvar-se era passar pelo purgatório em vida. Esse purgatório era a escravidão. História da África no século xx Junto a toda essa discussão religiosa, não podemos ignorar que o tráfico já era um negócio lucrativo para os europeus que estavam envolvidos com ele - uma vez mais, interesses econômicos e religiosos se convergiam na defesa do tráfico de africanos escravizados. -------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------- Primeiras rotas do tráfico transatlântico As primeiras grandes levas de africanos escravizados saíram da região que hoje corresponde aos países de Congo e Angola. A compra massiva de escravos nessa região estava intimamente ligada à conversão do rei do Congo ao catolicismo e à intima relação que este reino passou a ter com os portugueses. Logo em seguida, entre os séculos XVI e XVII, portugueses e outras nações europeias como os franceses, holandeses e ingleses começaram a comprar africanos escravizados da região que ficou conhecida como Costa do Ouro (no atual país de Gana) habitada sociedades acans, fantis e mandingas. A partir do século XVII, mas, sobretudo, no século XVIII, o tráfico atlântico ampliou sua área de atuação para a região do Golfo do Benin, que ficou conhecida como a Costa dos escravos devido ao grande número de africanos que de lá saíram. O reino do Benin se transformou em um grande fornecedor de escravos para os europeus e brasileiros. E, assim, o tráfico de escravos tornou-se uma das atividades mais rentáveis de todo o mundo História da África no século xx As mudanças do Tráfico no século XIX Nas últimas décadas do século XVIII, um ciclo de revoluções alterou o quadro mundial. Nesse período, que ficou conhecido como a “Era das Revoluções”, o Antigo Regime e o Sistema Colonial foram colocados em xeque, ao mesmo tempo em que o Liberalismo se expandia rapidamente. No continente europeu, os ideais de Liberdade, Igualdade e Fraternidade, defendidos na Revolução Francesa, marcaram o fim do Absolutismo e viabilizaram a construção de um novo modelo de sociedade. A escravidão também foi tema de debates políticos em muitas nações europeias, chegando inclusive a ser combatida. Ao mesmo tempo, diversos países europeus começavam a colher os frutos trazidos pela Revolução Industrial, acontecimento que otimizou a produção industrial ao adotar máquinas a vapor na fabricação de bens manufaturados. Produzia-se muito mais em menos tempo. O processo de independência no continente americano Do outro lado do Atlântico, os conceitos descritos acima impulsionaram o processo de independência no continente america A Revolução Norte-Americana (1776) foi o primeiro evento de grandes proporções baseado nos princípios do Iluminismo que rompeu os paradigmas da colonização europeia, embora não tenha abolido a escravidão. Já na região caribenha, os ideais da Revolução francesa foram levados ao extremo, viabilizando o que foi a maior revolução de escravos da história humana: a revolução do Haiti (1790). A partir de então, com exceção do Brasil e de Cuba, as novas nações americanas que se formaram também aboliram a escravidão. Como se pode perceber, as mudanças que acabamos de ver não ficaram restritas à Europa e às Américas. O continente africano também foi afetado pela “Era das Revoluções”. História da África no século xx O continente africano As mudanças econômicas geradas pela Revolução Industrial criaram outras necessidades aos países europeus. Em primeiro lugar, era preciso ampliar o mercado consumidor dos produtos manufaturados produzidos na Europa. Em segundo, para que a produção fosse feita em larga escala era preciso um grande estoque de matéria-prima que, grosso modo, não era encontrado na Europa a custos baixos. Como a grande maioria das colônias americanas já havia declarado sua independência, os países europeus precisavam achar esses produtos primários em outro lugar. E esse lugar era a África. Então, a partir do início do século XIX, os europeus passaram a se interessar pela exploração dos recursos naturais africanos. Mas a Europa não tinha fácil acesso ao continente africano- pelo contrário, suas relações com as sociedades africanas ocorriam principalmente nas feitorias e cidades costeiras, locais onde normalmente eles trocavam produtos manufaturados (como armas e tecidos) por escravos. Primeira porta de entrada dos europeus na África A abolição do tráfico transatlântico de escravos, decretada pela Inglaterra em 1807, viabilizaria a primeira porta de entrada dos europeus na África. Ainda que diversos ingleses envolvidos na luta pelo fim do comércio negreiro e da escravidão de fato acreditassem na importância da liberdade dos africanos, os recém-criados ideais humanitários não foram as únicas razõespara o fim do tráfico. Os europeus, de um modo geral, teriam muito a lucrar com essa iniciativa. Embora algumas regiões da África (como Angola e Moçambique) tenham mantido o comércio até meados do século XIX (Brasil e Cuba continuaram importando grande número de africanos escravizados até a década de 1850), após 1807, a maior parte das sociedades africanas envolvidas no tráfico se viu obrigada a História da África no século xx reestruturar sua economia, para manter as redes internacionais de comércio que haviam construído com nações europeias anos atrás. Mudanças na rede de comércio e suas consequências A partir dos primeiros anos do século XIX, as elites político-econômicas de Achanti (Império da Costa Ocidental africana) que, ao longo do século XVIII estabeleceram sua rede de comércio por meio da venda de ouro e escravos, viram-se obrigadas a produzir gêneros tropicais para sustentar suas negociações com comerciantes da Europa. Se em um primeiro momento, a substituição de escravos por gêneros tropicais parecia não causar danos imediatos, no médio prazo diversas sociedades africanas sofreram crises que as enfraqueceram politicamente. Isso porque a unidade política de muitos Estados africanos envolvidos no tráfico era mantida por meio da relação estabelecida entre os grupos dominantes desses estados (que controlavam o comércio) e os demais grupos subjugados. Fim do tráfico Com o fim do tráfico, boa parte dos grupos africanos dominados viu-se livre não só das taxações, mas também da obrigatoriedade política de fazer parte desses Estados que os controlavam. Isso causou o enfraquecimento e mais tarde a fragmentação política de extensos impérios, como Achanti e Oió. Esse duplo processo de fragmentação e enfraquecimento político das sociedades costeiras da África foi um dos fatores que facilitou a entrada de europeus no interior da África centro-ocidental. Mas não foram as únicas. Paralelamente, regiões islamizadas da África Ocidental atravessavam um processo de mudança, no qual as jihads passaram a ser chefiadas por líderes autóctones, criando novas dinastias e, consequentemente, novos reinos que não tinham uma forte unidade política estabelecida. História da África no século xx Ao norte do continente, a decadência do Império Turco-Otamano também criou uma fragilidade política em diferentes sociedades africanas, fato este que foi bem aproveitada pelos europeus. Na parte sul da África, a instabilidade gerada pelos conflitos entre os zulus e os africânderes também facilitou a entrada de europeus, sobretudo dos ingleses. Os ideais de Liberdade, Igualdade e Fraternidade defendidos na Revolução Francesa que se espalharam pelo Mundo Atlântico geraram o humanitarismo e o abolicionismo, movimentos fundamentais para o fim do tráfico transatlântico.
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