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Relato de um caso de déficit de repertório social Vol 2 DELITTI, M. (Org.) . Sobre comportamento e cognição. 218 222

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Capítulo 24
Relato de um caso de déficit de repertório 
social
C Uudni kc$in<i Si/v<i Pc/vint 
(Clínica privada)
1. Histórico
O cliente é do sexo masculino, nissei, tendo sido educado segundo as tra­
dições orientais. Tem 41 anos, casado, com um filho de 12 anos.
Mora com a esposa e o filho num apartamento. É músico trabalha num estúdio e 
numa escola de música.
Faz trilhas sonoras para propagandas e programas de TV.
Queixa Inicial
Relatou estar enfrentando problemas no relacionamento familiar e profissional, 
devido a dificuldade de estabelecer alguns limites, dar opiniões, ser firme nas decisões, 
falar “nâo" e principalmente por considerar-se incapaz de reverter este quadro. Tais
208 C U udlii Regina Silva Pereira
comportamentos levavam-no a um cotidiano confuso, repleto de afazeres e, deste modo, 
não reservava tempo para descansar ou fazer outras atividades.
Ex: Tem um contrato de trabalho de 20 horas semanais, porém trabalha o dobro 
do tempo estabelecido inclusive sábados e domingos, não recebendo hora extra e nenhum 
tipo de beneficio da empresa.
Recebe o pagamento todo mès atrasado e consequentemente atrasa suas dividas 
e nunca havia conseguido conversar com o chefe sobre esses assuntos.
Nos momentos de maior sobrecarga e confusão, conseguia manifestar-se de 
forma explosiva e agressiva.
Descreveu muitos sentimentos de desespero, angustia, desânimo; pouca vontade 
de trabalhar, sono excessivo, pensamentos carregados de auto depreciação e 
desvalorização do trabalho.
Ex: " Nada dá certo..., não sei o que fazer,por isso não tenho vontade de fazer
nada..."
" Estou sem ânimo para fazer as coisas,sô quero ficar dormindo..."
Mencionou uma vez ter pensado em suicídio.
Ex: “N5o agüento mais a minha vida, já pensei até em acabar com ela. "Mostrou 
também grande preocupação com alguns pensamentos que nomeava como 
“persecutórios “ em relação a equipe de trabalho Estes pensamentos atrapalhavam 
bastante seu desempenho no trabalho.
Ex:: "Eu nâo sei o porquê, mas toda vez que ele vem falar comigo tenho a 
sensação de que estou sendo passado para trás."
Frente a todas estas sensações e sentimentos, aparecia muito freqüentemente 
uma preocupação com a normalidade e com a loucura,o que evidenciava-se por perguntas 
como:
Ex: “Será que isso 6 normal? Será que nâo sou um louco?"
Mostrou por fim, uma grande preocupação com a questão financeira.pois 
encontrava-se bastante individado.
Procedimentos:
Diante do quadro observado, o primeiro procedimento utilizado foi transmitir-lhe 
informações sobre seus comportamentos encobertos. A explicação utilizada foi baseada 
na teoria de desamparo aprendido.
O principal objetivo desta explicação era fazer com que o cliente entendesse 
que seu estado emocional tinha relação direta com suas experiências de vida.
A partir destas informações,foi organizado um quadro de tarefas onde o cliente.no 
início, obrigou-se a fazer, e com o decorrer do tempo tais tarefas tornaram-se, segundo 
sua própria verbalização, atividades reforçadoras em sua vida.
Sobre comportamento e coflnlçüo 209
icaro
Realce
icaro
Realce
icaro
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As tarefas:
• Organizar todos os horários de trabalho e os horários disponíveis.
• Listar alguns trabalhos que poderiam ser encaixados nestes horários e entrar em contato 
com pessoas divulgando sua disponibilidade e interesse num novo trabalho.
• Organizar um material de apresentação do seu trabalho, fazer visitas mostrando esse 
material, telefonar e marcar algumas entrevistas.
• Listar as maiores dificuldades de contato ou nas entrevistas.
Durante o periodo em que organizava-se com as tarefas, foi convidado para 
fazer a trilha sonora de uma exposição de contos infantis. Convidou a terapeuta a participar 
da noite de estréia, mas o comparecímento foi impossibilitado e isso foi claramente 
explicado.
Com o tempo mais organizado e novos trabalhos surgindo,a preocupação com 
o lazer ficou evidente.Para tal preocupação.foi utilizado o mesmo procedimento das 
tarefas.
Com o aumento de propostas de trabalho e de contatos sociais.o cliente notou 
um déficit no seu repertório verbal e comportamental.
Ex: “Eu preciso aprender um novo jeito de falar, o que eu sei não adianta...”
“Eu preciso saber falar e valorizar o meu trabalho. Ele depende diretamente da 
minha propaganda. ”.
As dificuldades observadas nestas situações foram trabalhadas com sessões 
de “role playing" .treino assertivo e habilidades de comunicação, atentando sempre para 
as dificuldades, medos e sensações trazidas pelo cliente.
A modificação de seu repertório verbal, nestas situações, foi ficando cada vez 
mais evidente.( Neste momento os sintomas de depressão eram mínimos.)
Ex: Num jantar para negociar um novo trabalho, o cliente estabeleceu contrato 
de trabalho e comissão, não concordou com questões colocadas e valorizou seu trabalho.
Seus relacionamentos recentes eram caracterizados por uma participação ativa 
e decidida, enquanto que nos relacionamentos antigos ( família e antigo emprego ),tais 
características apareciam de formas mais sutis. Os motivos dessa diferença, as 
dificuldades e medos percebidos foram trabalhados com treino assertivo e levantamento 
de comportamentos alternativos.
O cliente trazia exemplos de situações reais, contava como havia se comportado 
e seus sentimentos. Eram questionados seus pensamentos e vontades,juntamente com 
o que gostaria de ter dito ou feito e o porquê de não ter conseguido.Estabeleciamos 
então,novas possibilidades de respostas que poderiam ser usadas nas próximas 
situações.
Exemplo de um diálogo cliente terapeuta onde o cliente conta uma discussão 
com a esposa:
Cliente: “Ontem tivemos uma discussão horrível,Ela disse que eu sou muito “trouxa” que 
todo mundo faz de mim o que bem entende e eu fíquei ouvindo, não conseguià responder 
nada.”
2 1 0 Claudia Resina Silva Pereira
icaro
Realce
Terapeuta: “Como vocô se sentia ouvindo isso?"
Cliente: "Muito mal, péssimo."
Terapeuta: "Tente dar um nome ao seu sentimento."
Cliente: “ Humilhação"
Terapeuta: "O que vocô sentiu e teve vontade de falar para ela?"
Cliente: 'Que é muito ruim ouvir isso, que ela me magoava muito e que ela podia aprender 
um jeito melhor de falar."
Terapeuta: "O que te impediu de falar?"
Cliente: "Achei que pudesse ser grosseiro e ela poderia se chatear."
Na semana seguinte a essa sessão, foi relatado que pela primeira vez havia 
conseguido falar sobre seus sentimentos com a esposa.
Todos os novos comportamentos aprendidos foram instalados lentamente. A 
partir desta nova conduta, ornava-se mais evidente a necessidade de aquisição de um 
repertório específico para responder às punições liberadas pelas pessoas frente a sua 
mudança.
Ex: "Além de mudar meu modo de ser, eu tenho que aprender a responder, quando eles 
falam que estou mudando para pior, que eu era muito mais sensível antes, que agora 
estou seco..."
Separou-se da esposa embora continue pagando todas as suas despesas 
(apartamento, água, luz, telefone, comida, roupa). Estes comportamentos foram 
escolhidos e assumidos frente a possibilidade da esposa, por motivos financeiros, mudar 
de cidade e assim afasta-lo do filho e também por considerar essa uma responsabilidade 
de pai. Optou ficar com este padrão, pelo menos por enquanto.
Ex: "Tenho medo de que ela tenha de tentar a vida em outro lugar e assim ficaria 
longe do meu filho. Isso eu não suportaria."
Ex: “Eu nâo imagino nâo prover tais coisas para meu filho"
A preocupação de ser sempre uma pessoa boa, que não nega nada para ninguém, 
que está sempre disponível, não é mais tão forte nos contatos de trabalho, porém aparece 
ainda na relação familiar.
Ex: "É inconcebível um pai e marido nâo ter a responsabilidade de manter a 
casa, a comida, a escola ...”
Estes conceitos que o homem deve manter afamília, ser o provedor, não aceitar 
que a mulher pague as contas, foram regras sociais incutidas sem serem analisadas 
pessoalmente.
Estas regras, que no início eram consideradas auto regras ,foram questionadas 
na terapia e gradualmente o cliente foi discriminando o que eram regras próprias, ou 
regras da cultura japonesa e familiar.
Os encobertos de auto desvalorização e sentimento de perseguição e exploração
Sobre comportamento e cormIç.Io 2 1 1
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da equipe de trabalho, também foram analisados pela discriminação do que era uma 
regra e do que era efetivamente uma contingência. O entendimento desta análise 
proporcionou a aceitação e recusa de várias situações e com isso, o cliente reorganizou 
seu contrato de trabalho, estabelecendo novos horários que fossem compatíveis com o 
salário e com seus novos empregos e recusou trabalhar nas horas extras e finais de 
semana a pedido do chefe.
Ex: Diante de um pedido do chefe para fazer hora extra, o cliente recusou e 
disse que só trabalharia nestas condições quando negociassem os valores a serem 
pagos pela horas trabalhadas.
Novas oportunidades de trabalho foram surgindo ao longo do ano e hoje ele 
trabalha em três lugares distintos; dois estúdios e uma escola de música e também toca 
numa banda de Jazz à noite em bares da cidade.
A terapia tem um ano e sete meses e continua em andamento. No meio do 
processo o cliente convidou a terapeuta para assistir a apresentação de sua banda num 
ba r. Ficou evidente sua emoção e satisfação ao poder mostrar o que considera ter de 
melhor: a música.
A emoção do cliente trouxe a terapeuta a lembrança da primeira sessão, quando 
ele se queixava de sua incompetência. Observar a mudança do seu repertório foi 
extremamente gratificante.
2 1 2 Claudia Reglim Silva Pereira
icaro
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