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57 Re vi sã o: N om e do r ev iso r - Di ag ra m aç ão : N om e do d ia gr am ad or - d at a ORIENTAÇÃO EM SUPERVISÃO ESCOLAR E ORIENTAÇÃO EDUCACIONAL Unidade III 7 ORIENTAÇÃO EDUCACIONAL E SUPERVISÃO ESCOLAR NA CONTEMPORANEIDADE 7.1 Orientação educacional: a prática cotidiana Para além da mera orientação vocacional e das obrigações da lei, hoje, o orientador educacional está, cada vez mais, consciente de seu papel profissional, trabalhando de forma interdisciplinar, com todos os elementos que fazem parte do processo educativo: alunos, professores, funcionários, pais ou responsáveis, demais técnicos e comunidade do entorno em que a escola está situada. Observação Interdisciplinaridade diz respeito à integração de todos os saberes/ disciplinas/atividades. Demanda do educador uma nova atitude diante da questão do conhecimento, sendo que a prática interdisciplinar necessita de humildade, coerência, espera, respeito e desapego. O orientador educacional deve comprometer-se com: 1. a realidade concreta dos alunos, percebendo-os como sujeitos de sua própria história e não como meros indivíduos que devem ser ajustados à sociedade; 2. a formação de cidadãos críticos, que possuem desejos e anseios; 3. uma prática educativa que é, ao mesmo tempo, coletiva e individual e que tem na diversidade de seus atores um campo fértil de aprendizado sobre os valores pessoais e sociais; 4. a discussão coletiva e efetivação do projeto político-pedagógico da escola, articulando-o às ações cotidianas. Os ramos de atuação do orientador educacional podem ser distribuídos em: a) Orientação escolar; b) Relação família-escola; c) Relação escola-comunidade d) Orientação em relação à saúde; 58 Unidade III Re vi sã o: N om e do r ev iso r - Di ag ra m aç ão : N om e do d ia gr am ad or - d at a e) Relações humanas; f) Orientação para o lazer; orientação vocacional e para o trabalho; h) Acompanhamento pós-escolar. Acompanhamento pós-escolar Relações humanas Vocacional e para o trabalho Lazer Relação família- escola Relação escola- comunidade Acompanhamento escolar Acompanhamento escolar e saúde Figura 14 O papel da orientação educacional pode, ainda, ultrapassar o âmbito da instituição escolar convencional, contribuindo com outros setores condizentes com a sua formação. Collares (2006) ressalta o papel de liderança e mediação exercido pela função e menciona a necessidade de atuação do orientador educacional em hospitais, empresas, ONGs, consultorias, escolas de informática ou línguas, academias, conselhos tutelares e penitenciárias, trabalhando na área de reabilitação profissional, relações interpessoais, recursos humanos entre outros serviços. Contudo, não devemos perder de vista o trabalho do orientador educacional no âmbito escolar e como partícipe da organização do currículo da escola. Podemos, dessa forma, elencar alguns dos fazeres do orientador educacional na escola: • contribuir para disseminar um clima harmonioso na escola e nas relações interpessoais de seus integrantes, difundindo valores como a solidariedade; • responsabilizar-se, juntamente com os demais profissionais da escola, pela elaboração e acompanhamento do desenvolvimento da proposta pedagógica da escola; • articular com a Equipe Técnica e professores a elaboração dos planos de trabalho, acompanhando sua implantação; • investigar, orientar e acompanhar o processo de recuperação dos alunos com baixo rendimento escolar; 59 Re vi sã o: N om e do r ev iso r - Di ag ra m aç ão : N om e do d ia gr am ad or - d at a ORIENTAÇÃO EM SUPERVISÃO ESCOLAR E ORIENTAÇÃO EDUCACIONAL • informar pais sobre o rendimento escolar; • acompanhar e encaminhar, quando necessário, os alunos com necessidades educativas especiais; • elaborar, com os demais integrantes da equipe técnica, suporte pedagógico e atividades de formação continuada. Essas são algumas das competências do orientador educacional. Sabe-se que a escola não foi sempre do jeito que estamos acostumados a encontrar. Antes da Revolução Industrial, no século XIX, e da formação da sociedade capitalista, a escola era destinada a sacerdotes e membros da elite. Com o advento da indústria, a sociedade precisou de outro tipo de homem, um cidadão, preparado para “vender” sua mão de obra, ou seja, a força de trabalho transforma-se em mercadoria. Esse homem deveria ter o tipo de formação adequado para as especificidades da vida e do trabalho. Contudo, esse foi um processo lento, mas que, aos poucos, foi gerando a forma escolar que temos hoje. Segundo Milet (2002, p. 43), interessou à sociedade capitalista promover a improdutividade da escola, para que se reproduzisse a força de trabalho, ou seja, o excedente de mão de obra barata, o chamado exército industrial de reserva. A autora acrescenta: A linguagem escolar expressa nos programas curriculares, no conteúdo dos livros didáticos, na fala do professor, nas normas disciplinares, nas regras de convivência reflete ideias, sentimentos e modelos de comportamento próprios da classe dominante... Temos hoje, um grupo de profissionais que atua na instituição escolar e está subordinado a uma estrutura de tipos e níveis de ensino, acompanhando o que determina a legislação vigente, fruto de negociações e interesse políticos. Contudo, a organização da escola está, ainda, subordinada às relações sociais internas (professor-aluno, professor-professor, aluno-aluno, professor-funcionário, funcionário-aluno) e externas (com a comunidade por meio de comunicação de massa), fazendo da escola um dos espaços da sociedade complexa integrante de uma totalidade dinâmica. Estando a sociedade em conflito e em mudança constante, a escola não poderia deixar de sofrer tais influências. Podemos dizer, ainda, que a instituição escola possui uma forma peculiar que se reproduz de maneira regular em instituições semelhantes mesmo que nas situações mais precárias e adversas. Pérez Góméz (2001, p. 15) afirma que a escola não é um simples agrupamento de pessoas. Trata-se de uma distribuição geográfica, social, política, temporal de profissionais e sujeitos, de espaços e tempos, isto é, uma distribuição cultural típica dessa instituição, que compõe uma rede de significados compartilhados determinados pelos mecanismos de interação e intercâmbios. 60 Unidade III Re vi sã o: N om e do r ev iso r - Di ag ra m aç ão : N om e do d ia gr am ad or - d at a A organização interna da escola constitui-se de referenciais emanados tanto da esfera administrativa como da esfera pedagógica, que se inter-relacionam e se complementam. Segundo Derouet: [...] Um estabelecimento de ensino não é apenas uma unidade pedagógica, é também uma pequena empresa de restauração que pode servir mais de um milhar de refeições; é também uma pequena empresa de limpeza e de manutenção, se considerarmos que os efetivos em pessoal auxiliar e administrativo representam, mais ou menos, metade do número de professores (1996, p. 75). Nessa organização administrativa e pedagógica, também se manifestam questões essenciais como a estruturação do tempo e do espaço, fazendo florescer uma cultura própria, produzida no seu interior, demarcada por relações de poder na e da escola. São questões constitutivas de uma cultura própria, que, apesar da semelhança em alguns casos à uma empresa no que tange aos aspectos administrativos, apresenta especificidades que nenhuma outra instituição possui. Segundo Pérez Gómez (2001, p.17), a escola, ao mesmo tempo em que propicia a mediaçãoreflexiva dos valores e das relações sociais de uma determinada sociedade, também desenvolve e reproduz sua própria cultura, gerando um conjunto de significados e comportamentos próprios. Assim, ao se pensar na diferenciação da instituição escola em relação a outras instituições, faz-se necessário ainda descrever como a forma escolar constituiu-se social e historicamente, e, ainda, como essa forma influencia a sociedade como um todo e vice-versa. A forma escolar, como resultado histórico de um processo de socialização da infância e da juventude, padronizou os saberes para existirem dentro de determinada organização. A escola é o espaço de tempo que tenta sistematizar e socializar as informações contidas na sociedade. À essa formatação dos saberes dá-se o nome de currículo, o qual dialeticamente acaba conformando a organização de toda a escola. Ressalta-se que os saberes estão espalhados por toda a sociedade, mas a escola tem uma forma tão poderosa que quase tudo relacionado a ensino, aprendizagem, socialização, disciplina, avaliação, entre outros, mesmo quando aparece noutros lugares na sociedade, funcionam tendo por referência a forma que a escola dá à organização dos saberes e que predomina sobre outras formas. Segundo Pérez Gómez (2001), além do currículo, os rituais e costumes, as relações existentes, a organização comportamental dos estudantes, são elementos típicos de uma cultura escolar que tanto condiciona como pressiona os comportamentos de todos os envolvidos no processo, constituindo-se outro entendimento da forma escolar. Contudo, essa forma escolar pode e deve ser refletida e está em permanente reorganização. O orientador educacional é o profissional que pode contribuir decisivamente para estar constantemente 61 Re vi sã o: N om e do r ev iso r - Di ag ra m aç ão : N om e do d ia gr am ad or - d at a ORIENTAÇÃO EM SUPERVISÃO ESCOLAR E ORIENTAÇÃO EDUCACIONAL repensando essa organização escolar, pelo fato de atuar com os diversos segmentos do contexto escolar e estar diretamente relacionado com questões que tem gerado polêmica no contexto escolar como avaliação, evasão e repetência, disciplina, cidadania, valores humanos, problemas de aprendizagem entre outros. É preciso pensar na atuação do especialista para que ele não se torne um profissional sem função ou desnecessário. Seu trabalho não pode estar centrado na ação de cobrir faltas e falhas de outros técnicos ou profissionais. A função primordial de qualquer técnico está em mobilizar o coletivo da escola, para a reflexão crítica sobre prática educativa com o objetivo de transformá-la, lembrando aos profissionais a presença de um projeto pedagógico mais abrangente do que os projetos individuais de cada um. O especialista deve estar bem qualificado, auxiliando o grupo na tomada de consciência do que está se vivendo no momento para juntos fazerem ajustes necessários visando ao bom andamento do processo ensino-aprendizagem. O orientador educacional pode ser um desses especialistas quando assume uma postura de transformação, ou seja, quando acredita que o homem pode mudar seu destino, que as situações não são completamente determinadas e que todos nós temos uma possibilidade de tomada de decisão e/ou ação, por menor ou mais complexa que seja a situação. Como ressalta Paulo Freire (1996), educador comprometido com a educação das classes populares, o homem e a mulher devem ser conscientes de que são seres inacabados e, a partir dessa consciência de si, devem buscar um processo permanente de aprendizado. Esse profissional comprometido com a mudança, que deve assumir o papel de mediador do processo educativo, parte da análise da realidade do sujeito para iniciar seu trabalho . No entanto, Vasconcellos (2002, p. 75) adverte que ao voltar o “olhar” para a realidade do aluno e da comunidade em que a escola está inserida, não se deve fazer uma: análise moralista, de acusação, como se a pessoa tivesse o tipo de prática que tem por ter decidido livre e conscientemente. Ter clareza, no entanto, que partir de onde está não é ficar lá. Entender não para justificar, mas para ajudar a mudar. As ações do orientador educacional tornam-se abrangentes, à medida que este assumiu o papel de elemento mediador das relações e da transformação da escola. Ele atua junto à formação continuada dos professores, tecendo as relações interpessoais entre funcionários, professores, membros da equipe, alunos e pais, orientando e organizando os alunos para atividades de representatividade e liderança entre outras atividades. 7.2 A orientação educacional em relação à Direção da escola A Direção da escola, geralmente é composta pelo setor administrativo, diretor e assistente de direção ou vice-diretor e pelo setor pedagógico, composto por orientador ou coordenador pedagógico e pelo 62 Unidade III Re vi sã o: N om e do r ev iso r - Di ag ra m aç ão : N om e do d ia gr am ad or - d at a próprio orientador educacional. Sendo parte da equipe, ou corpo técnico, o orientador irá colaborar com a direção quando: • participar das decisões tomadas e contribuir para o bom encaminhamento das questões administrativas; • auxiliar na organização das classes, horários (da escolha de turmas pelos professores, das atividades complementares, estudo do meio, festas, reuniões), enfim, quando auxiliar na organização técnico-pedagógica do trabalho educativo; • propor assuntos de comum interesse educacional para serem debatidos e concluídos em reuniões; • realizar programações comuns e distribuir responsabilidades pela execução e avaliação das mesmas (CP/OE). 7.3 A orientação educacional em relação aos funcionários da escola e corpo docente Cozinheiros, inspetores de alunos, bibliotecários, pessoal de limpeza, secretários, enfim todos os profissionais que exercem funções auxiliares do processo educativo devem ser considerados educadores e conscientizados de sua importante tarefa para que o processo de ensino-aprendizagem ocorra de maneira saudável e organizada. Para tanto, o orientador educacional tem a função de manter um bom clima, entre esses profissionais, trabalhando questões como relacionamento interpessoal, diálogo, respeito, resgate da autoestima e atribuições para o bom funcionamento da escola, por meio de reuniões sistemáticas, ouvindo críticas e propostas para o trabalho, fornecendo subsídios teórico-práticos. Ao reunir-se com inspetores de alunos, por exemplo, é importante discutir sobre o comportamento dos estudantes, evidenciando o que é natural da idade e o que deve ser observado. Pode-se ainda orientar o profissional com propostas de trabalho para o desenvolvimento de atividades no recreio ou quando necessitar tomar conta de uma sala de aula, em um possível atraso do professor. O orientador educacional pode auxiliar o corpo docente quando: • procura evidenciar a realidade socioeconômica que a escola está inserida e as dimensões psico-biológico-emocionais dos alunos, auxiliando o professor a interpretar e enfrentar as várias manifestações destes, por vezes complexas e contraditórias, ocorridas em sala de aula; • reflete coletivamente sobre formas de avaliar o aluno e as consequências da repetência e da evasão escolar; • estudos sobre os rendimentos dos alunos e tarefas educativas conjuntas, que levem ao alcance de objetivos comuns tais como: estudos de recuperação, atividades complementares às aulas, tarefas relacionadas à orientação vocacional; 63 Re vi sã o: N om e do r ev iso r - Di ag ra m aç ão : N om e do d ia gr am ad or - d at a ORIENTAÇÃO EM SUPERVISÃO ESCOLAR E ORIENTAÇÃO EDUCACIONAL • coordena estudos sobre problemasde natureza pedagógica, tais como: disciplina escolar, organização de classe juntamente com o administrativo, relacionamento com os alunos e dos alunos entre si e desenvolvimento infantil e do adolescente; • averigua as queixas apontadas pelo professor em relação aos alunos, no que se refere a problemas de saúde, comportamento e dificuldades de aprendizagem, orientando o professor a como proceder e, se necessário, encaminhando o aluno para diagnóstico e tratamento. Sempre que possível, procura dar devolutiva dos casos encaminhados ao professor; • auxilia o professor na busca de sua identidade profissional e complementação de sua formação humana de uma opção consciente pelo magistério. Com relação ao último item, Celso Vasconcelos (2002, p. 76) afirma que muitos professores buscam o magistério pela baixa procura dos cursos de formação e disponibilidade de postos de trabalho para professores, o que considera muito sério, já que a profissão exige da pessoa do professor um trabalho formativo constante e uma escolha profissional comprometida com o contexto social e humano do educando. A orientação educacional, na sua prática, precisa a todo momento auxiliar aos educadores na busca de soluções pedagógicas e metodológicas, redescobrindo o papel da escola na formação do sujeito e na construção de cidadão. Nesse sentido, é na escola que o aluno aprende a conviver com o outro, a aceitar a diversidade cultural, a participar e lutar pelo bem comum, a conviver com dificuldades e contradições, a trabalhar com o diálogo, a defender seus direitos e a dialogar. Todo o trabalho a ser desenvolvido pelo orientador educacional deve ter como base certos princípios norteadores: • respeito e encorajamento do papel ativo do aluno; • valorização do processo, do ato de fazer, e não apenas do resultado, produto final; • valorização das competências; • valorização dos conhecimentos prévios dos alunos; • valorização dos interesses individuais e de grupo; • planejamento da ação, estabelecendo objetivos, executando e avaliando a ação, revendo e refazendo, quando necessário; • percepção de momentos adequados para a introdução de desafios; • integrar-se ao trabalho de profissionais de outras áreas; • valorização da pesquisa e investigação para desenvolvimento das atividades pertinentes. 64 Unidade III Re vi sã o: N om e do r ev iso r - Di ag ra m aç ão : N om e do d ia gr am ad or - d at a 7.4 Orientação educacional: relacionamento família-escola / escola- comunidade A escola e a família são instituições que têm em comum a preparação dos jovens para o envolvimento social, sendo ambos os grupos pontos de referência nos quais vivemos e atuamos. É função da escola, além de educar os jovens, ensinar os conteúdos específicos dos diversos ramos do conhecimento, o que faz com que se diferencie da função da família, que tem uma ação educativa voltada para a construção de valores, sentimentos e emoções (SZYMANSKY, 1997). Fazer o elo entre a escola e os pais ou responsáveis e a comunidade é uma das funções mais importantes do orientador educacional. Ao se pensar no trabalho do orientador educacional com a comunidade próxima da escola, é importante realizar o levantamento de recursos existentes e parcerias, visando a manter contato contínuo com o mercado de trabalho para o entrosamento escola-comunidade, bem como a usar os serviços da comunidade em benefício das programações curriculares, fazendo-os sentir que alguns objetivos das instituições devem apresentar elementos comuns, pois servem à mesma coletividade. Com relação à família dos alunos, é essencial ouvir e identificar seus valores e modos de conceber a vida, detectando o que esta espera da escola e convidando-a a participar não só das atividades e festejos da escola, mas do planejamento e da tomada de decisões. Como, então, conviver com tal realidade? O que esperar da família, principalmente da mãe que é, também, chefe de família? Que tipo de contato poderá ser estabelecido para que a escola não se sinta isolada da família e a família possa participar sem sentir-se pressionada? A família deve sentir-se acolhida e compreendida para que se construa um elo de confiança e parceria. Tais questionamentos trazem em si uma complexidade que necessita de um “olhar diferenciado” dos educadores a respeito dos modos de educação e do conceito de família que se transforma à medida que a sociedade também sofre mudanças. Nas sociedades ditas primitivas, por exemplo, a educação das crianças e jovens era feita por todos da comunidade de maneira informal e relacionava-se à vida prática. As crianças aprendiam a vida por meio da vida. Mais tarde, a forma de educar as crianças mudou. O conceito de família extensa, incluindo parentes e agregados, era o que prevalecia. Neste ambiente não existia lugar para o sentimento de infância. As crianças eram geralmente amadas e cuidadas, mas viviam misturadas com o mundo adulto, vestindo-se como eles, participando de festas e dos mesmos jogos. Era comum as famílias mandarem seus filhos para prestarem serviços e educarem-se em outras famílias, a educação, segundo Carvalho (2004) distinguia-se em popular (oral e prática), para os filhos das classes populares, e erudita (letrada, formal, sinônimo de cultura), concedida apenas para os nascidos no topo da escada social. Aos poucos, com o 65 Re vi sã o: N om e do r ev iso r - Di ag ra m aç ão : N om e do d ia gr am ad or - d at a ORIENTAÇÃO EM SUPERVISÃO ESCOLAR E ORIENTAÇÃO EDUCACIONAL surgimento gradativo das sociedades urbano-industriais, as famílias foram perdendo a característica de externas e transformando-se em nucleares, restritas a pais, mães e filhos. Além disso, perderam o controle sobre sua produção econômica, necessitando sair de casa para vender sua força de trabalho e dessa forma garantir o sustento dos seus membros. Como consequência, precisou delegar os cuidados e educação dos mais novos a organizações especializadas com a escola. Esta gradativamente tornou-se “lócus” de educação pública que tinha por objetivo a transmissão do legado cultural e dos valores sociais e políticos da classe dominante, bem como a qualificação para o trabalho. A transferência da educação da criança da instância privada que era a família, para a instância pública (instituição escola), ressalta Carvalho (2004), tinha por finalidade: atender às necessidades de cuidado, instrução e liberação das crianças - uma solução tanto para o lazer dos privilegiados quanto para a exploração dos numerosos pobres – à medida que o trabalho infantil era erradicado, o ingresso dos jovens no mercado de trabalho era crescentemente adiado, e o trabalho das mães, além daquele dos pais, afastava-as da casa (CARVALHO, 2004)1 Tal situação gerou uma suposta responsabilização da família pelo sucesso ou fracasso escolar de seu filho, pois o acompanhamento da educação doméstica ao auxílio escolar, via dever de casa, modelo utilizado pela classe média, formalizava a interação da escola com a família. Essa política de envolvimento dos pais na escola é inviável para as condições atuais das famílias de classes menos favorecidas, pois pressupõe condições como tempo, familiaridade com os conteúdos escolares e com a linguagem acadêmica e, ainda propriedade para ensinar os deveres de casa. Portanto, se o sistema educacional adotar um único modelo de relação família-escola para indivíduos de origens socioculturais diversas contando com a contribuição sistemática da família para organizar o processo ensino-aprendizagem, poderá incorrer no erro de produzir o fracasso escolar dos sujeitos menos privilegiados, ressaltando sua origem social e as diferenças materiais, culturais e familiares.Segundo Milet (2002, p. 44), interessa à sociedade capitalista promover a improdutividade da escola, para que se reproduza a força de trabalho, o excedente de mão de obra barato, o chamado exército industrial de reserva. Diante do exposto, voltamos à pergunta inicial do texto. Como incentivar a participação da família na educação formal de seus filhos? Em primeiro lugar, é urgente a escola reconhecer e trabalhar com as diferenças socioeconômicas e a diversidade cultural das famílias, tendo uma visão crítica da relação família-escola e das suas implicações para a produção do fracasso/sucesso escolar do aluno. As relações entre a família e a escola somente 1 Aqui no Brasil, assim como em outros países mais desfavorecidos economicamente, esse movimento de democratização do ensino, iniciou-se mais tarde, quase no fim do século XX. 66 Unidade III Re vi sã o: N om e do r ev iso r - Di ag ra m aç ão : N om e do d ia gr am ad or - d at a podem ser construtivas se estiverem baseadas no respeito mútuo, na confiança e na aceitação das peculiaridades de cada um. Não existem duas famílias iguais e convém não ter esquemas rígidos sobre “como deve ser” uma família. Carvalho (2004) argumenta que a escola deve tratar de realizar práticas pedagógicas efetivas e que auxiliem o aluno a produzir conhecimento, independente do envolvimento da família com o trabalho extraescolar. É preciso produzir outro tipo de envolvimento dos pais na educação escolar de seus filhos. Tal experiência é desejável à medida que os pais puderem enriquecer os assuntos curriculares com novidades trazidas por eles e que possam ser compartilhadas com todos os alunos da classe. O contato entre família e educador é uma questão importante quando se pretende proporcionar abertura da instituição para que a família compreenda, aceite e valorize a tarefa educativa da escola, ao mesmo tempo, que é ouvida, entendida e aceita pela escola, sem julgamento de valor. Assim, na esteira desse pensamento, é possível tomar o exposto por Bassedas e Sole (1998, p. 296), no que se refere à relação benéfica entre família e escola pelos seguintes motivos: aproxima os dois mundos – o da família e o do centro – favorecendo aprendizagens mútuas, nas quais cada pessoa pode trazer uma experiência, um saber, uma maneira de fazer diferente e enriquecedora. Em qualquer caso, a pertinência, o tipo e a magnitude da participação deve ser cuidadosamente analisada e discutida pelo conjunto dos professores, ao mesmo tempo que convenientemente enquadrada no projeto pedagógico da escola. Essa participação nunca deve gerar confusão sobre as responsabilidades, as funções e as respectivas implicações; sempre deverá ser um meio, entre outros, para garantir o que queremos deixar evidente a proximidade entre os dois contextos primordiais. Nessa perspectiva, o chamamento individual, quando necessário, torna-se otimista e baseado na troca de experiências e informações sobre o aluno, que possibilitem o repensar de posturas e atitudes tanto da família, como da escola. Outra forma de participação ativa e efetiva da família diz respeito à maneira como o Conselho de Escola é conduzido, trazendo a oportunidade de a família sentir-se mais próxima da escola, participando de decisões. Esse instrumento democrático de atuação será discutido posteriormente quando apresentaremos os espaços mediação do orientador educacional. Além da parceria com a família, a escola e o orientador educacional têm um papel fundamental no estreitamento dos laços entre escola e comunidade, principalmente, se refletirmos sobre a educação da classe trabalhadora e sobre a democratização do ensino. Na experiência relatada por Milet (2002, p. 47) a respeito do debate sobre o papel da orientação educacional e a educação do filho do trabalhador, profissionais orientadores educacionais levantaram as proposições para ampliar a participação coletiva, tanto das famílias como da comunidade, no processo educativo. Ente as propostas, estavam: 67 Re vi sã o: N om e do r ev iso r - Di ag ra m aç ão : N om e do d ia gr am ad or - d at a ORIENTAÇÃO EM SUPERVISÃO ESCOLAR E ORIENTAÇÃO EDUCACIONAL • promover a discussão coletiva sobre o papel da escola na comunidade onde se situa e na sociedade em que vivemos; • levantar as expectativas da comunidade sobre suas aspirações em relação à escola; • propor a realização de um diagnóstico dinâmico e participativo tanto da realidade interna da escola, como da realidade da comunidade onde vivem os alunos; • valorizar a realidade do aluno na definição dos projetos escolares; • rediscutir o currículo escolar com a participação dos envolvidos no processo educativo, inclusive o aluno e a comunidade; • estimular e referendar a participação dos pais e da comunidade na elaboração dos projetos escolares, buscando opiniões, sugestões e críticas; • estabelecer contato com o local de trabalho do aluno, buscando a garantia de que seu horário de estudo seja respeitado; • enfatizar a necessidade de incluir no currículo a discussão sobre trabalho. Portanto, para que a família e a comunidade participem da escola, faz-se necessário o encorajamento ao exercício de debater, criticar, apreciar. Por outro lado, os profissionais da escola precisam estar abertos a “ouvir” o que esses segmentos têm a dizer. As relações devem ser transparentes, sendo que é somente na ação conjunta de todos que a escola cumprirá seu papel social. É somente com uma atitude de abertura que poderemos repensar valores e procedimentos, gerenciando as “crises”, diagnosticando a origem, propondo soluções e criando mecanismos de manejo e prevenção de possíveis situações-problema. Dessa forma, será possível, a partir do confronto de saberes, produzir novos saberes e parcerias, capazes de preencher as necessidades dos alunos. Diante desse panorama pergunta-se: como incentivar a participação da família na educação escolar dos filhos? De acordo com as ideias de Carvalho (2004, p. 20) que estudou a relação escola-família, pensando também nas questões de gênero: se há concordância acerca do conteúdo, método e da qualidade do ensino oferecido pela escola, isto é, apoio tácito dos pais/mães, e aprendizagem satisfatória dos filhos/as, isto é, convergência positiva do aproveitamento individual e da eficácia escolar, tudo vai bem nas relações família-escola. Mas se os resultados são insatisfatórios ou deficientes... então há problemas. Portanto, a relação família-escola basicamente depende de consenso sobre filosofia e currículo (adesão dos pais/mães ao projeto político-pedagógico da escola), e de coincidência entre, de um lado, concepções e possibilidades educacionais da família e, de outro, objetivos e práticas escolares. A relação 68 Unidade III Re vi sã o: N om e do r ev iso r - Di ag ra m aç ão : N om e do d ia gr am ad or - d at a família-escola também será variavelmente afetada pela satisfação ou insatisfação de professoras e de mães/pais, e pelo sucesso ou fracasso do/a estudante. A afirmação da autora resume bem o desejo dos educadores em relação a um envolvimento da família do aluno a cerca da educação formal que é dada na escola. Fica claro que o educador não quer que a família interfira no seu trabalho pedagógico ou na sua autoridade profissional. Tal participação, quase sempre, significa o comparecimento às reuniões de pais, monitoramento do dever de casa, assistência a trabalhos em grupo, providências quanto à aquisição de materiais especiais para projetos, disponibilidade para realizar programas culturais e de lazer com a criança etc. Contudo, sabemos que esse tipo de “disposição especial”por parte da família, para participar da vida escolar de seu filho, faz parte de uma visão de modelo tradicional de família, geralmente da classe média que hoje em dia quase não existe mais. Além disso, como lembra bem Carvalho (2004), em nossa sociedade, quando se menciona a participação dos pais na escola, estamos nos referindo, na maioria das vezes, ao envolvimento da mãe que, no contexto da divisão sexual do trabalho, é considerada a responsável por mais esse encargo que muitas vezes assume, também, toda a responsabilidade e a chefia de sua família. Se concordarmos que a participação dos pais na escola está diretamente relacionada ao desempenho escolar do estudante ou, ainda, se acreditarmos que quanto maior o envolvimento da família na educação formal de seus filhos, maior será seu rendimento, teremos de considerar as condições materiais e culturais dessas famílias e a disponibilidade de seus responsáveis. Não podemos negar que, embora haja exceções, o fracasso escolar atinge, principalmente, as crianças das famílias mais pobres das escolas públicas mais carentes. O orientador educacional deve ter seu plano de trabalho contextualizado com todos os segmentos da escola, incluindo-se, principalmente, a família e a comunidade. As transformações da sociedade moderna levam a uma nova concepção de família, que possui seus papéis ressignificados. Essas modificações de papéis, a serem desempenhados na família, advêm das características econômicas e sociais que se impõem na atualidade. De sorte que é necessário ao orientador educacional compreender as transformações e suas consequências no processo relacional família-escola-comunidade. Certo é que família e escola têm objetivo comum: propiciar condições favoráveis ao desenvolvimento integral das crianças, adolescentes, jovens e adultos. Desta forma, é importante desenvolver as seguintes ações: • caracterização do entorno da escola: — recursos econômicos; — clubes – associações; 69 Re vi sã o: N om e do r ev iso r - Di ag ra m aç ão : N om e do d ia gr am ad or - d at a ORIENTAÇÃO EM SUPERVISÃO ESCOLAR E ORIENTAÇÃO EDUCACIONAL — igrejas; — comércio; — indústrias; — transportadoras; — acessos; — pontos turísticos; — principais vias; — mapeamento; — serviços médicos e farmácia. Esse levantamento implica uma relação de visita real, quando necessário, objetivando recursos e parcerias com a escola, verificando-se quando a comunidade participa e se a escola é tida como pertencente à comunidade. • caracterização do grupo de pais: — elaborar previamente a documentação com informes dos pais, previne possíveis situações constrangedoras; — o orientador educacional deve apropriar-se por intermédio de questionário informativo, elaborado quando da matrícula, com dados pertinentes, tais como: renda familiar, situação econômica, membros da família, profissão dos responsáveis, cultura familiar, nível educacional. Com base nesse levantamento, os temas a serem abordados nas futuras reuniões terão mais relevância e encaminhamentos adequados. Outro levantamento importante junto aos pais deve ser sobre “as preocupações” deles em relação aos filhos e a si próprios: drogas, sexo, emprego, violência etc. Após mapear as características, o orientador educacional deverá viabilizar as ações suscitadas em sua análise. Também é de grande valia a garantia das proposições do plano do orientador educacional, o conhecimento dos professores e alunos para fundamentar sua interlocução com pais. A atuação junto aos pais deverá ser pautada em três momentos: I – com o grupo da comunidade: discutindo as possíveis colaborações e implicações, desenvolve-se um sentimento de responsabilidade e participação da comunidade junto à escola. 70 Unidade III Re vi sã o: N om e do r ev iso r - Di ag ra m aç ão : N om e do d ia gr am ad or - d at a II – com todo o coletivo de pais da escola (por período, por classe): a multiplicidade de opiniões, situações, concepções, exigem do orientador educacional a delimitação de temas necessariamente abordados em seus encontros com pais. As pautas das reuniões deverão ter boa estruturação, para que haja implicação dos pais e participação e, consequentemente, atendimento às expectativas. Em geral, são temas reais (reformas da escola, uniformes, passeios etc.) com abordagens conjuntas com a direção (horários, festas) e temas associados ao processo de desenvolvimento do aluno na escola e na sociedade (novas tecnologias, sexo, violência, hábitos de leitura etc.). III – com todo o coletivo de pais. 7.5 Orientação educacional e o trabalho com os alunos A seguir, leia uma experiência relatada por Arroyo (2004, p. 34) em uma reunião de formação de professores: Era um sábado. Nos reunimos na escola para um dia de estudo. Todos nós estranhamos o silêncio. A diretora comentou: “a escola sem os alunos não é a mesma”. “Parece uma casa sem filhos. Desabitada”, comentou uma professora. Chamou-me a atenção: a escola sem os alunos não é a mesma, parece uma casa desabitada. Não sabemos viver sem eles e elas. Sentimos sua ausência. Até seu incômodo. Sugeri que começássemos o dia de estudo por aí: sempre os alunos habitaram a escola? Estaríamos em tempo em que sentimos mais sua presença? Presença cômoda ou incômoda... O que mudou na escola? A resposta de muitas(os) professoras(es) coincidia: “os alunos não são os mesmos”. Seria um motivo suficiente para preocupar-nos. Uma professora nos levou para o núcleo de nossas inquietações: “quando os alunos não são os mesmos a escola poderia ser a mesma? Nós podemos fingir ser os mesmos?”... Estaria chegando a hora de repensarmos? Condenaremos e expulsaremos as(os) alunas(os), por não serem os mesmos? Desta vez, os alunos nos obrigam a repensar as imagens com que os representamos. Essas imagens terão de ser outras se os alunos são outros... Os alunos não são outros por serem indisciplinados, mas por serem outros como sujeitos sociais, culturais, humanos. Porque a infância, adolescência e juventude que são forçados a viver são outras. Os variados depoimentos dados pelos(as) professores(as) pareciam revelar que o desencanto docente não é tanto com as condutas indisciplinadas dos alunos (sempre houve indisciplina nas salas de aula). O desencanto é com a perda das imagens que povoam nossa docência, a educação e as escolas. Colocamos a pergunta: que olhares projetamos sobre os alunos? Com que imagens os representamos? Que imagens carregamos da infância, adolescência e juventude? Os(as) alunos(as) “que não são mais os mesmos” cabem nessas imagens? Não nos incomodam exatamente porque quebraram essas imagens? Vivenciar essas inseguranças pode ser positivamente amedrontador”. 71 Re vi sã o: N om e do r ev iso r - Di ag ra m aç ão : N om e do d ia gr am ad or - d at a ORIENTAÇÃO EM SUPERVISÃO ESCOLAR E ORIENTAÇÃO EDUCACIONAL O depoimento nos leva a pensar quais “olhares” temos do aluno e da escola. Com certeza, quando pensamos em criança, reafirmamos as ideias românticas, cheias de pureza, beleza e bondade (que guardamos de uma infância que nem sempre foi a nossa), como única imagem de aluno, ou seja, crianças são sempre adoráveis, bonitas, cheirosas e não têm maldade. No que se refere à educação, ainda temos uma imagem divulgadas por pedagogos românticos que acreditavam que iriam fazer florescer as plantinhas (alunos) nos jardins escolares. Assim, nossa imagem de infância e da educação é falsa, construída pela modernidade, no âmbito social e cultural e reforçada pela pedagogia moderna. Tais ideias não correspondem mais (será que um dia corresponderam?) à realidade de váriascrianças e adolescentes, principalmente daqueles que vivem nas favelas, nas ruas, no campo ou na cidade. Então, é preciso repensar essa imagem e buscar apreender o aluno real. Para tanto, é urgente voltarmos nosso “olhar” para os alunos. Isso significa reexaminarmos os conhecimentos que temos dos alunos, tanto no que se refere aos aspectos do desenvolvimento emocional, físico e intelectual, como em relação aos aspectos sociais e econômicos. Significa, ainda, “ouvir” o educando, sua história de vida, expectativas com relação à escola, os colegas, a professora etc. Precisamos tomar cuidado, pois durante anos, um ramo da Psicologia apoderou-se dos estudos sobre as fases do desenvolvimento humano e de outras pesquisas, direcionando nosso pensamento para a busca do conceito de “normalidade”, ou seja, quando a criança não faz determinada ação que estaria dentro do nível de desenvolvimento em que se encontra, tais pesquisas dizem que esta tem um atraso no seu desenvolvimento. Há de se enfatizar que é de extrema importância estudarmos as fases do desenvolvimento da criança e do adolescente para tomarmos tais reflexões como indicadores e ponto de partida para o conhecimento e a tomada de decisão com relação ao que será trabalhado com os alunos. Contudo, faz-se necessário conhecer os alunos em outros aspectos como a suas experiências familiares e pessoais, condições de moradia, emprego dos familiares, formas de sobrevivência experiências de exclusão, vivências da infância, trajetória escolar entre outras tantas questões. Arroyo (2004, p. 61) afirma que para conhecer os alunos é importante estudar as trajetórias humanas e entender as especificidades do contexto atual de vida deste. O autor adverte: Para chegarmos a ter outra sensibilidade pedagógica para com os conteúdos da docência, ou para novas didáticas ou para com os tempos de formação e socialização, teremos de começar por termos sensibilidade humana para com os(as) educandos(as) como sujeitos sociais e culturais, éticos e cognitivos. Plenos. Rever nosso olhar sobre os alunos sempre nos surpreende. Em dois sentidos: de um lado estranhamos a visão tão negativa que refletem os termos com que os nomeamos, de outro lado nos surpreende a riqueza de seus itinerários humanos, frequentemente tão tortuosos. Com isso, necessitamos encontrar formas de “olhar e ouvir” os alunos e conhecê-los. Ainda é raro encontrarmos escolas que, para conhecer seus alunos planejam os primeiros dias de aula com situações 72 Unidade III Re vi sã o: N om e do r ev iso r - Di ag ra m aç ão : N om e do d ia gr am ad or - d at a que propiciem a “escuta” do aluno e construção da imagem real deste. A esse período costuma-se dar o nome de período exploratório. Após esse momento, professores reúnem-se novamente para, diante desses dados, repensar e replanejar o trabalho com seu grupo de alunos, os objetivos, conteúdos e estratégias de ensino. O orientador educacional pode auxiliar nesse processo trazendo informações do contexto social e econômico em que os discentes estão inseridos, buscando informações sobre suas famílias e modos de vida, observamos os alunos, chamando a atenção para julgamentos preconceituosos e unificadores do estilo: os alunos dessa escola são oriundos de famílias desestruturadas ou por estarem inseridos num contexto social violento, a maioria dos alunos têm posturas indisciplinadas. O julgamento generalizante e apressado gera visões simplificadas, fragmentadas e excludentes. O profissional da orientação deve ajudar também os educadores a constantemente reverem seus padrões morais. Sabe-se que existem valores éticos que são universais, como o amor e o respeito humano. Contudo, há questões que hoje em dia devem ser revistas e reconstruídas. A formação ética passa por um processo permanente de reconstrução. Tomando como exemplo questões de adolescência e mídia, condutas em relação à mulher, à raça entre outras, verificamos que os valores e condutas estão mudando e que muitas vezes, os padrões que temos precisam ser repensados e por vezes superados. Segundo Arroyo (2004), à medida que avançamos e compreendemos a construção de valores na sociedade até em relação à sua história, podemos compreender e aprender a lidar com os percursos morais dos alunos, respeitando e dialogando com o ponto de vista do outro para encontrar formas de convivência saudáveis. O exercício da escuta e da liberdade pode ser um caminho possível para essas relações. O trabalho de orientação educacional junto ao escolar objetiva auxiliar aos alunos no seu pleno desenvolvimento e na sua formação humana, ou seja, o orientador educacional deve buscar formar o aluno como pessoa capaz de pensar, de estudar e de desenvolver seu sentido de cidadania. Outro aspecto a ser observado pelo orientador educacional, em relação ao discente, é instrumentalizá- lo para a organização eficiente do trabalho escolar, tornando a aprendizagem mais eficaz, bem como realizar sessões de orientação de estudos, previamente agendadas em calendário, onde o orientador educacional utilizará estratégias diversificadas (textos, trabalhos em grupo, vídeo, informática, debates, atividades extraclasse etc.) que vão ao encontro dos objetivos propostos e às necessidades e interesses da faixa etária a ser trabalhada. O orientador educacional, também necessita estabelecer um vínculo de confiança e cooperação aluno/aluno, aluno/orientador, ouvindo-o com paciência e atenção. O aluno é o elemento central do processo educativo e deve ser visto como um sujeito social e concreto, que tem uma história de vida que deve ser levada em consideração pelos membros da escola. É tarefa do orientador educacional fazer a mediação entre o aluno e aspectos do processo ensino- aprendizagem, evidenciando aos educadores quem é esse sujeito e preservando seu direito de participar da vida da escola, dentro e fora da sala de aula, construindo sua identidade pessoal e grupal e criando possibilidades de refletir sobre seus valores e os valores culturais vigentes na sociedade. 73 Re vi sã o: N om e do r ev iso r - Di ag ra m aç ão : N om e do d ia gr am ad or - d at a ORIENTAÇÃO EM SUPERVISÃO ESCOLAR E ORIENTAÇÃO EDUCACIONAL O orientador pode, ainda, estimular os alunos ao protagonismo juvenil, organizando a eleição e formação dos representantes de classe e de membros dos grêmios estudantis. Tal aspecto proporciona o exercício da prática da cidadania e liderança pelos alunos. Deve propiciar também, a integração de alunos novos, em cooperação com grêmio estudantil e outros participantes. Há a possibilidade de um trabalho sistemático com alunos antigos, por exemplo: uma associação de ex-alunos, que pode cooperar para a realização de grupos de estudos entre ex-alunos e alunos mais novos ou, ainda, a promoção de palestras sobre diversos assuntos de interesse dos alunos. A orientação vocacional ou profissional, como já sabemos, é um dos campos clássicos do trabalho da orientação. Contudo, tratar desse assunto hoje, na escola, significa imbuir-se de uma dose de esperança mostrando a importância de se estabelecer novos valores como a solidariedade, justiça, liberdade e paz, para além da competição e do individualismo. Significa ainda, ajudar nossos alunos a se conhecerem, a entenderem estas circunstâncias históricas complicadíssimas em que estão envolvidos, a acompanharem o movimento das profissões e a se capacitarem para encontrar alternativas dignas de sobrevivência – portanto, sem abrirem mão do compromisso com este horizonte mais geral de mudança (VASCONCELOS, 2006). Para isso, o orientador educacional pode lançar mão de grupos de orientação coletiva que podem ser formados espontaneamente, ou de sessão coletivas em classe,caso haja possibilidade, dentro do horário de aula. O orientador educacional atua ainda no sentido de possibilitar o encaminhamento, o diagnóstico e o tratamento de alunos com algumas necessidades educativas especiais, que podem ser desde um problema simples de visão ou audição, dificuldades de aprendizagem até problemas neurológicos e psiquiátricos. Nesta perspectiva, orientador atua junto com o professor, observando o aluno, solicitando relatório do educador, entrevistando os pais ou responsáveis e buscando informações que possam auxiliar o trabalho pedagógico em sala de aula. Infelizmente, em quase todos os municípios, há poucos serviços de saúde gratuitos que realizam o diagnóstico e o tratamento desses alunos gratuitamente. Este é um dos principais aspectos conflituosos do trabalho do orientador educacional que está relacionado, também, à questão do preconceito e da inclusão. Outra questão que merece destaque é que existem profissionais que confundem essa atribuição do orientador e as próprias limitações em trabalhar com problemas exclusivamente educacionais, que não fazem parte da dimensão da saúde. Esses educadores encaminham todo e qualquer aluno com dificuldade ao serviço de orientação educacional, gerando desgaste para alunos, familiares e para o próprio orientador. Vasconcelos (2002, p. 80) denomina tal prática de “síndrome de encaminhamento” ou seja, manda-se o aluno para que “se dê um jeito”, por conseguinte, provoca-se a “síndrome do chamamento” convocando os pais ou responsáveis para comunicar que o filho “tem ou é um problema”. 74 Unidade III Re vi sã o: N om e do r ev iso r - Di ag ra m aç ão : N om e do d ia gr am ad or - d at a Esse fato nos remete a outro problema bem comum na escola: o da indisciplina. Não é incomum ouvirmos relatos de professores declarando que os alunos de hoje, não são como eram os de antigamente e que, atualmente, a desestrutura familiar gera sujeitos que têm dificuldades em aceitar limites, são desrespeitosos, dispersivos e têm comportamentos agressivos. Essas situações, na opinião dos professores, os impedem de ministrar uma boa aula, pois muitas vezes, precisam trabalhar outros conteúdos como questões relacionadas a valores e saúde. Mas, será que esse é o verdadeiro ou único motivo da indisciplina na escola? Como explicar tal problemática? O fato é que a sociedade mudou e a escola mudou também ao se abrir para a escolarização dos filhos das camadas populares. Contudo, guardamos uma herança pedagógica alheia aos dias atuais, tratando o aluno, no que se refere aos condicionantes sociais e históricos e aos aspectos psicológicos, como se fossem iguais e tivessem as mesmas oportunidades dos alunos das classes mais favorecidas. Dessa forma, a indisciplina é um sintoma da inadequação do aluno real à escola idealizada, gerando a confrontação do novo sujeito histórico a velhos modelos autoritários, elitistas e conservadores de ensino. Se por um lado, o autoritarismo, as arbitrariedades e os preconceitos provocam mais revolta e violência por parte do aluno, por outro lado, a complacência, o paternalismo e o protecionismo, não auxiliam o aluno no desenvolvimento de atitudes de reflexão e autonomia moral2. Sendo assim, tais situações de conflito só serão resolvidas se forem enfrentadas sem culpabilizar os elementos envolvidos ou tratar o caso como um problema isolado. Enfrentar o conflito significa dialogar sobre o ocorrido, tentando evidenciar as questões que o provocaram e restabelecendo os vínculos e relações quase sempre rompidos, principalmente no que se refere à relação professor-aluno. Aquino (1999) afirma que tal atitude exige uma postura de construção negociada com relação às estratégias de ensino e avaliação, sendo que para isso o educador deve saber quem é o seu aluno e a realidade em que vive, investindo na construção coletiva das regras do grupo e no constante relembrar das mesmas, bem como, no renovar cotidiano de suas práticas em sala de aula. À luz desse enfoque, é importante que orientador educacional mantenha contatos contínuos de natureza informal (visitas à sala de aula e conversas no recreio) com os alunos, possibilitando um relacionamento cordial e levando-os a aceitar naturalmente a sua presença durante as atividades desenvolvidas pelos professores. Além disso, deve auxiliar o professor a procurar formas de estabelecer vínculos de confiança e afetividade com seus alunos, motivando-os às condutas de diálogo e reflexão sobre seu trabalho educativo. 2 Autonomia Moral – termo utilizado por Jean Piaget (1978) para se referir ao sujeito que tem a capacidade de autogovernar-se. A autonomia virá da compreensão da reciprocidade e do respeito nas relações entre as pessoas. 75 Re vi sã o: N om e do r ev iso r - Di ag ra m aç ão : N om e do d ia gr am ad or - d at a ORIENTAÇÃO EM SUPERVISÃO ESCOLAR E ORIENTAÇÃO EDUCACIONAL O trabalho de orientação educacional junto ao escolar objetiva auxiliar aos alunos no seu pleno desenvolvimento e na sua formação humana, ou seja, o orientador educacional deve buscar formar o aluno como pessoa capaz de pensar, de estudar e de desenvolver seu sentido de cidadania. Outro aspecto a ser observado pelo orientador educacional, em relação ao discente, é instrumentalizá-lo para a organização eficiente do trabalho escolar, tornando a aprendizagem mais eficaz, bem como realizar sessões de orientação de estudos, previamente agendadas em calendário, onde o orientador educacional utilizará estratégias diversificadas (textos, trabalhos em grupo, vídeo, informática, debates, atividades extraclasse etc.) que vão ao encontro dos objetivos propostos e às necessidades e interesses da faixa etária a ser trabalhada. O orientador educacional, também precisa estabelecer um vínculo de confiança e cooperação aluno/aluno, aluno/orientador, ouvindo-o com paciência e atenção. Assim, entre as atribuições do orientador educacional está a orientação para o estudo, como sugestão de itens para reflexão em sessões de orientação de estudo, cita-se: a) Plano pessoal de estudos; b) Observação de local apropriado para hora de estudo; c) Organização dos afazeres e sequencial de trabalhos, elencando prioridades; d) Realização de resumos e quadros pertinentes ao conteúdo estudado. O setor de orientação educacional pode estimular o alunado na eficiência de seu estudo, como apontado por Martins (1994, p. 136). A eficiência no estudo Um dos objetivos educacionais mais importantes e mais difíceis de serem conseguidos é o desenvolvimento de hábitos e técnicas eficientes de estudo. O orientador educacional não pode prescindir de um bom conhecimento dos hábitos de estudo de seus educandos, a fim de poder orientá-los convenientemente. Assim, sugerem-se algumas perguntas que podem fazer parte de um questionário de averiguação de problemas escolares: - É capaz de permanecer estudando sem interrupção? - Concentra-se bem nos estudos ou é distraído? - Tem dificuldade em aprender o que estuda? - Tem bronca de algum professor? - Dá opiniões nas aulas? 76 Unidade III Re vi sã o: N om e do r ev iso r - Di ag ra m aç ão : N om e do d ia gr am ad or - d at a - Pergunta quando tem dúvidas? - Falta muito às aulas? - Tem medo de ser reprovado? - Estuda diariamente as matérias dadas em aulas? - Procura decorar as lições? - Lê o todo e depois estuda por partes? - Faz revisões do assunto estudado, reproduzindo com suas palavras? - Faz resumos e exercícios para fixar o que estudou? - Pesquisa em outros livros o assunto em estudo? - Procura anotar tudo o que o professor fala em aula? - Estuda porque gosta? 7.6 Orientaçãoeducacional: relação escola-saúde O orientador educacional em suas atribuições deverá entender que seu aluno é um ser integral, constituído de aspectos físicos, psicológicos, mentais, emocionais entre outros. Dessa forma, muitas vezes, as “falhas” de aprendizagem podem ser advindas de privação cultural, falta de estímulo do ambiente familiar e até mesmo de fatores orgânicos. Cabe a este profissional encaminhar o educando aos setores competentes, visando a proporcionar o bem estar do mesmo. Contudo, o papel da escola não para por aí. Paralelamente, os educadores precisam ser sensibilizados para terem uma atitude de acolhimento para com esse sujeito, otimizando recursos educacionais escolares para atendê-lo da melhor forma possível. Tais dificuldades que extrapolam os limites das possibilidades da escola, denominadas de orgânicas, identificadas inicialmente, pelo professor e analisadas pelo orientador educacional por meio do desempenho do aluno, em relação à classe e a ele próprio, deverão ser encaminhadas para os profissionais e/ou técnicos da Saúde, ou ainda, para o setor competente. Este procedimento deverá ser realizado após análise e avaliação de todos os aspectos cognitivos, sociais, culturais e sempre com a participação e informação dos familiares. A informação dos pais objetiva não apenas as interações, mas permite a identificação de fatores que afetam o processo educativo. Como ponto de referência, na área da Saúde, o encaminhamento inicial deverá ser ao médico. Posteriormente, aos demais profissionais. É uma tarefa difícil e que exige do orientador educacional discernimento, competência e perspicácia. O orientador educacional, além de analisar o relatório do professor e a entrevista com os pais, deverá observar sistematicamente o aluno nas atividades desenvolvidas individualmente e em grupo, estando sempre atento aos aspectos emocionais. As anotações dessa observação contribuirão para a imparcialidade do relato e deverão compor a documentação para encaminhamento do aluno aos setores competentes. 77 Re vi sã o: N om e do r ev iso r - Di ag ra m aç ão : N om e do d ia gr am ad or - d at a ORIENTAÇÃO EM SUPERVISÃO ESCOLAR E ORIENTAÇÃO EDUCACIONAL Exemplificando: o aluno que em um grupo classe (de acordo com a faixa etária), após ter passado por várias experiências de aprendizagem, não possuir habilidades de audição, leitura oral, composição escrita, interpretação de ordens orais, trocas de fonemas, entre outros, deverá, após a sistematização da observação e dos relatos da situação (relatório), ser encaminhado pelo orientador educacional a um médico ou, dependendo do caso, diretamente ao fonoaudiólogo, psicólogo ou psicopedagogo. Alguns alunos podem apresentar alguma característica genética (síndromes), que se manifestam no desenvolvimento, em geral na escola. Por outro lado: quadro de anemias, deficiências, doenças congênitas, nem sempre são percebidas até mesmo pelos pais. O importante é não apenas encaminhar, mas assumir o compromisso de acompanhar o desenvolvimento do aluno trabalhando em parceira com profissionais como: fonoaudiólogos, fisioterapeutas, psiquiatras, psicólogos, psicopedagogos, terapeuta ocupacional, médicos (em todas as suas especialidades), dentistas e outros, conforme a necessidade do aluno. Tal acompanhamento deverá ser feito por meio do trabalho compartilhado. Não se pode compreender o trabalho do outro de forma isolada. O trabalho da orientação educacional implica ações individuais e coletivas. Assim, as ações coletivas fundamentam-se na ideia de vários profissionais trabalharem com o educando, trocando informações e saberes para melhor atendê-lo. As interlocuções que ocorrem após o encaminhamento do aluno devem ocorrer não só com o orientador, mas com o professor, a família e o profissional ou profissionais da saúde envolvidos, visando à compreensão integral do educando, seus comportamentos e formas de aprender. A partir daí, pode-se traçar um plano de apoio na resolução de seus problemas ou dificuldades. Ao realizar tal parceria, os envolvidos estarão realizando um trabalho em rede, numa perspectiva multidisciplinar que irá trazer benefícios positivos aos alunos. Práticas como essas proporcionam à criança com necessidades educacionais especiais o que chamamos de processo de inclusão, que renega o princípio da “normalização”, já explicitado anteriormente, e procura propiciar um ambiente saudável e com suporte técnico para que o aluno possa permanecer em uma sala de aula comum, com outras crianças, aprendendo e se socializando. A orientação educacional deve ter um caráter investigativo. A ação investigativa do orientador educacional possibilita o conhecimento do aluno tanto no funcionamento do sujeito quanto de seu organismo. As observações realizadas na escola pelo orientador educacional podem facilitar os profissionais da área de saúde no rumo de uma possível intervenção nessa área. Trabalhos atuais nas diversas áreas do conhecimento têm sido desenvolvidos de modo que seja construído um projeto de prevenção à vulnerabilidade e risco. Atitudes de prevenção adequadas à proteção da vida, numa proposta de construção do ser estabelecida, por meio das interfaces da área de saúde com a área da educação, espaço privilegiado para prevenir agravos múltiplos. De acordo com Saito (2001), pedagogos e profissionais da saúde serão transformados em educadores, preocupados com o bem estar do educando. Ainda conforme o exposto, eis alguns princípios norteadores: 78 Unidade III Re vi sã o: N om e do r ev iso r - Di ag ra m aç ão : N om e do d ia gr am ad or - d at a • considerar a criança/adolescente como um todo indivisível biopsicossocial; • capacitar-se para escutar, ouvir, apoiar e acolher antes de julgamentos e ordenações; • perceber, mesmo que por meio da doença ou limitação, a presença do ser em construção, seja criança ou adolescente; • exercer a atenção integral ao ser humano, dentro de princípios éticos, de autonomia e respeito; • não permitir a presença de preconceito e estereótipos na relação educador-educando. Saúde não é apenas processo de intervenção na doença, mas processos de intervenção para que o indivíduo e a coletividade disponham de meios para a manutenção ou recuperação do seu estado de saúde, no qual estão relacionados os fatores orgânicos, psicológicos, socioeconômicos e espirituais. Educar não significa simplesmente transmitir ou adquirir conhecimentos, por isso o orientador educacional tem entre suas atribuições mediar a relação saúde-escola. Torna-se importante, desse modo, a percepção de que não poderá haver cobrança no futuro se para as crianças e adolescentes não for oferecido um presente pautado na cidadania e na proteção ao projeto de vida. Diante disso, construir-se-á a cidadania da criança hoje e do adulto amanhã. 7.7 Orientação Educacional e relações interpessoais Relacionamentos interpessoais somente acontecem se houver comunicação entre pessoas. A comunicação é a base para toda interação humana, uma atividade dinâmica e contínua de troca de experiências, instruções e informações com o objetivo de informar e influenciar mutuamente atitudes e pensamentos. No cotidiano escolar, o processo de comunicação pode encontrar barreiras que dificultarão ou até mesmo impossibilitarão que o processo seja concluído de modo exitoso. Uma das funções mais importantes da orientação educacional é fazer o elo, a ligação entre a escola e a comunidade discente. É essencial ouvir o alunado e identificar seus valores, expectativas em relação à vida. Mostrar a importância das relações interpessoais a todos os atores da escola, valorizando as diferenças. Estar atento para o desenvolvimento das relações emfavor do clima favorável à resolução de situações é uma das dimensões da prática diária do orientador educacional. Ruth Rocha (1986, pp. 3-10) em seu texto “Quando a escola é de vidro” assim escreve: [...] Naquele tempo eu até achava natural que as coisas fossem daquele jeito. Eu nem desconfiava que existissem lugares muito diferentes... Eu ia pra escola todos os dias de manhã e quando chegava, logo, logo, eu tinha que me meter no vidro. 79 Re vi sã o: N om e do r ev iso r - Di ag ra m aç ão : N om e do d ia gr am ad or - d at a ORIENTAÇÃO EM SUPERVISÃO ESCOLAR E ORIENTAÇÃO EDUCACIONAL [...] O vidro dependia da classe em que a gente estudava. E assim, os vidros iam crescendo à medida que você ia passando de ano. Se não passasse de ano, era um horror. Você tinha que usar o mesmo vidro do ano passado. Coubesse ou não coubesse. Aliás nunca ninguém se preocupou em saber se a gente cabia nos vidros. [...] A gente não escutava direito o que os professores diziam, os professores não entendiam o que a gente falava... A gente só podia respirar direito na hora do recreio ou na aula de educação física. [...] Tinha menino que tinha até que sair da escola porque não havia jeito de se acomodar nos vidros. E tinha uns que mesmo quando saíam dos vidros ficavam do mesmo jeitinho, meio encolhidos, como se estivessem tão acostumados que até estranhavam sair dos vidros. [...] — Aposto que essa rebelião foi fomentada pelo Firuli. É um perigo esse tipo de gente aqui na escola. [...] Seu Hermenegildo não conversou mais. Começou a pegar os meninos um por um e enfiar à força dentro dos vidros. [...] E quebramos um vidro, depois quebramos outro e outro mais e dona Demência já estava na janela gritando – Socorro! Vândalos! A orientação educacional, como processo dinâmico e contínuo, favorece o processo de relações interpessoais. Imagine, então, o papel do orientador educacional como articulador das relações interpessoais em uma escola. Veja, saber ouvir, ver a totalidade e as partes e falar são atitudes que favorecem o desenvolvimento das relações interpessoais saudáveis. Por meio da comunicação interpessoal saudável, o orientador educacional e o grupo de alunos, professores e demais atores chegam a um entendimento mútuo, constroem uma relação de confiança e coordenam suas ações para atingirem os seus objetivos. 80 Unidade III Re vi sã o: N om e do r ev iso r - Di ag ra m aç ão : N om e do d ia gr am ad or - d at a Por outro lado, faz-se necessário observar os valores éticos que mais se destacam nas ações de todos os envolvidos no processo educativo. Muitas vezes, ao analisar uma situação de indisciplina ou violência na escola, por exemplo, julgamos os alunos a partir de nossos padrões e valores, esquecendo- nos que tais valores podem não ser os mesmos devido às diferentes circunstâncias sociais e vivências. Qual deveria ser nossa conduta? Será que devemos aceitar os valores dos outros sem discuti-los? Será que devemos impor nossos valores e rejeitando todos que os transgridam? Haveria um meio termo para tal situação? É claro que há outros caminhos para que o aluno aprenda e saiba distinguir os valores universais daqueles que são transitórios ou discriminatórios. Segundo Inoue, Migliori e D`Ambrosio (1999), saber o que é solidariedade, por exemplo, é uma coisa, outra bem diferente é saber como se é solidário, ou ainda, valorizar a solidariedade e justiça. Assim, ao pensar no trabalho com valores humanos na escola, é preciso pensar em três características importantes: saber, fazer e ser. Para tanto, é fundamental que na escola: [...] os alunos possam aprender a dialogar, a ouvir o outro e ajudá-lo, a pedir ajuda, a aproveitar críticas, explicar um ponto de vista, coordenar ações. É essencial aprender procedimentos dessa natureza e valorizá-los como forma de convívio escolar e social (PCN, v.1, p. 97). Essas atitudes não podem ser simplesmente transmitidas, mas vivenciadas no dia a dia da sala de aula e nos outros ambientes da escola. Os sujeitos se comportam de acordo com o que conhecem e esse conhecimento é gerado pela realidade que informa, motiva, dá exemplos e oferece respostas ao indivíduo. A construção de uma visão solidária de relações humanas a partir da sala de aula contribuirá para que os alunos superem o individualismo e valorizem a interação e a troca, percebendo que as pessoas se complementam e dependem umas das outras (PCN, v.3, p. 32). Segundo Aquino (1997), a conduta de diálogo por parte do educador, o estabelecimento de um contrato pedagógico com os alunos, ou seja, construção negociada por parâmetros e regras para o trabalho educacional e a predisposição para aceitação da mudança e da invenção são os fatores mais importantes para uma nova ordem pedagógica na escola. Dessa forma, os professores e funcionários, ou seja, os educadores, para adotar tais condutas dentro e fora da sala de aula, precisam também vivenciar situações como essas em suas esferas de atuação. O papel do orientador educacional, nesse sentido, é o de incentivar a reflexão sobre as atitudes de todos, oferecendo, juntamente com os demais membros da equipe, espaços de diálogo e atuação coletiva, evidenciando a importância do trabalho de cada um para o sucesso da ação educacional. Para tanto, pode-se lançar mão de textos, vivências ou jogos em grupo que possibilitem aos educadores terem a possibilidade de construir o espírito de grupo, aprofundar o conhecimento de si 81 Re vi sã o: N om e do r ev iso r - Di ag ra m aç ão : N om e do d ia gr am ad or - d at a ORIENTAÇÃO EM SUPERVISÃO ESCOLAR E ORIENTAÇÃO EDUCACIONAL mesmo e do outro, exercitar a crítica e a autocrítica, colocar-se no lugar do outro, vivenciar a confiança mútua, entre outros objetivos. Ao se constituir na escola um espaço seguro, participativo e comunicativo, torna-se possível o estabelecimento de laços fraternos, o desenvolvimento da autonomia e a construção da cidadania, tão almejada nos pressupostos da educação. E para tanto, é de grande importância respeitar os saberes dos alunos como bem diz Paulo Freire em sua Pedagogia da Autonomia: Respeito aos saberes dos educandos Por que não aproveitar a experiência que têm os alunos de viver em áreas da cidade descuidadas pelo poder público para discutir, por exemplo, a poluição dos riachos e dos córregos e os baixos níveis de bem-estar das populações, os lixões e os ricos que oferecem à saúde das gentes? Por que não há lixões no coração dos bairros ricos e mesmo puramente remediados dos centros urbanos? Essa pergunta é considerada em si demagógica e reveladora da má vontade de quem a faz. É pergunta de subversivo, dizem certos defensores da democracia. Por que não discutir com os alunos a realidade concreta a que se deva associar a disciplina cujo conteúdo se ensina, a realidade agressiva em que a violência é a constante e em que a convivência das pessoas é muito maior com a morte do que com a vida? Por que não estabelecer uma necessária “intimidade” entre os saberes curriculares fundamentais aos alunos e a experiência social que eles têm como indivíduos? Por que não discutir as implicações políticas e ideológicas de um tal descaso dos dominantes pelas áreas pobres da cidade? [...] Por que, dirá um educador reacionariamente pragmático, a escola não tem nada a ver com isso. A escola não é partido. Ele tem que ensinar conteúdos, transferi-los aos alunos. Aprendidos, eles operam por si mesmos (FREIRE, apud INOUE, 1999, p. 65). Diante disso, não é possível esquecer que o poder transformador da escola se dá também pelo exemplo obtido na convivênciadiária, tornando-se: O efeito multiplicador do exemplo A escola é um local privilegiado para a semeadura dos valores fundamentais que garantem a tessitura e a articulação da sociedade como um todo. É 82 Unidade III Re vi sã o: N om e do r ev iso r - Di ag ra m aç ão : N om e do d ia gr am ad or - d at a fundamental restabelecer a dignidade da função docente bem como de todas as ações praticadas no interior da escola. A transformação e o deslocamento das expectativas de sucesso através do simples jogo, ou de levar-se vantagem sobre alguém, para o valor do esforço pessoal, da semeadura, do trabalho, constitui uma tarefa ingente em cuja realização os professores têm muito a contribuir. Valores morais, espirituais, intelectuais, estéticos, religiosos entre outros, não se podem estabelecer por decreto, ou por meio da força. A convivência e o exemplo diário têm um efeito multiplicador impressionante, muitas vezes subestimado (MACHADO apud INOUE, 1999, p. 75). Martins (1992) lembra que o orientador educacional precisa possuir alguns requisitos pessoais, pela responsabilidade que tem no processo das relações interpessoais. Ainda segundo o autor, estas condições pessoais são: • equilíbrio emocional e de personalidade a fim de que não sofra influência pelos problemas do educando nem permita que seus problemas pessoais interfiram em seu trabalho; • empatia para ser capaz de colocar-se no lugar do outro, seja aluno ou colega de trabalho, objetivando melhor compreender os problemas do mesmo; • iniciativa e liderança a fim de transmitir segurança e confiança aos alunos e seus responsáveis; • entusiasmo para contagiar de otimismo as ações a serem desenvolvidas na escola; • estímulo às relações entre as pessoas, nas comunidades a que pertencem e nas instituições da sociedade. Das muitas funções do orientador educacional, a mais desafiadora é a de acreditar que é possível viver, conviver e aprender com as diferenças, nas mais diversas situações. Nada é mais gratificante que contribuir para transformações por meio da construção do conhecimento. Conforme destaca Moscovici (2001), o processo de interação humana supõe comunicação, mesmo havendo intenção contrária, pois o ser humano está sempre comunicando algo, seja por palavras ou por meios não verbais (gestos, postura corporal). O fato de estar na presença de outros modifica a percepção individual e, desta forma, promove interação comunicacional. No dia a dia das atividades pessoais e profissionais, a relação com outras pessoas requer uma busca constante, porém que difere de indivíduo para indivíduo. No contexto educacional, é possível perceber um componente significativo e interessante: a afetividade. Essa questão exige uma maior qualificação das relações humanas nas unidades educacionais e, em consequência, nas relações produtivas. 83 Re vi sã o: N om e do r ev iso r - Di ag ra m aç ão : N om e do d ia gr am ad or - d at a ORIENTAÇÃO EM SUPERVISÃO ESCOLAR E ORIENTAÇÃO EDUCACIONAL Certo é que no momento em que se vive, é de fundamental importância tomar as palavras de Delors (1999), aprender a ser, aprender a conhecer, aprender a conviver, aprender a fazer. Ademais, diante destas situações relacionais e comunicacionais é possível a compreensão da importância do trabalho do orientador educacional como mediador no processo educativo. Assim, na prática, o orientador educacional tem possibilidade de administrar e compreender conflitos, estabelecendo unidade entre o grupo e dialogicidade, criando um clima favorável. À luz do exposto por Antunes (2003, pp. 9-10): [...] cada pessoa é, e sempre será, um verdadeiro universo de individualidade; suas ações, seus motivos, seus sentimentos constituem paradigma único. [...] cada um é portador de um código biológico, uma história particular de vida e um volume imenso de circunstâncias que evoluíram e evoluem de forma dinâmica, tornando absolutamente incomparável . [...] ninguém pode jamais sentir a saudade que sentimos, experimentar a felicidade que vivemos, sofrer a angústia da perda que sofremos e, porque assim somos, constituímos figura ímpar, ser singular no imenso espaço que emoldura nossa passagem pelo tempo. Sabendo uma das dificuldades comunicacionais no processo das relações humanas. Placco (1994, p. 30) expõe que: [...] O orientador educacional, um dos educadores da escola deverá participar de uma ação educacional coletiva, assessorando o corpo docente no desencadeamento de processo em que a sincronicidade é desvelada, torna- se consciente, autônoma e direcionada para um compromisso consciente uma ação pedagógica competente e significativa para os objetivos propostos no projeto pedagógico da escola. As relações humanas podem facilitar o crescimento do grupo. Mas, o que é grupo? Para Weil (1991), grupo é toda reunião de indivíduos em torno de um objetivo comum. Um grupo pode formar-se espontaneamente, por exemplo, um grupo de crianças nos primeiros dias de aula, que se junta para brincar no horário do recreio. Também a formação de um grupo pode ser planejada, como turmas de alunos, de professores, que se pode chamar de grupo organizado. Um grupo é composto por indivíduos, e o seu êxito depende das atitudes dos seus integrantes. Há inúmeras condições para que um grupo seja exitoso em sua produção, eis algumas: a) Simpatia. b) Interesse. 84 Unidade III Re vi sã o: N om e do r ev iso r - Di ag ra m aç ão : N om e do d ia gr am ad or - d at a c) Comprometimento. d) Respeito. Destarte, a formação de um grupo é um processo que tem como mola propulsora a decisão objetiva, em torno da qual os indivíduos se agregam e criam seus compromissos, obrigações e modos de interação, ou seja há um sentido único, que é conhecido e partilhado por todos. Essa direção, sentido único inclui a interdependência, ou seja, a visão de que sozinho nenhum membro consegue realizar o objetivo. De modo geral, a participação em um grupo é espontânea, conquistada ou desenvolvida. De sorte que, ao orientador educacional, cabe articular suas ações sempre estimulando a cooperação, pois com o partilhar de sua autoridade com seus colaboradores se fortalece e adquire legitimidade em suas funções. Assim, compartilhar liderança implica em confiar nas pessoas, acreditando em suas potencialidades. Parafraseando Fullan e Hargreaves (2000), liderança compartilhada não significa perder poder, mas promover envolvimento e aprendizagem de todos os atores, propiciando, assim, transformações necessárias ao processo educativo do século XXI. As pessoas necessitam fazer parte de um contexto, de um grupo, querem ser ouvidas, ser vistas, querem relacionar-se. Um bom relacionamento entre pessoas ajuda na constituição e formação pessoal do ser. O trabalho da orientação educacional faz parte de um todo da escola, sendo, portanto, a mediação, o seu papel principal. Nessa perspectiva, o profissional da orientação articula a reflexão necessária entre a realidade e as representações que se fazem dela, entre o contexto e a cultura escolar, entre o concreto e o simbólico. Dessa forma, para Grinspun (2006, p. 71) “esta gama de aspectos que se entrecruzam [...], na verdade são dados, [...] para que possamos promover os meios, disponibilizar as condições para uma qualificação na construção da subjetividade”. Sua atuação faz-se sempre em consonância com o trabalho dos demais membros da equipe técnica, que podem ser o diretor, vice-diretor ou assistente de direção, coordenador pedagógico ou outros. Cada um desses profissionais desenvolve determinadas tarefas para que a escola possa desempenhar seu papel de
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