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Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais Curso de Engenharia de Produção Civil Filosofia da Tecnologia Fichamento Moralidade no Design A ética do design e a moralidade dos artefatos tecnológicos Peter-Paul Verbeek Realizado por: Jonatas Silva Junho de 2018 Moralidade no Design — A ética do design e a moralidade dos artefatos tecnológicos Peter-Paul Verbeek Tendo em vista a relevância dos estudos na filosofia acerca da não neutralidade da tecnologia na filosofia, o autor propõe uma expansão do assunto à ética na engenharia que, segundo ele, concentra-se geralmente nas discussões sobre decisões e responsabilidades assumidas por designer. O autor tem outro foco, para ele “as análises da não neutralidade da tecnologia torna-nos plausível atribuir alguma moralidade aos artefatos”, uma vez que o design e a tecnologia influenciam comportamentos humanos em diversas instâncias. O autor inicia a discussão constatando que a ética na tecnologia, na abordagem usual, como citado, aborda a tecnologia preocupando-se com sua funcionalidade, não levando em conta que muitas tecnologias afetam nossas decisões e ações morais, sempre modificando o contexto no qual elas cumprem sua função. Essa interação, denominada “mediação tecnologia” revela que a tecnologia influencia nas ações humanas e suas percepções acerca da realidade em que vivemos. Ele afirma que, para abordar de forma adequada os aspectos morais do desenvolvimento tecnológico, os estudos de ética na tecnologia devem incluir a influência moral da mediação tecnológica nas nossas vidas. Segue-se uma avaliação se os artefatos tem moralidade. Peter afirma, com base também em outros contribuidores: Langdon Winner e Bruno Latour, que os artefatos são portadores de moralidade, uma vez que eles têm papel ativo nas ações e decisões morais e interpretações do mundo. A avaliação esbarra num impasse: considerar artefatos como agente moral é algo aparentemente absurdo, pois na teoria ética para algo, “qualificar-se como agente moral exige, pelo menos, a posse de intencionalidade e algum grau de liberdade”. O autor propõe, então, uma análise mais profunda da intencionalidade tecnológica. Segundo ele, a intencionalidade requer a capacidade de formar intenções de forma espontânea, originada pelo agente; ainda que à primeira vista possa não ter relação com artefatos tecnológicos. Parece uma questão distante e difícil de se atribuir a artefatos tecnológicos, entretanto as tecnologias, uma vez aplicadas, sempre estabelecem uma relação com o usuário e a circunstância, afetando decisões morais. Essa mediação segue em duas direções: uma pragmática, voltada a ação, numa visão de que a tecnologia não é um instrumento neutro uma vez que artefatos podem mudar nosso comportamento por antecipação ou à força (como é o caso das lombadas); e uma hermenêutica, concernente à relação entre humanos e tecnologia na interpretação da realidade, revelando que a decisão leva consigo uma ação humana unida à influência da tecnologia. Um exemplo muito utilizado por Verbeek é o da ultrassonografia na obstetrícia: a visão do feto dessa forma o separa da mãe e o insere no contexto clínico, como paciente; ele permite a identificação de detalhes do feto, inclusive de possíveis patologias, abrindo um leque moral de influência ambivalente, uma vez que pode influenciar uma mãe a abortar, tanto quanto não abortar. Outro exemplo utilizado é a condução de um veículo: o quão rápido o indivíduo dirige e, com isso, o quão maior é a possibilidade de prejudicar outras pessoas, está condicionado ao tipo de estrada, à potência do motor do carro, à existência de lombadas ou radares,etc. O autor mostra que quando os artefatos mediam relações entre humanos e a realidade, isso implica que as decisões nunca são puramente humanas mas híbridas. Além disso a própria situação de escolha, frente à uma interpretação oriunda da tecnologia, é gerada pela presença do artefato tecnológico. Verbeek segue discorrendo acerca da liberdade da tecnologia, segundo ele, é obvio que as tecnologias não possuem liberdade, pois isso requer a existência de uma mente; portanto artefatos tecnológicos não podem possuir a liberdade como os humanos. Entretanto ele não os exclui totalmente da possibilidade de liberdade necessária para se caracterizar uma agencia moral. O autor mostra que não é necessário que haja autonomia completa, basta que exista algum grau de liberdade para ser considerado moralmente responsável por uma ação. Considerando que a liberdade humana jamais é absoluta, mas depende das circunstâncias específicas e que, na intencionalidade híbrida, humanos tem seu comportamento construído em conjunto com a tecnologia, a liberdade deve ser então “distribuída” entre os elementos humanos e não humanos. O autor mostra ainda que a conclusão de que mediação e moralidade estão em conflito não é uma conclusão satisfatória, pois para ele é praticamente impossível pensar em alguma situação moralmente relevante na qual a tecnologia não desempenhe um papel. Ele argumenta que é extremamente necessário lidar com os conceitos éticos para entender a relevância moral dos artefatos tecnológicos; e propõe que se reinterprete a liberdade como a capacidade de um agente em se relacionar com o que determina, ao invés de uma liberdade absoluta, que é alcançada ignorando a realidade. Tal definição ainda não permite que se realmente se atribua liberdade a artefatos, mas mostram que eles ajudam a constituir a liberdade, de forma que proporciona circunstância onde a existência humana pode ocorrer em sua liberdade, que deve ser avaliada como uma prática de lidar com influências e mediações. O autor fala por fim acerca do papel dos designers na moralidade da tecnologia; para ele, o design da tecnologia é propriamente uma atividade moral, pois a atividade de desenvolver artefatos, que terão papel de mediação nas experiências humanas, coopera para moldar decisões e ações morais. Toda mediação tecnológica constitui uma complexa interação entre os designers, usuários e a tecnologia, de forma que cada um deles tem sua porção específica de agência moral. O designer determina alguma forma específica de mediação; o artefato media as ações e decisões, algumas vezes de forma não prevista pelo designer; o ser humano toma uma decisão ou ação moral, em interação com a tecnologia. Peter mostra que é possível desenvolver avaliações morais sobre tecnologias; e estender os estudos sobre a ética ao campo material, de forma que o desenvolvimento de artefatos deve considerar o impacto sobre as ações e decisões morais da sociedade, de forma responsável; mas a “materialização da moralidade” não deve ser lançada sobre os ombros dos designer; a sociedade deve em conjunto discutir e avaliar a forma como a tecnologia contribui e atrapalha a vida .
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