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O PODER-DEVER DA FISCALIZAÇÃO TRIBUTÁRIA E OS DIREITOS E GARANTIAS INDIVIDUAIS

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UNIVERSIDADE DO SUL DE SANTA CATARINA 
EDUARDO AVERBECK 
 
 
 
 
 
 
 
 
O PODER-DEVER DA FISCALIZAÇÃO TRIBUTÁRIA E 
OS DIREITOS E GARANTIAS INDIVIDUAIS 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Palhoça 
2018 
 
 
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EDUARDO AVERBECK 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
O PODER-DEVER DA FISCALIZAÇÃO TRIBUTÁRIA E 
OS DIREITOS E GARANTIAS INDIVIDUAIS 
 
 
 
 
 
 
Monografia apresentada ao Curso de 
Direito da Universidade do Sul de Santa 
Catarina, como requisito parcial para a 
obtenção do título de Bacharel em Direito. 
 
 
Orientador: Prof. Nélio Herzmann Junior 
 
 
 
Palhoça 
2018 
 
 
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EDUARDO AVERBECK 
 
O PODER-DEVER DA FISCALIZAÇÃO TRIBUTÁRIA E 
OS DIREITOS E GARANTIAS INDIVIDUAIS 
 
 
Este Trabalho de Conclusão de Curso foi julgado 
adequado à obtenção do título de bacharel em 
Direito e aprovado em sua forma final pelo Curso 
de Direito da Universidade do Sul de Santa 
Catarina. 
 
 
Palhoça, 9 de julho de 2018. 
 
 
_________________________________________ 
Prof. e orientador Nélio Herzmann Junior 
Universidade do Sul de Santa Catarina 
 
 
_________________________________________ 
Prof. Nélio Herzmann 
Universidade do Sul de Santa Catarina 
 
 
_________________________________________ 
Prof. Joel Irineu Lohn 
Universidade do Sul de Santa Catarina 
 
 
3 
TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE 
 
O PODER-DEVER DA FISCALIZAÇÃO TRIBUTÁRIA E 
OS DIREITOS E GARANTIAS INDIVIDUAIS 
 
Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade 
pelo aporte ideológico e referencial conferido ao presente trabalho, isentando a 
Universidade do Sul de Santa Catarina, a Coordenação do Curso de Direito, a 
Banca Examinadora e o Orientador de todo e qualquer reflexo acerca desta 
monografia. 
Estou ciente de que poderei responder administrativa, civil e 
criminalmente em caso de plágio comprovado do trabalho monográfico. 
 
 
Palhoça, 9 de julho de 2018. 
 
 
 
EDUARDO AVERBECK 
 
 
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À minha família. 
 
 
5 
AGRADECIMENTOS 
 
À Universidade do Sul de Santa Catarina - Unisul, pela oportunidade de 
realizar о curso, e ao Prof. Nélio Herzmann Junior, pelo apoio na elaboração deste 
trabalho. 
 
 
6 
RESUMO 
 
A presente monografia tem por objetivo analisar a atividade de fiscalização realizada 
pelos agentes fiscais da Administração Tributária de modo a satisfazer o interesse 
público e respeitar os direitos e garantias fundamentais individuais assegurados pela 
Constituição Federal de 1988. Foram apresentados os conceitos relacionados ao 
Estado Democrático de Direito, assim como os direitos e garantias individuais 
pertinentes ao tema, como da inviolabilidade domiciliar, da intimidade e da vida 
privada, do sigilo da correspondência e dos dados, os quais representam 
importantes limites à atuação do Estado. De outro lado, foi demonstrado que o 
objetivo principal do Estado é o bem comum e que, para isso, a legislação prevê 
uma série de prerrogativas para a atuação da Administração Pública frente ao 
particular. Foram analisados a legislação específica sobre o tema fiscalização 
tributária, inclusive na esfera estadual, bem como o entendimento doutrinário e 
jurisprudencial sobre a possibilidade de entrada e coleta de dados dos agentes do 
Fisco no domicílio empresarial. Por fim, foi possível concluir que os direitos e 
garantias fundamentais não são absolutos, devendo sua aplicação ocorrer de 
maneira harmoniosa com toda a legislação para que assim não sirvam de escudo 
para a prática de ilícitos fiscais. 
 
Palavras chave: Fiscalização tributária. Direitos e garantias fundamentais. 
Inviolabilidade domiciliar. Sigilo de dados. 
 
 
7 
LISTA DE SIGLAS 
 
CRFB/88 - Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 
CTN - Código Tributário Nacional 
ICMS - Imposto sobre operações relativas à circulação de mercadorias e sobre 
prestações de serviços de transporte interestadual, intermunicipal e de 
comunicação 
RICMS-SC - Regulamento do Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de 
Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte 
Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação do Estado de Santa 
Catarina 
STF - Supremo Tribunal Federal 
 
 
8 
SUMÁRIO 
 
1 INTRODUÇÃO 09 
2 ESTADO E OS DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS 11 
2.1 ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO 11 
2.2. DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS 12 
3 ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA 15 
3.1 PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA 16 
3.1.1 Princípio da Legalidade 17 
3.1.2 Princípio da Supremacia do Interesse Público 18 
3.1.3 Princípio da Proporcionalidade 20 
3.1.4 Princípio da Eficiência 22 
3.2 PODERES ADMINISTRATIVOS 23 
3.2.1 Poder de Polícia 24 
4 ADMINISTRAÇÃO TRIBUTÁRIA 29 
4.1 FISCALIZAÇÃO TRIBUTÁRIA 30 
4.1.1 Fiscalização Tributária e o Domicílio 34 
4.1.2 Fiscalização Tributária e o Sigilo de Dados 43 
5 CONCLUSÃO 52 
REFERÊNCIAS 53 
 
 
9 
1 INTRODUÇÃO 
 
O Estado necessita de recursos para manter sua estrutura organizacional 
e desenvolver políticas públicas. Maiores investimentos em saúde, educação e 
segurança são exigências crescentes na sociedade contemporânea e, para tanto, 
faz-se necessária a contribuição de seus cidadãos. Ou seja, aliado ao direito de 
exigir benefícios do Estado está o dever de contribuir com o seu custeio. E nesse 
cenário ganha importância a Administração Tributária, entidade responsável pela 
arrecadação das contribuições obrigatórias chamadas tributos. 
Para garantir que cada contribuinte cumpra com suas obrigações, as 
autoridades fiscais possuem prerrogativas outorgadas pela legislação tributária para 
o combate à sonegação fiscal. É o poder de fiscalizar, instrumento essencial para 
garantir a prevalência do interesse público como manifestação da vontade geral. 
Entretanto, para efetivar a cobrança dos tributos, não pode o Estado 
valer-se de práticas autoritárias ou arbitrárias, ferindo direitos e garantias 
fundamentais do contribuinte. A observância desses direitos e garantias é 
indiscutível nos diversos ramos do direito, especialmente no Direito Tributário. 
A Administração Tributária, ao investigar o contribuinte com o fim de 
apurar possíveis ilícitos fiscais, poderá ter sua atuação considerada colidente com 
determinados direitos individuais, principalmente da inviolabilidade à privacidade, à 
intimidade, ao domicílio e ao sigilo de dados. Verificar de que forma deve o Estado 
exercer a atividade fiscalizatória na esfera tributária de modo a satisfazer o interesse 
público e respeitar os direitos e garantias fundamentais individuais é o objetivo geral 
desta monografia. 
O tema em questão ganha importância diante dos inúmeros conflitos 
existentes entre Fisco e contribuintes, além da jurisprudência pouco consolidada em 
relação ao tema. A percepção da sociedade é de que a sonegação fiscal no país 
ainda é alta, o que gera, ao lado da corrupção, sérios prejuízos aos cofres públicos e 
à livre concorrência. 
Sonegadores buscam diversas formas de escapar da atividade 
fiscalizatória, seja impedindo o acesso da autoridade ao estabelecimento, ocultando 
dados que comprovem vendas sem documento fiscal ou intimidando as autoridades 
mediante acusação de abuso
de poder. Verificar quais os limites da atuação da 
 
 
10 
autoridade fiscal bem como os direitos e deveres do contribuinte são fundamentais 
para o exercício da fiscalização tributária. Os tributos são essenciais para a 
existência do Estado. Garantir que cada pessoa, física ou jurídica, contribua com o 
que é legalmente devido é imprescindível na busca de uma sociedade mais justa e 
solidária. 
A presente monografia apresenta inicialmente uma introdução sobre o 
Estado Democrático de Direito e sobre os Direitos e Garantias Fundamentais 
assegurados pela Constituição Federal de 1988, os quais visam proteger o cidadão 
perante o poder estatal. 
O capítulo seguinte trata das prerrogativas da Administração Pública e 
seus princípios, sendo analisados quatro princípios considerados mais relevantes no 
contexto da fiscalização: legalidade, supremacia do interesse público, 
proporcionalidade e eficiência. Também é tratado o poder de polícia e seus 
atributos: discricionariedade, autoexecutoriedade e coercibilidade. 
O quarto capítulo apresenta a doutrina e a legislação a respeito da 
Administração Tributária e seu poder de fiscalização, inclusive no âmbito do Estado 
de Santa Catarina, dispondo sobre a jurisprudência acerca da relação fisco-
contribuinte especialmente no tocante à inviolabilidade do domicílio e ao sigilo de 
dados. 
O método de abordagem utilizado foi o dedutivo e a técnica de pesquisa a 
bibliográfica, fundamentada na Constituição Federal, legislação, doutrina e 
jurisprudência. Em relação ao procedimento, utilizou-se o método comparativo, o 
que possibilitou a análise de princípios constitucionais e tributários que guardam 
íntima relação com o tema; e o monográfico, tendo em vista a necessidade de se 
analisar o tema sob diferentes aspectos. 
 
 
11 
2 ESTADO E OS DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS 
 
2.1 ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO 
 
A Constituição da República Federativa do Brasil, lei máxima do país, 
promulgada em 5 de outubro de 1988, estabelece expressamente em seu artigo 1º 
que “a República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados 
e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito”. 
(BRASIL, 1988). 
O Estado de Direito caracteriza-se pela máxima segundo o qual todos os 
indivíduos, incluindo os governantes, devem se submeter ao império da lei. É a lei 
que estabelece e tutela os direitos e garantias fundamentais que devem ser 
respeitados pelo Estado na busca pela consecução de seus fins. 
Acerca do Estado de Direito, José Joaquim Gomes Canotilho assim o 
conceitua: 
 
Estado de direito é um Estado ou uma forma de organização político-estatal 
cuja atividade é determinada e limitada pelo direito. ‘Estado de não direito’ 
será, pelo contrário, aquele em que o poder político se proclama 
desvinculado de limites jurídicos e não reconhece aos indivíduos uma 
esfera de liberdade ante o poder protegida pelo direito. (CANOTILHO, 1999, 
p. 11). 
 
Em relação ao Estado Democrático de Direito, caracteriza-se como um 
Estado de Direito aliado ao regime democrático, que nada mais é do que um 
conjunto de princípios estruturantes. Nas palavras de Paulo Roberto de Figueiredo 
Dantas, o Estado Democrático de Direito representa a: 
 
Conjugação do Estado de Direito com o regime democrático. Trata-se, 
portanto, do Estado submetido ao império da lei, ou seja, a um conjunto de 
normas que criam seus órgãos e estabelecem suas competências, que 
preveem a separação dos poderes, e que também fixam direitos e garantias 
fundamentais para a proteção do indivíduo contra eventuais arbitrariedades 
estatais, e no qual também se garante o respeito à denominada soberania 
popular, permitindo que o povo (o titular do poder) participe da decisões 
políticas do Estado, seja por meio de representantes eleitos, seja por meio 
de mecanismos de democracia direta. (DANTAS, 2014, p. 65-66). 
 
 
 
12 
O Estado Democrático de Direito configura-se como resultado de um 
longo processo de evolução da sociedade na busca de uma maior participação 
popular nas decisões do Estado. Seja na esfera municipal, estadual ou federal, ao 
fazer uso de suas competências, os representantes do Estado estão submetidos ao 
império da lei, sendo obrigados a reconhecer e respeitar todos os direitos e 
garantias fundamentais incorporados à ordem constitucional. 
 
2.2 DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS 
 
Os direitos fundamentais, também conhecidos como direitos individuais, 
direitos do homem, direitos subjetivos públicos ou liberdades fundamentais, surgiram 
a partir dos ideais advindos do Iluminismo dos séculos XVII e XVIII com a 
necessidade de proteger o homem do poder estatal. A evolução do direito e a 
influência dos problemas sociais contribuíram nas conquistas dos movimentos do 
século XVIII. 
José Afonso da Silva (2001, p. 178) informa que os direitos fundamentais 
“não são a contraposição dos cidadãos administrados à atividade pública, como uma 
limitação ao Estado, mas sim uma limitação imposta pela soberania popular aos 
poderes constituídos do Estado que dele dependem”. 
Acerca dos direitos fundamentais, Alexandre de Moraes os define como: 
 
O conjunto institucionalizado de direitos e garantias do ser humano que tem 
por finalidade básica o respeito a sua dignidade, por meio de sua proteção 
contra o arbítrio do poder estatal, e o estabelecimento de condições 
mínimas de vida e desenvolvimento da personalidade humana pode ser 
definido como direitos humanos fundamentais. (MORAES, 2006, p. 21). 
 
Os direitos fundamentais têm a função não apenas de proteger o homem 
de eventuais abusos do Estado, mas também se prestam a compelir o Poder Público 
a tomar medidas de melhorias à condição humana e ao convívio social. 
No entendimento de Ingo Wolfgang Sarlet: 
 
Os direitos fundamentais, como resultado da personalização e positivação 
constitucional de determinados valores básicos (daí seu conteúdo 
axiológico), integram, ao lado dos princípios estruturais e organizacionais (a 
 
 
13 
assim denominada parte orgânica ou organizatória da Constituição), a 
substância propriamente dita, o núcleo substancial, formado pelas decisões 
fundamentais, da ordem normativa, revelando que mesmo num Estado 
constitucional democrático se tornam necessárias (necessidade que se fez 
sentir da forma mais contundente no período que sucedeu à Segunda 
Grande Guerra) certas vinculações de cunho material para fazer frente aos 
espectros da ditadura e do totalitarismo. (SARLET, 2005, p. 70). 
 
Os Direitos e Garantias Fundamentais na CRFB/88 são observados no 
Título II, classificados em individuais e coletivos, direitos sociais, de nacionalidade e 
políticos, como também em outros dispositivos dispersos na Carta Maior nos quais 
se verifique características de historicidade, universalidade, limitabilidade, 
concorrência e irrenunciabilidade. Representam cláusulas pétreas, conforme 
preceitua o artigo 60, §4º, IV da CRFB/88. 
A doutrina costuma classificar os direitos fundamentais em gerações. Os 
de primeira geração representam os direitos individuais, de defesa do cidadão contra 
a indevida atuação estatal, tais como os direitos à vida, à liberdade, à propriedade e 
à igualdade perante a lei. Representam também os direitos políticos, tais como o 
direito de voto e a capacidade eleitoral passiva. Conforme ensina Ana Cláudia Silva 
Scalquette: 
 
Os direitos de primeira dimensão são os direitos de liberdade, pois são fruto 
do pensamento liberal burguês, de caráter fortemente individualista, 
aparecendo como uma esfera limitadora da atuação do Estado, isto é, 
demarcando uma zona
de não-intervenção do Estado nas liberdades do 
indivíduo. (SCALQUETTE, 2004, p. 34). 
 
Os direitos fundamentais de segunda geração são os direitos sociais, 
econômico e culturais, que, ao contrário dos direitos de primeira geração, exigem 
uma atuação positiva do Estado com o fim de satisfazer os interesses da 
coletividade. São exemplos a assistência social, a saúde, a educação e o trabalho. 
Já os de terceira geração representam os direitos de titularidade difusa, 
ligados à fraternidade e solidariedade, tais como o direito à paz, do consumidor, ao 
desenvolvimento econômico, à comunicação, ao meio ambiente saudável, direito à 
conservação e utilização do patrimônio histórico e cultura. Tem-se, por fim, os 
direitos de quarta geração, que consistem no direito à democracia, à informação e 
ao pluralismo. 
 
 
14 
Os direitos fundamentais não surgiram simultaneamente, mas sim em 
períodos distintos conforme a demanda de cada época, por isso a classificação em 
gerações. Há quem prefira o termo dimensões, uma vez que o surgimento de novas 
gerações não ocasionou a extinção das anteriores, sendo que atualmente todos 
coexistem. 
Os direitos fundamentais que assistem ao contribuinte e seus 
representantes são predominantemente os de primeira geração ou dimensão, ou 
seja, direitos que exigem a não-interferência do poder do Estado sobre as ações 
individuais, como a garantia da inviolabilidade de domicílio (art. 5º, XI da CRFB/88), 
da inviolabilidade da intimidade e da vida privada (art. 5º, X da CRFB/88) e do sigilo 
da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações 
telefônicas (art. 5º, XII da CRFB/88). 
Já a fiscalização tributária tem sua atuação pautada nos direitos 
fundamentais de segunda geração, uma vez que representam uma atuação positiva 
do Estado na busca do interesse coletivo. 
 
 
15 
3 ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA 
 
A palavra administração tem origem no latim “administratione”, que 
significa o exercício de direção, de gerência. A Administração Pública abrange o 
conjunto de atividades exercidas pelos agentes, pessoas jurídicas e órgãos 
instituídos pelo Estado que produzem serviços, bens e utilidades para a população. 
Sobre o conceito de Administração Pública, Maria Sylvia Zanella Di Pietro 
divide o conceito de Administração Pública em dois sentidos: 
 
Em sentido material ou objetivo, a Administração Pública pode ser 
definida como a atividade concreta e imediata que o Estado desenvolve, 
sob regime jurídico total ou parcialmente público, para a consecução dos 
interesses coletivos. [...] pode-se definir Administração Pública, em 
sentido subjetivo, como o conjunto de órgãos e de pessoas jurídicas 
aos quais a lei atribui o exercício da função administrativa do Estado. (DI 
PIETRO, 2017, p. 125-128, grifo nosso). 
 
Nesse âmbito, Hely Lopes Meirelles assim conceitua: 
 
Em sentido formal, é o conjunto de órgãos instituídos para consecução 
dos objetivos do Governo; em sentido material, é o conjunto das funções 
necessárias aos serviços públicos em geral; em acepção operacional, é 
o desempenho perene e sistemático, legal e técnico, dos serviços 
próprios do Estado ou por ele assumidos em benefício da coletividade. 
Numa visão global, a Administração é, pois, todo o aparelhamento do 
Estado preordenado à realização de serviços, visando à satisfação das 
necessidades coletivas. A Administração não pratica atos de governo; 
pratica, tão-somente, atos de execução, com maior ou menor autonomia 
funcional, segundo a competência do órgão e de seus agentes. São os 
chamados atos administrativos, que, por sua variedade e importância, 
merecem estudo em capítulo especial. (Meirelles, 2010, p.65-66). 
 
Os objetivos da Administração Pública podem ser resumidos em um único 
fim: o bem comum da coletividade. Todo agente público, ao ser investido na função 
ou no cargo, assume o compromisso de bem servir a coletividade, não havendo 
liberdade para procurar outro objetivo ou para renunciar a qualquer parcela dos 
poderes e prerrogativas a ele conferidos. Enquanto governo é atividade política e 
discricionária, administração é atividade vinculada à lei. 
 
 
 
16 
3.1 PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA 
 
Princípios representam os alicerces do ordenamento jurídico, informando 
o sistema independentemente de estarem positivados em norma legal. 
Marcelo Alexandrino assim define princípios: 
 
Os princípios são as ideias centrais de um sistema, estabelecendo suas 
diretrizes e conferindo a ele um sentido lógico, harmonioso e racional, o que 
possibilita uma adequada compreensão de seu modo de organizar-se. Os 
princípios determinam o alcance e o sentido das regras de um determinado 
ordenamento jurídico. (ALEXANDRINO, 2006, p. 117). 
 
A CRFB/88, em seu Capítulo VII - Da Administração Pública, 
especificamente no artigo 37, caput, estabelece como inerentes à Administração 
Pública de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos 
Municípios os princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e 
eficiência. São os chamados princípios constitucionais expressos ou explícitos. Há 
também os princípios constitucionais implícitos, dispersos pela CRFB/88, como os 
do devido processo legal (art. 5º, LIV e LV), economicidade (art. 70), motivação (art. 
93, X), entre outros. 
Além dos princípios constitucionais, existem outros expressos ou 
implícitos em leis infraconstitucionais, como na Lei Complementar n. 101/2000 (Lei 
de Responsabilidade Fiscal), Lei n. 8666/93 (Lei de Licitações e Contratos da 
Administração Pública), Lei n. 9784/99 (Lei que regula o processo administrativo no 
âmbito da Administração Pública Federal), entre outras. A Lei n. 9784/99 estabelece, 
por exemplo, em seu artigo 2º, que Administração Pública obedecerá aos princípios 
da legalidade, finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, 
ampla defesa, contraditório, segurança jurídica, interesse público e eficiência. 
Cabe ressaltar que não há hierarquia entre princípios explícitos e 
implícitos, e o fato de figurarem em texto constitucional ou legal não lhes retira o 
caráter de princípio. Nesse sentido foi o entendimento do Supremo Tribunal Federal 
ao analisar o princípio da moralidade administrativa: 
 
Poder-se-á dizer que apenas agora a Constituição Federal consagrou a 
moralidade como princípio de administração pública (art. 37 da CF). Isso 
 
 
17 
não é verdade. Os princípios podem estar ou não explicitados em normas. 
Normalmente, sequer constam de texto regrado. Defluem no todo do 
ordenamento jurídico. Encontram-se ínsitos, implícitos no sistema, 
permeando as diversas normas regedoras de determinada matéria. O só 
fato de um princípio não figurar no texto constitucional, não significa que 
nunca teve relevância de princípio. A circunstância de, no texto 
constitucional anterior, não figurar o princípio da moralidade não significa 
que o administrador poderia agir de forma imoral ou mesmo amoral. Como 
ensina Jesus Gonzales Perez “el hecho de su consagracion em uma norma 
legal no supone que com anterioridad no existiera, ni que por tal 
consagración legislativa haya perdido tal carácter” (El principio de buena fé 
em el derecho administrativo. Madri, 1983. p. 15). Os princípios gerais de 
direito existem por força própria, independentemente de figurarem em texto 
legislativo. E o fato de passarem a figurar em texto constitucional ou legal 
não lhes retira o caráter de princípio. O agente público não só tem que ser 
honesto e probo, mas tem que mostrar que possui tal qualidade. Como a 
mulher de César. (STF – 2ª T. Recurso Extraordinário nº
160.381 – SP, Rel. 
Min. Marco Aurélio, v.u.; RTJ 153/1.030). 
 
Dos princípios mencionados, quatro deles merecem destaque na presente 
monografia: legalidade, supremacia do interesse público (ou preponderância do 
interesse público), proporcionalidade e eficiência. 
 
3.1.1 Princípio da Legalidade 
 
O princípio da legalidade é um elemento basilar do Estado Democrático 
de Direito. Representa ao mesmo tempo um limite e uma garantia, pois ao mesmo 
tempo que é um limite para a atuação do Poder Público, uma vez que ele só pode 
atuar quando autorizado por lei, também é uma garantia para os administrados, os 
quais só têm a obrigação de cumprir o que estiver previsto em lei. 
Hely Lopes Meirelles assim define a legalidade, como princípio de 
administração: 
 
A legalidade, como princípio de administração (CF, art. 37, caput), significa 
que o administrador público está, em toda a sua atividade funcional, sujeito 
aos mandamentos da lei e às exigências do bem comum, e deles não se 
pode afastar ou desviar, sob pena de praticar ato inválido e expor-se a 
responsabilidade disciplinar, civil e criminal, conforme o caso. 
A eficácia de toda a atividade administrativa está condicionada ao 
atendimento da Lei e do Direito. […]. 
As leis administrativas são, normalmente, de ordem pública e seus preceitos 
não podem ser descumpridos, nem mesmo por acordo ou vontade conjunta 
 
 
18 
de seus aplicadores e destinatários, uma vez que contêm verdadeiros 
poderes-deveres, irrelegáveis pelos agentes públicos. (MEIRELLES, 2010, 
p. 89). 
 
Assim, os agentes da Administração Pública devem sempre atuar 
conforme a lei, a qual determina as tarefas dos Agentes Administrativos e impõe 
condições excludentes de escolhas pessoais e subjetivas. 
 
3.1.2 Princípio da Supremacia do Interesse Público 
 
Segundo o princípio da supremacia do interesse público, ou princípio da 
preponderância do interesse público, sempre que houver conflito entre um particular 
e um interesse público coletivo, este último deve prevalecer. Dessa maneira, os 
interesses privados encontram-se subordinados à atuação estatal. 
Para Celso Antônio Bandeira de Mello: 
 
A prevalência dos interesses da coletividade sobre os interesses dos 
particulares é pressuposto lógico de qualquer ordem social estável e 
justifica a existência de diversas prerrogativas em favor da Administração 
Pública, tais como a presunção de legitimidade e a imperatividade dos atos 
administrativos, os prazos processuais e prescricionais diferenciados, o 
poder de autotutela, a natureza unilateral da atividade estatal, entre outras. 
(MELLO, 1994, p. 20). 
 
Ao tratar de interesse público, Di Pietro preleciona que os interesses 
públicos têm supremacia sobre os individuais: 
 
Esse princípio está presente tanto no momento da elaboração da lei como 
no momento da sua execução em concreto pela Administração Pública. Ele 
inspira o legislador e vincula a autoridade administrativa em toda a sua 
atuação. [...] as normas de direito público, embora protejam reflexamente o 
interesse individual, têm o objetivo primordial de atender ao interesse 
público, ao bem-estar coletivo. Além disso, pode-se dizer que o direito 
público somente começou a se desenvolver quando, depois de superados o 
primado do Direito Civil (que durou muitos séculos) e o individualismo que 
tomou conta dos vários setores da ciência, inclusive a do Direito, substituiu-
se a ideia do homem como fim único do direito (própria do individualismo) 
pelo princípio que hoje serve de fundamento para todo o direito público e 
que vincula a Administração em todas as suas decisões: o de que os 
interesses públicos têm supremacia sobre os individuais. (DI PIETRO, 
2017, p. 135-136, grifo nosso). 
 
 
19 
 
Em sintonia com a defesa do princípio da supremacia do interesse público 
segue o entendimento do autor Hely Lopes Meirelles: 
 
Sempre que entrarem em conflito o direito do indivíduo e o interesse da 
comunidade, há de prevalecer este, uma vez que o objeto primacial da 
administração é o bem comum. As leis administrativas visam, geralmente, 
assegurar essa supremacia do Poder Públicos sobre os indivíduos, 
enquanto necessária à consecução dos fins da Administração. Ao aplicador 
da lei compete interpretá-la de modo a estabelecer o equilíbrio entre os 
privilégios estatais e os direitos individuais, sem perder de vista aquela 
garantia. (MEIRELLES, 2010, p. 50). 
 
De modo diverso, parte da doutrina defende que o princípio da 
supremacia do interesse público seria incompatível com o Estado Democrático de 
Direito, tendo em vista os direitos fundamentais adotados na Constituição Federal de 
1988, e que a harmonização da legislação não se coaduna com qualquer regra 
absoluta de prevalência. 
Por ser o interesse público um conceito jurídico determinado, sua 
aferição, segundo essa doutrina, só seria possível após juízos de ponderação entre 
direitos individuais e metas ou interesses coletivos, feitos à luz do caso concreto, 
uma vez que a preservação dos direitos individuais faz parte do próprio interesse 
público. Ao afirmar previamente a superioridade de um dos bens envolvidos sobre o 
outro, restaria eliminada qualquer possibilidade de balanceamento racional de 
interesses. 
Desta forma, o princípio da supremacia do interesse público guardaria 
resíduos de um modelo estatal absolutista, uma forma disfarçada de manter o poder 
absoluto nas mãos do Estado, estando o cidadão em patamar inferior nesta relação. 
Nesse âmbito, Gustavo Binenbojm ensina: 
 
Daí se propor que é o postulado da proporcionalidade que, na verdade, 
explica como se define o que é o interesse público, em cada caso. O 
problema teórico verdadeiro não é a prevalência, mas o conteúdo do que 
deve prevalecer. A preservação, na maior medida possível, dos direitos 
individuais constitui porção do próprio interesse público. São metas 
gerais da sociedade política, juridicamente estabelecidas, tanto viabilizar 
o funcionamento da Administração Pública, mediante instituição de 
prerrogativas materiais e processuais, como preservar e promover, da 
forma mais extensa quanto possível, os direitos dos particulares. Assim, 
 
 
20 
esse esforço de harmonização não se coaduna com qualquer regra 
absoluta de prevalência a priori dos papéis institucionais do Estado sobre 
os interesses individuais privados. (BINENBOJM, 2005, p. 40). 
 
Completa o autor: 
 
Veja-se que não se nega, de forma alguma, o conceito de interesse 
público, mas tão-somente a existência de um princípio da supremacia do 
interesse público. [...]. 
O melhor interesse público só pode ser obtido a partir de um 
procedimento racional que envolve a disciplina constitucional de 
interesses individuais e coletivos específicos, bem como um juízo de 
ponderação que permita a realização de todos eles na maior extensão 
possível. O instrumento deste raciocínio ponderativo é o postulado da 
proporcionalidade. (BINENBOJM, 2005, p. 40). 
 
Assim, segundo essa corrente, o interesse público não deve ser 
considerado de forma suprema e absoluta sobre os interesses individuais, mas sim 
embasado na ponderação, devendo o administrador público percorrer as etapas de 
adequação, necessidade e proporcionalidade para encontrar o ponto de equilíbrio 
entre direitos individuais e metas coletivas. Ou seja, deveria ser aplicado o princípio 
da proporcionalidade em substituição ao princípio da supremacia do interesse 
público. 
 
3.1.3 Princípio da Proporcionalidade 
 
O princípio da proporcionalidade consiste no dever de serem impostas 
sanções, obrigações ou restrições apenas nas medidas necessárias para
o 
atendimento ao interesse público. Tem por finalidade precípua equilibrar os direitos 
individuais com os anseios da sociedade, na busca do equilíbrio e da harmonia. 
Sobre o tema, Suzana de Toledo Barros explica que: 
 
Ainda assinalando mudança substanciais para dar especial proteção aos 
direitos fundamentais, a Constituição Federal de 1988, mantendo a garantia 
da eternidade (art. 60, § 4º, inciso IV) e o princípio da reserva legal (art. 5º, 
inciso II), ampliou o princípio da proteção judiciária (art. 5º, inciso XXXV) 
com a criação de instrumentos processuais tendentes a coibir a omissão 
legislativa, como o mandado de injunção (art. 5º, inciso LXXI) e a criação 
direta de inconstitucionalidade por omissão (art. 103, § 2º), explicitou a 
 
 
21 
garantia do devido processo legal para a restrição da liberdade ou da 
propriedade (art. 5º, inciso LIV). [...]. 
O Princípio da Proporcionalidade como uma das várias idéias jurídicas 
fundantes da Constituição, tem assento justamente aí, neste contexto 
normativo no qual estão introduzidos os direitos fundamentais e os 
mecanismos de respectiva proteção. Sua aparição se dá a titulo de 
garantia especial, traduzida na exigência de que toda a intervenção 
estatal nessa esfera se dê por necessidade, deforma adequada e na 
justa medida, objetivando a máxima eficácia e otimização dos vários 
direitos fundamentais concorrentes. (BARROS, 1996, p. 395, grifo 
nosso). 
 
Nesse mesmo sentido, de que as competências administrativas só podem 
ser validamente exercidas na extensão e intensidade proporcionais ao que 
realmente seja demandado para cumprimento da finalidade de interesse público, 
segue o entendimento de Celso Antônio Bandeira de Mello: 
 
Este princípio enuncia a ideia - singela, aliás, conquanto frequentemente 
desconsiderada - de que as competências administrativas só podem ser 
validamente exercidas na extensão e intensidade proporcionais ao que 
realmente seja demandado para cumprimento da finalidade de interesse 
público a que estão atreladas. Segue-se que os atos cujo conteúdo 
ultrapasse o necessário para alcançar o objetivo que justifique o uso da 
competência ficam maculados de ilegitimidade, porquanto desbordam do 
âmbito da competência; ou seja, superam os limites que naquele caso lhes 
corresponderiam. Sobremodo quando a Administração restringe situação 
jurídica dos administrados além do que caberia, por imprimir às medidas 
tomadas uma intensidade ou extensão supérfluas, prescindendas, ressalta 
a ilegalidade de sua conduta. É que ninguém deve estar obrigado a suportar 
constrições em sua liberdade ou propriedade que não sejam indispensáveis 
à satisfação do interesse público. Logo, o plus, o excesso acaso existente, 
não milita em benefício de ninguém. Representa, portanto, apenas um 
agravo inútil aos direitos de cada qual. Percebe-se, então, que as medidas 
desproporcionais ao resultado legitimamente almejável são, desde logo, 
condutas ilógicas, incongruentes. (MELLO, 2008, p. 108-122). 
 
A doutrina costuma citar três subprincípios (ou elementos) formadores do 
princípio da proporcionalidade: a necessidade, a adequação e a proporcionalidade 
em sentido estrito. A necessidade refere-se a forma menos lesiva capaz de preparar 
o fim proposto pela regra em discussão; o ato administrativo utilizado deve ser, de 
todos os meios existentes, o menos restritivo aos direitos individuais. Já na 
adequação, o ato administrativo deve ser efetivamente capaz de atingir os objetivos 
pretendidos; o meio é adequado se, com sua utilização, o evento pretendido pode 
 
 
22 
ser alcançado. Em relação à proporcionalidade em sentido estrito, refere-se à 
proporção adequada que deve haver entre os meios utilizados e os fins pretendidos. 
A proporcionalidade também é utilizada como uma forma de ponderação 
entre dois ou mais princípios constitucionais que estejam em conflito, determinando, 
em cada caso, qual deve prevalecer sobre o outro. 
 
3.1.4 Princípio da Eficiência 
 
O princípio da eficiência foi inserido na CFRB/88 pela Emenda 
Constitucional n. 19/1998. Tal princípio impõe à Administração Pública a obrigação 
de realizar suas atribuições com rapidez, qualidade, economicidade e rendimento, 
privilegiando a eficiência em detrimento de concepções puramente formalísticas. 
Sobre o conceito do princípio da eficiência, Alexandre de Moraes informa 
que: 
 
[...] princípio da eficiência é o que impõe à administração pública direta e 
indireta e a seus agentes a persecução do bem comum, por meio do 
exercício de suas competências de forma imparcial, neutra, transparente, 
participativa, eficaz, sem burocracia e sempre em busca da qualidade, 
rimando pela adoção dos critérios legais e morais necessários para melhor 
utilização possível dos recursos públicos, de maneira a evitarem-se 
desperdícios e garantir-se maior rentabilidade social. (MORAES, 1999, 
p.30). 
 
O objetivo da eficiência é fazer com que os serviços públicos possam ser 
oferecidos com total atenção ao interesse público, a fim de se evitar desperdícios de 
tempo e de dinheiro. Sobre o princípio, explica Meirelles: 
 
O princípio da eficiência exige que a atividade administrativa seja exercida 
com presteza, perfeição e rendimento funcional. É o mais moderno princípio 
da função administrativa, que já não se contenta em ser desempenhada 
apenas com legalidade, exigindo resultados positivos para o serviço público 
e satisfatório atendimento das necessidades da comunidade e seus 
membros. (MEIRELLES, 2010, p. 98). 
 
No mesmo sentido é o entendimento de Marcelo Alexandrino, ao afirmar 
que a eficiência tem como corolário a boa qualidade e que a partir da positivação 
 
 
23 
desse princípio a sociedade passou a dispor de base jurídica expressa para exigir a 
efetividade do exercício de direitos fundamentais de segunda geração: 
 
A ideia de eficiência aproxima-se da de economicidade. Visa-se a atingir 
objetivos traduzidos por boa prestação de serviços, do modo mais simples, 
mais rápido, e mais econômico, melhorando a relação custo/benefício do 
trabalho da Administração. O administrador deve sempre procurar a solução 
que mais bem atenda ao interesse público, o qual deve tutelar. 
A positivação deste princípio permite afirmarmos parcialmente superada a 
doutrina anteriormente perfilhada por nossos tribunais, segundo a qual, 
relativamente aos atos discricionários, não se admitia perquirição judicial 
sobre a conveniência, oportunidade, eficiência ou justiça do ato, cabendo 
somente a análise quanto à sua legalidade. Ao menos no que se refere à 
eficiência, este entendimento não mais é defensável. 
Eficiência tem como corolário a boa qualidade. A partir da positivação deste 
princípio como norte da atividade administrativa, a sociedade passa a dispor 
de base jurídica expressa para cobrar a efetividade do exercício de direitos 
sociais como a educação, a saúde e outros, os quais têm que ser 
garantidos pelo Estado com qualidade ao menos satisfatória. Pelo mesmo 
motivo, o cidadão passa a ter o direito de questionar a qualidade das obras 
e atividades públicas, exercidas diretamente pelo Estado ou por seus 
delegatários. (ALEXANDRINO, 2006, p. 123-124). 
 
3.2 PODERES ADMINISTRATIVOS 
 
Para que possa exercer suas atividades e satisfazer os interesses 
coletivos, à Administração Pública é conferida uma série de poderes que 
instrumentalizam a realização de tarefas, conhecidos como poderes administrativos, 
os quais são inerentes ao exercício da atividade administrativa da União, dos 
Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. São, na verdade, poderes-deveres, 
pois a Administração não apenas
pode como tem a obrigação de exercê-los. 
Segundo Dirley da Cunha Júnior: 
 
Os poderes administrativos são os meios ou instrumentos jurídicos através 
dos quais os sujeitos da Administração Pública (as entidades 
administrativas, os órgãos e os agentes públicos) exercem a atividade 
administrativa na gestão dos interesses coletivos. São verdadeiros 
instrumentos de trabalho com os quais os agentes, órgãos e entidades 
desenvolvem as suas tarefas e cumprem os seus deveres funcionais. Por 
isso mesmo, são chamados poderes instrumentais, consentâneos e 
proporcionais aos encargos e deveres que lhe são conferidos. 
Os poderes administrativos são atividades jurídicas inerentes à 
Administração Pública e nascem com ela, sem os quais ela não conseguiria 
 
 
24 
fazer sobrepor a vontade da lei à vontade individual, o interesse público 
sobre o privado. (CUNHA JÚNIOR, 2015, p. 73). 
 
Os poderes administrativos são classificados em poder vinculado, poder 
discricionário, poder regulamentar, poder disciplinar, poder hierárquico e poder de 
polícia, este último tratado no tópico a seguir. 
 
3.2.1 Poder de Polícia 
 
Para a manutenção do bem comum, em algumas situações se faz 
necessária a restrição de certos direitos individuais. E o poder de polícia é o 
instrumento utilizado pelo Estado para prevenir que o mau exercício desses direitos 
individuais acabe por ameaçar a consecução do bem-estar coletivo. 
Meirelles assim conceitua o poder de polícia: 
 
Poder de Polícia é a faculdade de que dispõe a Administração Pública para 
condicionar e restringir o uso e gozo de bens, atividades e direitos 
individuais, em benefício da coletividade ou do próprio Estado. Em 
linguagem menos técnica, podemos dizer que o poder de polícia é o 
mecanismo de frenagem de que dispõe a Administração Pública para conter 
os abusos do direito individual. Por esse mecanismo, que faz parte de toda 
a Administração, o Estado detém a atividade dos particulares que se revelar 
contrária, nociva ou inconveniente ao bem-estar social, ao desenvolvimento 
e à segurança nacional. (MEIRELLES, 2010, p. 134). 
 
O artigo 78 do Código Tributário Nacional (CTN) traz a definição legal de 
poder de polícia (in verbis): 
 
Art. 78. Considera-se poder de polícia atividade da administração pública 
que, limitando ou disciplinando direito, interesse ou liberdade, regula a 
prática de ato ou abstenção de fato, em razão de interesse público 
concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos costumes, à disciplina da 
produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas 
dependentes de concessão ou autorização do Poder Público, à 
tranquilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos direitos individuais 
ou coletivos. 
Parágrafo único. Considera-se regular o exercício do poder de polícia 
quando desempenhado pelo órgão competente nos limites da lei aplicável, 
com observância do processo legal e, tratando-se de atividade que a lei 
tenha como discricionária, sem abuso ou desvio de poder. 
 
 
 
25 
Logo, o poder de polícia busca equilibrar o interesse da sociedade com o 
exercício de direitos individuais, evitando que o exercício ilimitado do direito 
individual acabe por prejudicar a coletividade. Pode ser exercido tanto em caráter 
repressivo, quando repreende e pune a conduta individual lesiva, quanto em caráter 
preventivo, quando busca impedir que determinada conduta lesiva ocorra. Essa 
limitação de direitos de determinado indivíduo ocorre justamente pelo dever do 
Estado de agir para garantir, por exemplo, os direitos fundamentais de segunda 
geração. 
Sobre a razão e o fundamento do poder de polícia, Meirelles leciona que: 
 
A razão do poder de polícia é o interesse social, e o seu fundamento está 
na supremacia geral que o Estado exerce em seu território sobre todas as 
pessoas, bens e atividades; supremacia que se revela nos mandamentos 
constitucionais e nas normas de ordem pública, que a cada passo opõem 
condicionamentos e restrições aos direitos individuais em favor da 
coletividade, incumbindo ao Poder Público o seu policiamento 
administrativo. 
Sem muito pesquisar, deparamos na vigente Constituição da República 
claras limitações às liberdades pessoais (art. 153, § § 59 e 69); à 
manifestação do pensamento e à divulgação pela imprensa (art. 153, § 89); 
ao direito de propriedade (art. 153, § 22); ao exercício das profissões (art. 
153, § 23); ao direito de reunião (art. 153, § 27); aos direitos políticos (art. 
154); à liberdade de comércio (art. 160). Por igual, o Código Civil condiciona 
o exercício dos direitos individuais ao seu uso normal, proibindo o abuso 
(art. 160), e, no que concerne ao direito de construir, além de sua 
normalidade, condiciona-o ao respeito aos regulamentos administrativos e 
ao direito dos vizinhos (arts. 554, 572 e 578). (MEIRELLES, 1976, p.3). 
 
Em relação aos limites do poder de polícia, Meirelles afirma que é preciso 
um equilíbrio entre a fruição dos direitos de cada um e os coletivos, predominando 
uma ideia de relatividade dos direitos em favor do bem-comum: 
 
Os limites do poder de polícia administrativa são demarcados pelo interesse 
social em conciliação com os direitos fundamentais do indivíduo 
assegurados na Constituição da República (art. 153). Do absolutismo 
individual evoluímos para o relativismo social. Os estados democráticos 
como o nosso inspiram-se nos princípios de liberdade e nos ideais de 
solidariedade humana. Daí o equilíbrio a ser procurado entre a fruição dos 
direitos de cada um e os interesses da coletividade, em favor do bem-
comum. Em nossos dias predomina a idéia da relatividade dos direitos [...]. 
(MEIRELLES, 1976, p.5). 
 
 
 
26 
Nesse ponto, Cunha Júnior adverte que o poder de polícia, longe de ser 
uma mera faculdade, é um dever e uma atribuição da Administração Pública: 
 
Na verdade, o poder de polícia, longe de ser uma mera faculdade, é um 
dever e uma atribuição da Administração Pública, da qual ela não pode 
renunciar nem transigir. Importa salientar, ademais, que o poder de polícia 
não incide para restringir ou anular o direito em si, uma vez que nem 
Emenda Constitucional pode fazê-lo, segundo prevê o art. 60 § 4º, IV, da 
Constituição Federal, mas sim para condicionar o exercício do direito, 
quando o comportamento do administrado expõe a risco o interesse coletivo 
(CUNHA JÚNIOR, 2015, p. 84). 
 
O poder de polícia possui atributos específicos apontados pela doutrina: a 
discricionariedade, a autoexecutoriedade e a coercibilidade. 
A discricionariedade no exercício do poder de polícia significa, nas 
palavras de Alexandrino (2006, p. 150), que “a Administração, quanto aos atos a ele 
relacionados, regra geral, dispõe de uma razoável liberdade de atuação, podendo 
valorar a oportunidade e conveniência de sua prática, estabelecer o motivo e 
escolher, dentro dos limites legais, seu conteúdo”. A finalidade de todo ato de polícia 
é, entretanto, ato vinculado, pois sempre se traduz na proteção do interesse público. 
Sobre a discricionariedade, Meirelles ensina que o poder de polícia 
administrativa é discricionário, mas passará a ser vinculado se a norma legal 
estabelecer o modo e a forma de sua realização: 
 
Através de restrições impostas às atividades do indivíduo, que afetem a 
coletividade, cada cidadão cede parcelas mínimas de seus direitos à 
comunidade, e o Estado lhe retribui em segurança, ordem, higiene, 
sossego, moralidade e outros benefícios públicos, propiciadores do conforto 
individual e do bem-estar geral. Para efetivar essas restrições individuais 
em favor da coletividade, o Estado se utiliza desse poder discricionário, que
é o poder de polícia administrativa. [...]. 
Observe-se que o ato de polícia é, em princípio, discricionário, mas passará 
a ser vinculado se a norma legal que o rege estabelecer o modo e forma de 
sua realização. Neste caso, a autoridade só poderá praticá-lo validamente 
atendendo a todas as exigências da lei ou regulamento pertinentes. 
(MEIRELLES, 1976, p.6-7). 
 
Assim, discricionariedade é a liberdade de agir dentro dos limites legais, 
tendo sempre a finalidade da proteção ao interesse público, o que não se confunde 
com arbitrariedade. 
 
 
27 
Em relação à autoexecutoriedade, refere-se ao atributo que autoriza a 
Administração decidir ou executar atos administrativos sem a prévia autorização 
judicial. Com base em tal atributo, a Administração Pública impõe medidas e 
sanções de polícia administrativas de forma direta e imediata, sem a necessidade de 
uma ordem judicial. 
Na definição de Meirelles: 
 
A auto-executoriedade, ou seja, a faculdade de a Administração decidir e 
executar diretamente a sua decisão através do ato de polícia, sem 
intervenção do Judiciário, é outro atributo do poder de polícia. Com efeito, 
no uso desse poder, a Administração impõe diretamente as medidas ou 
sanções de polícia administrativa, necessárias à contenção da atividade 
anti-social, que ela visa obstar. Nem seria possível condicionar os atos de 
polícia à aprovação prévia de qualquer outro órgão ou poder estranho à 
Administração. Se o particular se sentir agravado em seus direitos, sim, 
poderá reclamar, pela via adequada, ao Judiciário, que intervirá 
oportunamente para a correção de eventual ilegalidade administrativa ou 
fixação da indenização que for cabível. O que o princípio da auto-
executoriedade autoriza é a prática do ato de polícia administrativa pela 
própria Administração, independentemente de mandado judicial. 
(MEIRELLES, 1976, p.7). 
 
O terceiro atributo do poder de polícia, a coercibilidade, significa que as 
medidas adotadas pela Administração podem ser impostas de maneira coativa ao 
administrado, ou seja, sua observância é obrigatória, podendo a Administração, no 
caso de resistência, valer-se da força pública para garantir o seu cumprimento. 
Nesse sentido é o ensinamento de Meirelles: 
 
A coercibilidade, isto é, a imposição coativa das medidas adotadas pela 
Administração, constitui também atributo do poder de polícia. Realmente, 
todo ato de polícia é imperativo (obrigatório para o seu destinatário), 
admitindo até o emprego da força pública para o seu cumprimento, quando 
resistido pelo administrado. Não há ato de polícia facultativo para o 
particular, pois todos eles admitem a coerção estatal para torná-lo efetivo, e 
essa coerção também in depende de autorização judicial. É a própria 
Administração que determina e faz executar as medidas de força que se 
tornarem necessárias para a execução do ato ou aplicação da penalidade 
administrativa resultante do exercício do poder de polícia. O atributo da 
coercibilidade do ato de polícia justifica o emprego da força física quando 
houver oposição do infrator, mas não legaliza a violência desnecessária ou 
desproporcional à resistência, que em tal caso pode caracterizar o excesso 
de poder e o abuso de autoridade nulificadores do ato praticado e 
 
 
28 
ensejadores das ações civis e criminais para reparação do dano e punição 
dos culpados (MEIRELLES, 1976, p.8). 
 
A coercibilidade dos atos de polícia também independe de prévia 
autorização judicial, uma vez que o poder de polícia só é autoexecutório porque 
dotado de força coercitiva. 
Entretanto, o ato de polícia praticado de forma desproporcional, sem 
amparo na lei ou sem utilidade pública será considerado nulo, ilícito, devendo ser 
assim declarado pela própria Administração (autotutela) ou pelo Poder Judiciário 
(controle judicial). Essa atuação ilegítima do agente é o abuso de poder, que decorre 
da ação fora dos limites de sua competência (excesso de poder) ou da ação com fim 
diverso do interesse público (desvio de poder), punível nas esferas administrativa, 
cível e penal. 
A fiscalização tributária, tratada no capítulo seguinte, é um exemplo do 
exercício do poder de polícia administrativa, exercido pelo Estado por meio da 
Administração Tributárias e seus agentes fazendários. 
 
 
29 
4 ADMINISTRAÇÃO TRIBUTÁRIA 
 
Após uma breve introdução acerca do Estado Democrático de Direito e 
dos Direito e Garantias Fundamentais, bem como dos princípios e poderes atinentes 
à Administração Pública, no presente capítulo será tratado, com base na doutrina, 
legislação e jurisprudência, o tema específico da Administração Tributária e sua 
atividade fiscalizatória. 
Entre as inúmeras atuações da Administração Pública está a de arrecadar 
tributos e fiscalizar sua cobrança. O Lei Complementar n. 5.172, de 25 de outubro de 
1966, denominado Código Tributário Nacional, dispõe sobre o Sistema Tributário 
Nacional e institui normas gerais de direito tributário aplicáveis à União, Estados e 
Municípios. Em seu artigo 3º, dispõe que “tributo é toda prestação pecuniária 
compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua 
sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa 
plenamente vinculada”. 
Acerca da Administração Tributária, Kiyoshi Harada ensina que: 
 
Esse ramo especializado da Administração Pública exerce atividade voltada 
para a fiscalização e arrecadação tributária, impulsionando procedimento 
que objetiva verificar o cumprimento das obrigações tributárias, praticando, 
quando for o caso, os atos tendentes a deflagrar a cobrança coativa e 
expedir as certidões comprobatórias da situação fiscal do sujeito passivo. 
(HARADA, 2002, p. 477). 
 
Administração Tributária no Brasil são pessoas jurídicas de direito público 
interno da Administração Direta, neste caso, da União, Estados, Distrito Federal e 
Municípios, que exercem atividade vinculada, sob regime de direito público, com o 
fim de lançar, arrecadar, fiscalizar e cobrar tributos. 
Em relação aos dispositivos previstos na Carta Magna, os artigos 145 a 
162 da CRFB/88 tratam do Sistema Tributário Nacional. O artigo 145, §1º, consagra 
o princípio da capacidade contributiva, dispondo que: 
 
Sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados 
segundo a capacidade econômica do contribuinte, facultado à administração 
tributária, especialmente para conferir efetividade a esses objetivos, 
identificar, respeitados os direitos individuais e nos termos da lei, o 
 
 
30 
patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte. 
(BRASIL, 1988). 
 
Já o artigo 150, II, da CRFB/88, consagra o chamado princípio da 
isonomia tributária, vedando a instituição de tratamento desigual entre contribuintes 
que se encontrem em situação equivalente. São princípios que buscam a igualdade 
material, na medida em que buscam tratar igualmente os iguais e desigualmente os 
desiguais. 
Em relação aos dispositivos constitucionais, importante mencionar 
também que, consoante artigo 37, XII, da CRFB/88, a administração fazendária e 
seus servidores fiscais terão, dentro de suas áreas de competência e jurisdição, 
precedência sobre os demais setores administrativos. A função pública de 
arrecadação dos tributos, tem, portanto, prevalência sobre a competência 
concorrente ou o interesse de outro órgão administrativo. 
A Administração Tributária é, portanto, responsável pela arrecadação 
tributária, atividade essencial ao funcionamento do Estado e de imensurável 
interesse público, consistindo não apenas um poder, mas principalmente um dever 
da autoridade fazendária.
4.1 FISCALIZAÇÃO TRIBUTÁRIA 
 
Fiscalizar significa investigar, apurar, esclarecer. A atividade de 
fiscalização tributária consiste na investigação que a autoridade fazendária exerce 
sobre o contribuinte com a finalidade de identificar se as obrigações tributárias foram 
devidamente cumpridas. 
José do Santos Carvalho Filho assim dispõe sobre a fiscalização e seu 
duplo aspecto: 
 
Não adiantaria deter o Estado o poder de impor restrições aos indivíduos se 
não dispusesse dos mecanismos necessários à fiscalização da conduta 
destes. Assim, o poder de polícia reclama do Poder Público a atuação de 
agentes fiscalizadores da conduta dos indivíduos. A fiscalização apresenta 
duplo aspecto: um preventivo, através do qual os agentes da Administração 
procuram impedir um dano social, e um repressivo, que, em face da 
transgressão da norma de polícia, redunda na aplicação de uma sanção. 
(CARVALHO FILHO, 1999, p. 53). 
 
 
31 
 
O princípio da legalidade, um dos principais pilares de sustentação do 
Estado Democrático de Direito, é aplicável e obrigatório à Administração Tributária 
no exercício da atividade fiscalizatória. Ao investigar os contribuintes, o Fisco deve 
seguir rigorosamente o disposto no ordenamento jurídico. 
O CTN dedica todo o seu Título IV para a Administração Tributária, sendo 
o Capítulo I, artigos 194 a 200, reservado à Fiscalização. Segundo o artigo 194, a 
legislação tributária, observado o disposto no CTN, regulará, em caráter geral, ou 
especificamente em função da natureza do tributo de que se tratar, a competência e 
os poderes das autoridades administrativas em matéria de fiscalização da sua 
aplicação. 
Já o artigo 195 representa importante dispositivo garantidor da atividade 
fiscalizatória, prevendo que para os efeitos da legislação tributária, não têm 
aplicação quaisquer disposições legais excludentes ou limitativas do direito de 
examinar mercadorias, livros, arquivos, documentos, papéis e efeitos comerciais ou 
fiscais, dos comerciantes industriais ou produtores, ou da obrigação destes de exibi-
los. 
O artigo 200 autoriza a autoridade administrativa tributária solicitar o 
auxílio da força pública federal, estadual ou municipal, e reciprocamente, quando 
vítimas de embaraço ou desacato no exercício de suas funções, ou quando 
necessário à efetivação dê medida prevista na legislação tributária, ainda que não se 
configure fato definido em lei como crime ou contravenção. 
As regras previstas no CTN garantem amplos poderes de investigação às 
autoridades fiscais, com acesso à diversos tipos de documentos, à obtenção de 
informações com terceiros sobre operações do contribuinte e, ainda, à requisição de 
força policial em caso de desacato ou embaraço. 
No âmbito da legislação estadual, em relação ao Estado de Santa 
Catarina, o decreto n. 2870, de 27 de agosto de 2001, aprovou o Regulamento do 
Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre 
Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de 
Comunicação do Estado de Santa Catarina - RICMS-SC. 
O RICMS-SC, juntamente com a Lei n. 10297/1996, dispõem sobre o 
ICMS, tributo na modalidade imposto, de competência estadual, instituído conforme 
 
 
32 
artigo 155, II, da CRFB/88. O Capítulo X do RICMS-SC é dedicado ao Controle e 
Fiscalização do Imposto, sendo que, conforme previsto em seu artigo 68, compete à 
Secretaria de Estado da Fazenda a supervisão, o controle da arrecadação e a 
fiscalização do imposto. 
O artigo 69 do RICMS-SC traz relevantes dispositivos acerca do poder de 
fiscalização: 
 
Art. 69. A fiscalização será exercida sobre todas as pessoas, naturais ou 
jurídicas, contribuintes ou não, que estiverem obrigadas ao cumprimento de 
disposições da legislação do imposto, mesmo as que gozarem de 
imunidade ou isenção. 
§ 2° As pessoas referidas no “caput” exibirão aos agentes do fisco, sempre 
que solicitado, as mercadorias, livros das escritas fiscal e comercial e todos 
os documentos, inclusive os relativos a sistema de processamento de dados 
e meios magnéticos, em uso ou já arquivados, que forem julgados 
necessários à fiscalização e lhes franquearão o acesso aos seus 
estabelecimentos, depósitos e dependências, bem como centrais ou 
equipamentos de processamento eletrônico de dados, veículos, cofres e 
outros móveis, em horário de funcionamento do estabelecimento. 
§ 3° Os agentes do fisco terão acesso às dependências internas do 
estabelecimento, mediante a apresentação de sua identidade funcional aos 
encarregados diretos presentes no local. 
 
Assim, conforme previsto no artigo 69 do RICMS-SC, fica autorizado aos 
agentes do fisco o acesso às dependências internas do estabelecimento, em horário 
de funcionamento, bastando apenas a apresentação da identidade funcional aos 
encarregados diretos presentes no local. O acesso deverá ser franqueado aos 
estabelecimentos, depósitos e dependências, bem como centrais ou equipamentos 
de processamento eletrônico de dados, veículos, cofres e outros móveis. As 
pessoas indicadas no caput do mencionado artigo deverão exibir aos agentes do 
fisco todos os documentos necessários à fiscalização, inclusive os relativos a 
sistema de processamento de dados e meios magnéticos. 
Em relação à apreensão de documentos, assim dispõe o artigo 71 do 
RICMS-SC: 
 
Art. 71. Os livros, documentos fiscais, outros papéis, equipamentos e meios 
magnéticos que constituam prova de infração à legislação tributária poderão 
ser apreendidos pelos agentes do fisco, mediante termo do qual se deixará 
cópia com o contribuinte. 
 
 
33 
Parágrafo único. A devolução da coisa apreendida somente será efetuada 
mediante apresentação de cópia autenticada da mesma e desde que isto 
não importe em prejuízo para a Fazenda Estadual. 
 
Assim, os agentes do fisco poderão apreender papéis, equipamentos e 
meios magnéticos que constituam prova de infração à legislação tributária, devendo 
ser lavrado termo do qual se deixará cópia com o contribuinte. 
A autorização dos agentes do fisco para requisitar auxílio da Força 
Pública também é prevista no art. 72 do RICMS-SC: 
 
Art. 72. Quando vítima de embaraço ou desacato no exercício de suas 
funções ou quando seja necessária a efetivação de medidas acauteladoras 
de interesse do fisco, ainda que não se configure fato definido em lei como 
crime ou contravenção, os agentes do fisco, diretamente ou por intermédio 
da Gerência Regional da Fazenda Estadual, poderão requisitar o auxílio da 
Força Pública Estadual. 
 
Além do RICMS-SC, no Estado de Santa Catarina está em vigor a Lei 
Complementar n. 313/2005, que instituiu o Código de Direitos e Deveres do 
Contribuinte do Estado de Santa Catarina. No artigo 28 do referido Código estão 
previstos os deveres do contribuinte: 
 
Art. 28. São obrigações do contribuinte: 
I - o tratamento, com respeito e urbanidade, aos funcionários da 
administração fazendária do Estado; 
II - a identificação do titular, sócio, diretor ou representante nas repartições 
administrativas e fazendárias e nas ações fiscais; 
III - o fornecimento de condições de segurança e local adequado, em seu 
estabelecimento, para a execução dos procedimentos de fiscalização; 
IV - a apuração, declaração e recolhimento do imposto devido, na forma 
prevista na legislação; 
V - a apresentação em ordem, quando solicitados, no prazo estabelecido na 
legislação, de bens, mercadorias, informações, livros, documentos, 
impressos, papéis, programas de computador ou arquivos eletrônicos; 
VI - a manutenção em ordem, pelo prazo previsto na legislação, de livros, 
documentos, impressos e registros eletrônicos relativos
ao imposto; 
VII - a manutenção junto à repartição fiscal de informações cadastrais 
atualizadas relativas ao estabelecimento, titular, sócios ou diretores; 
VIII - prestar informações por escrito às autoridades fiscais, sempre que 
solicitadas; e 
IX - atender às intimações e requisições efetuadas petas autoridades 
fiscais, relativas à apresentação de documentos, livros, mercadorias, 
informações, arquivos, papéis, ou comparecimento à repartição tributária. 
 
 
34 
 
Além dos deveres, a lei trata também dos direitos do contribuinte, 
previstos no artigo 16, sendo importante destacar o previsto no inciso XIII, que 
assegura ao contribuinte o direito de não ser obrigado a exibir documento que já se 
encontre, comprovadamente, em poder da administração pública, e o previsto no 
inciso XII, que garante a preservação do sigilo de seus negócios, documentos e 
operações, quando não envolvam os tributos objeto de fiscalização. 
O artigo 34 da Lei Complementar n. 313/2005 dispõe sobre a obrigação 
da Administração Tributária, no desempenho de suas funções, pautar sua atuação 
de forma a gerar o menor ônus possível aos contribuintes, tanto no procedimento e 
no processo administrativo, como no processo judicial. 
 
4.1.1 Fiscalização Tributária e o Domicílio 
 
A proteção constitucional ao domicílio encontra-se prevista no artigo 5º, 
XI, da CRFB/88, segundo o qual a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela 
podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito 
ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial. 
Apesar de frequentemente utilizado o termo “domicílio” como objeto da 
inviolabilidade, a Constituição Federal garante a inviolabilidade da “casa”. Com 
exceção da Constituição de 1937, todas as outras utilizaram a expressão “casa”, e 
não “domicílio”. 
Da mesma forma, o Código Penal (Decreto-Lei n. 2848/1940), ao tratar 
dos crimes contra a inviolabilidade do domicílio, utiliza o termo “casa”, conforme 
disposto no artigo 150, §4º: 
 
Art. 150 - Entrar ou permanecer, clandestina ou astuciosamente, ou contra a 
vontade expressa ou tácita de quem de direito, em casa alheia ou em suas 
dependências: 
Pena - detenção, de um a três meses, ou multa. 
[...] 
§ 4º - A expressão "casa" compreende: 
I - qualquer compartimento habitado; 
II - aposento ocupado de habitação coletiva; 
 
 
35 
III - compartimento não aberto ao público, onde alguém exerce profissão ou 
atividade. 
 
Segundo Nélson Hungria (1980, p. 207), o que se protege é “a casa de 
moradia, o home, o chez soi, a habitação particular, o local reservado à vida íntima 
do indivíduo ou à sua atividade privada, seja ou não coincidente com o domicílio 
civil”. 
Caio Mário da Silva Pereira esclarece que a noção de domicílio, objeto da 
garantia de inviolabilidade, surge da conjugação da morada habitual com o animus 
manendi: 
 
E da conjugação destes fatores, a morada habitual ou residência e o animus 
manendi, fez o legislador, repitamos, a noção de domicílio, compreendendo 
uma ideia simples e prática. É a aliança da residência e da intenção de tê-la 
como definitiva que autoriza a dizer que nem sempre a residência e o centro 
das atividades atuais compõem a ideia jurídica do domicílio: um estudante 
que passa um ano na Europa, recebendo ‘bolsa de estudos’, não tem ali 
seu domicílio, muito embora lá resida e faça o centro de suas atividades 
estudantis; um funcionário, enviado pelo serviço a que pertence a uma outra 
localidade para executar uma tarefa, ainda que por largo tempo, tem uma 
residência e dedica-se ao seu trabalho, mas nem por isso ali se domicilia. É 
que falta o animus manendi, incompatível com a temporariedade da missão. 
(PEREIRA, 2011, p. 312-313). 
 
Acerca do tema, o Supremo Tribunal Federal tem conferido interpretação 
bastante extensiva ao conceito de “casa”, incluindo nele qualquer compartimento 
privado onde alguém exerce profissão ou atividade, a exemplo do julgado 
parcialmente transcrito a seguir: 
 
A proteção constitucional ao domicílio emerge, com inquestionável nitidez, 
da regra inscrita no art. 5º, XI, da Carta Política, que proclama, em norma 
revestida do mais elevado grau de positividade jurídica, que "a casa é 
asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem 
consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, 
ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial". A 
Carta Federal, pois, em cláusula que tornou juridicamente mais intenso o 
coeficiente de tutela dessa particular esfera de liberdade individual, 
assegurou, em benefício de todos, a prerrogativa da inviolabilidade 
domiciliar. Sendo assim, ninguém, especialmente a autoridade pública, 
pode penetrar em casa alheia, exceto (a) nas hipóteses previstas no texto 
constitucional ou (b) com o consentimento de seu morador, que se 
qualifica, para efeito de ingresso de terceiros no recinto doméstico, como o 
único titular do respectivo direito de inclusão e de exclusão. Impõe-se 
 
 
36 
destacar, por necessário, que o conceito de "casa", para os fins da 
proteção jurídico-constitucional a que se refere o art. 5º, XI, da Lei 
Fundamental, reveste-se de caráter amplo, pois compreende, na 
abrangência de sua designação tutelar, (a) qualquer compartimento 
habitado, (b) qualquer aposento ocupado de habitação coletiva e (c) 
qualquer compartimento privado onde alguém exerce profissão ou 
atividade. Esse amplo sentido conceitual da noção jurídica de "casa" 
revela-se plenamente consentâneo com a exigência constitucional de 
proteção à esfera de liberdade individual e de privacidade pessoal. 
(SS 1203, Relator(a): Min. CELSO DE MELLO, julgado em 08/09/1997, publicado em 
DJ DATA-15-09-97 P-44222). 
 
Em relação à jurisprudência acerca da inviolabilidade do domicílio e a 
fiscalização tributária, o Supremo Tribunal Federal tem entendimento bastante 
polêmico sobre o tema: 
 
FISCALIZAÇÃO TRIBUTÁRIA - APREENSÃO DE LIVROS CONTÁBEIS E 
DOCUMENTOS FISCAIS REALIZADA, EM ESCRITÓRIO DE 
CONTABILIDADE, POR AGENTES FAZENDÁRIOS E POLICIAIS 
FEDERAIS, SEM MANDADO JUDICIAL - INADMISSIBILIDADE - ESPAÇO 
PRIVADO, NÃO ABERTO AO PÚBLICO, SUJEITO À PROTEÇÃO 
CONSTITUCIONAL DA INVIOLABILIDADE DOMICILIAR (CF, ART. 5º, XI)- 
SUBSUNÇÃO AO CONCEITO NORMATIVO DE "CASA" - NECESSIDADE 
DE ORDEM JUDICIAL - ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA E FISCALIZAÇÃO 
TRIBUTÁRIA - DEVER DE OBSERVÂNCIA, POR PARTE DE SEUS 
ÓRGÃOS E AGENTES, DOS LIMITES JURÍDICOS IMPOSTOS PELA 
CONSTITUIÇÃO E PELAS LEIS DA REPÚBLICA - IMPOSSIBILIDADE DE 
UTILIZAÇÃO, PELO MINISTÉRIO PÚBLICO, DE PROVA OBTIDA EM 
TRANSGRESSÃO À GARANTIA DA INVIOLABILIDADE DOMICILIAR - 
PROVA ILÍCITA - INIDONEIDADE JURÍDICA - "HABEAS CORPUS" 
DEFERIDO. 
ADMINISTRAÇÃO TRIBUTÁRIA - FISCALIZAÇÃO - PODERES - 
NECESSÁRIO RESPEITO AOS DIREITOS E GARANTIAS INDIVIDUAIS 
DOS CONTRIBUINTES E DE TERCEIROS. 
- Não são absolutos os poderes de que se acham investidos os órgãos 
e agentes da administração tributária, pois o Estado, em tema de 
tributação, inclusive em matéria de fiscalização tributária, está sujeito 
à observância de um complexo de direitos e prerrogativas que 
assistem, constitucionalmente, aos contribuintes e aos cidadãos em 
geral. Na realidade, os poderes do Estado encontram, nos direitos e 
garantias individuais, limites intransponíveis, cujo desrespeito pode 
caracterizar ilícito constitucional. 
- A administração tributária, por isso mesmo, embora podendo muito, não 
pode tudo. É que, ao Estado, é somente lícito atuar, "respeitados os direitos 
individuais e nos termos da lei" (CF, art. 145, § 1º), consideradas,
sobretudo, e para esse específico efeito, as limitações jurídicas decorrentes 
do próprio sistema instituído pela Lei Fundamental, cuja eficácia - que 
prepondera sobre todos os órgãos e agentes fazendários - restringe-lhes o 
 
 
37 
alcance do poder de que se acham investidos, especialmente quando 
exercido em face do contribuinte e dos cidadãos da República, que são 
titulares de garantias impregnadas de estatura constitucional e que, por tal 
razão, não podem ser transgredidas por aqueles que exercem a autoridade 
em nome do Estado. 
A GARANTIA DA INVIOLABILIDADE DOMICILIAR COMO LIMITAÇÃO 
CONSTITUCIONAL AO PODER DO ESTADO EM TEMA DE 
FISCALIZAÇÃO TRIBUTÁRIA - CONCEITO DE "CASA" PARA EFEITO DE 
PROTEÇÃO CONSTITUCIONAL - AMPLITUDE DESSA NOÇÃO 
CONCEITUAL, QUE TAMBÉM COMPREENDE OS ESPAÇOS PRIVADOS 
NÃO ABERTOS AO PÚBLICO, ONDE ALGUÉM EXERCE ATIVIDADE 
PROFISSIONAL: NECESSIDADE, EM TAL HIPÓTESE, DE MANDADO 
JUDICIAL (CF, ART. 5º, XI). 
- Para os fins da proteção jurídica a que se refere o art. 5º, XI, da 
Constituição da República, o conceito normativo de "casa" revela-se 
abrangente e, por estender-se a qualquer compartimento privado não aberto 
ao público, onde alguém exerce profissão ou atividade (CP, art. 150, § 4º, 
III), compreende, observada essa específica limitação espacial (área interna 
não acessível ao público), os escritórios profissionais, inclusive os de 
contabilidade, "embora sem conexão com a casa de moradia propriamente 
dita" (NELSON HUNGRIA). Doutrina. Precedentes. 
- Sem que ocorra qualquer das situações excepcionais taxativamente 
previstas no texto constitucional (art. 5º, XI), nenhum agente público, 
ainda que vinculado à administração tributária do Estado, poderá, 
contra a vontade de quem de direito ("invito domino"), ingressar, 
durante o dia, sem mandado judicial, em espaço privado não aberto ao 
público, onde alguém exerce sua atividade profissional, sob pena de a 
prova resultante da diligência de busca e apreensão assim executada 
reputar-se inadmissível, porque impregnada de ilicitude material. Doutrina. 
Precedentes específicos, em tema de fiscalização tributária, a propósito de 
escritórios de contabilidade (STF). 
- O atributo da auto-executoriedade dos atos administrativos, que 
traduz expressão concretizadora do "privilège du preálable", não 
prevalece sobre a garantia constitucional da inviolabilidade domiciliar, 
ainda que se cuide de atividade exercida pelo Poder Público em sede 
de fiscalização tributária. Doutrina. Precedentes. 
(STF - HC: 82788 RJ, Relator: CELSO DE MELLO, Data de Julgamento: 
12/04/2005, Segunda Turma, Data de Publicação: DJ 02-06-2006 PP-00043 
EMENT VOL-02235-01 PP-00179) 
 
Percebe-se do julgamento do Habeas Corpus n. 82.788 que, para o STF, 
o atributo da autoexecutoriedade dos atos administrativos não prevalece sobre a 
garantia constitucional da inviolabilidade domiciliar, de modo que nenhum agente 
público, ainda que vinculado à administração tributária do Estado, poderá, contra a 
vontade de quem de direito, ingressar em espaço privado não aberto ao público sem 
mandado judicial. 
 
 
38 
A prevalência da inviolabilidade do domicílio frente ao poder de polícia 
também é observada no julgamento do Habeas Corpus n. 79.512: 
 
Prova: alegação de ilicitude da obtida mediante apreensão de documentos 
por agentes fiscais, em escritórios de empresa - compreendidos no alcance 
da garantia constitucional da inviolabilidade do domicílio - e de 
contaminação das provas daquela derivadas: tese substancialmente 
correta, prejudicada no caso, entretanto, pela ausência de qualquer prova 
de resistência dos acusados ou de seus prepostos ao ingresso dos fiscais 
nas dependências da empresa ou sequer de protesto imediato contra a 
diligência. 
1. Conforme o art. 5º, XI, da Constituição - afora as exceções nele 
taxativamente previstas ("em caso de flagrante delito ou desastre, ou para 
prestar socorro") só a "determinação judicial" autoriza, e durante o dia, a 
entrada de alguém - autoridade ou não - no domicílio de outrem, sem o 
consentimento do morador. 
1.1. Em conseqüência, o poder fiscalizador da administração tributária 
perdeu, em favor do reforço da garantia constitucional do domicílio, a 
prerrogativa da auto-executoriedade. 
1.2. Daí não se extrai, de logo, a inconstitucionalidade superveniente ou a 
revogação dos preceitos infraconstitucionais de regimes precedentes que 
autorizam a agentes fiscais de tributos a proceder à busca domiciliar e à 
apreensão de papéis; essa legislação, contudo, que, sob a Carta 
precedente, continha em si a autorização à entrada forçada no domicílio do 
contribuinte, reduz-se, sob a Constituição vigente, a uma simples norma de 
competência para, uma vez no interior da dependência domiciliar, efetivar 
as diligências legalmente permitidas: o ingresso, porém, sempre que 
necessário vencer a oposição do morador, passou a depender de 
autorização judicial prévia. 
1.3. Mas, é um dado elementar da incidência da garantia constitucional do 
domicílio o não consentimento do morador ao questionado ingresso de 
terceiro: malgrado a ausência da autorização judicial, só a entrada invito 
domino a ofende, seja o dissenso presumido, tácito ou expresso, seja a 
penetração ou a indevida permanência, clandestina, astuciosa ou franca. 
1.4. Não supre ausência de prova da falta de autorização ao ingresso dos 
fiscais nas dependência da empresa o apelo à presunção de a tolerância à 
entrada ou à permanência dos agentes do Fisco ser fruto do metus publicae 
potestatis, ao menos nas circunstância do caso, em que não se trata das 
famigeradas "batidas" policiais no domicílio de indefesos favelados, nem 
sequer se demonstra a existência de protesto imediato. 
2. Objeção de princípio - em relação à qual houve reserva de Ministros do 
Tribunal - à tese aventada de que à garantia constitucional da 
inadmissibilidade da prova ilícita se possa opor, com o fim de dar-lhe 
prevalência em nome do princípio da proporcionalidade, o interesse público 
na eficácia da repressão penal em geral ou, em particular, na de 
determinados crimes: é que, aí, foi a Constituição mesma que ponderou os 
valores contrapostos e optou - em prejuízo, se necessário da eficácia da 
persecução criminal - pelos valores fundamentais, da dignidade humana, 
aos quais serve de salvaguarda a proscrição da prova ilícita: de qualquer 
sorte - salvo em casos extremos de necessidade inadiável e incontornável - 
 
 
39 
a ponderação de quaisquer interesses constitucionais oponíveis à 
inviolabilidade do domicílio não compete a posteriori ao juiz do processo em 
que se pretenda introduzir ou valorizar a prova obtida na invasão ilícita, mas 
sim àquele a quem incumbe autorizar previamente a diligência. 
(STF - HC: 79512 RJ, Relator: SEPÚLVEDA PERTENCE, Data de 
Julgamento: 16/12/1999, Tribunal Pleno, Data de Publicação: DJ 16-05-
2003 PP-00092 EMENT VOL-02110-02 PP-00308) 
 
A decisão do STF de estender a proteção destinada constitucionalmente 
à casa a qualquer compartimento privado onde alguém exerce profissão ou atividade 
merece reflexão. 
Conforme nos adverte Caramanos Júnior: 
 
Não foi sem razão que a Constituição protegeu a casa, e não o domicílio. A 
casa é espaço privado inviolável, reduto do indivíduo, ressalvadas as 
hipóteses previstas taxativamente pela Constituição, em que cede para 
preservar bens ou direitos de magnitude superior. 
Parece equivocado conferir a proteção destinada constitucionalmente à 
casa aos compartimentos não abertos ao público, onde alguém exerça 
profissão ou atividade, embora tal concepção tenha prestígio na 
Jurisprudência Nacional. (CARAMANOS JÚNIOR,

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