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TEXTO E LINGUAGEM TEXTO E LINGUAGEM TEXTO E LINGUAGEM TEXTO E LINGUAGEM TEXTO E LINGUAGEM W30Vn0Nll 3 01X31 W39VnONH 3 01X31 W30VD0NI1 3 01X31 W30Vn0N!l 3 01X31 W39VnONIl 3 01X31 TEXTO E LINGUAGEM C oleção d irig ida por Maquira O sakabe, Maria Laura M ayrink-Sabinson c Raquel Salck Fiad A coleção destina-se principalmente a professores do ensino médio, na área de língua e literatura. As obras pretendem contribuir para a atuação na sala de aula, trazendo resultados de pesquisas e propondo métodos muitas vezes inovadores, sempre com sólido embasamento teórico. CAPA Projeto gráfico Alexondre Martins Fontes Ilustração Rex Design REDAÇÃO E TEXTUALIDADE REDAÇÃO E TEXTUALIDADE* Maria da Graça Costa Vai martins Martins Fontes SUMÁRIO A p re se n ta ç ã o ................................................................ VII PRIM EIRA PARTE PRESSUPOSTOS CAPITULO J Texto e tex tualidade ................................................ 3 CAPITULO 2 Como ava lia r a tex tualidade? .............................. 17 SEGUNDA PARTE RELATO DE UMA ANÁLISE CAPITULO 3 As condições de produção ..................................... 43 CAPITULO 4 A coerência, a coesão e a informatividade: breve es tudo quantita tivo ................................ 53 CAPITULO 5 A coerência, a coesão e a informatividade: análise qualitativa ................................................ 59 CAPITULO 6 Uma visão global do c o r p u s .................................. 111 Conclusão ..................................................................... 121 Noias .............................................................................. 129 B ib lio g ra fia ................................................................... 131 * Copyright O 1991. I jvm n a M anm \ Fkmtt% FAttofa lida .. Sâo M/wfe /* i/n /j presente edição. 1T ed ição / v y / 3 ! edição 2006 2! tiragem 2009 iV rpan^ã*) do original Múuricto Buhhítzar Leal Revi w s gráficas Edunnio Angelo Batista Mau r im t tUilthnzar Leal P rodução gráfica GrrnIJo Abes l>ados Internacionais ck ( aUfci&v*’ na Pubbcaçáo (C IP» iC áfm ra Brasüdna do 1 j \ ru . SP. Braâl) Comi Vai. Mana da Gi as,a Kedaçãn e textualiiladc / M ana da (Jraça C m ta Vai. - 3* ed SAn Paulo M anias Fontes. 2006. - (Tcxio c linguagem» ISBN 85-336-2*40-2 I Português - Redação 2. K edaçjo flaleratunO 1 Titulo. II Sér»e 06 8407 __________________________________________ CDI>-X0 H índices p u ra catalogo sistem ático: I RedaçAo Liicratura S0 K 2 . Texto : ProduçJko : R ctom a 808 Todos os direitos desta edição para a lingua iwrtuguesa re senados à IJvraria Martins Fontes Editora lida. Rua Ctmxelheiro Ramalho. 330 01325 OPO Sá o Paulo SP Rrasil Tel <li) 3241.3677 Fax {11) 3105.6993 C-rnail: infot&maninsforucseditora.tom.hr hnp:/M*ww.murimsfonteseditora.< om.br APRESENTAÇÃO A lingüística textual, desenvolvida sob re tudo na E u ro p a a p a r t i r do final da década de 60, tem se ded icado a e s tu d a r a n a tu re z a do texto e os fa to res envolvidos em sua p ro d u ção e recepção. Es sa teoria, na m edida em q u e b u sc a esc la recer o q u e é e co m o se produz u m texto, m erece se r co nhecida e con s id e rad a p o r quem se in teressa pe lo t rab a lh o com a exp ressão e sc r i ta na escola. Este livro p rocura condensar algumas das no ções mais relevantes da teoria e relacioná-las com os resu ltados de um a análise de cem redações ela b o ra d a s po r cand ida tos ao cu rso de Letras da UFMG no ves t ibu la r de 1983, na tentativa de e s tabe lecer um diagnóstico e lev an ta r a lgum as s u gestões p a r a o ensino esco la r de red ação 1. PRIMEIRA PARTE PRESSUPOSTOS CA PITULO I T E X T O E T E X T U A L ID A D E 1. O q u e é t e x t o Para se com preender melhor o fenômeno da produção de textos escritos, im porta entender previamente o que caracteriza o texto, escrito ou oral, unidade lingüística comunicativa básica, já que o que as pessoas têm para dizer umas às o u tras não são palavras nem frases isoladas, são textos. Pode-se definir texto ou discurso como ocor rência lingüística falada ou escrita, de qualquer extensão, do tada de unidade sociocomunicativa, sem ântica e formal. Antes de mais nada, um texto c uma uni dade de linguagem em uso2, cum prindo uma função identificável num dado jogo de a tuação 3 a) o pragmático, que tem a ver com seu f un cionamento enquanto atuação informacio- nal e comunicativa; b)o semãntico-conceitual, de que depende sua coerência; c) o lormal, que diz respeito à sua coesão. 2. O que é textualidade Chama-se textualidade ao conjunto de carac terísticas que fazem com que um texto seja um texto, e não apenas uma seqüência de frases. Beaugrande e Dressler (1983) apontam sete fato res responsáveis pela textualidade de urn discur so qualquer: a coerência e a coesão, que se rela cionam com o material conceituai e lingüístico do texto, e a intencionalidade, a aceitabilidade, a situacionalida.de, a informatividade e a intertex- malidade, que têm a ver com os fatores pragmá ticos envolvidos no processo sociocomunicativo. 2.1. Coerência e coesão A coerência resulta da configuração que as sumem os conceitos e relações subjacentes à su perfície textual. É considerada o fator fundamen tal da textualidade, porque c responsável pelo sentido do texto. Envolve não so aspectos lógicos e semânticos, mas também cognitivos, na medi da em que depende do partilhar de conhecimen tos entre os interlocutores. Um discursoé aceito como coerente quando 5 apresen ta um a configuração conceituai com pa tível com o conhecim ento dc m undo do reccbe- dor. Essa questão é fundamental. 0 texto não sig nifica exclusivam ente por si mesmo. Seu senti do é cons tru ído não só pelo p ro d u to r com o tam bém pelo reccbedor, que precisa de te r os conhe cimentos necessários à sua in terpretação . O pro d u to r do d iscurso não ignora essa par t ic ipação do in te r locu to r e con ta com ela. É fácil verificar que grande parte dos conhecimentos necessários à com preensão dos textos Aão vem explícita, mas fica dependente da capacidade de pressuposição e inferência do recebedor. Assim, a coerência do texto deriva de sua ló gica in terna , resu ltan te dos significados que sua rede de conceitos e relações põe em jogo, mas tam bém da com patib ilidade en tre essa rede con ceituai — o m undo textual — e o conhecim ento de m undo dc quem processa o discurso. A coesão é a m anifestação lingüística da coe rência; advém da m aneira como os conceitos e re lações sub jacen tes são expressos na superfície textual. Responsável pela unidade formal do tex to, constrói-se a través de m ecanism os g ram a t i cais c lexicais. E n tre os prim eiros estão os p ronom es ana- fóricos, os artigos, a elipse, a concordância, a cor relação en tre os tem pos verbais, as conjunções, por exemplo. Todos esses recursos expressam re lações não só en tre os elem entos no in te r io r de um a frase, mas também entre frases e seqüências dc frases den tro de um texto. Já a coesão lexical se faz pela re iteração, pe la substitu ição e pela associação. A re ite ração se 6 dá pela simples repetição de um item léxico e tam bém por processos como a nominalização (ex.: a re tomada, a través de u m substan tivo cognato, da idéia expressa por um verbo, como em adiar/adia mento ou promover/promoção). A substitu ição in clui a sinonímia, a antonímia, a hiponímia (quando o term o substi tu ído rep resen ta u m a parte ou umelem ento e o su b s t i tu id o r rep resen ta o todo ou a classe — ex.: carroça/veículo), e a h iperoním ia (quando o te rm o substi tu ído represen ta o todo ou a classe e o substitu idor um a parte ou um elemen to — ex.: objeto/caneta). Finalmente, a associação é o processo que perm ite relacionar itens do voca bulário pertinentes a um mesmo esquema cogniti vo (por exemplo, se falam os aniversário, podemos em seguida m enc ionar bolo, velinha, presentes, e esses termos serão interpretados como alusivos ao m esmo evento). A coerência e a coesão têm cm com um a ca racterís tica de p rom over a inter-relação sem ân tica en tre os e lem entos do discurso, responden do pelo que se pode ch am ar de conectividade tex tua l8. A coerência diz respeito ao nexo en tre os conceitos c a coesão, à expressão desse nexo no plano lingüístico. È im portan te reg is tra r que o nexo é indispensável para que u m a seqüência de frases possa ser reconhecida como texto. En tretanto , esse nexo nem sem pre precisa e s ta r ex plícito na superfíc ie do texto por um m ecanismo de coesão gram atica l. Vejamos um exemplo: (1 )0 Pedro vai buscar as bebidas. A Sandra tem que ficar com os meninos. A Tereza a r ru m a a casa. Hoje eu vou p rec isar da a juda de to do mundo. 7 Unia íala como (1) é perfe itamente aceitável, tem coerência, Iaz sentido. E n tre tan to não ap re senta m arcadores sintáticos específicos que de notem sua coesão. 0 nexo entre as frases se cons trói não no nível gramatical, mas no nível semán- tico-cognitivo. Por ou tro lado, um a seqücncia de frases in terligadas por marcadores lingüísticos de coesão que não correspondessem a relações efetivas es tabe lec idas na e s t ru tu r a lógico-semântico- cognitiva subjacente não seria um texto. É pos sível forjar artificialmente' um exemplo para ilus t ra r (normalmente, a com petência textual intui tiva impede que as pessoas produzam seqüências desse tipo): (2) No rádio toca um rock. O rock é um rit mo moderno. O coração também tem rit mo. Ele é um músculo oco composto de duas aurículas e dois ventrículos. Em (2), a presença dc recursos coesivos in- terfrasais (a recorrência de item lexical assi nalada por artigo definido, o ar t icu lador tam bém e o pronom e anafórico ele) não é suficien te para garan ti r textualidade à seqüência, já que ela não funciona como um todo significativo coe rente. Entre tanto , é inegável a utilidade dos meca nismos dc coesão como fatores da eficiência do discurso. Alem de to r n a r a superfície textual es tável e econômica, na medida em que fornecem possibilidades variadas de se promover a conti nuidade e a progressão do texto, também perm i 8 tem a explicitação de relações que, implícitas, po deriam ser de difícil interpretação, sobretudo na escrita. Nas seqüências (3) e (4) abaixo, por exemplo, o nexo é facilmente recobrável pelo leitor, embora não manifesto na superfície: (3) A máquina parou. Está faltando energia elétrica. (4)Choveu. O chão está molhado. O mesmo não acontece, porem, com as frases de (5a) a (51). Nesses casos, se a relação pretendi da não vier expressa, o recebedor poderá a tribuir ao enunciado sentido diferente do que o autor que ria, sobretudo se, não se tratando de produção oral, não for possível depreender as intenções do produtor através da entonação. Veja-se: (5a) Paulo saiu. João chegou. (5b) Paulo saiu assim que João chegou. (5c) Paulo saiu, mas João chegou. (5d) Paulo saiu, porque João chegou. (5e) Paulo saiu, apesar de João ter chegado. (5f )Sc Paulo saiu, João deve ter chegado. Casos similares a (3) e (4) foram estudados por Isenberg (1968), que os interpretou como pos sibilidades de "textualização" entre frases assin- délicas. O prim eiro exemplifica a textualização por "conexão causai" (a máquina parou porque está faltando energia clétrica) e o segundo, por "interpretação diagnostica" (pode-se verificar que choveu pelo fato de o chão e s ta r molhado). 9 Ao contrário , os exemplos (5b-f), inspirados em Garcia (1977: 18-20, 262-264), não podem dis pensar a conjunção, porque o nexo conceituai e n tre as informações é, digamos, mais frouxo e, por tanto, de processamento não imediato. Há diferen tes possibilidades de articulação e, por isso, a o p ção por um a delas precisa ser explícita. Além disso, os recursos coesivos, quando pre sentes, devem obedecer a padrões prévios, caso contrário seu em prego será percebido como " in fração textual”9, tornando “ irregular" a seqüên cia em que ocorrem . Alguns dos princípios que orientam o em prego desses recursos serão lem brados mais adiante. Resumindo o que foi dito, o fundamental para a textualidade é a relação coerente entre as idéias. A explicitação dessa relação através de recursos coesivos é útil, m as nem sem pre obrigatória . E n tretanto, uma vez presentes, esses recursos devem ser usados de acordo com regras específicas, sob pena de reduzir a aceitabilidade do texto. 2.2. Os fatores p ragm áticos da textualidade Entre os cinco fatores pragmáticos estudados por Beaugrande e Dressler (1983), os dois p r im ei ros se referem aos protagonistas do ato de c o m u nicação: a intencional idade e a aceitabilidade. A intencionalidade concerne ao em penho do produtor em cons tru ir um discurso coerente, coe so e capaz de sa tisfazer os objetivos que tem em mente num a determ inada situação comunicativa. A meta pode ser inform ar, ou impressionar, ou 10 ala rm ar , ou convencer, ou pedir, ou ofender, ctc., e é ela que vai o r ien tar a confecção do texto. Em ou tras palavras, a intcncionalidade diz respeito ao valor ilocutório do discurso, elemen to da m aior importância no jogo de atuação co municativa. O outro lado da moeda c a aceitabilidade, que concerne à expectativa do recebedor dc que o con junto de ocorrências com que se defronta seja um texto coerente, coeso, útil c relevante, capaz de levá-lo a ad qu ir ir conhecim entos ou a cooperar com o.s objetivos do produtor. Grice (1975, 1978)10 estabelece máximas con- versacionais, que seriam es tra tég ias norm alm en te adotadas pelos produtores para alcançar a acei tabilidade do recebedor. Tais es tra tég ias se refe rem à necessidade de cooperação (no sentido de o p ro d u to r responder aos in teresses dc seu inter locutor) c à qualidade (autenticidade), quan tida de (informatividade), pertinência e relevância das informações, bem como à m ane ira como essas in formações são apresentadas (precisão, clareza, o r denação, concisão, ctc). Mas é possível que, deliberadam ente , o pro d u to r queira ap resen ta r um texto que desrespei te alguma(s) dessas máximas. Tal intenção, reco nhecida pelo recebedor, ganhará função significa tiva c resu ltará em efeito de sentido im portante no jogo interativo. É o que-Grice cham a de “ im- plicatura conversacional”: o recebedor prefere su por que a infração aos princípios conversacionais seja intencional e tenha alguma significação do que sim plesm ente aceitar que seu in terlocu tor possa produzir um discurso impertinente e sem sentido. 11 Charollcs (1978:38) afirma que, em geral, o rc- ccbedor dá um "crédito de coercncia" ao produ tor: supõe que seu discurso seja coerente e se em penha em captar essa coerência, recobrindo lacu nas. fazendo deduções, enfim, colocando a servi ço da compreensão do texto todo conhecimento de que dispõe. Assim, a comunicação se efetiva quando se es tabelece um contrato de cooperação entre os in terlocutores, de tal modo que as eventuais falhas do produtor são percebidas como significativas (as vezes, o sentido do texto çstá na suaaparente fal ta de sentido — cf. a piada), ou são cobertas pela tolerância do recebedor. A margem de tolerância e tanto maior quanto mais conhecido é o assunto e mais informal ê a situação. O produtor sabe da existência dessa tolerabil idade e conta com ela, assim como conta a capacidade de pressuposição e inferência do recebedor. Essa “cumplicidade" do recebedor para com o texto é que possibilita que a produção não seja tarefa excessivamente di fícil e tensa e, assim, viabiliza o jogo comunicativo. O terceiro fator de textualidade, segundo Beaugrandc e Dresslcr (1983), é a situacionalida- de, que diz respeito aos elementos responsáveis pela pertinência e relevância do texto quanto ao contexto em que ocorre. E a adequação do texto a situação sociocomunicativa. O contexto pode, realmente, del in ir o senti do do discurso e, normalmente, orienta tanto a produção quanto a recepção. Em determinadas circunstâncias, um texto menos coeso e aparen temente menos claro pode funcionar melhor, ser mais adequado do que outro de configuração mais completa. Se n e m de exemplo as inscrições lacó- 12 nicas das p lacas de trânsito, m a is ap ro p r iad as à s i tuação específ ica cm que são u sadas do que um longo texto explicativo ou persuas ivo que os mo to r is ta s seq u e r tivessem tem po de ler. A con junção dos três fa to res já mencionados resu l ta n u m a série de conseqüências p a ra a prá tica com unicativa. Em p r im e iro lugar, é im p o r tan te p a ra o pro d u to r saber com que conhecimentos do recebedor clc pode co n ta r c que, portan to , não p rec isa ex p lic ita r no seu discurso. Esses conhecim entos po dem adv ir do contexto imediato ou podem pree- x is t ir ao a to comunicativo. Assim, um a inform a ção apa ren tem en te absu rda com o o exemplo a se guir, ex tra ído de Elias (1981: 45), fa rá sentido pa ra quem souber que Maria sofre de problemas gás tr icos de fundo nervoso e que passa mal sem pre que come tensa, p reocupada com o horário: (6) M aria teve um a ind iges tão em b o ra o re lógio es tivesse es trag ad o . Daí vem a noção de coerência pragmática, ou seja, a necessidade de o texto se r reconhecido pe lo recebedoi com o um em prego norm al da lingua gem num d e te rm in ad o contexto . O u tra conseqüênc ia da con jugação desses três fa to res de tex tualidade é a existência dos di versos tipos de d iscurso . A p rax e acab a p o r e s ta belecer que, n u m a dada c i rcu n s tân c ia , tendo-sc em m en te d e te rm in a d a in ten ção ilocucional, deve-se c o m p o r o texto dessa ou daque la m ane i ra. Assim, há convenções que regem o func iona m en to da linguagem na in te ração social e que de te rm inam , especif icam ente , qual o tipo p a r t ic u 13 la r de d isc u rso ad eq u ad o a cada ato co m u n ica t i vo. Essa ques tão é da m aio r im portânc ia para quem traba lha com o ensino de redação, pois vem dai o la to de que a tex tualidade de cada tipo de d iscu rso envolve e lem entos diferentes. O que c qua lidade num texto a rgum en ta iivo form al po derá se r defeito num poema, ou n um a es tó r ia de suspense, ou n u m a conversa de botequim , por exemplo. O in te resse do recebedor pelo texto vai de pender do grau de in form aliv idade de que o u lt i mo é po r tador . Esse é mais um fa to r de tex tua li dade apon tado por B eaugrande e D ress lc r (1983) e diz respeito á m edida na qual as oco rrênc ias de um texto são e sp e ra d a s ou não, conhecidas ou não, no plano conceituai e no formal. O corre que um d iscu rso menos previsível é m ais in fo rm ati vo, porque a sua recepção, e m b o ra m ais t rab a lhosa, resu lta m ais in teressan te , m ais envolven te. E n tre tan to , se o texto sc m o s t ra r in te iram e n te inusitado, te n d e rá a ser re je i tado pelo recebe dor, que não consegu irá processá-lo. Assim, o ideal é o texto se m a n te r num nível m ediano de informatividade, no qual se a l te rnam ocorrências de p rocessam ento imediato, que falam do conhe cido, com ocorrências de processam ento mais t ra balhoso, que trazem a novidade. P ara mim, o texto com bom índice de infor- matividade p rec isa a inda a te n d e r a o u t ro req u i sito: a suficiência de dados. Isso significa que o texto tem que a p re s e n ta r todas as inform ações necessárias para que seja co m p reen d id o com o sentido que o p ro d u to r p re tende . Não é possível nem desejável que o d iscu rso explicite todas as 14 informações necessárias ao seu processamento, mas c preciso que ele deixe inequívocos todos os dados necessários à sua compreensão aos quais o recebedor não conseguirá chegar sozinho. Bcaugrande e Drcssler (1983) lalam ainda de um outro componente de textualidade: a intertcx- tua!idade, que concerne aos fatores que fazem a utilização dc um texto dependente do conhecimen to de outro(s) texto(s). De fato, "um discurso não vem ao mundo numa inocente solitude, mas contrói-se através de um já-dito em relação ao qual ele toma posição”11. Inúmeros textos só fazem sentido quando entendidos em relação a outros textos, que funcionam como seu contexto. Isso é verdade tanto para a fala coloquial, em que se re tomam conversas anteriores, quanto para os pro nunciamentos políticos ou o noticiário dos jornais, que requerem o conhecimento de discursos e no tícias já divulgadas, que são tomados como pon to de partida ou são respondidos. Há aqui uma questão interessante que não é mencionada pelos autores. É que o mais freqüen te interlocutor de todos os textos, invocado e res pondido consciente ou inconscientemente, é o dis curso anônimo do senso comum, da voz geral cor rente. Assim, avaliar a intertextualidade, em sen- tido lato, pode significar analisar a presença des sa fala subliminar, de todos e de ninguém, nos tex tos estudados12. Por ou tro lado, como esse dis curso é de conhecimento geral, pode-se também considerá-lo como informação previsível e avaliar sua presença como elemento que faz baixar o grau de informatividade. Foi essa a minha opção na análise de redações que apresento adiante. 15 Relacionando os conceitos dc texto e textua lidade, poder-se-ia dizer, cm princípio, que a uni dade textual se constrói, no aspecto sociocomu- nicativo, através dos fatores pragmáticos (inten- cionalidade, aceitabilidade, situacionalidade, in formatividade e intertextualidade); no aspecto se mântico, através da coerência; e, no aspecto for mal, através da coesão. É possível, no entanto, repensar esse a rran jo, se se considerar que a informatividade e a in- tertextualidade dizem respeito, também, à maté ria conceituai do discursô, na medida em que li dam com conhecimentos partilhados pelos inter locutores. Ao mesmo tempo que contribuem pa ra a eficiência pragmática do texto, conferindo- lhe interesse e relevância, esses dois fatores tam bém se colocam como constitutivos da unidade lógico-semântico-cognitiva do discurso, ao lado da coerência. Assim, poder-se-ia situá-los a cava leiro, parte no plano sociocomunicativo, parte no plano semântico-conceitual. Foi dessa maneira que os considerei neste trabalho. 16 CAPÍTULO 2 COMO AVALIAR A TEXTUALIDADE? 1. Questões preliminares Um dos pontos-chave da lingüística textual é a discussão sobre o que faz de um texto um tex to, isto é, em que consiste a essência de um tex to, que propriedade distingue textos de não- textos. A essa discussão grande número de estu dos recentes responde apontando a coerência co mo fator fundamental da textualidade e, em fun ção dessa resposta, tenta esclarecer o que ée de que é feita a coerência de um texto. A conceitua- ção teórica, que busca estabelecer em que nível se situa e com que elementos lida a coerência, se mostra, muitas vezes, fruto da análise empírica, empenhada em descobrir que características usualmente apresentam os textos coerentes. Es 17 sas características são chamadas por alguns dc condições ou requisitos de coerência, porque, se um texto coerente tem qualidades específicas que o distinguem dos incoerentes, pode-se afirmar que, para ser coerente, um texto precisa apresen tar tais qualidades. Assim, a observação empíri ca possibilita a descrição, que, por sua vez, per mite a formulação de critérios para a análise textual. Neste trabalho, tomo como ponto de parti da a descrição fornecida por estudiosos da ques tão e utilizo como instriimcnto critérios de ava liação que considerei adequados ao modelo teó rico adotado. Para avaliar a coerência e a coesão das redações do corpus, tomei como base as cha madas "meta-regras” formuladas por Charollcs (1978) e, para os demais fatores de textualidade, orientei-me pelo que propõem Beaugrandc e Dressler (1983). Antes de apresentar e discutir os critérios de avaliação adotados, é preciso deixar claros alguns pontos. Primeiro quero registrar que a intenção aqui não é, de maneira alguma, prescritiva. Não se está aqui fornecendo mais uma receita, ou uma nova lista de macetes, à qual as redações escolares de vam se conformar para obter boas notas e se apro ximar do modelo que garante aprovação no vesti bular. 0 que se pretende é, a partir de um quadro de características identificadas em textos que "fun cionam’', construir um quadro adequado para bali zar a avaliação do funcionamento de outros textos. Em segundo lugar, quero delimitar a aplica bilidade dos critérios a serem adotados. Confor- 18 % me acertadamente observa Widdowson (1981: 56), a aceitabilidade de um texto se prende à sua iden tificação como “um emprego normal da língua". Ora, em situações diferentes, são diferentes as ex pectativas quanto ao que seja “normal" e aceitá vel. Assim, os critérios aplicáveis ao corpus des ta pesquisa podem não ser adequados para o ju l gamento da textualidade de discursos de outro tipo c construídos com outros objetivos. 0$ tex tos por mim analisados, por exigência da natu reza e do programa do concurso vestibular, se re vestem de peculiaridades que não sc podem dei xar de levar cm conta: são textos escritos, for mais, de função referencial dominante, compos tos de introdução, desenvolvimento e conclusão, através dos quais os candidatos buscam demons tra r sua habilidade de expor idéias c argumen tar em torno de determinado problema. Os requi sitos a que esse tipo específico de texto deve res ponder para angariar aceitabilidade são ce rta mente impraticáveis para uma conversa descon traída. um poema ou um romance, por exemplo. Resta ainda uma observação a fazer, quanto á organização dada ao grupo de fatores levados em conta no julgamento das redações. Como to das elas loram produzidas sob as mesmas condi ções (o vestibular) e não me era possível ter acesso a cada produtor individualmente, examinei em bloco a interferência dos fatores pragmáticos em sua textualidade. Quero dizer: a intencional ida- de, a aceitabilidade e a situacionalidade não fo ram analisadas cm cada redação particular; foi feita uma análise desses três fatores para o con junto das redações. Por outro lado, ampliei o con- 19 ccito de informatividade, dc modo a incluir nele a suficiência de dados c a intertextualidade (já que os textos requeridos para a interpretação do texto “X" constituem informações prévias necessárias ao texto "X"). Assim, entendendo a informativi dade, bem como a coerência e a coesão como fa tores centrados no texto, concernentes a elemen tos constitu tivos do texto, avaliei a presença e o funcionamento desses três com ponentes da tex tualidade em cada redação do corpus. f 2. Critérios p a ra a análise da coerência e da coesão Entendida a coerência como a configuração conceituai subjacente e responsável pelo sentido do texto, e a coesão como sua expressão no pla no lingüístico, é preciso esm iuçar essas noções, para perceber de que são feitos esses fatores e como se apresen tam ou deixam de se ap resen tar em produções lingüísticas reais tais como as re dações dos alunos na escola. É in teressante a proposta do lingüista fran cês Charolles (1978), porque parte exatamente da análise de redações de es tudan tes da escola ele m entar e do ensino médio. Nessa tentativa de ex plicitar o s is tem a implícito de regras referentes à composição e à in te rp re tação de textos, que constitui a com petência textual presente em to do falante, o a u to r se vale também das interven ções feitas pelos professores, de modo a perce ber o fenômeno em seus dois m om entos funda mentais — a p rodução e a recepção. 20 Para Charolles (1978), um texto coerente e coeso satisfaz a qua tro requisitos: a repetição, a progressão, a não-contradição e a relação. Vou chamá-los, aqui, dc continuidade, progressão, não- con tradição e articulação. 2.1. A continuidade A continuidade diz respeito à necessária re tomada de elementos no decorrer do discurso. Tem a ver com sua unidade, pois um dos fatores que fazem com que se perceba um texto como um todo único c a permanência, em seu desenvolvi mento, dc elementos constantes. Uma seqüência que trate a cada passo de um assunto diferente certam ente não será aceita como texto. Quanto à coerência, esse requisito se mani festa pela retomada de conceitos, de idéias. Quan to à coesão, pelo em prego de recursos lingüísti cos específicos, tais como a repetição de palavras, o uso de artigos definidos ou pronomes dem ons trativos para determ inar entidades já menciona das, o uso de pronomes anafóricos e de outros ter mos vicários (como os pró-verbos s e r e fazer e os pró-advérbios lá, ali, então, etc.), a elipse de te r mos facilmente recobráveis, en tre outros me canismos. O emprego desses m ecanism os de coesão obedece a regras específicas, como já disse. Por exemplo, os pronomes anafóricos devem concor da r em gênero e núm ero com o term o que subs tituem. Assim, uma seqüência como a que se se gue conterá um a infração textual, se ocorrer em 21 d isc u rso e sc r i to formal, cm cu ja recepção a ex pecta tiva é de respeito ao d ia le to pad rão : (7) O m en o r abandonado p re o cu p a a popula ção das g ran d es c idades p o rq u e a m arg i na l idade ac ab a os levando ao crime. O u tra exigência cabível q u an to a esse tipo de d iscu rso é que só podem r e c o b ra r p o r pronom e elem entos exp ressos na superfíc ie textual. 0 a lu no a u to r da f rase abaixo infringiu essa exigência ao p re fe r i r a ex p ressão Areação h u m a n a ” a “rea ção do h o m e m ” , porque sua opção acabou dei xando sem an teced en te exp resso o p ro n o m e que vem em seguida: (8) Pode-se def in ir conhecim ento com o a rea ção h u m a n a ao meio que o ce rca . Um caso m u ito freqüen te de “desvio de coe são", no d izer de El ias (1981: 59-60), é aquele em que o em prego do p ronom e an a fó r ico c r ia a m b i güidade, p o rq u e h á mais de u m te rm o que pode lhe se rv ir de an teceden te . A seqüênc ia abaixo exemplifica o problem a: (9) Ana es tava conversando com Teresa e Ro sa chegou. Aí ela con tou que e s tá nam o rando João. Assim, a v a l ia r a co n t inu idade de um texto c verificar, no p la n o conceituai, se há elem entos que p e rc o r re m todo o seu desenvolvimento, confcrindo-lhe unidade; e, no plano lingüístico,I 22 se esses elementos são retomados conveniente mente pelos recursos adequados. Não cabe aqui lazer o levantamento e a descrição de todas as regras que governam o emprego desses recursos, mas posso afirm ar que elas fazem parte da gra mática intuitiva de todo falante, que é capaz não so de empregá-los naturalmente como de reconhe cer as eventuais falhas no seu uso (tendo em vis ta, é claro, as contingências pragmáticas da atua ção comunicativa). Na análise das redações do corpus, conside rei a continuidade requisito da coerência e obser vei se os recursos lingüísticos que servem à ex pressão desse requisito foram empregados de mo do a favorecer a coesão textual. 2.2. A progressão Para Charolles (1978), a progressão, contra partida da repetição ou continuidade, é a segun da condição de coerência e coesão. O texto deve retom ar seus elementos conceituais e formais, mas não pode se limitar a essa repetição. É pre ciso que apresente novas informações a propósi to dos elementos retomados. São esses acrésci mos semânticos que fazem o sentido do texto pro gredir e que, afinal, o justificam. No plano da coerência, pcrcebe-se a progres são pela soma de idéias novas às que já vinham sendo tratadas» No plano da coesão, a língua dis põe de mecanismos especiais para manifestar as relações entre o dado e o novo13. Por exemplo, o dado, que costuma coincidir com o tópico, em 23 geral c retomado anaforicamente e aparece no ini cio de frases ou mesmo parágrafos ou seqüências de frases. Já a informação nova com freqüência se expressa pelo comentário e figura no final das frases. A progressão pode se fazer pelo acrésci mo de novos comentários a um mesmo tópico, ou pela transformação dos comentários em novos tó picos. A mudança dc tópico deve se apresentar inequívoca para o recebedor, sob pena de causar dificuldades de compreensão, visto que a tendên cia mais comum é interpretar as anáforas de uma passagem como referentes ao tópico dessa pas sagem. O texto que não deixa claro, a cada pas so, de que está tratando pode levar o recebedor a um processamento indevido que, na melhor das hipóteses, precisará ser refeito. Há. no português, construções, palavras e locuções que servem pa ra destacar de maneira especial o tópico de uma passagem, colocando-o em posição de foco: quan to a, a respeito de, no que se refere a; ser Sn que X, é que, até, mesmo, o próprio, etc. A progressão foi considerada como condi ção de coerência na análise das redações. Para lelamente, foi observado se essa condição foi bem expressa, através dos recursos disponíveis no português, de maneira a dar ao texto mais coesão. 2.3. A não-contradição O terceiro requisito proposto por Charollcs (1978) é o da não-contradição, que deve ser observado tanto no âmbito interno quanto no 24 âm bito das relações do texto com o mundo a que se refere. Para se r in ternam ente coerente, o texto p re cisa, cm p r im eiro lugar, respeitar princípios ló gicos elem entares. Não pode, por exemplo, afir m ar A e o con trá r io dc A. Suas ocorrências não podem se contradizer, têm que se r compatíveis entre si, não só no que trazem explícito como tam bém no que delas se pode concluir por pressupo sição ou inferência. Por ou tro lado, para ser coerente, o texto não pode contradizer o mundo a que se refere. O m un do textual tem que scr compatível com o mundo que o texto representa. Assim, um discurso refe rente ao m undo real não pode deixar de conside ra r algumas pressuposições básicas que integram a m an e ira com um de pensar esse mundo c que subjazem à com unicação textual: as causas têm efeitos; os objetos têm identidade, peso e massa; dois corpos não podem ocupar, ao mesmo tem po, o m esm o lugar no espaço, etc. A exigência de não-contradição se aplica não só ao plano conceituai (da coerência), mas tam bém ao plano da expressão (da coesão). Por exem plo, a través do em prego dos tempos e aspectos verbais, o texto ins taura um sis tem a próprio de situação dos fatos a que alude, tomando por re ferência o mom ento da com unicação ou um mo m ento de term inado pelo texto mesmo. A moda lidade é o u tro elemento do s is tem a de funciona m ento discursivo. Trata-se da a t i tude do p rodu to r tanto em relação ao conteúdo proposicional c ao valor de verdade dc seu enunciado quanto em relação ao próprio recebedor. Essa atitude se 25 manifesta lingüisticamcnte pelo emprego dos mo dos verbais e de itens específicos, com o os ver bos modais, alguns advérb ios (talvez, certam en te) c os cham ados verbos ilocutórios (achar, acei tar, considerar, admitir, exigir, deplorar, declarar, negar, etc.). As contradições relativas a esses dois elementos do que Charolles (1978: 23) chama “re gime enuncia tivo", a menos que intencionais e vi sando a efeitos estilísticos, podem causa r em ba raço ou es tranheza ao reccbedor. A configuração do m undo textual pode se ex p ressa r lingüisticamente a través do emprego de verbos, expressões e construções “criadores de m u n d o ”, no dizer de Charolles (1978: 28): sonhar, imaginar, pensar, acreditar, gostar (no condicio nal, gostaria que\, no caso de, na lupotese de; se ja..., (az. de conta que, era um a vez. etc. A não ser que objetivando efeitos intencionais específicos, o emprego contraditório desses recursos também pode aca rre ta r d is tú rb ios à in te rp re tação do dis curso, na m edida em que co n tra r ia as expectati vas do reccbedor. Um problem a concernen te à exigência da não-contradição, ao qual Charolles (1978) não faz referência, consiste no que eu chamei de constra- dição Icxico-semántica. Trata-se de inadequação muito 1 requente nas redações escolares e que diz respeito ao uso do vocabulário: muitas vezes o sig- nificante em pregado não condiz com o significa do pretendido ou cabível no texto. Tal con trad i ção resulta do desconhecimento, por parle do usuário , do vocábulo a que recorreu . Um exem plo elucidativo é o de um vestibulando que recla mava, em sua redação, contra "o desvelo das auto- 26 i idades pelo menor abandonado". Casos desse ti po situam-se, a meu ver, na região limítrofe cn- t re a coesão e a coerência, porque, embora sc ma nifestem no nível da expressão, concernem à vei- culação de conceitos e têm implicações sobre a e s t ru tu ra lógico-semântica do texto. Nas redações do corpus, a não-contradição in terna e externa foi tomada como condição dc coe rência. Quanto à coesão, foi verificado se os re cursos lingüísticos empregados serviram ao bom funcionamento discursivo, tornando o todo tex tual livre de contradição. 2.4. A articulação O quarto e último requisito de coerência pro posto por Charollcs (1978) é a relação, que eu cha mo aqui de articulação. O autor, considerando va go o te rm o relação, p ro c u ra delimitá-lo, rebatizando-o dc congruência e estabelecendo que dois latos serão congruentes quando um for uma causa, condição ou conseqüência pertinente do outro. Neste trabalho, o termo articulação não co brirá apenas essas três relações. Com ele estarei me referindo á m aneira como os fatos e concei tos apresentados no texto se encadeiam, como se organizam, que papéis exercem uns com relação aos outros, que valores assum em uns em relação aos outros. Avaliar a articulação das idéias de um texto, para mim, significa verificar se elas têm a ver umas com as outras e que tipo específico de relação sc estabelece entre elas (além das rc- 27 lações de con t inu idade , p ro g ressão e não- con trad içâo , já cobertas pelas o u tra s condições de coerência). São dois aspectos a se rem verifi cados: a presença e a pertinência das relações en tre os fatose conceitos ap resen tados . O texto po de ap resen ta r fatos c conceitos rclacionáveis sem es tab e lece r ligações en tre eles, ou pode es tabe lecer relações não per t inen tes e n t re os fatos e conceitos que den o ta (porque não são rc lacioná veis, ou porque se re lac ionam de o u tro modo). E ssas relações, como vimos, não precisam ser necessariam ente explicitadas por mecanismos lingüísticos formais. Podem perfe itam ente se es tabelecer ap en as no plano lógico-scmântico- conceitual (o da coerência). Entre tan to , há recur sos específicos para sua expressão formal, no pla no da coesão. E n tre eles podem-sc m en c io n a r os mecanismos de junção (tradicionalm ente cham a dos de conjunção), os articuladores lógicos do dis cu rso (expressões como por exem plo, dessa for ma, por outro lado, etc.) e os recu rsos lingüísti cos que perm item estabelecer relações temporais en tre os e lem entos do texto (a o rdem linear de ap resen tação desses elementos, as conjunções tem pora is , a lguns advérbios e expressões de va lor adverbial, os num era is o rd ina is e a lguns ad jetivos, com o anterior, posterior, subseqüente). Na análise das redações foram avaliadas a presença e a pertinência da articulação como con dição de coerência e foi observado se, q u an d o ne cessários, os m ecanism os lingüísticos que expli c itam as relações en tre os e lem entos tex tua is cs- tavam presen tes e foram ad eq u ad am en te em pre gados, con tr ibu indo para a coesão do discurso. 28 2.5. P a ra e n c e r r a r Aceita a proposta de Charolles (1978) — com a ressalva feita quanto à sua não-uni versai idade —, avaliar a coerência de um texto denotativo, es crito e formal, será verificar se, no plano lógico-scmântico-cognitivo, ele tem continuidade e progressão, não se contradiz nem contradiz o mundo a que se refere e apresenta os fatos e con ceitos a que alude relacionados de acordo com as relações geralmente reconhecidas entre eles no mundo referido no texto. Avaliar a coesão se rá verificar se os mecanismos lingüísticos utili zados no texto servem à manifestação da conti nuidade, da progressão, da não-contradição e da articulação. Dado o grande número de marcadores lin güísticos de coesão e dada a tremenda complexi dade que envolveria a tarefa de formular restri ções pertinentes e exaustivas com relação ao em prego de cada um, meu julgamento das redações, sobretudo neste particular, vai se basear na in tuição e no bom senso. Será considerada infra ção textual a ocorrência que acarre ta r em bara ços à leitura, tendo em mente as expectativas re sultantes do tipo de texto analisado. A esse propósito, é bom lembrar o papel de terminante dos fatores pragmáticos na comuni cação efetiva. 0 contexto e a imagem do interlo cutor podem autorizar lacunas na configuração textual não possíveis noutras circunstâncias. É relevante o fato de o produtor contar com os co nhecimentos prévios do recebedor e com sua ca pacidade de pressuposição e inferência. 29 Daí advem uma conseqüência importante pa ra o trabalho com redação na escola. São freqüen tes, por exemplo, os casos de aparente incoerên cia resultante da não-explicitação de fatos ou de relações entre fatos do mundo representado no texto. Se o professor consegue reconhecer esse mundo e refazer os cios ausentes, percebe o sen tido do texto e pode apontar ao aluno o problema e a forma de saná-lo. Esse tipo dc intervenção, de ve ficar claro, não obedece a imperativos cogniti vos, uma vez que o sentido do texto foi captado, mas obedece ao que Charolles (1978: 37) chama de " razões ílc deonlologia discursiva superior”. Em outras palavras, o que funcionaria na comunica ção real c vetado na redação escolar em virtude da preocupação do professor de ensinar a redigir. Charolles (1978: 37) tem essa pr eocupação co mo legítima e a justifica pelo fato de o professor considerar que nem todo leitor será capaz de reali zar a mesma operação por ele efetuada para recu perar o sentido do texto e julgar-se, então, na obri gação de apontar o problema ao aluno, por enten der que todo discurso, se não for imediatamente coerente e coeso, deve, pelo menos, ter o sentido facilmente recobrável por qualquer recebedor. Pa ra mim, tal atitude será pertinente sc explicitada pelo professor e se levar em conta, também, o tipo textual e as intenções do aluno produtor do texto. 3. Critérios para a análise da informatividade A informatividade é entendida pelos estudio sos como a capacidade do texto dc acrescentar ao 30 conhecimento do recebedor informações novas e inesperadas. Neste trabalho, esse termo c en tendido como a capacidade que tem um texto de efetivamente inform ar seu recebedor. Não c to mado apenas como sinônimo de originalidade, m as ganha o u tra acepção. Por um lado, no que tange à necessidade de imprevisibilidade, o conceito foi ampliado e pas sou a abranger o aspecto mais geral do fator in- lertextualidade, na medida em que se tomou co mo informação conhecida e previsível a voz do senso comum, da ideologia dominante, presente nas redações estudadas. Por ou tro lado, o termo passou a recobrir a exigência do que se chamou suficiência de dados, na medida em que se consi derou que, para ser informativo, o texto, além de se m ostra r relativamente imprevisível, precisa apresen tar todos os elementos necessários à sua compreensão, explícitos ou inferíveis das infor mações explícitas. Para avaliar a imprevisibilidade, Beaugran- de e Dressler (1978: 140-141) propõem uma esca la de três ordens, aplicável (e efetivamente apli cada) pelo falante comum. Na primeira ordem os autores enquadram as ocorrências de elevada previsibilidade e, conseqüentemente, baixa infor matividade, como os clichês e estereótipos, as fra ses feitas, as afirmações sobre o óbvio. Os textos que não ultrapassam esse patamar, ainda que do tados de coerência e coesão, resultam pragmati- camente ineficientes, porque desprovidos de in teresse. Na segunda ordem ficam as ocorrências em que o original c o previsível se equilibram, an gariando boa aceitabilidade, porquanto apresen 31 tam novidade sem provocar es tranhe/a . São dc terceira ordem as ocorrências que, aparentem en te pelo menos, não figuram no leque de a l te rna tivas possíveis c que, por isso mesmo, desorien tam, ainda que temporariamente, o reccbedor. Postulam os au tores que, na comunicação efeti va, o processam ento dos textos se faz através do alçamento para a segunda ordem das ocorrências de baixa informatividade c do rebaixamento, tam bém para essa ordem mediana, daquelas que pro vocam estranheza, de modo a atribuir sentido tan to a um as quan to a outras . Assim, no todo tex tual, o óbvio ganhará razão de ser c o inusitado se explicará, passando a ter, um e outro, rendi mento eficaz dentro do texto. O discurso em que esse processamento, cm um a ou outra direção, não for possível, tenderá a se r rejeitado: no p r i meiro caso, porque sc m ostra rá pouco informa tivo e desinteressante; no segundo caso, porque se m ostra rá difícil de ser entendido, impene trável. De outra parte, avaliar a suficiência dc dados é examinar sc o texto fornece ao reccbedor os ele mentos indispensáveis a um a in terpretação que corresponda ás intenções do produtor, sem se mostrar, por isso, redundante ou rebarbativo. Os dados cuja explicitação é necessária são aqueles que não podem ser tomados como dc domínio prévio do recebedor nem podem ser deduzidos a partir dos conhecimentos que o texto ativa. Assim, avaliar a informatividade significa, para mim, m ed ir o sucesso do texto em levar co nhecimento ao recebedor, configurando-se como ato de comunicação efetivo. Esse sucesso depen- 32 de, em parte, da capacidade do discurso de acres cen ta r alguma coisa à experiência do recebedor, 1 1 0 plano conceituai ou no plano da expressão (im- previsibilidade). De ou tra parte, resu lta do equi líbrio en tre o que o texto oferece e o que confia ã partic ipação de quem o in terpreta (suficiência de dados). Um texto informativo pode não ser de pro cessam ento imediato e dem andar algum esforço de interpretação. Em contrapart ida , é um texto que se mostra apto a engajar o recebedor, a con qu is ta r a adesão dele, viabilizando, assim, o es tabelecimento dc uma relação comunicativa ver dadeira. Um texto com baixo poder informativo, que não fornccc os elementos indispensáveis a uma in terpretação livre dc ambigüidades, ou que se limita a repetir coisas que nada somam à expe riência do recebedor, tem corno efeito desorientá- lo ou irritá-lo, ou simplesmente não a lcançar sua atenção. Tende a se r rejeitado. Mesmo que não chegue a ser tomado como não-texto, é avaliado como produção de má qualidade, com a qual não vale a pena perder tempo. Em suma, mesmo pa ra textos coerentes e coesos, um baixo poder in formativo tem como correlata uma baixa eficiên cia pragmática. 4. A subjetividade da avaliação Segundo Hallidaye Hasan(1978: 25), "texture is really a more-or-less affair" A mim parece que a natureza do texto é melhor compreendida se se 33 abre mão do rigor c da exatidão tecnicista e se dá espaço p a ra a intuição e o bom senso. Os c r i té r io s adotados neste trabalho p a ra o julgamento das redações são, inegavelmente, flui dos c subjetivos. Não vejo como fugir disso. A coe rência, a coesão e a informatividade estão em es treita dependência dos conhecimentos par t i lha dos pelos interlocutores. O que faz sentido para um recebedor pode parecer absurdo para outro; o nexo en t re os elementos textuais pode ser fa cilmente percebido por um, através das relações lógico-semàntico-cognitivas implícitas, e pe rm a necer irrecobrável para outro, sc não for expresso lingüisticamente; o que c “ba t ido” para um po de ser abso lu ta novidade para outro. Em ou tras palavras, o que estou dizendo é que a textualidade de uma produção lingüística qualquer depende, em grande parte, do recebe dor (seus conhecim entos prévios, sua capacida de dc pressuposição e inferência, sua adesão ao discurso) e do contexto (o que é texto num a s i tua ção pode não o ser em outra, e vice-versa). Como, então, fixar cr i té r ios rígidos e objetivos p a ra de m arcar os limites da textual idade: daqui p a ra lá, texto; daqui p a ra cá, não-texto? (!) T en ta r fazê-lo seria ignorar ou falsear as relações que de fato se estabelecem no processo de interação com u nicativa. Por isso neste trabalho não foi ado tada qual quer tabela objetiva para m edir a textualidade das redações do corpus. O julgamento, ainda que balizado pelos critérios já definidos, passou pe la subjetividade de minha percepção com o leito ra. Não há como evitar. Não vejo com o ca lcu lar 34 objetivam ente a d im ensão da gravidade de um a talha relativa, por exemplo, à condição de não contradição com o mundo real. Fazé-lo correspon deria a pretender a existência dc verdades inques tionáveis das quais se pudesse m ed ir num erica mente o afastamento; significaria adm itir um a única possibilidade de leitura do real; seria igno rar a participação do recebedor na construção do sentido do texto; seria desprezar todos os elemen tos pragmáticos que interferem decisivamente na textualidade. A necessidade de p reestabelecer parâm etros para o r ien ta r a avaliação técnica de um texto po de ser a tend ida através da definição de critérios qualitativos (e não quantitativos) que busquem cap ta r e s is tem atizar as condições na tu ra is de aceitabilidade dos discursos. Assim, acred ito que um ju lgam ento que p re tenda respe i ta r a natureza do objeto avaliado e percebê-lo na sua to ta lidade pode se pe rgun ta r o seguinte; d ada a situação com unicativa, as ca racterís t icas e as disposições dos interlocutores e o tipo textual efetivo, essa produção lingüísti ca se m ostra aceitável? Tem continuidade? Apre senta progressão? Mostra-se não-contraditória e bem ar t icu lada? Faz uso adequado dos recursos coesivos que servem à expressão dessas qualida des? É suficientemente c lara e explícita na a p re sentação das inform ações? Com porta um m íni mo de novidade que possibilite reconhecê-la co mo m anifestação personalizada e capaz dc a t ra i r a atenção dc um recebedor médio? As respostas a essas p erg u n tas não são redu- tíveis à exatidão de valores quantitativos. Antes, 35 passam inapelavelmente pela intuição e o bom senso, aplicados com na tu ra l idade pelo falante com um na com unicação cotidiana. São questões que têm a ver com a competência textual, que de te rm ina a capacidade das pessoas dc produzir e in te rp re ta r textos. A preocupação dc julgar com objetividade as redações escolares tem resu ltado cm esquem as de correção e a tr ibu ição de notas através dos quais se t i ram pontos por desrespeito às regras do dialeto padrão ou por desobediência às con venções relativas ao uso da escrita , como a o r to grafia c a pontuação. Q uer dizer: o ju lgam ento acaba privilegiando os aspectos mais superficiais do texto escrito, que nada têm a ver com sua es sência, isto é, sua textualidade, mas que são os únicos suscetíveis dc mensuração objetiva. A mim parece que o ensino de redação só te ria a ganhar se se p rocurasse respe i ta r na cscola o que acon tece na vida. A interação com unicativa cie verda de é um processo essencialm ente intersubjetivo: são pessoas que p roduzem /in te rp re tam textos, e e n t ram nesse jogo com toda a sua individua lidade. 5. A necessidade de um a avaliação global Um texto é um a unidade dc sentido, na qual os elementos significam uns em relação aos ou tros e em relação ao todo. O significado de cada um isolado pode não coincidir com o sentido que assum e cm relação ao conjunto, ou pode não scr relevante para esse sentido global. Decorre que 36 as ocorrências dc um texto não devem ser anali sadas per si, mas o texto deve ser percebido c in terpre tado integralmente, cada elemento sendo avaliado em função do todo. Por isso, os critérios cie julgamento aqui definidos conduzem a um exa me global do texto. No plano da coerência, não há como avaliar fragmentos: a continuidade, a progressão, a não- contradição e a articulação só podem ser perce bidas quando se analisa a redação por inteiro, examinando-se as relações do texto com seu te ma e as relações das par tes entre si e com o to do. O não-cumprimento de uma dessas condições num a determ inada passagem vai com prom eter todo o conjunto. A ordem, aqui, é macrocs- trutural. O plano da coesão, linear, m icroestrutural, oferece possibilidade cie percepção individuali zada das ocorrências: um pronome anafórico em pregado de maneira ambígua, uma conjunção que estabelece relações incabíveis, etc. Entretanto, o que importa é considerar o efeito dessas ocorrên cias no conjunto, é avaliar se os recursos lingüís ticos utilizados servem ou não à conexão das idéias, sc o texto como um todo se mostra coeso ou desconexo. Não interessa, também, ju lgar a informati vidade de cada seqüência, examinando, como quer a teoria física da informação, a probabili dade de ocorrência dos seus integrantes. O que conta é verificar se, em sua realização global, o texto equilibrou satisfatoriamente o explícito e o implícito, o previsível e o inesperado, de modo a seconstituir num todo informativo c atraente. 37 Além da inconveniência de uma análise frag mentária de cada componente textual considera do, há a Improcedência de um exame dos três co mo fatores absolutamente estanques. O que se de preende da conceituaçào estabelecida e dos cri térios esboçados é que eles são faces imbricadas de mesmo corpo. O que afeta um deles, em ge ral, tem implicação sobre os outros também. Sua separação só se obtém artificialmente, para aten der á necessidade dc análise (“dividir para domi nar"). Vejamos: a coesão é a manifestação lingüís tica da coerência e, assim, a ela está inquestio navelmente associada; a informatividade se aplica tanto sobre uma quanto sobre a outra e, mais que isso, localizada no terreno cognitivo, guarda pon tos de interseção com a coerência. Há problemas de difícil delimitação que se espraiam por mais de uma área. Por exemplo: até que ponto um a la cuna na configuração conceituai do texto é pro blema de informatividade (insuficiência de dados) ou de coerência (falta de articulação)? Ou. ainda, em que medida a rup tu ra com modelos cogniti vos usuais representa ganho para a informativi dade (imprevisibilidade) ou perda para a coerên cia (contradição entre o mundo textual e o m un do real)? Problemas semelhantes podem ser apon tados também no que respeita à coesão: qual o limite entre um arran jo sintático inusitado, que favorece a originalidade, e uma infração, que pre judica a coesão textual? Em razão do que foi apresentado, o que me preocupou na análise das redações foi identifi car com a maior nitidez possível os problemas 38 existentes, com a finalidade de tentar comprccn- der as reais dificuldades que eles representam. Assim, foi mais importante para mim perccbcr todas as ramificações e implicações de um mes mo problema do que buscar, artificialmente, isolá-lo do conjunto em que figura para identificá- lo c computá-lo como ocorrência individual. O ob jetivo foi perceber cada texto como um todo c che gar a um julgamento mais legítimo, mais próxi mo do que se passa dc fato no proccsso comuni cativo. Um julgamento que não se funda em pa râmetros rígidos, mas na realidade que o texto propõe; porem, um julgamento com inevitável margem dc subjetividade. 39 SEGUNDA PARTE RELATO DE UMA ANALISE CAPITULO 3 AS C O N D IÇ Õ E S DE PRODUÇÃO Antes de passar à análise da coerência, coe são e informatividade das redações estudadas, é preciso deter a atenção sobre as condições de pro dução desses discursos, o que significa avaliar o papel dos fatores pragmáticos (situacionalidade, intencional idade e aceitabilidade) sobre a textua lidade desses textos específicos. I. As contingências histórico-políticas As redações que compõem o corpus foram produzidas no vestibular/UFMG realizado em ja neiro de 1983. Nessa época o Brasil vivia o início do proces so de redemocratização. No âmbito federal, ea- 43 minhava para o fim o último governo de um a fa se de 21 anos de au to ri ta r ism o. No âm bito es ta dual, tom avam posse os governadores eleitos di re tam ente em novem bro de 1982, depois de lon go período cm que esses cargos e ram preenchi dos por escolha pessoal e exclusiva do prim eiro m anda tá r io do país. A anistia política fora con quistada, já se p renunciava a Nova República e a cam panha pelas eleições diretas para presiden te começava a g an h a r as ruas. Economicam ente, no entanto , o Brasil en frentava u m a crise cujos reflexos mais dolorosos e ram a recessão e o desemprego. Essas dificul dades não e ram exclusivamente nacionais. Afe tavam, naquele momento, até os Estados Unidos c os países ricos da Europa. Aqui, a s i tuação sc mostrava particularmente grave c, em função dis so, caracterizava-se com nitidez um processo de ac irram en to da violência, sobre tudo nos centros urbanos. A população via-se, então, dup lam ente ameaçada, pelo desemprego e pela insegurança. Todos esses co m p o n en te s do con tex to histórico-político-social são im portan tes porque integram o conjunto de conhecim entos e vivên cias par ti lhados pelos p rodu to res dos textos, os candidatos ao vestibular, e pelos seus recebedo- res compulsórios, os examinadores. Esses dados assum em p a r t icu la r relevância quando se sabe que o tema proposto para a redação foi violên cia social, assun to d ire tam en te dependente des sas contingências históricas. Não seria possível um a avaliação consistente da coerência ex terna e da inform atividade das redações sem levar em conta esse quadro político-cconômico-social. 44 2. O c o n te x to im ed ia to : o v e s t ib u la r As redações analisadas fizeram parte da pro va de Língua Portuguesa e L itera tura Brasileira, aplicada na segunda e tapa do vestibular, de ca rá te r classificatório. Todas as provas dessa e ta pa foram compostas de questões abertas; as ques tões de múltipla escolha se lim itaram à primei ra etapa, eliminatória. É fundam ental o fato de se t ra ta r de prova de vestibular, situação fortemente impregnada de carga ideológica, que lhe a tr ibui o papel mágico dc porta dc felicidade: u l t rap assa r esse umbral significa ob ter garantia absoluta de sucesso pro fissional e financeiro. O exame ganhou a dimen são de um rito de passagem, através do qual o jo vem adolescente atinge a categoria de adulto res ponsável, socialmente integrado e bem-sucedido. Em função desse mito, o concurso se realiza sob grande tensão c é, em geral, muito competi tivo. Em 1983, na UFMG, foram selecionados pa ra a segunda etapa, para todos os cursos, dois pre tendentes para cada vaga. N um a situação como essa, o candidato tem consciência de que seu de sempenho c decisivo e realiza um grande esfor ço dc auto-superação. Não bas ta fazer boas pro vas, é preciso fazer provas m elhores que as dos concorrentes, pois a segunda etapa é classifi- catória. Outra conseqüência do mito em que se trans formou o vestibular é a ncurotizante preparação a que se submetem os candidatos. A realidade atual é que praticamente todo o ensino, desde o 1? grau, se orienta pela filosofia adm itida c pelo 45 modelo de provas adotado no vestibular. No 2? grau a situação se agrava e o último ano imedia tamente anterior ao exame é, de modo geral, de dicado a ele de maneira intensa e exclusiva. Há, então, nos colégios e nos cursinhos preparatórios, a preocupação de, além de dotar os alunos dos co nhecimentos e habilidades necessários a quem se destina a um curso universitário, fornecer-lhes os truques c macetes considerados indispensáveis a um bom êxito nas provas. No caso em loco, a preparação específica se orienta por parâmetros previamente delimitados. Sabe-se que, além da redação, o candidato deve rá responder a questões discursivas nas quais o seu desempenho lingüístico, em termos de "cor reção gramatical", também estará em julgamen to. Isso significa que, normalmente, os competi dores se submetem a um intenso treinamento pa ra obter o domínio da língua padrão na modali dade escrita. O próprio programa do concurso ves tibular estabelece os critérios de avaliação e, quan to à redação, estipula que tipo de texto os candi datos deverão elaborar: O que sc espera em termos de reda- çào são habilidades de exposição de idéias e de argumentação em tomo dc de terminado problema. O tema será, pois, de tal natureza que conduza o candida to a demonstrar tais habilidades. Revela desempenho satisTatório do candidato em expressão escrita um tex to com as seguintes características: — organização adequada cm torno de uma idéia central; — estruturação das idéias de tal ma neira que se identifique uma introdução. um desenvolvimento c uma conclusão; 46 — divisão adequada das idéias cm parágrafos, c, em cada parágrafo, divisão adequada das idéias cm períodos; — ordenação lógica e coerente das idéias, com uso apropriado das partículas de transição e palavra de referência; — expressão das idéias com clareza e concisão, sem pormenores ex cessivos, redundâncias, palavras e expressões desnecessárias; — uso de vocabulário exato, preciso e adequado; — uso conveniente dos processos de coordenação e da subordinação de idéias; — adequação da modalidade de lín gua usada ao tratamento escolhi do para o tema; — uso adequado e correto dos sinais de pontuação; — uso correto das estruturas da lín gua escrita (morfologia e sintaxe); — correção ortográfica. (MEC/UFMG. Normas gerais. Pro gramas das provas de Língua Portugue sa e Literatura Brasileira íl ? e 2? etapas). Guia dc. inscrição do vestibular 1983, p. 7) Quanto à relação entre intencional idade e si- tuacionalidade, o que se pode supor é que o forte desejo de ser aprovado e a competitividade do con curso levarão o vestibulando a se empenhar para produzir um texto de acordo c o n as exigências do programa. 3. Os produtores dos textos A p a r t i r de um Questionário de Informações Sócio-econômicas elaborado pelo MEC e aplicado 47 a todos os inscritos no vestibular UFMG/1983, foi possível delinear o perfil da amostra de cem can didatos ao curso de Letras cujas redações anali sei. Seus integrantes, em sua maioria indivíduos com idade entre 17 e 22 anos, trabalhavam e con tribuíam para a renda familiar na ocasião do con curso. A maior parte deles provém de famílias em que o pai e a mãe têm nível médio de escolarida de, o pai é profissional dc nível médio c a mãe é dona-de-casa. No 2? grau, a maioria deles estudou em escola particular, duran te o dia, fazendo cur so regular (c não supletivo ou madureza), e não freqüentou cursinho. Foi possível também confrontar esse perfil com o do universo dos concorrentes à UFMG na segunda etapa do vestibular (6.914 candidatos) e constatar que os dois grupos apresentavam carac terísticas sócio-econômicas equivalentes, à exce ção de dois fatores: a participação na renda fami liar e a freqüência a cursinho. A maioria dos ves- tibulandos UFMG/1983 (segunda etapa) não traba lhava na época do exame e freqüentou algum cur so pré-vestibular. As circunstâncias específicas do vestibular co locavam cm situação equivalente os produtores dos textos analisados (bem como todo o conjunto de candidatos que chegaram a fazer a redação). Todos eles já haviam concluído o 2? grau e, no ves tibular, já haviam sido aprovados nas provas da etapa eliminatória, ou seja, já haviam passado por uma dupla seleção. A particularidade de os integrantes da amos tra serem concorrentes ao curso de Letras susci ta a hipótese de que eles tenham em comum o pen dor e o gosto pelo tra to com a linguagem, carac 48 te rís tica que os distinguiria dos demais candida tos. Tal hipótese não encontrou respaldo num in d icador quantitativo levantado: as notas das re dações. A questão de redação valeu 12 (doze) pontos, sendo a nota média, portanto, 6 (seis). Nos dois grupos, a média aritmética das notas ficou em tor no de 6 (seis) e a moda, também para os dois g ru pos, foi 6 (seis). Os pontos aqui levantados para a caracteri zação da am ostra serão retomados na conclusão, porque eles é que dão a medida da sua represen- tatividade c, por conseguinte, do alcance das pos síveis generalizações a serem postuladas. 4. Implicações do contexto pragmático Como já disse, as circunstâncias históricas do momento de produção das redações têm particu lar im portância no caso em exame, em razão do assunto proposto como tema, d iretam ente vincu lado à realidade circundante. Tal fato determinou que, afinal, o material cognitivo com que os ves- tibulandos trabalharam em seus textos fosse fun dam entalm ente o mesmo, o que não ocorreria se a proposta dc redação ensejasse a criação de um texto com base cm vivências pessoais. Outros elementos condicionantcs decorrem do fato de os textos integrarem uma prova de ves tibular. A situação comunicativa é absolutam en te artificial. O produtor do texto não é dono do seu assunto, nem da forma do seu discurso. Vê- se na contingência de discorrer sobre o tema que lhe for imposto, nos moldes preestabelecidos pelo 49 program a do concurso. O recebedor é ignorado, porem compulsório. Não se trata de um a pessoa a quem o produtor queira dizer alguma coisa, mas, pelo contrário, trata-se de um desconhecido que, caneta vermelha em punho, poderá barrar-lhe a entrada na universidade. A relação que se estabe lece en tre os interlocutores, em razão dos luga res que ocupam, é uma relação de poder, em que o produtor se submete ao que ele imagina sei a vontade do recebedor. Esse jogo de representações mentais, no entanto, sc processa de form a distor cida, porque os protagonistas de lato não se co nhecem e se baseiam cm suposições estereotipa das sobre a figura do outro. Mais um artificialis- mo resulta do próprio objetivo do pretenso ato de comunicação. A intenção nào é dizer alguma coi sa, mas demonstrar que se tem o domínio de uma modalidade do código c. com isso, angaria r apro vação no concurso. Nesse caso, às vezes, pode ser mais conveniente se esconder do que se mostrar, dizer não o que realmente se teria a dizer, mas ape nas o dizível, o considerado adequado para a cir cunstância. Assim, os objetivos do produtor, as sociados àquilo que ele imagina ser a expectativa do recebedor, vão exigir um severo direcionamen to da situação no sentido da conquista da meta planejada. Noutros termos, intencional idade, acei tabilidade e situacionalidade vão se conjugar pa ra exigir a auto-superação do candidato com vis tas à produção de um texto o mais próximo pos sível do padrão considerado desejável. As contingências apontadas autorizam algu mas expectativas. O curso a que sc destinam os candidatos, sua prévia seleção e suposta cuidado sa preparação, a importância social c a competi- 50 lividade do curso conduzem à hipótese dc que ti re em mãos um elenco de produções lingüísticas com alto padrão de textualidade. Por outro lado, fatores correlatos levam a esperar baixo grau dc informatividade nas redações: todas elas inte gram a m esm a prova, tra tam do mesmo tema, proposto no mesmo momento. Foram elaboradas por pessoas sujeitas às mesmas condições histó ricas e culturais, pertencentes, em sua maioria, a m esm a classe social e à mesma faixa etária, su postamente com a mesma habilitação e aptidão, que provavelmente se subm eteram a uma prepa ração de tendência despersonali/an te e que pre sumivelmente procuraram cum prir as exigências do programa. Os fatores que sugerem a segunda hipótese pesaram mais que aqueles que dão origem à pri meira. De início, um indicador disso foi a d istri buição de freqüência das notas de redação, que revelou um a concentração em torno de 6 (seis), tanto para a amostra analisada quanto para o uni verso dos vestibulandos UFMG/1983 (segunda eta pa). A análise qualitativa das redações vai confir m ar essa suposição. SI C A P I T U L O 4 A C O E R Ê N C I A . A C O E S Ã O E A I N F O R M A T I V I D A D E : B R E V E E S T U D O Q U A N T I T A T I V O A análise quantitativa não constitui o foco dc interesse deste trabalho. Os núm eros que ap re sento rap idam ente aqui têm apenas a função de possibilitar uma visão panorâmica do que foi apu rado no exame do corpus e, assim, m arca r um ponto de pa r t id a para a análise qualitativa. Computando quantas redações apresentaram uma ou mais infrações a cada condição conside rada, obtive os resultados constantes da Tabela 1 a seguir. 53 TABELA 1 INFRAÇÕES AS CONDIÇÕES DC TEXTUALIDADE CONSIDERADAS Fatores Condições % de Redaçócs com Infração C ontinuidade 32 Progressão 30 Coerência Não-con trad ição in te rn a 33 externa 64 A rticulação presença 56 pertinência 56 C ontinuidade 60 Coesão P rogressão 12 \à o -c o n trad ição 51 A rticulação 36 Suficiência de dados 65 Inform atividade Im previsib ilidade 87 A Tabela 1 m o s tra que a in fo rm ativ idade foi o fa to r cm re lação ao qual houve m a io r núm ero dc redações com problem as: 87% de las fe riram a condição de imprevisibilidade e 65%, a de su fi ciência de dados. Em segundo lugar vem a coerência. Assina lo que os aspec tos que têm a ver com a o rgan iza ção conceituai in terna do texto, à exceçào da con dição de articu lação interna ("presença"), se apre sentam falhos num percen tual re la t ivam ente bai xo de redações (cm to rno dc 30%). J á as condi ções de não-contradição externa c dc pertinência da articulação estabelecida se m o s t ra ra m proble m áticas c m m ais da m etade dos textos. A coesão foi o fa to r que sc ap re se n to u defi ciente num percentual m en o r dc redações. O em prego dc recursos lingüísticos que deno tam a pro- 54 gr es são (a estruturação de frases e parágrafos em função das relações entre dado e novo e entre tó- d í c o e comentário, o uso de mecanismos de cria ção de foco) sc mostrou inadequado num percen- :ual pouco signif icativo de redações (12%). Os me canismos de junção e os articuladores do discur so, que servem à inter-relação das idéias do tex to, foram mal empregados em 36% das redações. O alto índice de redações com problemas quanto à condição de não-contradição (51%) se explica em função do grande núm ero de falhas na área léxico-semântica: em 43% das redações foram constatadas impropriedades vocabulares que configuravam contradição entre o significan- te empregado e o significado cabível. Em 8% fo ram encontrados problemas concernentes ao uso de tempos e modos verbais, que redundam em contradições no regime enunciativo do texto. Os recursos lingüísticos que expressam a continuidade tiveram utilização inadequada em 60% das redações. Esse percentual, em desacor do com os 32% de redações afetadas por proble mas de continuidade no plano da coerência, exi ge um esclarecimento. Esse desacordo significa que, em m uitos casos, a re tom ada de elementos era feita sem problemas no plano conceituai, mas se apresentava mal expressada na superfície do texto. Era possível perceber com nitidez que elemento estava sendo retomado, a retomada e ra pertinente, mas não havia, por exemplo, con cordância en tre o pronome e seu antecedente, ou entre o verbo e o sujeito elíptico. Os pronomes anafóricos e a elipse, aliás, foram os mecanis mos de expressão da continuidade que apare 55 ceram mal em pregados com m aior freqüência no cor pus. A T abe la 2 a segu ir re su m e e to rna de fácil v isualização o que foi dito nos ú lt im os p a rág ra fos a p ro p ó s i to do em prego dos recursos de coe são: TABELA 2 1 \ FRAÇÕES RELATIVAS AO EMPREGO ÜH RECURSOS COESIVOS Condiçóes M ecanismos de coesão % de Redações com Problemas Continuidade Pronom es anafóricos Elipse substitu ição por zero concordância com sujeito elíptico D eterm inação por artigo deíinido Recorrência lexical Substitu ição lexical 32 02 10 06 04 06 TOTAL 60 Progressão Relações en ire dado e novo Relações en tre tópico e com entário Mecanismos de criação dc foco 02 09 01 TOTAL 12 N'áo-contradiçáo Tempos e modos verbais Compat ibilidade léxico-semântica 08 43 TOTAL 51 Articulação Mecanismos der junção e articuladores 36 TOTAL 36 É de in te resse re ssa l ta r que, indiv idualm en te, os itens que se a p re se n ta ram problem áticos em m aior núm ero de redações foram: o em prego 56 do vocabulário (43% dos textos com casos de con tradição léxico-semântica); o uso de mecanismos de junção e articu ladores do discurso (36% dos textos com problemas); o uso de pronomes ana- (o ricos (32% das redações com problemas de falta de concordância, ambigüidade, etc.). Os outros itens constantes da Tabela mostram índices pou co ou nada significativos, o mais alto deles a tin gindo apenas 10%. Esse levantamento é impor tante como diagnóstico e sugere um a nova área de trabalho no cuidado com o aspecto formal da redação. 57 CAPÍTULO 5 A C O E R Ê N C I A . A C O E S Ã O E \ I \ TF O R M A T I V I D A D E : A N Á L I S E Q U A L I T A T I V A Neste estudo qualitativo pretendo demons t r a r quais foram os problemas constatados nos textos e que interpretação eles receberam. Para tanto, vou transcrever14 e analisar algumas re dações em que essas dificuldade aparecem bem caracterizadas e são representativas do que ocor reu com freqüência no corpus. A intenção é apresentar exemplos caracterís ticos de infração a cada condição de textualida- dc fixada. Como não foi possível encontrar tex tos cu jo único problema fosse uma falha bem de lineada com relação a uni determinado requisi to, decidi apresentar a análise integral da reda ção escolhida para ilustrar o não-cumprimento de cada condição, destacando as dificuldades eon- 59 cernentes à realização cio requisito em 1'oco, mas não ignorando as eventuais falhas relativas a ou tras condições. Posto que o corpus me oferecia mais de um texto com ocorrência típica e inte ressante de infração relativa a cada condição, ou me oferecia textos com manifestações diferentes do mesmo problema, julguei pertinen te traze r à m ostra mais de um a redação, em alguns casos. 1. Em foco: p roblem as relativos à coerência e à coesão 1.1. Falha na realização do requis ito de continuidade REDAÇÃO N? 41 O homem como fruto do meio O homem é produto do meio social cm que vive. Somos todos iguais e não nascemos com o destino traçado para fa zer o bem ou o mau. O desemprego, pode ser considera do a principal causa de tanta violência. A falta de condições do indivíduo em ali mentar a si próprio e sua família. Portanto é coerente dizer, mais em prego, menos criminalidade. Um empre go com salário, que no mínimo supris se o que é considerado de primeira ne cessidade, porque os sub-empregos, es ses, não resolvem o problema. Trabalho não seria a solução, mas teria que ser a primeira providência a ser tomada. 60 Existem vários outros fatores que influenciam no problema como por exemplo, a educação, a falta de carinho, essas crianças simplesmente nascem, como que por acaso, e são jogadas no mundo, tomando-se assim pessoas re voltadas c agressivas. A solução é alongo prazo, é cuidan do das crianças, mostrando a elas a es cala de valores que deve ser seguida. E isso vai depender de uma cons cientização de todos nós. A descontinuidade é f lagrante nesse texto, mas aparece aí associada à desarticulação. E não são esses os únicos problemas. Vejamos a análise. A e s t ru tu ra formal da redação corresponde á organização do texto dissertativo e atende, pois, às exigências do programa: um parágrafo in tro dutório, qua tro dc desenvolvimento e dois reser vados à conclusão. De início, um núm ero tão grande de parágrafos num texto relativamente pe queno faz suspe ita r de um a certa fragmentação. O título e a prim eira frase lançam uma idéia que não se rá mais re tom ada explicitam ente na redação e que só à custa de algum esforço do rc- cebedor pode ser relacionada com os fatos e con ceitos expostos. Não é imediata
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