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Prof. Alexandre Furniel UNIDADE III Fundamentos da Sociologia da Educação Analisar as contribuições teóricas no âmbito da Sociologia da Educação desenvolvidas no século XX. Nesta unidade, o foco do estudo será: I. Althusser e a escola como aparelho ideológico do Estado. II. Pierre Bourdieu e os esquemas reprodutores. III. Educação e hegemonia em Gramsci. IV. Educação e planejamento em Mannheim. Objetivos desta unidade Como as transformações sociais ao longo do século XX influenciaram o pensamento educacional? A escola conduz à conformação social ou à sua transformação? Estaríamos condenados a reproduzir as estruturas sociais indefinidamente? Questão central Para Althusser, a permanência da sociedade capitalista depende da reprodução de seus componentes econômicos (força de trabalho, meio de produção) e da reprodução de seus componentes ideológicos. As instituições encarregadas pela manutenção do status, que são: Aparelhos repressivos do Estado: polícia e Judiciário. Aparelhos ideológicos do Estado: religião, mídia, escola e família. A educação escolar era vista por Althusser como difusora das ideologias que formam as concepções e as práticas dos sujeitos em sociedade, contribuindo para a reprodução das relações sociais de produção, uma vez que torna invisível e natural a divisão em classes sociais, determinando a posição de cada ser humano na engrenagem da produção capitalista. A formação dos trabalhadores no sistema escolar é considerada fundamental para o desenvolvimento das forças produtivas e torna-os capacitados tecnicamente para as atividades nas empresas e concordantes com as relações sociais de produção existentes na sociedade. Aparelhos ideológicos do Estado Além do desenvolvimento de competências de leitura, escrita e cálculo, das técnicas e da cultura humanística, os trabalhadores aprendem o respeito à ordem social, que se inicia com o respeito às regras de conduta, da moral dominante e das leis do Estado, segundo os preceitos que interessam às classes dominantes. Desse modo, os alunos oriundos das camadas populares assimilam com a educação escolar a submissão à ordem social dominante. Aparelhos ideológicos do Estado A ideologia é uma concepção que orienta a prática dos agentes em sociedade. As ideologias constituem estruturas de pensamento e avaliação do mundo, as ideias que as pessoas utilizam para compreender como o mundo social funciona, qual o seu lugar nele e o que devem fazer. Para Althusser, as condutas práticas são orientadas por ideologias que formam nossas ideias. Sempre agimos de acordo com uma ideologia, quer sejamos favoráveis ou contrários à sociedade capitalista. É a ideologia que dá significado aparentemente coerente para os fenômenos que vemos na sociedade. A ideologia Como a escola transmite a ideologia? A escola atua ideologicamente através de seu currículo, de forma direta, através de conteúdos que expressam o desejo de manutenção das estruturas sociais existentes. A escola tende a conduzir as classes subordinadas à submissão e à obediência, enquanto as pessoas das classes dominantes aprendem a comandar e a controlar. A ideologia na escola Embora cada aparelho ideológico, como igrejas, sindicatos e meios de comunicação, desempenhe uma função que lhe é peculiar, cabe à escola o papel dominante nas sociedades capitalistas, pois na mais tenra idade das crianças vai lhes incutindo os valores próprios das ideologias das classes dominantes. Destaca-se a contribuição dessa tendência teórica principalmente no que diz respeito à denúncia de uma política educacional tecnicista e da ausência de uma “autonomia da educação em face das relações sociais”. Aparelhos ideológicos do Estado A escola, quando considerada como um dos aparelhos ideológicos do Estado, é responsável pelo(a): a) Manutenção e pela perpetuação das relações sociais. b) Surgimento de uma consciência crítica e revolucionária. c) Movimento de vanguarda da sociedade de tipo capitalista. d) Formação da pedagogia do oprimido e do anarquismo pedagógico. e) Transformação social a partir da mobilização política da juventude. Interatividade Pierre Bourdieu (1930-2002) foi um dos intelectuais mais conhecidos e respeitados no mundo acadêmico nas últimas décadas. O pensamento de Durkheim serviu de base e ofereceu os métodos fundamentais para a construção de uma sociologia da educação muito influente no século XX. Um dos mais importantes sociólogos a analisar a educação contemporânea sob a influência de Durkheim foi Bourdieu. Pierre Bourdieu e os esquemas reprodutores Bourdieu produziu uma síntese teórica entre o modelo durkheimiano e o estruturalismo. O estruturalismo é uma corrente teórica que busca desvendar o peso das estruturas sociais sob os sujeitos. Seu ponto de partida é que os indivíduos estão submetidos ao controle das estruturas sociais. Os sujeitos são vistos como espécies de marionetes das estruturas dominantes. Para Bourdieu, a teoria de Durkheim e o estruturalismo permitem demonstrar como os indivíduos, em sua ação, reproduzem as orientações determinadas pela estrutura social vigente. Pierre Bourdieu e os esquemas reprodutores Os indivíduos estão submetidos aos desígnios da sociedade, fazem o que suas estruturas determinam e, ainda, são iludidos pelos discursos dominantes, que os fazem pensar que sua ação é resultante de vontade própria. Em 1964, Bourdieu publicou o livro “Os herdeiros”, em que critica o discurso dominante de que a escola possui caráter igualitário. Afirma que, por trás da aparente neutralidade, a escola reproduz as relações sociais e de poder vigentes. Sob a aparência de critérios escolares, existem critérios sociais de triagem e de seleção dos indivíduos para ocupar determinados postos na vida. A influência do estruturalismo A violência simbólica diz respeito à concepção cultural de grupos e classes dominantes, que é imposta a toda a sociedade através do sistema de ensino. O trabalho pedagógico é visto como a inculcação do “arbitrário”, compreendido como a concepção cultural de grupos e classes dominantes, que é imposta a toda a sociedade através do ensino. A pedagogia se impõe a inculcar valores e normas. Pierre Bourdieu: violência simbólica Bourdieu e Passeron chamavam de trabalho pedagógico a inculcação do arbitrário, que deve durar bastante para que o educando “naturalize” seu conteúdo, encarando-o como natural, como evidentemente correto em si mesmo, o bastante para produzir uma “formação durável”. Na medida em que o educando interioriza os princípios culturais que lhe são impostos pelo sistema de ensino – de tal modo que, mesmo depois de terminada sua fase de formação escolar, ele os tenha incorporado aos seus próprios valores e seja capaz de reproduzi-los e transmiti- los aos outros – constituindo o que Bourdieu chamou de habitus. O trabalho pedagógico A noção de habitus se refere à existência de um conjunto de saberes e práticas interiorizados, que se forma em cada indivíduo lado a lado com a capacidade de pensar e agir por si mesmo, com base na interiorização das experiências e das circunstâncias existentes na sociedade. Compõem o habitus do agente todas as disposições adquiridas e desenvolvidas no seu processo de socialização e incorporadas de modo a possibilitar-lhe a formação de concepções e habilidades necessárias para a sua vida individual e social. Habitus Para Bourdieu e Passeron, todo sistema de ensino institucionalizado visa, em alguma medida, realizar de modo organizado e sistemático a inculcação dos valores dominantes e reproduzir as condiçõesde dominação social que estão por trás de sua ação pedagógica. A partir de dados empíricos, os autores demonstram que a “condição de classe de origem” dos alunos determina a probabilidade de sucesso escolar. Tal situação reproduz a “condição de classe de chegada” desse aluno, isto é, o tipo de habitus que adquiriu, o “capital cultural” ao qual teve acesso e, em especial, a posição na hierarquia econômica e social a que chegou. Os esquemas reprodutores O esquema teórico desenvolvido por Pierre Bourdieu concebe a escola como espaço de: a) Reprodução das relações sociais. b) Transformação social. c) Manifestação do senso comum. d) Obtenção do conhecimento científico. e) Valorização do saber humanístico. Interatividade Antonio Gramsci (1891-1937) foi jornalista e ativista político. Viveu encarcerado por vários anos pelo regime fascista da Itália e gravemente enfermo. Deixou um legado de 2.500 páginas de anotações, os famosos “Cadernos do cárcere”. O contexto histórico de sua reflexão é o período entre a Primeira e a Segunda Guerras Mundiais, na Itália, sob o regime fascista de Mussolini. Sua motivação política era elaborar um pensamento fiel ao marxismo revolucionário e ao projeto de construção de uma sociedade socialista. Educação e hegemonia: Gramsci A importância das ideias de Gramsci está em sua capacidade de atualizar o pensamento de inspiração marxista, de modo a adequá-lo às características das sociedades europeias de capitalismo avançado da primeira metade do século XX. Nos “Cadernos do cárcere”, desenvolveu reflexões teóricas importantes no campo da pesquisa educacional e desenvolveu uma proposta de escola unitária, que promoveu a educação humanista voltada para a formação intelectual e moral necessária para a construção de uma sociedade igualitária e livre. Educação e hegemonia: Gramsci Distinção política entre Oriente e Ocidente Oriente: países onde o Estado concentra todo o poder e a sociedade civil é fraca, pouco organizada, sem capacidade de contrapor-se a tal poder concentrado no Estado. O único modo de lutar pelo poder em tal situação é investir contra o Estado. Ocidente: países onde a sociedade civil tem organização, é múltipla, organizada e tem condições de dividir com o Estado as estruturas de poder político; sociedades com mercado interno forte e vida política plural. O poder está diluído entre o Estado e a sociedade civil. Educação e hegemonia: Gramsci Nas sociedades ocidentais, o poder não está em um lugar só, está em muitos lugares ao mesmo tempo. Está no governo, mas também está nas empresas, nos clubes, no mercado, nos partidos, na cultura. Para Gramsci, para se chegar ao poder, os grupos políticos não podem fazer uma política de insurreição contra o Estado. É preciso uma revolução no cotidiano. Desse modo, a política deve ser feita na sociedade, em todos os espaços disponíveis. Enquanto o Estado é visto como força, coerção, dominação, a sociedade é o espaço do consenso e da persuasão. Educação e hegemonia: Gramsci Tipos de intelectuais Intelectual orgânico: surge em ligação direta com os interesses da classe que ascende ao poder. Busca dar homogeneidade e coerência interna à concepção de mundo que interessa a essa classe. Sua função é fazer com que todos pensem com a cabeça da classe dominante. Os dominados também possuem seus intelectuais, que procuram desenvolver uma contra-hegemonia. Intelectuais tradicionais: foram intelectuais orgânicos das classes que eram então dominantes, como o clero, pois os padres deram coerência e organicidade à dominação da nobreza. Os intelectuais e a disputa pela hegemonia A função dos intelectuais é ser um instrumento de construção e consolidação de uma vontade coletiva, de um consenso social em torno de ideias por eles veiculadas, das concepções de mundo do bloco histórico ao qual estão ligados. Quem forma os intelectuais? O intelectual é formado na escola. O indivíduo precisa passar por uma formação escolar que lhe dê um acesso especial à cultura. Os intelectuais e a disputa pela hegemonia Gramsci observou que na sociedade moderna a ciência misturou-se à vida cotidiana de um modo nunca visto antes – as atividades práticas se tornaram complexas e especializadas. De um lado, forma-se a escola humanista, que dá uma formação clássica destinada a desenvolver em cada indivíduo uma cultura geral ou o poder fundamental de pensar e saber se orientar na vida. De outro, surge a escola especializada, voltada para a formação específica dos diferentes ramos profissionais. A escola e a formação dos intelectuais Defende a escola unitária, que teria caráter formativo e objetivaria equilibrar de forma equânime o desenvolvimento da capacidade de trabalhar manualmente e o desenvolvimento das capacidades de trabalho intelectual. Para Gramsci, a escola deveria se abrir para todas as classes, para formar seus próprios intelectuais. Todos devem ter acesso a uma escola que lhes permita uma formação cultural básica, que possa ser eventualmente expandida para que a “batalha das ideias” não seja sempre ganha pela mesma classe social. Gramsci e a defesa da escola unitária Na concepção de Gramsci, a escola deve unificar a formação, de modo a abranger a educação tradicional com forte conteúdo teórico, literário, filosófico e científico para o trabalho prático. Segundo ele, é necessária uma escola única, inicial de formação geral, humanista, formativa, que equilibre de modo justo o desenvolvimento da capacidade de trabalhar manualmente e o desenvolvimento das capacidades de trabalho intelectual. Gramsci e a defesa da escola unitária Gramsci critica a formação educacional baseada na separação hierárquica entre trabalho intelectual e braçal, pois todos os seres humanos são intelectuais e todos os tipos de trabalho envolvem alguma forma de elaboração mental para a sua execução. Para Gramsci “todos os homens são intelectuais, mas nem todos os homens têm na sociedade a função intelectual”, pois não há atividade humana da qual se possa excluir toda intervenção intelectual. Assim, todo homem, fora de sua profissão, desenvolve uma atividade intelectual, seja como filósofo, artista, e é capaz de ter uma concepção de mundo e suscitar novas maneiras de pensar. Gramsci e a defesa da escola unitária Portanto, valorizava a escola humanista tradicional porque ela promovia uma formação mais abrangente para os educandos, mas também valorizava o ensino profissionalizante e propunha uma unificação de ambas. Desse modo, defende uma educação tecnológica, ligada às necessidades práticas, mas simultaneamente formuladora dos saberes mais abrangentes sobre a humanidade, que promove a participação política organizada na vida social. Gramsci e a defesa da escola unitária A escola unitária defendida por Antonio Gramsci diz respeito à: a) Educação para a revolução, associada à formação moral. b) Educação tradicional com inovação tecnológica. c) Educação humanista sem ciências exatas. d) Educação libertadora com princípios marxistas. e) Educação profissionalizante, associada à formação humanística. Interatividade Karl Mannheim (1893-1947) passou a ser conhecido em 1929 quando publicou o livro “Ideologia e utopia”, considerado um clássico da Sociologia. Mannheim vivenciou os conflitos na Segunda Guerra Mundial na Alemanha nazista. Migrou para a Inglaterra e lecionou Sociologia na London School of Economics. Propunha em seus textos o planejamento racional da educação das novas gerações como meio para a construção de uma civilização democrática. Educação e planejamento em Mannheim Karl Mannheim foi fortemente influenciado pelo pensamento de Max Weber, mas buscou substituir o pessimismo da teoria sociológica weberiana pela ideia de intervenção racional e planejamento na área educacional. Técnica social: seriam os meios utilizados para um adequado controle social, desenvolvido por meio de métodos que possibilitem que o comportamento humano seja influenciado “[...] de maneira que este se enquadre nos padrões vigentes da interação e organização sociais”. Educação e planejamento em Mannheim Para Mannheim, a educação é vista como possibilidade de desenvolvimento e construção do equilíbrio social, sem que se transforme em técnica de manipulação. Empenhou-se no estudo das possibilidades de adaptação dos sistemas escolares às exigências apresentadas na sociedade moderna. Para ele, a escola deveria desempenhar essa função essencial, tendo em vista que as famílias e os grupos comunitários tendem a perder a preeminência na formação educacional dos indivíduos. Educação e planejamento em Mannheim Para Mannheim, cabe à escola a função de transmitir as informações consideradas importantes no arcabouço cultural e técnico da sociedade na qual está inserida. Também é dever da escola formar as novas gerações com atitudes e valores favoráveis à procura dos conhecimentos necessários para a vida em sociedade, sem descuidar da imprescindível função de qualificar o aluno para uma carreira profissional. Mannheim concebe que a escola pode tanto contribuir para a manutenção da ordem social quanto para a sua alteração. Educação para a democracia Para Mannheim, “a tarefa da educação não é simplesmente formar pessoas ajustadas à situação presente, mas também pessoas capacitadas a operarem como agentes do desenvolvimento social”. Desse modo, a educação pode contribuir para a socialização dos indivíduos de acordo com os pressupostos da democracia, tornando-os preparados para um comportamento democrático, baseado no diálogo e na resolução pacífica dos conflitos, e não na imposição da vontade de cada um por meio do uso da força. Educação para a democracia Mannheim retoma a formulação de Max Weber sobre a educação e dá uma nova perspectiva, fugindo, de certo modo, do pessimismo weberiano. O mundo moderno não tem apenas custos ou ameaças à liberdade, a modernidade traz também esperanças e valores sociais solidários. Defendia uma sociedade que fosse essencialmente democrática, uma democracia de bem-estar social dirigida pelo planejamento racional. Mannheim e a luz no fim do túnel A principal contribuição da democracia moderna é a possibilidade de que todas as camadas sociais venham a contribuir com o processo educacional. A sociologia é vista como a ciência capaz de fazer essa síntese. Tendo vivido os horrores do nazismo, Mannheim identificou neste regime a irracionalidade, a desumanidade e a barbárie. Só a democracia poderia fazer surgir a luz no fim do túnel. A superação de formas atrasadas e tradicionais de educação poderia ser fonte de otimismo se tratada a partir da visão democrática. Educação para a democracia Nesta unidade vimos uma síntese das concepções teóricas da sociologia educacional do século XX. O eixo dessas análises foi mostrar o caminho que tomou a sociedade industrial moderna, as transformações que ela impôs a todos os setores sociais e em particular para a área da educação. Síntese Por que a inserção das camadas populares nos sistemas educacionais é vista com otimismo por Mannheim? a) Porque amplia o mercado consumidor de livros. b) Porque amplia a oferta de mão de obra especializada. c) Porque permite o acesso às elites dos membros talentosos das classes inferiores. d) Porque reduz as taxas de analfabetismo na sociedade. e) Porque conduz a sociedade a padrões mais rígidos de controle social. Interatividade ATÉ A PRÓXIMA!
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