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simbolismo e modernismo

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Prévia do material em texto

Literatura Portuguesa: 
Poética
Do Simbolismo ao Modernismo
Material Teórico
Responsável pelo Conteúdo:
Prof. Dr. Manoel Francisco Guaranha
Revisão Textual:
Profa. Ms. Silvia Augusta Albert
5
•	Introdução
•	Simbolismo em Portugal
•	O Modernismo português
Para que você tenha um ótimo aproveitamento, é importante que leia o texto com bastante 
atenção, mais de uma vez e, se possível, sublinhando as informações mais importantes. 
Além disso, observe bem as imagens apresentadas, pois elas ilustram as principais informações 
do texto e poderão te ajudar no entendimento dos principais conceitos.
Veja a apresentação narrada e a representação visual que fizemos do conteúdo. Dessa 
maneira, você entrará em contato com o material de formas diferentes e poderá absorver as 
informações com maior facilidade. 
Não se esqueça de fazer as atividades. Esta unidade possui um exercício de múltipla escolha 
de autocorreção e um fórum, no qual esperamos sua participação. 
Lembre-se, as atividades ajudam você a estudar e fixar os conteúdos.
Não deixe para última hora!
Nesta unidade, você conhecerá os movimentos artísticos dos 
séculos XVIII e XIX que refletem um momento da história de 
grandes transformações políticas, sociais, econômicas e culturais.
Do Simbolismo ao Modernismo
6
Unidade: Do Simbolismo ao Modernismo
Contextualização
O Simbolismo do final do século XIX representa, sob muitos aspectos, um prenúncio do 
Modernismo. Isso porque se trata de uma concepção de arte que foge àquele tipo de representação 
objetiva que fora proposta pelo Realismo, contaminado que estava este movimento pelos 
procedimentos científicos que valorizam formas mais racionais de representação da realidade.
Ao explorar o mundo inconsciente, valorizar a sugestão, a musicalidade e os procedimentos 
sinestésicos (fusão dos vários sentidos, de forma simultânea, para dar conta de conhecer 
aspectos da realidade que fogem à rigorosa observação e experimentação dos procedimentos 
científicos) abre-se uma porta para a abstração, para a pesquisa estética que iriam desaguar 
nos vários movimentos de Vanguarda do início do século XX: Futurismo, Cubismo, Dadaísmo, 
Expressionismo, Surrealismo entre outros.
Em Portugal, pode-se dizer que o Simbolismo funde-se com o Modernismo, já que o maior 
poeta simbolista lusitano, Camilo Pessanha, foi muito respeitado por Fernando Pessoa, ícone 
do Modernismo naquele país. Também podemos dizer que o próprio Pessoa apresenta muitos 
elementos simbolistas em suas obras. Entre eles, o poema “Opiário” atribuído a um heterônimo, 
Álvaro de Campos, em que aparecem elementos temáticos decadentistas, o tédio, a atração 
pelo Oriente, entre outros.
Também podemos dizer que a Revista Orpheu e, consequentemente, o Orfismo, fazem 
parte dos movimentos de Vanguarda Europeia, pois aderem em certo sentido às propostas 
iconoclastas dessas tendências artísticas.
Esta contextualização pretende mostrar a você, caro aluno, que tudo está muito interligado e 
só didaticamente separamos autores e períodos. Na verdade, é nos textos que essas tendências 
se concretizam e se fundem. Por isso, desejamos que você tenha interesse não apenas em 
esquematizar os aspectos de cada período, mas também em identificá-los nos textos e utilizá-los 
para compreender os efeitos de sentido que eles produzem nos poemas.
Também queremos conscientizá-lo de que selecionamos apenas os autores que consideramos 
mais representativos do período, dada a complexidade do tema e o tempo destinado à disciplina. 
Sugerimos que estude e conheça outros poetas desses períodos, como Mário de Sá-Carneiro, 
também responsável pelo Modernismo português, amigo de Fernando Pessoa, e poeta que 
sintetiza bem essa mistura de tendências da época.
7
Introdução
Nesta unidade, trataremos de dois períodos literários que se complementam: o Simbolismo e 
o Modernismo. Antes de entrarmos em detalhes sobre cada um desses movimentos, é necessário 
explicarmos um pouco o contexto histórico do final de século XIX e início do século XX.
Uma das marcas do final do século XIX foi a crise resultante dos problemas trazidos pela 
Revolução Industrial, entre eles, a instabilidade provocada pelo progresso material que trouxe 
consigo o signo da mudança. Além disso, os procedimentos positivistas para dar conta de 
compreender a realidade mostraram-se ineficazes. Se, por um lado, a ciência resolveu alguns 
problemas, por outro, surgiram muitos outros problemas decorrentes, inclusive, do próprio 
processo de desenvolvimento tecnológico, como a necessidade de consumo que não podia ser 
satisfeita de modo igual por todos os indivíduos. 
A filosofia do período começou a contestar o Positivismo. O reflexo dessa atitude fez-se sentir 
na arte por meio de um tipo de escrita que valorizava o inconsciente em lugar do racional; o 
abstrato em lugar do concreto; a sugestão em lugar da apresentação de verdades objetivas. Foi 
um momento em que o artista passou a duvidar da palavra como forma eficaz de representação 
da realidade. Nesse contexto, a música ganhou papel preponderante e a literatura ganhou 
um caráter reticente. Em busca da essência, espécie de Neoplatonismo, o simbolista passou a 
explorar todos os recursos de que a linguagem dispunha para evocar ideias.
Charles Baudelaire (1821-1867), precursor do movimento, em seu poema “Correspondências”, 
dá uma dimensão da busca simbolista:
A natureza é um templo onde vivos pilares
Deixam filtrar não raro insólitos enredos;
O homem o cruza em meio a um bosque de segredos
Que ali o espreitam com seus olhos familiares.
Como ecos longos que à distância se matizam
Numa vertiginosa e lúgubre unidade,
Tão vasta quanto a noite e quanto a claridade,
Os sons, as cores e os perfumes se harmonizam.
Há aromas frescos como a carne dos infantes,
Doces como o oboé, verdes como a campina,
E outros, já dissolutos, ricos e triunfantes,
Com a fluidez daquilo que jamais termina,
Como o almíscar, o incenso e as resinas do Oriente,
Que a glória exaltam dos sentidos e da mente. 
8
Unidade: Do Simbolismo ao Modernismo
Este texto nos dá bem a dimensão do que pretendia o artista do período. Ao dizer que a 
natureza é um templo, o sujeito poético resgata a dimensão sagrada desse espaço, a fusão 
entre o material e o espiritual, não no sentido religioso, mas no sentido de oposição entre o 
concreto e o abstrato.
Repare que, no primeiro quarteto, diz-se que o homem cruza esse bosque de segredos que é 
a natureza, mas as mensagens que ela emite são, para ele, insólitos segredos, ou seja, segredos 
estranhos. Já a natureza, esta observa o homem com olhares familiares. Em algum momento, 
o homem já esteve integrado à natureza e talvez não a consiga compreender mais porque se 
distanciou dela por meio da razão.
Acostumado a categorizar o mundo de modo racional e a compreendê-lo de modo artificial, 
como é o processo de construção do conhecimento proposto pela Ciência, o homem não percebe 
a profunda unidade que existe no universo. Ali “os sons, as cores e os perfumes se harmonizam” .
O próprio sujeito poético nos dá uma ideia de como resgatar essas “correspondências” entre 
as coisas. No primeiro terceto, predominam as sinestesias, figuras de linguagem decorrentes 
da fusão dos sentidos em uma mesma expressão: aromas frescos, aromas doces, aromas 
verdes. Vale lembrar que a sinestesia é um recurso linguístico que corresponde à necessidade 
de conhecimento e representação da realidade de um modo não compartimentado, artificial, 
como é feito pelo pensamento racional e, por extensão, pela Ciência.
Veja que, no final, o poeta cita elementos referentes ao Oriente, que são capazes de exaltar a 
glória, ao mesmo tempo, dos sentidos (carne) e da mente (espírito).
Não se tratando de uma espiritualidade religiosa, a proposta consiste em buscar a essência 
não necessariamenteem um mundo fora do nosso, mas a partir dos sentidos.
Note, ainda, que o sujeito poético não dá uma receita de como deve ser essa busca, sugere 
apenas, de modo simbólico, esses procedimentos.
Paul Verlaine, Stéphane Mallarmé, Arthur Rimbaud entre outros, juntaram-se a Baudelaire na 
luta contra as convenções poéticas. Com a publicação do “Manifesto Simbolista”, de Jean Moréas, 
em 1886, o termo Simbolismo começou a ser mais aplicado ao ambiente literário do período. 
 
 Explore
Saiba mais detalhes sobre o Simbolismo em:
•	 Dicionário de Termos Literários, verbete “Simbolismo”, de Fernando Guimarães: http://
www.edtl.com.pt/?option=com_mtree&task=viewlink&link_id=284&Itemid=2
•	 Itaú Cultural: Enciclopédia Itaú Cultural de Artes Visuais: http://www.itaucultural.org.br/
aplicExternas/enciclopedia_ic/index.cfm?fuseaction=termos_texto&cd_verbete=3841
Sobre as relações entre Simbolismo e Decadentismo, saiba mais em:
•	 Dicionário de Termos Literários, verbete “Simbolismo”, de José António Costa Ideias: http://
www.edtl.com.pt/index.php?option=com_mtree&task=viewlink&link_id=705&Itemid=2
9
Simbolismo em Portugal
Oficialmente, o Simbolismo em Portugal iniciou-se com a obra Oaristos, em 1890, de Eugênio 
de Castro. Oaristo significa colóquio sigiloso entre casais. Repleto de musicalidade, rimas e 
palavras raras, no prefácio o autor apresenta sua ideia sobre o que seria o Simbolismo.
 
 Explore
Tenha acesso à leitura do livro Oaristos em: http://bibliotecajoanina.uc.pt/obras_raras/oaristos
Saiba mais sobre Oaristos lendo o artigo “Eugênio de Castro no contexto da “Internacional 
Simbolista”, de José Carlos Seabra Pereira e Maria de Jesus Cabral da Universidade de Coimbra . 
O endereço eletrônico é: http://revistas.ua.pt/index.php/Carnets/article/viewFile/1391/1267
A seguir, vamos estudar um dos poetas mais representativos do simbolismo em português: 
Camilo Pessanha
O poeta mais representativo do Simbolismo em português foi Camilo Pessanha (1867 – 
1926). Depois de se formar em Direito na Universidade de Coimbra, em 1891, estabeleceu-
se em Macau como professor de Filosofia, em 1864. Homem de grande sensibilidade, ele 
isolou-se do convívio social e escreveu poemas, sonetos e ensaios sobre a China, publicados 
postumamente, em 1944. Embora tenha convivido, em Coimbra, com poetas simbolistas como 
Eugênio de Castro e Antônio Nobre, publicou poucos trabalhos em revistas e jornais. 
Poeta solitário, Pessanha refugiou-se no ópio e não se preocupava em divulgar seus textos, 
às vezes nem registrava por escrito seus poemas, contentando-se em guardá-los de memória. 
Os poemas do volume Clepsidra (1920), por exemplo, foram transcritos por um admirador, 
quando Camilo voltou a Portugal em férias.
 
 Explore
Biografia e texto de Camilo Pessanha
Camilo Pessanha é um dos poetas mais fascinantes da literatura portuguesa. Você pode saber mais 
a respeito dele no portal da Biblioteca Nacional de Portugal. Lá, você encontrará uma biografia 
completa, os textos e manuscritos do poeta. Endereço: http://purl.pt/14369/1/
A obra Clepsidra constituiu um marco não só na literatura simbolista, mas em toda a 
literatura portuguesa. A palavra Clepsidra vem do grego “kleps-udra”, que contém o verbo 
“kleptô” (roubar, enganar, dissimular) e o nome “udor” (água). Clepsidra significa “relógio de 
água”, usado para marcar o tempo atribuído aos oradores.
10
Unidade: Do Simbolismo ao Modernismo
A palavra tornou-se o símbolo temático camiliano que comporta dois aspectos fundamentais: 
tempo e discurso. 
Assim como a fluidez da água determina o tempo que o orador tem, a fluidez do discurso de 
Camilo Pessanha mimetiza o escoar do tempo, a volatilidade da palavra.
Tecnicamente, essa fluidez desenvolvida nos textos é identificada por meio de procedimentos 
caros aos Simbolistas, a saber: a musicalidade, a sinestesia, a sugestão e o acúmulo de imagens 
aparentemente desconexas.
O pequeno poema que abre o livro chama-se “Inscrição”. Breves considerações sobre ele nos 
mostram quantas possibilidades de análise estão sugestivamente contidas nos textos simbolistas 
Inscrição.
Eu vi a luz em um país perdido.
A minha alma é lânguida e inerme.
Oh! Quem pudesse deslizar sem ruído!
No chão sumir-se, como faz um verme...
Este poema introduz todos os demais e serve de prefácio ao livro.
A palavra Inscrição possui, entre outros menos pertinentes, os seguintes sentidos:
a) palavra ou frase que se grava em pedestais de estátuas, medalhas, vasos entre outros 
objetos usados para consagrar a memória de alguém ou de um fato; epígrafe;
b) frase ou citação que se escreve na fachada de prédios ou monumentos arquitetônicos, seja 
como decoração, seja para resguardar a sua história, seja como finalidade educativa ou 
edificante;
c) símbolo primitivo gravado ou pintado na rocha, caverna, pintura rupestre;
d) música: frase enigmática, normalmente em latim, colocada no início de cânones (cânone: 
tipo de composição polifônica em que uma melodia é contrapontada a si mesma, peça de 
canto coral em que as várias partes repetem a parte inicial, em tempos diferentes); lema;
e) etimologicamente, inscrição significa o próprio ato de escrever.
 
A ideia de “Inscrição” também pode ser tomada como Epitáfio – aquilo que assinala o lugar 
do corpo já despojado do elemento anímico, corroído pelos vermes, o lugar da morte, ausência 
de luz, ausência da alma.
O termo “Inscrição” sugere o lugar da permanência, por meio da ideia do epitáfio, da gravação 
nas estátuas e, ao mesmo tempo, o marco da efemeridade, na imagem do mesmo epitáfio. O poema 
pode ser considerado um epitáfio dos outros textos do livro, que falam frequentemente de morte.
11
A metáfora do país perdido também é ambígua: num primeiro sentido, pode ser tomado 
como uma referência a Portugal, se nos basearmos no fato de o poeta estar exilado; mas pode 
também ser considerada a própria terra em que ele se encontra, Macau, perdido, porque distante 
da sua terra natal e desconhecido, porque poucos o conheciam.
Num segundo sentido, esse país perdido pode ser a infância do poeta. Nesse caso, o desejo 
de regresso à terra natal pode ser interpretado como o desejo de regresso ao útero materno.
A conexão entre as palavras luz e alma, por um lado, e chão e verme, por outro, reafirma 
a tônica da mensagem: desejo de regressar à virtualidade da preexistência e um sentido de 
inadaptação ao mundo: (“a minha alma é lânguida e inerme”, ou seja, alma sem arma, indefesa); 
os adjetivos que qualificam a alma indiciam a abulia e a ataraxia que percorrem toda a obra, já 
que languidez é o estado de abatimento, de fraquezas físicas e psicológicas.
Glossário
Abulia: incapacidade de tomar decisões voluntárias, incapacidade relativa e temporária de iniciar 
o que quer que seja – etimologicamente irresolução, falta de vontade.
Ataraxia: para os pensadores céticos, epicuristas e estoicos, completa ausência de perturbações 
ou inquietações da mente, concretizando o ideal tão caro à filosofia helênica da tranquila e serena 
felicidade obtida por meio do domínio e da extinção das paixões, dos desejos e inclinações sensórias/ 
qualquer sensação, fugaz ou permanente de serenidade, tranquilidade, calma, comportamento 
apático diante de estímulos, indiferença/ estado obtido por meio de tranquilizantes. 
 
Os diferentes tempos verbais em um texto tão pequeno (vi = pretérito perfeito do indicativo; 
é = presente do indicativo; pudesse = pretérito perfeito do subjuntivo; sumir = infinitivo; faz 
= presente do indicativo) sugerem a intersecção, a fusão de planos temporais, certa ideia de 
sincronia ou atemporalidade que, se por um lado é característica do próprio discurso poético, 
por outro, liga-se ao título “Inscrição”: a fluidez do discurso mimetizado pela fluidez do tempo. 
Vamos,a seguir, analisar outro poema de Pessanha, em que destacamos a musicalidade, 
elemento caro aos simbolistas:
Violoncelo
Chorai, arcadas 
Do violoncelo, 
Convulsionadas.
Pontes aladas
De pesadelo...
De que esvoaçam,
Brancos, os arcos. 
Por baixo passam,
Se despedaçam, 
No rio os barcos. 
Fundas, soluçam 
Caudais de choro. 
Que ruínas, ouçam... 
Se se debruçam, 
Que sorvedouro! 
Lívidos astros, 
Soidões lacustres... 
Lemes e mastros... 
E os alabastros 
Dos balaústres! 
Urnas quebradas. 
Blocos de gelo! 
Chorai, arcadas 
Do violoncelo, 
Despedaçadas...
12
Unidade: Do Simbolismo ao Modernismo
É conhecida e muito comentada a influência de Paul Verlaine, simbolista francês (1844-
1896) sobre a poesia de Camilo Pessanha: Verlaine foi o poeta que em seu texto “Arte poética” 
proclamou “A música antes de tudo”, afinado com os demais simbolistas, Baudelaire e Mallarmé, 
na ideia de que a ambição da poesia era tornar-se música, embora com tonalidades diferentes.
Para Baudellaire, a música despertava sensações das mais diversas, favorecendo a criação 
de analogias entre os sentidos.
Mallarmé imaginou a sonoridade como um meio de nada dizer, a fim de se atingir o obscuro.
Para Verlaine, a música deveria sugerir, mas a música era desejada para que a linguagem se 
vaporizasse e se tornasse tão flexível, de modo que o verbo se transformasse na coisa voejante, 
ou na boa aventura esparsa ao vento.
Nesse ponto, podemos estabelecer a afinidade entre Pessanha e Verlaine: a diluição de 
contornos, que é uma técnica impressionista, aplicada à poesia por meio da musicalidade. No 
caso do poema “Violoncelo”, ela está tanto no título do poema quanto na sua construção. A 
música permite a associação de imagens como se verá a seguir.
O poema se constrói a partir de um som sugerido: “Chorai arcadas /Do violoncelo!”, que 
funciona como estímulo para uma série de associações. Arcadas significam, ao mesmo tempo, a 
passada repetida do arco sobre as cordas do violoncelo e uma série de arcos, que nos remete à 
imagem das pontes. Arcadas que num primeiro momento são aladas, desvinculadas do contato 
com a terra; e depois, no sentido de construção, aquelas por baixo da qual passam os barcos e 
se despedaçam. Novamente a imagem do rio e da desconstrução, a clepsidra que sugere o fluxo 
do tempo e seu esgotamento. O rio é uma imagem de destruição, agrega a imagem polivalente 
da água, mas ao mesmo tempo é o choro. 
 O jogo sonoro presentifica-se no poema por meio do efeito aliterativo das últimas 
estrofes, pelo jogo de consoantes vibrantes constritivas (obstáculo parcial) /r/, e oclusivas, /p/, /t/, 
obstáculo total.
Vejamos:
Lívidos astros, 
Soidões lacustres... 
Lemes e mastros... 
E os alabastros 
Dos balaústres!
Brancos, os arcos. 
Por baixo passam,
Se despedaçam, 
No rio os barcos
 
Urnas quebradas. 
Blocos de gelo! 
Chorai, arcadas 
Do violoncelo, 
Despedaçadas...
13
É muito importante perceber como os poemas de Pessanha mostram, claramente, os princípios 
e os procedimentos poéticos que foram a marca do simbolismo.
Agora, vamos estudar o modernismo português a partir dos poemas do maior poeta da 
língua portuguesa: Fernando Pessoa.
O Modernismo português
Fernando Pessoa (1888-1935) e a questão da heteronímia
Antes de ler este texto, solicitamos que você visite o Portal Multipessoa. Nele, você encontrará 
grande parte das informações sobre a vida e a obra de Fernando Pessoa. Neste momento, 
é fundamental que você estude um pouco da biografia do poeta em http://multipessoa.net/
labirinto/vida-e-obra/1, acesso em 23/11/2013.
Fernando Pessoa foi um poeta que criou “outros eus”, ou seja, criou outras personalidades 
poéticas, os chamados heterônimos, que são diferentes dos pseudônimos, quando o autor 
assina suas obras com um nome inventado que não é o seu, com a intenção de ocultar o nome 
verdadeiro ou de criar um nome que lhe pareça melhor. Os heterônimos constituem nomes 
imaginários sob os quais um escritor cria obras de tendências, características e estilos diversos 
dos seus, como se fossem, de fato, de outros autores. Ao fazer isso, Pessoa desdobrou-se em 
múltiplos sujeitos que expressaram múltiplas visões do mundo.
Para compreender o processo heteronímico em Fernando Pessoa, é necessário considerar 
os aspectos contextuais em voga no momento em que ele viveu. Podemos pensar, para isso, 
em um conceito difuso, mas útil até certo ponto, o conceito de Modernidade. Para explicá-
lo, citaremos vários movimentos de vanguarda e alguns termos do contexto de Portugal que 
aparecem em destaque no texto. Para compreendê-los melhor não deixe de acessar os links que 
indicamos logo após os parágrafos em que são citados.
A Modernidade foi o momento que sucedeu a falência do Cientificismo Positivista do século 
XIX, em que o Ocidente viveu o desencanto com a Ciência. Tal desencanto já começara a partir 
do Decadentismo do final do século XIX. Alguns pensadores começaram a duvidar da Ciência 
como uma forma de conhecimento capaz de solucionar todos os problemas da humanidade, 
conforme apregoavam aqueles que se viram encantados com todo o progresso científico e 
tecnológico ocorrido ao longo dos séculos XVIII e XIX. 
O conhecimento religioso, baseado na fé, também entrara em crise, em grande parte, 
questionado pelo conhecimento científico, baseado na experimentação e na observação. 
Desse modo, o homem viu-se desamparado. Essa percepção refletiu-se na arte por meio de 
várias tendências, as chamadas Vanguardas, em que predominava certo tom apocalíptico, 
iconoclasta, de destruição e, às vezes, de novas propostas de reconstrução dos valores. 
14
Unidade: Do Simbolismo ao Modernismo
As tendências de Vanguarda mais importantes, surgidas na Europa entre 1909 e 1924, 
foram: Futurismo, Cubismo, Dadaísmo, Expressionismo e Surrealismo. Eram movimentos 
que propunham temas e procedimentos estilísticos que iam da iconoclastia pura e simples 
(Dadaísmo), à busca da reconstrução primitivista (Cubismo); da abolição da sintaxe 
(Futurismo), à escrita automática, livre das amarras da razão (Surrealismo). O tema da 
falência do mundo burguês, bastante presente no Expressionismo, sintetizou o desconforto 
do período em relação à sociedade.
Sob a influência desses movimentos de Vanguarda, encontramos o Modernismo português, 
cuja origem vinculou-se intimamente ao aparecimento da revista Orpheu, de 1915, na qual 
tiveram participação fundamental Mário de Sá-Carneiro e Fernando Pessoa.
Os Movimentos de Vanguarda Europeia são fundamentais para se compreender 
as artes modernas e contemporâneas, bem como o processo de construção 
literária de Fernando Pessoa. Por isso, indicamos a você endereços eletrônicos 
que deve consultar para compreender melhor esses fenômenos culturais. Não 
deixe de visitá-los e estudá-los com atenção.
•	 http://www.mundoeducacao.com/literatura/vanguardas-europeias.htm
•	 http://g1.globo.com/pernambuco/vestibular-e-educacao/noticia/2012/08/
veja-como-vanguardas-europeias-quebraram-o-conceito-de-beleza.html
A situação de Portugal na época era delicada: a perda das colônias, a humilhação sofrida 
pelo Ultimatum (1890), a decadência da monarquia e a criação da República (1910), entre 
outros fatores, foram acontecimentos que devem ser considerados como ingredientes que 
conferiram características específicas ao Modernismo português, movimento que conviveu 
simultaneamente com o Saudosismo e com o Presencismo, propostas que oscilavam entre o 
resgate do passado como forma de superar as dificuldades do presente (Saudosismo) e a busca 
de uma literatura viva e original, livre de regras de escola e de engajamento social (Presencismo).
 
 Explore
Saiba mais sobre Saudosismo em: http://faroldasletras.no.sapo.pt/saudosismo.html
Saiba mais sobre o Ultimato Inglês ou Ultimatum, de 1890, em http://www.academia.edu/477670/O_Ultimatum_Ingles_de_1890_-_Sua_Genese_e_a_perspectiva_inglesa
Saiba mais sobre o Presencismo e a Revista Presença em http://cvc.instituto-camoes.pt/
contomes/05/sabia.html
 
15
Sendo assim, o aparecimento do fenômeno heteronímico na obra de Fernando Pessoa 
justificou-se, em parte, como resposta estética ao estado de coisas do contexto em que o 
poeta viveu. As diversas personalidades em que se desdobrou o escritor são o resultado dessa 
encruzilhada a que a Europa chegou no início do século XX. Nesse período, encontrava-se 
ainda, parte em curso, parte em gestação, a Primeira Guerra Mundial (1914-1919), que 
redefiniria o mapa europeu.
O contexto histórico não é a única causa da complexa teia heteronímica tecida por Fernando 
Pessoa. Embora o próprio Pessoa tenha advertido que “O poeta é um fingidor”, não devemos 
deixar de considerar as observações que o próprio Fernando Pessoa fez sobre a gênese dos 
heterônimos. Elas estão contidas na conhecida carta a Adolfo Casais Monteiro, que você deve 
ler. O documento encontra-se no material complementar da disciplina e também no endereço 
indicado a seguir: http://arquivopessoa.net/textos/3007
O que chama a atenção na carta, num primeiro momento, é a tentativa de Pessoa de deixar 
claro, na resposta que deu ao amigo sobre a gênese dos heterônimos, que escrevia sem pensar: 
“Estou, porém, escrevendo diretamente, tão depressa quanto a máquina mo permite, e vou-me 
servindo das expressões que me ocorrem, sem olhar a que literatura haja nelas. Suponha – e 
fará bem em supor, porque é verdade – que estou simplesmente falando consigo”. Mais adiante, 
reforçou a mesma ideia: “Repito, porém: escrevo como se estivesse falando consigo, para que 
possa escrever imediatamente. Não sendo assim, passaria meses sem eu conseguir escrever”. 
Quando fala sobre o aparecimento do primeiro heterônimo, Alberto Caeiro, surgido em 8 
de março de 1914, o poeta diz que escreveu em “uma cômoda alta, de pé (sic) – mais de 30 
poemas a fio” dando-lhes o título de O Guardador de Rebanhos. Depois, afirma que escreveu 
seis poemas da série “Chuva Oblíqua”, de Fernando Pessoa ortônimo, como uma reação 
de sua personalidade ao surgimento do heterônimo. Quanto aos outros dois heterônimos 
fundamentais, Ricardo Reis e Álvaro de Campos, o poeta nos informa que tratou de descobrir, 
“instintiva e subconscientemente – uns discípulos” para o mestre que seria Alberto Caeiro.
Embora o Surrealismo e sua escrita automática tenham surgido em 1924, na França, ele 
estava vinculado aos movimentos anteriores da Vanguarda Europeia e é produto do conjunto 
de ideias dessa mesma Vanguarda. Pode-se dizer que Fernando Pessoa, de certa forma, adota 
essa proposta de valorização do inconsciente que os Simbolistas, influenciados pelo pensamento 
de Henri Bergson (1859-1942), também já haviam utilizado.
Nesse sentido, a explicação primeira sobre a origem orgânica de cada heterônimo, dada ainda 
por Pessoa na carta a Adolfo Casais Monteiro, envolve questões de ordem psiquiátrica, pois o 
poeta diz que é histérico ou “histeroneurastênico”, algo que explica como “tendência orgânica e 
constante para a despersonalização e para a simulação”. Diz ainda que Álvaro de Campos, seu 
heterônimo mais afinado ao pensamento Futurista, é “o mais histericamente histérico” de todos, 
de uma histeria que o poeta afirma que “acaba em silêncio e poesia”.
É possível relacionarmos, ainda, autorizados pelo próprio Pessoa, o surgimento dos 
heterônimos à infância do poeta: “Desde criança tive tendência para criar em torno [de mim] 
um mundo fictício, de me cercar de amigos que nunca existiram.”, diz. O que Fernando Pessoa 
não diz na carta é que viveu grande parte da infância na África do Sul e estudou em escola 
inglesa, com formação em língua inglesa, uma cultura diferente da sua, ao mesmo tempo em 
que vivia num lar com a família de portugueses, mãe e padrasto. 
16
Unidade: Do Simbolismo ao Modernismo
Talvez o contínuo exercício de pensar em dois idiomas possa ter influenciado, em parte, a 
tendência de Pessoa para o desenvolvimento de múltiplas personalidades, já que o exercício de 
um idioma estrangeiro não é uma simples operação de decorar palavras, mas uma expressão 
da forma de ver e pensar o mundo de acordo com a cultura da língua.
Por outro lado, o programa estético do Modernismo português, contido na revista Orpheu, 
revela-se útil para iluminar a questão heteronímica. O nome da revista nos remete a um mito 
grego que pode ser considerado um emblema da concepção de literatura dos modernistas 
portugueses. 
Na mitologia grega, Orfeu foi um poeta por excelência, seu canto acalmava as feras e era 
capaz de harmonizar a natureza. Quando perdeu Eurídice, parou de cantar. Os deuses, vendo 
a natureza triste, permitiram que ele descesse ao mundo dos mortos para resgatar sua amada. 
Incapaz de cumprir a função sem olhar para trás, conforme a ordem recebida, Orfeu fracassou 
e, quando subiu à Terra, foi despedaçado pelas fúrias. 
Nesse mito concentram-se elementos de cunhos psicanalítico, histórico e metalinguístico que 
explicaremos a seguir.
 
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Leia mais sobre a Revista Orpheu em http://faroldasletras.no.sapo.pt/orpheu.html
 
Psicanaliticamente, Orfeu sem Eurídice representa um “animus” desprovido de sua “anima”, 
por isso não pode mais cantar. Daí vem a ideia de que o poeta precisa equilibrar “anima” e 
“animus” em sua personalidade para poder produzir sua arte. Contudo, quando lhe é permitido 
realizar uma ação prática, resgatar sua “anima”, o poeta fracassa pela falta de pragmatismo, não 
consegue deixar de olhar o passado. 
É possível dizer que isto está no comentário que Fernando Pessoa fez a Adolfo Casais 
Monteiro sobre a histeria, que na mulher, segundo ele, se traduz em certa explosão exterior, mas 
no homem acaba em silêncio e poesia. Antes de ser uma observação machista, revela-nos a 
consciência de Pessoa do fato de o artista sentir-se, pelo caráter contemplativo que tem a arte, 
desconfortável frente ao intenso pragmatismo exigido pelo mundo contemporâneo. 
Assim, também para Orpheu, quando subiu do mundo dos mortos, a única solução possível 
foi a fragmentação, metáfora da heteronímia, num mundo em que o desequilíbrio entre a 
“anima” e o “animus” instaurou-se de vez.
Trocando Ideias
Na teoria de Carl Gustav Jung (1875-1961)
•	 Animus: a personificação da natureza masculina do subconsciente da mulher.
•	 Anima: a personificação da natureza feminina do subconsciente do homem.
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Historicamente, para Portugal (àquela época um Império despedaçado), talvez o mito de 
Orfeu representasse o embate entre passado, presente e futuro. Orfeu fracassou porque não 
conseguiu resistir à tentação de olhar para trás, ou seja, fixar-se no passado. Buscar Eurídice 
pode ser o emblema de buscar no passado da nação o equilíbrio perdido. Contudo, há que se ter 
o bom senso de não olhar para o passado o tempo todo, como propunham alguns saudosistas 
do tempo, mas voltar-se para o futuro de maneira firme para que se pudesse trazer de volta o 
que se perdeu um dia. 
Esta é uma mensagem que o emblema do mito de Orfeu transmite. E neste ponto é possível 
falarmos da obra Mensagem, de Fernando Pessoa ele mesmo, sem nos desviarmos da questão 
heteronímica, já que o próprio Fernando Pessoa nos revelou, na carta a Casais Monteiro, ser 
essa obra “uma faceta secundária” em sua personalidade. Diz ainda que, no momento em que 
a obra foi inscrita no concurso de poemas nacionalistas, “coincidiu sem que eu planeasse ou 
premeditasse”, assim como o surgimento dos heterônimos. Mais uma vez, Pessoa sugeriu certo 
pendor para a valorização do inconsciente (sem plano) em prejuízo do racional.
 
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Sobre Mensagem, de Fernando Pessoa, é importante que você consulte os seguintes endereços 
eletrônicos para sabermais:
•	 http://faroldasletras.no.sapo.pt/fernando_pessoa.html. O site fala sobre toda a obra de Fernando 
Pessoa e contextualiza Mensagem dentro desse universo.
•	 http://faroldasletras.no.sapo.pt/mensagem_pessoa.htm. O site contém a obra Mensagem, de 
Fernando Pessoa.
•	 http://faroldasletras.no.sapo.pt/mensagem_textos_teoricos.htm. O site traz textos teóricos que 
explicam a obra Mensagem, de Fernando Pessoa.
Já o aspecto metalinguístico que encontramos no processo heteronímico de Fernando Pessoa 
é um dado que não se refere apenas à personalidade do poeta ou à história de Portugal, mas 
sugere uma reflexão sobre a arte. 
Pode-se dizer que Alberto Caeiro, Ricardo Reis e Álvaro de Campos, os principais heterônimos, 
constituem um diálogo que revela as relações entre a linguagem e a natureza. Criada como 
substituta da realidade, a palavra é, ao mesmo tempo, campo de múltiplas possibilidades de 
reconstrução do universo e elemento que mostra ao homem as limitações da expressão do 
pensamento. O questionamento desses aspectos antagônicos da linguagem, que nos afasta e 
nos une à natureza, é apresentado nos heterônimos.
A seguir nos deteremos um pouco em cada heterônimo, começando por Alberto Caieiro:
Alberto Caeiro é aquele poeta que não acredita na possibilidade de a palavra dar conta 
das coisas. Esse fato está na própria biografia que Pessoa criou para ele: o “Guardador de 
Rebanhos” tem pouco estudo e escreve mal. Procura captar o objeto em sua essência, por isso 
serve-se de um discurso tautológico que pretende que a coisa se revele por si, sem tradução: 
18
Unidade: Do Simbolismo ao Modernismo
“Passa uma borboleta diante de mim/ E pela primeira vez no universo eu reparo/ Que as 
borboletas não têm cor nem movimento /Assim como as flores não têm perfume nem cor/ A cor 
é que tem cor nas asas da borboleta/ No movimento da borboleta o movimento é que se move 
/O perfume é que tem perfume no perfume da flor.” 
O que nós vemos das coisas são as coisas.
Porque veríamos nós uma coisa se houvesse outra?
Porque é que ver e ouvir seria iludirmo-nos
Se ver e ouvir são ver e ouvir?
O essencial é saber ver,
Saber ver sem estar a pensar,
Saber ver quando se vê,
E nem pensar quando se vê,
Nem ver quando se pensa.
Mas isso (triste de nós que trazemos a alma vestida!),
Isso exige um estudo profundo,
Uma aprendizagem de desaprender
E uma sequestração na liberdade daquele convento
De que os poetas dizem que as estrelas são as freiras eternas
E as flores as penitentes convictas de um só dia,
Mas onde afinal as estrelas não são senão estrelas
Nem as flores senão flores,
Sendo por isso que lhes chamamos estrelas e flores.
O poeta diz que “trazemos a alma vestida”, ou seja, pensamos e a razão, em certo sentido, 
reveste nossa alma. Por isso precisamos aprender a desaprender.
Perceba que o poeta põe reparos no uso da metáfora: as estrelas não são “as freiras eternas” 
nem as flores “as penitentes convictas de um só dia”. Estrelas e flores são estrelas e flores. 
Encontra-se aqui a ideia de simplicidade de Alberto Caeiro, mas ao mesmo tempo a ideia de 
que as palavras não dão conta de expressar aquilo que vimos ou sentimos.
Tal como o homem antes de aprender a pensar, ou seja, antes de romper com a natureza, 
Caeiro vê sempre o universo como se fosse a primeira vez, vê em vez de pensar. Sua 
preferência pela visão, sentido que aparece em destaque em seus poemas, decorre do fato 
de a visão ser o mais concreto dos sentidos, pois quando o olhar se aplica ao objeto, as 
dúvidas se dissipam, diferente do olfato, da audição, do tato ou do paladar, por exemplo, 
que mais facilmente nos enganam. Mesmo sabendo que isso se trata de um fingimento 
poético, já que toda emoção é uma mentira da razão, como nos disse o próprio Pessoa, 
temos em Caeiro o homem pré-lógico. Para ele, o passado, o futuro e o presente não 
existem, o tempo é uma abstração humana:
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Vive, dizes, no presente;
Vive só no presente.
Mas eu não quero o presente, quero a realidade;
Quero as coisas que existem, não o tempo que as mede.
O que é o presente?
É uma coisa relativa ao passado e ao futuro.
É uma coisa que existe em virtude de outras coisas existirem.
Eu quero só a realidade, as coisas sem presente.
Não quero incluir o tempo no meu esquema.
Não quero pensar nas coisas como presentes; quero pensar nelas como 
coisas.
Não quero separá-las de si-próprias, tratando-as por presentes.
Eu nem por reais as devia tratar.
Eu não as devia tratar por nada.
Eu devia vê-las, apenas vê-las;
Vê-las até não poder pensar nelas,
Vê-las sem tempo, nem espaço,
Ver podendo dispensar tudo menos o que se vê.
É esta a ciência de ver, que não é nenhuma. 
A seguir, encontramos outro heterônimo de Fernando Pessoa: Ricardo Reis.
Ricardo Reis incorpora o poeta Clássico. O período clássico foi o momento em que se 
instaurou a abstração, o período da Filosofia. O homem, não mais integrado à natureza, passou 
a atribuir a explicação dos fenômenos aos deuses. O pendor Clássico de Ricardo Reis justifica 
um elemento de sua biografia: é monarquista exilado no Brasil (só poderia ser monarquista 
já que a nobreza foi o sustentáculo do Classicismo). Reis teve formação jesuítica (latinista), 
mas é pagão. Estudou o idioma grego por conta própria. Trata-se de um sujeito que busca no 
Epicurismo, ou no diálogo entre o Epicurismo e o Estoicismo, duas correntes do pensamento 
grego pré-cristão, as bases de sua poesia. 
Glossário
Epicurismo: doutrina do filósofo grego Epicuro (341-270 a.C.) e seus epígonos [seguidores], 
caracterizada por uma concepção atomista e materialista da natureza, pela busca da indiferença 
diante da morte e uma ética que identifica o bem aos prazeres comedidos e espirituais, que, por 
passarem pelo crivo da reflexão, seriam impermeáveis ao sofrimento incluído nas paixões humanas
20
Unidade: Do Simbolismo ao Modernismo
Estoicismo: doutrina fundada por Zenão de Cício (335-264a.C.), e desenvolvida por várias 
gerações de filósofos, que se caracteriza por uma ética em que a imperturbabilidade, a extirpação 
das paixões e a aceitação resignada do destino são as marcas fundamentais do homem sábio, o 
único apto a experimentar a verdadeira felicidade [O estoicismo exerceu profunda influência na 
ética cristã.]
•	 Saiba mais sobre Epicurismo e Estoicismo no endereço eletrônico: http://www.revistas.usp.br/
letrasclassicas/article/viewFile/51509/55571
Veja como as ideias Epicuristas manifestam-se no texto de Ricardo Reis:
Vem sentar-te comigo, Lídia, à beira do rio.
Sossegadamente fitemos o seu curso e aprendamos
Que a vida passa, e não estamos de mãos enlaçadas.
 (Enlacemos as mãos).
Depois pensemos, crianças adultas, que a vida
Passa e não fica, nada deixa e nunca regressa,
Vai para um mar muito longe, para ao pé do Fado,
 Mais longe que os deuses.
Desenlacemos as mãos, porque não vale a pena cansarmo-nos.
Quer gozemos, quer não gozemos, passamos como o rio.
Mais vale saber passar silenciosamente
 E sem desassossegos grandes.
Sem amores, nem ódios, nem paixões que levantam a voz,
Nem invejas que dão movimento demais aos olhos,
Nem cuidados, porque se os tivesse o rio sempre correria,
 E sempre iria ter ao mar.
Amemo-nos tranquilamente, pensando que podíamos,
Se quiséssemos, trocar beijos e abraços e caricias,
Mas que mais vale estarmos sentados ao pé um do outro
 Ouvindo correr o rio e vendo-o.
Colhamos flores, pega tu nelas e deixa-as
No colo, e que o seu perfume suavize o momento —
Este momento em que sossegadamente não cremos em nada,
 Pagãos inocentes da decadência.
Ao menos, se for sombra antes, lembrar-te-ás de mim depois
Sem que a minha lembrança te arda ou te fira ou te mova,
Porque nunca enlaçamos as mãos, nem nos beijamos
 Nem fomos maisdo que crianças.
E se antes do que eu levares o óbolo ao barqueiro sombrio,
Eu nada terei que sofrer ao lembrar-me de ti.
Ser-me-ás suave à memória lembrando-te assim — à beira-rio,
 Pagã triste e com flores no regaço.
21
Como o Estoicismo influenciou o pensamento cristão em maior escala, o Epicurismo 
sistemático, adotado por Reis, foi uma maneira de se contrapor ao Cristianismo. Ele dizia que 
aceitava Cristo apenas como um deus a mais e o qualifica como um “deus triste”, que não 
matou os outros deuses. O ascetismo do Cristianismo tradicional foi combatido por Reis quando 
disse que o ressurgimento da natureza é a prova de que Pã, Ceres e Apolo continuam vivos, 
fecundando os campos. 
 
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Conheça mais sobre Pã, Ceres e Apolo no endereço eletrônico: http://www.
arteuniversal.com.br/g/mitologia_grega.html
 
O deus Pã não morreu,
Cada campo que mostra
Aos sorrisos de Apolo
Os peitos nus de Ceres —
Cedo ou tarde vereis
Por lá aparecer
O deus Pã, o imortal.
Não matou outros deuses
O triste deus cristão.
Cristo é um deus a mais,
Talvez um que faltava.
Pã continua a dar
Os sons da sua flauta
Aos ouvidos de Ceres
Recumbente nos campos.
Os deuses são os mesmos,
Sempre claros e calmos,
Cheios de eternidade
E desprezo por nós,
Trazendo o dia e a noite
E as colheitas douradas
Sem ser para nos dar
O dia e a noite e o trigo
Mas por outro e divino
Propósito casual.
 
Agora é a vez do terceiro heterônimo de Fernando Pessoa: Álvaro de Campos
Álvaro de Campos, por sua vez, é um heterônimo extremamente comprometido com 
as tendências contemporâneas. Mais próximo da ideologia de Pessoa, a temática de sua 
obra revela o homem fragmentado da modernidade, que exalta a máquina ao mesmo 
tempo em que a vê como um elemento que oprime o homem. Nele se fundem a ideia 
do progresso e do caos, duas facetas do mundo moderno. Trata-se do poeta no qual a 
abstração instaura-se de vez.
Leia o fragmento de “Ode Triunfal”:
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Unidade: Do Simbolismo ao Modernismo
ODE TRIUNFAL
À dolorosa luz das grandes lâmpadas eléctricas da fábrica 
Tenho febre e escrevo. 
Escrevo rangendo os dentes, fera para a beleza disto, 
Para a beleza disto totalmente desconhecida dos antigos.
Ó rodas, ó engrenagens, r-r-r-r-r-r-r eterno! 
Forte espasmo retido dos maquinismos em fúria! 
Em fúria fora e dentro de mim, 
Por todos os meus nervos dissecados fora, 
Por todas as papilas fora de tudo com que eu sinto! 
Tenho os lábios secos, ó grandes ruídos modernos, 
De vos ouvir demasiadamente de perto, 
E arde-me a cabeça de vos querer cantar com um excesso 
De expressão de todas as minhas sensações,
Com um excesso contemporâneo de vós, ó máquinas! [...]
•	 Leia	o	poema	na	íntegra	em:	http://multipessoa.net/labirinto
 
Esta é a face Futurista de Álvaro de Campos. Veja que, ao mesmo tempo em que acha belos 
os ícones da modernidade, esses elementos são como um suplício para o sujeito poético, eles são 
excessivos. Parece, inclusive, que o mundo moderno e suas engrenagens se apropriam do próprio 
sujeito, tornando-o histérico, nervoso, doente. É possível perceber, estilisticamente, um nervosismo 
extremo na poética de Álvaro de Campos se comparada à placidez de Caeiro e de Ricardo Reis.
Desespero, angústia, solidão, sentimento de vazio existencial são tônicas da poética de Álvaro 
de Campos, como podemos ver no fragmento a seguir:
Se te queres matar, porque não te queres matar? 
Ah, aproveita! que eu, que tanto amo a morte e a vida,
Se ousasse matar-me, também me mataria... 
Ah, se ousares, ousa! 
De que te serve o quadro sucessivo das imagens externas 
A que chamamos o mundo? 
A cinematografia das horas representadas 
Por actores de convenções e poses determinadas, 
O circo policromo do nosso dinamismo sem fim? 
De que te serve o teu mundo interior que desconheces? 
Talvez, matando-te, o conheças finalmente... 
Talvez, acabando, comeces... 
E de qualquer forma, se te cansa seres, 
Ah, cansa-te nobremente, 
E não cantes, como eu, a vida por bebedeira, 
Não saúdes como eu a morte em literatura! [...]
•	 Leia	o	poema	na	íntegra	em:	http://multipessoa.net/labirinto
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Perceba que Campos escrevia poemas longos, derramados, sem preocupação com métrica 
ou com rima. 
Ainda acerca de Campos, Pessoa diz que o imaginou em dois momentos, antes e depois de ter 
conhecido o mestre Caeiro, o que o obrigou a um duplo exercício de despersonalização, pois teve de 
compor, criar duas fases para um mesmo poeta. A faceta anterior de Campos revela-se no poema 
“Opiário”, quando o poeta ainda era influenciado pelo Simbolismo e pelas coisas do Oriente. 
Opiário
É antes do ópio que a minh’alma é doente. 
Sentir a vida convalesce e estiola 
E eu vou buscar ao ópio que consola 
Um Oriente ao oriente do Oriente.
 
Esta vida de bordo há-de matar-me. 
São dias só de febre na cabeça 
E, por mais que procure até que adoeça, 
Já não encontro a mola pra adaptar-me.[...]
•	 Leia	o	poema	na	íntegra	em:	http://multipessoa.net/labirinto
Isso revela que os próprios heterônimos são partidos, como cacos de espelho que se 
dividem em múltiplos fragmentos: Caeiro, entre o não saber escrever bem e o ato de produzir 
poesia; Reis, entre a formação jesuítica e o pendor autodidata helenista; Campos, antes e 
depois de conhecer Caeiro. 
Esse exercício poético de Fernando Pessoa nos sugere que, mais que um fingidor, o poeta 
é aquele ser capaz de captar os problemas e as contradições de seu tempo e transformar esses 
questionamentos em arte. 
Um poema de Fernando Pessoa, assinado por ele mesmo, deve ser trazido como exemplo, 
tanto da consciência da fragmentação do homem moderno quanto da consciência da 
precariedade da arte para dar conta da expressão do pensamento. Trata-se do texto muito 
conhecido “Autopsicografia”:
Autopsicografia
O poeta é um fingidor
Finge tão completamente
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente.
E os que leem o que escreve,
Na dor lida sentem bem,
Não as duas que ele teve,
Mas só a que eles não têm.
E assim nas calhas de roda
Gira, a entreter a razão,
Esse comboio de corda
Que se chama coração.
24
Unidade: Do Simbolismo ao Modernismo
O texto divide-se em três estrofes e cada uma delas trata de um dos elementos fundamentais 
do processo de construção literária. O poeta, na primeira estrofe (Auto); o leitor, na segunda 
(psico); e o poema, na terceira (grafia).
Pensemos no seguinte processo: o sujeito poético teve uma “dor”, compreendida aqui como 
uma experiência que o levou a escrever um poema. Essa expressão seria fingimento poético, 
já que não poderia ser a experiência em si uma vez que esta já se esvaíra, transformando-se, 
agora, em expressão. 
Na primeira estrofe, ao afirmar que o poeta é um fingidor e que ele finge tão completamente 
que a dor verdadeira passa por dor fingida, o sujeito poético nos revela a impossibilidade de 
saber o que é, de fato, verdade ou invenção artística no ato de produzir literatura.
Do mesmo modo, os leitores, que podem ter tido uma experiência parecida com a que 
o poeta teve para construir o seu texto, ou seja, uma dor, esses nunca terão acesso nem à 
experiência do próprio poeta, que esta é exclusiva dele, nem à própria experiência que tiveram 
no passado, pois esta é exclusiva dos leitores. Estes têm acesso apenas à dor lida, ou seja, à 
experiência recriada pela linguagem do poema. 
Os leitores, “Os que leem”, têm acesso apenas à “dor lida”, quer dizer, ao poema e não à dor 
que, de fato, o poeta sentiu e o motivou a escrever o texto ou à dor que ele fingiu, materializou 
por meio da linguagem. Por mais que os leitores possam experimentar no poema um tipo de 
dor, esta dor não é nem a mesma que eles experimentaram na vida, visto que é a dor lida, uma 
dor virtualmente expressa e suscitada no e pelo texto e que se multiplicatantas vezes quantas o 
poema for lido.
Em conclusão, temos que a poesia é produto da razão, as calhas de roda, em que gira o 
coração, comboio de corda. Lembre-se de que o trenzinho de corda é uma máquina que só 
funciona nos trilhos, nas calhas de roda. Desse modo, razão e emoção são ingredientes para a 
construção da poesia. A emoção pura não comunica nada, por isso precisa das calhas de roda, 
da razão, que a transformam em linguagem.
Essa mesma ideia nos é apresentada por Pessoa por meio da proposta Sensacionista, de 
1916: “Todo objeto é uma sensação nossa./Toda arte é a conversão de uma sensação em objeto./
Portanto, toda arte é a conversão de uma sensação numa outra sensação”. Esse silogismo é, 
em certo sentido, a tradução teórica do processo heteronímico, assim como, paradoxalmente, a 
demonstração racional da falência do mesmo processo racional em tentar explicar, de maneira 
objetiva a realidade. 
Sendo assim, é necessário considerar não a questão da heteronímia, mas as questões que 
esse fenômeno nos propõe. Tão abrangentes quanto os numerosos “outros eus” criados por 
Pessoa, são os problemas relativos à gênese do processo que, como vimos, é resultante do 
conjunto de elementos contextuais e individuais aliados a um gênio que teve plena consciência 
das potencialidades, e da impotência ao mesmo tempo, da linguagem, instrumento de trabalho 
que utilizou com genialidade. 
25
Nesse caso, o que primeiramente se manifesta como uma atitude iconoclasta revela-se numa 
resposta da arte a uma nova maneira de ver o mundo, que a Modernidade nos apresentou: um 
mundo que ganha a forma fragmentada e virtual.
Procuramos construir, nessa unidade, um painel significativo do contexto do início do século 
XX e da poesia portuguesa no período. Este momento histórico e literário serviu e serve até 
hoje como base para a literatura contemporânea. É importante que você procure conhecer mais 
sobre os poetas estudados nessa unidade e perceba que alguns deles, como Camilo Pessanha 
e Fernando Pessoa, exerceram, e exercem, muitas influências sobre os autores modernos e 
contemporâneos. Para entender isso melhor, leia a bibliografia recomendada e os sites sugeridos 
no material complementar.
26
Unidade: Do Simbolismo ao Modernismo
Material Complementar
Unidade V – Do Simbolismo ao Modernismo
Para que você possa entender melhor como Fernando Pessoa concebeu o processo 
heteronímico, disponibilizamos uma carta que ele escreveu a Adolfo Casais Monteiro, 
respondendo ao colega sobre questões gerais do seu processo de criação poética. Apesar de 
Pessoa dizer que o poeta é um fingidor, muitas das informações contidas neste documento 
revelam aspectos importantes da visão do mundo dele e de sua concepção sobre arte entre 
outros temas. 
O documento a seguir foi extraído do endereço http://arquivopessoa.net/textos/3007, 
acessado em 23/11/2013. Optamos por manter a grafia original, conforme se encontra no site.
Além da carta, recomendamos também que você assista ao documentário realizado pela 
Rede Globo em 2008, Fernando Pessoa, o poeta fingidor. Ele está disponível no Youtube em 
http://www.youtube.com/watch?v=m3PmIxGkRtU, acesso em 19/12/2013.
Boa leitura!
Carta de Fernando Pessoa a Adolfo Casais Monteiro.
 [Carta a Adolfo Casais Monteiro - 13 Jan. 1935]
Lisboa, 13 de Janeiro de 1935.
Meu prezado Camarada:
Muito agradeço a sua carta, a que vou responder imediata e integralmente. Antes de, propriamente, 
começar, quero pedir-lhe desculpa de lhe escrever neste papel de cópia. Acabou-se-me o decente, é 
domingo, e não posso arranjar outro. Mas mais vale, creio, o mau papel que o adiamento.
Em primeiro lugar, quero dizer-lhe que nunca eu veria «outras razões» em qualquer coisa que 
escrevesse, discordando, a meu respeito. Sou um dos poucos poetas portugueses que não decretou 
a sua própria infalibilidade, nem toma qualquer crítica, que se lhe faça, como um acto de lesa-
divindade. Além disso, quaisquer que sejam os meus defeitos mentais, é nula em mim a tendência 
para a mania da perseguição. À parte isso, conheço já suficientemente a sua independência mental, 
que, se me é permitido dizê-lo, muito aprovo e louvo. Nunca me propus ser Mestre ou Chefe-Mestre, 
porque não sei ensinar, nem sei se teria que ensinar; Chefe, porque nem sei estrelar ovos. Não se 
preocupe, pois, em qualquer ocasião, com o que tenha que dizer a meu respeito. Não procuro caves 
nos andares nobres.
Concordo absolutamente consigo em que não foi feliz a estreia, que de mim mesmo fiz com um 
livro da natureza de «Mensagem». Sou, de facto, um nacionalista místico, um sebastianista racional. 
Mas sou, à parte isso, e até em contradição com isso, muitas outras coisas. E essas coisas, pela mesma 
natureza do livro, a «Mensagem» não as inclui.
27
Comecei por esse livro as minhas publicações pela simples razão de que foi o primeiro livro 
que consegui, não sei porquê, ter organizado e pronto. Como estava pronto, incitaram-me a que o 
publicasse: acedi. Nem o fiz, devo dizer, com os olhos postos no prémio possível do Secretariado, 
embora nisso não houvesse pecado intelectual de maior. O meu livro estava pronto em Setembro, e 
eu julgava, até, que não poderia concorrer ao prémio, pois ignorava que o prazo para entrega dos 
livros, que primitivamente fora até fim de Julho, fora alargado até ao fim de Outubro. Como, porém, 
em fim de Outubro já havia exemplares prontos da «Mensagem», fiz entrega dos que o Secretariado 
exigia. O livro estava exactamente nas condições (nacionalismo) de concorrer. Concorri.
Quando às vezes pensava na ordem de uma futura publicação de obras minhas, nunca um livro 
do género de «Mensagem» figurava em número um. Hesitava entre se deveria começar por um livro 
de versos grande — um livro de umas 350 páginas — , englobando as várias subpersonalidades de 
Fernando Pessoa ele mesmo, ou se deveria abrir com uma novela policiária, que ainda não consegui 
completar.
Concordo consigo, disse, em que não foi feliz a estreia, que de mim mesmo fiz, com a publicação de 
«Mensagem». Mas concordo com os factos que foi a melhor estreia que eu poderia fazer. Precisamente 
porque essa faceta — em certo modo secundária — da minha personalidade não tinha nunca sido 
suficientemente manifestada nas minhas colaborações em revistas (excepto no caso do Mar Português 
parte deste mesmo livro) — precisamente por isso convinha que ela aparecesse, e que aparecesse 
agora. Coincidiu, sem que eu o planeasse ou o premeditasse (sou incapaz de premeditação prática), 
com um dos momentos críticos (no sentido original da palavra) da remodelação do subconsciente 
nacional. O que fiz por acaso e se completou por conversa, fora exactamente talhado, com Esquadria 
e Compasso, pelo Grande Arquitecto.
(Interrompo. Não estou doido nem bêbado. Estou, porém, escrevendo directamente, tão depressa 
quanto a máquina mo permite, e vou-me servindo das expressões que me ocorrem, sem olhar a que 
literatura haja nelas. Suponha — e fará bem em supor, porque é verdade — que estou simplesmente 
falando consigo).
Respondo agora directamente às suas três perguntas: (1) plano futuro da publicação das minhas 
obras, (2) génese dos meus heterónimos, e (3) ocultismo.
Feita, nas condições que lhe indiquei, a publicação da «Mensagem» , que é uma manifestação 
unilateral, tenciono prosseguir da seguinte maneira. Estou agora completando uma versão inteiramente 
remodelada do Banqueiro Anarquista, essa deve estar pronta em breve e conto, desde que esteja 
pronta, publicá-la imediatamente. Se assim fizer, traduzo imediatamente esse escrito para inglês, e 
vou ver se o posso publicar em Inglaterra. Tal qual deve ficar, tem probabilidades europeias. (Não 
tome esta frase no sentido de Prémio Nobel imanente). Depois — e agora respondo propriamente à 
sua pergunta, que se reporta a poesia — tenciono, durante o verão, reuniro tal grande volume dos 
poemas pequenos do Fernando Pessoa ele mesmo, e ver se o consigo publicar em fins do ano em 
que estamos. Será esse o volume que o Casais Monteiro espera, e é esse que eu mesmo desejo que 
se faça. Esse, então, será as facetas todas, excepto a nacionalista, que «Mensagem» já manifestou.
Referi-me, como viu, ao Fernando Pessoa só. Não penso nada do Caeiro, do Ricardo Reis ou 
do Álvaro de Campos. Nada disso poderei fazer, no sentido de publicar, excepto quando (ver mais 
acima) me for dado o Prémio Nobel. E contudo — penso-o com tristeza — pus no Caeiro todo o meu 
poder de despersonalização dramática, pus em Ricardo Reis toda a minha disciplina mental, vestida 
da música que lhe é própria, pus em Álvaro de Campos toda a emoção que não dou nem a mim nem 
à vida. Pensar, meu querido Casais Monteiro, que todos estes têm que ser, na prática da publicação, 
preteridos pelo Fernando Pessoa, impuro e simples!
Creio que respondi à sua primeira pergunta.
Se fui omisso, diga em quê. Se puder responder, responderei. Mais planos não tenho, por enquanto. 
E, sabendo eu o que são e em que dão os meus planos, é caso para dizer, Graças a Deus!
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Unidade: Do Simbolismo ao Modernismo
Passo agora a responder à sua pergunta sobre a génese dos meus heterónimos. Vou ver se consigo 
responder-lhe completamente.
Começo pela parte psiquiátrica. A origem dos meus heterónimos é o fundo traço de histeria 
que existe em mim. Não sei se sou simplesmente histérico, se sou, mais propriamente, um histero-
neurasténico. Tendo para esta segunda hipótese, porque há em mim fenómenos de abulia que a 
histeria, propriarmente dita, não enquadra no registo dos seus sintomas. Seja como for, a origem 
mental dos meus heterónimos está na minha tendência orgânica e constante para a despersonalização 
e para a simulação. Estes fenómenos — felizmente para mim e para os outros — mentalizaram-se em 
mim; quero dizer, não se manifestam na minha vida prática, exterior e de contacto com outros; fazem 
explosão para dentro e vivo — os eu a sós comigo. Se eu fosse mulher — na mulher os fenómenos 
histéricos rompem em ataques e coisas parecidas — cada poema de Álvaro de Campos (o mais 
histericamente histérico de mim) seria um alarme para a vizinhança. Mas sou homem — e nos 
homens a histeria assume principalmente aspectos mentais; assim tudo acaba em silêncio e poesia...
Isto explica, tant bien que mal, a origem orgânica do meu heteronimismo. Vou agora fazer-lhe a 
história directa dos meus heterónimos. Começo por aqueles que morreram, e de alguns dos quais já 
me não lembro — os que jazem perdidos no passado remoto da minha infância quase esquecida.
Desde criança tive a tendência para criar em meu torno um mundo fictício, de me cercar de 
amigos e conhecidos que nunca existiram. (Não sei, bem entendido, se realmente não existiram, ou 
se sou eu que não existo. Nestas coisas, como em todas, não devemos ser dogmáticos). Desde que 
me conheço como sendo aquilo a que chamo eu, me lembro de precisar mentalmente, em figura, 
movimentos, carácter e história, várias figuras irreais que eram para mim tão visíveis e minhas como 
as coisas daquilo a que chamamos, porventura abusivamente, a vida real. Esta tendência, que me 
vem desde que me lembro de ser um eu, tem-me acompanhado sempre, mudando um pouco o tipo 
de música com que me encanta, mas não alterando nunca a sua maneira de encantar.
Lembro, assim, o que me parece ter sido o meu primeiro heterónimo, ou, antes, o meu primeiro 
conhecido inexistente — um certo Chevalier de Pas dos meus seis anos, por quem escrevia cartas 
dele a mim mesmo, e cuja figura, não inteiramente vaga, ainda conquista aquela parte da minha 
afeição que confina com a saudade. Lembro-me, com menos nitidez, de uma outra figura, cujo 
nome já me não ocorre mas que o tinha estrangeiro também, que era, não sei em quê, um rival do 
Chevalier de Pas... Coisas que acontecem a todas as crianças? Sem dúvida — ou talvez. Mas a tal 
ponto as vivi que as vivo ainda, pois que as relembro de tal modo que é mister um esforço para me 
fazer saber que não foram realidades.
Esta tendência para criar em torno de mim um outro mundo, igual a este mas com outra gente, 
nunca me saiu da imaginação. Teve várias fases, entre as quais esta, sucedida já em maioridade. 
Ocorria-me um dito de espírito, absolutamente alheio, por um motivo ou outro, a quem eu sou, ou 
a quem suponho que sou. Dizia-o, imediatamente, espontaneamente, como sendo de certo amigo 
meu, cujo nome inventava, cuja história acrescentava, e cuja figura — cara, estatura, traje e gesto — 
imediatamente eu via diante de mim. E assim arranjei, e propaguei, vários amigos e conhecidos que 
nunca existiram, mas que ainda hoje, a perto de trinta anos de distância, oiço, sinto, vejo. Repito: 
oiço, sinto vejo... E tenho saudades deles.
(Em eu começando a falar — e escrever à máquina é para mim falar — , custa-me a encontrar 
o travão. Basta de maçada para si, Casais Monteiro! Vou entrar na génese dos meus heterónimos 
literários, que é, afinal, o que V. quer saber. Em todo o caso, o que vai dito acima dá-lhe a história 
da mãe que os deu à luz).
Aí por 1912, salvo erro (que nunca pode ser grande), veio-me à ideia escrever uns poemas de 
índole pagã. Esbocei umas coisas em verso irregular (não no estilo Álvaro de Campos, mas num 
estilo de meia regularidade), e abandonei o caso. Esboçara-se-me, contudo, numa penumbra mal 
urdida, um vago retrato da pessoa que estava a fazer aquilo. (Tinha nascido, sem que eu soubesse, 
o Ricardo Reis).
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Ano e meio, ou dois anos depois, lembrei-me um dia de fazer uma partida ao Sá-Carneiro — 
de inventar um poeta bucólico, de espécie complicada, e apresentar-lho, já me não lembro como, 
em qualquer espécie de realidade. Levei uns dias a elaborar o poeta mas nada consegui. Num dia 
em que finalmente desistira — foi em 8 de Março de 1914 — acerquei-me de uma cómoda alta, e, 
tomando um papel, comecei a escrever, de pé, como escrevo sempre que posso. E escrevi trinta e 
tantos poemas a fio, numa espécie de êxtase cuja natureza não conseguirei definir. Foi o dia triunfal 
da minha vida, e nunca poderei ter outro assim. Abri com um título, O Guardador de Rebanhos. E 
o que se seguiu foi o aparecimento de alguém em mim, a quem dei desde logo o nome de Alberto 
Caeiro. Desculpe-me o absurdo da frase: aparecera em mim o meu mestre. Foi essa a sensação 
imediata que tive. E tanto assim que, escritos que foram esses trinta e tantos poemas, imediatamente 
peguei noutro papel e escrevi, a fio, também, os seis poemas que constituem a Chuva Oblíqua, de 
Fernando Pessoa. Imediatamente e totalmente... Foi o regresso de Fernando Pessoa Alberto Caeiro 
a Fernando Pessoa ele só. Ou, melhor, foi a reacção de Fernando Pessoa contra a sua inexistência 
como Alberto Caeiro.
Aparecido Alberto Caeiro, tratei logo de lhe descobrir — instintiva e subconscientemente — uns 
discípulos. Arranquei do seu falso paganismo o Ricardo Reis latente, descobri-lhe o nome, e ajustei-o 
a si mesmo, porque nessa altura já o via. E, de repente, e em derivação oposta à de Ricardo Reis, 
surgiu-me impetuosamente um novo indivíduo. Num jacto, e à máquina de escrever, sem interrupção 
nem emenda, surgiu a Ode Triunfal de Álvaro de Campos — a Ode com esse nome e o homem com 
o nome que tem.
Criei, então, uma coterie inexistente. Fixei aquilo tudo em moldes de realidade. Graduei as 
influências, conheci as amizades, ouvi, dentro de mim, as discussões e as divergências de critérios, 
e em tudo isto me parece que fui eu, criador de tudo, o menos que ali houve. Parece que tudo se 
passou independentemente de mim. E parece que assim ainda se passa. Se algum dia eu puder 
publicar a discussão estética entre Ricardo Reis e Álvaro de Campos, verá como eles são diferentes, 
e como eu não sou nada na matéria.
Quando foi da publicação de «Orpheu», foi preciso,à última hora, arranjar qualquer coisa para 
completar o número de páginas. Sugeri então ao Sá-Carneiro que eu fizesse um poema «antigo» do 
Álvaro de Campos — um poema de como o Álvaro de Campos seria antes de ter conhecido Caeiro 
e ter caído sob a sua influência. E assim fiz o Opiário, em que tentei dar todas as tendências latentes 
do Álvaro de Campos, conforme haviam de ser depois reveladas, mas sem haver ainda qualquer 
traço de contacto com o seu mestre Caeiro. Foi dos poemas que tenho escrito, o que me deu mais 
que fazer, pelo duplo poder de despersonalização que tive que desenvolver. Mas, enfim, creio que 
não saiu mau, e que dá o Álvaro em botão...
Creio que lhe expliquei a origem dos meus heterónimos. Se há porém qualquer ponto em que 
precisa de um esclarecimento mais lúcido — estou escrevendo depressa, e quando escrevo depressa 
não sou muito lúcido — , diga, que de bom grado lho darei. E, é verdade, um complemento verdadeiro 
e histérico: ao escrever certos passos das Notas para recordação do meu Mestre Caeiro, do Álvaro de 
Campos, tenho chorado lágrimas verdadeiras. É para que saiba com quem está lidando, meu caro 
Casais Monteiro!
Mais uns apontamentos nesta matéria... Eu vejo diante de mim, no espaço incolor mas real do 
sonho, as caras, os gestos de Caeiro, Ricardo Reis e Alvaro de Campos. Construi-lhes as idades e 
as vidas. Ricardo Reis nasceu em 1887 (não me lembro do dia e mês, mas tenho-os algures), no 
Porto, é médico e está presentemente no Brasil. Alberto Caeiro nasceu em 1889 e morreu em 1915; 
nasceu em Lisboa, mas viveu quase toda a sua vida no campo. Não teve profissão nem educação 
quase alguma. Álvaro de Campos nasceu em Tavira, no dia 15 de Outubro de 1890 (às 1.30 da 
tarde, diz-me o Ferreira Gomes; e é verdade, pois, feito o horóscopo para essa hora, está certo). 
Este, como sabe, é engenheiro naval (por Glasgow), mas agora está aqui em Lisboa em inactividade. 
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Unidade: Do Simbolismo ao Modernismo
Caeiro era de estatura média, e, embora realmente frágil (morreu tuberculoso), não parecia tão frágil 
como era. Ricardo Reis é um pouco, mas muito pouco, mais baixo, mais forte, mas seco. Álvaro de 
Campos é alto (1,75 m de altura, mais 2 cm do que eu), magro e um pouco tendente a curvar-se. 
Cara rapada todos — o Caeiro louro sem cor, olhos azuis; Reis de um vago moreno mate; Campos 
entre branco e moreno, tipo vagamente de judeu português, cabelo, porém, liso e normalmente 
apartado ao lado, monóculo. Caeiro, como disse, não teve mais educação que quase nenhuma 
— só instrução primária; morreram-lhe cedo o pai e a mãe, e deixou-se ficar em casa, vivendo de 
uns pequenos rendimentos. Vivia com uma tia velha, tia-avó. Ricardo Reis, educado num colégio 
de jesuítas, é, como disse, médico; vive no Brasil desde 1919, pois se expatriou espontaneamente 
por ser monárquico. É um latinista por educação alheia, e um semi-helenista por educação própria. 
Álvaro de Campos teve uma educação vulgar de liceu; depois foi mandado para a Escócia estudar 
engenharia, primeiro mecânica e depois naval. Numas férias fez a viagem ao Oriente de onde resultou 
o Opiário. Ensinou-lhe latim um tio beirão que era padre.
Como escrevo em nome desses três?... Caeiro por pura e inesperada inspiração, sem saber ou 
sequer calcular que iria escrever. Ricardo Reis, depois de uma deliberação abstracta, que subitamente 
se concretiza numa ode. Campos, quando sinto um súbito impulso para escrever e não sei o quê. 
(O meu semi-heterónimo Bernardo Soares, que aliás em muitas coisas se parece com Álvaro de 
Campos, aparece sempre que estou cansado ou sonolento, de sorte que tenha um pouco suspensas as 
qualidades de raciocínio e de inibição; aquela prosa é um constante devaneio. É um semi-heterónimo 
porque, não sendo a personalidade a minha, é, não diferente da minha, mas uma simples mutilação 
dela. Sou eu menos o raciocínio e a afectividade. A prosa, salvo o que o raciocínio dá de ténue 
à minha, é igual a esta, e o português perfeitamente igual; ao passo que Caeiro escrevia mal o 
português, Campos razoavelmente mas com lapsos como dizer «eu próprio» em vez de «eu mesmo», 
etc., Reis melhor do que eu, mas com um purismo que considero exagerado. O difícil para mim é 
escrever a prosa de Reis — ainda inédita — ou de Campos. A simulação é mais fácil, até porque é 
mais espontânea, em verso).
Nesta altura estará o Casais Monteiro pensando que má sorte o fez cair, por leitura, em meio de 
um manicómio. Em todo o caso, o pior de tudo isto é a incoerência com que o tenho escrito. Repito, 
porém: escrevo como se estivesse falando consigo, para que possa escrever imediatamente. Não 
sendo assim, passariam meses sem eu conseguir escrever. 
Falta responder à sua pergunta quanto ao ocultismo (escreveu o poeta). Pergunta-me se creio 
no ocultismo. Feita assim, a pergunta não é bem clara; compreendo porém a intenção e a ela 
respondo. Creio na existência de mundos superiores ao nosso e de habitantes desses mundos, em 
experiências de diversos graus de espiritualidade, subtilizando até se chegar a um Ente Supremo, que 
presumivelmente criou este mundo. Pode ser que haja outros Entes, igualmente Supremos, que hajam 
criado outros universos, e que esses universos coexistam com o nosso, interpenetradamente ou não. 
Por estas razões, e ainda outras, a Ordem Extrema do Ocultismo, ou seja, a Maçonaria, evita (excepto 
a Maçonaria anglo-saxónica) a expressão «Deus», dadas as suas implicações teológicas e populares, e 
prefere dizer «Grande Arquitecto do Universo», expressão que deixa em branco o problema de se Ele 
é criador, ou simples Governador do mundo. Dadas estas escalas de seres, não creio na comunicação 
directa com Deus, mas, segundo a nossa afinação espiritual, poderemos ir comunicando com seres 
cada vez mais altos. Há três caminhos para o oculto: o caminho mágico (incluindo práticas como 
as do espiritismo, intelectualmente ao nível da bruxaria, que é magia também), caminho místico, 
que não tem propriamente perigos, mas é incerto e lento; e o que se chama o caminho alquímico, o 
mais difícil e o mais perfeiro de todos, porque envolve uma transmutação da própria personalidade 
que a prepara, sem grandes riscos, antes com defesas que os outros caminhos não têm. Quanto a 
«iniciação» ou não, posso dizer-lhe só isto, que não sei se responde à sua pergunta: não pertenço 
a Ordem Iniciática nenhuma. A citação, epígrafe ao meu poema Eros e Psique, de um trecho 
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(traduzido, pois o Ritual é em latim) do Ritual do Terceiro Grau da Ordem Templária de Portugal, 
indica simplesmente — o que é facto — que me foi permitido folhear os Rituais dos três primeiros 
graus dessa Ordem, extinta, ou em dormência desde cerca de 1881. Se não estivesse em dormência, 
eu não citaria o trecho do Ritual, pois se não devem citar (indicando a ordem) trechos de Rituais que 
estão em trabalho.
Creio assim, meu querido camarada, ter respondido, ainda com certas incoerências, às suas 
perguntas. Se há outras que deseja fazer, não hesite em fazê-las. Responderei conforme puder e 
o melhor que puder. O que poderá suceder, e isso me desculpará desde já, é não responder tão 
depressa.
Abraça-o o camarada que muito o estima e admira.
Fernando Pessoa - 1935
Fonte: http://arquivopessoa.net/textos/3007, acesso em 23/11/2013.
32
Unidade: Do Simbolismo ao Modernismo
Referências
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_______________. A Literatura portuguesa através dos textos. 11ª ed. São Paulo: Cultrix, 
1981.
GOMES, A. C. A Literatura portuguesa em perspectiva – Simbolismo, Modernismo. 
São Paulo: Atlas, 1994.
PESSOA, Fernando. O Barqueiro anarquista e outras prosas. (seleção e apresentação de 
Massaud Moisés). São Paulo, Cultrix, 1988.
_________________. Obra poética. São Paulo:José Aguilar, 1972.
Academia.edu: http://www.academia.edu/, acessado em 18/12/2013.E-Dicionário de Termos Literários, Carlos Ceia: http://www.edtl.com.pt, acessado em 
24/10/2013. 
Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa: http://houaiss.uol.com.br/, acessado em 
18/12/2013.
Farol das Letras: http://faroldasletras.no.sapo.pt/, acessado em 1/10/2013.
Instituto Camões: http://cvc.instituto-camoes.pt/, acessado em 24/10/2013.
Multipessoa.net: http://multipessoa.net/labirinto, acessado em 18/12/2013.
Portal G1 – Globo.com: http://g1.globo.com, acessado em 18/12/2013.
Portal Arte Universal: Mitologia:
33
Anotações
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