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O Cristão e a Sexualidade Tradução: Camila Rebeca Almeida Revisão: André Aloísio Oliveira da Silva & William Teixeira eBook: João Fernandes Este eBook foi distribuído gratuítamente pelo Ministério Fiel, Ministério Ligonier e Voltemos ao Evangelho. O ministério Ligonier, fundado pelo pastor R.C. Sproul, tem como objetivo principal apresentar fielmente a verdade das Escrituras, através de cursos, materiais de estudo e diversos recursos multimídia, a fim de que pessoas possam crescer no conhecimento de Deus e em Sua santidade. LIGONIER.ORG/PT 4 CRISTÃO E A SEXUALIDADE PROVIDÊNCIA E CONTENTAMENTO R. C. Sproul Blaise Pascal, o famoso filósofo e matemático francês, obser-vou que os seres humanos são criaturas de profundo parado- xo. Nós nos adequamos tanto à profunda miséria quanto à tremen- da grandeza, muitas vezes ao mesmo tempo. Tudo o que precisamos fazer é examinar as manchetes para ver se esse é o caso. Quantas vezes as celebridades que fizeram um grande bem por meio de fi- lantropia são flagradas em escândalos? A grandeza humana é encontrada, em parte, em nossa capacidade de contemplarmos a nós mesmos, de refletirmos sobre as nossas origens, nosso destino e nosso lugar no universo. No entanto, tal contemplação tem um lado negativo, e esse é o seu potencial para nos causar dor. Podemos nos considerar miseráveis quando pensa- mos em uma vida que é melhor do que a que desfrutamos agora e reconhecemos que somos incapazes de alcançá-la. Talvez pensemos em uma vida livre da doença e da dor, mas sabemos que a agonia física e a morte são certas. Ricos e pobres sabem que uma vida de maior riqueza é possível, mas se frustram quando essa riqueza é inalcançável. Doentes ou saudáveis, pobres ou ricos, bem-sucedi- dos ou fracassados — todos somos capazes de ficar irritados quan- do uma vida melhor continua fora do nosso alcance. As Escrituras prescrevem apenas um remédio para essa frustração: contentamento. O contentamento bíblico é uma virtude espiritual que encontra- mos exemplificada pelo apóstolo Paulo. Ele afirma, por exemplo: “aprendi a viver contente em toda e qualquer situação” (Filipenses 4.11). Não importa a condição da sua saúde, riqueza ou sucesso, Paulo achou possível estar contente com a sua vida. Na época de Paulo, duas proeminentes escolas da filosofia grega concordavam que nosso objetivo deveria ser encontrar contenta- mento, mas elas tinham maneiras muito diferentes de alcança-lo. 5 O primeiro, o estoicismo, dizia que a imperturbabilidade era o ca- minho para o contentamento. Os estoicos criam que os seres hu- manos não tinham controle real sobre as suas circunstâncias exter- nas, estando sujeitas aos caprichos do destino. O único lugar que poderiam ter qualquer controle era em suas atitudes pessoais. Não podemos controlar o que nos acontece, eles diziam, mas podemos controlar o que pensamos sobre isso. Assim, os estoicos se exerci- tavam para alcançar a imperturbabilidade, um sentimento interior de paz que os deixaria despreocupados, não obstante o que lhes acontecesse. Os epicureus eram mais proativos em sua busca do contentamento, procurando encontrar um equilíbrio adequado entre o prazer e a dor. Seu objetivo era minimizar a dor e maximizar o prazer. Ain- da assim, mesmo alcançar um objetivo neste campo pode resultar em frustração. Podemos nunca obter o prazer desejado, ou, tendo obtido tal prazer, podemos perceber que este não traz o que pensá- vamos. Paulo não era um estoico nem um epicureu. O epicurismo conduz fi- nalmente a um pessimismo definitivo: não podemos obter ou man- ter o prazer que buscamos; então, qual é o ponto? A doutrina apos- tólica da ressurreição e da renovação da criação não permite esse pessimismo. A criação “será redimida do cativeiro da corrupção, para a liberdade da glória dos filhos de Deus” (Romanos 8.18-25; veja 1 Coríntios 15). Paulo também rejeitou a resignação passiva do estoicismo, pois ele não era fatalista. Paulo se esforçou ativamente em direção a seus objetivos e nos convocou a operarmos a nossa salvação com temor e tremor, crendo que Deus opera em nós e atra- vés de nós para realizar os seus propósitos (Filipenses 2.12). Para o apóstolo, o verdadeiro contentamento não era complacência e nem uma condição, nesse lado da glória, que não pudesse admitir sentimentos de descontentamento e insatisfação. Afinal, Paulo fre- quentemente expressa tais sentimentos em suas epístolas quando considera os pecados da igreja e as suas próprias falhas. Ele não descansou em suas vitórias, mas trabalhou zelosamente para resol- ver problemas tanto pessoal quanto pastoralmente. O contentamento de Paulo dizia respeito às suas circunstâncias 6 CRISTÃO E A SEXUALIDADE pessoais e ao estado da sua condição humana. Se ele sofria necessi- dade ou desfrutava de prosperidade material, ele tinha “aprendido” a se contentar aonde quer que Deus o colocasse (Filipenses 4.12). Observe que isso foi algo que ele aprendeu. Não era um dom natu- ral, mas algo que ele teve que ser ensinado. Qual era o segredo do contentamento que ele havia aprendido? Paulo nos diz em Filipenses 4.13: “Tudo posso naquele que me for- talece”. Resumindo, o contentamento do apóstolo estava fundamentado em sua união com Cristo e em sua teologia. Ele via a teologia não como uma disciplina teórica ou abstrata, mas como a chave para entender a própria vida. Seu contentamento com a sua condição na vida repousava em seu conhecimento do caráter e das ações de Deus. Paulo estava satisfeito porque sabia que a sua condição era ordenada pelo seu Criador. Ele entendeu que Deus trazia tanto prazer quanto dor em sua vida para um bom propósito (Romanos 8.28). Paulo sabia que, desde que o Senhor ordenou sabiamente a sua vida, poderia encontrar força no Senhor para todas as cir- cunstâncias. Paulo entendeu que estava cumprindo o propósito de Deus, estivesse experimentando abundância ou humilhação. A sub- missão ao governo soberano de Deus sobre a sua vida foi a chave para seu contentamento. Enquanto continuamos a lutar contra os desejos da carne, pode- mos ser tentados a crer que Deus nos deve uma condição melhor do que a que desfrutamos atualmente. Crer em algo assim é pecado e conduz à uma grande miséria, que só é superada pela confiança na graça providencial e sustentadora do Senhor. Nós encontraremos o verdadeiro contentamento somente enquanto nós recebemos essa graça e andamos nela. 7 3 MANEIRAS PELAS QUAIS O EVANGELHO MUDA O CASAMENTO Erik Raymond Quando um novo líder é nomeado em uma organização, a mu- dança é inevitável. O novo chefe definirá a política, estabelecerá o tom e refletirá uma atitude em sua organização. O mesmo é verdade quanto aos nossos casamentos. O novo líder a quem me refiro aqui não é um novo marido, mas sim o verdadeiro marido, o Senhor Jesus Cristo. Pelas Escrituras, nós sabemos que um casamento cristão nunca é simplesmente uma união de duas pessoas, mas duas pessoas uni- das em Jesus Cristo. Esta é outra maneira de dizer que Jesus é a nossa cabeça, o Senhor e o que concede vida ao nosso casamento. Quando um homem e uma mulher abraçam a verdade do evan- gelho, seja na conversão ou na santificação, sempre há mudanças correspondentes relacionadas a Jesus ser o cabeça do casamento. Abaixo estão três das mudanças mais comuns que Cristo opera em um casamento enquanto o governa por meio do evangelho. 1. Do egoísmo ao serviço Cada pecado flui do reservatório do eu. Nós abandonamos Deus e os outros em favor de nós mesmos. Isso é desastroso e doloro- so. Em nenhum lugar essa inversão é mais evidente e prejudicial do que no casamento. Porém, quando o evangelho alcança o lar, há nítidas mudanças nesse contexto. A esposa irritável se torna paciente e bondosa com seu marido porque Jesus foi paciente e bondoso com ela. O marido autocentrado encontra maisalegria em aprender sobre os interesses da sua esposa do que sobre a his- tória dos seus atletas favoritos. Isso é porque ele percebe que ela foi feita por Deus e para Deus, bem como a verdade que o Espírito continua a operar poderosamente mais de Cristo na vida da sua 8 CRISTÃO E A SEXUALIDADE esposa. Isso é atraente e animador de uma forma que dribles e gols nunca podem ser. O evangelho alcança o lar e afasta os nossos corações de nós mesmos (egoísmo) em direção ao nosso cônjuge (serviço). 2. Da preguiça ao comprometimento Se você não acha que a preguiça é um problema na América, con- sidere o fato de que temos uma cadeira chamada “Rapaz pregui- çoso”, que é adaptada e comercializada para o homem americano. E ela vende! A preguiça, assim como o egoísmo, é inclinada para o eu, mas recebe as suas instruções de ação a partir do comando do conforto. Nós desejamos a comodidade e nos recusamos a fazer qualquer coisa difícil porque poderia ser desconfortável. A pregui- ça se relaciona principalmente sobre a preservação e promoção da percepção de conforto pessoal. E a preguiça mente muito. Sabe- mos que há um problema em nosso casamento, mas também sabe- mos que isso exige uma mudança, talvez até mesmo uma mudança dolorosa. Então, o que acontece? A preguiça diz: “Oh, eu farei isso em outro momento”. Ou a preguiça diz convincentemente: “Isso não é tão ruim. Eu ficarei bem”. Mas isso é a preguiça falan- do e não Jesus, o governador das nossas vidas. Sem dúvida, você pode imaginar como isso poderia minar o plano de Jesus para o crescimento e mudança em você e seu casamento. Mas quando o evangelho da graça alcança o lar, nos tornamos comprometidos em nosso casamento. Não somos mais espectadores passivos esperando manter uma cultura de conforto e segurança através da mediocridade disfarçada. Em vez disso, nos aproximamos do que Jesus é: buscamos a semelhança com Cristo por meio de, dolorosa- mente, mortificar o pecado. 3. Da justiça própria à humildade A justiça própria é aquela mentalidade diabólica de que possuímos mérito em nós mesmos que nos recomenda diante de Deus e dos homens. Enquanto o egoísmo ama se retrair para o eu, a justiça própria ama se gloriar do eu. Em sua essência, isso se opõe ao evangelho que gira em torno da nossa necessidade e recebimento da justiça imputada de Cristo. A justiça própria em um casamento é tão sutil quanto uma sobrancelha erguida, enquanto a humilda- 9 de é tão perceptível quanto a feição alegre. Durante uma discus- são, uma esposa pode comunicar algumas preocupações ao seu marido. Se ele é justo em si mesmo, pode começar a contradizê-la com “dura” evidência. Se as coisas ficarem difíceis, seu ousado ad- vogado interior articulará poderosamente a sua inocência enquan- to também apresenta acusações contra sua esposa. A justiça pró- pria no casamento está sempre na defensiva porque percebemos que sempre estamos sob ataque. Isso deve ser contrastado com o evangelho que nos ensina que já fomos suficientemente atacados, criticados e julgados. A cruz é o veredito. Nós somos culpados. Mas a beleza do evangelho é que, enquanto éramos infinitamente pecaminosos, também fomos profundamente amados. Isso pro- duz humildade e segurança. Quando o evangelho alcança o lar em um casamento, nós silenciaremos mais rapidamente nossos advo- gados internos, enquanto desfrutamos a verdade do evangelho. É somente aqui que nós podemos, humildemente, crescer juntos na semelhança de Cristo. Quando o evangelho vem ao lar e ao casamento há uma mudança definitiva no modo de funcionamento, tom e atitude. O casa- mento começa a ter as características do seu líder. No caso do evangelho, não pode haver melhor líder e nenhuma mudança mais importante para nós e nosso casamento. 10 CRISTÃO E A SEXUALIDADE O REMÉDIO DO EVANGELHO PARA A HOMOSSEXUALIDADE John Freeman A Bíblia revela que o sexo foi criado por Deus e é bom. Foi ideia dele. Logo as primeiras palavras de Deus registradas e dirigidas à humanidade encapsulam os ensinamentos da Bíblia sobre o sexo: “Sede fecundos, multiplicai-vos, enchei a terra” (Gênesis 1.28). Este mandamento positivo demonstra que o sexo foi designado para glorificar a Deus, fortalecer o vínculo entre marido e mulher, ser experimentado exclusivamente entre um homem e uma mu- lher no relacionamento conjugal e propagar a raça humana. Neste lado da queda, o sexo e a sexualidade são distorcidos em graus menores ou maiores. No entanto, hoje existe a controvér- sia intensa sobre a homossexualidade nos círculos evangélicos e, cada vez mais, nas igrejas reformadas também. Não somente a homossexualidade é frequentemente apresentada como boa, mas também é apresentada como algo a ser buscado com a bênção de Deus. É alarmante que a aceitação do comportamento homossexu- al entre evangélicos professos esteja aumentando. Nós ouvimos de algumas pessoas que o tipo de relações homossexuais que vemos hoje (amorosas, monogâmicas) não são abordadas nas Escrituras. Embora essa tendência pareça continuar, essas visões revisionistas devem ser rejeitadas pelos seguidores de Jesus Cristo. A Palavra de Deus é firme em sua visão negativa da homossexu- alidade e do desejo sexual pelo mesmo sexo. A Bíblia é o padrão infalível pelo qual devemos ver a homossexualidade e entender o remédio do evangelho para isso. Infelizmente, a confiabilidade da Bíblia nessa área tem sido questionada atualmente por muitos que reivindicam a fé cristã. Os cristãos que veem a Escritura como autoritativa e inspirada não devem aceitar esta visão diluída da 11 Palavra de Deus. A Bíblia revela a posição de Deus a respeito dos problemas do coração humano, sendo a homossexualidade um dentre muitos. Como os cristãos devem pensar sobre a homossexualidade? Nós precisamos compreendê-la de três maneiras. Primeiramente, a homossexualidade nas Escrituras é sempre mencionada em ter- mos de uma ação, algo feito fisicamente com outra pessoa ou um padrão de pensamento interno e ativo da mente e do coração. A palavra grega mais usada para descrever a homossexualidade no Novo Testamento é arsenokoitēs, que se refere a um homem deitado com outro homem. Portanto, sempre que é mencionada, é sempre definida em termos de uma atividade, um comportamento ou uma pessoa que se envolve nesse comportamento do coração e corpo. Em segundo lugar, a homossexualidade é chamada de pecado em todas as passagens onde é mencionada. É proibida e é expressa- mente considerada como contrária à vontade de Deus. As Escri- turas afirmam isso claramente em Gênesis 19.4-9; Levítico 18.22, 20.13; 1 Timóteo 1.9-10 e Judas 7. Romanos 1.24-27 também descreve a atividade da paixão e da luxúria centradas no coração, bem como o comportamento. Isto se refere a homens e mulheres. O comportamento é listado em 1 Coríntios 6.9-11, onde também aprendemos que esta foi a história de alguns cristãos na igreja primitiva. Entre os que tinham experimentado a salvação havia ex-praticantes da homossexualidade. Portanto, não só o comportamento homossexual do corpo e do coração é definido como pecado, mas também é retratado como consequência e efeito da queda. Referindo-se à realidade do sexo ilícito, Levítico 18.6-19 lista mais de uma dúzia de formas de pe- cado sexual, incluindo a homossexualidade e o sexo com animais. Novamente, a gravidade do pecado sexual, particularmente da homossexualidade, é fortemente declarada em Romanos 1.24-26, usando frases vívidas e terríveis como “concupiscências de seu próprio coração”, “paixões infames” e ter uma “disposição mental reprovável”. Isso em adição aos versículos em Judas que falam de “transformar em libertinagem a graça de nosso Deus” e de pessoas 12 CRISTÃO E A SEXUALIDADE que “havendo-se entregado à prostituição... seguindo após outra carne”. Esta última designação está especificamenteligada ao que aconteceu em Sodoma e Gomorra. Mas, Deus realmente deve comunicar que o mau uso do sexo nas formas acima mencionadas (e, por inferência, os desejos que levam a esse mau uso) é proibido e considerado como pecado? É claro. Nossos desejos, especialmente os nossos desejos sexuais, nunca são neutros. Ver o desejo pelo mesmo sexo como neutro, especialmente quando esse desejo objetifica a outra pessoa sexual- mente ou vê a pessoa meramente como um objeto de paixão sexu- al, é entender mal a profundidade e a complexidade do pecado. Na Escritura, o coração é muitas vezes visto como o centro dos nossos desejos. Em Marcos 7.21, Jesus descreve o coração como o centro de toda imoralidade sexual e sensualidade. Essas inclinações são retratadas como coisas vis que vêm do interior. Ele está falando sobre desejo, seja o objeto desse desejo alguém do sexo oposto ou do mesmo sexo. Tiago 1.14-15 nos diz que somos atraídos e seduzidos por nossos desejos e que o desejo dá à luz o pecado. O desejo não é uma parte neutra do nosso ser, mas uma parte muito ativa dele. Certamente essas perspectivas da Escritura são amplamente rejeitadas. Há um fator essencial na tentativa de legitimar a ho- mossexualidade biblicamente. Em termos simples, na cultura de hoje, nossa sociologia está cada vez mais interpretando, definindo e determinando a nossa teologia. O que quero dizer com isso? Houve um tempo em que os crentes rotineiramente olhavam para a Bíblia, tanto para saber como pensar sobre as questões da vida quanto para encontrar soluções para os dilemas que enfrentavam, incluindo questões relacionadas ao sexo e à sexualidade. Isso não é mais assim. Hoje, o impacto e a influência da rede social de alguém e da experiência com amigos e familiares substituíram o que a Bíblia poderia dizer sobre esse assunto. Outro termo para enten- der esta transferência de autoridade e credibilidade para longe da Palavra de Deus em direção à experiência pessoal é a acomodação cultural. Hoje, parece que muitas pessoas acreditam que as Escri- turas devem se curvar às nossas experiências ou às dos outros. 13 Devemos também notar que a homossexualidade nunca é descri- ta na Escritura como uma condição ou estado de existência. Ao contrário da ideia moderna de uma “orientação” homossexual inata — um termo usado frequentemente nos últimos vinte e cinco anos ou mais — esse conceito não é encontrado na Escritu- ra. É assumido na Bíblia que podemos nos tornar inclinados ou “orientados” para qualquer coisa a que continuamente entregamos as nossas mentes e corações. Faça algo em pensamento ou em ação muitas vezes e por um período bastante longo, e isso se tornará enraizado em nós. Contudo, precisamos ter cuidado com o pensamento simplista aqui, especialmente quando refletimos em nossa responsabili- dade — algo que muitos não acreditam que têm quando se trata dos seus desejos pelo mesmo sexo ou do seu comportamento. Nós somos o produto das interações complexas de muitos fatores durante muitos anos. Por que alguns são propensos a qualquer número de persuasões psicossociais, incluindo ira, depressão ou dependência química? Eis a resposta: nem sempre escolhemos as nossas lutas ou tentações, embora assumamos a responsabilidade pelo que fazemos com elas. Elas se desenvolvem em nós através de uma interação complexa de temperamento, influências internas e externas, e de nossos próprios eus desejosos, arruinados e peca- minosos. Nós facilmente e por natureza cooperamos com essas influências de modo que os hábitos do coração e o comportamento se tornem fortes e dominantes. Em certo sentido, somos a soma de milhares de pequenas decisões que tomamos. Nós temos cooperado com os nossos desejos cultivados. Assim, apesar dos fatores externos que podem ter estado envolvidos no desenvolvimento daquelas tenta- ções que achamos particularmente atraentes, ainda assim somos responsáveis por ter vidas piedosas, inclusive na área da sexuali- dade. Finalmente, precisamos entender que Deus oferece perdão, um testemunho limpo e restauração por meio de Jesus Cristo para todos os pecadores arrependidos, incluindo aqueles que têm um histórico de comportamento homossexual e outros pecados. Ele 14 CRISTÃO E A SEXUALIDADE não somente nos perdoa por sermos propensos a abusar do seu dom do sexo e sexualidade, mas a sua graça verdadeiramente nos educa “para que, renegadas a impiedade e as paixões mundanas, vivamos, no presente século, sensata, justa e piedosamente” (Tito 2.11-12). Isso não significa necessariamente que podemos fingir que não usamos o sexo como parte de nossa história ou que os desejos sexuais ilícitos não continuarão a nos incomodar ou ser uma fonte de tentação, mas isso significa que a graça de Deus nos dá poder para viver de modo transformado como seguidores de Jesus Cristo. Ele nos capacita a resistir à tentação e a viver para sua glória. Cristo é mediador dessa graça e capacita os crentes; mas a igreja, o corpo de Cristo, também desempenha um papel crucial. Ouvi um pastor dizer: “O arrependimento mata aquilo que está me matan- do, sem matar a mim mesmo”. Eu não conheço alguém que possa fazer isso sozinho. Aprender a andar em obediência e a mortificar o nosso pecado e nossa natureza pecaminosa nunca é algo a ser tentado sozinho ou isoladamente. A mudança bíblica é uma ativi- dade comunitária. O chamado da igreja é oferecer apoio e encora- jamento àqueles que experimentam atrações pelo mesmo sexo e outras tentações sexuais. Caminhar com aqueles que são tentados dessa maneira significa que ajudamos a suportar os fardos das suas lutas e tentações, oferecendo amizade e companheirismo, e ajudando-os a crer pela primeira vez ou crer novamente no evan- gelho todos os dias. Isso é o que Cristo faz por nós e é o que preci- samos fazer por outros que estão lidando com o pecado sexual. Ao fazer isso, também seremos lembrados de que nós também somos perdoados por nossas transgressões. 15 MINISTRANDO AOS ABUSADOS E AOS ABUSADORES Sean Michael Lucas Esse é um cenário de pesadelo para todos os envolvidos: um ho- mem liga para o seu pastor em lágrimas e solicita uma reunião o mais rápido possível. Trinta minutos depois, ele está no escritório do pastor, confessando que sua esposa o pegou tocando sua filha de 13 anos de forma sexual. Ele parece completamente perturba- do, até que o pastor exorta o homem a ligar para o disque-denún- cia de abuso infantil e denunciar a si mesmo. Então, o agressor começa a se proteger: “Isso não destruirá a minha família? Isso não me custará o meu trabalho? Isso não destruirá a minha re- putação?”. O homem se recusa e sai do escritório. Duas semanas depois, toda a sua família muda de estado para um local desconhe- cido. O que o pastor deve fazer? Muitas vezes, o pastor não faz nada, ainda que muitos estados tenham leis de denúncia de abuso sexual que exijam que clérigos denunciem este tipo de abuso mesmo quando a prerrogativa de pastor-confessor tenha sido invocada. Da mesma forma, a liderança da igreja não faz nada, argumentan- do que a família fugiu para outro estado, além do alcance da sua antiga congregação. E o resultado é que um abusador sexual se livra do seu pecado e crime e continuará a cometer esse pecado até que finalmente seja pego pelas autoridades. Pense na criança envolvida, o que a igreja está dizendo em relação a ela neste caso? Pense sobre a esposa e os outros filhos; no pró- prio homem e em sua alma imortal; na nova comunidade para a qual ele se mudou com sua família, o que a igreja está dizendo em relação a esses envolvidos? Pense na igreja e no evangelho, o que a igreja está dizendo no que diz respeito a estes? Em cada caso em que a igreja não enfrenta o pecado, e especial- 16 CRISTÃO E A SEXUALIDADE mente os pecados sexuais disruptivos, estamos dizendo algo muitosimples: amamos a nós mesmos, nosso conforto e nossa reputação mais do que a Deus, o evangelho e os outros. Isso é o que acontece quando não vemos mal algum. É claro que existem inúmeras outras situações em que nossas igre- jas e nossa liderança relevam o mal: • Quando o eminente apoiador financeiro deixa a sua mulher por outra e a igreja não lhe disciplina, permitindo que ele “renuncie” à sua membresia; • Quando o cardiologista ameaça sua esposa com uma arma, depois diz que “estava apenas brincando”, e não sofre nenhuma consequência; • Quando a mãe de meia-idade, tendo três filhos, decide deixar seu marido, sua casa e sua igreja simplesmente porque ela não está feliz e ninguém entra em contato com ela. Em cada uma dessas formas e em inúmeras outras, quando a igreja não consegue lidar com os indivíduos com disciplina forma- tiva, corretiva, graciosa e amorosa, provocamos dano espiritual e realmente traímos o evangelho. Então, o que faremos sobre isso? Como nossas igrejas podem bri- lhar como luzes no meio de situações reconhecidamente difíceis, complexas e confusas? Como passamos de ser pessoas que não veem mal algum e amam nosso próprio conforto a pessoas que amam a Cristo e seu povo, independentemente do custo para nós? Planeje com antecedência As igrejas muitas vezes não fazem a coisa certa — tanto eclesiás- tica quanto civilmente — porque não pensaram com antecedência em como proceder em situações específicas. Não podemos esperar até que o cenário de pesadelo ocorra. Se o fizermos, teremos certe- za de lidar com isso da forma inadequada. Antes, precisamos ante- cipadamente ter procedimentos claros e escritos a serem seguidos. Para as igrejas presbiterianas, há um sentido em que isso já foi determinado para nós. Na igreja Presbiteriana na América, por exemplo, temos o livro de ordem da igreja, que estabelece um pro- cesso disciplinar. Para as igrejas independentes que não têm regras de disciplina denominacional é necessário que haja um processo 17 claro e escrito de disciplina eclesiástica. Independentemente do contexto denominacional, como líderes eclesiásticos, devemos es- tar determinados a seguir o processo — não importa quem esteja envolvido (Mateus 18.15-20; 1 Timóteo 5.21). Entretanto, devemos admitir que talvez precisemos de outros protocolos para ajudar a orientar respostas a situações específicas. Por exemplo, quando há suspeita ou confirmação de abuso infan- til, os líderes da igreja precisam ter e seguir diretrizes específicas para denunciar o caso às autoridades civis competentes. Para desenvolver tais protocolos, será necessário trabalhar com um ad- vogado local para garantir que a igreja cumpra as leis estaduais de denúncia. Ter esse protocolo escrito retira os achismos da denún- cia. Em muitos estados, a exigência é que os líderes eclesiásticos relatem o assunto assim que ele é descoberto, e então permitam que as autoridades competentes investiguem e determinem se um crime foi cometido. Cooperar com o estado nestas questões é apropriado e bíblico (Romanos 13.1-7). Seja firme, mas amável O apóstolo Paulo nos exorta a restaurar os pecadores com brandu- ra (Gálatas 6.1). Tal mansidão não é oposta à firmeza e à determi- nação; pelo contrário, isso decorre de reconhecer que nós também somos pecadores. Esse reconhecimento deve nos preservar de uma justiça própria jactanciosa ou de uma ira arrogante. Esteja certo de que com pecados como o abuso infantil, há uma ira justa que é apropriada contra o pecado e seus efeitos a longo prazo. Ainda assim, é a bondade de Deus que leva ao arrependimento (Roma- nos 2.4). Mesmo enquanto tratamos amável e firmemente com aqueles que cometem o crime, estamos buscando o seu arrependi- mento e restauração final. Porém, muitas vezes falhamos em demonstrar compaixão similar para com as vítimas. As igrejas regularmente noticiam falhar ao lidar com compaixão com as mulheres que se divorciam dos seus maridos que são flagrados vendo pornografia infantil; ou rele- varem quando casos de abuso infantil são descobertos. Outras igrejas confessam que se recusam a defender as mulheres que são fisicamente maltratadas por seus maridos ou que as crianças que 18 CRISTÃO E A SEXUALIDADE são abusadas sexualmente por seus pais passam despercebidas. Onde está a compaixão por essas vítimas? Como igrejas, devemos ser determinados a demonstrar compaixão àqueles contra quem o pecado foi cometido por sermos determinados a fazer com eles como desejamos que os outros façam conosco (Mateus 7.12). Lidere e se envolva com o evangelho Tanto o autor quanto a vítima do pecado precisam da mesma coisa: o evangelho de Jesus. Aqueles que cometem pecados sexuais — seja imoralidade sexual, adultério ou mesmo abuso sexual — precisam ouvir o evangelho. A suma da disciplina é confrontar o pecador com as demandas de Cristo, exigir o arrependimento, mas também buscar novos padrões de obediência que só podem ocor- rer quando o pecador corre diariamente para Cristo. Muitas vezes, aqueles que cometem pecados complicados e he- diondos acreditam que seus pecados são muito grandes para que sejam perdoados. Eles precisam ser lembrados de que “não há pecado tão grande, que possa trazer condenação àqueles que verdadeiramente se arrependem” (Confissão de Fé de Westmins- ter 15.4). Tal arrependimento genuíno provém da “apreensão da misericórdia [de Deus] em Cristo para com aqueles que se arre- pendem” (CFW 15.2). Quão grande é a misericórdia de Deus em Cristo? Tão grande que ele enviou seu Filho unigênito para morrer pelos pecadores, e que essa morte é suficiente para perdoar todos os nossos pecados, mesmo os mais hediondos. As vítimas também precisam do evangelho de Jesus: que Jesus é um Salvador que não esmaga a cana quebrada ou apaga a torcida que fumega (Mateus 12.20); que ele se identifica com o ferido e quebrantado e concede liberdade aos oprimidos pelo pecado (Lu- cas 4.17-21); e que Ele também perguntou “por quê?”, quando a dor e o desamparo de Deus foram esmagadores (Mateus 27.46). Mas as vítimas do pecado também precisam saber que Jesus faz mais do que se identificar conosco em nossas dores, ele realmente fez algo sobre isso. Através da sua ressurreição, ele é capaz de dar nova vida e nova esperança no presente e no futuro. Há poder para prosseguir em meio a dor que eles conhecem. Além disso, o evangelho nos fornece a base para o perdão, sabendo que nós tam- 19 bém cometemos pecados hediondos contra Deus (Efésios 4.32). Esteja preparado para um longo caminho Essa é realmente a coisa mais difícil de todas. Como líderes no ministério, gostamos de acreditar que quando intervimos, traba- lhamos em um processo disciplinar e nos envolvemos com o evan- gelho, nós “consertamos” a situação. Mas isso não funciona assim. Especialmente em situações em que há uma denúncia significativa — como em um relacionamento adúltero de longo prazo, divórcio ou abuso sexual — pode levar meses e anos de aplicação do evan- gelho para que vejamos cura e esperança. Tais situações geralmente envolvem apoio financeiro (se o crimi- noso arrependido perde o seu emprego, se houver um divórcio), aconselhamento ou terapia de longo prazo (que podem ou não ser cobertos pelo seguro) ou reuniões contínuas e regulares de prestação de contas. Essas coisas custam tempo, esforço e energia emocional aos pastores e líderes no ministério. E, ainda assim, Deus, por meio do seu Espírito, não apenas nos sustenta para amar dessas maneiras, mas também nos aponta para o objetivo final de tudo: “[Cristo,] o qual nós anunciamos, advertindo a todo homem e ensinando a todo homem em toda a sabedoria, a fim de que apresentemos todo homem perfeito em Cristo” (Colossenses 1.28). Ver pecadores recuperados, vítimas restauradas e os dois em caminho seguro para o céu — o que mais um pastor ou uma igreja desejariam?20 CRISTÃO E A SEXUALIDADE MINISTRANDO AOS QUE INCORRERAM EM PECADOS SEXUAIS Rosaria Butterfield Ir a Cristo é o teste decisivo da realidade, pois nos faz enfrentar o fato de que nosso pecado é nosso maior problema. Todos os dias, um crente deve enfrentar a realidade de que o pecado original nos distorce, o pecado atual nos distrai e o pecado interior nos mani- pula. Essa distorção, distração e manipulação criam uma distância entre nós e nosso Deus. Nós estamos em uma guerra, e quanto mais cedo a percebermos, melhor. O sofrimento sexual vem com cargas de vergonha, pois o pecado sexual é em si mesmo destrutivo: nos persegue, nos aprisiona e nos seduz para fazermos a sua vontade. O pecado sexual não descansará até que tenha capturado seu objeto. Quando a nossa consciência nos condena, às vezes, tentamos lutar. Mas quando a vergonha impõe o isolamento, nos escondemos exatamente das pessoas e recursos de que precisamos. Nós ficamos apreensivos por isso, até que Satanás prometa enganosamente que o doce alívio virá apenas ao entretermos aquele olhar lascivo, clicarmos no link da Internet ou apagarmos as luzes de nossos quartos e corações, abraçando o semelhante portador da imagem divina que Deus nos proíbe abraçar. Nós, ovelhas sexualmente feridas, sacrificaremos casamentos fiéis, filhos preciosos, ministérios frutíferos, trabalho produtivo e repu- tações imaculadas pelo prazer sexual imediato e ilícito. Podemos orar sinceramente pela libertação de um pecado sexual em particular, apenas para sermos enganados quando sua falsifi- cação nos seduzir. Quando oramos pela libertação do pecado por meio do sangue expiatório de Cristo, isso significa que eu conheço a verdadeira natureza do pecado, não que eu já não sinto sua atra- 21 ção. Se você deseja ser forte do seu próprio jeito, Deus não respon- derá a você. Deus quer que você seja forte no Cristo ressurreto. As pessoas que são sexualmente feridas — você e eu — precisa- mos conhecer profundamente as seguintes realidades bíblicas se quisermos encontrar a liberdade em Cristo e ministrar a outras pessoas sexualmente feridas: O amor de Deus Deus prova o seu próprio amor para conosco pelo fato de ter Cris- to morrido por nós, sendo nós ainda pecadores (Romanos 5.8). A morte de Cristo é pessoal. É “por nós”. Se você está em Cristo, o seu amor expiatório vem com o poder de salvar você do seu peca- do e de sua culpa. O pecado sexual produz três coisas que afastam do amor de Deus. Primeiro, a sua prática ao longo do tempo fere a consciência, fazendo-nos entorpecidos e mudos para a beleza da santidade. Segundo, porque o pecado sexual desenvolve-se em se- gredo, isso nos isola da família de Deus. Terceiro, o pecado sexual geralmente envolve outra pessoa e, portanto, atrai outra pessoa para o pecado, aumentando, assim, a extensão e o dano do pecado. Se você sofre sob o fardo do pecado sexual, venha a Jesus, porque o jugo dele está firmado no amor de Deus. Deus é amor e ele é por você. Ele está intercedendo por você. Ele quer que você conheça o seu amor. O perdão de Deus Enquanto calei os meus pecados, envelheceram os meus ossos pe- los meus constantes gemidos todo o dia. Porque a tua mão pesava dia e noite sobre mim, e o meu vigor se tornou em sequidão de estio. Confessei-te o meu pecado e a minha iniquidade não mais ocultei. Disse: confessarei ao SENHOR as minhas transgressões; e tu perdoaste a iniquidade do meu pecado (Salmo 32.3-5). Nós vivemos em um mundo que cada vez mais ensina a ideia de que o perdão de si mesmo resolve a vergonha. A noção de autoperdão vem de uma falsa e deficiente antropologia da personalidade. Nós não nos criamos e, portanto, não podemos perdoar a nós mesmos. Porque Deus é por você, Ele quer perdoá-lo e restaurá-lo. Ele ama um coração quebrantado e contrito. A cura de Deus por meio de Cristo 22 CRISTÃO E A SEXUALIDADE Enviou-lhes a sua palavra, e os sarou, e os livrou do que lhes era mortal. (Salmo 107.20). Sara os de coração quebrantado e lhes pensa as feridas (Salmos 147.3). Por meio do seu sangue, Cristo satisfez a justiça de Deus. Nesse supremo ato de amor está a solu- ção para a persistente culpa do pecado sexual. Pelas pisaduras de Jesus nós fomos sarados (Isaías 53.3). A providência de Deus para a sua dor Bendito seja o Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, o Pai de misericórdias e Deus de toda consolação! É ele que nos conforta em toda a nossa tribulação, para podermos consolar os que estive- rem em qualquer angústia, com a consolação com que nós mesmos somos consolados por Deus (2 Coríntios 1.3-4). O pecado sexual tem consequências que não podemos controlar e nem mesmo ver até que o Espírito Santo tire as escamas dos nossos olhos. O peca- do sexual é um tirano implacável. O aborto exige a morte de uma criança que ainda não nasceu. A homossexualidade exige a con- denação da ordem de Deus na criação. O adultério exige a traição dos votos feitos diante de Deus e a destruição de “uma só carne”. A pornografia exige escravos sexuais e joga mulheres e crianças na indústria do tráfico sexual. Quando nós, crentes, cometemos pe- cado sexual, nós cuspimos na face de Deus. Quando, nós, crentes, nos arrependemos e abandonamos o pecado sexual, nós somos restaurados. A providência de Deus tem um lugar para a sua dor. Porque você (ainda) vê o que outros cegos pelo pecado não podem ver, você é uma seta para o próprio Deus. Você vê o sangue em suas mãos, você sente a sua penalidade e culpa serem removidas e você traba- lha como embaixador de Deus. O povo de Deus Não vos sobreveio tentação que não fosse humana; mas Deus é fiel e não permitirá que sejais tentados além das vossas forças; pelo contrário, juntamente com a tentação, vos proverá livramento, de sorte que a possais suportar (1 Coríntios 10.13). Nós, na igreja, somos o meio de escape uns dos outros. Deus já proveu um meio de escape, através da sua Palavra e seu Espírito, e também através do corpo de Cristo e da simples prática da hospitalidade. A porta 23 aberta de sua casa e de seu coração é o meio de escape de algum irmão ou irmã. Jesus disse: “Em verdade vos digo que ninguém há que tenha deixado casa, ou irmãos, ou irmãs, ou mãe, ou pai, ou filhos, ou campos por amor de mim e por amor do evangelho, que não rece- ba, já no presente, o cêntuplo de casas, irmãos, irmãs, mães, filhos e campos, com perseguições; e, no mundo por vir, a vida eterna” (Marcos 10.29-30). Jesus fala aqui da família de Deus cujo amor, presença e bondade são o que o Senhor usa para recompensar o “cêntuplo” do que você precisou deixar para vir a Cristo. O evangelho é custoso. E é digno do custo. Mas esses princípios bíblicos não são anotações para lembrete. Você não pode ministrar aos feridos sexualmente até que esteja cheio da Palavra de Deus, bebendo longa e firmemente dos seus poços profundos. Nossos vizinhos sexualmente feridos não neces- sitam primeiramente ser educados na visão de mundo cristã; eles precisam ser levados à cruz. Antes que possamos fazer isso, nós mesmos devemos “nos enriquecer com a Palavra” (emprestando o título do livro de A.W. Pink [Enriquecendo-se com a Bíblia – Edito- ra Fiel]). Nós mesmos devemos saber que, para Deus, o arrependi- mento é o ponto de partida. 24 CRISTÃO E A SEXUALIDADE O QUE O FUTURO RESERVA Denny Burk O presidente Obama estava correto quando disse que a decisão da Suprema Corte sobre o casamento gay caiu como um raio. A decisão em Obergefell v. Hodges, que legalizou o casamento gay em todo o país, é de fato um divisor de águas na nossa vida nacio- nal. Embora a maioria dos americanos agora apoiem o casamento gay, muitos de nós consideramos essa decisão como uma tragédia moral e jurídica. Do ponto de vista legal, isso envolve cinco juízes não eleitos im- pondo ao país uma nova definição de casamento. Ojulgamento não está firmado em um sólido princípio jurídico, mas nos parece- res de cinco advogados que arrogam para si mesmos o direito de promulgar uma política social. A Suprema Corte não tem o direito de redefinir o casamento para todos os cinquenta estados, mas isso é exatamente o que fez. Do ponto de vista moral, a decisão é uma completa subversão do bem, do direito e da verdade em relação ao casamento. O casamento é a união pactual de um homem e uma mulher para a vida. Sua conexão com a procriação e os filhos nos foi revelada na natureza, na razão e no senso comum. A Bíblia revela ainda que o casamento é um emblema do evangelho — um símbolo do amor pactual de Cristo por sua igreja (Efésios 5.31-32). A decisão do tribunal tenta virar tudo de cabeça para baixo. Em consequência, essa decisão fica contra a razão e o senso comum. Mais importante ainda, é contra os propósitos daquele que criou o casamento desde o princípio (Gênesis 2.24-25). Uma nova realidade Embora eu esteja triste com essa decisão, continuo confiante de que os cristãos continuarão a dar testemunho da verdade sobre o casamento, mesmo que a lei da nossa terra agora esteja contra 25 nós. Ainda assim, muitos cristãos se perguntam como prosseguir nessa nova realidade. Eu sou um pastor, e essa pergunta é exatamente o que eu ouvi das pessoas em minha igreja. Normalmente os nossos membros não fazem perguntas quanto ao ensino da Bíblia sobre homossexuali- dade e casamento. Eles sabem disso. Tampouco eles têm dúvidas sobre a obrigação de amar o próximo, buscar o seu bem e ter paz com todos (Marcos 12.29-31; Lucas 6.33; Romanos 12.18). Eles sabem de tudo isso também. A pergunta deles é como viver o que Jesus os chamou para ser quando as pessoas os tratam com hostilidade. Eu conversei recen- temente com uma irmã, membro da igreja, cujo chefe é gay. Cerca de metade dos seus colegas de trabalho também são gays. Eles são seus amigos, e ela lhes ama. Ela quer manter um relacionamento com eles, e ela espera permanecer sendo uma parte das suas vidas. Mas ela está preocupada de que as suas crenças cristãs sobre o casamento e a sexualidade a afaste deles, uma vez que se tornem conhecidas. A última coisa em que ela pensa é travar uma guerra cultural ou ganhar um debate com eles. Ela só quer espaço para ser amiga deles, mesmo que eles discordem completamente sobre essas questões fundamentais. Eu poderia contar outras histórias de irmãos e irmãs em Cristo que não estão apenas preocupados em manter relacionamentos com amigos no trabalho, como também em cometerem suicídio profissional se suas opiniões cristãs se tornarem conhecidas entre seus colegas de trabalho. Mais uma vez, eles não querem travar uma guerra cultural com ninguém. Mas eles também não querem enfrentar a perda do seu emprego ou uma advertência em seu ar- quivo dos Recursos Humanos quando eles não forem a uma festa na empresa em comemoração pelo colega de trabalho que acaba de se casar com um parceiro do mesmo sexo. Eles estão tentando descobrir como serem fiéis a Jesus, amigos fiéis e empregados fiéis quando essas obrigações parecerem estar em conflito. Esse é o desafio que estou percebendo entre nossos membros. O que eles estão se perguntando é se sua fé cristã será tolerada no espaço público. E eu não estou falando sobre qualquer desejo da 26 CRISTÃO E A SEXUALIDADE parte deles de se envolverem em proselitismo agressivo e desa- gradável. Eles estão se perguntando se um pluralismo genuíno existirá na América pós-Obergefell, ou se as opiniões cristãs sobre sexualidade e casamento serão excluídas da nossa vida nacional. Sou muito grato por esses queridos irmãos e irmãs em minha igre- ja. Nenhum deles expressou qualquer pensamento de abandonar o ensinamento de Jesus por causa dessas dificuldades. Eles andarão com Cristo, não importa o custo. Eu louvo a Deus por isso. Mas ainda assim, estou preocupado com eles, e estou orando por eles; pois são os atingidos silenciosos na linha da frente de uma guerra cultural em que não desejam estar. Eles só desejam seguir Jesus em paz. E como as implicações de Obergefell alcançam as suas vidas, eu oro para que eles sejam capazes de fazer exatamente isso (1 Timóteo 2.2). Aumento da oposição Os cristãos estão começando a perceber que o seu lugar na vida americana está sendo julgado no tribunal da opinião pública. E não está claro se isso acabará bem para a igreja cristã. No início deste ano, vimos os governadores de Indiana e Arkan- sas abandonarem os Atos de Restauração da Liberdade Religiosa (ARLR) em seus estados. Esse foi um momento de alerta em nossa vida nacional que revelou quão profundamente a América mu- dou suas atitudes sobre a homossexualidade, quão desajustados os evangélicos estão com a nova ortodoxia sexual e como muitos americanos estão dispostos a punirem os evangélicos por suas crenças transgressoras. Vimos dois governadores republicanos regressando de estados com ARLR, o que seria completamente incontroverso há apenas dez anos. Vimos uma mídia nacional repudiar de modo arrogante a nossa primeira liberdade na Declaração dos Direitos dos Cida- dãos dos Estados Unidos com citações temíveis ou como “pseudo” liberdade religiosa. Vimos políticos após políticos que não quise- ram ou não foram capazes de defender de modo coerente a liber- dade religiosa. E vimos incontáveis cabeças falantes denegrirem a liberdade religiosa como um eufemismo para intolerância e discri- minação. O colunista do New York Times, Frank Bruni, escreveu 27 que os cristãos deveriam ser “obrigados a tirar a homossexualida- de da sua lista de pecados”. Não é de admirar que Nicholas Kristof tenha dito que “os evangélicos constituem um dos poucos grupos dos quais é seguro zombar abertamente”. A liberdade religiosa tomou um golpe épico na vida americana, e parece que estamos apenas começando. E o foco do ataque pare- ce ser os evangélicos. Os evangélicos estão começando a sentir desprezo aberto de nossos desprezadores eruditos, que acham a nossa antiga fé bizarra e discordante com a América pós-revolução sexual. Não há uma “maioria silenciosa” para os cristãos apelarem por socorro. Os evangélicos são uma minoria fiel quando se trata do nosso compromisso com o ensinamento de Jesus sobre a sexu- alidade. Não se trata apenas das pessoas não gostarem das nossas opiniões. É também que as pessoas não gostam de nós por causa das nossas opiniões. De fato, uma pesquisa recente descobriu que há mais pessoas que veem as pessoas gays favoravelmente do que as que veem os evangélicos favoravelmente. Recuo ou comprometimento? Sem dúvida, os cristãos evangélicos enfrentam uma nova realida- de na América pós-Obergefell. E eles estão se perguntando como seguir em frente. Eles ouvem alguns líderes aconselhando recuo e desengajamento da cultura. Eles ouvem outros líderes dizendo que precisamos nos comprometer com a guerra cultural com o tipo de politicagem que marcou a antiga Moral Majority dos anos 1980. Nenhuma opção realmente captura o que Jesus nos ensinou sobre o nosso relacionamento enquanto permanecemos no mundo. João 17 registra as palavras da oração de Jesus pouco antes de ele ser entregue para ser crucificado. Sua oração se concentrou não ape- nas nos onze discípulos restantes, mas também em todos aqueles que creriam nele através do testemunho dos seus discípulos. Em suma, Jesus estava orando por nós. Entre outras coisas, Jesus orou para que estivéssemos no mundo, não fôssemos do mundo, por causa do mundo. 1. Jesus orou, “Não peço que os tires do mundo, e sim que os guar- des do mal... Assim como tu me enviaste ao mundo, também eu os enviei ao mundo” (vv. 15, 18). Isso significa que o desengajamento 28 CRISTÃO E A SEXUALIDADE do mundo não é uma opção para os cristãos. Jesus nos enviou ao mundo sabendo muito bem que enfrentaríamosoposição: “No mundo, passais por aflições; mas tende bom ânimo; eu venci o mundo” (16.33). 2. Mas estar no mundo não significa ser do mundo. No evangelho de João, “mundo” não é uma palavra genérica para o planeta Ter- ra. É um termo técnico que designa a humanidade em sua queda e rebelião contra Deus (veja também 1João 2.15-17). Assim, quan- do Jesus nos envia ao mundo, ele sabe que está nos enviando para um reino de rebelião ativa contra os propósitos do seu Pai. Mas a sua expectativa é que nossa presença no mundo seja uma influ- ência “santificadora”. Por quê? Porque a nossa fidelidade a Jesus e sua Palavra “nos santificam” no meio da podridão (João 17.16-17). E essa é a questão. 3. Nós estamos no mundo, ainda que não sejamos do mundo, por causa do mundo. Jesus diz que envia seus discípulos santificados ao mundo para que “o mundo conheça que tu me enviaste e os amaste, como também amaste a mim” (v. 23). Em última análise, nossa santificação no mundo é para uma missão: mostrar ao mun- do — em toda sua queda e rebelião — que Deus enviou o seu Filho para morrer pelos pecadores. Sim, nós enfrentamos uma nova realidade como consequência de Obergefell. Mas sabemos como avançar nessa nova realidade por- que Jesus já nos deu as nossas ordens de marcha. Ele nos mostrou que a oposição do mundo é a regra, não a exceção. E nós sabemos que vamos vencer no final, porque Jesus já venceu (16.33). 29 DEVO ASSISTIR A UM CASAMENTO HOMOSSEXUAL? Kevin DeYoung Por que um cristão poderia se recusar a assistir, ajudar ou parti- cipar de uma cerimônia de casamento entre pessoas do mesmo sexo? Para simplificar, vamos supor que esta é uma discussão en- tre cristãos tradicionais que creem — como a igreja sempre acredi- tou e como a maioria da igreja no mundo ainda acredita — que o comportamento homossexual é pecaminoso e que o casamento é uma união pactual e conjugal entre um homem e uma mulher. Com esse comentário de esclarecimento, podemos abordar a questão diretamente: Por que um cristão poderia sentir o dever de consciência de não assistir ou participar de um casamento gay? Não é por causa de fanatismo, medo ou porque não sabemos que Jesus esteve com pecadores que nos leva a essa conclusão. É por causa do nosso desejo de ser obedientes a Cristo e por causa da na- tureza do evento do casamento em si. Uma cerimônia de casamento, na tradição cristã, é antes de tudo um culto de adoração. Portanto, se a união que se celebra no culto não pode ser biblicamente sancionada como um ato de adoração, cremos que o culto dá credibilidade a uma mentira. Não podemos, em boa consciência, participar de um culto falso. Eu entendo que não soa muito agradável, mas a conclusão segue a premissa, a sa- ber, que o “casamento” que está sendo celebrado não é de fato um casamento e não deve ser celebrado. Além disso, há muito tempo existe um entendimento de que os presentes em uma cerimônia de casamento não são apenas obser- vadores ocasionais, mas testemunhas que estão concedendo a sua aprovação e apoio aos votos que devem ser feitos. É por isso que a linguagem tradicional fala sobre se reunir “aqui, diante de Deus, e diante desta congregação”. É por isso que um dos modelos de 30 CRISTÃO E A SEXUALIDADE casamento na Igreja Presbiteriana na América ainda tem o minis- tro dizendo: Se qualquer homem pode mostrar justa causa pela qual eles não podem se casar licitamente, que o declare agora, ou então cale-se para sempre. Muito explicitamente, o casamento não é uma festa para amigos e familiares. Não é uma mera formalidade cerimonial. É um evento divino no qual aqueles reunidos celebram e honram a “celebração do matrimônio”. É por isso que — embora eu queira construir vínculos com uma amiga lésbica ou garantir a um membro da família que seja gay que eu me importo com ele e quero ter um relacionamento com ele — eu não participaria de uma cerimônia de casamento entre pessoas do mesmo sexo. Eu não posso ajudar com o meu bolo, com minhas flores, ou com a minha presença a tornar solene aqui- lo que não é santo. Ao assumir essa posição, muitas vezes eu ouvi coisas como esta em resposta: Mas Jesus convivia com pecadores. Ele não estava preocupado em ser contaminado pelo mundo. Ele não queria afastar as pessoas do amor de Deus. Ele estava sempre abrindo as portas da misericór- dia de Deus. Ele nos diria: “Se alguém lhe obriga a assar um bolo, asse dois para ele”. Ok, vamos pensar nessas objeções. Desejo, na verdade, refletir por frases, e não apenas com frases de efeito e sentimentalismo vago. Jesus convivia com pecadores. Verdade, mais ou menos (depende do que você entende por “convivia”). Mas Jesus cria que o casa- mento era entre um homem e uma mulher (Mateus 19.3-9). O exemplo de Cristo nos evangelhos nos ensina que não devemos ter medo de passar tempo com pecadores. Se um casal gay de vizinhos convida você para jantar, não os ignore. Ele não estava preocupado em ser contaminado pelo mundo. Essa não é a questão aqui. Isso não é sobre piolhos ou germes de peca- do. Nós mesmos temos muitos deles. Ele não queria afastar as pessoas do amor de Deus. Mas Jesus fez isso o tempo todo. Ele agiu de maneiras que poderiam ser involun- 31 tariamente, e com mais frequência deliberadamente, antagônicas (Mateus 7.6, 13-27; 11.20-24; 13.10-17; 19.16-30). Jesus afastava as pessoas o tempo todo. Isso não é desculpa para que sejamos imprudentes e indelicados. Mas isso deveria nos fazer abandonar a noção não-bíblica que diz que se alguém se sente magoado por suas palavras ou não amado por suas ações, você consequente- mente foi insensata e pecaminosamente desamoroso. Ele estava sempre abrindo as portas da misericórdia de Deus. Amém. Continuemos pregando Cristo e pregando como Ele fez: convocando todas as pessoas a se arrependerem e crerem no evan- gelho (Marcos 1.15). Se alguém lhe obriga a assar um bolo, asse dois para ele. Sem dúvi- da, esse e é um princípio verdadeiro e belo sobre como os cristãos, quando injuriados, não devem revidar. Mas dificilmente isso pode significar que fazemos o que as pessoas exigem, não importa os nossos direitos (Atos 4.18-20, 16.35-40, 22.22-29) e não importa o que seja certo diante de Deus. Um casamento não é um convite para jantar, uma festa de forma- tura ou uma comemoração pela aposentadoria. Mesmo em um ambiente completamente secular, ainda permanece um significa- do — e, às vezes, os convites de casamento o expressam — de que nossa presença no evento honraria o casal e seu casamento. Seria difícil, se não impossível, assistir a um casamento (muito menos ajudar ou fornecer a comida principal), sem que a sua presença comunique celebração e apoio ao que está acontecendo. E por mais doloroso que seja para nós e para aqueles que amamos, celebrar e apoiar uniões homossexuais não é algo que Deus ou sua Palavra nos permitirá fazer. 32 CRISTÃO E A SEXUALIDADE APROFUNDE EM SEUS ESTUDOS: O que a Bíblia ensina sobre a homossexualidade? 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