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Física Matemática I November 21, 2012 1 Motivação 1.1 Números Uma vez desenvolvida a escrita é inquestionável a importância prática de se inventar símbolos para designar as quantidades. Neste sentido surgem naturalmenteos números naturais N. A necessidade de se expressar a posseou a falta(ou ainda se você vai ganhar ou perder uma certa quantidade) faz surgir o símbolo �n, com n 2 N, e, conseqüentemente, a idéia de números inteiros Z. Além disso, o conceito de se dividir um objeto em n partes inteiras (onde n 2 N) é também bastante intuitiva. Assim, é de importância prática se inventar um símbolo para resumir a expressão dados 2 objetos e dividindo cada um deles em sete 7 eu quero pegar (ou dar) uma destas partes de cada objeto. A invenção deste símbolo me permite dizer que eu quero 2=7 (ou �2=7) do total de objetos. Surgem então os números racionais Q. Mesmo na estrutura matemática mais rigorosa os racionais são construídos a partir dos inteiros (racionais são classes de equivalência de inteiros). Mas de onde vem os chamados números reais R? Quando se coloca todas as idéias acima numa estrutura matemática rigorosa, observa-se que existem quantidades que não podem ser expressas como números racionais. Estas quantidades são chamadas de números irracionais. Mas que quantidades são estas? Apesar de geometricamente estas quantidades poderem ser construídas (e.g., pelo teorema de Pitágoras), na verdade elas não possuem respaldo no nosso mundo cotidiano. Neste sentido poderíamos dizer que os números irracionais não possuem uma utilidade prática (além da matemática pura). Entretanto, a descrição do mundo através da Física adquiriu uma so sticação matemática tão grande que os conceitos envolvidos na construção dos números reais possuem hoje conseqüências diretas nas teorias e modelos que descrevem o universo. Por exemplo, aplicando as mesmas idéias que levam aos reais, mas seguindo um caminho diferente, é possível construir um outro conjunto, diferente de R (i.e., cujos elementos têm propriedades diferentes). Além disso, é possível se fazer Física utilizando este conjunto no lugar dos reais. Uma destas possibilidades são os chamados números p-ádicos. O ponto aqui é que números são construídos pela nossa necessidade de que não exista nada que não possamos expressar. Dentro desta idéias, de onde surgem os números complexos? 1 1.2 Teorema fundamental da álgebra Vivamos num mundo sem os complexos. Um dia, resolvendo um problema real do nosso mundo, nos de- paramos com a equação 3x2 + 1 = 0 : (1) Fácil ver que, neste nosso mundo onde só existem os reais, esta equação não possui soluções. Obviamente, a incapacidade de tratar uma expressão matemática qualquer, além de frustrante, implica numa série de limitações práticas no tratamento de problemas do mundo real. A inexistência de soluções reais da equação (1) é uma manifestação do fato do conjunto dos números reais não formar um corpo algebricamente fechado. Um corpo (abaixo veremos o que é um corpo) F diz-se algebricamente fechado se qualquer polinômio de uma variável de grau maior ou igual a 1, com coe cientes em F , tiver pelo menos uma raiz em F . Para não corrermos mais o risco de obter equações polinomiais intratáveis, de nimos então um novo conjunto maior, dos quais os R fazem parte, mas que qualquer polinômio neste novo conjunto possua soluções que também sejam elementos deste conjunto. Este processo é chamado de fechar algebricamente o conjunto. Fazendo isso com os reais, o que se obtém é precisamente o conjunto dos números complexos C. Disse então que C é o fecho algébrico de R. Esta característica dos números complexos é uma conseqüência do Teorema fundamental da álgebra. Theorem 1 Qualquer polinômio p(z), z 2 C, com coe cientes complexos e de grau n � 1 tem alguma raiz complexa. Em outras palavras, o corpo dos números complexos é algebricamente fechado e, portanto, tal como qualquer outro corpo algebricamente fechado, a equação p(z) = 0 possui n soluções não necessariamente distintas. 1.3 Teorema da identidade O teorema da identidade (identity theorem) para funções holomór cas (funções de variáveis complexas difer- enciáveis) estabelece que: Theorem 2 Dada duas funções holomór cas f e g de nidas num aberto (conexo) D � C, se f = g em alguma vizinhança de z contida em D, então f = g em D. Assim, uma função holomór ca está completamente determinada uma vez conhecido seu valor numa vizinhança arbitrariamente pequeno. Esta propriedade não é válida para funções reais diferenciáveis. É graças à propriedade acima que podemos tão facilmente estender uma função real para o plano complexo, por exemplo, ex �! ez. Além disso, a noção de diferenciabilidade é muito mais forte para funções complexas, pois a existência da diferencial de primeira ordem implica na existência das diferenciais de qualquer ordem. Assim, mostrando-se 2 que uma função complexa possui uma primeira derivada, automaticamente se mostra que ela é in nitamente diferenciável e, conseqüentemente, que ela é uma função analítica (pode ser expandida em série de Taylor). O fato de uma função possuir uma expansão em série de nida em todo seu domínio é de fundamental importância tanto em matemática quanto em física. Assim, dada uma certa função real f (x), se conseguirmos entender esta função para o plano complexo, i.e., encontrar uma função diferenciável f (z) de nida em C que para Im z = 0 seja igual a f (x), esta função será única (pelo teorema da identidade) e analítica. Assim, o estudo das propriedades de funções com variáveis complexas é de fundamental importância não apenas teóricos, mas também práticos. 2 Números complexos Assim como os reais, os números complexos foram inventados originalmente apenas por razões matemáticas. Entretanto, seu estudo posterior apresentou uma série de aplicações práticas. Comecemos então com uma olhada na estrutura matemática por trás dos números complexos. Um número complexo é um mapa z : R2 �! R2 onde de nimos duas operações binárias1 (+; �) com as seguintes propriedades algébricas zi � z (xi; yi) ; xi; yi 2 R ; z (x1; y1) + z (x2; y2) � z (x1 + x2; y1 + y2) = z2 + z1 ; z (x1; y1) � z (x2; y2) � z1z2 � z (x1x2 � y1y2; y1x2 + x1y2) = z2z1 : Chamemos o conjunto de todos os z de C. Vejamos porque esta escolha de operações, aparentemente arbi- trária, é tão importante. Das de nições acima é fácil ver que z (x; y) + z (0; 0) = z (x; y) ; _x; y ; (identidade) (2) z1 + (z2 + z3) = (z1 + z2) + z3 ; (associativo) (3) _ z (x1; y2) 9 z (�x1;�y2) j z1 + z2 = z (0; 0) ; (inverso) (4) z1 + z2 = z2 + z1 (comutativo). (5) A existência do elemento z0 = z(0; 0) (2) e as propriedades (3) e (4) acima fazem deste conjunto um grupo pela primeira operação binária (a soma, +).O fato da soma ser comutativa (5), faz deste um grupo abeliano. 1Operações que envolvem dois elementos do conjunto. 3 Além disso, podemos ver também que z (x; y) � z (1; 0) = z (x; y) ; _x; y ; (identidade) (6) z1 (z2z3) = (z1z2) z3 ; (associativo) (7) (a inexistência do elemento inverso para z (0; 0) faz com que C, assim como R, não seja um grupo pelo produto). A existência do elemento z(1; 0) (6) (identidade do produto) acima e da associatividade do produto (7), fazem deste conjunto um monóide pelo produto (um grupo é um monóide onde todos os elementos têm inversa). Um conjunto que é simultaneamente um grupo abeliano (por +), um monóide (�) e além disso, respeita a propriedade distributiva pela composição das duas operações z1 (z2 + z3) = z1z2 + z1z3 (distributivo): (8) é chamado de um anel. A comutatividade da multiplicação (z1z2 = z2z1) faz deste um anel abeliano. Finalmente, todas estas propriedades, mais o fato do conjunto C � z (0; 0) formar um grupo pela multi- plicação (z (0; 0) é o único elemento sem inversa pelo produto), devidoàs propriedades seguintes z1 (z2z3) = (z1z2) z3 ; (associativo) _ z (x1; y1) ; x21 + y21 6= 0 9 z�1 � x1 x21 + y 2 1 ;� y1 x21 + y 2 1 � j zz�1 = z (1; 0) ; fazem deste anel abeliano um corpo. É pelo fato de C ser um corpo que podemos fazer com z 2 C tudo que fazemos com os números reais. Assim, polinômios estão bem de nidos, bem como as séries in nitas. Destarte podemos de nir funções trigonométricas, exponenciais etc. E, o mais importante, podemos procurar pelo inverso de todas estas funções. 2.1 Realização ou representação de C Vamos começar de nindo o seguinte símbolo para nos referirmos aos elementos de C: z (x; y) � x+ iy ; x; y 2 R ; onde x é chamado parte real de z (x = Re z) e y parte imaginária (y = Im z). É importante ter em mente que a quantidade acima é apenas um símbolo, não representando nenhuma soma, ou qualquer coisa parecida. 4 Para efetivamente trabalharmos (manipularmos) este símbolo, precisamos encontrar uma de nição baseada em entidades que já saibamos trabalhar. Ou seja, precisamos realizar esta quantidade em algum es- paço conhecido. Vejamos três possibilidades para esta realização. 2.1.1 Representação matricial Podemos de nir o símbolo introduzido acima como uma matriz z (x; y) � x+ iy � x �y y x ! ; e especi carmos que a soma e o produto deste símbolo respeita a álgebra usual de matrizes. Exercise 3 Veri que que o símbolo assim de nido obedece às propriedades de soma e multiplicação de nidas na seção anterior. Agora que temos uma representação concreta para o nosso símbolo, podemos efetuar cálculos completos. Por exemplo, para z = i�=2, podemos calcular ez = ei�=2 ei�=2 = exp " 0 ��=2 �=2 0 !# = 1X n=0 1 n! 0 ��=2 �=2 0 !n = 1X n=0 (�=2) n n! 0 �1 1 0 !n = 1 0 0 1 ! + �=2 0 �1 1 0 ! + (�=2) 2 2! 0 �1 1 0 !2 + (�=2) 3 3! 0 �1 1 0 !3 + ::: observando que 0 �1 1 0 !2 = � 1 0 0 1 ! ; 0 �1 1 0 !3 = � 0 �1 1 0 ! ; ::: temos ei�=2 = 1 0 0 1 ! + �=2 0 �1 1 0 ! � (�=2) 2 2! 1 0 0 1 ! � (�=2) 3 3! 0 �1 1 0 ! + ::: = 1 0 0 1 ! 1X n=0 (�1)n (�=2)2n (2n)! + 0 �1 1 0 ! 1X n=0 (�1)n (�=2)2n+1 (2n+ 1)! = 1 0 0 1 ! cos �� 2 � + 0 �1 1 0 ! sin �� 2 � = 0 �1 1 0 ! = 0 + i1 � i = z (0; 1) : 5 Da mesma forma ei2� = 1 0 0 1 ! = 1 + 0i = z (1; 0) � 1 : Observe que o símbolo 1 2 C da igualdade acima não tem o mesmo signi cado (apesar de compartilhar as mesmas propriedades) do símbolo 1 2 R como elemento dos reais. Mais especi camente, o nosso 1 aqui é uma matriz. De forma geral, usando a notação introduzida acima, ei� = 1 0 0 1 ! cos (�) + 0 �1 1 0 ! sin (�) = 1 cos (�) + i sin (�) (9) conhecida como fórmula de Euler. Exercise 4 Podemos escrever ez1+z2 = ez1ez2? De forma geral, ex+iy = ex " 1 0 0 1 ! cos y + 0 �1 1 0 ! sin y # = ex cos y � sin y sin y cos y ! = ex (cos y + i sin y) : (10) Exercise 5 Obtenha a relação acima. Remark 6 Os resultados obtidos numa certa representação são válidos em qualquer representação. 2.1.2 Representação algébrica Outra forma de se representar um elemento de C (talvez a mais conhecida) é a rmar que a quantidade x+ iy respeita a álgebra usual dos reais (i.e., passamos a considerar este símbolo como uma soma usual) acrescida da seguinte de nição i:i � �1 : Exercise 7 Veri que que esta de nição reproduz as operações de soma e produto de nidas na seção anterior. A veri cação da compatibilidade desta de nição com a anterior é imediata i:i = 0 �1 1 0 ! 0 �1 1 0 ! = � 1 0 0 1 ! = �1 + 0:i = �1 : 6 2.1.3 Representação geométrica Uma terceira forma de se representar os elementos de C é a rmar que estes são pontos no plano x � y e identi car a operação de soma com a álgebra (usual) dos vetores que partem da origem até o ponto x; y. Neste caso é conveniente utilizar a representação polar deste ponto z � x^r cos � + y^r sin � ; r2 = x2 + y2 ; y x = tan � : Neste caso costuma-se ainda introduzir a notação y^ � i ; x^ � 1 =) z = r (cos � + i sin �) : Usando o resultado (9), que deve ser válido em qualquer representação, temos z = r (cos � + i sin �) = rei� ; r; � 2 R : Nesta notação r é a magnitude (ou módulo, ou valor absoluto) de z (r = jzj) e � a fase ou argumento (� = arg z). Partindo das de nições é fácil ver que jzj2 = r2 = (Re z)2 + (Im z)2 : A operação de múltimplicação de dois números z1 = r1ei�1 e z2 = r2ei�2 é identi cada como o aumento da magnitude de z1 por um fator r2 seguido de uma rotação deste vetor de um ângulo �2. O que, na representação polar, possui uma forma bastante simples z1z2 = r1e i�1r2e i�2 = r1r2e i(�1+�2) : Exercise 8 Veri que que a introdução dos símbolos acima é compatível com a representação algébrica, i.e., veri que que na representação geométrica i:i = �1. Exercise 9 Use a representação geométrica para mostrar a desigualdade triangular jz1 + z2j � jz1j+ jz2j : 7 As vezes é importante usar a representação polar fora da origem z � z0 = � exp (i�) =) z = � exp (i�) + z0 ou seja, z são pontos com coordenadas polares � e � com relação a z0. Exercise 10 Desenhe no plano x� y os pontos jz + ij = 1 : Remark 11 Todas as representações apresentadas são, obviamente, equivalentes. A utilização de uma certa representação depende apenas das conveniências do problema. 2.1.4 Extração de raízes Vejamos agora como funciona uma determinada operação em C. O ponto é que, apesar de podemos fazer em C tudo que fazemos em R, os resultados que obtemos são bem diferentes. Por exemplo, vamos extrair a raiz n-ésima de um número complexo z ( n p z ou z1=n). Isso equivale a encontrar z0 tal que: (z0) n = z : Este problema é mais facilmente tratado na representação polar z = r (cos � + i sin �) z0 = r0 (cos �0 + i sin �0) Ou seja, dados r e � (reais) precisamos encontrar números reais r0 e �0 tais que r (cos � + i sin �) = rn0 (cos �0 + i sin �0) n Usando a fórmula de Euler (9) temos (cos �0 + i sin �0) n = � ei�0 �n = � ein�0 � = cos (n�0) + i sin (n�0) conhecido como teorema de De Moivre. Com isso nossa igualdade toma a forma r (cos � + i sin �) = rn0 (cos (n�0) + i sin (n�0)) 8 que pode ser resolvida fazendo (pois � e r são parâmetros independentes) r = rn0 =) r0 = n p r n�0 = � � 2�k ; k 2 N =) �0 = � n � 2� k n Agora, para n = k (ou n = mk com m 2 N) temos �0 = �=n+ 2� o que representa o mesmo ponto. Então, existem n valores de k k = 0; 1; :::; n� 1 que representam pontos distintos e satisfazem a nossa igualdade. Assim, para z 6= 0, a expressão npz = z1=n possui n raízes z1=n = z0 = n p r � cos � + 2�k n + i sin � + 2�k n � ; k = 0; 1; ::; n� 1 : Exercise 12 Calcule 3 p 1, com 1 2 C. Resp. 1 = cos 0 + i sin 0 =) r = 1 ; � = 0 11=3 = � cos 2�k 3 + i sin 2�k 3 � ; k = 0; 1; 2 z0 = � cos 2�0 3 + i sin 2�0 3 � = 1 z1 = � cos 2� 3 + i sin 2� 3 � z2 = � cos 4� 3 + i sin 4� 3 � Observe que para 1 2 R; 3p1 = 1. Remark 13 Antes de efetuarmos qualquer operação com uma quantidade (um número), precisamos especi- car a qual conjunto esta quantidade pertence. 2.2 Funções Uma função W (z) : C ! C de uma variável complexa é também um número complexo, cuja parte real U = ReW e imaginária V = ImW dependem, na nossa representação geométrica, da posição de z no plano x� y. Usando as notações introduzidas anteriormente escrevemos W (z) = U (x; y) + iV (x; y) : 9 Podemosescolher duas diferentes representações grá cas paraW . A primeira é representar U (x; y) e V (x; y) como superfícies sobre o plano complexo x � y. Esta representação, que é útil em certas ocasiões, possui o inconveniente de não explicitar a relação das duas funções U e V como elementos de C. Outra possibilidade é representar o próprio número complexo W como um ponto no plano U � V . Neste último caso, a função W (z) fornece um mapa (R2 �! R2) do plano z = x� y no plano W = U � V e, para cada ponto no plano z, corresponde um (ou, como veremos, mais de um) valor ponto no plano W . Exemplo: Conjugação complexa: W (z) � �z (x; y) = z (x;�y) x+ iy �! x� iy A representação grá ca do mapa R2 �! R2 é a reexão dos pontos em relação ao eixo x. Como pode ser veri cado pela de nição, esta operação respeita as propriedades z1 + z2 = �z1 + �z2 z1z2 = �z1�z2 z + �z = 2Re z z � �z = 2 Im z Além disso, pelas de nições na seção da representação geométrica, temos z:�z = x2 + y2 = jzj2 =) jzj = z:�z A noção de norma nos permite escrever desigualdades do tipo jz1j > jz2j ; i.e., z1 são todos os pontos mais distântes da origem que z2. Mas a rmações como z1 > z2 não fazem 10 sentido algum (a menos, é claro, que Im z1 = Im z2 = 0). Exercise 14 Mostre que jz1z2j2 � jz1j2 jz2j2 = 0 : 11 2.2.1 Funções multivalentes Vejamos agora uma função um pouco mais complicada, W (z) = z2 = (x+ iy) 2 = x2 � y2 + 2ixy = r2e2i� ; U = x2 � y2 ; V = 2xy : O semi-circulo no plano z é mapeado num círculo no plano W e a linha x = 1 é mapeada na parábola 4U = 4� V 2. Exercise 15 O que acontece com um circulo de raio R centrado em (a; b)? Rint: use a equação do circulo em coordenadas polares r2 � 2ar cos � � 2br sin � = R2 � a2 � b2 : Esta gura foi retirada do livro Mathematical Methods of Physics, J. Mathews, R.L. Walker (2nd. Edition Addison Wesley, 1971) 12 Exercise 16 Estude a função 1=z. Para motivar a discussão a seguir, considere a seguinte questão: Exercise 17 Onde está o problema na seguinte demonstração 1 = p 1 = p ei2� = ei 2� 2 = ei� = �1 ??? Antes de responder esta pergunta, voltemos ao estudo das características de z2. No exemplo W (z) = z2 os pontos z e �z são mapeados no mesmo ponto W . O principal problema desta característica é que isto implica em problemas na de nição do mapa inverso W�1 (z) = z1=2 = p rei�=2 : Uma vez que na função acima �z = arg z = (argW ) =2 = �W =2; os pontos �z e �z + 2�, que representam os mesmos pontos no plano z, são dois pontos distintos �W e �W + �. Ou seja, o para inverso W�1 = z1=2 não é monovalente. A rigor o conceito de função se refere apenas a mapas monovalentes. Entretanto, isso ocorre com tanta freqüência para mapas complexo que usamos um certo abuso de linguagem e dizemos que W = z1=2 (a partir daqui chamaremos W�1 simplesmente de W ) é uma função multivalente. Obviamente, como tal coisa não existe nos reais, precisamos desenvolver certas ferramentas para tratar este tipo de função. Uma curva fechada no plano z que circule a origem (�z = 0 � 2�) não retornará para o mesmo ponto no plano W . De outra forma, qualquer curva fechada que circule a origem no plano z não gera uma curva fechada no plano W . Um ponto com esta característica é chamado ponto de rami cação2 . Por exemplo, a função W = p z � a tem um ponto de rami cação em a. 2Neste exemplo, na verdade, estamos falando mais especi camente de um ponto de rami cação algébrica. 13 Figure 1: Esta gura foi retirada do livro Mathematical Methods of Physics, J. Mathews, R.L. Walker (2nd. Edition Addison Wesley, 1971) Assim as funções multivalentes estarão bem de nidas apenas se não circularmos um ponto de rami cação. Para garantir isso, traçamos no plano z uma linha deste ponto até o in nito, chamada linha de rami cação (ou corte de rami cação) e, ao trabalharmos com a função, concordamos em nunca cruzar esta linha. No caso da rami cação na origem é conveniente tomar como linha de rami cação o semi-eixo real positivo ou negativo. O plano z cortado desta forma é chamado uma folha de Riemann da função em consideração. Esta folha é mapeada de forma unívoca numa parte do plano W chamada de ramo da função. No nosso caso de W = z1=2 a metade deste plano . A outra metade do plano W (o outro ramo da função) também é mapeada em todo o plano z. Podemos evitar o problema da multivalência do mapa (ou da função) dizendo que existem várias cópias (ou folhas) do plano z assim cortado e, ao cruzar a linha de rami cação, passamos de uma folha para outra. As curvas se comportam como se estas folhas fossem ligadas na linha de rami cação (Figura). As folhas assim ligadas formam uma superfície de Riemann S. Esta superfície mapeia sem ambiguidade todo o plano W , i.e., W : S ! C é uma função legítima (monovalente). Agora uma curva fechada no plano W é também uma curva fechada na superfície de Riemann S. Então, quando escrevemos W (z) = z2, precisamos ser bem claros se estamos falando de W : C �! C ou W : C �! S. Estas são duas funções diferentes. A segunda possui uma inversa (raiz quadrada), enquanto a primeira não. 14 Voltando agora ao problema da nossa prova1 = �1. O problema está em que, quando escrevemos p 1 = 1 estamos falando de um ramo (e, consequentemente, de uma especí ca folha de Riemann) da função z1=2. Mais especi camente, o valor desta função no ponto z (1; 0). Se dermos agora uma volta completa até o ponto z (1; 2�) estaremos cruzando uma linha de rami cação (independente de onde ela esteja) e, conseqüentemente, passaremos para uma outra folha de Riemann. Ou seja, quando nos movemos na superfície de Riemann S (onde z1=2 está bem de nida como função) saímos do ponto z1 = ei0� e chegamos num outro ponto z2 = ei2�, com z1 = z2 em z 2 C, mas com z1 6= z2 em z 2 S e, consequentemente, W (z1) 6= W (z2). O erro da nossa demonstração foi considerar W (z1) =W (z2) e com isso a rmar que p ei0 ? = p ei2� =) 1 ?= �1 : Resumindo: a função W = z1=2 está de nida com z 2 S que são duas cópias do plano z e possui dois ramos. No primeiro ramo (de nido no primeiro plano z) temos W (ei0�) = p 1 = 1, já no segundo ramo (segundo plano z) W (ei2�) = p 1 = �1. Sempre que falamos no valor de uma função multivalente, não basta dar a forma da função, mas precisamos também dizer de qual ramo estamos falando. Com o desenvolvimento do curso vamos ver algumas aplicações (e implicações) práticas das de nições acima. O número de folhas ligadas de ne a ordem do ponto de rami cação. Outras raizes (r1=nei�=n) podem ser descritas da mesma forma. A função W (z) = z1=3 necessita de 3 folhas e tem a origem como ponto de rami cação de ordem 3. No caso de funções com mais de um ponto de rami cação, por exemplo, W (z) = p (z � a) (z � b) ; temos diferentes formas de traçar a linha de rami cação. Na função acima podemos construir duas linhas partindo uma de a e outras de b até o in nito, ou podemos traçar apenas uma linha de a até b. A forma das superfícies de Riemann dependem desta escolha. Exemplo: Para resolver o problema de Kepler (da forma das órbitas) usando variáveis de ângulo ação temos de resolver a integral Z r 2mE + 2mk r � L 2 r2 dr Este problema, resolvido por Sommerfeld, envolve uma integral complexa com dois pontos de rami cação. Esta descrição mostra que, apesar de todos os benefícios vindos da extensão das funções para o plano complexo, este procedimento não é uma tarefa trivial nem mesmo para um caso simples como x1=2. 15 2.3 Diferenciação Para uma função f : R �! R ser diferenciável num ponto x 2 R, os seguintes limites f 0 (x) = lim dx!�0 f (x+ dx)� f (x) dx ; devem existir e serem iguais. Por exemplo, a função f (x) = x jxj ; não tem o limite limx!�0 f (x) de nido no ponto x = 0. Outro exemplo, a função(contínua) f (x) = jxj não é diferenciável em x = 0, porque lim dx!+0 f (0 + dx)� f (0) dx = 1 ; lim dx!�0 f (0 + dx)� f (0) dx = �1 : Omesmo critério pode ser usado para se analisar a diferenciabilidade de uma função complexa. Precisamos assim analisar o limite lim z!w f (z) = u ; w; z; u 2 C : A única diferença entre este limite e o conceito usual na reta real e que, sendo w um ponto no plano (f : R2 �! R2), existem várias formas diferentes de se aproximar do ponto w. Um problema semelhante ao que ocorre em uma dimensão, onde os limites pela direita e pela esquerda podem ser diferentes. Quando isso ocorre dizemos que este limite não existe. Da mesma forma, se o limite para w depender do caminho escolhido no plano, dizemos que o limite não existe. Uma função f é diferenciável num ponto z se existir o limite f 0 (z) = lim dz!0 f (z + dz)� f (z) dz � df dz (11) e este for independente do caminho pelo qual z + dz se aproxima de z. Uma função é analítica3 (regular ou holomór ca) numa região E se for diferenciável nesta região. Remark 18 Praticamente toda a teoria de funções de uma variável complexa se aplica apenas a funções analíticas. 3Para funções reais o termo analítica numa região signi ca que a função é igual a sua série de Taylor nesta região. 16 Exemplo: a função f (z) = jzj2. Precisamos analisar jz + dzj � jzj dz = (z + dz) (�z + d�z)� z�z dz = z�z + zd�z + �zdz + d�zdz � z�z dz = zd�z + �zdz + d�zdz dz = z d�z dz + �z dz dz + d�z dz dz = z d�z dz + �z + d�z : Fazendo dz ! 0 pelo eixo real dz = dx = d�z df dz = z dx dx + �z + dx = z + �z : Fazendo dz ! 0 pelo eixo imaginário dz = idy = �d�z df dz = z (�idy) idy + �z + d�z = �z + �z : Para ser diferenciável devemos ter z + �z = �z + �z =) z = �z : Esta função só pode ser difereciável em z = 0. O que é verdade, porque neste ponto df dz ���� z=0 = 0 d�z dz + 0 + d�z = d�z = 0 ; independente do caminho. Assim, f (z) = jzj2 é diferenciável apenas no ponto z = 0 e não é analítica em nenhuma região.� Remark 19 Funções são analíticas em regiões. Remark 20 Da seção anterior temos que a região de regularidade de uma função multivalente deve ser de nida numa superfície de Riemann. Pode-se provar4 que se uma função f (z) possui uma derivada numa região, esta derivada é necessariamente contínua. Assim, uma função f (z) sempre pode ser expandida numa série de Taylor em torno de um ponto z0 numa região onde esta função é analítica f (z) = a0 + a1 (z � z0) + :::+ an (z � z0)n ; a0 = f (z0) ; an = 1 n! f (n) (z0) : (12) O raio de convergência desta expansão é um circulo cujo raio se estende até o ponto onde a função é singular, 4Veja, e.g., Konrad Knopp, Theory of Functions, Parts I. 17 i.e., um ponto onde a função deixa de ser analítica. O contrário também é verdade, qualquer série de potência convergente numa região representa uma função analítica nesta região. 2.3.1 Equações diferenciais de Cauchy-Riemann Se uma função W (z) = U (x; y)+ iV (x; y) é analítica e fazemos dz = dx+ idy em (11) podemos fazer dz ! 0 pela horizontal (dy = 0) ou pela vertical (dx = 0). Se a função é analítica devemos obter o mesmo limite (11) para estas duas variações de dz, dW dz = @W @x dx dz + @W @y dy dz ; dx dz = 1 ; dy dz = �i� dW dz � dx=0 = �@W@y i� dW dz � dy=0 = @W@x ) =) �@W @y i = @W @x ; (13) se usarmos agora a nossa representação matricial de W W (z) = U + iV = U �V V U ! ; @W @x = @U @x �@V@x @V @x @U @x ! �@W @y i = @U @y �@V@y @V @y @U @y ! 0 1 �1 0 ! = @V @y @U @y �@U@y @V@y ! temos �@W @y i = @W @x =) @U @x �@V@x @V @x @U @x ! = @V @y @U @y �@U@y @V@y ! o que fornece �@U @y = @V @x ; @V @y = @U @x : (14) Estas são as equações diferenciais de Cauchy-Riemann (CR) e fornecem condições necessárias e su cientes para uma funçãoW = U+iV ser analítica numa região, desde que as quatro derivadas parciais existam e sejam contínuas. De outra forma, as condições de CR são necessárias, mas não su cientes, para estabelecer a diferenciabil- idade da função. Como mapas de R2 �! R estas funções são diferenciáveis se as derivadas parciais existirem e forem contínuas, mas como mapas de C �! C, estes mapas, além de serem contínuos, precisam satisfazer as condições de CR. É muito importante compreender o signi cado das igualdades acima. Como vimos anteriormente, toda função complexa pode ser vista como um mapa de R2 �! R. Existe uma in nidade de mapas que são diferenciáveis como funções reais (todas as derivadas parciais acima existem), mas que não satisfazem as 18 relações acima. Estes mapas não são funções complexas diferenciáveis. Para que exista a derivada de uma função complexa (e ser chamada de diferenciável) esta função tem de obedecer as equações de Cauchy- Riemann. Está é uma restrição bastante forte e implica que funções reais diferenciáveis não serão necessariamente funções complexas diferenciáveis. 19 Exemplo: f (z) = jzj2 = x2 + y2 =) U = x2 + y2 ; V = 0 @U @x = 2x ; @U @y = 2y ; @V @x = @V @y = 0 as funções U e V acima são diferenciáveis (como funções reais) em qualquer ponto. Mas as condições de CR fornecem �@U @y = @V @x =) �2y = 0 ; @V @y = @U @x =) 2x = 0 ; Que só são satisfeitas na origem x = y = 0. Vemos (novamente) que a função f (z) = jzj2 só é diferenciável no sentido complexo (f : C �! C) na origem, mesmo que, como uma função de R2 �! R, U e V sejam diferenciáveis em todos os pontos.� Assim, se a derivada de uma função W = U + iV existe num ponto z0 (as derivadas parciais de U e V existem neste ponto) e obedecem a condição de CR, então a derivada W 0 pode ser calculada como (13) W 0 (z0) = dW dz ���� z=z0 = @W @x = @ (U + iV ) @x = @U @x + i @V @x : (15) Ou, usando CR, W 0 = @U @x � i@U @y : (16) Remark 21 Dada uma função complexa diferenciável, valem também as regras usuais de diferenciação de somas e produtos de funções. Todos os argumentos usados para demonstrar estas regras para funções reais continuam válidos. Exercise 22 Veri que se e onde é diferenciável a função: W = z2. Resp: z2 = (x+ iy) (x+ iy) = x2 � y2 + 2ixy U = x2 � y2 ; V = 2xy @U @x = 2x ; @U @y = �2y ; @V @x = 2y ; @V @y = 2x Esta função é diferenciável em todos os pontos e, consequentemente, analítica em qualquer região. Exercise 23 A conjugação complexa �z (ou z�) de um número z de nida por z = x+ iy =) z� = �z � x� iy = re�i� 20 Veri que se e onde é diferenciável a função: W = z�. Exercise 24 Veri que se e onde é diferenciável a função: W = jzj2 = zz�. Resp: U = x2 + y2 ; V = 0 @U @x = 2x ; @U @y = 2x esta função só pode ser diferenciável na origem. Para veri car se esta função é realmente diferenciável na origem, precisamos veri car se as derivadas parciais são contínuas. O que de fato é verdade. Então, a função acima é diferenciável na origem. Mas esta função não é analítica em nenhuma região. Como vimos, a última função é uma função real perfeitamente diferenciável. Como um mapa R2 �! R em W = U + iV = x2 + y2, U = x2 + y2; V = 0 ambas as funções são perfeitamente diferenciáveis. Assim, a condição de diferenciação complexa é algo mais forte que a diferenciação real. Se uma função f : C �! C satisfaz as equações de CR e as derivadas parciais existem e são contínuas, a derivada complexa desta função existe e é dada por f (z) = U (x; y) + iV (x; y) =) f 0 (z) = @U @x + i @V @y : Exercise 25 Mostre que, em coordenadas polares,as condições de CR se tornam r @U @r = @V @� ; @U @� = �r @V @r e que a derivada de uma função pode ser calculada como: f 0 (z) = @U @x + i @V @y = (cos � � i sin �) � @U @r + i @V @r � : Resp: Veja o livro do Churchil pg 65. De nition 26 Se f : C �! C possui diferencial complexa em todos os pontos num aberto centrado em z0, dizemos que f é analítica, ou holomór ca, em z0. De nition 27 Uma função f : C �! C é dita inteira (entire function) se for analítica em qualquer ponto de C . De nition 28 Uma função f : C �! C possui uma singularidade no ponto z1 se ela não for analítica neste ponto. Isto inclui o caso em que f não está de nida em z1. Proposition 29 Se f e g são funções analíticas num domínio E então: 1. f + g é analítica em E 21 2. f � g é analítica em E 3. wf é analítica em E para todo w complexo ou real 4. fg é analítica em E 5. f=g é analítica em E exceto nos zeros de g. Proposition 30 Se f; g : C �! C são funções analíticas, então a composta f � g : C �! C é analítica. Exercise 31 Veri que que se f (z) e f� (z) são ambas analíticas numa região D, então f é constante em D. Resp: pg 73 Churchill. 22 3 Funções harmônicas Como vimos, a característica de uma função ser diferenciável complexa é uma restrição bastante forte nesta função (bem mais forte que diferenciabilidade real). Estas condições estão relacionadas com a equação de Laplace. Por exemplo, a distribuição de calor num corpo u obedece a equação @u @t � �r2u = 0 no regime estacionário (@u=@t = 0) em duas dimensões temos a equação (17). A equação de difusão do calor e a equação de onda, no caso estacionário se reduz a equação de Laplace. Como veremos nos exemplos a seguir, esta equação possui uma in nidade de aplicações, em especial, no eletromagnetismo e na dinâmica dos uidos. Uma função H : Rn �! R é chamada harmônica num certo domínio D se suas derivadas parciais de primeira e segunda ordem forem contínuas em D e H satisfaz a equação diferencial nX i=1 @2H @x2n = 0 conhecida como equação de Laplace. No que segue, estamos interessados no caso em duas dimensões H : R2 �! R, Hxx (x; y) +Hyy (x; y) = 0 ; (17) Falar sobre unicidade da solução. Funções harmônicas possuem a notável propriedade de que se você traçar um círculo ao redor de um ponto, e encontrar o valor médio da função dentro deste círculo, este valor é sempre igual ao valor da função no centro deste círculo, que é igual a média do valor da função na fronteira. Desde que a função esteja de nida dentro de todo o círculo e em sua fronteira. Esta propriedade pode ser usada para resolver, de forma iterativa, o problema de Dirichlet, i.e., xada a condição na fronteira, qual o valor da função numa região. Este efeito pode ser observado numa chapa quente. Vejamos como estas funções se relacionam com as funções analíticas. Theorem 32 Se uma função f (z) = u (x; y) + iv (x; y) é analítica, então as funções u e v são harmônicas. Assumindo que f é analítica em D, então nesta região ela deve obedecer às condições de CR @u @x = @v @y ; @u @y = �@v @x (18) 23 diferenciando ambos os lados destas igualdades em relação a x temos @2u @x2 = @2v @x@y ; @2u @x@y = �@ 2v @x2 Da mesma forma, diferenciando com relação a y temos @2u @y@x = @2v @y2 ; @2u @y2 = � @ 2v @y@x Lembrando que a continuidade da derivada parcial garante que @2u @y@x = @2u @x@y ; @2v @y@x = @2v @x@y temos @2u @x@y = �@ 2v @x2 = @2u @y@x = @2v @y2 =) @ 2v @y2 + @2v @x2 = 0 ; �@ 2u @y2 = @2v @y@x = @2v @x@y = @2u @x2 =) @ 2u @x2 + @2u @y2 = 0 : Ou seja u e v são harmônicos em D. Por outro lado, se duas funções u e v são harmônicas em D e suas derivadas parciais satisfazem às condições de CR, ou seja, é possível construir uma função complexa analítica u+ iv com estas funções, então v é chamada de harmônica conjugada de u. Theorem 33 Uma função f (z) = u (x; y)+ iv (x; y) é analítica em D apenas se v é a harmônica conjugada de u. É importante notar que se v é a harmônica conjugada de u, isso não garante que u é a harmônica conjugada de v (observe que as condições de CR (18) não são simétricas em u e v). Por exemplo, as funções u (x; y) = x2 � y2 ; v (x; y) = 2xy : Enquanto a função f = u+ iv = z2 é analítica. A função f = v + iu ; não é analítica em nenhum ponto. Exercise 34 Veri que a a rmação acima. É possível mostrar (ver Churchill) que se uma função u é harmônica em D, então ela é a parte real de 24 alguma função analítica em D. Além disso, se a harmônica conjugada existe, ela é única a menos de uma constante aditiva. Assim, dada uma função harmônica, podemos sempre construir uma função analítica. Por exemplo, u (x; y) = y3 � 3x2y é harmônica. Pela primeira relação de CR (18) sua harmônica conjugada deve obedecer @u @x = @v @y =) @v @y = �6xy =) v (x; y) = �3xy2 + � (x) usando agora a segunda relação �@v @x = � � �3y2 + �0 (x) � = @u @y = 3y2 � 3x2 =) 3y2 � �0 (x) = 3y2 � 3x2 =) �0 (x) = 3x2 =) � (x) = x3 + C Assim v (x; y) = �3xy2 + x3 + C é a harmônica conjugada de u e a seguinte função é analítica f (z) = y3 � 3x2y + i ��3xy2 + x3 + C� : Utilizando as propriedades das funções analíticas é possível concluir uma série de propriedades para as funções harmônicas quando estas são conjugadas. Por exemplo, se f é analítica então f = u+ iv =) f2 = �u2 � v2�+ i (2uv) também será. Assim o produto e a diferença do quadrado de duas funções harmônicas conjugadas também são funções harmônicas. Remark 35 O produto de duas funções harmônicas não é em geral uma função harmônica. Remark 36 Toda solução da eq. de Laplace pode ser expandida em série de potências numa região sem singularidades. (Soluções são tabeladas) Encontrar soluções da equação de Laplace (e de equações diferenciais em geral) não é uma tarefa trivial. Por isso as soluções conhecidas são compiladas em tabelas que possam ser consultadas por quem deseje resolver um determinado problema prático. Características e o método de construção da conjugada descrito acima permite, a partir do conhecimento de uma solução, construir um par de soluções conjugadas e, consequentemente, encontrar vários outros elementos para compor estas tabelas. 25 Remark 37 Se f : C �! R é harmônica e g : C �! C é analítica então f � g é harmônica. Dizemos que mapas analíticos preservam soluções da equação de Laplace, ou que a equação de Laplace é invariante por transformações analíticas. 3.1 Campos irrotacionais de divergência nula Uma grande quantidade de problemas em física envolve a presença de campos conservativos, i.e., campos cujo trabalho necessário para se movimentar sob sua ação independe do caminho seguido. Por exemplo, o movimento de uma massa num campo gravitacional, ou de uma carga num campo elétrico constante (r � E = �@B=@t). Estes campos são irrotacionais. Se estes campos não possuírem fontes ou sorvedouros (e.g., num campo elétrico estamos tratando uma região sem cargas r:E = �="0) eles também possuem a sua divergência nula. Por exemplo, um uido newtoniano incompressível de viscosidade constante é descrito pela seguinte particularização da equação de NavierStokes � � @v @t + v:rv � = �rp+ �r2v ; no caso estacionário onde não há nenhum tipo de aceleração (@v=@t + v:rv = 0) e não há gradiente de pressão (rp = 0) temos a equação de Laplace para as componentes de v. A incompressibilidade implica ainda r:v = 0, e se não houver rodamoinhos no uído r� v = 0. 26 Consideremos então campo vetorial num plano, que pode ser tanto um problema de mecânica dos uidos, como de eletromagnetismo, onde o uido poderiaser o campo elétrico. Podemos descrever este campo vetorial como V (x; y) = u (x; y) x^+ w (x; y) y^ : Se este uído é irrotacional (um campo conservativo ou um uído sem rodamoinhos) r�V = 0 =) ����� @@x @@yVx Vy ����� = @Vy@x � @Vx@y = @w@x � @u@y = 0 =) @w@x = @u@y (19) Se não houver nenhuma fonte ou sorvedouro do nosso uído (sem cargas, ou um uido incompressível), então sua divergência também será nula r �V (x; y) = @Vx @x + @Vy @y = 0 =) @u @x = �@w @y (20) Assim, a função f = �V � u� iw obedece as condições de CR (19) e (20). Assim, se V descreve um campo irrotacional sem fontes nem sorvedouros, então a função f = �V : C �! C é diferenciável. Além disso, se as derivadas parciais de V forem contínuas, f será uma função analítica. Ademais temos que as componentes de f são funções harmônicas. Lembrando que um campo irrotacional sempre pode ser escrito como o gradiente de uma função escalar, pois V (x; y) = r� (x; y) = @� @x x^+ @� @y y^ =) r�V = @ @x @� @y � @ @y @� @x = 0 : (onde para trocarmos as derivadas precisamos que � : R2 �! R tenha derivadas parciais contínuas) podemos escrever V (x; y) = r� (x; y) =) u = @� @x ; w = @� @y f = u� iw = @� @x � i@� @y Lembrando a expressão (16) W 0 = @U @x � i@U @y : 27 que obtivemos anteriormente temos F = u+ iv =) F 0 = @u @x � i@u @y F 0 = f = @� @x � i@� @y =) � = ReF (21) Vemos que, nas condições acima, a função � é a parte real da antiderivada de f . Este resultado também é bastante útil. Example 38 Por exemplo, vamos encontrar o potencial que gera o campo (o encontro de 2 rios) V (x; y) = 2xx^� 2yy^ =) V = 2x� i2y f = �V = 2x+ i2y = 2 (x+ iy) f (z) = 2z Fácil que f é analítica (veri que!). Assim V descreve um campo irrotacional sem fontes nem sorvedouros que, consequentemente, pode ser descrito por um escalar. Observando que F = z2 =) F 0 = 2z = f Do fato de F 0 ser também analítica e usando a relação (21) temos � = ReF = x2 � y2 : E determinamos assim o potencial que gera o nosso campo conservativo.� O estudo da equação de Laplace, ou o estudo das funções harmônicas, é chamado de teoria dos potenciais. 28 Remark 39 Toda função analítica corresponde a um campo irrotacional de divergência nula. Um uido incompressível sem rodamoinhos, um campo elétrico sem cargas etc. 4 Integral Como f : C �! C pode ser vista como composta por um par de funções R2 �! R (mais algumas pro- priedades) é natural supor que, assim como ocorre na diferenciação, o conceito de integral de uma função complexa também se relacione com a integral de funções no plano. Observe que, a princípio, poderíamos tentar de nir a integral de uma função complexa como a integral da parte imaginária e real, i.e., como a integral de duas funções no planoZ f (z) dz ? = Z Z (U (x; y) + iV (x; y)) dx dy = Z Z U (x; y) dx dy + i Z Z V (x; y) dx dy ; (22) ou seja, a integral de uma função complexa seria uma integral de área. Mas, neste caso, a integral da função f (z) = 2z seria f (z) = 2z = 2 (x+ iy)Z Z 2x dx dy + i Z Z 2y dx dy = Z 2x dx Z dy + i Z 2y dy Z dx = yx2 + ixy2 : Mas observe que desta forma a derivada desta "primitiva" F = yx2 + ixy2 não corresponde a cuja derivada complexa de novamente f (z), pois yx2 + ixy2 6= z2 ; d dz z2 = 2z Ou seja, a de nição (22) não corresponde a uma operação inversa a nossa de nição de diferenciação. Este é um argumento de porque não de nimos a integral desta forma. Nós queremos ter, também para funções complexas, um análogo do teorema fundamental do cálculo. Além disso, lembrando da nossa representação grá ca dos números complexos, temos que dz = dx+ idy pode ser visto como um vetor in nitesimal no plano x; y, ou seja, se comporta como dr = {^dx+ |^dy. Todos estes argumentos indicam que a de nição de integral que queremos não se relaciona com integrais de áreas, mas sim com integrais de curvas. Como vimos acima, o conceito de limite no plano complexo deve levar em conta que temos vários caminhos possíveis para nos aproximarmos do ponto em questão. Da mesma forma, o conceito de integrar entre dois pontos, possui a mesma questão de qual caminho percorremos para chegar de um ponto a outro. Este problema também existe na integral de linha de funções no plano. Assim, vamos primeiro rever o que acontece neste último caso. 29 4.1 Teorema de Green Um campo vetorial num plano é uma função que a cada ponto deste plano associa um vetor. Tal campo pode ser usado, por exemplo, para descrever o comportamento de um uido, um campo eletromagnético etc. Um dos grandes interesses no estudo de problemas práticos é saber qual o trabalho realizado para se mover neste campo vetorial. Por exemplo, queremos mover uma carga elétrica por um campo elétrico, ou uma massa num campo gravitacional, ou ainda um barco por um rio. Em todos estes casos, o trabalho realizado será: W = Z C F:dr (23) onde, num plano, F (x; y) = U (x; y) {^+V (x; y) |^ é o campo vetorial (neste caso a força) e dr = {^dx+ |^dy um elemento de deslocamento na trajetória C. Em geral este trabalho depende, não apenas do caminho, mas também do sentido que este caminho é seguido. Exemplo: Vamos calcular a integral de linha do campo F = (3x� y) i+ (x+ 5y) j sobre a circunferência unitária. Este caminho pode ser parametrizado como 30 x = cos!t ; y = sin!t ; t 2 � 0; 2� ! � onde ! está relacionado com a velocidade que percorremos a curva. Assim W = Z C F:dr = Z C (U (x; y) dx+ V (x; y) dy) x = x (t) ; y = y (t) =) dx = dx dt dt ; dy = dy dt dt ; W = Z 2� ! 0 � (3x� y) dx dt + (x+ 5y) dy dt � dt dx dt = �! sin!t ; dy dt = ! cos!t W = Z 2� ! 0 ((3 cos!t� sin!t) (�! sin!t) + (cos!t+ 5 sin!t) (! cos!t)) dt = Z ! (� (3 cos!t� sin!t) sin!t+ (cos!t+ 5 sin!t) cos!t) dt = ! Z ��3 cos!t sin!t+ �sin2 !t+ cos2 !t�+ 5 sin!t cos!t� dt = ! Z ((�3 + 5) sin!t cos!t+ 1) dt = ! Z 2� ! 0 (2 sin!t cos!t+ 1) dt = ! Z 2� ! 0 2 sin!t cos!tdt+ Z 2� ! 0 1dt ! = ! 2 Z 2� ! 0 sin!t cos!tdt+ 2� ! ! = ! 2 Z 2� ! 0 1 2 sin 2!t dt+ 2� ! ! = ! Z 2� ! 0 sin 2!t dt+ 2� ! ! = ! � 1 2! cos 2!t ����2�=! 0 + 2� ! ! = ! � 2� ! � = 2�: Observe como o valor calculado não depende de !, a velocidade com que percorremos a curva.� Vamos calcular a integral (23) para um campo F arbitrário, mas para um caminho especí co, por exemplo, um retângulo: (0; 0)! (a; 0)! (a; b)! (0; b)! (0; 0) 31 W = Z C F:dr = Z C (U (x; y) {^+ V (x; y) |^) : (^{dx+ |^dy) = Z C (U (x; y) dx+ V (x; y) dy) : Na primeira parte do caminho (0; 0)! (a; 0) ; dr = {^dx =) dy = 0: W j(a;0)(0;0) = Z (a;0) (0;0) (U (x; y) dx+ V (x; y) dy) = Z a 0 U (x; 0) dx Enquanto na segunda parte (a; 0)! (a; b) ; dr = |^dy =) dx = 0 W j(a;b)(a;0) = Z (a;b) (a;0) (U (x; y) dx+ V (x; y) dy) = Z b 0 V (a; y) dy Da mesma forma W j(0;b)(a;b) = Z 0 a U (x; y) dx = � Z a 0 U (x; b) dx W j(0;0)(0;b) = Z 0 b V (x; y) dy = � Z b 0 V (0; y) dy (o sinal de menos vem do fato do percurso ser na direção em que x e y diminuem). O trabalho total é a soma 32 do trabalho de cada parte: W = W j(a;0)(0;0) + W j(a;b)(a;0) + W j(0;b)(a;b) + W j(0;0)(0;b) = Z a 0 [U (x; 0)� U (x; b)] dx+ Z b 0 [V (a; y)� V (0; y)] dy (24) Um ponto importante é que cada uma das integrais acima é uma integral ordinária em apenas uma variável. Assim, no cálculo de qualquer das integrais acima a função integrada pode ser tratada como uma função de uma única variável.Assim, podemos fazer, por exemplo: U (x; y) = fx (y) =) f 0x (y) = dfx (y) dy =) Z b 0 f 0 x (y) dy = fx (b)� fx (0) f 0 x (y) = dfx dy = lim dy*0 fx (y + dy)� f (y) dy = lim dy*0 U (x; y + dy)� U (x; y) dy = @U @yZ b 0 f 0 x (y) dy = fx (b)� fx (0) =) Z b 0 @U @y dy = U (x; b)� U (x; 0) Da mesma forma Z a 0 @V @x dx = V (a; y)� V (0; y) Substituindo em (24) temos W = � Z a 0 Z b 0 @U @y dy dx+ Z b 0 Z a 0 @V @x dx dy = Z a 0 Z b 0 � @V @x � @U @y � dx dy Assim, para o nosso caminho quadrado W = Z C F:dr = Z C (U (x; y) dx+ V (x; y) dy) = Z Z R � @V @x � @U @y � dA Suponha agora que o nosso quadrado tenha sido dividido, por exemplo, por uma linha vertical no ponto x = h < a e calculamos o trabalho para percorrer cada um dos dois quadrados: W1 = W (h;0) (0;0) +W (h;b) (h;0) +W (0;b) (h;b) +W (0;0) (0;b) W2 = W (a;0) (h;0) +W (a;b) (a;0) +W (h;b) (a;b) +W (h;0) (h;b) 33 onde W (h;b) (h;0) = Z b 0 V (h; y) dy W (h;0) (h;b) = Z 0 b V (h; y) dy = � Z b 0 V (h; y) dy = �W (h;b)(h;0) Então W1 +W2 =W (h;0) (0;0) +W (0;b) (h;b) +W (0;0) (0;b) +W (a;0) (h;0) +W (a;b) (a;0) +W (h;b) (a;b) Agora observamos que W (h;0) (0;0) +W (a;0) (h;0) = Z h 0 U (x; 0) dx+ Z a h U (x; 0) dx = Z a 0 U (x; 0) dx =W (a;0) (0;0) W (h;b) (a;b) +W (0;b) (h;b) = W (0;b) (a;b) Assim W1 +W2 = W j(a;0)(0;0) + W j(a;b)(a;0) + W j(0;b)(a;b) + W j(0;0)(0;b) =W Ou seja, não importa que divisão façamos no nosso quadrado todas as contribuições das partes internas irão se cancelar (porque são percorridas na ordem inversa) e sobrará apenas as bordas. Assim, para uma superfície fechada qualquer, podemos subdividi-la em quadrados, somar todas as con- tribuições dos quadrados e o que teremos será a integral de linha nas bordas da região interna do caminho. É importante notar que qualquer buraco na nossa área, i.e., regiões que não pertencem ao domínio das funções geraram bordas e contribuirão para a integral. Assim, de forma geral, para um caminho fechado que encerre uma superfície simplesmente conexa (sem 34 buracos) temos: I C F:dr = I C (U (x; y) dx+ V (x; y) dy) = Z Z R � @V @x � @U @y � dA (25) Este é o teorema de Green e permite, através do cálculo de integrais de áreas, que não envolve produtos vetoriais, calcular uma integral de linha. Exemplo: Vamos voltar ao nosso exemplo anterior F = (3x� y) i+ (x+ 5y) j U = (3x� y) ; V = (x+ 5y) @V @x = 1; @U @y = �1 I C F:dr = Z Z R � @V @x � @U @y � dA = Z Z R [1 + 1] dA = 2 Z Z R dA = 2� : � Este teorema também permite ver que, se @V @x = @U @y =) I C F:dr =0 ; para qualquer curva fechada. Ou seja, F é um campo conservativo. Veja que esta expressão concorda com (19) que obtivemos porque F é um campo gradiente. Se F é um campo conservativo temos F = rf = @f @x x^+ @f @y y^ =) Z C F:dr = Z C � @f @x x^+ @f @y y^ � : (^{dx+ |^dy) ;Z C F:dr= Z C � @f @x dx+ @f @y dy � = Z B A df = f (B)� f (A) ; para A e B os limites de C. Assim Z C rf:dr =f (B)� f (A) ; é uma generalização do Teorema Fundamental do Cálculo para funções de várias variáveis. Como veremos a seguir, todo o material desenvolvido acima está intimamente ligado com o cálculo de integrais de funções complexas. 4.2 Integrais complexas Dos resultados anteriores, sabemos que integrais complexas estão intimamente ligadas às integrais de campos vetoriais. Assim, se quisermos obter uma generalização do teorema fundamental do cálculo, assim como () é 35 esta generalização para funções no plano, devemos interpretar nossas integrais complexas como integrais de linha. No caso de funções complexas, estas integrais de linha são chamadas de integrais de caminhos. Agora, se tratarmos a integral Z C f (z) dz como uma integral de linha sobre uma curva C no plano complexo, podemos, assim como na integral de linha de funções reais, parametrizar esta curva por um parâmetro t qualquer e escrever C (t) = x (t) + iy (t) =) dx = dx dt dt = _xdt ; dy = dy dt dt = _ydt Z C f (z) dz = Z C f (x (t) + iy (t)) ( _x+ i _y) dt = Z C f (z (t)) _z dt Usando as de nições e os resultados acima podemos calcular a integral de funções complexas no plano complexo Exemplo: vamos integrar f (z) = z� de 1 até i por duas linhas retas de 1! 0 e 0! i linha retaZ C z� dz = Z C1 z� dz + Z C2 z� dz ; C1 : 1! 0 ; C2 : 0! i Parametrizando por z = x+ iy temos Z C z� dz = Z C1 (x� iy) (dx+ idy) + Z C2 (x� iy) (dx+ idy) = Z 0 1 x dx+ Z 1 0 y dy = �1 2 + 1 2 = 0 : E ao longo do arco Z C z� dz = Z �=2 0 z� (�) _z d� = Z �=2 0 e�i� � iei� � d� = i Z �=2 0 d� = i � 2 Do resultado acima vemos que a integral, em geral depende do caminho de integração.� Exemplo 2: Vamos integrar a nossa função f (z) = 2z como uma integral de linha, por exemplo, do 36 ponto 0 ao ponto 1 + i por uma linha reta x = y =) x = t ; y = t =) _x = 1 = _y Z C f (z) dz = Z 1 0 2 (t+ it) (1 + i) dt = (1 + i) 2 Z 1 0 2tdt = 2 (1 + i) 2 � t2 2 �1 0 = (1 + i) 2 = 2i E por duas linhas retas 0! 1 e 1! (1 + i)Z C f (z) dz = 2 �Z 1 0 (x+ iy) (dx+ idy) + Z 1+i 1 (x+ iy) (dx+ idy) � = 2 �Z 1 0 x dx+ Z 1 0 (1 + iy) (idy) � = 2 �Z 1 0 x dx+ �Z 1 0 1 (idy) + i Z 1 0 y (idy) � � = 2 �Z 1 0 x dx+ Z 1 0 idy � Z 1 0 y dy � = 2 Z 1 0 idy = 2i : Repetindo este processo in nitas vezes podemos ver que, neste caso, a integral não depende do caminho. Observe também que neste caso, se assumirmos que a integral é uma antiderivada, temosZ C 2z dz = � z2 �1+i 0 = (1 + i) 2 = 2i : Então neste caso, e isso pode ser veri cado para qualquer pontos iniciais e nais, nossa de nição concorda com a idéia de antiderivação. 4.3 Integrais de funções analíticas Vamos agora usar a nossa de nição de integral complexa como uma integral de linha, temos f = u+ iv =) Z C f (z) dz = (26)Z C (u+ iv) (dx+ idy) = Z C (u dx� v dy) + i Z C (u dy + v dx) A existência da integral acima depende da existência da integral de u e v e, assim como no caso dos campos, a curva C deve ser lisa por partes. Lembrando que C é um caminho sobre o plano complexo, i.e., o plano x; y, cada uma das duas integrais 37 acima é da forma Z C (u (x; y) dx+ v (x; y) dy) ou seja, temos duas integrais de caminho (reais) para os campos vetoriais F1 = ux^� vy^ ; F2 = vx^+ uy^ Se a curva C for uma curva fechada, podemos então agora usar o teorema de Green (25) para calcular I C F1:dr = Z Z R � @ (�v) @x � @u @y � dA I C F2:dr = Z Z R � @u @x � @v @y � dA Usando agora as relações de CR temos �@u @y = @v @x =) I C F1:dr = Z Z R � �@v @x � @u @y � dA = Z Z R � � � �@u @y � � @u @y � dA = 0 @v @y = @u @x =) I C F2:dr = Z Z R � @u @x � @v @y � dA = Z Z R � @v @y � @v @y � dA = 0 Assim, o teorema de Green para funções no R2, as condições de CR e a nossa de nição das integrais complexas como integrais de linha no plano complexo, garantem que cada um dos termos em (26) é zero. De outra forma, se f é uma função analítica num domínio E � C a integral sobre qualquer curva fechada em E, lisa por pedaços (uma exigência para que a integral dos campos esteja bem de nida), entãoIf (z) dz = 0 : (27) Este é o teorema de Cauchy-Goursat. Remark 40 Obviamente o resultado acima já era esperado, uma vez que funções analíticas são campos conservativos e, para tais campos, a integral por um circuito fechado é zero. O ponto aqui é que, para se obter o resultado (27), passamos de uma integral de linha para uma integral de área. Ou seja, este resultado só é válido se a nossa função for analítica em toda a área no interior da curva fechada. De outra forma, mesmo que a função seja analítica em todas as regiões em torno do caminho de integração, se ela for singular num único ponto dentro da região, não podemos mais usar os resultados acima. Como conseqüência, a integral de f de um ponto z1 até um ponto z2 depende apenas dos pontos e 38 independe do caminho Z C f (z) dz = Z z2 z1 f (z) dz : Na verdade, já sabíamos deste fato, uma vez que funções analíticas são campos irrotacionais (conservativos). Obviamente toda a discussão acima depende do fato da função ser analítica e, consequentemente, não possuir singularidades na região em consideração. Em geral a integral de uma curva fechada que envolva uma singularidade não será igual a zero. Remark 41 Para funções não analíticas, temos de calcular uma integral de linha e o resultado irá, no geral, depender da curva e não só dos extremos. 39 4.4 Antiderivada Voltemos ao cálculo da integral Z C f (z) dz através da parametrização C (t) = x (t) + iy (t) =) dx = dx dt dt = _xdt ; dy = dy dt dt = _ydt com o que temos Z C f (z) dz = Z C f (x (t) + iy (t)) ( _x+ i _y) dt = Z C f (z (t)) _z dt Vamos primeiro supor que os pontos iniciais e nais estão sobre o eixo dos reais. Para o caso de caminhos C também sobre o eixo dos reais (dy = 0) a integral acima é da formaZ CR f (z (t)) _z dt = Z b a w (t) dt ; a; b 2 R : Onde w é uma função complexa, mas com argumentos reais, w : R �! C. Ou seja, w é uma restrição do domínio de f sobre o eixo real. Vamos ver o que acontece com a integral da função w (z (t)) � w (t) = u + iv. Onde, como estamos caminhando apenas no eixo real, u = u (x) e v = v (x) são funções reais de uma única variável real, u; v : R �! R. Assim, usando o teorema fundamental do cálculo para funções reais temosZ b a w (t) dt = Z b a (u+ iv) dt = Z b a u dt+ i Z b a v dt = U (t)jba + i V (t)jba = W (t)jba ; onde U 0 = dU dt = u ; V 0 = dV dt = v ; W = U + iV Da expressão acima vemos que Z b a w (t) dt = W (t)jba ; W 0 = w ; (28) onde, obviamente, a mesma parametrização z (t) deve ser usada para w e W . O resultado acima diz que: Remark 42 Para funções complexas com argumentos reais, temos uma generalização do teorema fun- damental do cálculo. Obviamente, assim como no caso de integrais reais, a função deve estar bem de nida em todo o eixo real. 40 Exemplo: calcular Z �=4 0 eit dt = ��ieit��=4 0 = 1p 2 + i � 1� 1p 2 � � O resultado acima pode ser usado para se de nir a integral inde nida de uma função complexa, sua primitiva ou a antiderivada. Obviamente, se estamos procurando uma primitiva de uma função, esta só dependerá dos pontos iniciais e nal de integração. E, como vimos, isto só está garantido para funções analíticas. Assim, vamos procurar primitivas apenas de funções analíticas. Se f é analítica, sabemos que para qualquer caminho temosZ z2 z1 f (z) dz = Z 1 0 f (z (t)) ( _x+ i _y) dt com z (0) = z1 e z (1) = z2 terá o mesmo valor. Usando (28) temosZ b a w (t) dt = W (t)jba ; W 0 = w então existe uma função F tal queZ 1 0 f ( _x+ i _y) dt = F j10 ; F 0 = f ( _x+ i _y) = f _z (onde 0 é a derivada pelo parâmetro real) mas para qualquer função F (z (t)) F 0 (z) = dF dz _z = f _z =) dF dz = f : Assim, se para uma função analítica f de nirmos um caminho qualquer z0 (t) ; t 2 [0; 1] F (z) = Z z 0 f (z0 (t)) dz0 = Z 1 0 f (z0 (t)) ( _x0 + i _y0) dt com z0 (t = 0) = 0 e z0 (t = 1) = z teremos F 0 = f e podemos dizer que F é a antiderivada de f . A de nição acima é independente da parametrização (desde que z0(1) = z). Observe que isso só é possível porque f é analítica e, consequentemente, a integral só depende dos extremos do caminho. O resultado acima é o nosso teorema fundamental do cálculo complexo para funções analíticas. Do nosso estudo de derivadas é fácil ver que, assim como no caso de funções reais F está de nida a 41 menos de uma constante. Exemplo: A utilização da antiderivada é, no cálculo de integrais, idêntico ao cálculo nos reais Z 1+i 0 z2 dz = � z3 3 �1+i 0 = (1 + i) 3 3 = 2 3 (i� 1) : 4.5 Integrais de contorno Vamos agora integrar a função f (z) = 1 z num caminho C que seja um circulo de raio unitário começando e terminando em 1. Podemos parametrizar o circulo fazendo z = eit =) dz dt = ieitZ C z� dz = Z 2� 0 e�it dz dt dt = Z 2� 0 e�it ieitdt = i Z 2� 0 dt = 2�i : Z C 1 z dz = Z C z� zz� dz como no circulo zz� = 1 Z C 1 z dz = Z C z� zz� dz = Z 2� 0 e�it dz dt dt = Z 2� 0 e�it ieitdt = i Z 2� 0 dt = 2�i : Diferente de zero. Porque f não é analítica em todos os pontos dentro do contorno. Exercise 43 Veri que os pontos onde 1=z é analítica. Suponha agora um outro círculo de raio R, neste caso teríamos:Z C 1 z dz = Z C z� zz� dz = Z C z� R2 dz = 1 R2 Z C z� dz fazendo z = R exp (it) =) dz dt = iR exp (it) 42 Figure 2: Figura 3 temos z = eit =) dz dt = ieitZ C 1 z dz = 1 R2 Z C z� dz = 1 R2 Z 2� 0 R exp (�it) dz dt dt = Z 2� 0 e�it ieitdt = i Z 2� 0 dt = 2�i : A parametrização acima mostra ainda que qualquer circulo em torno da origem daria o mesmo resultado. Observe agora que se zermos a integral pelo caminho da gura abaixo Ou seja, de A até D pelo circulo, depois de D até C então de C até B pela gura externa e, nalmente de B de volta para A teremos percorrido um caminho fechado que não contem nenhuma singularidade, i.e., nesta região a função é analítica. Assim, neste contorno C 0 temosI C0 1 z dz = 0 Mas a integral sobre o caminho D ! C é igual ao negativo da integral B �! A e, consequentemente, a integral na curva externa é igual a integral da curva interna. Este resultado mostra que: Remark 44 se f é uma função analítica com uma singularidade num ponto, qualquer integral ao redor desta 43 singularidade (percorrida na mesma direção), tem o mesmo valor independente da curva. Assim, I C 1 z dz = 2�i para qualquer curva C que circule a origem. De nition 45 Dizemos que a função f tem um pólo no ponto w se lim z�!w jf (z)j =1 Vamos calcular a integral I C 1 (z � z0)n dz : num contorno C que circule z0. Esta função tem um pólo em z = z0. Mas sabemos que qualquer caminho dará o mesmo resultado. Assim, escolhemos o caminho C que é um circulo unitário centrado em z0, i.e., C é o circulo z 0 = z0 + e i�. Com isso z = z0 + e i� ; _z = i�ei�I C 1 (z � z0)n dz = Z 2� 0 1 (ei�) n ie i� d� = Z 2� 0 e�i�niei� d� = i Z 2� 0 ei�(1�n) d� = ( 2�i para n = 1 0 para n 6= 1 (29) Exemplo: Calcule a integral I C z z2 � 1 dz com C um círculo centrado na origem de raio 2. Primeiro se veri ca-se quantas singularidades estão no interior do circuito. No caso, as duas. Depois se faz a decomposição z (z2 � 1) = z (z + 1) (z � 1) = 1 2 (z + 1) + (z � 1) (z + 1) (z � 1) = 1 2 � (z + 1) (z + 1) (z � 1) + (z � 1) (z + 1) (z � 1) � = 1 2 � 1 (z � 1) + 1 (z + 1) � 44 com isso, usando (29), I C z z2� 1 dz = I C 1 2 � 1 (z � 1) + 1 (z + 1) � dz = 1 2 �I C 1 (z � 1) dz + I C 1 (z + 1) dz � = 1 2 [2�i+ 2�i] = 2�i : Exemplo: Calcular f (z) = z� em torno do círculo de raio unitário e em torno do quadrado �1� i. Em torno do círculo temos Z 2� 0 e�i� � iei� � d� = i Z 2� 0 d� = 2�i Ao redor do quadrado z = 1 + ti =) Z 1 �1 (1� ti) i dt = 2i z = �1� ti =) Z 1 �1 ((�1 + ti)� i) dt = 2i z = t� i =) Z 1 �1 (t+ i) dt = 2i z = �t+ i =) Z 1 �1 (�t� i) i dt = 2i Num caso 2�i no outro 8i.� Resumindo: � Integrais de funções não analíticas devem ser calculadas em todos os pontos da curva. � Integrais de funções inteiras (analíticas em todo o plano complexo) sobre domínios fechados são zero. � Integrais de funções inteiras não depende do caminho (podemos escolher de acordo com a conveniência). � Integrais de funções analíticas com singularidades podem ser calculadas por qualquer caminho que não contorne a singularidade � Integrais fechadas de funções analíticas que envolvem singularidades só precisam ser calculadas ao redor dos pontos de singularidade. Cuidados especiais com funções multivalentes: Exemplo: uso da antiderivada no cálculo da integral de funções multivalentes. Vamos calcular a integral da função f (z) = p z do ponto 1 até �1 através de um semi-circulo acima do eixo real, C = ei� ; 0 � � � �. 45 Como vimos anteriormente, esta função possui vários ramos. Apesar de todos estes ramos possuírem a mesma forma funcional, seus domínios de de nição são diferentes para cada corte escolhido. Por exemplo, suponha que se escolheu o seguinte corte: f1 (z) = [z (r; �)] 1=2 � pr exp (i�=2) ; r > 0 ; 0 < � < 2� Neste corte não podemos efetuar a integral pelo método da anti-derivada, porque a função não é analítica no caminho (não podemos de nir a derivada, porque não podemos nos aproximar do ponto por qualquer caminho sem cruzar a linha de corte) este ramo não é analítico, não está de nido, em z = 1). Podemos resolver este problema fazendo o corte em outro lugar. Por exemplo, fazendo o corte � = ��=2 f2 (z) = [z (r; �)] 1=2 � pr exp (i�=2) ; r > 0 ; ��=2 < � < 3�=2 Neste caso, como nosso caminho não cruza a linha de corte e, conseqüentemente, o ramo escolhido é analítico em todo o percurso, podemos calcular F = 2 3 z3=2 =) F 0 = z1=2Z C z1=2 dz = � 2 3 z3=2 �r=1;�=� r=1;�=0 = 2 3 �p r exp � 3 2 i� ��r=1;�=� r=1;�=0 = 2 3 � exp � 3 2 i� ���=� �=0 = 2 3 � exp � 3 2 i� � � exp (0) � = 2 3 [�i� 1] = �2 3 (1 + i) Qualquer caminho acima do eixo real pode ser calculado da mesma maneira. Agora, se quisermos efetuar o mesmo cálculo por um caminho C2 que liga o mesmo ponto, mas passa pela parte abaixo do eixo real, devemos escolher um novo ramo da função. Por exemplo, podemos fazer o corte em � = �=2 f3 (z) = [z (r; �)] 1=2 � pr exp (i�) ; r > 0 ; �=2 < � < 5�=2 observe que � = 0 não está no domínio desta função. 46 F = 2 3 z3=2 =) F 0 = z1=2Z C z1=2 dz = � 2 3 z3=2 �r=1;�=� r=1;�=2� = 2 3 �p r exp � 3 2 i� ��r=1;�=� r=1;�=2� = 2 3 � exp � 3 2 i� ���=� �=2� = 3 2 � exp � 3 2 i� � � exp � 3 2 i2� �� = 2 3 � exp � 3 2 i� � � exp (3i�) � = 2 3 [�i� (�1)] = 3 2 [1� i] Observe que, mesmo tendo a mesma forma funcional, o resultado é diferente. 4.6 A formula integral de Cauchy Se f é uma função analítica num domínio E � C pelos resultados acima temos queI C0 f (z) z � w dz = 0 para qualquer caminho C 0 que não contorne o ponto z = w (pois f é analítica, mas o integrando tem uma singularidade). Vamos imaginar uma curva como a da gura 2 com w no centro do círculo interno (observe que há um circulo interno que circunda a singularidade, mas há o caminho externo que não circunda). O ponto crucial é que o cálculo da integral na gura, por qualquer caminho, independe do tamanho (raio) do círculo interno. Isso signi ca que, se C é o circulo interno, que circunda a singularidade em w, esta integral terá o mesmo valor para qualquer círculo, em especial (a seguir eu usei o símbolo ?C �! 0 para indicar que o diâmetro do círculo tende a zero) I C f (z) z � w dz = lim?C�!0 I C f (z) z � w dz : (30) Mas como f é analítica, quando o círculo tente ao ponto z = w temos lim z�!w f (z) = f (w) para qualquer caminho do limite (lembrando que para funções analíticas o limite acima não depende do caminho). Assim temos lim ?C�!0 I C f (z) z � w dz = f (w) I C 1 z � w dz : Usamos agora a integral de contorno (29) e calculamos 47 I C 1 z � w dz = 2�i Retornando este resultado em (30) temosI C f (z) z � w dz = lim?C�!0 I C f (z) z � w dz = f (w) I C 1 z � w dz = f (w) 2�i ou ainda f (w) = 1 2�i I C f (z) z � w dz (31) onde lembramos que C é qualquer curva que circunde a singularidade (i.e., que circunde w). Esta é a fórmula integral de Cauchy. A fórmula acima mostra a característica bastante peculiar das funções analíticas de que seu valor numa certa região é totalmente determinado pelo valor nas bordas desta região. Assim, uma vez de nido as condições da função na fronteira, não há mais nenhuma liberdade na de nição dos seus valores internos. Ou ainda, qualquer alteração em qualquer ponto da fronteira, altera todos os demais valores da função. Este comportamento pode ser visto, por exemplo, no estado de equilíbrio de uma chapa aquecida, onde o valor da temperatura nos pontos da borda da chapa determina seu valor em toda a chapa (lembrando que a parte real e imaginária de uma função analítica obedece, cada uma, a equação de Laplace). Exemplo de aplicação: Calcule a integralI C z (9� z2) (z + i)dz onde o caminho C é um circulo de raio 2 (jzj = 2) centrado no ponto z0 = �i. Solução: Apesar do integrando ter uma singularidade no interior do caminho, observe que a função f (z) = z (9� z2) é analítica em toda a região de interesse. Assim, podemos usar a fórmula integral de Cauchy para escrever f (�i) = 1 2�i I C � z (9� z2) � 1 (z + i) dz = (�i)� 9� (�i)2 � =) I C � z (9� z2) � 1 (z + i) dz = 2�i (�i)� 9� (�i)2 � = � 5 : � 48 4.7 Derivadas de funções analíticas Vamos voltar à integral I C f (z) z � w dz para uma curva C que circunda a singularidade w. Vamos agora parametrizar esta curva por z (t), t 2 [0; 1], com isso I C f (z) z � w dz = Z 1 0 f (z (t)) z (t)� w _z dt : Usando agora a fórmula integral de Cauchy (31) temos f (w) = 1 2�i Z 1 0 f (z (t)) z (t)� w _z (t) dt : Vamos calcular agora a derivada da função f (w) d dw f (w) = f� 0 (w) = 1 2�i d dw �Z 1 0 f (z (t)) z (t)� w _z dt � : Observe que a quantidade dentro do sinal de integral pode ser considerada como uma função de w e t. Usando agora a regra de Leibniz (que garante que, para integrais reais, nós podemos diferenciar através do sinal de integral) temos f� 0 (w) = 1 2�i �Z 1 0 @ @w f (z (t)) z (t)� w _z dt � : (observe que a integral é uma função apenas de w mas o integrando é uma função de w e t por isso, quando entra na integral a derivada total vira uma derivada parcial). Efetuando agora a diferenciação f� 0 (w) = 1 2�i Z 1 0 f (z) (z � w)2 _z dt = 1 2�i I C f (z) (z � w)2 dz : Repetindo este procedimento n vezes temos que f� (n) (w) = n! 2�i I C f (z) (z � w)n+1 dz ; esta é a fórmula de Cauchy para as derivadas. Do resultado acima temos o importante: Theorem 46 Se fé uma função analítica numa região E � C; e C é uma curva simples (cujo percurso não se cruza) fechada em E, então para um ponto z0 dentro da curva C, a n-ésima derivada de f existe e é dada por f� (n) (z0) = n! 2�i I C f (z) (z � z0)n+1 dz : (32) 49 Este resultado garante que, se a função é analítica, além de ser diferenciável (como já sabíamos), ela pode ser in nitamente diferenciável. Lembrando que uma função f é analítica em z0 se, e somente se, existe uma vizinhança deste ponto onde a derivada de f existe em cada ponto desta vizinhança, temos que todas as derivadas também serão funções analíticas em E. Pois a derivada estará de nida para todos os pontos z0 dentro do contorno e f (n+1) existe em todos os pontos de E, então f (n) é analítica em E. A existência de todas estas derivadas garante que podemos expandir uma função analítica em série de Taylor (que é a de nição de funções analíticas para funções de variáveis reais). O resultado acima é mais uma diferença gritante entre funções reais diferenciáveis e funções complexas diferenciáveis. (Obviamente, se uma função real possui uma derivada de ordem n isso não garante a existência da derivada de ordem n+ 1 e, conseqüentemente, a função pode não ser expansível em série de Taylor.) Como corolário do teorema acima temos: Corollary 47 Se u : R2 �! R é uma função harmônica, então ela possui derivadas de todas as ordens, e cada uma destas derivadas também são funções harmônicas, pois se f = u + iv é analítica, e portanto contínua, segue que f 0 = @u @x + i @v @x = @u @y + i @v @y e, portanto as derivadas de u e v também são contínuas e assim sucessivamente para as demais derivadas. Existe também uma versão inversa do teorema de Cauchy-Goursat. Theorem 48 Se f = u+ iv é dada por funções u e v contínuas numa região e satisfaz a condiçãoI C f (z) dz = 0 ; para qualquer contorno fechado, então f é analítica nesta região. Este é o teorema de Morera. Os resultados acima são essenciais para o estudo de série de potências de funções analíticas. Assim, exemplos de aplicação destes resultados serão dados diretamente no desenvolvimento das seções seguintes. 5 Séries de Taylor A decomposição em série de funções possui uma in nidade de aplicações práticas, por exemplo, para se estimar o valor de certas funções (quando se pressiona o botão seno da calculadora o que ela faz é calcular a série do seno até uma certa ordem e assim em todos os cálculos numéricos). Para funções complexas, além desta aplicação prática, uma série de outras propriedades das funções (além do seu valor) podem ser obtidas pela sua expansão em série de potências. Para funções complexas, se f (z) é uma função in nitamente diferenciável num ponto z0, então (como no caso de funções reais) de nimos sua 50 série de Taylor em torno de um ponto z0 como 1X k=0 f (k) (z0) k! (z � z0)k onde f0 = f e 0! = 1! = 1. Observe que, para funções reais, em geral esta série não é igual a f . Por exemplo a função f (x) = ( 0, para x � 0 e101 exp �� 1x2 � , para x > 0 : Esta função é in nitamente diferenciável em qualquer ponto x e todas as derivadas são zero na origem. Assim, a série de Taylor desta função em torno da origem calculada no ponto 1 vale 0, o que, obviamente é bem diferente de f (1) = e101e�1 = e100. Além disso, uma série de Taylor pode não convergir. E do exemplo acima vemos que, mesmo que ela convirja, pode convergir para algo que não se relaciona com a nossa função. De forma geral, a questão da convergência desta série é um ponto bastante intrincado. Entretanto, como veremos, esta questão se torna muito mais simples quando nos restringimos apenas a funções analíticas. Se f (z) é uma função analítica numa região E interior a um círculo C0 centrado em z0, para qualquer ponto em z 2 E podemos usar a formula integral de Cauchy (31) para escrever f (z) = 1 2�i I C1 f (z0) z0 � z dz 0 onde C1 é um caminho fechado interior a E que tomaremos como um círculo de raio r1. Vamos tomar C1 dentro de E de sorte que possamos traçar um novo circulo C0 maior que C1. 51 Observe agora que 1 z0 � z = 1 (z0 � z0)� (z � z0) = 1 (z0 � z0) 1 1� z�z0z0�z0 (33) mas para qualquer � complexo com � 6= 1 temos 1 1� � = 1 + �+ � 2 + :::+ �n�1 + �n 1� � Para ver isso, multiplique ambos os lados por (1� �) 1 = (1� �) �1 + �+ �2 + :::+ �n�1�+ �n = � 1 + �+ �2 + :::+ �n�1 �� ��+ �2 + :::+ �n�1 + �n�+ �n = 1� �n + �n Assim, podemos escrever (33) como 1 z0 � z = 1 z0 � z0 " 1 + z � z0 z0 � z0 + :::+ � z � z0 z0 � z0 �n�1 + 1 1� z�z0z0�z0 � z � z0 z0 � z0 �n# multiplicando por f (z0) temos f (z0) z0 � z = f (z0) z � z0 + f (z0) (z0 � z0)2 (z � z0) + :::+ f (z 0) (z0 � z0)n (z � z0) n�1 + f (z0) (z0 � z0) (z0 � z0)n 1 1� z�z0z0�z0 (z � z0)n = f (z0) z � z0 + f (z0) (z0 � z0)2 (z � z0) + :::+ f (z 0) (z0 � z0)n (z � z0) n�1 + f (z0) (z0 � z0)n 1 (z0 � z) (z � z0) n Dividindo cada termo por 2�i e integrando ao longo de C1 temos 1 2�i I C1 f (z0) z0 � z dz 0 = 1 2�i I C1 f (z0) z � z0 dz 0 + 1 2�i I C1 f (z0) (z0 � z0)2 (z � z0) dz0 + +:::+ 1 2�i I C1 f (z0) (z0 � z) (z0 � z0)n (z � z0) n dz0 (34) Usando agora a fórmula de Cauchy para a derivada (32) temos que 1 2�i I C1 f (z0) (z � z0)k+1 dz0 = 1 k! f (k) (z0) 52 Podemos então escrever (34) como f (z) = f (z0) + f 0 (z0) (z � z0) + :::+ f (n�1) (z0) (n� 1)! (z � z0) n�1 +Rn (35) onde Rn = (z � z0)n 2�i I C1 f (z0) (z0 � z) (z0 � z0)n dz 0 : Vamos chamar de r1 o raio da nossa curva C1. Pegando agora um ponto z dentro da curva C1 e um ponto z0 na curva C1, i.e., jz0 � z0j = r1 e jz � z0j = r < r1. Com isso temos jz0 � zj = j~r1 � ~rj � r1 � r (lembre que z0 é o caminho sobre o circulo C1 de raio r1). jRnj = jz � z0j n 2� ����I C1 f (z0) (z0 � z) (z0 � z0)n dz 0 ���� = rn 2� ����I C1 f (z0) (z0 � z) (z0 � z0)n dz 0 ���� � r n 2� I C1 jf (z0)j jz0 � zj jz0 � z0jn jdz 0j = rn 2� Z 2� 0 jf (z0)j j~r1 � ~rj (r1)n r1d� = rn 2� r1 (r1) n Z 2� 0 jf (z0)j j~r1 � ~rj d� (lembre-se que a integral de é uma soma de vetores que é sempre menor que a soma dos módulos). Lembrando que jz0 � zj = j~r1 � ~rj � r1 � r temos Z 2� 0 jf (z0)j j~r1 � ~rj d� � Z 2� 0 jf (z0)j r1 � r d� = 1 r1 � r Z 2� 0 jf (z0 (�))j d� Voltando na expressão de jRnj temos jRnj � r n 2� r1 (r1) n 1 r1 � r Z 2� 0 jf (z0 (�))j d� Agora, se M = max (jf (z0)j) ; z0 2 E ou seja, M é o valor máximo do módulo de f (jf (z0)j � M ; z0 2 E), este valor existe porque f é analítica em E. 53 Podemos escrever Z 2� 0 jf (z0 (�))j d� � Z 2� 0 M d� =M Z 2� 0 d� = 2�M Com isso temos jRnj � r n 2� r1 rn1 2�M (r1 � r) = r1M r1 � r � r r1 �n ; Mas como r r1 < 1 temos lim n!1Rn = 0 : (lembre-se que se uma seqüência converge em módulo ela converge). Assim, quando n tende a in nito o limite da soma dos n termos do segundo membro da igualdade (35) converge e podemos escrever f (z) = f (z0) + 1X n=1 an (z � z0)n ; an = f (n) (z) n! ���� z=z0 Lembrando agora que o circulo C1 que traçamos é um circulo qualquer dentro do circulo maior C0, temos como resultado que: quando f é analítica no interior do circulo C0 a convergência da sua série de Taylor está garantida. De outra forma, a convergência da série de Taylor em torno de um ponto z0 de uma função analítica está garantida até o primeiro ponto de singularidade da função (i.e., onde a função deixa de ser analítica).
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