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SECRETARIA DE ESTADO DA SAÚDE PROGRAMA DE APRIMORAMENTO PROFISSIONAL HOSPITAL DAS CLÍNICAS DA FACULDADE DE MEDICINA DE RIBEIRÃO PRETO- USP GABRIELA INARA ARCARO JULIANA SCABINE DOENÇA DE WILSON RIBEIRÃO PRETO – SP 2008 2 SECRETARIA DE ESTADO DA SAÚDE PROGRAMA DE APRIMORAMENTO PROFISSIONAL HOSPITAL DAS CLÍNICAS DA FACULDADE DE MEDICINA DE RIBEIRÃO PRETO- USP GABRIELA INARA ARCARO JULIANA SCABINE DOENÇA DE WILSON Monografia apresentada ao Programa de Aprimoramento Profissional/SES,elaborada no Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto-SP. Área: Laboratório de Pediatria-Setor Metais Departamento de Apoio Médico RIBEIRÃO PRETO - SP 2008 3 SUMÁRIO Assunto Página SUMÁRIO...............................................................................................................3 LISTA DE TABELAS...............................................................................................6 LISTA DE FIGURAS...............................................................................................7 RESUMO................................................................................................................8 1. INTRODUÇÃO.................................................................................................10 1.1 O Cobre na História..............................................................................13 1.2 Aspecto e Forma...................................................................................14 1.3 Fisiologia do Cobre................................................................................15 1.3.1 Dose necessária de Cobre.......................................................15 1.3.2 Absorção..................................................................................16 1.3.3 Distribuição...............................................................................17 1.3.4 Excreção...................................................................................19 1.3.5 Essencialidade..........................................................................20 1.4 O Benéfico Papel do Cobre no Corpo Humano......................................22 1.4.1 Cérebro.....................................................................................22 1.4.2 Coração e Vasos Sanguíneos...................................................22 1.4.3 Pele............................................................................................22 1.4.4 Sistema Imunológico..................................................................23 1.4.5 Ossos.........................................................................................23 4 1.5 Patologia do Cobre............................................................................... 23 1.5.1 Toxicidade do Cobre............................................................... 23 1.5.2 Síndrome Tóxica..................................................................... 25 1.6 Síndrome de Menkes........................................................................... 26 1.7 Síndrome de Wilson............................................................................. 27 1.7.1 História da Doença................................................................ 28 1.7.2 Genética................................................................................. 29 1.7.3 Hereditariedade...................................................................... 29 1.7.4 Ceruloplasmina...................................................................... 29 1.7.5 Patologia da Doença.............................................................. 30 1.7.6 Sintomatologia........................................................................ 30 1.7.7 Diagnóstico............................................................................. 33 1.7.7.1 Espectrofotômetro de Absorção Atômica............................ 34 1.7.7.1.1 Espectrofotômetro de Absorção Atômica com Chama..... 35 1.7.7.1.2 Espectrofotômetro de Absorção Atômica com Forno de Grafite.............................................................................................. 36 1.7.8 Outros Exames....................................................................... 37 1.7.8.1 Dosagem de Ceruloplasmina..................................... 37 1.7.8.2 Dosagem de Cobre Hepático..................................... 38 1.7.8.3 Exame com Lâmpada de Fenda................................ 38 1.7.8.4 Estágios mais Avançados da Doença........................ 38 1.7.9Tratamento................................................................................................ 39 1.8 Curiosidades............................................................................................... 42 2. JUSTIFICATIVA. ........................................................................................... 45 5 3. OBJETIVO................................................................................................... 46 4. MATERIAL E MÉTODOS............................................................................ 47 5. RESULTADOS............................................................................................ 51 6. DISCUSSÃO E CONCLUSÃO.................................................................... 59 7. REFERÊNCIAS........................................................................................... 61 6 LISTA DE TABELAS Tabela Página 1. Índice de ingestão média de cobre estimada na dieta de um adulto (mg/dia) em diferentes países..................................................................................15 2. Principais macronutrientes e seus efeitos sobre a absorção gastrointestinal do cobre..........................................................................................................17 3. Principais Cuproenzimas com atividade oxidativa, redutora e oxidativa no homem.................................................................................................... 21 4. Parâmetros bioquímicos normais e na doença de Wilson..........................39 5. Relação anual das amostras recebidas e realizadas de cobre urinário de 1999 a 2008............................................................................................. 52 6. Relação anual das amostras recebidas e realizadasde cobre sérico de 1999 a 2008............................................................................................. 54 7 LISTA DE FIGURAS Figura Página 1. Comparação entre o número de amostras de cobre na urina e no sangue recebidas e realizadas no Setor de Metais do HCFMRP-USP nos últimos dez anos.................................................................................................... 51 2. Aumento da demanda anual de cobre urinário de 1999 a 2008................ 53 3. Aumento da demanda anual de cobre sérico de 1999 a 2008.................. 55 4. Porcentagem de dosagens de cobre urinário nos últimos dez anos Com valores normais e alterados.............................................................. 55 5. Porcentagem de dosagens com valores normais e alterados de cobre no sangue nos últimos dez anos................................................................. 56 6. Porcentagem de pacientes do sexo feminino e masculino com valores > 60ug/24h de cobre na urina nos últimos dez anos................................... 57 7. Porcentagem de pacientes do sexo feminino e masculino com valores < 60 ug% de cobre no sangue nos últimos dez anos.................................. 57 8. Quantificação da demanda das Clínicas de Origem dos exames solicitados nos últimos dez anos.................................................................. 58 8 RESUMO A Doença de Wilson é uma enfermidade de importância mundial, independente do sexo. Há uma relevância acentuada do diagnóstico precoce, frente ao início do tratamento contra a doença. O recurso utilizado pelo Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto – USP (HC-FMRPUSP) para esse fim diagnóstico é a dosagem de cobre em urina 24 de horas e cobre sérico no Laboratório de Pediatria. O paciente que apresentar a doença terá o seu resultado inferior ao valor de referência normal para o cobre sérico (70 a 140 ug%) e terá o resultado superior ao valor de referência normal para o cobre urinário (< que 60ug/24h). Para as devidas dosagens utilizam-se metodologias específicas e de alta sensibilidade, como Espectrofotometria de Absorção Atômica com Chama (EAAC) e Forno de Grafite (EAAFG). Esse estudo relacionou 1134 amostras de cobre urinário e 2819 de cobre sérico, provenientes de dosagens dos pacientes atendidos (HC-FMRPUSP) no período dos últimos dez anos (1999 a 2008). Através de levantamento dos registros internos do Setor de Metais demonstrou- se os seguintes resultados: • COBRE URINÁRIO: 23,1% (262 dosagens) mostraram-se acima de 60 ug/24h; • COBRE SÉRICO: 10,3% (291 dosagens) mostraram-se abaixo de 60ug%; Houve uma concordância do número de pacientes com dosagens no sangue e urina o que confirma o diagnóstico laboratorial para os pacientes com a Doença de Wilson. 9 Não há preferência de sexo nesta enfermidade, havendo uma demanda com cerca de 50% de solicitações para homens e 50% para mulheres. As clínicas de maior demanda são compatíveis com as características da doença que acomete diversos órgãos. Em primeiro lugar vem a Gastroenterologia (49,12% das dosagens), e em segundo a Neurologia (17,99%), seguida de múltiplas clínicas do hospital (32,09%). 10 1. INTRODUÇÃO A Doença de Wilson é conhecida desde 1883, quando Westphal a denominou de pseudoesclerose ao observar a presença de tremores e rigidez. Strumpell, em 1898, evidenciou doença de fígado em autópsia de dois pacientes portadores de tremores (Brito J.C.F. e cols, 2004). Em 1912, o neurologista Kinnier Wilson (1878-1937) descreveu a forma clássica da doença, correlacionando a sintomatologia dos gânglios da base à doença do fígado, denominando-a de degeneração lenticular progressiva. Hall, em 1921, a descreveu como degeneração hepatolenticular (Brito J.C.F. e cols, 2004). Esta doença é uma desordem genética recessiva e autossômica rara, que interfere com o metabolismo do cobre (Ala, A. e cols, 2007). Está relacionada com deficiente excreção biliar e conseqüente depósito do cobre (Cu) no fígado, córnea, rins e cérebro. A ausência ou deficiência de uma ATPase transportadora do metal, codificada no cromossomo 13, que faz a ligação do cobre com a ceruloplasmina para que ele seja eliminado do hepatócito para a bile ou pela urina, faz com que o metal se acumule no interior da célula (Teixeira, J.A; 2004). A sintomatologia é caracterizada por manifestações neurológicas, hepáticas, psiquiátricas e oculares (Brito, J.C.F. e cols 2004), sendo comum a cirrose, ascite, hipertensão portal, icterícia, tremores, rigidez, anéis de Keyser-Fleischer (K-F) (presente em mais de 95% dos casos), cataratas “sunflower”, anemia hemolítica, demência, depressão, irritabilidade, agressividade, entre outros (Teixeira, J.A 2004). Os distúrbios neurológicos, segundo Barbosa e cols (2005) representam a forma inicial mais freqüente (54,4%), seguida de insuficiência hepática (31,1%) e alterações psiquiátricas (14,4%) (Brito J.C.F. e cols 2004). 11 Geralmente os pacientes irão apresentar manifestações neurológicas na segunda ou terceira década de vida. Estas manifestações são invariavelmente acompanhadas por anéis de KF. Há relatos de pacientes com manifestações neuropsiquiátricas sem a presença de anéis de KF. Estes, no entanto, são considerados exceções. O tamanho dos anéis de KF está fortemente correlacionado com a severidade da doença (Moreira, D.M. e cols, 2001). As manifestações neurológicas iniciais incluem tremores, disartia, sialorréia, incordenacão e ataxia. O tremor, unilateral ou bilateral, é o sintoma mais freqüente e pode ser contínuo ou intermitente. Disartia é um achado precoce (Moreira, D.M. e cols, 2001). Cerca de 20% dos pacientes apresentam anormalidade psiquiátrica como sintoma inicial da doença como, esquizofreniformes ou paranóides, distúrbios do humor, alucinações, ilusões, comportamento disinibido. Manifestações endocrinológicas englobam ginecosmatia e atraso na puberdade, e são devidas à disfunção hepática (Moreira, J.S. R. e cols, 2001). A manifestação oftalmológica associada à Doença de Wilson é a catarata, descrita como semelhante ao girassol, relatada em 1922 por Siemerling e Oloff. É uma alteração que não interfere com a visão. A catarata consiste em um anel central na região pupilar do cristalino com cor e extensões em forma de pétalas que se assemelham ao girassol. O cristalino apresenta depósitos granulares semelhantes ao da córnea (Moreira, D.M. e cols, 2001). A Doença de Wilson ocorre em todo o mundo, em todas as raças e nacionalidades, acometendo ambos os sexos, com início entre os 11 e 25 anos de idade (Brito J.C.F. e cols, 2004). 12 Estima-se que a prevalência de indivíduos homozigotos com o gene da doença, seja de aproximadamente 1 a cada 30 milhões de pessoas, e a prevalência de heterozigotos seja de 90 por milhão, sendo assim considerada uma das doenças genéticas autossômicas recessivas mais prevalentes (Moreira, D.M. e cols, 2001). Cerca de 75% dos casos permanecem não diagnosticados. Os heterozigotos não desenvolvem a doença e tampouco necessitam de tratamento, podendo, no entanto, apresentar discretas anormalidades no metabolismo do cobre causando, às vezes, confusões no diagnóstico (Rodrigues, R.B.; 2005). Não há um teste específico para se diagnosticar a Doençade Wilson. O grande desafio é a presença de sinais inespecíficos que podem ser confundidos com doenças que afetam outros sistemas (Ala, A. e cols, 2007). Devido a isto, o diagnóstico envolve a tríade clássica de achados clínicos, bioquímicos e moleculares (Teixeira, J.A. 2004). Clinicamente, a Doença de Wilson tem que ser a primeira suspeita em crianças e adultos jovens com hepatopatia crônica ou qualquer hepatite incomum, devendo ser incluída no diagnóstico diferencial de adolescentes e adultos com manifestações neurológicas e características. O valor de cada prova diagnóstica varia de acordo com o estágio da doença. Para o estágio inicial da doença os melhores exames são: nível plasmático de ceruloplasmina, excreção urinária de 24 horas de cobre, cobre sérico, cobre hepático e exame com lâmpada de fenda por um oftalmologista. Em estágios mais avançados, está indicados o estudo genético, biópsia hepática, isótopos de cobre (cobre radiomarcado) e determinação de mutações (Teixeira, J. A. 2004). O tratamento deve ser iniciado imediatamente após o diagnóstico, com o objetivo de reduzir os sintomas e a progressão da doença (Teixeira, J. A; 2004). O uso de 13 fármacos na doença de Wilson é baseado no uso de queladores de cobre (ex. penicilamina), visando sua excreção. Outra alternativa, como transplante hepático, também pode ser utilizada (Ala, A. e cols, 2007), sendo este um tratamento indicado para hepatopatia irreversível. Embora seja uma doença genética e sem cura até o momento, diferentemente dos outros erros inatos do metabolismo, na doença de Wilson o tratamento clínico pode reverter dramaticamente o curso da deterioração progressiva, por isso, é importante o conhecimento da doença para que o tratamento adequado seja realizado. Este, quando iniciado logo após o diagnóstico, evita que ocorra a toxicidade pelo cobre, causando danos graves à saúde e podendo o paciente até mesmo à morte (Rodrigues, R.B. 2005). 1.1. O Cobre na História A idade dos metais teve início há 12 mil anos. Os primeiros metais encontrados em forma relativamente puras foram a prata e o cobre . O cobre foi descoberto há cerca de 9500 a.C. no atual Iraque. Era encontrado em muitos lugares, geralmente montanhosos, como pequenas partículas, ou mesmo nódulos ou pepitas de cor verde violácea ou verde negro. Podia se apresentar também, sob forma de pequenas placas ou formas arborescentes (Pedrozo, M.F.M. 2003). Segundo os historiadores, a primeira idade do cobre teve seu maior desenvolvimento no Egito. Encontram-se provas da exploração de minas na Península da Sinai, que remontam o reinado do Rei Senefru, 3800 a.C e inclusive, o descobrimento de crisóis nessas minas indica que a extração do metal incluía certa refinação (Instituto Procobre Brasil, 2008). 14 A Ilha de Chipre que eles chamavam Ciprium, no Mediterrâneo foi a maior fonte de cobre no Mundo Antigo. A palavra cobre veio de Cuprum, nome romano para metal Cipriano, dando origem também à sigla Cu, como símbolo químico do cobre. O uso de cobre e ouro marca a transição da idade da pedra para um modo de vida mais moderno (Pedrozo, M.F. M, 2003). O cobre alcançou sua real dimensão como metal imprescindível para o desenvolvimento industrial em 1831, quando Faraday descobriu o gerador elétrico. A partir da Revolução Industrial foram descobertos novos e importantes usos para o cobre e os progressos obtidos na metalurgia que permitiram produzir várias outras ligas deste metal, incrementando-se seus campos de aplicação. Deste momento em diante a demanda por ele cresceu em forma notável. (Instituto Procobre Brasil, 2008). 1.2. Aspecto e Forma O cobre, um metal marrom avermelhado e nobre como o ouro e a prata, é o primeiro elemento do grupo IB da tabela periódica. Apresenta quatro estados de oxidação: metálico (Cu º), íon coproso (Cu +), íon cúprico (Cu++) e o íon trivalente (Cu+++). Dentre suas propriedades, destaca-se a elevada condutividade térmica e elétrica, maleabilidade, baixa corrosividade. Pode ser encontrado em vários sais minerais e compostos orgânicos, apresentando-se na natureza tanto na forma elementar como na metálica (Pedrozo, M.F. M, 2003). 15 1.3. Fisiologia do Cobre O organismo não pode fabricar cobre, de modo que se deve obtê-lo dos alimentos ou suplementos dietéticos. O cobre está disponível em uma ampla variedade de alimentos frescos e ligeiramente processados (Instituto Procobre Brasil, 2008). 1.3.1. Dose necessária de cobre A OMS estima que o limite inferior da faixa aceitável de ingestão oral diária para o cobre seja de 20g/kg de peso corporal para os adultos e perto de 50g/kg de peso corporal para lactentes. Para um adulto saudável normal (que pesa entre 50-70 kg), isto equivale a 1,0 a 1,4 mg/dia (Instituto Procobre Brasil, 2008). PAÍS INGESTÃO MÉDIA ESTIMADA DE Cu NA DIETA DE UM ADULTO (mg/dia) Dinamarca 1,2 Finlândia 2,0 Alemanha 0,95 Holanda 1,5 Noruega 1,0 Suécia 1,2 Reino Unido 1,63 (homens); 1,23 (mulheres) Estados Unidos 1,24 (homens); 0,9 (mulheres) TABELA I: Índice de ingestão média de estimada Cu na dieta de um adulto (mg/dia) em diferentes países. 16 1.3.2. Absorção Nos mamíferos o cobre pode ser absorvido do estômago ao intestino delgado distal. No entanto, somente uma pequena fração do cobre ingerido é solubilizada suficientemente no estômago, o que dificulta a sua absorção neste local (Pedrozo, M.F. M, 2003). Ao alcançar os hepatócitos liga-se à apotioneína, para formar o Cu – metalotioneína, ou é incorporado à ceruloplasmina, retornando à circulação e sendo posteriormente eliminado na urina, ou ainda é excretado na bile (Rodrigues, R.B2005). As concentrações plasmáticas do cobre aumentam constantemente da infância à velhice. Provavelmente isto se deva ao declínio da secreção biliar, e não ao aumento na absorção gastrointestinal de cobre, ao longo da vida (Pedrozo, M.F. M, 2003). A absorção do cobre ao longo do trato gastrointestinal pode ser modificada pelo pH, pelos macronutrientes presentes na dieta e por fatores patológicos (Doença de Wilson) (Pedrozo, M.F. M, 2003). 17 Principais Modificadores da Absorção Intestinal de Cobre MACRONUTRIENTES EFEITO OBSERVADO FIBRAS (Hemicelulose) ↓ CARBOIDRATOS (Frutose) ↓ PROTEÍNAS (Dieta de alto teor protéico) ↑ ÁCIDOS ORGÂNICOS (Aminoácidos polibásicos naturais) ↑ CÁTIONS DIVALENTES (Zn; Fe; Mo; Sn). ↓ ↓ ( absorção diminuída) ↑ ( absorção aumentada) TABELA II: Principais macronutrientes e seus efeitos sobre a absorção gastrointestinal do cobre. 1.3.3. Distribuição O cobre absorvido pela mucosa intestinal é transportado para o fígado pela via porta, ligado principalmente à albumina. Linder e cols (1988) consideram que a dose diária ingerida encontra–se entre 0,6 e 1,6 mg/dia, sendo absorvido cerca de 50% . O fígado é o principal órgão de distribuição dos mamíferos, sequestrando o cobre recém absorvido e redirecionando-o através do sangue para os outros tecidos. No 18 sangue, o cobre encontra-se distribuído entre os eritrócitos e plasma (Pedrozo, M.F. M, 2003). No homem, 80 a 90 % do cobre plasmático estão firmemente ligados à ceruloplasmina, enquanto o restante está ligado à albumina e a outros aminoácidos (Turnlund ,J.R, 1998 ). Nas Intoxicações agudas por cobre, o excesso se liga preferencialmente à albumina (Barceloux D.G.1999). No fígado o cobre é primariamente incorporado à fração solúvel, associando-se no citosol a: • Substâncias endógenas de altopeso molecular, não identificada completamente • Substâncias de peso molecular intermediário, provavelmente superóxido dismutase • Substâncias de baixo peso molecular, compostas principalmente por metalotioneína (Pedrozo, M.F. M, 2003). O transporte do fígado para os tecidos periféricos parece envolver a ceruloplasmina, a albumina, a transcuproína e os aminoácidos. (World Health Organization, 1998). A ceruloplasmina é sintetizada no fígado e nos rins, apresentando de 6 a 8 átomos de cobre fortemente ligados a ela. Acredita-se que a ceruloplasmina se ligue a receptores de membrana nas células de outros tecidos, os quais induzem uma alteração conformacional na proteína, promovendo a liberação dos átomos de cobre. Os níveis plasmáticos de ceruloplasmina são regulados pelo fígado (Pedrozo, M.F. M, 2003). 19 Em condições normais, as concentrações mais elevadas de cobre são encontradas na bile, no fígado, no cérebro, no coração e nos rins (Barceloux. D.G,1999). Os teores de cobre em indivíduo adulto normal encontram-se entre 18-45 mg Cu/g de peso seco (Barceloux, D.G,1999). Dietas deficientes em cobre diminuem a concentração de cobre hepático, de metalotioneína, e a atividade de cobre – zinco superóxido dismutase. A síntese de ceruloplasmina ativada pelo fígado é diminuída ou eliminada em indivíduos que apresentam doença de Wilson (World Health Organization, 1998). 1.3.4. Excreção A bile constitui a principal via de excreção do cobre hepático em mamíferos, representando o principal mecanismo de homeostase do organismo. Aproximadamente 80 % do cobre que deixa o fígado é excretado via bile. A excreção urinária não é relevante, somente 30 a 60 ug por dia são eliminados por esta via por indivíduos adultos (Turnlund J.R., 1998). A meia-vida biológica do cobre no sangue após a ingestão de 0,29 mg de cobre variou entre 13-33 dias. Em criancas, o tempo de retenção do cobre sanguíneo foi estimado em 2,3 dias (Raghunath, R. e cols, 1997). Desordens genéticas estão associadas à deficiência no transporte hepatobiliar de cobre e ao acúmulo hepático do metal na Doença de Wilson (degeneração hepatolenticular) (World Health Organization, 1998). 20 O uso de agentes quelantes como a D-penicilamina favorece a excreção do metal. Este quelante é utilizado para reduzir as concentrações tóxicas de cobre em pacientes com Doença de Wilson (Pedrozo, M.F.M., 2003). 1.3.5. Essencialidade Até 1928, sabia-se que o cobre era constituinte da hemocianina (pigmento responsável pelo transporte de oxigênio em invertebrados). Após esta data foi reconhecido como elemento essencial para os vertebrados, quando se demonstrou que a anemia de ratos alimentados somente com leite podia ser corrigida pela adição de cinzas de origem animal e vegetal que continham sulfeto de cobre. (Uauy, R. e cols,1998). A essencialidade desse metal deve-se à sua incorporação a um grande número de enzimas e proteínas estruturais. O papel do cobre nas atividades enzimáticas de oxi-redução se deve à sua habilidade em funcionar como um elétron intermediário de transferência. Em alguns processos é requisitado como co-fator, em outros, com componente alostérico, conferindo estrutura apropriada para a ação catalítica. E o principal componente do centro catalítico de diversas enzimas redox e sua presença é essencial para processos fisiológicos normais, como respiração celular, síntese de melanina, biossíntese de tecido conectivo, defesa contra radicais livres e metabolismo de ferro intracelular (Pedrozo, M.F.M., 2003). 21 Principais Cuproenzimas com Atividade Oxidativa e Redutora no Homem ENZIMA FUNÇÃO Citocromo-C oxidase Transporte de elétrons, oxidase intestinal Superóxido dismutase Destruição do radical superóxido, dismutação Catecol oxidase Síntese de melanina Lisil oxidase Colágeno, elastina cross-liking Ceruloplasmina Transporte de cobre, oxidação (furoxidase) Aminoxidases Desaminação de aminas primárias Dopamina-b-monoxigenas Síntese de norepinefrina Peptilglicina monoxigenase α - amidação de neuropeptídeos FONTE: Uauy e cols (1998) TABELA III: Principais cuproenzimas com atividade oxidativa e redutora no homem. Assim como outros metais, o cobre desempenha um papel importante na regulação da expressão gênica. O mecanismo de regulação transcriptacional se deve à ligação do cobre a promotores de metalotionína. (Uauy, R. e cols, 1998). O cobre é essencial para a utilização de ferro na formação da hemoglobina e na maturação de neutrófilos (World Health Organization, 1998). 22 1.4. O benéfico papel do cobre no corpo humano 1.4.1. Cérebro O cobre é essencial na formação do cérebro e do sistema nervoso. Também cumpre uma função na criação de neurotransmissores e mensageiros químicos, que facilitam a comunicação entre as células nervosas e o movimento dos impulsos nervosos ao longo dos nervos. 1.4.2. Coração e os Vasos Sangüíneos O cobre ajuda a manter a elasticidade dos vasos sangüíneos, o que permite a manutenção de uma pressão arterial adequada. A aorta – principal e maior artéria do corpo que sai do coração – não desempenha seu papel adequadamente se houver deficiência de cobre. É preciso do cobre para um saudável funcionamento e tonicidade muscular, pelo que também cumpre um papel fundamental no coração. 1.4.3. Pele O cobre tem um papel importante na formação de colágeno, um tecido conectivo da pele. Colágeno é a proteína mais freqüentemente encontrada na pele humana e é importante na manutenção de uma aparência – suave, saudável, sem rugas – em nosso rosto e em diversas áreas do corpo. 23 1.4.4. Sistema Imunológico É preciso do cobre para manutenção de um sistema imunológico saudável que proteja o corpo de microrganismos de doenças. Um forte e agressivo contingente de soldados anti-microrganismos que incluem glóbulos brancos (que limpam o material externo), anticorpos (moléculas de proteínas), citosinas (mensageiros químicos), linfócitos B (produzem anticorpos) e linfócitos T (células imunes), mantêm o corpo saudável e livre de doenças. 1.4.5. Ossos O papel vital do cobre na formação de colágeno é fundamental para a formação, saúde e reparação dos ossos. O colágeno é o fator principal que incide na rigidez, força mecânica e competência de um osso. De fato, os estudos em animais mostram que as fraturas dos ossos, anormalidades do esqueleto e osteoporose ocorrem quando existe uma deficiência de cobre (Instituto Procobre Brasil, 2008). 1.5. Patologia do cobre 1.5.1. Toxicidade do Cobre A necessidade de cobre nos vários órgãos ou nos sistemas do organismo é regulada por mecanismos de controle homeostáticos. A toxicidade do cobre ocorre quando tais mecanismos de controle dentro de um determinado compartimento são sobrecarregados e/ou quando os mecanismos de reparo celular estão deteriorados (Pedrozo, M.F.M., 2003). 24 O cobre que não está ligado a uma proteína é tóxico (Instituto Procobre Brasil, 2008). O cobre, quando em excesso, promove as seguintes reações adversas: • Deslocamento do metal de seus sítios de ligação, resultando em alterações nas membranas, como despolarização e dano aos receptores ou moléculas transportadoras; • Ligação do cobre a macromoléculas como DNA ou enzimas contendo grupamento sulfidrilas, carboxilas ou imidazólicos, resultando em dano protéico, alterações funcionais decorrentes do grande número de enzimas dependentes de cobre; • Dano celular (perda da integridade celular) devido à produção de oxirradicais pelareação de Fenton: Cu++ + H2O2 Cu+2 + OH- + OH- (Pedrozo, M.F.M. 2003). Alterações funcionais e estruturais do sistema imune e dos órgãos linfóides ocorrem durante a deficiência de cobre. Alterações na resposta dos anticorpos e na função e número de linfócitos B foram demonstrados através de dados experimentais e em humanos (Omara, F.O. e cols, 1998). As manifestações decorrentes da deficiência do metal incluem disfunção cardíaca, aumento de lipoproteínas de baixa densidade, diminuição da metionina e encefalinas leucínicas, diminuição do cobre-zinco superóxido dismutase eritrocitária e diminuição da depuração de glicose (Pedrozo, M.F.M. 2003). 25 1.5.2. Síndrome Tóxica A toxicidade aguda decorrente da ingestão de cobre não é freqüente em seres humanos, sendo usualmente relacionada à ingestão acidental ou intencional e à contaminação de bebidas (World Health Organization, 1998). Vários casos de exposição aguda única foram relatados na literatura. Tais relatos referem-se ao uso de sulfato de cobre nas doses de 0,4 a 100 mg Cu e os sintomas apresentados foram vômitos, sensação de ardência epigástrica, diarréia, melena, letargia, anemia hemolítica aguda, dano renal e hepático, neurotoxicidade, aumento da pressão sangüínea e freqüência respiratória (Barceloux, D.G, 1999). Níveis elevados de cobre inibem os grupos sulfidrilas das enzimas, tais como glicose-6-fosfatase e glutation-redutase, as quais são responsáveis por proteger o organismo contra danos provocados pelos radicais livres. A inibição da glicose-6- fosfatase leva à hemólise. A intoxicação aguda por cobre causa erosão do epitélio gastrointestinal associado à necrose centrilobular do fígado e necrose tubular dos rins (World Health Organization, 1998). A exposição aguda a poeiras e a fumos de cobre pode irritar os olhos, o nariz e a garganta, provocando tosse, espirros e sangramentos nasais. Os fumos metálicos podem promover a febre dos fumos, caracterizada por sintomas semelhantes à gripe, associados ao sabor metálico na boca, febre e calafrios, broncoconstrição e tosse (Barceloux, D.G. 1999). A exposição crônica pode levar a espessamento e esverdeamento da pele, dentes e cabelo. Pode-se observar também irritação das fossas nasais, úlceras e perfuração de septo, além de hepatoxicidade. 26 Como o cobre é um elemento essencial, há várias desordens no seu mecanismo de homeostase que resultam na sua deficiência ou toxicidade. Dentre elas, temos os distúrbios genéticos de Menkes e de Wilson (Pedrozo, M.F.M. 2003). 1.6. Síndrome de Menkes Foi detectada em 1962 em cinco crianças que sofriam de problemas de crescimento, de degeneração cerebral e do cerebelo, com tratamento mental em um aspecto específico dos cabelos (brancos, fragmentados, e com torções particulares) (Sartori, I.T.2004) É uma desordem recessiva ligada ao cromossomo X e que ocorre em aproximadamente 1 entre 200 mil nascidos vivos. As condições clínicas dos portadores desta síndrome relembram o estado de deficiência de cobre, caracterizada por anomalias ósseas, retardo mental severo, degeneração neurológica e óbito na infância. O gene relacionado a esta patologia, MNK (Xq13. 3), codifica 1.500 aminoácidos do tipo P relacionados à ATPase. A detecção dos portadores é difícil, já que são fenotipicamente normais. O cobre acumula-se em algumas células renais e placentárias, refletindo a marcante redução na primeira fase de transporte do cobre do sangue ao fígado, após a absorção, impossibilitando a incorporação do metal às enzimas cobre específicas (Cordano, A.1998). Ao nascer a criança parece normal, porém sofre rápida deteriorizacão neurológica, desencadeando poucos movimentos (hipotonia), queda anormal da temperatura do corpo, déficit no crescimento, retardo mental e um sinal peculiar de cabelos de aço (Sartori, I.T. 2004). 27 Frente a esta síndrome, o pesquisador Daniel Chutorlanscy, médico formado em psiquiatria pela Universidade Federal Fluminense, com especialização em psicoterapia, imunologia e medicina ortomolecular, autor do texto científico “Síndrome de Menkes”, propõe o tratamento alternativo terapêutico com ingestão diária de grandes quantidades de castanha-do-pará e antioxidantes pela via oral, o quadro clínico do paciente declina rapidamente. O tratamento habitual descrito prescreve a utilização de sais de cobre por via endovenosa ou subcutânea (Sartori, I.T. 2004) 1.7. Síndrome de Wilson 1.7.1. História da Doença A Doença de Wilson foi descrita pela primeira vez em 1912 pelo neurologista Kinnier Wilson (1878-1937) como uma degeneração hepatolenticular progressiva. Wilson descreveu uma síndrome familiar caracterizada por cirrose e degeneração lenticular. Ele uniu seis descrições prévias a seis casos próprios. Já naquela oportunidade, apontou os sintomas psiquiátricos como componentes importantes no quadro clínico, embora não os considerasse como integrantes necessários da doença. (Rodrigues, R.B. 2005) Na publicação clássica de Kinnier Wilson (1912) a doença é descrita como: “Degeneração Lenticular Progressiva”, uma doença neurológica associada com cirrose hepática. Anteriormente, Westphal (1883), Strumpell (1898) e Gowers (1906) haviam descrito desordens neurológicas similares, mas sem terem feito a associação com a cirrose. Rumpell, em 1913, demonstrou concentrações elevadas de cobre no fígado e 28 no cérebro de pacientes acometidos. Em 1952, Scheinberg e Gitlin encontrou níveis reduzidos de ceruloplasmina sérica, a enzima ligadora do cobre e postularam que o erro primário decorria na síntese defeituosa de ceruloplasmina (Rodrigues, R.B. 2005). 1.7.2 Genética Esta doença é uma desordem genética recessiva e autossômica rara, que interfere com o metabolismo de cobre (Ala, A. E. cols, 2007). Para a transmissão, ambos os pais devem ser portadores de um gene da Doença de Wilson, que passa para a criança afetada (Rodrigues, R.B., 2005). São necessários dois genes anormais para apresentar a doença. O gene responsável está localizado precisamente num local conhecido como cromossomo 13, na região 13q14. O gene é chamado de ATP7B. Muitos casos da doença de Wilson ocorrem devido à mutação espontânea do gene. Um número significativo de casos é simplesmente transmitido de geração para geração. Muitos pacientes não têm uma história familiar de doença de Wilson. As pessoas com apenas um gene anormal são chamadas de portadoras. Elas não desenvolvem a doença e nem precisam de tratamento (wilsondisease.org, 2008). Mais de trinta diferentes mutações têm sido identificadas. Portanto, fica difícil desenvolver um único e específico teste genético para a doença. No entanto, numa determinada família, se a mutação especifica é identificada, um diagnóstico genético é possível. Isso pode ajudar a identificar um parente assintomático de modo a que ele seja tratado antes que fique doente ou fisicamente prejudicado. Atualmente, ainda não existe um teste genético amplo ou um diagnóstico pré- natal (Rodrigues, R.B. 2005). 29 1.7.3. Hereditariedade A Doença de Wilson predomina em pessoas jovens, com 60 a 70% dos acometidos procurando cuidados médicos entre os 8 e 20 anos, sendo mais rara antes dos 3 e após os 40 anos (Hortêncio, A.P. B. e cols, 2001). Estima-se que a prevalência de indivíduos homozigotos com o gene da doença, seja de aproximadamente 1 a cada 30 milhões de pessoas, e a prevalência de heterozigotos seja de 90 por milhão, sendo assim considerada uma das doenças genéticas autossômicas recessivas mais prevalentes (Moreira, D.M. e cols, 2001). Como a Doençade Wilson é hereditária recessiva, é preciso receber um gene de cada um dos pais para se ter a doença (chance de 25%) (Associação Brasileira de Doença de Wilson, 2008). 1.7.4 Ceruloplasmina É uma glicoproteína carregadora, produzida pelo fígado, responsável pelo transporte do cobre plasmático. Sua concentração no soro aumenta quando o cobre ligado à albumina diminui. A ceruloplasmina apresenta, para cada molécula, de 6 a 8 átomos de cobre fortemente ligados a ela. O papel da ceruloplasmina não é muito conhecido e parece não ser só de transporte, existe evidência que ela pode ter propriedades anti-radicais livres e oxidantes. A concentração de ceruplasmina no soro varia de acordo com a fisiologia e patologia. 30 Hipercupremia: é usualmente observada durante a gravidez, com concentrações de ceruloplasmina no soro atingindo valores duas vezes maiores no parto do que encontrados em mulheres não grávidas. Concentrações extremamente elevadas de ceruloplasmina e de cobre têm sido encontradas em vários linfomas, particularmente na doença de Hoggkin, infarto do miocárdio, tireotoxicose e infecções agudas e crônicas. Hipocupremia: observada na síndrome de má absorção protéica, nefrose, na doença de Wilson, devido à alta perda de cobre na urina e na doença de Menkes que está associada à hipoceruloplasminemia acentuada (Sartori, I.T. 2004). 1.7.5 Patologia da Doença Nos doentes de Wilson, o cobre começa a se acumular logo após o nascimento, devido às baixas concentrações de ceruloplasmina sérica. O primeiro lugar que o cobre compromete é o fígado. Em cerca de metade dos pacientes com doença de Wilson, o fígado é o único órgão afetado. As alterações físicas no fígado são visíveis apenas no microscópio. Quando a doença evolui, sempre se pensa que os doentes têm uma hepatite infecciosa ou uma mononucleose infecciosa, quando na verdade o que eles têm é a hepatite da doença de Wilson (Wilsondisease.org, 2008). 1.7.6 Sintomatologia A sintomatologia da doença relaciona-se aos órgãos em que ocorre o depósito progressivo e gradual de cobre nos tecidos (Rodrigues, R.B., 2005). 31 O excesso de cobre compromete o fígado e o cérebro, provocando hepatite e sintomas neurológicos e psiquiátricos. Os sintomas aparecem geralmente no final da adolescência (Wilsondisease.org, 2008). A sintomatologia polimorfa da Doença de Wilson observada, em parte, em outras patologias do Sistema Nervoso Central, depende do grande número de mutações que ocorrem e correlaciona-se com a localização das lesões decorrentes das alterações metabólicas. Os distúrbios neurológicos, segundo Barbosa e cols (2005), representam a forma inicial mais freqüente (54,4%), seguida de insuficiência hepática (31,1%) e alterações psiquiátricas (14,4%) (Brito J.C.F. e cols, 2004). Manifestações Clínicas: 1. Formas Hepáticas: • Hepatite Fulminante: caracteriza-se por icterícia progressiva, ascite e insuficiência hepática, manifestando-se geralmente em crianças ou adultos jovens. • Hepatite Crônica Ativa: manifesta-se entre os 10 e 30 anos, sendo caracterizado pela icterícia, aumento das aminotransferases e hipergamaglobulinemia. • Cirroses: onde as manifestações clínicas consistem em esplenomegalia, ascite, hipertensão portal e presença de aranhas vasculares (Rodrigues, R.B., 2005) 2. Neurológico: ataxia, tremores, diafagia, disartria, distonia, rigidez, prejuízo na coordenação motora fina, anormalidade de marcha e postura. 32 3. Hematológico: anemia hemolítica, coagulopatia, trombocitopenia (Teixeira, J.A, 2004). 4. Ocular: anéis de Keyser-fleischer (atualmente o termo anéis de KF refere-se à coloração marrom-dourada, marrom-esverdeada, amarelo-dourada ou bronze, alterações pigmentadas localizadas na membrana de Descemet, principalmente na região perilímbica na córnea), que caracterizam-se pela deposição de granulações de cobre de tamanhos e formas variadas na córnea e predominam na periferia corneana (Moreira, D.M. e cols, 2001) e cataratas em girassol. 5. Renal: diminuição da filtração glomerular, acidose tubular, nefrolitíase. 6. Psiquiátrico: demência, depressão, esquizofrenia, irritabilidade, agressividade. Os sintomas psiquiátricos são divididos em quatro grupos, na seguinte ordem de frequência: • Sintomas comportamentais/personalidade: como irritabilidade, agressividade, incongruência comportamental, atos autodestrutivos ou anti-sociais, desibinição e impulsividade são frequentemente relatados. • Sintomas afetivos: como labilidade afetiva, puerilidade, “emotionalism”, incongruência afetiva (discrepância entre o afeto e as circunstâncias ambientais) e estados depressivos são as manifestações mais constantemente relatadas. Muito menos frequentes são os quadros bipolares, que quase sempre ocorrem em pacientes com histórico familiar para este transtorno mental. Desordens de marcha parecem se correlacionar aos sintomas depressivos. • Sintomas cognitivos: como declínio intelectual de graus variáveis e alterações de consciência também são frequentemente relatados. Tais dados, entretanto, 33 devem ser interpretados com cautela, posto que as limitações motoras e disartrias podem mascarar os resultados das investigações. • Quadros esquizofreniformes. (Rodrigues, A, C.T. e cols 2003) 7. Digestiva: pancreatite, colelitíase. 8. Além de cardiopatias, hipoparatireoidismo, rabdomiólisese (Teixeira, J.A, 2004). Outras alterações: • As lúnulas das unhas apresentam coloração azul, devido à formação de depósitos de cobre; • Alterações ósseas que se constituem em desmineralização; • Hipoparatireoidismo, possivelmente devido ao acúmulo de cobre. • Outro órgão acometido é o rim, que apresenta alterações hidrópicas e esteatose, onde o cobre está acumulado. 1.7.7 Diagnóstico O diagnóstico da Doença de Wilson envolve a tríade clássica de achados clínicos, bioquímicos e moleculares e é feito de maneira relativamente simples (Teixeira, A T. 2004). Os exames de laboratório são principalmente o nível de cobre na urina de 24 horas (maior do que 60 microgramas/24h), o nível de cobre no sangue (menor que 60 microgramas/dL), a dosagem de ceruloplasmina no sangue; a verificação da existência do anel de KF nos olhos (nem sempre presente). Esse anel, quando presente, é sinal decisivo da doença de Wilson; pode ser invisível a olho nu, por isso é necessário o 34 exame com lâmpada de fenda por um oftalmologista. Estes exames são os principais e muitas das vezes bastam para o diagnóstico (Associação Brasileira da Doença de Wilson, 2008). Níveis séricos baixos de ceruloplasmina são encontrados em aproximadamente 90 a 95% dos pacientes com Doença de Wilson. No entanto, 15 a 25% das crianças e adultos jovens com a forma hepática podem exibir valores séricos baixos de ceruloplasmina, mas não evoluirão com a doença. A ceruloplasmina é uma glicoproteína produzida pelo fígado, responsável pelo transporte de 80 a 95% do cobre plasmático. É uma proteína de resposta de fase aguda, migrando na região alfa-2-globulina na eletroforese de proteínas (Rodrigues, R.B. 2005). 1.7.7.1. Espectrofotômetro de Absorção Atômica A diferença fundamental entre um fotômetro e um espectrofotômetro é a precisão, pois enquanto no fotômetro consegue-se isolar faixa de comprimento de onda superior à 20nm, no espectrofotômetro isola-se na faixa de 0,1nm. A Espectrofotometria de Absorção Atômica se resume em todos os átomos poderem absorver radiação, sendo os comprimentos de onda da radiação absorvida específicos para um determinado elemento químico. (Giorgeon, R.C. 1998)O Espectrofotômetro de Absorção Atômica consiste de: • Sistema de leitura; • Detector de radiação; • Fonte de radiação (lâmpada de cátodo oco); 35 • Monocromador; • Atomizador (chama forno de grafite, gerador de vapor e atomizador de sólidos). A lâmpada de cátodo oco consiste de um tubo de vidro contendo um cátodo (copo ou cilindro contendo o elemento químico para ser excitado) e um ânodo, podendo ser um anel situado na “boca” do cátodo, ou simplesmente um estilete colocado na sua lateral. Os átomos existentes dentro da lâmpada são excitados por processo de colisão e seu espectro de emissão é produzido. (Manual da qualidade – Laboratório de Pediatria- Setor Metais). 1.7.7.1.1 Espectrofotômetro de Absorção Atômica com Chama A Espectrofotometria de Chama é uma técnica analítica usada para análises qualitativas e quantitativas de um elemento presente em uma amostra. Nesta técnica, a amostra, na forma de um líquido homogêneo, é introduzida em uma chama onde reações térmicas e químicas criam átomos livres capazes de absorver, emitir ou fluorescer em comprimentos de ondas característicos (Giorgeon, R.C. 1998) O processo de absorção atômica com chama consiste em tornar a amostra em solução, aquecê-la a uma temperatura conveniente para dissociá-la em átomos no estado fundamental. Durante o processo, a amostra passa por um sistema de nebulização – chama - que tem a função de converter a amostra em solução em um “spray” de aerossol que será necessário para uma efetiva atomização. (Manual da qualidade – Laboratório de Pediatria- Setor Metais). 36 Combinações diversas de gases combustíveis e oxidantes têm sido propostas e são utilizadas nos fotômetros de Chama, no caso de cobre sérico o gás utilizado é o Acetileno e ar comprimido (Giorgenon, R.C. 1998). . • ACETILENO: C2H2 Risco Principal: Fogo Toxidez: simples asfixiante Inflamável • AR COMPRIMIDO: Risco principal: alta pressão Não é tóxico Inodoro 1.7.7.1.2 Espectrofotômetro de Absorção Atômica com Forno de Grafite Como o sistema de atomização por chama é simples, com excelentes resultados, porém o sistema de atomização por forno de grafite tem a possibilidade de determinar concentrações de vários elementos com sensibilidade de até 10.000 vezes mais baixas que os valores obtidos com a técnica de chama. (Manual da qualidade – Laboratório de Pediatria- Setor Metais). Embora haja diferentes tipos de fornos atomizadores, todos eles apresentam o mesmo objetivo fundamental, gerar uma população significativa de átomos no estado fundamental, de tal forma que a absorção atômica possa ser medida. O processo de obtenção daqueles átomos pode ser detalhado de uma forma muito simples em três estágios: 37 1. Estágio de Secagem: onde o solvente é removido da amostra. 2. Estágio de Carbonização: onde são removidas as moléculas orgânicas pesadas e o material inorgânico. 3. Estágio de Atomização: no quais os átomos no estado fundamental são gerados em uma zona de pequeno volume e coincidente com o caminho óptico do feixe de luz da fonte de radiação (Gonçalves, E.P. 1988). • ARGÔNIO: Ar Risco principal: alta pressão e sufocação Toxidez: simples asfixiante Inodoro (Giorgenon, R.C. 1998) 1.7.8. Outros exames 1.7.8.1 Dosagem de ceruloplasmina: • Princípio do método (NEFELOMETRIA): a ceruloplasmina contida no soro forma imunocomplexos numa reação imunoquímica como anticorpos específicos que dispersam a luz radiada. A intensidade da luz difusa depende da concentração da respectiva proteína na amostra. A avaliação faz-se comparando com um padrão de concentração conhecida em um nefelômetro. • Composição dos reagentes: os N-anti-soros são soros líquidos de origem animal obtidos em coelhos, utilizando-se ceruloplasmina humana altamente purificada. Um procedimento especial de estabilização elimina os componentes lábeis. As 38 impurezas microbianas são eliminadas, de forma considerável, através da adição de azida sódica (<1g/L) como conservante. • Valores de referência: 0,2 a 0,55 g/L • Pacientes com DW: abaixo de 0,2 g/L (Rodrigues, R.B. 2005) 1.7.8.2 Dosagem de Cobre Hepático: Eleva-se, podendo ocorrer o mesmo em uma variedade de desordens colestáticas, incluindo pacientes assintomáticos, sendo maior que 250 mg/g. Alguns pacientes heterozigotos também apresentam um aumento na taxa de cobre hepático (Teixeira, J.A ., 2004) 1.7.8.3 Exame com lâmpada de fenda: Os anéis de KF nos olhos não são específicos, podendo aparecer em pacientes sem a patologia e não aparecer em pacientes com a doença, porém na maioria dos pacientes com a doença, o anel de KF e a hipoceruloplasmina sérica confirma o diagnóstico. 1.7.8.4 Estágios mais avançados da doença: • Estudo genético; • Biópsia hepática; • Isótopos de cobre (cobre radiomarcado); • Determinação de Mutações (Teixeira, J.A, 2004). 39 NORMAL D. de WILSON CERULOPLASMINA 10-20mg/dl < 20mg/dl ELIMINAÇÃO URINÁRIA DE COBRE EM 24h < 60ug/24h > 60 ug/24h COBRE HEPÁTICO < 50 ug/g > 250ug/g COBRE SÉRICO TOTAL 70-140ug% < 60ug% COBRE SÉRICO LIVRE 5-10ug/dl > 25ug/dl Tabela IV: Parâmetros bioquímicos normais e na Doença de Wilson. Fonte: Gastroenterol Hepatol (2003). 1.7.9 Tratamento A doença de Wilson é facilmente tratável. Com a terapia adequada o desenvolvimento da doença pode ser interrompido e muitas vezes os sintomas podem ser revertidos. O tratamento visa remover o excesso de cobre acumulado e prevenir um novo acúmulo. É importante que o tratamento seja mantido para o resto da vida (Rodrigues, R.B. 2005). O tratamento farmacológico é baseado no uso dos queladores de cobre, visando a sua excreção. O transplante hepático é bem sucedido nos pacientes com falha hepática não responsiva ao tratamento médico. A doença era progressiva e fatal até 1951, quando o Dimercaprol, um agente quelante foi usado. Em 1956, John Walshe relatou o benefício da penicilamina oral, que revolucionou o tratamento da doença. Entretanto, alguns pacientes não toleraram a penicilamina e, em 1969, a trientina foi 40 introduzida como uma alternativa. O zinco foi usado pela primeira vez em meados dos anos 60, e ganhou reconhecimento nos pacientes assintomáticos, como terapia de manutenção, após um período inicial de tratamento com um quelante (Ala, A. e cols, 2007). Medicamentos: • D-Penicilamina: é considerado como padrão ouro. Este quebra o cobre, favorecendo sua excreção urinária. São necessárias várias semanas de tratamento para se observar alívio dos sintomas neurológicos e meses para melhorar a função hepática. A ocorrência de anemia aplástica impede o uso futuro do fármaco e a elastose perfurante pode ser irreversível. Deve ser feito a cada 3 meses exame de urina e de sangue para avaliar a toxidade e eficácia. Em gestantes não há comprovação de que ocorra alguma má formação do feto. • Trientina (Dicloridrato de Trietilenotetramina): Não possui efeitos colaterais graves. Muito mais caro que o anterior, aumenta a excreção urinária de cobre e interfere na absorção intestinal. É o fármaco mais seguro para iniciar o tratamento em pacientes assintomáticos. Constitui uma alternativa em casos de intolerância à D-Penicilamina. • Tetratiomolibdato: é um quelante extremamente potente do cobre, apropriado à redução aguda do mesmo em pacientes neurológicamente acometidos ou nos casos em que é necessária uma rápida perda de cobre. Limita a absorção de cobre por formar complexos com a albumina na luz intestinal (este complexo não 41 consegue ser absorvidopela luz intestinal) e também reduz a disponibilidade de cobre para a captação celular. O único efeito colateral é a depressão medular. • Acetato de Zinco Oral: Este induz a síntese da proteína de ligação de cobre, metalotioneína, pelas células GI (gastrintestinais), e a descamação subsequente das células da mucosa elimina o cobre do organismo. Este medicamento tem baixa toxidade, porém é um pouco lento na eliminação do cobre. Também é indicado para pacientes assintomáticos. • L-DOPA: proporciona melhora dos sintomas neurológicos. Outros meios de tratamento: • Medidas Alimentares: devem-se evitar alimentos ricos em cobre, como vísceras de animais, mariscos, frutos secos, chocolate, gelatinas, produtos de soja. Observar a água para ver se ela tem excesso de cobre e substituí-la por outra, porém só esta medida alimentar não é suficiente. • Transplante de Fígado Ortotópico: este é o tratamento indicado para a hepatopatia irreversível. A taxa de sobrevida para o procedimento aproxima-se de 70%. Não há publicado que exista recidiva da lesão hepática relacionada com o cobre em pacientes transplantados portadores da doença. Pacientes com doença de Wilson que realizaram o transplante podem apresentar amenorréia primária ou secundária devido à disfunção ovariana, além de terem predisposição a abortos espontâneos pelo excesso de cobre depositado no útero proveniente do plasma. • Hemodiálise: nos casos que se acompanham de insuficiência renal. 42 • Fisioterapia: para a reeducação da marcha, da escrita e dos movimentos em geral (Teixeira, J.A., 2004). 1.8 Curiosidades • Cobre na beleza: Está demonstrado que o cobre permite que nosso organismo possa utilizar a tirosina, um aminoácido que influi na pigmentação do cabelo e da pele, e cuja deficiência pode provocar a formação inapropriada da elastina (um dos componentes do tecido conjuntivo da pele). No processo de transformação de colágeno novo a colágeno amadurecido, têm um papel importante as enzimas, e para que estas cumpram sua função, necessitam da presença da vitamina C e do cobre, assim, para reduzir o risco de estrias e envelhecimento cutâneo, é importante incluir estes nutrientes na dieta diária (Instituto Procobre Brasil, 2008). • Cobre Bactericida: Os mecanismos antimicrobianos do cobre são complexos e ocorrem em diferentes formas, tanto dentro das células quanto nos espaços intersticiais entre as células. Um fator crítico responsável pelas propriedades antimicrobianas do cobre é a habilidade deste metal de aceitar ou doar facilmente seus elétrons (quer dizer, o cobre tem uma alta oxidação catalítica e alto potencial de redução). Esta propriedade química permite que os íons do cobre alterem as proteínas dentro das células dos microrganismos para 43 que as proteínas já não possam realizar suas funções normais. Os cientistas também observaram que o cobre é responsável por inibir o transporte eletrônico nas interações da parede celular, ligando o DNA e desordenando as estruturas helicoidais. Através destes mecanismos e outros, o cobre deixa inativos muitos tipos de bactérias, fungos e vírus. Realizaram-se estudos comparativos da eficácia antimicrobiana do cobre com alumínio, aço inoxidável, PVC e polietileno, nos quais se estabeleceu que não há evidências que indiquem que estas matérias possuam propriedades antimicrobianas. Durante os últimos anos, o estudo da eficácia antimicrobiana em diferentes superfícies de contato demonstrou claramente que o cobre e certas ligas de cobre deixam inativos vários dos tipos mais potentes de microrganismos, incluindo Escherichia coli O157: H7, Listeria monocytogenes, Campylobacter jejuni, Salmonella enteriditis, Legionella pneumophilia, Staphylococcus aureus resistente à Meticilina (MRSA) e gripe A (Instituto Procobre Brasil, 2008). • Cobre na gestação: O cobre é crucial para a ótima formação do cérebro e sistema nervoso de uma criança. O mineral é responsável pela produção e manutenção da mielina, o material que rodeia e protege as células nervosas e cerebrais. Além disso, o cobre desempenha uma função na fabricação de neurotransmissores, os mensageiros químicos que propiciam a comunicação entre as células nervosas. O cobre é necessário também para ajudar as mulheres grávidas a evitar a anemia. Tem um papel muito importante em ajudar a transportar o ferro para os tecidos. Já que o cobre está envolvido em muitos outros processos, como por exemplo, o 44 desenvolvimento de nervos e músculos, e o crescimento dos vasos sangüíneos, é muito importante assegurar os níveis adequados de cobre na dieta (Instituto Procobre Brasil, 2008). • Aplicação em doenças: • Alzheimer: Os doentes apresentam uma concentração de cobre inferior à habitual no tecido cerebral. Segundo estes cientistas, se o nível de cobre é muito baixo, a proteína β-amilóide (APP) que atua no equilíbrio do metabolismo celular deste mineral, não consegue realizar sua função e induz a formação de placas senis que destroem as células cerebrais, por isso, uma maneira possível de combater este mal seria subministrar algumas doses do metal vermelho a quem padece. • Gripe: Estudos mostram como o vírus da gripe A é quase completamente erradicada em seis horas em superfícies de cobre. • Vacas Loucas: De acordo a uma pesquisa publicada na revista italiana “Corriere della Salute”, a carência de cobre no ser humano e nos animais poderia ser a causa da doença de Creutzfeldt-Jakob e conduzem à hipótese de que a proteína priônica não possui um correto funcionamento graças à carência de cobre, o que produz como conseqüência a morte de células cerebrais (Instituto Procobre Brasil, 2008). 45 2. JUSTIFICATIVA A Doença de Wilson é uma desordem genética recessiva e autossômica rara, que interfere com o metabolismo de cobre. Esta doença ocorre em todo mundo, em todas as raças e nacionalidades, independente do sexo, com início entre os 11 e 25 anos de idade. Cerca de 75% dos casos permanecem não diagnosticados, justificando a necessidade de avaliar a etiologia da doença e a possibilidade de um diagnóstico prematuro, inclusive pelo agravo do comprometimento neurológico, quanto mais tardio for a descoberta. O objetivo dessa observação foi relatar a demanda de pedidos de exame para o elemento Cobre no Setor de Metais do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto – USP, por ser um Hospital terciário com atendimentos a casos de maior complexidade e que há dez anos vem dando o apoio no diagnóstico mais rápido nos casos da doença. Desenvolveu-se o método de dosagem de cobre na urina como suporte comprovativo e possibilidade de pesquisa seriada no conjunto familiar quando um caso é confirmado. 46 3. OBJETIVO Comparar o número de amostras de cobre na urina e no sangue recebidas e realizadas no Setor de Metais do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto – Universidade de São Paulo, nos últimos dez anos. Quantificar a demanda longitudinal no período e as Clínicas que solicitam o exame. Relacionar os valores fora da faixa referencial normal dos cobres urinários e séricos, como apoio diagnóstico para comprovação da Doença de Wilson. 47 4. MATERIAL E MÉTODOS Realizou-se uma quantificação retrospectiva a partir de anotações em cadernos de controles internos do Laboratório de Pediatria – Setor Metais do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto – SP nas amostras de sangue eurina recebidos e realizados rotineiramente no setor. O período analisado foi de janeiro de 1999 a junho de 2008. Os dados levantados obedeceram aos programas operacionais padronizados do Setor de Metais e a rotina estabelecida do Hospital das Clínicas. As análises de amostras de cobre sérico são realizadas por Espectrofotometria de Absorção Atômica (EAA) com Chama e para as amostras de cobre urinário é utilizado o EAA com Forno de Grafite Para a análise de cobre sérico, as amostras são coletadas em frasco isento de contaminação de cobre (tubo para soro, tampa vermelha-vacutainer) e o paciente deve estar com jejum de 8 horas. Já para a análise de cobre urinário, a amostra é de urina 24 horas, coletada em frasco plástico lavado previamente com ácido nítrico 30%. Ambas as amostras são conservadas em geladeira (4ºC) e as dosagens são realizadas semanalmente. Para o processamento das amostras de urina, realiza-se uma homogeneização, medindo o volume total e separando um pequeno volume (+ ou – 10 ml) em tubo cone. Posteriormente para a dosagem, feita sempre em triplicata por estar medindo concentrações ínfimas (ug/L), dilui-se a urina na proporção de 1:1, agitando vigorosamente (em Vortex), centrifuga-se em microcentrífuga de eppendorf a 13.000 RPM por 10 minutos e passa-se o sobrenadante para os flaconetes do carrossel do amostrador do forno de grafite onde é efetuada a leitura das amostras. A partir dos 48 resultados realizam-se cálculos corrigindo o valor do aparelho com a diluição e com o volume total da urina do paciente. Para o processamento de amostras de sangue, realiza-se uma centrifugação à 2500 RPM por 10 minutos separando o soro. Posteriormente para a dosagem, feita em duplicata, dilui-se o soro na proporção de 1:1 em tubo de polietileno, homogeniza-se e efetua a leitura no EAA – chama. A partir dos resultados realizam-se cálculos corrigindo a diluição (multiplica-se por 2 – diluiu 1/1 e por 100 para o resultado passar de ug/ml para ug% - vezes 200). Dosagem de Cobre Urinário • Princípio do método: a urina de 24h, é colhida em frasco lavado previamente com HNO3 a 30%, mede-se o volume total das 24 horas. Diluir com água Milli Q na proporção de 1:1 (500ul+500ul) e a concentração é determinada através da Espectrofotometria de Absorção Atômica com Forno de Grafite 640 Zeeman Varian em tubo pirolítico sem plataforma. Os resultados são fornecidos em microgramas por litro e convertidos conforme o volume para microgramas nas 24 horas. • Valores de referência: até 60 ug/24h • Pacientes com DW: acima de 60 ug/24h (Rodrigues, R.B. 2005) 49 Dosagem de Cobre Sérico • Princípio do método: O sangue coletado é diluído na proporção de 1:1 e a concentração é determinada através da Espectrofotometria de Absorção Atômica em Chama. • Valores de referência: 70 a 140 ug/% • Paciente com DW: abaixo de 60 ug/% (Rodrigues, R.B. 2005) Coleta do Material para Dosagem Soro: coletar em frasco isento de contaminação de cobre (tubo de tampa vermelha no sistema vacutainer), paciente em jejum de 8 horas. Urina: 24 horas, coletada em frasco plástico lavado previamente com ácido nítrico 30% (Sartori, I.T. 2004). Conservação da Amostra Refrigeração (4ºC): • Soro: 5 a 7 dias; • Urina: 15 a 20 dias. 50 Congelamento: • Soro: até 90 dias, ou indefinido, dependendo de armazenamento adequado. • Urina: até 90 dias. Interferentes da amostra Hemólise no soro ou plasma ou urina com coleta inadequada (Sartori, I.T. 2004) 51 5. RESULTADOS Foram recebidas no Laboratório de Pediatria – Setor de Metais do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto no período de janeiro de 1999 a junho de 2008, 1198 amostras de urina e 2857 amostras de soro (sangue) para dosagem do oligoelemento Cobre. Destas foram analisadas um total de 1134 (94,66%) amostras de cobre urinário e de 2819 (98,67%) amostras de cobre sérico. 0 1000 2000 3000 Amostras Recebidas Amostras Realizadas Cobre Sangue Cobre Urina FIGURA I: Comparação entre o número de amostras de cobre na urina e no sangue recebidas e realizadas no Setor de Metais do HCFMRP-USP nos últimos dez anos. 52 COBRE URINÁRIO Amostras Recebidas Amostras Realizadas 1999 99 96 2000 105 98 2001 120 108 2002 119 116 2003 113 108 2004 115 109 2005 130 124 2006 142 133 2007 164 154 2008 (182) (176) TOTAL 1198 1134 TABELA V: Relação anual das amostras de cobre urinário recebidas e realizadas de 1999 a 2008. 53 0 50 100 150 200 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 COBRE URINÁRIO Amostras Realizadas FIGURA II: Aumento da demanda anual de cobre urinário de 1999 a 2008 54 COBRE SANGUÍNEO Amostras Recebidas Amostras Realizadas 1999 408 405 2000 412 405 2001 388 377 2002 250 246 2003 225 217 2004 147 145 2005 150 150 2006 169 167 2007 216 216 2008 (984) (982) TOTAL 2857 2819 TABELA VI: Relação anual das amostras de cobre sérico recebidas e realizadas de 1999 a 2008. 55 0 200 400 600 800 1000 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 COBRE SANGÜÍNEO Amostras Realizadas FIGURA III: Aumento da demanda anual de cobre sérico de 1999 a 2008 Do total das dosagens de 1134 amostras de urina, 262 (23,1%) tiveram o resultado > que 60 ug/24h e do total das dosagens de 2819 amostras de sangue, 284 (10,1%) tiveram o resultado < que 60 ug%, sendo que várias dessas amostras são replicatas de dosagens seriadas (do mesmo paciente). COBRE URINÁRIO 23,10% 76,90% > 60ug/24h até 60 u/24h 56 FIGURA IV: Porcentagem de dosagens de cobre urinário nos últimos dez anos com valores normais e alterados. COBRE SANGUE 10,30% 14,44% 75,26% < 60ug% >140 ug% 70-140ug% FIGURA V: Porcentagem de dosagens com valores normais e alterados de cobre no sangue nos últimos dez anos. Os 23,1% de cobre urinário com dosagens acima de 60 ug/24h nos últimos dez anos correspondem a 86 pacientes diferentes, 48,8% são do sexo feminino e 51,2% do sexo masculino. 57 C OB R E U R IN A: > 60ug /24h 48,80% 51,20% M ulheres Hom ens FIGURA VI: Porcentagem de pacientes do sexo feminino e masculino com valores > 60 ug/24h de cobre na urina nos últimos dez anos. Quanto ao cobre sérico, podemos observar que 10,3% dos valores dosados são abaixo de 60 ug%%, e correspondem a 85 pacientes diferentes, 40% são do sexo feminino e 60% são do sexo masculino. C O B R E S É R IC O : < 60u g % 40% 60% M ulheres Hom ens 58 FIGURA VII: Porcentagem de pacientes do sexo feminino e masculino com valores < 60 ug% de cobre no sangue nos últimos dez anos. Das amostras recebidas no Setor de Metais do Laboratório de Pediatria, verifica- se que as Clínicas de origem prevalentes são a Gastroenterologia (responsável por 49,12% das amostras) seguida pela Neurologia (17,99% das amostras). O restante (32,89%) se distribui para dezenove demais Clinicas de demandas assistidas. CLÍNICAS DE ORIGEM DAS AMOSTRAS 49,12% 17,99% 32,89% GASTRO NEURO OUTRAS FIGURA VIII: Quantificação da demanda das Clínicas de Origem dos exames solicitados nos últimos dez anos.59 6. DISCUSSÃO E CONCLUSÃO A Doença de Wilson por acometer diferentes órgãos, pode ser confundida com outras patologias, observando-se que 32,09% das dosagens foram solicitadas pelas mais diversas Clínicas do Hospital. Deve-se pensar nesta doença quando houver hepatopatia crônica ou qualquer hepatite incomum, o que confirma os 49,12% de dosagens solicitadas pelos ambulatórios ou enfermarias da Gastroenterologia. É incluída no diagnóstico diferencial de adolescentes e adultos com manifestações neurológicas características, o que justifica nossa segunda clínica de maior demanda com 17,99% de pedidos de exames advindos da Neurologia. Não há preferência de sexo nesta enfermidade, havendo uma demanda com cerca de 50% de solicitações para homens e 50% para mulheres com resultados superiores à 60 ug/ 24h para o cobre urinário e resultados inferiores à 60 ug% para o cobre sérico, confirmando o diagnóstico laboratorial (ou bioquímico) para pacientes com a doença. Quanto ao número de amostras recebidas e realizadas concluímos que as margens de coletas impróprias ou inadequações não ultrapassam 3,3%, aceitável para quaisquer dosagens em laboratórios de Análises Clínicas de grande porte. O diagnóstico laboratorial com a dosagem de cobre sérico e cobre urinário deve ser realizado quando houver suspeita da doença. Verificou-se um aumento exponencial da demanda entre 1999 com 99 amostras recebidas para dosagens de cobre na urina frente a 182 amostras recebidas em 2008 (acréscimo de 91,7 %) Anteriormente a 1999 não havia no HCFMRP-USP equipamentos e metodologias para realização desses exames. Atualmente pode-se monitorar desde os 6 primeiros casos com diagnóstico confirmado em 1999 até os 24 pacientes que atualmente usam 60 o serviço para controles periódicos destes exames com finalidade de manutenção ou redução das doses de medicação (quelantes) ingeridas continuamente. 61 7. REFERÊNCIAS AGUILAR, F.P. Enfermedad de Wilson: consideraciones fisiopatológicas , clínicas y terapêuticas . Gastroenterol Hepatol 26(1): 42-51,2003. ALA, A.; WALKER, A.P.; ASHKAN, K. et al. Wilson’s Disease. Lancet. 369:397-408, 2007. 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