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MAHFOUD Miguel org PLANTÃO PSICOLÓGICO NOVOS HORIZONTES

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Prévia do material em texto

1
Miguel Mahfoud (org)
Daniel Marinho Drummond
Juliana Mendanha Brandão
John Keith Wood
Raquel Wrona Rosenthal
Roberta Oliveira e Silva
Vera Engler Cury
Walter Cautella Junior
2ª edição
revista e ampliada
PLANTÃO PSICOLÓGICO:
NOVOS HORIZONTES
São Paulo
2012
2
Plantão Psicológico: novos horizontes
LAPS – Laboratório de Análise de Processos
em Subjetividade/UFMG
© 1999 by Miguel Mahfoud
1ª edição: outubro de 1999
2ª edição: setembro de 2012
 Revisão Miguel Mahfoud
Daniel Marinho Drummond
Capa e Diagramação
Na capa
Juliana de Souza Vaz
“Silêncio e presença”, foto de Miguel Mahfoud, 2012
Edição do CD-ROM
Apoio técnico
Daniel Marinho Drummond
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)
Plantão Psicológico: novos horizontes / Miguel Mahfoud (org.) – 2ª edição, revista e ampliada
– São Paulo: Companhia Ilimitada, 2012.
156 p.
ISBN 978-85-88607-22-4
Vários autores.
Inclui CD.
Bibliografia.
1. Aconselhamento. 2. Auto-realização (Psicologia). 3. Consulta psicológica. 4. Psicologia
aplicada. 5. Psicologia humanista. 6. Psicólogos - Entrevistas. I. Mahfoud, Miguel.
99-4235 CDD-158.3
Índices para catálogo sistemático:Índices para catálogo sistemático:Índices para catálogo sistemático:Índices para catálogo sistemático:Índices para catálogo sistemático:
1. Plantão psicológico : Aconselhamento :
Psicologia aplicada 158.3
Direitos desta edição reservados à
C. I. Editora e Livraria Ltda.C. I. Editora e Livraria Ltda.C. I. Editora e Livraria Ltda.C. I. Editora e Livraria Ltda.C. I. Editora e Livraria Ltda.
Rua Florinéia, 38 - Água Fria
02334-050 São Paulo (SP)
Tel. (11) 2950-4683 / (11) 2574-8539
livrariaciailimitada@gmail.com
www.companhiailimitada.com.br
SUMÁRIO
Autores ............................................................................................... 5
Nota à segunda edição ..................................................................... 7
Prefácio
John Keith Wood .................................................................. 9
Introdução
Frutos Maduros do Plantão Psicológico
Miguel Mahfoud .................................................................. 13
A vivência de um desafio: Plantão Psicológico
Miguel Mahfoud .................................................................. 17
Plantão de Psicólogos no Instituto Sedes Sapientiae:
uma proposta de atendimento aberto à comunidade
Raquel Wrona Rosenthal ......................................................... 31
Plantão Psicológico na escola: uma experiência
 Miguel Mahfoud ................................................................. 45
4
Plantão Psicológico: novos horizontes
Plantão Psicológico na escola: presença que mobiliza
Miguel Mahfoud, Daniel Marinho Drummond,
Juliana Mendanha Brandão, Roberta Oliveira e Silva ....... 65
Pesquisar processos para apreender experiências:
Plantão Psicológico à prova
Miguel Mahfoud, Daniel Marinho Drummond,
Juliana Mendanha Brandão, Roberta Oliveira e Silva ....... 97
Plantão Psicológico em Hospital Psiquiátrico:
Novas Considerações e desenvolvimento
Walter Cautella Junior ...................................................... 113
Plantão Psicológico em Clínica-Escola
Vera Engler Cury ............................................................... 131
Psicólogos de plantão...
Vera Engler Cury ............................................................... 151
5
AUTORES
Daniel Marinho Drummond é psicólogo, Mestre em
Psicologia Social pela Universidade Federal de
Minas Gerais, Professor Assistente na Universi-
dade Estadual do Sudeste da Bahia.
John Keith Wood (1934 – 2004) Ph.D. em Psicologia
pelo The Union Institute (E.U.A.), foi professor na
California State University em San Diego (E.U.A.)
onde também fez plantão psicológico no Hos-
pital e no Centro de Aconselhamento, e, no Brasil,
foi professor no Programa de Pós-Graduação
em Psicologia Clínica da Pontifícia Universidade
Católica de Campinas. Foi amigo íntimo e, por
quinze anos, colaborador direto de Carl Rogers.
Desenvolveu uma Psicologia de grandes grupos
e vários projetos internacionais.
Juliana Mendanha Brandão é psicóloga, Mestre em
Psicologia Social pela Universidade Federal de
Minas Gerais.
6
Plantão Psicológico: novos horizontes
Miguel Mahfoud é psicólogo, Doutor em Psicologia
Social pela Universidade de São Paulo, Professor
Associado no Departamento de Psicologia da
Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas e
no Programa de Pós-Graduação em Psicologia
da Universidade Federal de Minas Gerais.
Raquel Wrona Rosenthal (atualmente Raquel Wrona)
é psicóloga pela Pontifícia Universidade Católica
de São Paulo, com Especialização em Aconse-
lhamento Psicológico pela Universidade de São
Paulo e Curso de Estudos Avançados da Abor-
dagem Centrada na Pessoa (Rosenberg/Wood).
Psicoterapeuta e facilitadora de grupos.
Roberta Oliveira e Silva é psicóloga pela Universidade
Federal de Minas Gerais, especialista em Saúde
Mental, Família e Comunidade pela Pontifícia
Universidade Católica de Minas Gerais,
especialista em Psicologia Clínica Existencial
 pela FEAD, professora na Faculdade Pitágoras
Campus Vale do Aço e psicoterapeuta.
Vera Engler Cury é psicóloga clínica, Doutora em
Saúde Mental pela Universidade Estadual de
Campinas, Docente Permanente do Programa
de Pós-Graduação em Psicologia da Pontifícia
Universidade Católica de Campinas.
Walter Cautella Junior é psicólogo, Doutor em
Psicologia Escolar e do Desenvolvimento
Humano pela Universidade de São Paulo,
Supervisor de prática psicológica e Assistente de
Coordenação de Projetos de Pesquisa no
Laboratório de Estudos e Práticas em Psicologia
Fenomenológica Existencial do Instituto de
Psicologia da Universidade de São Paulo.
7
Esta segunda edição do livro “Plantão
psicológico: novos horizontes” nasce para fazer memória.
No melhor sentido do termo: Nasce como ajuda a
darmo-nos conta de algo que, iniciado no passado,
continua presente.
Continuam presentes força e atualidade de seus
artigos. Gerados na fonte viva da experiência real,
amadurecidos no amor ao desafio, continuam a trazer
ao presente sabedoria instigante.
Este volume nasce ampliado: a inclusão do texto
“A vivência de um desafio: plantão psicológico” ajuda a manter
presente entre nós o primeiro artigo a sistematizar a
proposta de plantão psicológico. Artigo este que
continua a ser citado em diversas publicações e utilizado
em diversos cursos de formação universitária, a
despeito de seus já muitos anos de presença desafiadora.
De fato, neste ano de 2012 fazemos memória
viva de 25 anos de publicação daquela proposta
original na obra organizada por Rachel Lea Rosenberg
1
.
NOTA À SEGUNDA EDIÇÃO
1
 ROSENBERG,
Rachel Lea (Org.).
Aconselhamento
Psicológico Centrado
do Cliente. São Paulo:
EPU, 1987.
8
Plantão Psicológico: novos horizontes
Ano em que fazemos memória igualmente viva dos
também 25 anos de seu falecimento. Ela permanece
mestra de todos os que, com plantão psicológico,
querem dar uma contribuição à incansável tarefa de
construir e reconstruir uma psicologia da pessoa, do
sujeito atuante em seu mundo de modo livre,
responsável por seu destino. Para todos estes, sem
dúvida, Rachel continua a ser presença geradora.
Esta segunda edição nasce, assim, para fazer
memória. E a Rachel Lea Rosenberg é dedicada.
Miguel Mahfoud
9
PREFÁCIO
John Keith Wood
Este livro traz boas novas.
Primeiramente, apresenta evidências de que o
Plantão Psicológico é um serviço viável para atender
adolescentes, estudantes universitários e outros
membros da comunidade, abastados ou não.
O contato com esse serviço ajuda as pessoas a
lidarem efetivamente com os predicamentos da vida,
não os tratando como problemas que requerem tra-
tamento psiquiátrico.Por exemplo, uma pessoa em uma
“crise espiritual” não está confrontando um problema.
Não está tendo um comportamento normal ou
anormal. É um predicamento envolvendo questões
filosóficas, buscando significados, identidade.
O psicólogo Prof. Dr. Miguel Mahfoud ilustra
este ponto de vista em um relato sobre experiências
em um colégio. Plantão seria “um espaço onde o aluno
pudesse buscar ajuda para rever, repensar e refletir suas
questões”. Naturalmente, tal atividade não é apenas uma
conversa entre amigos. Em situações onde uma forma
10
Plantão Psicológico: novos horizontes
diferente de psicoterapia é mais apropriada, a pessoa
recebe a indicação de um(a) profissional competente.
Uma outra boa nova é que plantão psicológico
pode promover uma experiência de aprendizagem
eficaz para estagiários(as). Confrontando a pessoa inteira
no contexto completo da sua existência, o estagiário(a)
necessariamente deve ampliar sua visão do papel da
psicoterapia. O filósofo e matemático inglês Alfred
North Whitehead observou que, “O conhecimento de
segunda-mão do mundo instruído é o segredo da sua
mediocridade”. O tipo de problemas que as pessoas
enfrentam são, em geral, de primeira-mão. A ajuda que
necessitam é de ordem prática. Esta forma de aprendi-
zagem é prática.
Assim, ambos os participantes – o plantonista e
o indagador(a) – participam e se beneficiam de uma
educação intuitiva cujo objetivo é a auto-realização. Em
um encontro de pessoa a pessoa como este, onde se
procura dirigir a melhor parte de si mesmo à melhor
parte do outro com o propósito de curar a mente, o
corpo e a natureza, a essência da psicoterapia está, de
fato, sendo redefinida.
O mesmo observa Walter Cautella Junior, des-
crevendo seu trabalho em um hospital psiquiátrico:
“A experiência do plantão psicológico leva a instituição
a reformar sua visão do indivíduo institucionalizado”.
Há promessas de mais boas novas. A palavra
“plantão” vem do francês planton, quando era aplicado
em linguagem militar para designar a pessoa que ocupa
uma posição fixa, alerta dia e noite. Seu uso moderno
refere-se ao suporte, fora do horário normal, oferecido
por médicos em hospitais ou, como aqui, por um psicó-
logo. Além disso, sua relevância está no fato de que a
origem da palavra planton vem do latin: plantare, plantar.
Um significado dessa palavra refere-se a “planta
do pé”. Assim, o plantão psicológico pode ser visto co-
mo tendo seus pés no chão. Sendo prático. Respondendo
11
Prefácio
às necessidades imediatas dos clientes (que poderão ser
psicológicas ou de qualquer outra ordem).
O segundo sentido de “plantar,” é “meter um
organismo vegetal na terra para enraizar”. Essa é outra
característica do Plantão Psicológico descrito neste livro:
estar plantado na cultura brasileira com suas deficiências
e seus nutrientes. Principalmente, é um organismo vivo
e crescendo. Assim, como lembram as palavras de
Prof.a. Dr.a Vera E. Cury, “Uma ética das relações in-
terpessoais, sutil mas poderosa, feita de pequenos gestos
e acenos suaves, simples e ainda assim determinada,
parece conduzir os projetos do Plantão Psicológico”.
Se for possível ficar imune e não se deixar res-
tringir por dogmas e modismos filosóficos poderá
continuar a se desenvolver efetivamente de acordo
com as necessidades da população desse tempo e lugar.
John Keith Wood
Jaguariúna, Agosto 1999
12
Plantão Psicológico: novos horizontes
13
INTRODUÇÃO
1
 MAHFOUD, Miguel.
A vivência de um
desafio: plantão
psicológico. In:
ROSENBERG, Rachel
Lea (Org.). Aconse-
lhamento psicológico
centrado na pessoa.
São Paulo: EPU,
1987, p. 75-83. (Série
Temas Básicos de
Psicologia, Vol. 21).
O texto está publi-
cado no presente vo-
lume. Cf. p. 17-30.
Frutos Maduros do
Plantão Psicológico
Miguel Mahfoud
Desde a primeira sistematização – nos idos
de 1987
1
 – da inicial experiência de Plantão
Psicológico no Brasil, que se apresentava como
desafio a ser vivenciado, como semente que muda
de cor e se alastra no terreno de sempre com brotos
frágeis mas injetando a verde esperança que tudo
transforma, desde então a proposta de um Aconse-
lhamento Psicológico aberto às mudanças de nosso
tempo, de nossa cultura e de nossa realidade social
foi brotando e formando raízes.
Que solo seria o mais propício ao desenvolvimento
de algo que prometia vitalidade senão o nosso próprio,
nossa terra, nossos desafios sociais, institucionais? Apren-
der da experiência a partir de um empenho com a reali-
dade assim como ela é para de dentro transformá-la.
Assim, em nosso solo brasileiro a experiência de Plantão
Psicológico tomou corpo de maneira original.
O presente livro quer comunicar a sistematização
de um exercício de aprendizagem a partir da experiência
14
Plantão Psicológico: novos horizontes
de empenho em diferentes contextos institucionais.
Diversas experiências de Plantão Psicológico que dão
vida a uma modalidade de Aconselhamento Psicológico
que aceitou romper os limites estabelecidos pelo
descompromisso teorizado de tantas psicologias, pelo
reducionismo sentimental de algumas propostas de
psicologia que se querem humanistas.
Veremos aqui os desafios serem enfrentados em
novos horizontes. Tantos desafios permanecem os
mesmos para a psicologia desde muito: desafios sociais
como as dificuldades econômicas e de trabalho,
desafios educacionais, desafios de uma psicologia
humanista atuante dentro das instituições... A novidade
vem da vitalidade da experiência mesma de um
atendimento que aceita outros parâmetros para orientar
seu desenvolvimento. Os novos horizontes são indi-
cados pela própria aprendizagem significativa siste-
matizada com rigor para acolher a vitalidade que com
surpresa emerge.
Queremos que o leitor possa entrar em contato
com a vitalidade da experiência, e com a força provo-
cadora que algo acontecido de fato pode nos comunicar:
a força do possível. Mais do que modelos, encontramos
aqui provocações.
Uma das provocações significativas é a integração
de trabalhos de base humanista inserido em instituições.
Tantas vezes ouvimos o refrão quase automaticamente
repetido de que as instituições têm objetivos diversos
daqueles que movem a Psicologia Humanista já que
esta quer acentuar a centralidade da pessoa e seus pro-
cessos autênticos. As experiências aqui comunicadas
indicam uma possibilidade de trabalhos claramente de
base humanista que aceitam – com nossos próprios
sujeitos – o desafio de continuamente buscar, no con-
texto assim como se apresenta, a afirmação dos inte-
resses propriamente humanos. Se realmente fosse im-
possível para nós, de que maneira poderíamos esperar
15
Introduçâo
que fosse possível para nossos clientes? Se não fosse
possível para nós, só nos restaria propor o atendimento
psicológico como espaço alternativo, e por isso
inevitavelmente alienante. Encontramos aqui experiências
que podem abrir novos horizontes neste sentido.
Em se tratando de uma novidade que estava
apenas brotando, por muitos anos a comunidade psi
acolheu a proposta de Plantão Psicológico como algo
“alternativo”. No sentido que seria algo outro em re-
lação ao estabelecido como campo seguro e próprio
do saber e da técnica psicológica. Desconfianças, dúvi-
das, reticências... cultivadas em compasso de espera,
até que os frutos amadurecessem e se pudesse conhecer
de fato esse Plantão. O próprio Conselho Federal de
Psicologia chegou a se pronunciar em documento ofi-
cial, classificando Plantão Psicológico dentre as técnicas
alternativas emergentes. Alternativa de maneira distinta
daquelas de origem confusa ou esotérica, mas entendida
como proposta inovadora, que em certa medida rom-
pe parâmetros estabelecidos por técnicas tradicionais
e que ainda estava aguardando uma avaliação mais rigo-
rosa de sua eficácia pelas instituições de ensino superior
e de pesquisa.
Pois bem,os frutos amadureceram e são aqui
oferecidos. Amadureceram no trabalho sistemático,
na observação atenta, na sistematização com rigor
metodológico com base em pesquisas de base feno-
menológica. São esses frutos que agora, aqui, são ofe-
recidos à comunidade para que possamos promover
a experiência de Plantão Psicológico com uma concep-
ção clara, de maneira tal a possibilitar sua correspon-
dente avaliação.
Neste sentido este livro dá um passo histórico.
Já não podemos falar em Plantão Psicológico como
técnica alternativa. O atual e crescente interesse do-
cumentado pela presença de mesas redondas e/ou
de comunicação de pesquisa sobre Plantão Psicológico
16
Plantão Psicológico: novos horizontes
em diversos congressos nacionais e regionais já era
um indício dessa mudança. A apresentação dessas
experiências sistematizadas e pesquisadas colocam um
ponto final.
É claro que trata-se de um ponto final só no
caráter de alternativo. Sabemos bem que estamos no
início. Plantão tem ainda muito em que crescer para
exprimir toda sua potencialidade. Os primeiros frutos
maduros apresentam o Plantão; e sabemos, agora mais
do que nunca, que vale a pena cultivá-lo, que há terreno
propício, que há horizonte amplo onde mirar.
Bom terreno, boas sementes, bons frutos... :
bom proveito!
17
A expressão “plantão” está associada a certo
tipo de serviço, exercido por profissionais que se
mantêm à disposição de quaisquer pessoas que deles
necessitem, em períodos de tempo previamente
determinados e ininterruptos.
Do ponto de vista da instituição, o atendimento
de plantão pede uma sistematicidade do serviço ofere-
cido. Do profissional, esse sistema pede uma dispo-
nibilidade para se defrontar com o não-planejado e
com a possibilidade (nem um pouco remota) de que
o encontro com o cliente seja único. E, ainda, da pers-
pectiva do cliente significa um ponto de referência,
para algum momento de necessidade.
Pelo conjunto destas três características, “plantão
psicológico” parece um desafio. E é!
Com os poucos recursos de saúde mental atual-
mente disponíveis à população brasileira, somados à
pouca informação a respeito da especificidade e diver-
sidade de cada área profissional envolvida, a tendência
tem sido a de que os serviços oferecidos se fixem em
algumas prioridades definidas pelos casos mais graves.
Uma consequência é a especialização em demandas
bastante restritas.
A vivência de um desafio:
Plantão Psicológico
Miguel Mahfoud
18
Plantão Psicológico: novos horizontes
Como atender à demanda de Paula, que
estando apaixonada por um rapaz é pressionada pelo
marido a resolver-se com quem fica, num prazo de
15 dias, sob pena de ser expulsa de casa, e não se sente
em condições de resolver isso? Ou de Sérgio, preo-
cupado com sua esposa por ela estar ouvindo vozes e
acordar à noite imaginando que ele tenha morrido,
pede atendimento para ela? Que tipo de atendimento
seria adequado a Miriam, que, tornando-se viúva aos
30 anos, defronta-se com fortes mudanças em suas
relações pessoais com seu filho de três anos, com sua
família e a do marido, e com amigos, e pede ajuda no
sentido de localizar-se melhor? Ou ainda a Caetano,
que quer saber como convencer seu irmão alcoólatra
de que ele e seus filhos precisam de ajuda psicológica?
Se a “resposta-padrão” do psicólogo é psico-
terapia – como tem sido sua especialização no consul-
tório e outras instituições de saúde mental – parece
não haver como responder à demanda que lhe é feita
naquele preciso momento e por aquela pessoa específica.
Assim, quem vive uma ansiedade ante a alguma
dificuldade circunstancial ou ante a necessidade de se
localizar quanto às possibilidades de recursos de saúde
mental, normalmente permanecem à margem, sem
um espaço adequado onde ser acolhido e ajudado a
lidar melhor com seus recursos e limites.
O enfoque assumido pelo profissional em
Aconselhamento Psicológico Centrado na Pessoa é
uma contribuição ao enfrentamento dessa problemá-
tica, na medida em que se coloca disponível a acolher
a experiência do cliente em determinada situação, ao
invés de enfocar o seu problema. Na prática, essa atitude
significa disponibilidade para atender uma gama
bastante ampla de demandas, já que o foco se define
pelo próprio referencial do cliente e não pela especiali-
zação do profissional (como seria, por exemplo, para
um psiquiatra ou psicanalista ortodoxos, entre outros).
19
Essa característica de enfocar a experiência do
cliente por seu próprio referencial está ligada a uma
outra, que se refere à possibilidade de responder à
pessoa que coloca sua demanda, já no momento
presente, no aqui e agora da situação do encontro.
O conjunto destas características possibilita,
então, realizar um plantão psicológico, onde o trabalho
do conselheiro-psicólogo é no sentido de facilitar ao
cliente uma visão mais clara de si mesmo e de sua pers-
pectiva ante a problemática que vive e gera um pedido
de ajuda. Nisso, a forma de enfrentar a problemática
se definirá no próprio processo de plantão e com par-
ticipação efetiva de ambos, cliente e conselheiro.
Em relação aos exemplos de demandas ante-
riormente levantados, o plantão psicológico possibilita
atender a Sérgio, ele próprio ali presente e preocupado
com sua esposa, além de esclarecer os recursos dispo-
níveis para o tratamento dela. O mesmo acontece nos
casos de Paula ante seu marido, ou Caetano ante seu
irmão alcoólatra e sua família. E possibilita a Miriam
se localizar ante sua problemática de viúva, clareando
ainda mais seu pedido de aconselhamento psicológico
ou terapia, tornando aquele encontro muito mais signi-
ficativo do que uma inscrição como coleta de dados
sobre a cliente ou sobre sua problemática (como é a
forma clássica de triagem ou inscrição para atendimento
psicoterápico).
Trata-se, então, de enfrentar a problemática que
é apresentada, via a própria pessoa que está presente.
Tomemos aqueles exemplos um a um:
1) Paula procura o plantão psicológico bastante
tensa, preocupada, cabeça baixa. Diz que é a primeira
vez que procura ajuda psicológica e que nunca con-
versou com ninguém sobre seu problema atual. Conta
que se sente encurralada: estando casada há dois anos,
apaixonou-se por outro rapaz com quem trabalha, e
A vivência de um desafio: Plantão Psicológico
20
Plantão Psicológico: novos horizontes
depois de declarar-se a ele, e confirmar que seus sen-
timentos eram correspondidos, contou ao marido o
que estava acontecendo. Este lhe deu um prazo de 15
dias para que se decidisse, sob pena de ser expulsa de
casa e perder o filho de um ano. Paula não se sentia
em condições de resolver nada, mas a situação era
limite (via a possibilidade de ocorrer agressão física).
O conselheiro procura ouvir com atenção, estar
junto a ela naquele momento marcado por emoções
fortes (amor, medo, raiva...) ante sentimentos de fra-
casso e abandono e ante interesses incertos. Isso facilita
a Paula expor-se, ouvir-se, sentir-se. Sintonizadas, as
perguntas do conselheiro ajudam-na a olhar a situação
e a si mesma.
Durante a sessão dá-se conta da raiva que tem
do marido (inicialmente falava de indiferença) e do
quanto tem sentido falta de sua atenção.
A sessão dura uma hora e marca-se um retorno
ao plantão para três dias depois.
No retorno conta que naqueles dias pôde
explicitar sua raiva pelo marido de forma direta: houve
discussões difíceis e mesmo nesse clima ela pôde
perceber que ele gostava muito dela e não queria que
ela se afastasse. Isso mudou a percepção que vinha
tendo do marido e possibilitou que conversassem de
forma mais clara, como nunca antes, dizendo um ao
outro o que estavam sentindo, o que esperavam um
do outro, o que fazia falta... Diz que combinaram uma
forma diferente de organizar o tempo para que cui-
dassem mais do espaço deles como casal, ao intuírem
a possibilidade de um relacionamentomais vivo.
Na sessão considera o relacionamento com o
marido mais globalmente, desde o tempo de namoro,
e examina sua própria história constituída também por
esse relacionamento. Relativiza seus sentimentos pelo
“outro”, dá-se conta da idealização que tem feito da
pessoa do outro, de quem na verdade é distante.
21
Enfim, vê a possibilidade de verificar no próprio
relacionamento com o marido a viabilidade de
continuarem juntos ou de ligar-se a outra pessoa.
Agradece o atendimento e despede-se.
O desfecho do problema talvez nunca che-
guemos a conhecer. Estivemos com Paula, que agora
caminha.
2) Sérgio procura o Serviço de Aconselhamento
Psicológico buscando atendimento para sua esposa.
Conta com detalhes os comportamentos dela que o
preocupam, como, por exemplo: não dar mais conta
de atividades rotineiras como cozinhar, estar comple-
tamente desatenta às necessidades dos filhos, dormir
muito, ouvir vozes e acordar assustada durante a noite
imaginando que ele esteja morto.
O conselheiro, atento também à ansiedade de
Sérgio, comenta que percebe estar sendo difícil para
ele ficar nessa situação, assumindo tarefas que seriam
dela, preocupando-se com os filhos que passam o dia
com ela e assustando-se ao ser apalpado no meio da
noite quando ela quer verificar se está vivo ou morto.
Sérgio passa a falar mais de si mesmo, na sua situação
com a esposa, e a comentar suas dificuldades no traba-
lho onde se sente “abusado”, ampliando a percepção
de seu momento atual.
No final o conselheiro lhe oferece a possibili-
dade de encontros regulares como aquele, caso esti-
vesse interessado em um processo de aconselhamento
para si mesmo que está vivendo um período difícil.
“Eu não, moço! Quem precisa de tratamento é minha
mulher!” – responde prontamente.
Ele pôde aproveitar aquele momento de plantão
também para si mesmo, ocupando um espaço que lhe
foi possibilitado durante a sessão. Agora ele não vê a
necessidade de um espaço mais sistemático neste senti-
do. Sabe, porém, que há essa possibilidade.
A vivência de um desafio: Plantão Psicológico
22
Plantão Psicológico: novos horizontes
O conselheiro lhe ofereceu indicações de ser-
viços psiquiátricos em que sua esposa poderia ser
atendida, e Sérgio disse que voltaria a procurar o plantão
caso houvesse problemas para o encaminhamento de
sua esposa.
Aquele momento não se desenrolou alheio à
pessoa dele. E o conselheiro esteve com Sérgio, no
horizonte dele, independentemente de continuidade que
pudesse haver.
3) Caetano vai ao Serviço de Aconselhamento
pedindo ajuda para convencer seu irmão alcoólatra
de que ele precisa de tratamento psicológico. Já
aposentado por motivos de saúde, não tem se cuidado,
está sempre muito deprimido, e seus filhos de cinco e
sete anos vêm apresentando comportamentos agressi-
vos e destrutivos.
Comenta que fica muito preocupado com a
situação, que se agrava cada vez mais, e ao mesmo
tempo não pode fazer nada. Conta que já falou com a
esposa de seu irmão, mas ela não o ouve. Sugere, então,
que o conselheiro, como especialista nesses assuntos,
escreva uma carta dizendo que realmente eles precisam
de tratamento psicológico.
O conselheiro aponta os sentimentos de frus-
tação e impotência ante a situação e ante o seu desejo
de intervir. Caetano, então, fala de como seria impor-
tante fazer alguma coisa, pois não confia na educação
que sua cunhada dá aos filhos porque ela trabalha em
um bar.
Perguntado como é o relacionamento entre ele
e sua cunhada, fala de desconfiança da integridade
moral e chega a concluir que tem se relacionado com
ela em tom de acusação, e isso mantém um distan-
ciamento e a não-aceitação de suas opiniões. Assim,
Caetano reconhece seus próprios limites em poder aju-
dar, já que ele próprio não acredita muito nas
23
condições pessoais de sua cunhada para que ela pudesse
dar conta do recado. Comenta nunca ter pensado nisto.
O conselheiro explica que embora não possa
lhe fornecer a carta sugerida, compreende que essa
ideia tenha surgido como possibilidade de intervenção
ante o distanciamento e as dificuldades de confiança e
comunicação entre eles.
Um tanto surpreso, Caetano diz que talvez
procure conversar com sua cunhada, mas já não sente
a mesma urgência e o mesmo ímpeto que o levou a
procurar o plantão.
Pergunta sobre os recursos de saúde mental aos
quais poderia recorrer. O conselheiro lhe dá as infor-
mações e Caetano indaga se poderia voltar para con-
versar, caso sinta a necessidade. A resposta é afirmativa,
e ele segue sua história.
4) Miriam procura o Serviço de Aconselha-
mento pedindo atendimento psicológico porque tem
estado intranquila e confusa desde que seu marido
faleceu, há seis meses, em acidente automobilístico.
Diz-se muito só e abandona, e que suas relações de
amizade e parentesco têm se deteriorado. Comenta
que todos a veem de modo diferente agora – viúva
jovem (30 anos) –, tendo surgido preocupações e inte-
resses novos em relação a ela.
O conselheiro percebe que Miriam está falando
de uma experiência muito forte para ela; pode ter algu-
ma noção do que ela está sentindo, e para compreendê-la
melhor faz perguntas sobre alguns aspectos aos quais
já havia se referido vagamente.
Miriam então fala mais sobre sua solidão, sobre
o sentimento de abandono e apesar de saber racio-
nalmente que seu marido não a abandonou, esse senti-
mento a confunde. Comenta em seguida que o con-
vívio com a família (a dela e a do marido) não tem
sido algo que a ajude porque ambas têm a preocupação
A vivência de um desafio: Plantão Psicológico
24
Plantão Psicológico: novos horizontes
de que ela “imponha respeito”, tome cuidado com as
amizades, não se aproxime de outros homens para
respeitar a memória de seu marido, o que a faz sentir-
se envolvida por uma atmosfera de controle. Por outro
lado, vê-se como jovem, não quer fechar novas
possibilidades para si e para seu filho de três anos, na
vida que têm pela frente. Por outro lado, tem sido
cortejada por homens que há pouco eram apenas seus
amigos e vive essa mudança repentina com dificuldades.
Não estando mais segura dessas amizades, nem pode
avaliar com clareza as intenções das pessoas que se
oferecem para apoiá-la. Comenta que o resultado tem
sido o recuo, e percebe claramente que isso só tem
agravado ainda mais seu mal-estar.
Fica um pouco em silêncio, chora discreta-
mente... Em seguida fala que é bom poder falar com
liberdade sobre tudo isso.
O conselheiro comenta que pôde perceber que
está sendo importante para ela fazer tais comentários,
e que procurar atendimento estava sendo a tentativa
de abrir uma nova porta, alternativa à postura de recuo
que vem tomando.
Pela própria relação que se estabeleceu ali, na-
quele momento, e pela forma como ela olha a si e a
sua situação, o conselheiro pôde avaliar que os senti-
mentos de abandono, deterioração e a percepção de
ser o centro dos interesses não estão ligados a um
comprometimento psicopatológico a nível psiquiátrico;
ela está atenta a sentimentos e movimentos distintos
dentro de si mesma. Assim, diz a Miriam da possibi-
lidade de ser atendida em processo de aconselhamento
psicológico no próprio Serviço de Aconselhamento.
Ela demonstra interesse, e o conselheiro explica-lhe as
condições de atendimento naquela instituição; então
preenchem uma ficha com os dados da cliente (nome,
endereço, telefone, horário disponível para ser atendida
etc.), efetivando assim a inscrição.
25
Sendo que há uma fila de espera e tendo-se esti-
mado o início do atendimento para pouco mais de
um mês, o conselheiro informa que durante o período
de espera ela poderá procurar o plantão caso sinta
uma necessidade mais premente de conversar. O anún-
cio da possibilidade é recebido com alívio por Miriam.
Despedem-se, ficando a instituição responsável
por chamá-la quando o atendimento puder se iniciar.Enfrentar a problemática apresentada a partir
da experiência da pessoa ali presente permite acolher a
demanda já naquele momento, no momento de sua
expressão: e isso é apenas uma primeira característica
importante de um atendimento em sistema de plantão
psicológico. A consequência é que além de se poder
estar disponível a uma gama muito grande de deman-
das, as formas de continuidade são também muito
diversificadas. Assim, nos exemplos dados, o conselhei-
ro pôde atender ao pedido de informação e à ansie-
dade de Sérgio ante sua esposa psicótica; ao pedido
de Caetano que se propunha a ajudar seu irmão alcóo-
latra; pôde atender ao pedido de clarificação de Paula
que se sentia encurralada nas dificuldades com o ma-
rido; e ao pedido de aconselhamento psicológico de
Miriam que se viu numa nova condição social a partir
da viuvez. E ao acolher a demanda já no momento
presente, o referencial do próprio cliente conduz o
processo de atendimento para uma direção ou para
outra: Sérgio mantém o foco da problemática sobre
sua esposa, mesmo clarificando sua própria experiência
na situação-problema; Caetano voltou o foco mais
para si mesmo, para suas possibilidades e limites de
intervenção; Paula, voltando o foco para si e seus
sentimentos, pôde se colocar de forma mais clara com
o marido e não viu mais a necessidade do acompanha-
mento; Miriam, ao examinar sua experiência, confirma
o desejo de um processo de atendimento psicológico.
A vivência de um desafio: Plantão Psicológico
26
Plantão Psicológico: novos horizontes
Que seja o referencial do próprio cliente a definir
a direção do processo não significa ausência ou passi-
vidade do conselheiro, ao contrário, é a sua presença
clara e atenta que permite ao cliente uma clarificação
maior de seu referencial. Ao mesmo tempo que o con-
selheiro sabe que está facilitando um processo infi-
nitamente mais amplo do que lhe é possível apreender
só naquele momento, sabe estar facilitando também o
processo de crescimento da pessoa, do qual aquele breve
encontro participa (de forma significativa, espera-se!) –
assim como aquele encontro permitiu a Paula desenrolar
um novo processo com seu marido, que segue em
frente independentemente do acompanhamento do
conselheiro.
Uma outra contribuição que cabe ao psicólogo-
conselheiro no momento do plantão é estar atento à
forma de relação que se estabelece e à forma como o
cliente percebe sua problemática, para bem ajudá-lo
também nas diversas possibilidades de continuidade
e/ou encaminhamento. Por exemplo, se Miriam colo-
casse como globalidade a sua percepção de deterio-
ração das relações e de sua identidade, ou com rigidez
a sua percepção de que todos passaram a controlá-la
ou seduzi-la, a proposta de atendimento em Acon-
selhamento Psicológico poderia ser acompanhada de
um encaminhamento para um exame e/ou um acom-
panhamento psiquiátrico. O sistema de plantão psi-
cológico contém um caráter de triagem não-clássica,
sendo que esta não é o centro do encontro, não o
delimita nem o conduz, mas nem por isso está ausente
para o conselheiro quando avalia as possibilidades de
continuidade dentro da perspectiva do cliente.
A flexibilidade do conselheiro quanto à direção
da continuidade do processo é também o que lhe
permite continuar disponível à pessoa que lhe pro-
curou, mantendo o plantão como referência, como
mais um dentre os recursos de saúde mental possíveis
27
de serem utilizados. Dessa forma, Sérgio pode procurar
novamente o plantão para novas informações ou para
um atendimento pessoal, e Caetano pode pedir um
atendimento no prosseguimento de seu processo. Esta
disponibilidade do conselheiro pode se manter mesmo
que já se tenha definido a forma de encaminhamento,
como no caso de Miriam, que seguirá um processo
de Aconselhamento Psicológico. A experiência de
plantão como momento significativo da pessoa ante
sua problemática tende a se tornar referência-existencial:
portas abertas que podem significar facilitação para
um novo pedido de ajuda ou facilitação para suportar
a espera do início de um outro processo.
Para que possa se tornar referência estável é
importante que a instituição assegure a presença de
conselheiros disponíveis em certos horários em lugares
fixos, além de manter informações e contatos com
outros recursos de saúde e educação.
É claro que os exemplos de demandas até aqui
apresentados foram escolhidos em função de explicitar
o potencial, a amplitude e a viabilidade do sistema de
plantão psicológico com a contribuição da Abordagem
Centrada na Pessoa. Demandas muito mais simples
são também comuns, e mesmo nestes casos o plantão
pode ser de grande contribuição. Por exemplo:
Lúcia é estudante de arquitetura, trabalha já na
sua área, gosta do que faz, mora com a família. Procura
o Serviço de Aconselhamento Psicológico e pede aten-
dimento dizendo que não ocorreu nada de anormal
nos últimos tempos, mas está querendo se conhecer
melhor, e quer ter um tempo e um espaço específicos
para se dedicar a isso. O conselheiro se interessa por
saber o que tem feito, como tem se sentido em sua
vida quotidiana, e Lúcia fala de algumas dificuldades
de relacionamento com os pais por alguns choques de
valores, de como gostaria de ser mais independente
A vivência de um desafio: Plantão Psicológico
28
Plantão Psicológico: novos horizontes
desses atritos, mais firme, e de como seu namorado
tem sido importante para ela neste sentido. Assim, fica
melhor delimitado, para a própria Lúcia também, o
seu campo de interesse para iniciar um processo de
atendimento psicológico. Preenchem a ficha de inscri-
ção e o conselheiro lhe explica as condições de atendi-
mento naquela instituição. A sessão durou meia hora.
O plantão permite um sistema de inscrição, por
si, terapêutico – já no momento de pedido de atendi-
mento. Isto porque propicia ao cliente configurar com
mais clareza seu pedido de ajuda – ainda que isso não
mude sua perspectiva. Trata-se de facilitação à clarifi-
cação de sua demanda; o que equivale a dizer, clari-
ficação de seu eu que está em um certo movimento
de busca. Essa forma de inscrição de um Serviço de
Aconselhamento Psicológico não dispensa uma certa
organização burocrática, mas não se pauta por ela.
Se tal sistema de plantão psicológico descortina
um horizonte amplo para atendimentos psicológicos,
não se pode dizer, porém, que suas possibilidades sejam
ilimitadas. Sua viabilidade se insere nos próprios limites
da relação de ajuda. Por isso uma pessoa que vai buscar
o “conselho” para a resolução de seu problema – sem
disponibilidade interna de um contato maior consigo
mesma – pode ficar decepcionada e o conselheiro,
por sua vez, pode ficar sem poder contribuir, mesmo
que queira. Ou uma pessoa que em surto psicótico é
levada por amigos, mas não consegue manter contato
a ponto de se efetivar um encontro com o conselheiro,
pode sair como entrou. Também uma relação de ajuda
permanece circunscrita a limites institucionais e pessoais
do conselheiro e do próprio cliente.
Aceitar manter-se no momento presente, cen-
trado na vivência da problemática que emerge com
sua ansiedade e força particulares no próprio momento
de pedido de ajuda, acompanhando a variação da
29
percepção de si e das circunstâncias pela direção que a
clarificação a levar – eis a disponibilidade do psi-
cólogo-conselheiro, que possibilita o atendimento em
plantão psicológico. Assim, num horizonte novo, reto-
mo as palavras do início deste capítulo: “Pelo conjunto
destas características, plantão psicológico parece um
desafio. E é!”.
A vivência de um desafio: Plantão Psicológico
31
O Plantão de Psicólogos no Instituto
Sedes Sapientiae: uma proposta de
atendimento aberto à comunidade
Raquel Wrona Rosenthal
No final da década de 70, parte do grupo de
profissionais que antes se reunia como “Grupo de
Psicologia Humanista”, decide constituirno Instituto
Sedes Sapientiae, o Centro de Desenvolvimento da
Pessoa, CDP.
Estimulado pelo entusiasmo de Rachel Lea
Rosenberg, o CDP desenvolvia programas de estudos
teóricos, grupos de supervisão e reflexão sobre a
prática clínica, promovia workshops abertos ao público,
ciclos de encontros de profissionais paulistas e também
encontros nacionais, constituindo-se em importante
referência para os interessados em discutir e aprofundar
o conhecimento da ACP, Abordagem Centrada na
Pessoa.
Sempre atenta ao potencial transformador da
ACP, considerando tanto a dimensão individual quanto
a social / comunitária, Dra. Rosenberg propõe a criação
de um serviço de Plantão de Psicólogos, inspirado
nas experiências das walk-in clinics, surgidas nos Estados
32
Plantão Psicológico: novos horizontes
1
 ROGERS, Carl
Ramson. As condi-
ções necessárias e
suficientes para a
mudança terapêu-
tica da personali-
dade. In: WOOD,
John Keith et alii
(Org.s). Abordagem
centrada na pessoa,
Vitória: Fundação
Ceciliano Abel de
Almeida / Universi-
dade Federal do
Espírito Santo, 1995,
p. 157-179.
2
 ROGERS, Carl
Ramson. Psicotera-
pia e consulta psico-
lógica. 1ª ed. São
Paulo: Martins Fon-
tes, 1987 (Coleção
Psicologia e Peda-
gogia), p. 207-208.
Unidos para prestar atendimento imediato à
comunidade. Até então o Serviço de Aconselhamento
Psicológico, no Instituto de Psicologia da USP, sob
sua coordenação, já vinha oferecendo o que chamava
“plantão”, e que consistia, naquele caso, em uma
disponibilidade mais atenciosa de recepção aos clientes
que procuravam inscrição para atendimento regular
em aconselhamento psicológico. Daí surgiram as
primeiras reflexões sobre as potencialidades de um
serviço de “Plantão Psicológico”: o poder transfor-
mador da escuta atenciosa, não diretiva, centrada no
cliente, confiante na tendência ao desenvolvimento
das potencialidades inerentes à pessoa (tendência
atualizante), e na possibilidade dessa tendência ser
estimulada, mesmo através de um único encontro com
o profissional, desde que este último possa oferecer
sua presença inteira, através de sua própria congruência,
capacidade de empatia e aceitação incondicional do
outro, atitudes pilares da ACP.
1
É de Carl Rogers, o criador da Abordagem
Centrada na Pessoa, a ponderação:
“Se atendermos à complexidade da vida humana com
olhar justo, temos que reconhecer que é altamente
improvável que possamos reorganizar a estrutura da
vida de um indivíduo. Se pudermos reconhecer este limite
e nos abstivermos de desempenhar o papel de Deus,
poderemos oferecer um tipo muito precioso de ajuda, de
esclarecimento, mesmo num curto espaço de tempo. Podemos
permitir ao cliente que exprima seus problemas e
sentimentos de forma livre, e deixá-lo com o reconhecimento
das questões que enfrenta.” 2
Muitas pessoas, em determinada circunstância
de suas vidas, poderiam se beneficiar ao encontrar essa
interlocução diferenciada, que lhes propiciasse uma
oportunidade também de escutar a si mesmos,
33
O Plantão de Psicólogos no Instituto Sedes Sapientiae
3
 INSTITUTO SEDES
SAPIENTIAE: : : : : Carta
de Princípios, s/d
(mineo.).
identificando e reconhecendo seus próprios sentimentos
e possibilidades de auto direção, no momento em que
enfrentam a dificuldade, sem que necessariamente
tenham que se submeter a atendimento sistemático,
prolongado, como tradicionalmente oferecem as
psicoterapias.
Coube a mim a coordenação e supervisão do
Plantão de Psicólogos do CDP, oferecido pela primeira
vez em agosto de 1980, como um dos chamados
“cursos de expansão”do Instituto Sedes Sapientiae. O
curso tinha duração semestral, e prestava, através de seus
alunos, atendimento psicológico aberto à população.
O Instituto Sedes Sapientiae ou Sedes, como hoje
o chamamos, fundado em São Paulo em 1975, é um
importante centro de prestação de serviços, ensino e
pesquisa ligados às áreas da Psicologia e da Educação,
tendo como compromisso
“assumir sua parcela de responsabilidade na
transformação qualitativa da realidade social, estimulando
todos os valores que acelerem o processo histórico no sentido
de justiça social, democracia, respeito aos direitos da pessoa
humana”.3
Feliz associação de ideais, nosso Plantão tinha
lugar certo para acontecer!
As atividades iniciaram-se pela seleção dos
plantonistas. Os critérios adotados pediam que fossem
psicólogos, que conhecessem os fundamentos da ACP,
que tivessem experiência mínima de um ano em
atendimento clínico e estivessem especialmente
sensibilizados pela natureza do serviço proposto.
Contávamos com um grupo de doze planto-
nistas e uma supervisora e estabelecemos o horário
das 20 às 22 horas, às segundas e quintas-feiras
34
Plantão Psicológico: novos horizontes
4
 BELLAK, Leopold
& SMALL, Leonard.
Psicoterapia de
Emergência e Psico-
terapia Breve. Porto
Alegre: Artes Médi-
cas, 1980.
para os atendimentos e nossas reuniões. Dedicamos
aproximadamente um mês e meio ao planejamento e à
divulgação do novo serviço, período em que pudemos
compartilhar nossas expectativas e fantasias, aplacando
nossa ansiedade, acentuada pela ausência de bibliografia
específica sobre plantão psicológico. Não havia
qualquer menção, nas diversas bibliotecas especializadas
que consultamos, às walk-in clinics das quais Rachel
Rosenberg nos falara.
Sabíamos que a possibilidade de psicoterapias
de curta duração vinha sendo considerada por autores
que adotavam diferentes abordagens, como por
exemplo, os trabalhos de Bellak e Small,
4
 de orientação
psicanalítica. As Psicoterapias Breves vinham tendo,
desde a década de 70, grande implemento e pesquisa,
mas nada de sistemático havia sobre outras experiências
de curta duração ou mesmo de sessões únicas de
atendimento.
Dra. Rosenberg, ao refletir sobre variações no
tempo de atendimento, apontava o caráter preventivo
de uma intervenção no momento oportuno:
“A duração prevista para um atendimento
possivelmente eficaz em terapia tem sofrido modi-
ficações de várias espécies. Comprovações empíricas
de resultados satisfatórios justificam o uso de aten-
dimentos com um número pré-determinado ou má-
ximo de horas. Cria-se uma metodologia específica
para este tipo de atendimento em linhas teóricas
variadas [...], o atendimento de curta duração se insere
como aplicação natural, bem sucedida e cada vez mais
utilizada. Mesmo no caso de problemas graves ou difi-
culdades antigas, conclui-se que o princípio de tudo-
ou-nada – ou seja, terapia profunda e prolongada ou
nenhuma assistência psicoterápica – não tem real
validade. Especialmente em pontos críticos do
35
O Plantão de Psicólogos no Instituto Sedes Sapientiae
5
 ROSENBERG,
Rachel Lea. Terapia
para Agora. In:
ROGERS, Carl
Ramson &
ROSENBERG, Rachel
Lea. A Pessoa como
Centro. São Paulo:
E.P.U., 1977, p. 52.
6
 Madre Cristina,
nascida Célia Sodré
Dória, cônega de
Santo Agostinho,
educadora, psicó-
loga e fundadora do
Instituto Sedes
Sapientiae, persona-
lidade inesquecível
para a Psicologia e
para a História bra-
sileiras.
desenvolvimento ou da vivência, uma intervenção
adequada tem, além de efeitos terapêuticos, caráter
preventivo de conflitos maiores posteriores”.
5
Alguns alunos supunham que, devido ao caráter
imediato do atendimento, certamente receberíamos
muitos clientes em crise emocional aguda e insistiam
na necessidade de contarmos com um psiquiatra
plantonista. Precisamos esclarecer que nossa proposta
não era criar um serviço para emergências psiquiátricas
e sim oferecer escuta imediata, recebendo a pessoa no
momento da dificuldade, sem que necessariamente a
intensidade dessa dificuldade tivesse atingido um ponto
crítico que representasse ameaça iminente à sua
integridade ou à de outros; não era destinado ao suicida
em potencial, como sugeria a divulgação recente do
CVV, Centro de Valorizaçãoda Vida, cuja equipe de
plantonistas era constituída por leigos em psicologia e
prestava atendimento inicial por telefone. Por precau-
ção, tratamos de pesquisar e organizar uma relação de
instituições e serviços particulares de psiquiatria, caso
viéssemos a necessitar.
A preocupação de Madre Cristina
6
 era de que
o novo serviço não viesse aumentar as já enormes
filas de espera para psicoterapia naquela clínica, tão
solicitada devido à tradicional qualidade dos serviços
prestados. Insistíamos em esclarecer que a intenção não
era fazer triagem, embora pudéssemos, eventualmente,
realizar encaminhamentos. O Plantão Psicológico não
foi concebido como uma alternativa “tampão” para
acabar com filas de espera em serviços de assistência
psicoterapêutica, já que não pretende substituir a psico-
terapia. Não acreditamos que uma única sessão seja
capaz de resolver sérios problemas emocionais ou pro-
mover resultados reconstrutivos da personalidade. So-
mente mais tarde é que viemos a descobrir as possi-
bilidades terapêuticas do plantão.
36
Plantão Psicológico: novos horizontes
7
 um destes cartazes
encontra-se digita-
lizado no CD-ROM
anexo ao livro.
Fizemos várias reuniões em torno de aspectos
éticos das formas de divulgação: tratava-se de uma
nova proposta e aberta à comunidade em geral. Como
divulgá-la, transmitindo sua originalidade e
acessibilidade, sem banalizá-la? Optamos pela
impressão de cartazes
7
, que foram afixados em diversas
escolas, igrejas, hospitais, bibliotecas públicas e
faculdades com o destaque: “Psicólogos de Plantão”
e o texto:
“Somos um grupo de psicólogos prontos para ouvir, trocar
idéias, esclarecer dúvidas. Enfim, estar com você no
momento em que sentir que um psicólogo pode ajudar.”
Seguia-se o nome da psicóloga responsável e
seu número de inscrição no CRP, o endereço e horários
do atendimento.
Os plantonistas visitaram as salas de aula do Sedes
onde se desenvolviam outros cursos, para anunciar o
atendimento e esclarecer dúvidas a respeito. Os
primeiros a nos procurar foram justamente alguns
alunos desses cursos, uns motivados por questões
pessoais, outros, pelo interesse profissional em
conhecer melhor o Plantão.
Houve uma divulgação num programa da TV
Cultura, uma reportagem extensa que entrevistou
plantonistas e supervisora, e que, infelizmente, só foi
ao ar às vésperas da interrupção do serviço devido às
férias. Este fator diminuiu o impacto de sua reper-
cussão, pois os clientes que nos procuraram em segui-
da à edição do programa da TV não puderam ser
atendidos.
O jornal Folha de São Paulo publicou reportagem
do jornalista Paulo Sérgio Scarpa sobre o Plantão
Psicológico, destacando sua utilidade pública. Inte-
ressante assinalar que a seção onde se inseriu a matéria
37
O Plantão de Psicólogos no Instituto Sedes Sapientiae
8
 Estas matérias se
encontram digita-
lizadas no CD-ROM
anexo ao livro.
intitulava-se “A Folha e as respostas da sociedade à
crise”(07/11/81). Outras menções ao serviço já ha-
viam sido feitas por esse mesmo jornal, em edição de
16/01/81 e em seu caderno “Folhetim”, cuja edição,
em 20/09/81, era dedicada ao tema “Desemprego e
Insegurança”
8
. Hoje, passados 19 anos, podemos
reconhecer, com tristeza, a atualidade desses temas.
O primeiro grupo de doze plantonistas traba-
lhou de agosto a dezembro de 1980, dividido em
sub-grupos de seis que se alternavam entre atendimento
e supervisão: enquanto metade prestava plantão às
segundas-feiras, a outra parte reunia-se para supervisão;
às quintas-feiras, invertiam-se as funções. A supervisão
também era acessível ao plantonista durante o trans-
correr de um atendimento, caso precisasse dela. A du-
ração de uma sessão de atendimento poderia variar de
uma a duas horas, dependendo de haver ou não outros
clientes à espera.
Dispúnhamos de sete salas, sendo seis destinadas
ao atendimento e uma para as reuniões de supervisão.
Madre Cristina, confiante na importância da
iniciativa, ofereceu-se para recepcionar os clientes. Assim,
quem procurava o Plantão Psicológico, mesmo nas
noites mais frias do inverno, encontrava-a logo à
entrada do Sedes, sentada atrás de uma pequena mesa,
apoiada num travesseiro para respaldar suas costas,
que tão vigorosamente suportaram, com coragem e
dignidade, as pressões da luta por justiça social em
nosso país. Cabia a ela indicar ao cliente o andar e a
sala de atendimento, o que fazia com calor e firmeza,
já despertando nele uma disposição receptiva ao
encontro com o profissional.
No primeiro semestre de 1981 foi feita nova
seleção de plantonistas e alguns dos ex-alunos, entu-
siasmados que estavam, se re-inscreveram.
38
Plantão Psicológico: novos horizontes
Novamente, para o terceiro curso, no segundo
semestre de 1981, tivemos re-inscrições.
Em 1982 não foi renovada a proposta. A su-
pervisora, preparando-se para sua terceira gravidez,
embevecida que estava pelo novo, decidiu-se pela
dedicação mais intensa às suas filhas, enquanto se afas-
tava do Sedes, levando muito para refletir a respeito
de seus plantões e suas “plantinhas”. Mais tarde, é
convidada a oferecer Plantão Psicológico aos fun-
cionários do mesmo instituto, atividade que desen-
volveu até dezembro de 97. Esse convite atesta o
reconhecimento da importância da proposta e a re-
percussão que o Plantão Psicológico alcançou dentro
daquela instituição.
Trataremos aqui de apresentar como foi
desenvolvido o Plantão Psicológico aberto à co-
munidade.
OS CLIENTES
Nos três semestres do Plantão de Psicólogos,
realizamos 145 atendimentos, sendo 28 retornos.
Tínhamos estabelecido três retornos como possibilidade
máxima para cada cliente no mesmo semestre. Enten-
díamos que, cas o nos procurasse com maior freqüência,
isto indicaria a conveniência de encaminhá-lo à
psicoterapia. Tínhamos uma relação de instituições que
prestavam atendimento gratuito, como era nosso caso,
e também uma relação de psicoterapeutas dispostos a
trabalhar por honorários simbólicos.
Das 117 pessoas que nos procuraram, 52% eram
mulheres e 48% homens. Predominaram os solteiros;
o nível de escolaridade dos clientes variou de semi-
alfabetizados a curso superior completo; 17% eram
profissionais liberais (advogado, economista, psicólogo,
fisioterapeuta), e o restante composto por outras
ocupações (escriturário, comerciário, comerciante,
motorista, vendedor, feirante, office-boy, técnicos em
39
O Plantão de Psicólogos no Instituto Sedes Sapientiae
serviços diversos). Procurou-nos também uma pessoa
que declarou como ocupação, ser “pedinte”. Meses
depois, a plantonista que o atendeu o encontraria num
dos ônibus urbanos, recolhendo esmolas entre os
passageiros.
Após cada atendimento, era solicitado ao cliente
que depositasse numa urna um comentário escrito, sem
necessidade de se identificar. Dos 68 depoimentos
recolhidos, destacamos alguns, para ilustrar a reper-
cussão imediata ao encontro:
“Eu nunca havia participado de uma entrevista com
psicólogos. Fiquei até com receio pois não sabia como
iria iniciar a conversa. Entretanto, foi mais fácil do que
imaginava. O ‘à vontade’ com que a psicóloga conduziu
o bate-papo propiciou-me externar praticamente tudo o
que vinha me inquietando, chegando mesmo a tirar
conclusões ou elucidar dúvidas com o simples desabafo de
minhas preocupações. Senti-me pois tão satisfeita como
se tivesse recebido um presente de Natal ”.
“Não acho que o atendimento recebido tenha resolvido o
meu problema, mas tenho plena convicção de que abriu-
me algumas portas, deu-me algumas luzes e fez-me refletir.
Creio que agora estou mais apto a resolvê-lo e muito
otimista por saber que posso”.
“Acho que existem muitas pessoas que deveriam fazer
esta ‘pré-análise’ antes de se definir pelo terapeuta”.
“Não fez minha cabeça”.
“Como é bom ter e sentir que podemos sentar e conversar
com uma pessoa.Falar de nossos problemas sem pensar
que vamos ser censurados”.
40
Plantão Psicológico: novos horizontes
“Achei ótima a idéia desse Plantão. Psicólogos ouvindo
pessoas em casos de emergência ‘emocional’. Deve continuar
e se expandir em vários locais e ser divulgado e ‘ensinado’,
dado como curso nas escolas de Psicologia”.
“Acho essa iniciativa muito válida e isso, acredito eu,
vem a ressaltar ainda mais o papel, ainda que às vezes
reprimido do psicólogo na sociedade. Acredito que mesmo
sendo um só encontro, estes 50 ou 60 minutos que sejam,
nossas 23 horas restantes e dias posteriores serão
melhores”.
De maneira geral, os comentários aludiam à
importância de ser ouvido, faziam referências ao alívio
pelo desabafo, sugeriam que o atendimento deveria
ser pago, apontavam a necessidade de maior divul-
gação do serviço e a ampliação dos horários de aten-
dimento e alguns revelaram frustração da expectativa
de que pudessem receber atendimento prolongado.
OS PLANTONISTAS
Os plantonistas se referiam com freqüência à
sua experiência como estagiários durante o tempo da
faculdade, declarando o quanto “sofreram” ao se des-
ligar do cliente por ocasião da conclusão do curso de
graduação. Agora, a questão do vínculo, a separação
do cliente, a ansiedade em função desse único encontro,
a imprevisibilidade quanto a outra oportunidade
(sessão seguinte) para eventual “reparação” de sua
atuação, tudo era discutido sistematicamente nas
supervisões. Suponho que uma das conseqüências
dessas dificuldades dos alunos foi o número de enca-
minhamentos realizados e a quantidade de interven-
ções de natureza diretiva, com tendência a oferecer
respostas e sugestões.
Outra questão diz respeito à superação do
estereótipo de que uma relação de ajuda psicológica
41
O Plantão de Psicólogos no Instituto Sedes Sapientiae
deva se estender no tempo, de que profundidade e
intensidade sejam diretamente proporcionais à duração
do atendimento. A possibilidade de que uma inter-
venção de natureza breve pudesse ser suficiente para
o cliente não era claramente percebida pelos alunos,
limitação que podemos atribuir à formação que re-
ceberam nos cursos de Psicologia, onde a habilitação
do psicólogo estava mais voltada para a atividade clí-
nica da psicoterapia ou do psicodiagnóstico através
de testes.
Também em relação às intervenções diretivas
observamos, muitas vezes, que o sentimento de impo-
tência do plantonista diante de clientes de menor poder
aquisitivo, levou-os a adotar atitudes paternalistas e,
de certa forma, desvalorizantes para o cliente; houve
casos em que o aluno procurava encontrar soluções
imediatas, dar conselhos e sugestões ou mesmo insistir
em encaminhamentos muitas vezes não percebidos
como necessários pelo próprio cliente.
Liesel Lioret, psicóloga que pouco tempo de-
pois iniciaria também como supervisora o atendimento
psicológico do tipo plantão em postos de saúde
através da Clínica das Faculdades São Marcos, fez a
seguinte reflexão sobre sua experiência:
“A questão dos valores do psicólogo é importante em
qualquer processo psicoterapêutico, mas quando se trata
de sua ‘vontade de ajudar’ pessoas com problemas de
subsistência, a visão que ele tem da ‘pobreza’ e de seu
próprio lugar na sociedade modela seus objetivos explícitos
e implícitos e suas atitudes. O psicólogo tem a tendência
a se preocupar mais com o ‘como’ de sua atuação do que
com o ‘porquê”, ou seja, com as implicações pessoais e
ideológicas de suas intervenções. Por exemplo, não terá
a mesma postura se acredita que uma tomada de
consciência individual possa ser um fator de mudança,
ou se acredita que somente uma mudança social e política
possa trazer
42
Plantão Psicológico: novos horizontes
9
 Extraído de rela-
tório pessoal não
publicado (1982).
Parágrafo aqui re-
produzido sob per-
missão da autora.
soluções para as situações individuais.[...] Ele deve, mais
do que nunca, estar atento às incongruências de seus
sentimentos com os pressupostos intelectuais: até que ponto
ele realmente confia nos recursos da pessoa para enfrentar
suas dificuldades e modificar seu mundo?”9
O SERVIÇO E O CURSO
Quanto à estruturação do serviço, que acom-
panhava o calendário dos cursos do Instituto Sedes
Sapientiae, percebemos que a proposta semestral, com
constantes interrupções devido às férias, além de trun-
car o afluxo de clientes, tornava muito curto o período
de preparação do plantonista, preparação que nos
parece requerer bastante empenho, especialmente no
que diz respeito às bases conceituais da Abordagem
Centrada na Pessoa e aos valores pessoais do profis-
sional. Isto pôde ser confirmado pelo número de re-
inscrições dos alunos para os semestres seguintes, evi-
denciando que não só reconheciam a relevância e
efetividade do Plantão Psicológico, como também a
consciência que tinham da necessidade de aperfei-
çoamento. O tempo breve da relação com o cliente
talvez torne mais perceptível, tanto para o supervisor
como para o próprio aluno, o grau de consistência na
adoção da ACP como referencial para sua atuação. A
ausência de solidez na “atitude centrada na pessoa”
prejudicará a qualidade da relação de ajuda, gerando
no plantonista comportamentos incongruentes e
condutas diretivas.
ALGUMAS CONSIDERAÇÕES SOBRE O PLANTÃO
Nossas próprias “descobertas” antecipam o que
diria mais tarde o rabino e escritor Nilton Bonder:
“A grande descoberta deste século para as Ciências
Humanas é a descoberta terapêutica da escuta. Não há
melhor entendimento que alguém possa nos prestar do
43
O Plantão de Psicólogos no Instituto Sedes Sapientiae
10
 BONDER, Nilton.
Elul, O mês da escu-
ta. Kol: Boletim In-
formativo da Comu-
nidade Judaica do
Brasil, Rio de Ja-
neiro, Ano III, n. 7,
agosto 1998, p. 1.
que servir-nos de ouvido para as falas baixas e quase
imperceptíveis de nossa existência” 10.
Ouvir pode sugerir uma atitude passiva, mas não
é. Ouvir implica acompanhar, estar atento, estar presente.
Presença inteira. Que quer dizer “presença inteira”?
Todos sabemos o que significa presença “parcial”.
Quantas vezes duvidamos que nosso interlocutor esteja
realmente nos ouvindo? Mesmo que alguém, ao ser
questionado “Você está ‘mesmo’ me ouvindo?” seja
capaz de repetir literalmente aquilo que acaba de ouvir,
a repetição soará vazia, oca de sentido, se sua presença
estiver cindida. Ser capaz de repetir neste caso não
significa ser bom ouvinte. É sutil, mas às vezes podemos
até perceber, sem mesmo ter consciência de que
percebemos – pela própria “densidade” de olhar do
outro, pelo tipo de brilho desse olhar – a denúncia da
“parcialidade” da presença. Um olhar nosso ao olhar
do interlocutor poderá revelá-la. A repetição, mesmo
quando se torne uma reprodução, isto é, quando procure
“re-produzir”, sintetizando o conteúdo daquilo que foi
ouvido, eventualmente em outras palavras, torna-se oca,
é apenas e simplesmente um eco.
Eco, a ninfa da mitologia grega, evitava a com-
panhia dos homens e dos deuses e não se importava
com o Amor. Pã, apaixonado por ela e irritado com sua
indiferença, fez que os pastores da região a despeda-
çassem, espalhando os despojos pelas campinas. Eco,
dispersada por muitos lugares, limita-se a repetir os
sons que se produzem por perto.
Ouvir realmente, e não apenas “ecoar”, requer
concentração do plantonista (terapeuta, ouvinte etc.).
Não é possível ouvir estando disperso como Eco. E
não estou me referindo a concentração apenas como
capacidade de focalizar a atenção (no cliente ou na
fala do cliente), mas quero ressaltar a concentração
do terapeuta em si mesmo.
44
Plantão Psicológico: novos horizontes
Proponho refletirmos sobre “concentração”
como “congruência”. Parece estranho? Congruência
pode ser entendida como o alinhamento de várias
esferas sobre um mesmo eixo. Psicologicamente falan-
do, significaria ter as dimensõesdo pensar, sentir e
agir, alinhadas em torno do mesmo eixo, ter “todos
os centros num mesmo centro”. Congruência é por-
tanto concentração, tomar dentro de si como único
centro, o mesmo eixo de alinhamento. É alinhamento
interno, concentração, presença inteira.
A Abordagem Centrada na Pessoa, enfatizando as
qualidades da relação (aceitação incondicional, empatia e
congruência) como fator mobilizador do crescimento
(tendência atualizante) se confirma como perfeito
referencial para o “Plantão Psicológico”, modalidade de
atendimento que vem abrir também novas perspectivas
de contribuição social para o psicólogo.
Relembrando a expressão tão rica de sentidos
do Prof. Miguel Mahfoud, podemos confirmar o Plantão
Psicológico como presença que mobiliza.
45
1
 O presente texto
foi originalmente
apresentado no VIII
Encuentro Latino-
americano del Enfo-
que Centrado en la
Persona, promovido
pela Universidade
Iberoamericana da
Cidade do México e
pela Universidade
Autônoma de Aguas-
calientes, em Aguasca-
lientes, México, em
1996, com apoio da
FAPEMIG.
Plantão Psicológico na escola:
uma experiência
Miguel Mahfoud
O desempenho profissional é fruto possível
de raízes filosóficas, e é verdade que se conhece a
árvore pelos frutos. Mas se o fruto-desempenho
profissional não morrer, ficará só; se morrer um pouco,
para uma reflexão mais profunda e para se misturar
com o que dá vida, produzirá cem por um.
Por isso quero agradecer a possibilidade de
compartilhar experiências
1
, a oportunidade de pensar
um pouco mais no que faço; oportunidade de me
enriquecer pela consciência de que também eu fui
plantado e que também eu sou árvore com raiz e fruto,
e oportunidade de comunicar. O sentido mais
profundo do fruto não é semear de novo?
A Educação tem pedido técnicas à Psicologia.
Mas o risco é o de não se clarear a finalidade geral da
educação, respondendo segundo objetivos precisos
mas inadequados a essa finalidade. Ou seja, o risco é o
de não explicitarmos (nem a nós mesmos) que a
46
Plantão Psicológico: novos horizontes
finalidade da educação é a formação da pessoa, e
querermos responder a tantas demandas com diversos
objetivos definidos (aumento do rendimento escolar,
auxílio na expressão verbal e escrita, aplacamento de
comportamentos anti-sociais...) que podem nos ocupar
muito, podemos até obter resultados, mas poderíamos
ainda assim não estar respondendo à verdadeira
finalidade da educação. Se a explicitarmos, daremo-
nos a oportunidade de que ela ilumine objetivos,
métodos e técnicas. E, ainda mais importante, daremos
a nós mesmos a oportunidade de sermos educadores,
isto é, testemunhas de uma consciência ampla possível,
que já começa a ser uma rota de orientação dentro da
desorientação cultural em que vivemos, e que as nossas
crianças e adolescentes não têm como evitar.
É nesse sentido que um pouco ousadamente
evitei assumir uma função psico-pedagógica na escola
em que trabalhei. É preciso salientar que ali tínhamos
uma condição de trabalho incomum, não sendo cha-
mados a desempenhar as funções de orientação educa-
cional, ou coordenação pedagógica ou disciplinar –
funções estas exercidas por outros profissionais. Pude
então me preocupar com uma contribuição propria-
mente psicológica no âmbito escolar.
Devido à minha formação marcada pela Aborda-
gem Centrada na Pessoa logo quis que também na escola
a psicologia pudesse contribuir primeiramente consti-
tuindo um espaço para o aluno como pessoa. Um espaço
onde se retomasse a finalidade da educação através da
formação da pessoa naquele contexto, assim como é,
com todos os seus recursos e limites, já. Em um contexto
institucional cristalizado e tantas vezes inevitavelmente
partícipe da desorientação cultural que todos vivemos,
eu quis ser psicólogo e educador ao testemunhar o valor
e a potência inovadora e criadora da pessoa que cresce
com consciência de si e da realidade.
47
Plantão Psicológico na escola: uma experiência
2
 Cf. MAHFOUD,
Miguel. A Vivência
de um Desafio:
Plantão Psicológico.
In: ROSENBERG, R.
L. (Org.). Aconse-
lhamento Psicoló-
gico Centrado na
Pessoa, São Paulo:
EPU, 1987, p. 75-83.
(Série Temas Bási-
cos de Psicologia,
Vol. 21)
Assumindo isso como finalidade, a técnica de
atendimento breve que tem sido chamada de “Plantão
Psicológico”
2
 serviu como método de presença entre
os alunos e professores.
Sabemos bem que a imagem de um Serviço
de psicologia dentro da escola é visto por todos como
algo muito diferente disso que propomos, e assim
quisemos afirmar essa nova ótica para todos, mas prin-
cipalmente – e a partir – dos alunos, a quem aquele
Serviço de psicologia queria servir. Preparamos, então,
folhetos de divulgação da proposta, que penso possam
ajudar a explicar a vocês também um pouco do que
vem a ser um Plantão Psicológico na escola.
Aos alunos de nível colegial foi entregue um
folheto com trechos da música “Quase sem querer”
do grupo Legião Urbana, e alguns comentários apre-
sentando o Plantão Psicológico. Trazia os seguintes
dizeres:
“Tenho andado distraído,
Impaciente e indeciso
E ainda estou confuso.
...
Quantas chances desperdicei
Quando o que eu mais queria
Era provar pra todo mundo
Que eu não precisava
Provar nada pra ninguém
...
Como um anjo caído
Fiz questão de esquecer
Que mentir pra si mesmo
É sempre a pior mentira.
Mas não sou mais
Tão criança a ponto de saber
Tudo.
...
48
Plantão Psicológico: novos horizontes
3
 As ilustrações dos
panfletos apresen-
tados neste capítulo
são de Durval Cor-
das, a quem agrade-
cemos a autorização
para publicação.
Sei que às vezes uso
Palavras repetidas
Mas quais são as palavras
Que nunca são ditas?”
de “Quase Sem Querer”
(Dado Villa-Lobos/ Legião Urbana)
PLANTÃO PSICOLÓGICO NO COLÉGIO
– Uma ajuda para quem não quer viver
desperdiçando chances (com os amigos,
com a família, no colégio...).
– Um espaço para procurar ouvir em si as
palavras mais profundas e verdadeiras.
– Uma possibilidade para todo aluno que não
quer viver “quase sem querer”.
Os pedidos de encontro com o psicó-
logo podem ser feitos pessoalmente todas as
3as e 6as feiras nos intervalos da manhã na sala
45 (próximo à biblioteca e à informática).
Ou por escrito, todos os dias deixando
na portaria do Colégio um bilhete destinado
ao psicólogo Miguel Mahfoud contendo seu
nome, número e classe, data e assinatura.
– Querendo, apareça!
Já o folheto preparado e entregue aos alunos
de nível ginasial foi o seguinte
3
:
49
Plantão Psicológico na escola: uma experiência
50
Plantão Psicológico: novos horizontes
51
Plantão Psicológico na escola: uma experiência
52
Plantão Psicológico: novos horizontes
53
Plantão Psicológico na escola: uma experiência
54
Plantão Psicológico: novos horizontes
A resposta dos alunos foi bastante positiva. No
início a curiosidade sobre minha pessoa e sobre o tipo
de atendimento era o mais marcante, e vagarosamente
foi se instalando como um espaço para as pessoas, mais
do que para os problemas. Isso fez com que mesmo
quando precisávamos chamar alguém para conversar
por pedidos da coordenação pedagógica ou disciplinar,
ou por pedido de algum professor, a disponibilidade
de tratar dos problemas era já diferente, porque o inte-
resse era por ele, e não por suas notas ou comporta-
mentos. Então até suas notas e comportamentos eram
discutidos; suas queixas intermináveis, ouvidas; mas sua
pessoa continuava a ser o centro, e a resposta à situação
assim como é ainda cabe a ele, que pode agora ter
alguém a quem se referir, com quem se avaliar, em
quem se apoiar. A consciência ampla do educador ali
frente ao aluno se traduz também em disponibilidade
e cumplicidade para que o aluno viva com realismo e
com cuidado consigo mesmo. De modo geral isso é
mobilizado rapidamentee o psicólogo permanece
como referência para o aluno na escola, também para
outras ocasiões mais tarde, e a experiência permanece
como referência dentro do aluno – espero para sempre.
A consciência de si e da realidade pede, antes
de mais nada, discriminação. Quem é quem na escola?
Com quem você pode contar? Quais são os recursos
disponíveis na rede de relacionamentos?
Mas se provoco os alunos a estarem atentos à
realidade e ao cuidado consigo mesmos e à sua presença
na escola, é porque procuro fazer o mesmo ali. Também
eu preciso discriminar bem, e aprender a reconhecer as
diferentes contribuições dos vários professores e
coordenadores que convivem muito mais diretamente
com os alunos do que eu, e por isso podem ser um
contato importante para o meu trabalho e para diferentes
formas de ajuda a alunos em dificuldade. Eles podem
55
Plantão Psicológico na escola: uma experiência
4
 Este folheto en-
contra-se digita-
lizado no CD-ROM
que acompanha o
livro.
me dar feed-back de minhas intervenções, podem cooperar
quando também eles se abrem a um tipo de compreensão
dos acontecimentos que considere o lado dos alunos e
as outras dimensões normalmente deixadas à margem
da sala de aula.
Na verdade a manutenção desse tipo de pro-
posta pede um empenho constante, e disponibilidade
a manter um diálogo continuamente retomado – com
os professores, com os alunos e com o conjunto da
instituição – para se esclarecer a linha do trabalho, e
para que se tenha atenção com o sentido que o trabalho
vai tomando para a instituição:
COM OS PROFESSORES
Quanto aos professores, é fácil que em um
primeiro momento eles sintam que somos “defensores”
dos alunos, e quase nos vejam como inimigos. Sentem-
se incompreendidos. Chamá-los a colaborar conosco na
atenção com os alunos nem sempre é potente para
romper aquela impressão. Às vezes é preciso que eles
vejam alguns passos que estão sendo dados pelo aluno e
que se liguem diretamente a seu trabalho. Dedicar-se a
explicitá-los nem sempre é fácil, mas é sempre importante.
COM OS ALUNOS
Quanto aos próprios alunos, é importante
retomar a proposta de que eles próprios podem nos
procurar, e estar atentos às tensões que nossa presença
suscita entre eles, para poder lidar com elas também
enquanto escola no seu conjunto, além do âmbito de
atendimento individual ou de pequenos grupos.
Como exemplo, apresento a vocês um folheto
4
que lançamos quando uma outra psicóloga foi trabalhar
comigo no Colégio, e aproveitamos para lidar também
com a tensão existente entre os alunos, ligada ao fato
de que alguns deles se encontravam conosco.
56
Plantão Psicológico: novos horizontes
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Plantão Psicológico na escola: uma experiência
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Plantão Psicológico: novos horizontes
Assim, brincamos um pouco com a tensão, e o
projeto foi re-proposto.
COM A INSTITUIÇÃO
Quanto à necessidade de recolocar continuamente
a proposta, a nível institucional a questão também não é
simples. Às vezes nos sentimos um pouco “marcianos”.
Mas o trabalho vai sempre no sentido de responder às
demandas da instituição retomando sempre o ponto
de partida da centralidade da pessoa. De fato, isso é
muito desafiador e criativo. Criamos métodos e instru-
mentos novos ao procurar responder aos pedidos e
necessidades da instituição retomando a finalidade da
educação e as contribuições da Psicologia.
Gostaria de citar dois exemplos:
1) O primeiro se refere a um pedido que a
direção da escola nos fez de nos ocuparmos de
Orientação Profissional, sugerindo a aplicação de testes.
Na nossa visão, para aqueles alunos, o problema
se localizava no tema da escolha. Sendo alunos de classe
sócio-econômica “A”, poderiam escolher o que qui-
sessem – mas na verdade não podem escolher porque
não sabem o que querem, ou porque o caminho pro-
fissional já está traçado por herança familiar (a empresa
da família, o consultório do pai...). Não queríamos
aplicar testes, porque não os ajudaria em nada a
enfrentar o problema de não se conhecerem, e o de
assumirem conscientemente um caminho para si na
vida e na sociedade. Não queríamos substituí-los nessa
tarefa de escolha que é tão importante, e assinala uma
passagem para o mundo adulto.
A atenção a isso nos deu criatividade para
utilizar, dentro de nossa abordagem, instrumentos
criados a partir de outros parâmetro teóricos. Uti-
lizamos textos da cultura brasileira, por exemplo o da
música “Caçador de Mim” (Sérgio Magro/Luís
61
5
 Cf. MARTINS, C.R.
Psicologia do Com-
portamento Voca-
cional. São Paulo:
EPU/EDUSP, 1978.
6
 FRANKL, V. E.
Psicoterapia e sen-
tido da vida: funda-
mentos da logote-
rapia e análise exis-
tencial. São Paulo:
Quadrante, 1973.
Plantão Psicológico na escola: uma experiência
Carlos Sá) como imagem da busca de si que aquele
momento de escolha envolve; ou o poema “Que é o
Homem?” de Carlos Drummond de Andrade para abrir
espaço a uma pergunta sobre si e sobre o mundo num
horizonte amplo.
Mas desenvolvemos um novo método de
Orientação Vocacional adaptando o Método de História
de Vida apresentado por Julius Huizinga no IV Fórum
Internacional da Abordagem Centrada na Pessoa, no
Rio de Janeiro em 1989. Pedimos aos alunos para
desenharem o gráfico de sua história de vida, assinalando
as experiências mais significativas desde o nascimento
até o momento presente, avaliando-as como positivas
ou negativas em diferentes graus. Depois pedimos que
redijam um texto apresentando um dia comum no
futuro, cerca de 15 anos mais a frente. Desse trabalho é
possível extrair o critério pessoal com o qual cada um
deles olha, avalia e se engaja na própria vida. Então se
propõe enfrentar a questão da escolha profissional com
aqueles critérios pessoais, tendo em vista as profissões
que mais favoreceriam a expressão e o desenvolvimento
de suas características; ao invés de perseguir a questão
de onde ele deveria se encaixar para poder ser feliz –
questão esta que parte de uma posição alienada e
alienante. Só depois de explicitados esses critérios e
mobilizado esse processo de busca é que utilizamos,
eventualmente, testes de personalidade (como o de
Pfister) e o Modelo de Holland
5
 de grupos profissionais
associados a características de personalidade. A proposta
é a de enriquecer e ampliar a reflexão sobre si como
ser-no-mundo, único e irrepetível,
6
 ao invés de esperar
daqueles instrumentos uma resposta.
2) Outro exemplo, para nós muito significativo,
foi quanto à dificuldade da instituição em trabalhar
explicitamente a questão das drogas, que preocupa
muito a todos – direção, professores, pais e alunos.
62
Plantão Psicológico: novos horizontes
8
 MAHFOUD, Miguel
& BRANDÃO, Sílvia
Regina. Educação
Afetiva. In: I Con-
gresso Interno do
Instituto de Psico-
logia da USP. São
Paulo, 1991, p. Z6.
7
 Cf. CARLINI, E.A.;
CARLINI-COTRIN,
B. & SILVA FILHO,
A.R. Sugestões pa-
ra programas de
prevenção ao abuso
de drogas no Brasil.
São Paulo: CEBRID,
1990.
Frente à necessidade de um trabalho de
prevenção ao uso de drogas e frente às dificuldades
institucionais de tratar do tema, nos pareceu mais
adequado procurar utilizar o método que vem sendo
chamado de Educação Afetiva
7
, que procura modificar
fatores pessoais considerados disponentes à utilização
de drogas (como auto-estima, identidade, resistência a
pressão de grupo etc.) sem necessariamente enfocar o
tema drogas.
Assim, Sílvia Regina Brandão e eu elaboramos
o primeiro material brasileiro de Educação Afetiva
8
,
sempre retomando a questão da centralidade da pessoa,
e abordando principalmente o tema da identidade a
partir da existência, do ser-no-mundo e o tema da
conjugação entre desejo e limite.
SITUAÇÃO DESAFIADORA
Para terminar, eu não

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