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Faculdade de Direito DOSIMETRIA DAS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE A incidência e o reflexo das circunstâncias do crime nas diversas fases da fixação da pena Edson Massato Ishizawa RA : 455600-4 Turma – 3209C01 Fone: (11) 5011-9459 e-mail: emassato@uol.com.br Orientador: Prof. Edson Luz Knippel São Paulo 2004 Faculdade de Direito DOSIMETRIA DAS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE A incidência e o reflexo das circunstâncias do crime nas diversas fases da fixação da pena EDSON MASSATO ISHIZAWA RA : 455600-4 TURMA – 3209C01 Monografia apresentada ao Curso de Direito da UniFMU como requisito parcial para a obtenção do grau de Bacharel em Direito, sob a orientação do Prof. Edson Luz Knippel São Paulo 2004 Faculdade de Direito Banca Examinadora Prof. orientador:_______________________________ Edson Luz Knippel Prof. argüidor:________________________________ Prof. argüidor:________________________________ Nota:_________(_________) São Paulo 2004 Os nossos mais sinceros agradecimentos ao Prof. Edson Luz Knippel, cuja orientação foi imprescindível para a realização desta pesquisa. SINOPSE As penas restritivas de liberdade, consagradas no Código Penal pátrio, são a detenção e a reclusão, cuja dosimetria é regulamentada pelo art. 68 do referido direito substantivo. São três as fases da fixação da pena. Primeiro se fixa a pena-base, aumentando ou diminuído a pena cominada ao tipo legal, considerando-se a existência das circunstâncias judiciais. Em um segundo momento, sobre a pena-base, incidirão as agravantes e as atenuantes, compondo a pena provisória. Por derradeiro, para a dosimetria da pena definitiva, consideram-se as causas de aumento e diminuição da pena. Pelo princípio jurídico non bis in idem, nenhuma circunstância poderá ser considerada mais de uma vez na dosimetria da pena, sendo que, em caso de múltipla incidência de uma circunstância, deve ser observada a seguinte prioridade: qualificadoras; causas de aumento e diminuição da pena; agravantes e atenuantes; circunstâncias judiciais. Somando-se a esta regra, impõe-se que apenas as causas de aumento e diminuição podem levar a fixação da pena aquém ou além daquela cominada ao tipo legal. SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO, 7 2. DAS PENAS, 9 2.1. Conceito, finalidade e características, 9 2.2. Classificação segundo o Código Penal, 16 2.3. Penas privativas de liberdade e suas espécies, 18 3. DAS CIRCUNSTÂNCIAS DO CRIME, 24 3.1. Conceito, 24 3.2. Diferença entre circunstância e elementar do tipo, 25 3.3. Classificação, 29 3.4. Circunstâncias judiciais, 30 3.4.1. Culpabilidade, 30 3.4.2. Antecedentes, 32 3.4.3. Conduta social, 38 3.4.4. Personalidade do agente, 38 3.4.5. Motivos do crime, 39 3.4.6. Circunstâncias do crime, 39 3.4.7. Conseqüências do crime, 40 3.4.8. Comportamento da vítima, 40 3.5. Circunstâncias legais, 41 3.5.1. Agravantes e atenuantes, 42 3.5.2. Qualificadoras, 45 3.5.3. Causas de aumento e diminuição da pena, 45 4. DA FIXAÇÃO DA PENA, 46 4.1. Fases da fixação da pena privativa de liberdade, 49 4.2. A incidência das circunstâncias e seus reflexos, 51 4.3. Múltipla incidência de uma única circunstância nas diversas fases da fixação da pena, 65 4.4. Concurso de circunstâncias, 66 4.1.1. Concurso de agravantes e atenuantes, 66 4.1.2. Concurso de causas de aumento ou diminuição, 68 5. CONCLUSÃO, 69 6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS, 73 1. INTRODUÇÃO O tema referente à dosimetria das penas restritivas de liberdade é por demais complexo para ser esmiuçado em um curso de graduação de direito em função de sua extensa grade curricular. Por outro lado, trata-se de um assunto de suma importância para aqueles que pretendem militar na área do direto penal, seja na Advocacia, no Magistrado ou no Ministério Público, pois entre estes sempre haverá um interesse público ou privado a ser tutelado. De um lado estará presente o jus puniendi do Estado, do outro, o direito à liberdade do indivíduo, e no centro, a sua composição, ou seja, a justiça. Imprescindível, pois, nos aprofundarmos na questão, motivo o qual nos inspirou a realizar este estudo. Devido à vastidão do assunto, delimitamos-o à incidência e o reflexo das circunstâncias do crime nas diversas fases da fixação das penas privativas de liberdade, com o intuito precípuo de encontrarmos respostas a duas questões formuladas no projeto desta pesquisa, quais sejam: a) A circunstância de um determinado crime pode incidir em mais de uma fase da fixação da pena? b) As circunstâncias do crime podem levar a fixação da pena aquém ou além do limite estabelecido no tipo penal? Para tanto, utilizamos uma metodologia eminentemente bibliográfica, tomando como ponto de partida os artigos 59 a 68 do Código Penal, confrontando-os com o entendimento doutrinário e jurisprudencial pátrio. Outrossim, em nosso estudo, nos detivemos às penas privativas de liberdade constantes no Código Penal em detrimento daquelas preceituadas nas leis extravagantes. Assim sendo, a nossa pesquisa foi dividida, basicamente, em 3 capítulos: No primeiro, discorremos sobre a pena: conceito, princípios, finalidades, características e espécies, segundo o código penal, dando ênfase ao estudo das penas privativas de liberdade. No segundo capítulo, tratamos das circunstâncias do crime: conceito, características e espécies, assim como dos critérios para diferenciá-las das elementares dos tipos penais. Por derradeiro, após nos aprofundarmos no conhecimento dos universos das penas restritivas de liberdade e das circunstâncias do crime, estudamos a intersecção de ambos, ou seja, a sua correlação. É nesse momento, portanto, que pretendemos dirimir as questões suscitadas em relação a incidência e o reflexo das circunstâncias do crime nas diversas fases da fixação das penas privativas de liberdade, objeto desta pesquisa. 2. DAS PENAS 2.1. Conceito, finalidade e característica Pena do grego “poiné” e do latim “poena” quer dizer castigo, punição. Do ponto de vista jurídico, pena é uma punição legal imposta pelo Estado àquele que infringe norma de direito, nos limites da lei. Do conceito acima, extraem-se princípios, alguns explícitos e outros implícitos, sejam quais: a) Punição legal: deve estar prevista em lei existente antes da prática do ato delituoso – princípio da anterioridade, consubstanciado no princípio da legalidade ou da reserva legal, que constitui efetiva limitação do poder punitivo estatal. Subtende-se, ainda, deste princípio que a lei deve emanar do Poder Legislativo, através de procedimento estabelecido em nível constitucional, para a definição dos crimes e cominação das sanções penais, o que afasta não só outras fontes do direito como as regras jurídicas que não são leis em sentido estrito, embora tenham o mesmo efeito, como ocorre, por exemplo, com as medidas provisórias.1 Nesse sentido, preceitua a norma constitucional princípio reiterado pelo nosso Código Penal: “Não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal” (Art. 5o, XXXIX, CF). “Não há crime sem lei anterior que o defina. Não há pena sem prévia cominação legal” (art. 1o, CP). 1 MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de Direito Penal. 19. ed. São Paulo: Atlas, 2003. v.1, p.55. b) Imposta pelo Estado: o “ius puniendi”, ou o direito de punir, é exclusivo do Estado, que deve em contrapartida respeitar os princípios do devido processo legal , do contraditório e da ampla defesa. “ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente” (art. 5o,LIII, CF). “ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal”(art. 5o, LIV, CF). “aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes” (art. 5o, LV, CF). c) Àquele que infringe norma de direito: a pena é pessoal, não podendo ser imputada a outro senão ao próprio agente delituoso, segundo o princípio da pessoalidade. “nenhuma pena passará da pessoa do condenado, podendo a obrigação de reparar o dano e a decretação do perdimento de bens ser, nos termos da lei, estendidas aos sucessores e contra eles executadas, até o limite do valor do patrimônio transferido” (art. 5o, XLV, CF). d) Nos limites da lei: não é qualquer pena a ser imposta, e sim aquela cominada em lei, e dentro dos limites estabelecidos. Tais limites, são norteados explicitamente pelo princípio da legalidade e implicitamente pelos princípios: • Da Intervenção Mínima - ao direito penal cabe somente intervir nos casos de ofensa grave aos bens jurídicos mais importantes, assim considerados pela sociedade, sendo que aos demais casos cominar-se-ão sanções extrapenais. • Da Proporcionalidade – princípio que prescreve que o meio, que é a pena, deve ser proporcional ao fim, que é o de punir o agente pelo delito praticado, ou seja, a intensidade da pena deve ser diretamente proporcional à gravidade do delito, requisito este a ser observado pelo legislador ao estabelecer os limites do desvalor da ação e do desvalor do resultado, face às sanções correspondentes. “a lei regulará a individualização da pena e adotará, entre outras, as seguintes: a) privação ou restrição da liberdade; b) perda de bens; c) multa; d) prestação social alternativa; e) suspensão ou interdição de direitos” (art. 5o, XLVI, CF). • Da Culpabilidade a) Como fundamento da pena: “refere-se ao fato de ser possível ou não a aplicação de uma pena ao autor de um fato típico e antijurídico, isto é, proibido pela lei penal. Para isso, exige-se a presença de uma série de requisitos – capacidade de culpabilidade, consciência da ilicitude e exigibilidade da conduta – que constituem os elementos específicos do conceito dogmático de culpabilidade. A ausência de qualquer desses elementos é suficiente para impedir a aplicação de uma sanção penal”.2 “É isento de pena o agente que, por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado, era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento” (art. 26, CP). b) Como elemento de determinação ou medição da pena: “Nessa acepção a culpabilidade funciona não como fundamento da pena, mas como limite desta, impedindo que a pena seja imposta aquém ou além da medida prevista pela própria idéia de culpabilidade, aliada, é claro, a outros critérios, como importância do bem jurídico, fins preventivos, etc”.3 “O juiz, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e conseqüências do crime, bem como ao comportamento da vítima, estabelecerá, conforme seja necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime” (art. 59, CP). • Princípio da humanidade. - “Esse princípio sustenta que o poder punitivo estatal não pode aplicar sanções que atinjam a dignidade da pessoa humana ou que lesionem a constituição físico-psíquica dos condenados”.4 2 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. v.1, p.14. 3 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. v.1, p.14. 4 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. v.1, p.15. “não haverá penas: a) de morte, salvo em caso de guerra declarada, nos termos do art. 84, XIX; b) de caráter perpétuo; c) de trabalhos forçados; d) de banimento; e) cruéis” (art. 5o, XLVII, CF). Uma outra questão que está implícita no conceito de pena é a sua finalidade. Várias são as teorias a respeito deste assunto, dentre as quais destacamos: I) Teoria Absoluta ou Retributiva Teoria, cujos principais defensores foram Kant e Hegel, que, em linhas gerais, considera a pena como um castigo imposto ao agente por transgredir a lei, com o fim de realizar a justiça, não podendo ser aplicada como um meio para se buscar outro bem, nem em benefício do culpado ou da sociedade. A pena é aplicada só por ter o sujeito delinqüido, em detrimento da ordem ética (Kant) ou da ordem jurídica (Hegel), não havendo qualquer função preventiva ou preocupação com a pessoa do delinqüente, pensamento que ensejou fortes críticas a esta teoria. II) Teorias Relativas ou Preventivas Para esta corrente, a pena não visa retribuir o fato delitivo cometido, e sim prevenir a sua prática. Impõe-se a pena para que o delinqüente não volte a delinqüir, diferentemente das teorias absolutas que impõe a pena ao agente somente porque este delinqüiu. Esta teoria se subdivide ainda em dois grupos distintos: o da Prevenção Geral e o da Prevenção Especial. A teoria da Prevenção Geral, cujos principais precursores foram Bentham, Beccaria, Filangieri, Schopenhauer e Feuerbach, preconiza que o Direito Penal pode dar a solução ao problema da criminalidade através da pena em dois momentos distintos, mas ambos agindo na psique de todos os homens da sociedade, na forma de uma coação psicológica: o primeiro, como objetivo imediato, no instante da cominação da pena, a todos avisando quais são as ações injustas contra as quais se reagirá; o segundo, no momento da aplicação da pena, deixando claro a disposição de cumprir a ameaça, ou seja, a certeza do seu cumprimento. Fundamentada na intimidação, esta teoria leva em consideração a ponderação da racionalidade do homem comum, que se absteria de cometer delitos em face do temor de ser punido, não considerando, porém, um aspecto importante da psicologia do delinqüente, que é a sua confiança em não ser descoberto. Já a teoria da Prevenção Especial, cujo principal defensor foi Von Liszt, assim como na teoria da Prevenção Geral, procura evitar a prática do delito, porém visando exclusivamente o delinqüente, e não todo o grupo social. Tem como objetivo a defesa da ordem social e considera o delinqüente uma ameaça a esta ordem. Assim, visa apenas àquele que já delinqüiu, e o fim da pena é intimidá-lo, corrigi-lo, ou neutralizá-lo, se incorrigível. III) Teorias Mistas, Unificadoras ou Ecléticas Tendo Merkel como precursor, estas teorias tentam agrupar em um conceito único a retribuição, a prevenção geral e prevenção especial, como fins da pena. Por outro lado, estabelecem uma diferença entre fundamentação e fim. “Sustenta-se que a sanção punitiva não deve fundamentar-se em nada que não seja o fato praticado, qual seja, o delito”.5 O fim precípuo do Direito Penal seria a prevenção geral ou especial, enquanto que a retribuição desempenharia uma função limitadora da pena. “Passou-se a entender que a pena, por sua natureza, é retributiva, tem seu aspecto moral, mas sua finalidade é não só a prevenção, mas também um misto de educação e correção”.6 É esta, pois, a teoria adotada pelo direito pátrio. “A pena na reforma de 1984, passou a apresentar natureza mista: é retributiva e preventiva, conforme dispõe o art. 59, caput, do CP”.7 “O juiz, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e conseqüências do crime, bem como ao comportamento da vítima, estabelecerá, conforme seja necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime” Complementando o nosso estudo, mencionamos, ainda, duas outras teorias. A primeira, conhecida como a Teoria da Prevenção Geral Positiva, de Welzel e Jacobs, preconiza que o fundamento do direito penal não é a proteção dos bens jurídicose sim a proteção da norma. A segunda, conhecida como Teoria da Prevenção Geral Limitadora, contrária à primeira, prescreve que a prevenção geral deve expressar-se com sentido limitador do poder punitivo do Estado, tendo como elementos limitadores os princípios da intervenção mínima, da proporcionalidade, da ressocialização e da culpabilidade. 5 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. v.1, p.83. 6 MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de Direito Penal. 19. ed. São Paulo: Atlas, 2003. v.1, p.245. 7 JESUS, Damásio E. de. Direito Penal. 26. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. v.1, p.519. 2.2. Classificação segundo o Código Penal Segundo o art. 32 do Código Penal, as penas podem ser privativas de liberdade, restritivas de direito e de multa. Das penas privativas de liberdade, que são a detenção e a reclusão, falaremos detalhadamente mais adiante. As penas restritivas de direito, relacionadas no art. 43 do Código Penal, são as chamadas penas alternativas ou substitutivas, inseridas no referido estatuto repressivo pela Lei 7.209/84 e ampliadas pela Lei 9.714/98, de caráter geral, seguindo uma tendência mundial de substituir as penas privativas de liberdade por outras, dando primazia à questão da ressocialização do delinqüente. A aplicação de tais penas se dá segundo os critérios do art. 44 do Código Penal e pode ser: a) Prestação pecuniária: Segundo o art. 45, § 1o, CP, “a prestação pecuniária consiste no pagamento em dinheiro à vítima, a seus dependentes ou a entidade pública ou privada com destinação social, de importância fixada pelo juiz, não inferior a 1 (um) salário mínimo nem superior a 360 (trezentos e sessenta) salários mínimos. O valor pago será deduzido do montante de eventual condenação em ação de reparação civil, se coincidentes os beneficiários”. b) Perda de bens e valores: Autorizada também pelo art. 5o, XLVI, b, da CF, e regulamentada pelo art. 45, § 3o, do CP, consiste em um confisco em favor do Fundo Penitenciário Nacional, cujo valor máximo será o montante do prejuízo causado, ou do provento obtido pelo agente ou terceiro, em conseqüência do crime, o que for maior. c) Prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas: A Constituição Federal, em seu art. 5o, XLVI, d, prevê tal pena. Conforme o art. 46, e seus parágrafos, a pena consiste na atribuição de tarefas gratuitas ao condenado em entidades assistenciais, hospitais escolas, orfanatos e outros estabelecimentos congêneres, em programas comunitários ou estatais, conforme as aptidões do condenado, devendo ser cumpridas à razão de uma hora de tarefa por dia de condenação, aplicável às condenações superiores a seis meses de privação da liberdade, observados os critérios do art. 44 do mesmo estatuto. d) Interdição temporária de direitos: De acordo com o art. 47 do CP, que foi recepcionado pelo art. 5o, XLVI, e, da CF, as penas podem ser: I – proibição do exercício de cargo, função ou atividade pública, bem como de mandato eletivo; II - proibição do exercício de profissão, atividade ou ofício que dependam de habilitação especial, de licença ou autorização do poder público; III - suspensão de autorização ou de habilitação para dirigir veículo. IV – proibição de freqüentar determinados lugares. e) Limitação de fim de semana: Conforme preconiza o art. 48 do CP, consiste na obrigação imposta ao condenado de permanecer, aos sábados e domingos, por cinco horas diárias, em casa de albergado ou outro estabelecimento adequado. A pena de multa, prevista no art. 5o, XLVI, c, CF, pode ser comum, ou seja, abstratamente prevista em cada tipo penal, ou substitutiva da pena privativa de liberdade, nos termos dos artigos 58, parágrafo único e 44, § 2o , do CP. Conforme o art. 49 do CP, consiste no pagamento ao fundo penitenciário de quantia fixada na sentença e calculada em dias multa, de no mínimo dez e no máximo, de trezentos e sessenta, sendo que o valor do dia-multa será fixado pelo juiz não podendo ser inferior a um trigésimo do maior salário mínimo mensal vigente ao tempo do fato, nem superior a cinco vezes esse salário. 2.3. Penas privativas de liberdade e suas espécies Com fundamento no art. 5o, XLVI, a, da CF, o Código Penal, em seu art. 33, menciona duas espécies de penas privativas de liberdade: reclusão e detenção. Ademais, além dessas duas espécies, a Lei das Contravenções Penais introduziu, ainda, a prisão simples, a qual apenas citamos, pois o nosso foco volta-se, exclusivamente, para o conteúdo do Código Penal. É oportuno, no entanto, antes de estudarmos estas espécies de pena, traçarmos linhas gerais a respeito dos sistemas penitenciários e dos regimes penais. São três os sistemas penitenciários conhecidos quanto à execução das penas privativas de liberdade: o sistema de Filadélfia, também conhecido como sistema Pensilvânico ou Celular, o sistema de Auburn e o sistema Progressivo. O sistema Celular, que teve sua origem na cidade de Filadélfia, Estado da Pensilvânia, EUA, por volta do ano de 1776, caracterizava-se, precipuamente, pelo isolamento absoluto do condenado, sem direito a trabalho ou visitas. Já o sistema de Alburn, que herdou o nome da cidade norte-americana do Estado de Nova Iorque, onde se originou em 1818, tinha como características principais o isolamento noturno, o trabalho dos presos e a exigência de absoluto silêncio entre os condenados. O sistema Progressivo, criado pelos ingleses e posteriormente aperfeiçoado pelos irlandeses, no qual inspirou-se o sistema penitenciário brasileiro, divide a condenação em quatro períodos: “o primeiro é de recolhimento celular contínuo; o segundo é de isolamento noturno, com trabalho e ensino durante o dia; o terceiro é de semiliberdade, em que o condenado trabalha fora do presídio e recolhe-se à noite; e o quarto é o livramento condicional.”.8 Quanto aos regimes penais, são três as espécies adotadas pelo nosso Código Penal, nos termos do art. 33, § 1o, alíneas “a”, “b” e “c”: a) Regime fechado: Execução da pena em estabelecimento de segurança máxima ou média – penitenciária, cujas regras estão dispostas no art. 34 e parágrafos, do CP; b) Regime semi-aberto: Execução da pena em colônia agrícola, industrial ou estabelecimento similar; regulamentada nos art. 35 e parágrafos, do CP; c) regime aberto: Em regra: execução da pena em casa de albergado ou estabelecimento adequado, tendo suas regras dispostas no art. 36 e parágrafos, do CP. Excepcionalmente: conforme os requisitos aduzidos pelo art. 117 da Lei 8 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. v.1, p. 250; Cf. PINHO, Rodrigo César Rebello. Apreciação crítica do anteprojeto de lei modificativa da parte geral do código penal de 1940 no tocante às penas privativas de liberdade. Justitia 117/126. 7.210/84 – Lei de execução Penal (LEP), poderá no regime aberto ser a pena cumprida em residência particular, forma conhecida como Prisão Domiciliar. A LEP estabelece as condições básicas de cada um dos referidos estabelecimentos para o cumprimento da pena: penitenciária - arts. 87 a 90; colônia agrícola, industrial ou similar - arts. 91 a 92; casa do albergado - arts. 93 a 95. Além disso, prescreve nos arts. 110 a 119 as regras do sistema progressivo. Ressalte-se que no sistema penitenciário brasileiro, quando se diz progressivo, referimo-nos a um conceito amplo de progressão, que é o gênero, do qual fazem parte as espécies progressão e regressão, isto é, uma vez estabelecido o regime inicial pelo juiz da condenação, o condenado poderá tanto progredir para um regime mais ameno ou regredir para um regime mais rigoroso, se houver, conforme determinação do juiz da execução, nos termos estabelecidas na LEP. Em face de tal situação, iniciada a fase de execução,não existe diferença entre detenção e reclusão no que se refere ao regime sob qual a pena poderá ser cumprida até o seu termo. Não se pode, no entanto, alegar que não existam diferenças entre detenção e reclusão. São várias as diferenças, e, a título exemplificativo, citamos9 : a) Somente os crimes mais graves são punidos com a pena de reclusão, enquanto que à detenção relacionam-se os delitos de menor gravidade; b) A pena de detenção inicia-se, na pior das hipóteses, no regime semi- aberto, ao passo que a reclusão pode iniciar-se no regime fechado; 9 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. v.1, p. 421. c) É permitido à autoridade policial conceder fiança somente nos casos de delitos punidos com detenção, enquanto que naqueles em que são cominadas penas de reclusão a fiança deverá ser requerida ao juiz; d) Nos crimes punidos com reclusão, a medida de segurança será sempre detentiva, ao passo que, naqueles punidos com detenção a medida de segurança poderá ser convertida em tratamento ambulatorial (art. 97 do CP) ; e) Somente os crimes punidos com reclusão, praticados pelos pais, tutores ou curadores contra os respectivos filhos, tutelados ou curatelados, geram a incapacidade para o exercício do pátrio-poder, tutela ou curatela, respectivamente. Como já dito acima, a execução da pena de detenção inicia-se, no pior dos casos, em regime semi-aberto. Tal afirmação deduz-se da segunda parte do caput do art. 33 do CP que prescreve: “A pena de reclusão deve ser cumprida em regime fechado, semi-aberto ou aberto. A de detenção, em regime semi-aberto, ou aberto, salvo necessidade de transferência a regime fechado”. Conclui-se, então, que as possibilidades de cumprimento da pena de detenção são o regime semi-aberto e o aberto, salvo necessidade de transferência para o regime fechado, no caso de uma regressão. Já no caso da reclusão, o rol é mais amplo, incluindo além da possibilidade de cumprimento da pena em regime semi-aberto e aberto, o regime fechado. As regras que determinam o regime inicial a ser cumprido nas penas privativas de liberdade estão contidas nos parágrafos 2o e 3o do art. 33, combinados com o seu caput: “§ 2º - As penas privativas de liberdade deverão ser executadas em forma progressiva, segundo o mérito do condenado, observados os seguintes critérios e ressalvadas as hipóteses de transferência a regime mais rigoroso: a) o condenado a pena superior a 8 (oito) anos deverá começar a cumpri-la em regime fechado; b) o condenado não reincidente, cuja pena seja superior a 4 (quatro) anos e não exceda a 8 (oito), poderá, desde o princípio, cumpri-la em regime semi-aberto; c) o condenado não reincidente, cuja pena seja igual ou inferior a 4 (quatro) anos, poderá, desde o início, cumpri-la em regime aberto”. “§ 3º - A determinação do regime inicial de cumprimento da pena far-se-á com observância dos critérios previstos no art. 59 deste Código”. Do exposto acima podemos concluir o que se segue: I) Para pena de reclusão: a) O condenado, reincidente ou não, cuja pena seja superior a 8 anos deverá começar a cumpri-la em regime fechado; b) O condenado não reincidente, cuja pena seja superior a 4 anos e não exceda 8 anos, começará a cumpri-la em regime fechado ou semi-aberto, segundo determinação do juiz da condenação, observados os critérios do art. 59 do CP; c) O condenado reincidente, cuja pena seja superior a 4 anos e não exceda 8 anos, deverá começar a cumpri-la em regime fechado; d) O condenado não reincidente, cuja pena não exceda 4 anos, começará a cumpri-la em regime fechado, semi-aberto ou aberto, segundo determinação do juiz da condenação, observados os critérios do art. 59 do CP; e) O condenado reincidente, cuja pena não exceda 4 anos, começará a cumpri-la em regime fechado ou semi-aberto, segundo determinação do juiz da condenação, observados os critérios do art. 59 do CP. II) Para pena de detenção a) O condenado não reincidente, cuja pena não exceda 4 anos, começará a cumpri-la em regime semi-aberto ou aberto, segundo determinação do juiz da condenação, observados os critérios do art. 59 do CP; b) O condenado não reincidente, cuja pena seja superior a quatro anos, ou reincidente, independentemente da quantidade da pena, deverá começar a cumpri-la em regime semi-aberto. Existem ainda exceções às regras enumeradas acima: “Por expressa disposição da Lei no 8.072 de 25-7-90, a pena será integralmente cumprida em regime fechado quando se tratar de tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, de terrorismo e dos crimes definidos como hediondos, consumados ou tentados, ainda que aplicada pena inferior a oito anos (art. 2o, § 1o). Também o art. 10 da Lei no 9.034, de 3-5-95, que prevê os crimes praticados por organização criminosa, estabelece o regime inicial fechado, qualquer que seja a quantidade da pena aplicada e independentemente de ser ou não o condenado reincidente”.10 3. DAS CIRCUNSTÂNCIAS DO CRIME 3.1. Conceito “Circunstância: situação, estado ou condição de coisa(s) ou pessoa(s) em determinado momento; particularidade, acidente que acompanha um fato, uma situação; caso, condição; causa, motivo”.11 “Circunstância deriva de circum stare, “estar em redor”. Tratando-se de crime, circunstância é todo fato ou dado que se encontra em redor do delito. É um dado eventual, que pode existir ou não, sem que o crime seja excluído”.12 “Circunstâncias do crime são aqueles elementos meramente acessórios, que não integram o crime, mas influem sobre sua gravidade, deixando inalterada sua essência”.13 10 MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de Direito Penal. 19. ed. São Paulo: Atlas, 2003. v.1, p. 256. 11 FEREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Aurélio Século XXI: o dicionário da língua portuguesa. 3. ed., Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1999. p. 478. 12 JESUS, Damásio E. de. Direito Penal. 26. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. v.1, p.551. 13 COSTA JÚNIOR, Paulo José da. Direito Penal: curso completo. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2000. p. 164. Somando-se os conceitos acima, poderíamos afirmar que circunstância do crime é tudo aquilo que o circunda, manifestando-se por uma situação, estado ou condição de coisa ou pessoa, por uma particularidade, um acidente que o acompanha, por um caso, uma condição, causa ou motivo. Podemos extrair, também, a sua característica principal, que é a acessoriedade. A circunstância, então, é acessória, depende do delito para a sua existência na esfera penal. O crime, por sua vez, subsiste mesmo quando as suas circunstâncias não forem determinadas. 3.2. Diferença entre circunstância e elementar do tipo Consideração importante a se fazer, é a diferença entre circunstância de um fato e circunstância de um crime. Todo crime é um fato, mas nem todo fato é um crime. Conclui-se, então, que podemos ter circunstâncias de um fato tido como criminoso, não sendo porém circunstâncias do crime, pois estão contidas neste, e não circundando-o, como conceituado acima. Deste pensamento subtende-se que não são circunstâncias do crime os seus requisitos, quais sejam: o fato típico e a antijuridicidade. O fato em si, a sua tipicidade e a sua antijuridicidade não são circunstâncias do delito, mas ele próprio. Tanto é que se excluirmos qualquer um destes elementos, o crime, em si, se esvai. Logo, os elementos do tipo e a antijuridicidade não são circunstâncias do crime. A comprovação de parte desta afirmação, relativa a antijuridicidade, pode ser observada no art. 23 do Código Penal: “Não há crime quando o agente pratica o fato: I - em estado de necessidade; II - em legítima defesa; III - em estrito cumprimento de dever legal ou no exercício regular de direito”. Quanto aos elementos do tipo, extraímos os fundamentosda doutrina, que para diferenciá-los de uma simples circunstância do crime, os exclui, isolada e hipoteticamente. Se desta operação resultar a atipicidade total ou surgir um outro crime, estar-se-á diante de uma elementar. Caso contrário, ou seja, subsistindo o crime, tratar-se-á de uma circunstância.14 Tomemos como exemplos, dois casos distintos do nosso Código Penal: Homicídio simples Art. 121 - Matar alguém: Pena - reclusão, de 6 (seis) a 20 (vinte) anos. Caso de diminuição de pena § 1º - Se o agente comete o crime impelido por motivo de relevante valor social ou moral, ou sob o domínio de violenta emoção, logo em seguida a injusta provocação da vítima, o juiz pode reduzir a pena de um sexto a um terço. Se excluirmos qualquer um dos elementos do § 1o, o crime de homicídio simples subsiste, não surgindo nenhum outro em seu lugar. São estas, então, simples circunstâncias do crime. Infanticídio 14 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. v.1, p.552; JESUS, Damásio E. de. Direito Penal. 26. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. v.1, p.552. Art. 123 - Matar, sob a influência do estado puerperal, o próprio filho, durante o parto ou logo após: Pena - detenção, de 2 (dois) a 6 (seis) anos. No infanticídio, porém, diferentemente do caso anterior, excluindo-se, por exemplo, a circunstância do estado puerperal, este crime desaparece, surgindo outro em seu lugar: o homicídio. Estamos diante, então, de uma elementar do tipo. Existe, porém, controvérsia na doutrina em relação às chamadas “qualificadoras”, como por exemplo, o homicídio qualificado (art. 121, §2o, CP). Damásio E. de Jesus e Julio Fabrini Mirabete, consideram-nas como sendo circunstâncias do crime.15 Cezar Roberto Bitencourt, opostamente, exclui as qualificadoras deste rol, fundamentando-se no seguinte pensamento: “Cumpre destacar, porém, que somente os tipos básicos contêm as elementares do crime, porquanto os chamados tipos derivados – qualificados – contêm circunstâncias especiais que, embora constituindo elementos específicos dessas figuras derivadas, não são elementares do crime básico, cuja existência ou inexistência não alteram a definição deste. Assim, as qualificadoras, como dados acidentais, servem apenas para definir a classificação do crime derivado, estabelecendo novos limites mínimo e máximo, cominados ao novo tipo. Concluindo, as elementares são componentes do tipo penal, enquanto as circunstâncias são molduras da aplicação da pena, e são acidentais, isto é, podem ou não existir na configuração da conduta típica. As circunstâncias, que não constituem e nem qualificam o crime, são conhecidas na doutrina como circunstâncias judiciais, circunstâncias legais e causas de aumento e de diminuição da pena” (grifo nosso).16 Compartilhamos do pensamento acima, pois entendemos que as qualificadoras são apenas fruto da intenção do legislador em organizar os tipos 15 JESUS, Damásio E. de. Direito Penal. 26. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. v.1, p.555; MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de Direito Penal. 19. ed. São Paulo: Atlas, 2003. v.1, p.292. penais, não deixando, porém, por este motivo, de serem crimes distintos e autônomos. O infanticídio, por exemplo, não deixa de ser uma espécie de homicídio, diferenciando-se deste apenas pela presença de circunstâncias específicas. Tais circunstâncias, no entanto, poderiam ter ensejado uma forma qualificada de homicídio. Assim como no infanticídio, o homicídio qualificado comina pena distinta do homicídio simples. Outrossim, se excluirmos as circunstâncias específicas do homicídio qualificado, este desaparecerá, surgindo um outro crime em seu lugar: o homicídio simples. Que diferença há, então, entre uma forma e outra, além da distinção dada ao infanticídio que foi erigido em artigo apartado do homicídio? Não é, no entanto, objeto deste estudo aprofundarmos nesta questão, tão pouco defender uma tese a seu respeito, e, considerando-se que grande parte da doutrina considera as qualificadoras como sendo circunstâncias do crime, assim também consideraremos. Exceção ao método da exclusão para diferenciar uma elementar do tipo e uma circunstância ocorre com a tentativa (art. 14, CP). Considerada como uma circunstância legal genérica de diminuição de pena, é, na realidade, uma elementar genérica complementar a vários outros tipos penais. Se excluirmos as circunstâncias descritas na tentativa, utilizando-se do aludido método, o crime deixará de existir. Se o crime não é consumado, ele só pode ser tentado, ou não constituirá nenhum delito. Trata-se de uma adequação típica de subordinação mediata, por extensão ou ampliada, quando o fato não se enquadra imediatamente na norma penal incriminadora, necessitando para isso do concurso de outra disposição, havendo, no caso da tentativa, uma ampliação temporal da figura típica, uma vez que, com o concurso da outra disposição, o tipo não abrange somente o momento consumativo 16 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. v.1, p.552. do crime, estendendo-se, também, ao instante anterior em que a conduta se dirigia à completa realização do modelo legal.17 17 JESUS, Damásio E. de. Direito Penal. 26. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. v.1, p.270. 3.3. Classificação Conforme relacionam-se ou não ao agente do crime, as circunstâncias classificam-se em objetivas ou subjetivas, respectivamente. As primeiras dizem respeito a materialidade do delito como, os modos, os meios e o objeto empregados, o tempo, o lugar e a qualidade da vítima. As últimas relacionam-se especificamente ao o agente do crime, suas qualidades pessoais, os motivos que o levaram a praticar a infração penal, etc. Outra classificação, para nós a mais importante, pois, como veremos mais adiante, determina o momento em que as circunstâncias são consideradas no cálculo da pena, é aquela em que a doutrina subdivide-as em judiciais e legais. As circunstâncias judiciais são aquelas descritas no art. 59, caput, do Código Penal, e assim são denominadas por serem reconhecidas e admitidas pelo poder discricionário que a lei confere ao juiz. “O juiz possui, no processo individualizador da pena, uma larga margem de discricionariedade, mas não se trata de discricionariedade livre e, sim, como anota Jescheck (Tratado de Derecho Penal, vol. II/1191, 1981), de discricionariedade juridicamente vinculada, posto que está preso às finalidades da pena e aos fatores determinantes do quantum punitivo”.18 Por outro lado, as circunstâncias legais são especificamente taxadas pelo Código Penal, independem da discricionariedade do juiz para o seu reconhecimento, e, conforme são descritas na parte geral ou na parte especial, são conhecidas como circunstâncias legais genéricas ou específicas, respectivamente. 18 FRANCO, Alberto Silva. et al. Código Penal e sua interpretação jurisprudencial. 6. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997. v.1, p.876. 3.4. Circunstâncias judiciais Conforme dissemos, anteriormente, as circunstâncias judiciais são aquelas reconhecidas ou não pelo juiz, segundo sua avaliação, dentre aquelas descritas no caput do art. 59 do Código Penal: “O juiz, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e conseqüências do crime, bem como ao comportamento da vítima, estabelecerá, conforme seja necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime:” Observe-se que a disposição acima tem caráter amplo e genérico, devendo, no entanto, como veremoscom mais detalhes ao tratarmos sobre a fixação da pena, serem excluídas deste rol, aquelas que figurarem entre as circunstancias legais. A seguir, passaremos, então, a descrever cada uma das circunstâncias judiciais. 3.4.1. Culpabilidade Culpabilidade é o grau de censurabilidade da conduta do agente. Ressalte-se, no entanto, que a culpabilidade a que se refere o art. 59, do CP, não é aquela que funciona como pressuposto de imposição da pena, analisada juntamente com a tipicidade e a antijuridicidade no momento em que se decide pela condenação. Aqui ela atua como elemento balizador do quantum da pena.19 Por outro lado, polêmica é a questão da abrangência do termo “culpabilidade”. A Lei 7.209/84, que reformou a parte geral do Código Penal de 1940, substituiu as expressões “intensidade do dolo” e “grau de culpa”, antes usadas, pela “culpabilidade”, sob a justificativa de que “graduável é a censura, cujo índice, maior ou menor, incide na quantidade da pena”. Adotou-se, assim, a 19 BITENCOURT,Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. v.1, p.553. teoria finalista, excluindo-se da culpabilidade o dolo e a culpa, que passaram a fazer parte do tipo penal, restando, ainda, como seus elementos a imputabilidade, a potencial consciência da ilicitude e a exigibilidade de conduta diversa. Grande parte da doutrina, porém, entende que, apesar da modificação inserida pela Lei 7.209/84, o dolo deve ser considerado para avaliar o grau de censurabilidade.20 Nesse sentido, manifestou-se o STJ: “-...Não há negar a vocação finalista da nova redação do dispositivo que trata da fixação da pena no art. 59, do CP. A própria Exposição de Motivos é clara, ao afirmar “-...Preferiu o Projeto a expressão “culpabilidade” em lugar de intensidade do dolo ou grau de culpa”, visto que graduável é a censura, cujo índice, maior ou menor, incide na quantidade da pena”. Ainda que se aceite, como ensina a teoria finalista, que o dolo faz parte da ação humana, que está localizada no tipo, e não no juízo de culpabilidade (Welzel), ainda assim ele não fica excluído do exame para a fixação da pena-base. Evidente que se a sanção ao crime deve ser aplicada entre os extremos da pena in abstrato, o dolo não pode ser extraído do art. 59 competindo ao juiz, a análise da sua maior ou menor intensidade. No particular, a própria Exposição de Motivos é explícita, ao dizer: Preferiu o projeto a expressão culpabilidade...”visto que é graduável a censura, cujo índice, maior ou menor, incide na quantidade da pena”. Então, pergunta- se, que é a censura, senão a reprovabilidade da conduta da ação ilícita típica? E a imputabilidade não é um dos elementos da culpabilidade? E nela não se exige que o indivíduo proceda de acordo com suas condições psíquicas, exatamente de onde se extraem a periculosidade 20 BITENCOURT,Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. v.1, p.554; FRANCO, Alberto Silva. et al. Código Penal e sua interpretação jurisprudencial. 6. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997. v.1, p.883; CARVALHO NETO, Inácio de. Aplicação da pena. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2003. p.34. e a maior ou menor intensidade do dolo? Se as respostas são afirmativas, na visão finalista do tipo penal, nele se incluem, desenganadamente, o dolo e a negligência. É a melhor doutrina (...)” (STJ – RE – Rel. José Cândido – RSTJ 17/472).21 Outrossim, nos ensina Salo de Carvalho que a culpabilidade de que tratamos é de ato e não de autor. Diz respeito à reprovação do ato e não da personalidade do sujeito, do julgamento ético a seu respeito, da culpabilidade de caráter ou a sua periculosidade.22 Nesse sentido, Inácio de Carvalho Neto manifesta-se: “A culpabilidade não se confunde com a periculosidade. Esta é requisito para a aplicação da medida de segurança, enquanto que a imposição de pena depende da culpabilidade”.23 3.4.2. Antecedentes “Antecedentes são todos os fatos da vida pregressa do agente, sejam bons ou maus”.24 Clássico é o conceito acima na doutrina, porém, após realizarmos estudos a respeito do assunto, arriscamos formular o seguinte conceito: Antecedentes são precedentes judiciais do agente, relevantes, bons ou maus, anteriores à época dos fatos delituosos que geraram a sua condenação. 21 FRANCO, Alberto Silva. et al. Código Penal e sua interpretação jurisprudencial. 6. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997. v.1, p.883. 22 CARVALHO, Amilton Bueno de; CARVALHO, Salo de. Aplicação da Pena e Garantismo. Rio de Janeiro: Lumen Júris, 2001. p.39. 23 CARVALHO NETO, Inácio de. Aplicação da pena. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2003. p.35. 24 JESUS, Damásio E. de. Direito Penal. 26. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. v.1, p.556. O conceito acima, expressa o nosso posicionamento a respeito das controvérsias existentes na doutrina em relação à sua amplitude, e a ele chegamos formulando questões a partir do conceito clássico, sejam quais: a) Incluem-se nos antecedentes quaisquer fatos da vida pregressa do agente? Não. Consideram-se, tão somente, os precedentes judiciais, chamados também de “antecedentes criminais”, ou sejam, os fatos que estão sob a jurisdição do poder judiciário, desde que relevantes e anteriores ao crime sobre o qual irá incidir a pena. Excluem-se, portanto, aqueles de caráter social, relacionados ao agente, que são abrangidos pela “conduta social”, outra circunstância também elencada no at. 59, do CP. Nesse sentido, extraímos ensinamento da doutrina: “O juiz deverá levar em conta, ao individualizar a pena, os antecedentes do agente, isto é, tudo aquilo que existiu ou lhe aconteceu antes da prática do fato criminoso. Em resumo, o seu comportamento anterior. O estudo dos episódios da vida anteacta do agente sofreu, contudo, restrição em face da introdução no art. 59 da PG/84, do conceito de “conduta social”, como um fator independente de posição da pena. Destarte, o conceito de antecedentes veio a ter um relativo esvaziamento, destinando-se agora não mais a expressar um quadro referencial abrangente (comportamento social, inclinação ao trabalho, relacionamento familiar etc. do agente), mas apenas um quadro menor referente à existência ou não, no momento da consumação do fato delituoso, de precedentes judiciais”.25 Questão polêmica é o confronto dos antecedentes criminais com o princípio da presunção do estado de inocência, contido no art. 5o, LVII, da Constituição Federal: “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória” Para parte da doutrina e da jurisprudência, incluem-se no rol dos maus antecedentes, por exemplo, os inquéritos instaurados ou arquivados, os processos criminais em andamento, as absolvições penais por falta de provas, as prescrições abstratas, retroativas e intercorrentes, as condenações ainda não transitadas em julgado e os processos paralisados por superveniência da extinção da punibilidade, sem que haja, contudo ofensa ao aludido princípio. Nesse sentido, Damásio E. de Jesus26, Inácio de Carvalho Neto27 e Gilberto Ferreira28. Também, nesse sentido, manifestou-se o STF: “Não tem razão o paciente quando alega que, à guisa de maus antecedentes, foram levados em conta inquéritos policiais. A jurisprudência do STF tem entendimento no sentido de que ‘a presunção de inocência não impede que a existência de inquérito policial e de condenação criminal que não possa ser considerada para a caracterização da reincidência não possa ser levada em 25 FRANCO, Alberto Silva. et al. Código Penal e sua interpretação jurisprudencial. 6. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997. v.1, p.884. 26 JESUS, Damásio E. de. Direito Penal. 26.ed. São Paulo: Saraiva, 2003. v.1, p.556. 27 CARVALHO NETO, Inácio de. Aplicação da pena. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2003. p.44. 28 CARVALHO NETO, Inácio de. Aplicação da pena. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2003. p.44; Cf. FERREIRA, Gilberto. Op. Cit., pp. 84-85. conta de maus antecedentes’ (HC 74.967, Rel. Min. Moreira Alves, DJU 30/05/97)” (STF – HC 77.049/4-RS – Rel. Min. Ilmar Galvão – j. em 09.06.98 – LBJ 194/476 (ago./1998), verb. 15.418).29 Por outro lado, a doutrina e a jurisprudência adversárias preconizam que a admissão de tais antecedentes viola o princípio da presunção do estado de inocência, “Com efeito, sob o império de uma nova ordem constitucional, e “constitucionalizando o Direito Penal”, somente podem ser valoradas como “maus antecedentes” decisões condenatórias irrecorríveis. Assim, quaisquer outras investigações preliminares, processos criminais em andamento, mesmo em fase recursal, não podem ser valorados como maus antecedentes” .30 Nesse sentido, decidiu o STF: “O ato judicial de fixação da pena não poderá emprestar relevo jurídico-legal a circunstância que meramente evidente haver sido, o réu, submetido a procedimento penal persecutório, sem que deste haja resultado, com definitivo trânsito em julgado, qualquer condenação de índole penal. A submissão de uma pessoa a meros inquéritos policiais, ou, ainda, a persecuções criminais de que não tenha derivado qualquer título penal executório, não se reveste de suficiente idoneidade jurídica para justificar ou legitimar a especial exacerbação da pena. Tolerar-se o contrário implicaria admitir grave lesão ao princípio constitucional consagrador da presunção de não- culpabilidade dos réus ou dos indiciados (CF, art. 5o, LVII). É inquestionável que somente a condenação penal transitada em julgado pode justificar a exacerbação da pena, pois, com ela, 29 CARVALHO NETO, Inácio de. Aplicação da pena. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2003. p.45. 30 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. v.1, p.555. descaracteriza-se a presunção juris tantum de não-culpabilidade do réu, que passa, então – e a partir desse momento – a ostentar o status jurídico-penal de condenado, com todas as conseqüências daí decorrentes. Não podem repercutir contra o réu situações jurídico=processuais ainda não definidas por decisão irrecorrível do Poder Judiciário especialmente naquelas hipóteses de inexistência de titulo penal condenatório definitivamente constituído” (STF – HC 68.465-3 – Rel. Celso de Mello – DJU, de 21.2.92, p. 1.694).31 Alega a primeira corrente que não se trata de atribuir ao réu conseqüência própria do status de condenado, valorando o fato como imputação de culpa, e sim apurar a sua propensão para o crime.32 Ora, entendemos que a afirmação acima é parcialmente correta. O que se procura é avaliar a propensão do réu para o crime, mas com a finalidade de estabelecer a pena-base, “suficiente para reprovação e prevenção do crime”, conforme aduz o art. 59, do CP. Portanto, se age sobre uma pena, como elemento de determinação ou medição (vide princípios da pena – 2.1. d), é inegável que o antecedente veste a vestimenta da culpabilidade de um delito, virtual é verdade, mas com efeitos reais sobre outro delito real. Logo se é de culpa que falamos, o preceito constitucional deve ser obedecido. Compartilhamos, portanto, do pensamento da segunda corrente, entendendo que somente podem ser considerados como antecedentes as condenações penais transitadas em julgado que não constituam reincidência, pois estas últimas são agravantes genéricas, como veremos mais adiante. Ressalte-se, no entanto, que no caso de 31 FRANCO, Alberto Silva. et al. Código Penal e sua interpretação jurisprudencial. 6. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997. v.1, p.888. 32 CARVALHO NETO, Inácio de. Aplicação da pena. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2003. p.45. existência de mais de uma causa de reincidência, uma delas poderá ser considerada como antecedente. Do pensamento acima é que concluímos que os antecedentes são precedentes judiciais, excluindo-se, então, os precedentes policiais e aqueles que não são relevantes, ou sejam, as situações jurídico- processuais ainda não definidas por decisão irrecorrível ou, em regra, se irrecorríveis, constituam reincidência. b) Os antecedentes podem ser tanto bons quanto maus? Não há dúvidas em relação à possibilidade da existência de maus antecedentes, pois sendo precedentes judiciais, fácil é de se observar que, uma vez sob a apreciação do judiciário, na esfera penal, tendem, na maioria das vezes, a ser infrações. Quanto aos bons antecedentes, para aqueles que entendem ser abrangente o campo sobre o que versam, não há dificuldade em identifica-los, como, por exemplo, ter o agente inclinação para o trabalho. Por outro lado, os que se restringem aos antecedentes criminais, como são chamados, normalmente se calam a respeito dos bons, dentre aqueles, apesar de admiti-los. Existe, inclusive, na doutrina, quem considere ser característica intrínseca dos antecedentes a negatividade. “Negativo porque revela a tendência judicial em considerar apenas os ‘maus antecedentes’ do autor, sendo excluídos todos os fatos ‘nobres’”. 33 Apesar da dificuldade em imaginar bons antecedentes, dentro da ótica restritiva, ao nosso ver, estes podem existir. Talvez a dificuldade advenha da utilização da denominação “antecedente criminal”, 33 CARVALHO, Amilton Bueno de; CARVALHO, Salo de. Aplicação da Pena e Garantismo. Rio de Janeiro: Lumen Júris, 2001. p.43. vinculando o fato pregresso ao crime. Se, no entanto, utilizássemos a expressão “precedentes judiciais”, cuja amplitude é maior, indicando todos os fatos realizados perante ou sob a responsabilidade do Poder Judiciário, poderíamos imaginar bons antecedentes com menor dificuldade, como, por exemplo, o agente ter funcionado como jurado durante vários anos. Outrossim, o fato de não ter maus antecedentes já é um bom precedente. 3.4.3. Conduta social É a vida pregressa do agente representada pela sua conduta no meio social, familiar, profissional, etc. Tal conduta pode ser tanto boa quanto má, avaliada segundo padrões éticos e morais da sociedade contemporânea, e , muitas vezes, não se vincula a existência ou não de precedentes judiciais. Por exemplo, pode um sujeito portador de maus antecedentes, antes de preso, ter sido um bom pai de família e inclinado ao trabalho. 3.4.4. Personalidade do agente Caráter ou qualidade pessoal do agente que o individualiza em relação a outras pessoas. É o elemento estável da conduta, sua maneira habitual de ser no meio ambiente em que vive. Através da análise da personalidade verifica-se a boa ou má índole do agente, sua maior ou menor sensibilidade ético-social, assim como a presença ou não de desvios de caráter, com o objetivo de identificar se o crime constitui um episódio acidental ou uma tendência na vida do réu.34 34 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. v.1, p.555. 3.4.5. Motivos do crime São as causas ou as razões que levaram o agente a praticar o crime, avaliadas à luz de uma valoração ética, moral e social, segundo padrões da sociedade contemporânea. Um indivíduo pode cometer um crime impulsionado pelos mais variados motivos: fome, ambição, amor, ódio, ciúme, honra, por vingança, por um motivo político, etc. Em relação a dois crimes de homicídio, um praticado em defesa da honra e o outro impulsionado por puro sadismo, a princípio, injusto seria que sobre o primeiro pendesse pena maior do que aquela atribuída ao segundo. Há, portanto, no intuito de individualizara pena, que se valorar tais motivos para se estabelecer a pena mais adequada, proporcional à magnitude do injusto e ao desvalor da ação. Ressalte-se, no entanto, que, como veremos mais adiante, devem ser excluídos deste rol aqueles motivos expressos tanto na parte geral do Código Penal como em sua parte especial. 3.4.6. Circunstâncias do crime Como estudamos anteriormente, circunstância do crime é tudo aquilo que o circunda, manifestando-se por uma situação, estado ou condição de coisa ou pessoa, por uma particularidade, um acidente que o acompanha, por um caso, uma condição, causa ou motivo. As circunstâncias que ora estudamos, no entanto, são subespécies das circunstâncias judiciais. Excluem-se do rol, então, as demais circunstâncias judiciais, aquelas que fazem parte do tipo penal e as circunstâncias legais. A inclusão de tais circunstâncias inominadas no âmbito das circunstâncias judiciais, demonstra a preocupação do legislador em abarcar o maior número possível de elementos individualizadores da pena. 3.4.7. Conseqüências do crime As conseqüências do crime dizem respeito aos efeitos produzidos pela ação delituosa: “o maior ou menor vulto do dano ou perigo de dano, que é sempre inerente ao delito, não só para a vítima como para a sociedade, o sentimento de insegurança provocado nesta e outros efeitos ainda que mais afastados” (Magalhães Noronha. Direito Penal, 31 ed. 1995, vol 1/245).35 São os efeitos produzidos pelo ato delituoso, excetuando-se as conseqüências naturais do crime contidas nos tipos penais. Assim, o efeito morte no homicídio, por exemplo, não constitui a conseqüência da qual falamos e sim elementar do tipo penal. Constituiria conseqüência, o fato do homicídio ter sido praticado perante crianças, causando, posteriormente, a uma delas um trauma psíquico. 3.4.8. Comportamento da vítima Por vezes, a vítima contribui com o seu comportamento para que o agente venha a praticar o crime. Não significa, contudo, que tal comportamento justifique o delito ou isente de pena o seu autor. Serve sim 35 FRANCO, Alberto Silva. et al. Código Penal e sua interpretação jurisprudencial. 6. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997. v.1, p.900. para se avaliar o grau de censurabilidade do ato criminoso em face da influência exercida pelo comportamento da vítima. Nesse sentido, explica a Exposição de Motivos do Código Penal – Lei 7.209/84 em seu item 50: “Fez-se referência expressa ao comportamento da vítima, erigido, muitas vezes, em fator criminógeno, por constituir-se em provocação ou estímulo à conduta criminosa, como, entre outras modalidades, o pouco recato da vítima nos crimes contra os costumes.” A ciência que estuda o comportamento da vítima no fato criminoso é a Vitimologia que costuma classificar os tipos de vítimas em: vítimas totalmente inocentes – as que não tem qualquer participação no delito; vítimas menos culpadas que o criminoso – as provocadoras, imprudentes e ignorantes; vítimas tão culpadas como o delinquente – as vítimas voluntárias dos crimes de encontro; vítimas mais culpadas que o delinquente – as que provocam o delito; vítimas totalmente culpáveis – as agressoras, simuladoras e imaginárias.36 3.5. Circunstâncias legais Conforme já dissemos, as circunstâncias legais são aquelas, especificamente, taxadas pelo Código Penal, não dependendo da discricionariedade do juiz para o seu reconhecimento, e, conforme são descritas na parte geral ou na parte especial, são conhecidas como circunstâncias legais genéricas ou específicas, respectivamente. São circunstâncias legais genéricas as causas de aumento ou diminuição de pena constantes da parte geral do CP, as agravantes e as atenuantes. 36 CARVALHO, Inácio de. Aplicação da pena. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2003. p.69; Cf. MENDELSON. “La victimologie, science actuelle” . In: Revue de drit pénal et de criminologie. Bruxelles, 1959. Apud Paulo José da COSTA JÚNIOR. Op. cit., p. 202. São circunstâncias legais específicas, ou também conhecidas como especiais, as causas de aumento e diminuição de pena constantes da parte especial do CP e as qualificadoras. 3.5.1. Agravantes e atenuantes As agravantes são aquelas circunstâncias enumeradas no art. 61 e 62, do CP, quando não constituírem elementos do tipo ou qualificadoras. “Art. 61. São circunstâncias que sempre agravam a pena, quando não constituem ou qualificam o crime: I - a reincidência: II - ter o agente cometido o crime: a) por motivo fútil ou torpe:, b) para facilitar ou assegurar a execução, a ocultação, a impunidade ou vantagem de outro crime; c) à traição, de emboscada, ou mediante dissimulação, ou outro recurso que dificultou ou tornou impossível a defesa do ofendido; d) com emprego de veneno, fogo, explosivo, tortura ou outro meio insidioso ou cruel, ou de que podia resultar perigo comum; e) contra ascendente, descendente, irmão ou cônjuge; f) com abuso de autoridade ou prevalecendo-se de relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade; g) com abuso de poder ou violação de dever inerente a cargo, ofício, ministério ou profissão; h) contra criança, velho, enfermo ou mulher grávida; i) quando o ofendido estava sob a imediata proteção da autoridade; j) em ocasião de incêndio, naufrágio, inundação ou qualquer calamidade pública, ou de desgraça particular do ofendido; l) em estado de embriaguez preordenada. Agravantes no caso de concurso de pessoas Art. 62 - A pena será ainda agravada em relação ao agente que: I - promove, ou organiza a cooperação no crime ou dirige a atividade dos demais agentes; II - coage ou induz outrem à execução material do crime; III - instiga ou determina a cometer o crime alguém sujeito à sua autoridade ou não-punível em virtude de condição ou qualidade pessoal; IV - executa o crime, ou nele participa, mediante paga ou promessa de recompensa”. As atenuantes são as circunstâncias descritas no art. 65, do CP, conhecidas como atenuantes nominadas, e no art. 66, do CP, que são as atenuantes inominadas: “Art. 65 - São circunstâncias que sempre atenuam a pena: I - ser o agente menor de 21 (vinte e um), na data do fato, ou maior de 70 (setenta) anos, na data da sentença; II - o desconhecimento da lei; III - ter o agente: a) cometido o crime por motivo de relevante valor social ou moral; b) procurado, por sua espontânea vontade e com eficiência, logo após o crime, evitar-lhe ou minorar-lhe as conseqüências, ou ter, antes do julgamento, reparado o dano; c) cometido o crime sob coação a que podia resistir, ou em cumprimento de ordem de autoridade superior, ou sob a influência de violenta emoção, provocada por ato injusto da vítima; d) confessado espontaneamente, perante a autoridade, a autoria do crime; e) cometido o crime sob a influência de multidão em tumulto, se não o provocou”. “Art. 66 - A pena poderá ser ainda atenuada em razão de circunstância relevante, anterior ou posterior ao crime, embora não prevista expressamente em lei”. As agravantes e as atenuantes têm como função agravar ou atenuar, respectivamente, a pena-base, segundo prudente arbítrio do juiz, vez que o Código Penal não estabelece a quantidade de aumento ou diminuição. Outrossim, já estudamos que as circunstâncias podem ser de natureza objetiva ou subjetiva, conforme relacionam-se com a materialidade do delito ou ao agente do crime. Tal distinção se fará importante no concurso de agravantes e atenuantes como veremos mais adiante. 3.5.2. Qualificadoras Como já estudamos anteriormente no capítulo que trata sobre a distinção entre circunstâncias do crime e elementares do tipo, as qualificadoras, apesar de serem consideradas circunstâncias do crime por grande parte da doutrina, atuam como verdadeirostipos penais autônomos. Tal afirmação é corroborada pelo fato das qualificadoras se encontrarem presentes somente na parte especial do Código Penal, cominando, em caso de sua incidência, novos limites para a pena, aumentando-a em relação àquela cominada ao tipo penal básico. Exemplo clássico é o do homicídio qualificado (art. 121. § 2o, CP), em que a incidência de qualquer uma das circunstâncias elencadas assevera a pena de reclusão para 12 a 30 anos em detrimento do homicídio simples, cuja pena é de 6 a 20 anos. São exemplos de qualificadoras: arts. 121, § 2o; 129, §1o; 129, § 2o; 129, § 3o; 130, § 1o; 150, § 1o; 223, parágrafo único; 230, § 1o; 230, § 2o; etc. 3.5.3. Causas de aumento e diminuição de pena As causas de aumento ou de diminuição de pena, também conhecidas como majorantes e minorantes, respectivamente, são circunstâncias legais constantes tanto na parte geral – circunstâncias legais gerais, como na parte especial – circunstâncias legais especiais, do Código Penal. Caracterizam-se por expressarem em seu texto a conjugação dos verbos “aumentar”, “diminuir” ou “reduzir”, aumentando ou diminuído a pena em forma de fração. Ademais, como veremos a seguir, incidem no derradeiro momento da dosimetria da pena, após a consideração das agravantes e das atenuantes. São exemplos de causas de aumento e de diminuição de pena: arts. 14, parágrafo único; 24, § 2o; 26, parágrafo único; 121, §1o, 121, §4o; 133, §3o; 135, parágrafo único; 207, § 2o; etc. 4. DA FIXAÇÃO DA PENA Como veremos adiante, são três as fases da dosimetria da pena, formando um sistema trifásico. Antes de estudarmos cada uma dessas fases, porém, é oportuno tecermos considerações sobre regras comuns a todas elas. Característica comum às diversas fases da dosimetria da pena é o poder outorgado ao juiz para aplicar a sanção in concreto, tendo como fim atender ao princípio da individualização da pena. É importante, no entanto, salientar que este poder, discricionário que é, subordina-se às regras contidas no Código Penal e no Código de Processo Penal, ordinariamente. Tais regras apresentam- se, basicamente, por via de limites mínimos e máximos impostos para as penas, e, também, pela obrigatoriedade imposta ao juiz de motivar as suas decisões, conforme prescrevem os dispositivos do CPP abaixo: “Art. 381. A sentença conterá: III - a indicação dos motivos de fato e de direito em que se fundar a decisão”. “Art. 564. A nulidade ocorrerá nos seguintes casos: III - por falta das fórmulas ou dos termos seguintes: m) a sentença”. Nesse sentido proferiu o STF: “Incabível a fixação da pena além do mínimo, se não houve fundamentação para justificar fosse ela exacerbada. Nulidade da decisão condenatória, para que outra seja proferida” (STF – HC- Relator Aldir Passarinho – JUTACRIM 89/477 e RTJ 121/101).37 Ademais, a Exposição dos Motivos do Código Penal – Lei 7.209/84 esclarece em seu item 51, 2a parte, que o sistema trifásico tem como fim permitir o completo conhecimento da operação realizada pelo juiz, dando ênfase à garantia constitucional da ampla defesa: “Tal critério permite o completo conhecimento da operação dos elementos incorporados à dosimetria. Discriminado, por exemplo, em primeira instância, o quantum da majoração decorrente de uma agravante, o recurso poderá ferir com precisão essa parte da sentença, permitindo às instâncias superiores a correção de equívocos hoje sepultados no 37 FRANCO, Alberto Silva. et al. Código Penal e sua interpretação jurisprudencial. 6. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997. v.1, p.909. processo mental do juiz. Alcança-se pelo critério, a plenitude de garantia constitucional da ampla defesa”. Existe, no entanto, entendimento jurisprudencial majoritário de que não há necessidade de fundamentação, no caso de estabelecimento de pena mínima. Assim decidiu o STF: “A sentença criminal deve conter fundamentação suficiente, e não abundante. A parte da sentença que diz respeito à fixação da pena deve ser fundamentada, entretanto, se a pena foi fixada na quantidade mínima, sem prejudicar o réu, não se anula a decisão” (STF – HC – Rel. Antônio Neder – RTJ 68/348).38 Em oposição ao pensamento majoritário, entendemos ser mais correta a posição que adota a obrigatoriedade da fundamentação, mesmo nos casos em que se fixe a pena no mínimo legal, conforme nos ensina Cezar Roberto Bittencourt39: “Esse é um entendimento que necessita ser revisto urgentemente ou, pelo menos, merece detida reflexão. É, no mínimo, uma posição questionável entender que a favor do indivíduo tudo é permitido, esquecendo-se que ao outro pólo da relação processual encontra-se a sociedade, representada pelo Ministério Público, que também tem o direito de receber um tratamento isonômico. A fixação da pena no limite mínimo permitido, sem a devida fundamentação, viola o ius accusationis e frauda o princípio constitucional da individualização da pena, que em outros termos, significa dar a cada réu a sanção que merece, isto é, necessária e suficiente à prevenção e repressão do crime. Assim, deve-se entender que a ausência 38 FRANCO, Alberto Silva. et al. Código Penal e sua interpretação jurisprudencial. 6. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997. v.1, p.908. 39 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. v.1, p.561. de fundamentação gera nulidade, mesmo que a pena seja fixada no mínimo, desde que haja recurso da acusação, é claro”. Outra peculiaridade é o imperativo imposto pelo princípio jurídico “non bis in idem” que significa “não duas vezes a mesma coisa”, ou seja, ninguém pode responder pela segunda vez sobre o mesmo fato já julgado, ou duplamente punido pelo mesmo direito. Consequentemente, no caso de haver múltipla incidência de uma única circunstância nas diversas fases da fixação da pena, esta só poderá ser considerada uma única vez. Em qual fase é a questão, cuja resposta veremos mais adiante. Outras regras regem o sistema trifásico, porém, de aceitação não tão pacífica como as que descrevemos, motivo pelo qual as abordaremos, para melhor entendimento e discussão, no desenvolver do nosso estudo. 4.1. Fases da fixação da pena privativa de liberdade Muito já se discutiu no passado sobre quantas e quais seriam as fases de fixação da pena. De um lado, Roberto Lyra defendia o sistema bifásico, e de outro, Nelson Hungria, o sistema trifásico. 40 No primeiro caso, para a fixação da pena-base levar-se-ia em consideração, em um mesmo momento, as circunstâncias judiciais e as circunstâncias legais genéricas – agravantes e atenuantes, para posteriormente, em uma segunda fase, incidirem sobre a pena-base as circunstâncias relativas as causas de aumento ou diminuição da pena. No segundo caso, a apreciação das circunstancias judiciais e das circunstâncias legais genéricas seriam feitas em momentos distintos. Este é, pois, o sistema consagrado na reforma de 1984, que eliminou a controvérsia existente, conforme esclarece a 1a parte do item 51, da Exposição dos Motivos do Código Penal – Lei 7.299/84: “Decorridos quarenta anos da entrada em vigor do Código Penal, remanescem as divergências sobre as etapas da aplicação da pena. O Projeto opta claramente pelo critério das três fases, predominantes na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal. Fixa-se, inicialmente, a pena- base, obedecendo-se o disposto no art. 59; consideram-se, em seguida, as circunstâncias atenuantes e agravantes; incorporam-se ao cálculo, finalmente, as causas de diminuição e aumento.” Nesse sentido, estabelece o caput do art. 68, do Código Penal: “A pena-base será fixada atendendo-se ao critério do art. 59 deste Código; em seguida serão consideradas as circunstâncias atenuantes e agravantes; por último, as causasde diminuição e de aumento”. São, então, três as fases de fixação da pena: a) Fixação da pena-base: escolha da pena aplicável, dentre as cominadas (art. 59, I, CP) e estabelecimento da sua quantidade, dentro dos limites previstos (art. 59, II, CP), levando-se em consideração as circunstâncias judiciais (art. 59, caput, CP) ; b) Fixação da pena provisória: consideração das agravantes (arts. 61, 62, CP) e das atenuantes (arts. 65 e 66, CP); c) Fixação da pena definitiva: consideração das causas de aumento e diminuição da pena, genéricos ou específicos. Ressalte-se, porém, que consideramos como definitiva a pena estabelecida na terceira fase somente para efeitos do nosso estudo, pois é verdade que após este momento, tem ainda o juiz a incumbência de estabelecer 40 JESUS, Damásio E. de. Direito Penal. 26. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. v.1, p.587. o regime inicial de cumprimento da pena restritiva de liberdade (art. 59, III, CP) e substituí-la, por outra espécie, caso seja cabível (art. 59, IV, CP). 4.2. A incidência das circunstâncias e seus reflexos Conforme estudamos anteriormente, as circunstâncias do crime se classificam em: circunstâncias judiciais, contidas no caput do art. 59, do CP; circunstâncias legais genéricas, que são as agravantes e atenuantes, e as causas de aumento e diminuição de pena expressas na parte geral do CP; circunstâncias legais específicas, que são as qualificadoras e as causas de aumento e diminuição de pena relacionados na parte especial do CP. Passaremos a seguir a descrever os seus reflexos face a sua incidência nas diversas fases da fixação da pena. a) Qualificadoras As qualificadoras atuam como tipos penais autônomos, para efeitos de aplicação da pena.41 Logo incidem, a priori, na cominação das penas abstratas, aumentando-as em relação às penas cominadas aos respectivos tipos penais básicos. Representam a preocupação do legislador em atender ao princípio constitucional da individualização da pena, porém na fase legislativa. Quanto aos seus reflexos, delimitam a pena mínima e a máxima, às quais devem estar adstritos os efeitos das circunstâncias judiciais, assim como das agravantes e atenuantes, conforme demonstraremos adiante. Outrossim, elementares do tipo que são, pelo princípio non bis in idem, uma vez presentes no caso concreto, impedem a sua consideração em qualquer uma das fases do sistema trifásico. b) Circunstâncias judiciais O caput do art. 59 , do CP, consagra uma fórmula ampla e genérica de circunstâncias, com o intuito de abarcar o maior número possível de elementos individualizadores da pena que incidirão sobre a primeira fase de sua dosimetria. Poderíamos dizer, então, que as circunstâncias judiciais englobam todas as circunstâncias do crime, exceto aquelas aduzidas como circunstâncias legais: qualificadoras; agravantes e atenuantes; causas de aumento e diminuição da pena. Conclue-se do exposto que, uma vez incidentes como circunstâncias legais, específicas que são e, pelo princípio non bis in idem, tais circunstâncias, em regra, não podem incidir como circunstâncias judiciais. Quanto aos seus reflexos, as circunstâncias judiciais Influem na escolha das penas cominadas e na dosimetria da pena-base. A pena-base é aquela que servirá como ponto de partida para o cálculo da pena provisória. Para o seu estabelecimento, o juiz escolhe a pena aplicável, dentre as cominadas, e fixa a sua quantidade, obedecendo aos limites previstos na sanção penal abstrata. Os critérios, para tanto, estão contidos no caput do art. 59, do CP, que faz menção às circunstâncias judiciais e a necessidade de se estabelecer pena suficiente para a reprovação prevenção do crime. 41 CARVALHO NETO, Inácio de. Aplicação da pena. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2003. p.85. As penas cominadas são as sanções abstratas expressas para cada tipo penal, básico ou qualificado. Podem ser simples, cumulativas ou alternativas. Simples são aquelas em que se comina apenas uma espécie de pena: reclusão, detenção ou multa. Cumulativas são aquelas em que se cominam, concomitantemente, pena restritiva de liberdade com pena pecuniária: reclusão e multa ou detenção e multa. Já nas penas alternativas cominam, alternativamente, pena restritiva de liberdade ou pecuniária: reclusão ou multa; detenção ou multa. A distinção se faz importante para compreendermos que a escolha preconizada pelo art. 59, I, do CP, diz respeito somente as penas alternativas, sendo que tal dispositivo não alcança as penas simples e as penas cumulativas. Quanto ao critério utilizado para a escolha, recorremos ao ensinamento de Inácio de Carvalho Neto:42 “Embora não se possa fixar parâmetros a priori para a escolha entre as penas alternativamente cominadas, entendemos que, havendo mais de uma circunstância judicial desfavorável ao acusado, muito provavelmente não será mais o caso de se aplicar a pena de multa, devendo-se optar pela pena restritiva de liberdade, ainda que, quando for o caso, em limites próximos do mínimo legal”. Em relação à dosimetria da pena-base, consideração importante a se fazer é o fato desta estar adstrita aos limites da sanção penal cominada. Isso ocorre em função do princípio da legalidade. O art. 59, do CP, não estabelece o quantum da pena-base, prescrevendo, somente, em seu inciso II, que a quantidade da pena aplicável deverá estar dentro dos limites previstos. Ora, tais limites são aqueles previstos na pena cominada para o tipo penal, conforme aduz o art. 53 do CP: “As penas privativas de liberdade têm seus limites estabelecidos na sanção correspondente a cada tipo legal de crime”. Ademais, o princípio constitucional da legalidade, preconizado pelo art. 5o, XXXIX, da CF e repetido pelo art. 1o do CP, estabelece: “Não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal” Polêmica, no entanto, é a discussão a respeito de qual patamar deverá o juiz partir para fazer incidir as circunstâncias judiciais. Como a lei se cala, a controvérsia gira em torno de duas correntes distintas, uma defendendo a utilização da pena mínima, e a outra, o termo médio entre a pena mínima e a máxima cominadas. Fundado no princípio de beneficiar sempre o réu, a doutrina e a jurisprudência majoritária entendem que o patamar a ser utilizado é a pena mínima cominada. Por outro lado, outros defendem como patamar inicial o termo médio, ou seja, a média da soma dos dois extremos – pena mínima e pena máxima. Assim, se a pena for de 6 a 12 anos de reclusão, por exemplo, o termo médio seria de 9 anos. A partir deste ponto, passaria o juiz a dosar a pena-base, diminuindo-a ou aumentando-a, conforme forem boas ou más as circunstâncias judiciais. Postula esta corrente que tal critério é mais racional, tendo em vista o patamar médio possibilitar tanto a redução quanto o 42 CARVALHO, Inácio de. Aplicação da pena. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2003. p.81. aumento da pena, dentro dos limites mínimo e máximo da pena cominada, em detrimento da tese do patamar mínimo que só permite a variação para cima. Os defensores do termo mínimo refutam a tese adversária, argumentando que, no caso de haver absoluto equilíbrio entre circunstâncias positivas e negativas, a pena não sairia do patamar inicial, e, nestas condições, se o termo médio fosse adotado como ponto de partida o réu seria prejudicado. Acreditamos ser mais correta a tese do termo médio, pois, além de ser mais racional,
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