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Pensamento Social Brasileiro - Slides de Aula Unidade II

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Unidade II 
 
 
 
 
PENSAMENTO SOCIAL BRASILEIRO 
 
 
 
 
 
 
Profa. Neusa Meirelles 
Tendências do pensamento social brasileiro e a 
sociologia 
 O pensamento social brasileiro abrange distintas tendências 
de reflexão sobre a realidade brasileira, sobre o poder, 
cotidiano e formas de sociabilidade, formando um conjunto de 
modalidades de problematização da vida social, e respostas 
ancoradas na ciência e filosofia, daí sua afinidade com o 
pensamento sociológico: ambos problematizam as condições 
sociais presentes no ambiente em que foram produzidos e 
buscam respostas pertinentes. 
 
Pensando o Brasil, integralistas e comunistas dos 
anos 20 e 30 
 Nos anos 20 e 30 do século XX, duas modalidades de 
construção teórica da realidade brasileira estavam em 
confronto no ambiente político brasileiro, refletindo posições 
ideológicas radicalmente distintas: de um lado o fascismo, 
de outro, o comunismo vitorioso desde 1917 na Rússia; 
 As duas tendências vinculadas à expressão política de 
contingentes de trabalhadores do capitalismo industrial 
urbano, apesar de a economia brasileira ser agroexportadora, 
iniciando a substituição de importações e sofrendo efeitos da 
crise econômica de 1929. 
 
A Semana de Arte Moderna 
 As mudanças que viriam no panorama político e intelectual 
brasileiro, e de São Paulo em particular, já se faziam anunciar 
no âmbito cultural pela Semana de Arte Moderna, evento que 
marcou o movimento modernista em São Paulo, cuja dimensão 
estética, de relacionamento entre o popular e o erudito, de 
maior relevância para a cultura brasileira, acrescentava-se o 
nacionalismo estético de Mario de Andrade e o antropofagismo 
de Oswald de Andrade. 
Modernismo 
 Havia no intelectualismo modernista de 22 uma dimensão 
reacionária, representada por vários intelectuais que 
integraram o movimento integralista; 
 As ideias fascistas no Brasil representavam a expressão 
extremada da praxis conservadora; 
 O discurso integralista não era de fundamental importância, 
porque nasceu vazio, embora reacionário extremado, e 
inserido na história brasileira. 
Integralismo 
 O Integralismo propunha a utopia nacionalista da autonomia 
econômica (quando o capitalismo se fortalecia na expansão 
internacional) além do desejo das elites brasileiras por uma 
ordem social conseguida de cima para baixo (democradura) 
ou uma democracia à brasileira. 
 A Ação Integralista, fundada em outubro de 1932, depois da 
chamada “revolução constitucionalista”, explicitava o caráter 
conservador, religioso do movimento, atraiu intelectuais, 
juristas de renome, despertando certo envolvimento patriótico 
e intervencionista do qual também participavam os militares. 
 Militantes fardados marchavam vestindo camisas verdes, com 
bandeiras, símbolos, erguendo o braço na saudação: Anauê! 
 
Marxismo 
 A crítica marxista à sociedade burguesa confirmava a visão 
que muitos intelectuais já haviam elaborado sobre essa mesma 
sociedade, com suas contradições, injustiças e problemas. 
O Partido Comunista, pela direção da III Internacional, assumiu 
uma linha francamente proletária, promovendo a exclusão dos 
intelectuais da direção, embora tais medidas não impedissem 
que intelectuais e artistas de todas as áreas fossem 
simpatizantes e militantes do Partido. 
 Nas publicações do partido havia discussões teóricas em torno 
de questões ideológicas, como as questões políticas, aliás, 
uma tradição que continua nos dias atuais; apesar de existir a 
maior parte do tempo na clandestinidade. 
Os anos 30 
 Os anos 30 sinalizaram mudanças sensíveis no ambiente 
político e econômico brasileiro; Boris Fausto (1978) comenta 
que os “barões do café”, dominantes na política, não tinham 
como opositores uma burguesia industrial, mas havia uma 
“complementaridade básica entre interesses agrários e 
industriais, temperada pelas limitadas fricções”; 
 No equilíbrio instável formado, apareciam duas forças 
políticas: classe média, associada aos militares, e a classe 
operária, em parte politizada, e alvo da articulação do poder 
do estatal. Em São Paulo, esse cenário é francamente hostil 
aos interesses de setores da oligarquia cafeeira, que lideraram 
o movimento de 32. 
 
Estado Novo 
 O Estado Novo foi uma ditadura que instituiu um sistema de 
“compromisso” entre segmentos das elites e os populares, 
afastou de vez a oligarquia cafeeira do poder, cooptando 
alguns na qualidade de interventores; as novas configurações 
remetem para o rearranjo dos dispositivos de poder, para os 
quais figuraram como forças externas: a II Guerra que levou 
o Brasil de Vargas a fechar acordo com os EUA, para 
permanência das tropas americanas em Natal, e mais 
empréstimos, em perfeito entendimento, posteriormente 
reafirmado pela “política da boa vizinhança” e como forças 
internas, a desarticulação da república oligárquica paulistana, 
em uma articulação de compromissos personalistas, um 
traço que seria reforçado mesmo durante o Estado Novo, 
e no populismo que viria a seguir. 
 
Criação da Escola de Sociologia e da FFCLH da USP 
 Quando a elite paulista ainda amargava as derrotas de 30 
e 32, e identificava fatores de seu insucesso, deu-se a criação 
de uma instituição privada destinada a ampliar e reforçar 
a competência política e administrativa da elite paulista: 
a Escola Livre de Sociologia e Política de São Paulo, fundada 
em 27 de abril de 1933; a ELSP tinha finalidade elitista 
declarada, enquanto a FFCLH da USP, criada em 1934, também 
a tinha, mas não a declarava. Os professores das duas 
instituições mantinham relações estreitas, caracterizando 
um convívio acadêmico singular. 
 
Antropologia e Sociologia, figuras centrais 
 Emilio Willems, alemão imigrante, formado em Economia pela 
Universidade de Berlim, e que lecionava no Paraná e Santa 
Catarina. 
 Egon Schaden, brasileiro, neto de alemães, assistente de 
Emilio Willems, (Antropologia, Etnografia e Etnologia voltadas 
para o estudo das populações indígenas brasileiras). 
 Herbert Baldus, diretor do Museu Paulista e ELSP, etnógrafo 
e etnólogo, teórico e empírico. Orientador de Florestan 
Fernandes, mestrado na ELSP (1949) em Antropologia, com 
Organização social dos Tupinambá, seguindo-se a Tese de 
Doutorado em 1951, Função Social da Guerra entre os 
Tupinambá. 
 
Caio Prado Júnior 
 Caio Prado Júnior, paulista de família tradicional, intelectual, 
foi empresário de sucesso e militante comunista, teórico 
heterodoxo e marxista; sua posição de método, o materialismo 
histórico dialético, com variações, conduz a construção do 
objeto de conhecimento pelo sujeito, mas por um processo de 
tecedura entre as condições materiais objetivas (selecionadas 
como significantes pelo sujeito, e tomadas a partir de dados de 
natureza empírica) e as ideias e conceitos que municiam 
o sujeito para tratamento da relevância desses dados na 
construção do objeto. A relação (dialética) entre o empírico 
e o conceitual com a intermediação do sujeito é, portanto, 
central ao método. 
 
Interatividade 
Qual das alternativas abaixo está errada sobre as relações entre 
Brasil e EUA no quadro da II Guerra? 
a) A primeira estratégia foi a política de “boa vizinhança”. 
b) Aumento das vantagens comparativas do capital nacional no 
processo de expansão multinacional. 
c) A ideia de progresso foi sendo substituída pela ideia de 
desenvolvimento. 
d) O papel do Estado, como promotor e agente da economia, foi 
sendo identificado na figura do governante. 
e) A propaganda criou a imagem positiva do american way of 
life, e negativa, de pobreza e de sacrifício, associada à URSS, 
ao seu povo, e modo de vida. 
 
Pensando o Brasil com as obras de Caio Prado Jr., 
Gilberto Freyre, SergioBuarque 
 Do ponto de vista metodológico, Caio Prado se valeu do 
materialismo histórico dialético, mas com adaptações às 
condições brasileiras. 
 Gilberto Freyre, conforme ele mesmo, desenvolveu o “método 
do ensaio de sociologia genética e de história social, 
pretendendo fixar e às vezes interpretar alguns dos aspectos 
mais significativos da formação da família brasileira” (1948: 50). 
 Sergio Buarque se municiou de um fazer weberiano para 
construir uma história cultural do Brasil, sem comparações 
nem construção de tipologias, procurando captar, na figura 
de personagens típicas, o “espírito” de um período. 
 
Gilberto Freyre e Sergio Buarque 
 Gilberto Freyre focalizou a articulação peculiar, escravista em 
terras brasileiras, entre dois universos culturais distintos: 
o do europeu português, da Casa Grande e o do escravo 
africano, notadamente aquele do serviçal, descendo a 
detalhes minuciosos e significativos das práticas sociais, 
surpreendendo na intimidade das casas grandes, relações 
confessadas e ocultadas com as senzalas, para entender e 
interpretar as complexas relações de arrogância e submissão 
existentes. 
 Em contrapartida, Sergio Buarque metaforicamente buscou as 
raízes do Brasil, uma aproximação poética entre uma realidade 
vivida, na experiência dos cotidianos da história, e as 
profundas raízes das grandes árvores nacionais. 
Caio Prado Jr. 
 Caio Prado se colocou na tarefa de traçar linhas mestras da 
evolução política, e depois da formação econômica do Brasil. 
Parece significativa a substituição de uma palavra “evolução” 
por “formação”: evolução dizendo respeito à política, enquanto 
formação dizendo respeito à economia. Para Caio Prado, os 
fatos da economia devem ser compreendidos na sua 
peculiaridade de realidades nacionais; embora possa haver 
semelhanças entre realidades, por exemplo, brasileiras e 
europeias, não se pode admitir a priori um curso assemelhado. 
Por isso o autor questiona e desacredita algumas das teses de 
marxistas brasileiros (alguns) que insistiam em priorizar a 
teoria em detrimento da evidência empírica, a exemplo da 
debatida questão dos “restos feudais” de um feudalismo 
que não existiu em terras brasileiras. 
 
Liberal e autoritário, um discurso conservador 
 Esse discurso “liberal democrático autoritário” predominou na 
Constituinte de 1946, e permaneceu tendência ideológica, 
sendo repetido na história política brasileira. Uma variação 
desse discurso, constituindo uma tendência, residiu em 
colocar no Estado a realização do futuro desejado para o “bem 
do povo e progresso da nação”. 
 Por decorrência, na medida em que cabia ao Estado, e não à 
sociedade, concretizar no futuro esse “progresso”, cumpria 
eleger um governo que tivesse o mesmo compromisso, que 
defendesse todo o povo, protegendo a todos de eles mesmos, 
ou “dos que perturbam a ordem com ideias estranhas ao 
caráter brasileiro”. Em linhas gerais, esse raciocínio constituiu 
a base do populismo. 
 
Panorama político populista 
 Com a IIª Guerra o Brasil entrou na área de influência dos EUA, 
iniciado com a política de “boa vizinhança”, e que se 
consolidou na história política e econômica do Brasil; a ideia 
de progresso, (positivista) foi sendo substituída pela ideia de 
desenvolvimento associada à industrialização e ao papel do 
Estado, e ao american way of life. 
 Os partidos políticos PSD, PSP, PTB e UDN eram controlados 
pelos “nomes” da política populista, mas Vargas venceu a 
eleição presidencial de 1950 com a coligação PTB e PSP. 
Quanto ao PCB, condenado à ilegalidade, vivia a 
clandestinidade, mas no ambiente eleitoral populista, 
“votos são votos”. 
 
 
 Ambiente político populista no governo Vargas 
 
 Confronto entre interesses do capital nacional (Petrobrás, CSN) 
e os do capital externo, norte-americano (nacionalismo X 
imperialismo). 
 Oposição moralista (corrupção) que levou ao suicídio de Vargas. 
 No meio urbano – a industrialização com a participação do 
Estado expandiu a economia, estimulou a urbanização 
acelerada. 
 No meio rural – a ordem tradicional patrimonial mantinha 
privilégios, nas grandes fazendas de pecuária e latifúndios 
improdutivos, avanço sobre terras tidas como devolutas, 
um processo considerado “normal” na ordem tradicional. 
 
 
Anos JK (1955-1960), modernização conservadora e 
populismo bossa nova 
 
 Nacionalismo “parceiro” das multinacionais: montadoras 
no ABC, urbanização, Brasília, aumento da dívida externa. 
 Liberdade política: o PCB gozava de “clandestinidade 
autorizada” (posição que somente um presidente bossa-nova 
poderia permitir); o partido admitia que setores ligados ao 
imperialismo econômico e político dos EUA não teriam 
interesse em golpes ou ditaduras (a história desmentiu). 
 Oposição militar: Aeronáutica (Aragarças) e Marinha. 
 Ambiente intelectual: construção teórica e política da formação 
social brasileira em distintas elaborações teóricas; nacional e 
desenvolvimento, palavras empregadas como categorias de 
análise e expressão de realidades históricas, sociais. 
 
Ambiente político e “neutralidade” das ciências sociais 
Influência do ambiente político na trajetória do pensamento 
social brasileiro e no ambiente universitário da USP: 
 Florestan Fernandes: a “sociologia paulista”, pesquisa e 
produção teórica sobre transformação social no Brasil; 
 Ruy Coelho, Maria Isaura Pereira de Queiroz, Antonio 
Candido, Asis Simão, pesquisa das questões culturais 
emergentes nas novas condições históricas. 
 Os efeitos do “desenvolvimentismo brasileiro”, segundo Bosi 
(1977: VIII): “no plano macroeconômico: o triunfo das 
multinacionais; no plano social: a reprodução acelerada da 
divisão de classes; no plano político: o governo autoritário, a 
tecnocracia; no plano cultural: a mass comunication e a 
repressão”. 
 
Pensar o desenvolvimento é refletir sobre a dimensão 
política 
 Entender a integração da economia nacional ao contexto 
dinâmico da economia internacional sob a hegemonia do 
capitalismo monopolista dos USA. 
 O pensamento social brasileiro colocava como seu objeto de 
estudo as potencialidades e possibilidades de mudança social 
e econômica. 
 Aos sociólogos cabia o exame crítico da metodologia, os 
aspectos relevantes como objetos de pesquisa e a dimensão 
política do fazer sociológico. 
 
 
 Novos temas e áreas de pesquisa em Sociologia 
 
 Resultado da aproximação entre campos das ciências sociais: 
a. Sociologia e Economia: Sociologia do Desenvolvimento; 
b. Sociologia e Filosofia: Sociologia do Conhecimento, 
Sociologia Política e Sociologia da Comunicação; 
c. Sociologia e Direito: Sociologia Jurídica e Sociologia 
Política, favorecendo exame crítico da ordem social em sua 
dimensão normativa, e a análise crítica das práticas 
normativas operantes em seu avesso; 
d. Sociologia e História: favoreceu a crítica a alguns modelos 
importados de interpretação da sociedade brasileira. 
 
Sociologia e mudança social 
 Dos anos 50 em diante a sociologia passou a analisar o 
processo de mudança social que o Brasil passava, identificar, 
ou mesmo antecipar os problemas eventuais que tais 
mudanças propiciariam, bem como fundamentar a elaboração 
de políticas adequadas para diminuir os custos, ampliando os 
efeitos positivos; 
 Nesses tempos de mudança o diagnóstico sociológico adquiriu 
importância para “clarificação do horizonte cultural dos grupos 
empenhados nos processos de mudança e na influência 
construtiva que exerce na precipitação das polarizações 
ideológicas, variavelmente ignoradas, esquecidas ou 
encobertas”, como afirmou Florestan Fernandes (1962: 5). 
 
Ambiente político e ideologização 
 O processo de ideologização do pensamento social brasileiroabrangeu a dimensão teórica das tendências dos partidos 
políticos. 
 A reflexão sobre distintas concepções acerca do papel do 
Estado, sentido e conteúdo das alternativas de política 
econômica; concepções presentes e de futuro. 
 A esquerda elaborou contribuição original com incorporação 
seletiva do pensamento teórico de base marxista. 
 A direita desenvolveu programas assistencialistas, com apoio 
dos EUA, de caráter político ideológico (Peace Corps), e IPES 
e IBAD atuavam no meio político, financiando campanhas 
eleitorais e outras de claro teor ideológico (Guerra Fria). 
 
Interatividade 
Qual das proposições está incorreta sobre tendências do 
pensamento social acadêmico entre 1950 e 1960? 
a) As ciências sociais passavam por aproximação entre os 
campos, dando origem a novos temas e linhas de pesquisa. 
b) As tendências de direita e esquerda, clássicas ao campo 
político burguês, influíam no pensamento social brasileiro. 
c) O pensamento social brasileiro abrangia a expressão política 
de distintas “versões” para o desenvolvimento. 
d) A Sociologia garantia a objetividade e mantinha a neutralidade 
do conhecimento científico elaborado. 
e) Nacionalismo e desenvolvimento eram temas centrais ao 
pensamento social. 
 
Sociologia: Florestan Fernandes 
 Em 1959 Florestan Fernandes lançava uma obra clássica na 
sociologia brasileira: Fundamentos Empíricos da Explicação 
Sociológica. Seu propósito à época era discutir metodologia 
em sociologia ao longo de um percurso em três etapas, todas 
com foco em sociologia: de uma introdução ao raciocínio 
científico na sociologia, o livro continua para a reconstrução 
da realidade (parte I), avança para discutir os problemas da 
indução (parte II), e finalmente (parte III) entra na discussão do 
método de interpretação funcionalista. A questão central da 
obra reside em discutir o que significa reconstruir a realidade 
nas ciências sociais. 
 
Florestan, abordagem crítica 
 Octavio Ianni (1996: 25) ressalta duas características da 
sociologia de Florestan Fernandes: 
a) Acompanha a trajetória de lutas do povo brasileiro desde as 
lutas dos povos indígenas, a inserção do negro na sociedade 
de classes, as lutas de trabalhadores do campo e da cidade 
pela conquista de direitos sociais; 
b) Constrói uma abordagem crítica na análise da dinâmica das 
estruturas sociais, discutindo aspectos teóricos avançando 
na análise e interpretação das condições e possibilidades de 
transformação social, valendo-se da produção da sociologia 
clássica e contemporânea, além do marxismo. 
 
Florestan, relações de sentido, mediação: o fazer 
sociológico 
 Trabalhar as relações de sentido entre o “momento teórico” 
e o “momento prático”, o que se explicita como “momento 
político”: as noções de burguês e de burguesia entendidas 
como categorias histórico-sociais e “como meios heurísticos 
legítimos da análise do desenvolvimento do capitalismo no 
Brasil” (FERNANDES,1976: 20); mas a especificidade brasileira 
implica em relacionar dois modelos, o de sociedade burguesa 
e o patrimonialista desenvolvido no Brasil. É essa relação que 
Florestan focaliza quando afirma que “era preciso extrair o 
ethos burguês do cosmos patrimonialista em que fora inscrito, 
graças a quase quatro séculos de tradição escravista e de um 
tosco capitalismo comercial” (FERNANDES, op. cit.: 310). O 
fazer sociológico: mediação entre o fato empírico, recortado 
pela observação e sua construção articulada pela teoria. 
 
Dois dos sociólogos formados por Florestan, FHC 
 FHC, como ficou conhecido depois que deixou de ser 
sociólogo para ser presidente da república, defendeu seu 
doutoramento em 1961, com a tese “Capitalismo e Escravidão 
do Brasil Meridional”. Na obra mostrou a precariedade da 
ordem democrática supostamente instalada com a abolição, o 
preconceito que apareceu como “técnica de ajustamento” em 
face das desigualdades sociais, e o “ideal de branqueamento” 
ratificado pelos negros. Em 1963, FHC defendeu sua livre 
docência com a tese “Empresário Industrial e Desenvolvimento 
Econômico no Brasil”. O trabalho focalizou um “tipo social”, 
embora não tenha mantido uma análise weberiana. 
FHC conclui que a modernização da economia brasileira se fez 
pelo “aproveitamento e redefinição paulatina de formas 
tradicionais”. 
 
Dois dos sociólogos formados por Florestan, Ianni 
 Octavio Ianni defendeu seu doutoramento em 1962, com 
a tese “As Metamorfoses do Escravo, apogeu e crise da 
escravatura no Brasil Meridional”. O trabalho mostrou que 
quando se esgotam as possibilidades da sociedade baseada 
no trabalho escravo, instauram-se as condições geradoras 
da demanda pelo trabalho livre, e o negro ainda está em 
processo de absorção do novo, assim como também ele é um 
“novo” agente de produção, que vai ser incorporado abaixo 
das categorias criadas pelo branco para descrevê-lo a si 
mesmo. Em 1965 Ianni publicou “Estado e Capitalismo” sua 
tese de livre docência, examinando a participação do Estado 
na economia; Ianni não aceita a tese da neutralidade do 
Estado, nem pressupõe nele um papel além da condição 
necessariamente burguesa, associada à origem. 
 
Democracia à brasileira 
 Entre os anos 50 e 60 formou-se uma oposição política civil 
e golpista, mas sustentada pelas armas e ideias militares. 
Quando em 1960 a sucessão presidencial tirou Minas Gerais 
do poder, o apoio de JK trouxe para o Planalto um São Paulo 
de raízes pantaneiras (Jânio), cabelos revoltos, discursos 
inflamados, diretos, talvez radicais: outro modelo de 
populismo? Com certeza, mas o regime da democracia à 
brasileira logo revelou seu avesso, fazendo lembrar a 
sabedoria de outro mineiro: “uma eleição é feita para corrigir 
o erro da eleição anterior, mesmo que o agrave” (Drummond, 
1990). A eleição colocou na Presidência uma figura 
carismática (Jânio), não disposta a cumprir “as regras” do 
acordo, e na Vice-Presidência (Jango) um estancieiro do PTB, 
acusado de pretender reformas de base, inclusive a agrária. 
 
Democracia à brasileira e o golpismo 
 Quando o Presidente carismático intempestivamente renunciou 
ao poder, o Congresso e militares aceitaram a renúncia, e se 
recusaram a dar posse ao Vice-Presidente, considerado um 
esquerdista e risco para a democracia. 
 A crise política foi “resolvida” com a mudança às pressas para 
o regime parlamentar (Tancredo Neves, Primeiro Ministro), 
e com o plebiscito retornou o Presidencialismo. 
 Os anos entre 1961 e 1964 foram caracterizados pela discussão 
da política nacional e internacional, discursos radicais a favor e 
contra as reformas, sobretudo a agrária. 
 As reformas eram necessárias e foram realizadas durante a 
ditadura, mas favorecendo interesses das elites e da classe 
média. 
Pensar o Brasil, enfrentar as contradições 
 Pensar o Brasil a partir dos anos 50 era reconhecer a 
contradição entre pobreza e modernidade, tema discutido por 
Jacques Lambert em “Os Dois Brasís”, (e de outros autores, 
Roger Bastide e Pierre Monbeig, sem a mesma popularidade). 
 Oposições entre tradicional e moderno, desenvolvimento e 
subdesenvolvimento etc. escamoteiam a dimensão histórica 
e estrutural dos processos econômicos e sociais dos quais 
emergem tais realidades, resultantes da expansão do 
capitalismo internacional, em posição dependente e 
retardatária. 
 Raul Prebisch na direção da CEPAL contemplou esse tema, 
explorando as possibilidades com originalidade teórica, 
dando origem a uma “tradição cepalina”. 
 
A influência cepalina 
 Em 1953, Ignácio Rangel publicou “Dualidade básica da 
economia brasileira”, obra também baseada nas teses da 
CEPAL, discute especificidades da economia brasileira; Celso 
Furtado também foi influenciado pela CEPAL, explorou as 
condições históricas estruturaisda sociedade e economia 
brasileiras; segundo Colistete (2001) decorrem: a Teoria da 
Dependência (FHC e Enzo Falleto nos anos 70), e a Teoria do 
Capitalismo Tardio (João Manuel Cardoso de Melo, 1975). 
Francisco de Oliveira em “Economia Brasileira: Crítica da 
Razão Dualista” (1972) mostra que “subdesenvolvimento é 
precisamente uma ‘produção’ da expansão do capitalismo”. 
 
Pensamento político, a memória dos anos JK 
 Durante o período JK (1955-1960) toda uma geração viveu a 
sensação de se sentir parte da sociedade brasileira e da sua 
história, acreditando na democracia, e “acreditando que o 
país podia sair do atraso, podia se livrar dos latifúndios e dos 
latifundiários, podia sair da ignorância e do analfabetismo, 
podia superar o grau quase insuportável de miséria da maioria 
de nosso povo. [...] O povo aparecia, finalmente o povo, com 
o qual nós, jovens intelectuais, poderíamos realizar nossos 
projetos de futuro para a sociedade brasileira, afastando a 
velha imagem do país atrasado e inerme”. Depoimento de 
João Batista de Andrade à Revista Estudos Avançados (2002). 
 
Da teoria à prática, a ideologia: ISEB 
 Na medida em que a elaboração teórica passa a fundamentar a 
intervenção política, registra-se a convergência de dois modos 
de pensar: aquele que seria o científico, que investiga e 
questiona, com aquele que busca estabelecer as finalidades 
e objetivos para a ação política e cultural ancorada na ciência, 
esse modo de pensar se alimenta e exercita o espírito crítico 
em relação ao que é revelado pela ciência, opera com valores e 
ideias, buscando a transformação da realidade, esse modo de 
pensar é caracterizado pela dimensão ideológica. 
 Esse foi o papel assumido pelo Instituto Superior de Estudos 
Brasileiros (ISEB) a levar a nação ao reconhecimento do 
subdesenvolvimento e ao esforço de superação dessa 
condição, por meio de uma prática política de desenvolvimento. 
 
ISEB e o pensamento crítico 
 Esse foi o papel assumido pelo Instituto Superior de Estudos 
Brasileiros (ISEB), órgão sediado no Rio de Janeiro, elaborar e 
de “lançar as bases de um pensamento brasileiro (autêntico ou 
não alienado) através de um projeto teórico-ideológico de 
natureza totalizante onde confluiriam disciplinas e ciências 
diversas: Sociologia, História, Política, Economia e Filosofia”, 
conforme aponta Toledo em seu trabalho denominado “ISEB: 
Fabrica de Ideologias” (1978: 17). Os conhecimentos 
elaborados nos campos dessas disciplinas convergiriam no 
esforço de levar a nação ao reconhecimento do 
subdesenvolvimento e ao esforço de superação dessa 
condição, por meio de uma prática política de desenvolvimento; 
nesse sentido o trabalho de Toledo desvenda a ideologização 
do pensamento isebiano. 
 
Interatividade 
Nas alternativas abaixo, qual não correspondeu às linhas de 
trabalho do ISEB? 
a) Desenvolver estudos e análises de cunho funcionalista da 
realidade brasileira, visando controle da inflação e elevação 
da renda. 
b) Elaboração de uma política de desenvolvimento nacional. 
c) Desenvolver uma ideologia do nacionalismo 
desenvolvimentista. 
d) Desenvolver estudos de reflexão teórica e epistemológica. 
e) Desenvolver estudos focados na ação política, de uma política 
de mobilização ideológica dirigida para o desenvolvimento 
nacional. 
 
Golpe Militar Civil 
 O Golpe militar civil de 1964 representou ruptura com as 
concepções elaboradas pelo ISEB: os militares e civis que 
assumiram o poder se consideravam nacionalistas, mas de um 
nacionalismo tutelado, favorável ao desenvolvimento 
econômico integrado no “bloco do ocidente”. 
 O Golpe instaurou um regime de exceção e supressão de 
direitos civis por 24 anos. 
 O movimento vinha de longa data, tinha participação de 
organismos como IPES, IBAD, CONCLAP e outros. 
 ESG (Escola Superior de Guerra) ocupava lugar de centro 
intelectual na elaboração de uma “política nacional de 
segurança”, interna e externa. 
 
Civis e militares, dispositivos de poder 
 No que diz respeito aos dispositivos de poder, a convivência 
entre militares e civis na condução da política apresentava uma 
dinâmica peculiar, na qual militares, conquanto heterogêneos, 
deveriam ser politizados, os civis os reconheciam na condução 
da política, na arbitragem pela intervenção em situações mais 
complexas. 
 Stepan (1975: 51) denominou essa aliança de “coalizão golpista 
vencedora”, por ela militares cooptaram civis para liderança 
política, e civis recorreram aos militares para condução de 
ações repressivas na manutenção da ordem. 
 Esse jogo foi um fator na manutenção da ditadura por 24 anos. 
 
Forjando uma dada “legitimidade”, a estratégia 
psicossocial 
 Obter a adesão permanente nos âmbitos objetivo e subjetivo 
a uma ordem social construída a partir de um processo de 
sondagem, para “detectar os sentimentos, a mentalidade, as 
atitudes, as aspirações, os sonhos, os desejos, os ideais, 
enfim, todos os valores que moviam e organizavam a vida 
social brasileira” (REZENDE, 2013: 43). 
 Admitindo que os valores encontrados na sondagem fossem 
“preservação da família, da moral, dos costumes, da pátria, do 
patriotismo e da propriedade” (REZENDE, op. cit., p. 48) toda e 
qualquer oposição não poderia ser tolerada. 
 O Gal. Golbery do Couto e Silva se dedicou à construção dessa 
weltanshauugen como base (ideológica) da segurança 
nacional. 
 
O autoritarismo e a “engenharia” do milagre brasileiro 
 O Estado passou a ser representado por um sistema de 
planejamento pragmático, instrumentalizando atribuições e 
objetivos do Estado. 
 O grupo no poder “retirou sua legalidade do próprio estado, 
mas não tem força social em que se apoiar para buscar 
legitimidade de sua dominação” (FERREIRA, 2004: 56-57). 
 Povo e sociedade civil não são sujeitos nesse modelo político, 
figuram como objeto do discurso (tecnocrático) que 
pretensamente o justifica. 
 O modelo de economia excludente instaurado (milagre 
econômico) manteve os privilégios (fazer crescer o bolo, para 
depois dividir) agravando as diferenças sociais. 
 
O campo “de fora” do autoritarismo (crítica intelectual 
e artística) e o campo da resistência ao golpe e à 
ditadura 
 O campo "de fora" dessa ordem contava com o poder do 
pensamento crítico dos intelectuais de todos os setores; com 
o poder dos artistas, dos não cooptados, e explicitamente 
com o pensamento crítico das ciências sociais; 
 As formas de resistência política, os núcleos e organizações 
de militância e os movimentos de guerrilha, integravam desde 
o início do golpe, o campo mais explícito e consequente de 
oposição e de resistência, ao modelo autoritário instalado. 
 Nesse campo, tanto homens quanto mulheres se construíam 
como sujeitos na disposição de fazer história, por isso não 
podem ser considerados como “de fora”, nem mesmo como 
a outra face do modelo instaurado, mas como sua radical 
alternativa (e subversão). 
 
A restauração da democracia à brasileira 
 Depois da luta por eleições diretas, conversas mineiras e 
paulistas em tons diferentes, figuras que defendiam a chamada 
“Revolução” estavam agora nos comícios, tornaram-se 
arautos, menestréis da democracia etc. 
 Passado o luto pela morte de Tancredo Neves, assumiu a 
Presidência José Sarney, em 1985, dono de longa carreira 
política, um maranhense, ex-presidente da Arena, depois 
membro do PMDB e membro da ABL. 
 Seguiu-se um curto período de campanha para eleição à 
Assembleia Nacional Constituinte, que iniciou os trabalhos 
em 1987 e concluiu em 1988, ano de promulgação da nova 
Constituição. 
 
Do neoliberalismo ao pós-neoliberalismo 
 O Brasil adotou o neoliberalismo como linha de política 
econômica, processo planejado e implantado por FHC (PSDB)desde antes de seu primeiro mandato em 1995. 
 Segundo Bresser Pereira (2002) essa adoção desconsiderou o 
interesse nacional e as diferenciações sociais. Em 2003, FHC foi 
substituído por Luís Inácio Lula da Silva, do PT. 
 O desafio enfrentado pelo novo presidente residia em 
desenvolver uma política pós-neoliberal. 
 Para Emir Sader (2013: 139) a chave do enigma Lula residiu em: 
estabilidade monetária, retomada do desenvolvimento 
econômico e políticas de distribuição de renda. 
 
 
Uma síntese, direções principais 
Na trajetória do pensamento social brasileiro é possível distinguir 
duas direções principais: 
a. O pensamento engajado em um processo de mudança social, 
compreendendo tendências ideológicas diferenciadas, mas 
ainda assim, mais reformista que revolucionário; um divisor 
nessas tendências reside na contradição entre soberania 
nacional e modernidade, (como se para atingir a modernidade 
fosse necessário abrir mão do conceito considerado 
“antiquado” de soberania nacional); 
b. O pensamento voltado para o próprio modo de pensar e 
de agir do brasileiro, por isso ele se faz irônico, explora as 
contradições presentes no cotidiano, abrangendo obras 
da literatura, teatro, cinema, televisão e da cultura midiática. 
 
Interatividade 
Qual das alternativas abaixo está incorreta no tocante às 
tendências de pensamento social brasileiro? 
a) Como pensamento engajado em um processo de mudança 
social, abrange tendências ideológicas diferenciadas. 
b) Como pensamento engajado, inclui apenas as vertentes 
revolucionárias. 
c) Como pensamento engajado, inclui a discussão sobre 
a abolição do conceito soberania nacional. 
d) Como pensamento engajado, inclui a reflexão sobre 
identidade cultural brasileira. 
e) Como pensamento engajado, inclui a reflexão sobre 
a produção brasileira nas artes plásticas, na mídia 
e música popular. 
 
 
 
 
 
 
 ATÉ A PRÓXIMA! 
 
	Slide Number 1
	Tendências do pensamento social brasileiro e a sociologia
	Pensando o Brasil, integralistas e comunistas dos anos 20 e 30
	A Semana de Arte Moderna
	Modernismo
	Integralismo
	Marxismo
	Os anos 30
	Estado Novo
	Criação da Escola de Sociologia e da FFCLH da USP
	Antropologia e Sociologia, figuras centrais
	Caio Prado Júnior
	Interatividade
	Resposta
	Pensando o Brasil com as obras de Caio Prado Jr.,�Gilberto Freyre, Sergio Buarque 
	Gilberto Freyre e Sergio Buarque
	Caio Prado Jr. 
	Liberal e autoritário, um discurso conservador
	Panorama político populista
	� Ambiente político populista no governo Vargas�
	�Anos JK (1955-1960), modernização conservadora e populismo bossa nova�
	Ambiente político e “neutralidade” das ciências sociais
	Pensar o desenvolvimento é refletir sobre a dimensão política 
	� Novos temas e áreas de pesquisa em Sociologia�
	Sociologia e mudança social
	Ambiente político e ideologização
	Interatividade
	Resposta
	Sociologia: Florestan Fernandes
	Florestan, abordagem crítica
	Florestan, relações de sentido, mediação: o fazer sociológico
	Dois dos sociólogos formados por Florestan, FHC
	Dois dos sociólogos formados por Florestan, Ianni
	Democracia à brasileira
	Democracia à brasileira e o golpismo
	Pensar o Brasil, enfrentar as contradições
	A influência cepalina
	Pensamento político, a memória dos anos JK
	Da teoria à prática, a ideologia: ISEB
	ISEB e o pensamento crítico
	Interatividade
	Resposta
	Golpe Militar Civil
	Civis e militares, dispositivos de poder
	Forjando uma dada “legitimidade”, a estratégia psicossocial
	O autoritarismo e a “engenharia” do milagre brasileiro
	O campo “de fora” do autoritarismo (crítica intelectual e artística) e o campo da resistência ao golpe e à ditadura
	A restauração da democracia à brasileira
	Do neoliberalismo ao pós-neoliberalismo
	Uma síntese, direções principais
	Interatividade
	Resposta
	Slide Number 53

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