Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Curso: Direito Disciplina: Lógica e Hermenêutica – 72 h Prof. Msc. Gustavo Daniel Tavares Bastos Gama UNIVERSIDADE DA REGIÃO DE JOINVILLE - UNIVILLE Qual a diferença entre HERMENÊUTICA, INTERPRETAÇÃO e EXEGESE? É importante conhecer o significado das palavras? EXEGESE • Exegese deriva do grego exegesis, ou seja extrair, externar, expor, guiar, conduzir, revelar. • O termo tem sido utilizado para designar a interpretação de textos religiosos, sagrados. Entretanto, é comum no meio jurídico. EXEMPLO: • FÉ: … porque em verdade vos digo que, se tiverdes fé como um grão de mostarda, direis a este monte: Passa daqui para acolá, e há de passar; e nada vos será impossível. (Mat. 17:20) • ATENÇÃO! Qual é o instrumento de trabalho do operador jurídico? INTERPRETAÇÃO • Interpretar deriva do latim interpretare, do verbo derivado de interpres (mago, vidente, sacerdote). • Adivinho que lia o futuro das pessoas pelas vísceras. Na Roma antiga era o intermediário entre as divindades e os homens. HERMENÊUTICA • Hermenêutica: hermeneutikem alemão; herméneutique em francês. A palavra provém do latim hermeneuticus, oriundo do grego, hermeneúein. • Deriva de Hermes deus da mitologia grega filho de Zeus e de Maia. Seria o equivalente Mercúrio para os romanos e Toth para os egípcios. • Considerado o intérprete da vontade divina. Tido por ser o melhor amigo dos homens. Mensageiro ou intérprete da vontade dos deuses. HERMENÊUTICA • Suas funções: mensageiro dos deuses, deus da linguagem, do discurso eloquente e persuasivo, das metáforas, da prudência, também das intrigas e razões veladas, da fraude e do perjúrio, da sagacidade e da ambiguidade. Patrono dos oradores, arautos, embaixadores e diplomatas, dos mensageiros e dos ladrões. HERMENÊUTICA • Inventou o fogo, a lira, a syrinx, o alfabeto, os números, as medidas, os pesos etc. • Pela sua constante mobilidade e outras qualidades foi considerado o deus do comércio e do intercâmbio social, da riqueza advinda dos negócios, especialmente do enriquecimento súbito ou inesperado, das viagens, das estradas e encruzilhadas, das fronteiras e das condições limítrofes ou transitórias, da mudanças, dos umbrais, dos acordos e contratos. • Segundo CARLOS MAXIMILIANO a hermenêutica é superior à interpretação. • A primeira seria a teoria científica da arte de interpretar. A busca do sentido e do alcance. • A segunda seria a aplicação da primeira, quase tradução. O grande personagem será aquele que estabelecerá a relação entre o texto abstrato e o caso concreto. MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica e Aplicação do Direito. São Paulo: Forense, 2005. HERMENÊUTICA Numa perspectiva constitucional, Peter Häberle (p. 14) afirma que o conceito de interpretação reclama um esclarecimento que pode assim ser formulado: Quem vive a norma acaba por interpretá-la. Toda a atualização da Constituição, por meio da atuação de qualquer indivíduo constitui, ainda que parcialmente, uma interpretação constitucional antecipada. Originalmente, indica-se como interpretação apenas a atividade que, de forma consciente e intencional, dirige-se à compreensão e à explicação de sentido de uma norma (um texto). (...) Para uma pesquisa ou investigação realista do desenvolvimento da interpretação constitucional, pode ser exigível um conceito mais amplo de hermenêutica. HÄBERLE, Peter. Hermenêutica Constitucional – a sociedade aberta dos intérpretes da constituição: contribuição para a interpretação pluralista e “procedimental” da constituição. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 1997, 55 p. HERMENÊUTICA Citado autor continua (p. 15): Todo aquele que vive no contexto regulado por uma norma e que vive com esse contexto é, indireta ou, até mesmo diretamente, um intérprete dessa norma. O destinatário da norma é participante ativo, muito mais ativo do que se pode supor a tradicionalidade do processo hermenêutico. Como não são apenas os intérpretes jurídicos da Constituição que vivem a norma, não detém eles o monopólio da interpretação da Constituição. Por isso falaremos adiante de hermenêutica! HÄBERLE, Peter. Hermenêutica Constitucional – a sociedade aberta dos intérpretes da constituição: contribuição para a interpretação pluralista e “procedimental” da constituição. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 1997, 55 p. HERMENÊUTICA HERMENÊUTICA • Para Ricoeur (p. 23) a hermenêutica é: “... a teoria das operações da compreensão em sua relação com a interpretação dos textos. A ideia diretriz será, assim, a da efetuação do discurso como texto. Todo o segundo estudo será consagrado à elaboração das categorias do texto. Com isso fica preparado o terreno para uma tentativa de resolver a aporia central da hermenêutica apresentada no final do primeiro estudo, a saber: a alternativa, ao meu ver desastrosa, entre explicar e compreender. A busca de complementariedade entre essas duas atitudes, que a hermenêutica de origem romântica tende a dissociar, exprimirá, assim, no plano epistemológico, a reorientação exigida da hermenêutica pela noção do texto”. RICOEUR, Paul. Hermenêutica e Ideologias. Petrópolis: Vozes, 2008, 183 p. HERMENÊUTICA • Pode-se concluir, então, que para Ricoeur a hermenêutica exige a complementariedade entre o explicar e o compreender. Dissociar essas ideias só nos terá um efeito didático, ou seja, apenas para compreensão teórica visto que se explica é porque compreendeu e vice-versa. • No estudo e solução dos casos jurídicos não ocorre o mesmo? • Poderíamos simplesmente aplicar uma norma num caso concreto sem considerar que ela é o resultado de discussões dos problemas reais? • Não é desafiador associar o passado e o futuro agora no presente? RICOEUR, Paul. Hermenêutica e Ideologias. Petrópolis: Vozes, 2008, 183 p. HERMENÊUTICA • Citado autor continua (p. 142): O gesto da hermenêutica é um gesto humilde de reconhecimento das condições históricas a que está submetida toda a compreensão humana sob o regime da finitude. O da crítica das ideologias é um gesto altivo de desafio, dirigido contra distorções da comunicação humana. Pelo primeiro, insiro-me no devir histórico ao qual estou consciente de pertencer; pelo segundo oponho ao estado atual da comunicação humana falsificada a ideia de uma libertação da palavra, de uma libertação essencialmente política, guiada pela ideia-limite da comunicação sem limite e sem entrave. RICOEUR, Paul. Hermenêutica e Ideologias. Petrópolis: Vozes, 2008, 183 p. HERMENÊUTICA • Sérgio Alves Gomes (p. 28) alerta que há discordância entre os autores sobre o conceito de hermenêutica jurídica. Trata-se de expressão sinônima de interpretação jurídica ou há diferença entre hermenêutica e interpretação do direito? Discutindo outros autores Gomes afirma que: Apesar da aludida polêmica, as obras que versam sobre hermenêutica jurídica comprovam que, no bojo destas os autores têm se preocupado tanto em expor os processos ou métodos de interpretação do direito quanto em analisar as consequências da utilização destes durante o ato interpretativo, tendo em vista a solução dos casos concretos. GOMES, Sergio Alves. Hermenêutica Jurídica e Constituição no Estado de Direito Democrático. Rio de Janeiro: Forense, 2002, 78 p. HERMENÊUTICA • Para a Hermenêutica somente a razão não serve. Precisaremos integrar os conceitos aos pré-conceitos. Nenhum conhecimento se perde. • Os estudos deverão ser contextualizados. A compreensão exigirá conhecer quem fala, o tema, quem ouve, as circunstâncias de ambos (espaço, tempo etc). • Criticar idéias passadas será mais dificil. Nessa hipótese, as condicionantes seriam: na condição, tempo, conhecimento etc dele faria eu diferente?• Carlos Maximiliano alerta que: “toda a lei é obra humana e aplicada por homens; portanto imperfeita na forma e no fundo, e dará duvidosos resultados práticos, se não verificarem com esmero, o sentido e o alcance de suas prescrições. A norma deve ser flexibilizada para atender ao caso concreto (…) não basta conhecer as regras aplicáveis para determinar o sentido e o alcance dos textos. Parece necessário reuni-las e, num todo harmônico, oferecê-las ao estudo, em um encadeamento lógico”. MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica e Aplicação do Direito. São Paulo: Forense, 2005. • E continua “A memória retém com dificuldade o que é acidental; por outro lado, o intelecto desenvolve dia a dia o logicamente necessário, como conseqüência, evidente por si mesma, de um princípio superior. A abstração sistemática é a lógica da ciência do direito”. • Por fim, alerta que “ao invés de abandonar um vocábulo clássico e precioso, é preferível esclarecer-lhe a significação, variável com a marcha evolutiva do Direito. Todos os termos técnicos suportam as acepções decorrentes do progresso da ciência a que se acham ligados”. MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica e Aplicação do Direito. São Paulo: Forense, 2005. O Direito deve dialogar com as outras áreas do conhecimento. RESOLVER PROBLEMAS • Percebemos a diferença do plano de raciocínio de cada uma das ideias apresentadas? • No dia a dia essas expressões são utilizadas num mesmo sentido. • Vejamos os julgados a seguir: • CASO 1 APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE EXECUÇÃO DE ALIMENTOS - TÍTULO EXECUTIVO JUDICIAL - HOMOLOGAÇÃO DE ACORDO EM SEPARAÇÃO CONSENSUAL - PARCELAS VENCIDAS INADIMPLIDAS - SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO ANTE A QUITAÇÃO DOS VALORES NOS TERMOS DO ACORDO HOMOLOGADO JUDICIALMENTE. INSURGÊNCIA DOS EXEQUENTES - PLEITO PELA REFORMA DA SENTENÇA SOB O ARGUMENTO DE QUE O ACORDO JUDICIAL FIXOU A PENSÃO NO EQUIVALENTE A 50% (CINQUENTA POR CENTO) DOS VENCIMENTOS DO ALIMENTANTE - IRRELEVÂNCIA - EXECUTADO QUE NÃO MAIS EXERCE ATIVIDADE SALARIAL - DEMISSÃO SUPERVENIENTE, CONTUDO, QUE NÃO AFASTA A CERTEZA E LIQUIDEZ DO TÍTULO EXECUTIVO - INTERPRETAÇÃO DA AVENÇA ALIMENTAR COM BASE NO PRINCÍPIO DA SOLIDARIEDADE E DIGNIDADE HUMANA - INEXISTÊNCIA DE ALTERAÇÃO SUPERVENIENTE DOS TERMOS ACORDADOS (...) • CASO 1 (…) SUPLEMENTAÇÃO HERMENÊUTICA DAS DISPOSIÇÕES CONSTANTES NO TÍTULO EXECUTIVO - MANUTENÇÃO DA OBRIGAÇÃO MENSAL FIXADA EM 50% (CINQUENTA POR CENTO) DOS VENCIMENTOS DO VARÃO À ÉPOCA DESENHISTA SINDICALIZADO - ADIMPLEMENTO REGULAR E ESPONTÂNEO EM QUANTIA SUPERIOR AO ACORDO DURANTE O PERÍODO EM QUE O DEVEDOR TRABALHOU NO JAPÃO - BOA-FÉ DEMONSTRADA - AUSÊNCIA DE AÇÃO REVISIONAL DE ALIMENTOS - NECESSIDADE DE SEU AFORAMENTO PARA ALTERAÇÃO DO VALOR DA PENSÃO - EXEGESE DO ARTIGO 1.027, DO CÓDIGO CIVIL. SENTENÇA MANTIDA - RECURSO DESPROVIDO. (AP n. 2006.023066-3, de Balneário Camboriú, rel. Des. Denise Volpato) • CASO 2 INFORTUNÍSTICA - AUXÍLIO-ACIDENTE - APLICAÇÃO DA LEI N. 9.032/95 - DIREITO INTERTEMPORAL - LEI VIGENTE NO MOMENTO DO ACIDENTE - IMPOSSIBILIDADE DE INCIDÊNCIA DE NORMA POSTERIOR SEM EXPRESSA AUTORIZAÇÃO - EXEGESE DO PLENO DO EXCELSO PRETÓRIO NOS RE NS. 415454 E 416827 - INTERPRETAÇÃO REITERADA NO DIA SEGUINTE EM QUASE 5.000 RECLAMOS COM SEMELHANTE FUNDAMENTO - RESSALVA DO ENTENDIMENTO DO RELATOR - APELO DESPROVIDO. Não obstante exegese que se encontrava pacificado nesta egrégia Corte e no Superior Tribunal de Justiça quanto a aplicação imediata da legislação acidentária mais benéfica, o plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 415454 e do RE 416827, afastou a incidência da Lei n. 9.032/95 aos benefícios de pensão por morte concedidos anteriormente. (...) • CASO 2 (…) Essa matéria, mutatis mutandis, é atingida pelos mesmos princípios da hipótese dos autos. Portanto, ressalvado o entendimento deste Relator, utiliza-se o critério tempus regit actum (EREsp n. 329929/SP) em direito previdenciário/acidentário, sendo inviável a repercussão da legislação acidentária posterior ao acidente que seja mais benéfica ao obreiro sem a expressa previsão legal. Em prestígio ao princípio da segurança jurídica, é pertinente que todos os julgamentos sigam a mesma interpretação pacificada pelo Excelso Pretório como guardião da Magna Carta, e pelo Superior Tribunal de Justiça na hermenêutica das leis federais. (AP n. 2007.058116-1, de Criciúma, rel. Des. Francisco Oliveira Filho) • CASO 3 PLANO PRIVADO DE ASSISTÊNCIA À SAÚDE. REEMBOLSO DE QUANTIAS VENCIDAS E VINCENDAS. DÍVIDA PROVENIENTE DE PARTO EXECUTADO EM HOSPITAL NÃO CREDENCIADO. ARGÜIÇÃO PRELIMINAR DE REVELIA E CONFISSÃO FICTA. INOCORRÊNCIA. LITISCONSORTE PASSIVO QUE CONTESTA A AÇÃO. EXEGESE DO ART. 320, INCISO I, DO CPC. MÉRITO. INCIDÊNCIA DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR NOS CONTRATOS DE ADESÃO DE PLANOS DE SAÚDE. PREVISÃO CONTRATUAL DE COBERTURA DOS GASTOS INERENTES AO PARTO. INEXISTÊNCIA DE EXCLUSÃO DE COBERTURA EM RELAÇÃO AO NASCIMENTO DE GÊMEOS. APELADA QUE SE NEGA A REEMBOLSAR OS GASTOS OCORRIDOS EM HOSPITAL NÃO CREDENCIADO (...) • CASO 3 (…) INTERPRETAÇÃO DE CLÁUSULAS CONTRATUAIS EM DESACORDO COM O ART. 47 DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. HERMENÊUTICA DA ABUSIVIDADE EM CONSONÂNCIA COM A NOVA LEI DOS PLANOS E SEGUROS DE SAÚDE. DECLARAÇÃO DE NULIDADE DE CLÁUSULAS CONTRATUAIS EXONERATIVAS DE PRESTAÇÃO. ENTENDIMENTO DO ART. 51, IV, DO CDC. OBRIGAÇÃO DE REEMBOLSO CONFIGURADA. RECURSO PROVIDO. (AP n. 2000.000423-5, de Jaraguá do Sul, rel. Des. Jorge Schaefer Martins) • COM AS EXPRESSÕES NUM MESMO SENTIDO. MUITO COMUM! • AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO DE SENTENÇA. PENHORA DO IMÓVEL RESIDENCIAL DE PROPRIEDADE DO FIADOR EM CONTRATO LOCATÍCIO. POSSIBILIDADE. ALEGAÇÃO DE IMPENHORABILIDADE DO BEM DE FAMÍLIA INCABÍVEL. RECURSO PROVIDO. Não gera qualquer dúvida de interpretação a redação do artigo 3º, inciso VII, da Lei 8.009/90, ao dispor com manifesta clareza que o imóvel residencial de propriedade do fiador em contratos de locação não é afetado pela impenhorabilidade oponível aos bens de família. Exegese diversa estará contrariando frontalmente texto expresso de lei como ainda violando princípio basiliar de hermenêutica, positivado no art. 4o da Lei de Introdução do Código Civil, porquanto inversa aos fins sociais orientadores da Lei 8.009/90 e oposta às exigências do bem comum, pois, se assim não for, o mercado imobiliário locatício entrará em curto espaço de tempo em colapso, tendo em vista que muito pouco ou nada servirá a tão decantada garantia pessoal fidejussória. Ademais, o direito social constitucional de moradia (artigo 6º, da CF) há de ser interpretado como garantia de acesso à habitação, sem prejuízo da possibilidade de incidência de ônus sobre o imóvel. (AP n. 2005.023582-8. Criciúma. Rel.: Des. Joel Dias Figueira Júnior)
Compartilhar