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TUMORES DO ESTÔMAGO Adenocarcinoma Gástrico Incidência e epidemiologia Por motivos desconhecidos, a incidência e a taxa de mortalidade do câncer gástrico têm sofrido acentuada queda nos últimos 75 anos em todo o mundo. A incidência de câncer gástrico caiu no mundo inteiro, mas permanece alta no Japão, China, Chile e Irlanda. O risco de câncer gástrico é superior nas classes socioeconômicas inferiores. As pessoas que migram de nações de alta incidência para as de baixa incidência permanecem suscetíveis ao câncer gástrico, enquanto o risco para seus filhos é próximo ao de seu novo país, achado que sugere que uma exposição ambiente, provavelmente que começa no início da vida, tem relação com o surgimento de câncer gástrico. Os carcinógenos da dieta são considerados o fator mais provável. Patologia Aproximadamente 85% dos cânceres de estômago são adenocarcinomas (tumor de origem epitelial: revestimento epitelial de glândulas ou ductos) e 15% são linfomas (tumor que envolve células sanguíneas e células relacionadas: tecido linfoide), bem como tumores do estroma gastrintestinal (GIST) e leiomiossarcoma (tumor com origem no músculo liso). Os adenocarcinomas gástricos podem ser divididos em 2 categorias: um tipo difuso, em que não há coesão celular, e as células individuais infiltram e espessam a parede gástrica sem formar uma massa bem definida; e o tipo intestinal caracterizado por células neoplásicas coesas que formam estruturas tubulares semelhantes ás glândulas. Os carcinomas difusos são mais comuns em pacientes mais jovens, ocorrem em todo o estômago (incluindo a cárdia), diminuem a elasticidade da parede gástrica (chamada linite plástica, ou aspecto em “bolsa de couro”) e têm pior prognóstico. Cânceres difusos apresentam adesão intercelular deficiente, principalmente como consequência da perda de expressão da E caderina. As lesões do tipo intestinal com frequência são ulcerativas, mais comuns no antro e na curvatura menor do estômago, e muitas vezes um processo pré-canceroso prolongado as precede, geralmente iniciado pela infecção pelo H. pylori. A incidência de carcinomas difusos não varia muito na maioria das populações, mas a do tipo intestinal tende a se concentrar nas áreas geográficas de alto risco, sendo menos comuns nas regiões que a incidência de câncer gástrico vem diminuindo. Portanto, diferentes fatores etiológicos estão provavelmente envolvidos nestes 2 subtipos. Etiologia A ingestão de altas concentrações de nitratos, presente em alimentos desidratados, defumados ou salgados, por períodos prolongados parece estar associada a um risco maior. Acredita-se que bactérias convertam esses nitratos em nitritos carcinogênicos. A ingestão de alimentos parcialmente decompostos, muito comum entre as classes menos favorecidas em todo o mundo, pode ser responsável pela introdução exógena de bactérias. Outras bactérias como o H. pylori também podem contribuir para esse efeito ao causar gastrite crônica, perda da acidez gástrica e proliferação bacteriana no estômago. O efeito da erradicação do H. pylori no risco subsequente de câncer gástrico em áreas de alta incidência da doença está sendo investigado. A acidez pode diminuir após a retirada cirúrgica das células produtoras de ácido do antro gástrico para controle da doença ulcerosa péptica benigna. Outras causas de perda de acidez em idosos são a acloridria, gastrite atrófica e até anemia perniciosa. Na gastrite atrófica, endoscopias seriadas documentaram substituição da mucosa gástrica comum por células do tipo intestinal, processo chamado de metaplasia intestinal que pode ocasionar a atipia celular, e mais tarde, neoplasia. É possível que a melhora na preservação dos alimentos e a disponibilidade de refrigeração para todas as classes socioeconômicas tenham diminuído a ingestão de bactérias exógenas na dieta. O H. pylori não foi associado á forma mais proximal, difusa, de carcinoma gástrico. Vários outros fatores etiológicos estão associados ao câncer gástrico. As úlceras gástricas e os pólipos adenomatosos já foram implicados algumas vezes, mas os dados em favor de uma relação de causa e efeito são duvidosos. A dificuldade na diferenciação clínica entre úlceras gástricas benignas e pequenos carcinomas ulcerados pode explicar em parte essa suposta associação. A hipertrofia extrema das pregas gástricas (doença de Ménètrièr), dando a impressão de lesões polipoides, está associada a elevada frequência de transformação maligna. No entanto, essa hipertrofia não representa a presença de pólipos adenomatosos verdadeiros. Os indivíduos do grupo sanguíneo tipo A apresentam maior incidência de câncer gástrico que os indivíduos do grupo sanguíneo O, observação que pode ter relação com diferenças na atividade secretora da mucosa que a proteção que ela oferece contra carcinógenos. A mutação germinativa do gene E-caderina, que codifica uma proteína de adesão celular tem transmissão autossômica dominante e está associada a elevada incidência de cânceres gástricos oculto do tipo difuso em portadores jovens assintomáticos. As úlceras duodenais não estão associadas ao câncer gástrico. Considerando o modelo da carcinogênese em etapas, K-ras parecem ser eventos iniciais do câncer gástrico do tipo intestinal. A expressão de C-met é amplificada em aproximadamente um para cada cinco casos e está correlacionada com o estágio avançado. Aproximadamente metade dos tumores do tipo intestinal apresentam mutações nos genes supressores de tumores como TP53, TP73, APC (polipose adenomatosa coli), TFF (família do fator trefoide), DCC (deletados no câncer de colo) e FHIT (tríade de histidina frágil). A superexpressão de ciclina E está associada à progressão da displasia. Alterações epigenéticas (especialmente metilação aumentada) têm sido correlacionadas com um risco mais elevado de doença invasiva. A beta-catenina tem sido encontrada no núcleo de células tumorais na margem invasiva da lesão. Manifestações clínicas Os cânceres gástricos superficiais e curáveis cirurgicamente geralmente são assintomáticos. Á medida que o tumor se estende, os pacientes podem apresentar desconforto abdominal superior insidioso que varia de plenitude pós-prandial vaga a dor intensa e constante. A anorexia, muitas vezes acompanhada de náuseas leves, é muito comum mas não costuma ser a queixa que traz o paciente ao médico. Às vezes, há perda de peso. As náuseas e os vômitos são mais acentuados nos tumores do piloro, e a disfagia e a saciedade precoce podem ser os principais sintomas nas lesões difusas que se originam na cárdia. Não há sinais físicos precoces. Uma massa abdominal palpável indica um longo período de evolução e sugere extensão regional. Os carcinomas gástricos se disseminam por extensão direta através da parede gástrica para os tecidos perigástricos, as vezes aderindo a órgãos adjacentes, como pâncreas, colo ou fígado. A doença também se difunde pelos vasos linfáticos ou se implanta nas superfícies peritoneais. Metástases para os linfonodos intra-abdominais ou supraclaviculares são frequentes, assim como os nódulos metastáticos nos ovários (tumor de Krukenberg), na região periumbilical (“nodo da irmã Maria José”) ou no fundo de saco peritoneal (prateleira de Blumer, palpável ao toque retal ou vaginal). Também pode ocorrer ascite maligna. O fígado é o local mais comum de disseminação tumoral hematogênica. A presença de anemia ferropriva em homens ou de sangue oculto nas fezes em ambos os sexos exige a pesquisa de lesão oculto do trato gastrintestinal. Uma avaliação cuidadosa é especialmente importante em pacientes com gastrite atrófica ou anemia perniciosa. Algumas manifestações clínicasincomuns, que podem estar associadas ao adenocarcinomas gástricos, são: tromboflebite migratória, anemia hemolítica microangiopática, ceratose seborreica difusa (conhecida como sinal Leser-Trèlat) e acantose nigricans. Diagnóstico O exame radiológico de duplo contraste é o mais simples dos métodos diagnósticos usados para avaliar pacientes com queixas epigástricas. O uso da técnica de duplo contraste ajuda a detectar pequenas lesões ao melhorar a visualização de detalhes da mucosa. Durante o exame radiológico, é necessário distender o estômago, pois a diminuição da distensibilidade pode ser o único sinal de um carcinoma infiltrante difuso. A detecção das úlceras gástricas pode ser bastante precoce, mas é difícil distinguir radiograficamente entre úlceras malignas e benignas. A localização anatômica da úlcera não representa por si só uma indicação da presença ou ausência de câncer. As úlceras gástricas de aspecto radiográfico benigno trazem problemas especiais. Alguns médicos acreditam que a gastroscopia não é obrigatória se o aspecto radiológico for típico de benignidade, se cicatrização completa for visualizada a radiografia em 6 semanas, e o aspecto a radiografia contrastada for normal após vários meses. No entanto, recomendamos a biópsia gastroscópica e a citologia de material escovado em todos os pacientes com úlcera gástrica, para excluir câncer. As úlceras gástricas malignas têm de ser identificadas antes que penetrem nos tecidos adjacentes, pois a taxa de cura de lesões precoces limitadas a mucosa ou submucosa é superior a 80%. Como os carcinomas gástricos são difíceis de serem diferenciados clinica ou radiologicamente dos linfomas gástricos, as biópsias endoscópicas devem ser as mais profundas possíveis devido à localização submucosa dos tumores linfoides.