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UNIVERSIDADE FEDERAL DO TRIANGULO MINEIRO Aline Rodrigues Faria Côbo O PROGRAMA DE INCLUSÃO SOCIAL DO EGRESSO DO SISTEMA PRISIONAL – PRESP – UBERABA: Desafios e possibilidades para o egresso Uberaba 2014 ALINE RODRIGUES FARIA CÔBO A INCLUSÂO SOCIAL DOS EGRESSOS DO SISTEMA PRISIONAL EM UBERABA Trabalho de Conclusão de Curso, apresentado à Universidade Federal do Triângulo Mineiro – UFTM, como requisito parcial para obtenção de título de bacharel em Serviço Social. Orientadora: Profª Drª Cláudia Helena Julião Uberaba 2014 ALINE RODRIGUES FARIA CÔBO . A INCLUSÂO SOCIAL DOS EGRESSOS DO SISTEMA PRISIONAL EM UBERABA Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à Universidade Federal do Triângulo Mineiro, como requisito parcial para obtenção do título de bacharel em Serviço Social. ______de_______________de________. Banca Examinadora: _____________________________________________________ Profª. Drª. Cláudia Helena Julião (Orientadora) Universidade Federal do triângulo Mineiro _____________________________________________________ Profª. Drª. Celeste Aparecida Pereira Barbosa Universidade Federal do triângulo Mineiro _____________________________________________________ Profª. Drª. Regina Maura Rezende Universidade Federal do triângulo Mineiro Dedico esta conquista à minha mãe, sem a qual eu não teria conseguido chegar até aqui, ao meu marido, pelo seu companheirismo e às duas pessoas que chegaram durante a caminhada deste percurso, e mudaram o sentido da minha vida, a cada sorriso e a cada palavrinha nova renovavam as forças e explodia a vontade de alcançar meus objetivos, aos meus filhos: Pedro Rodrigues Côbo Oliveira e Isabella Rodrigues Côbo Oliveira AGRADECIMENTOS Agradeço a Deus, por ter permitido que eu viesse nessa família tão maravilhosa e por ter me mandando tantos presentes bons, verdadeiros anjos em minha vida. À minha mãe, por ir além do impossível para me ajudar e estar do meu lado, por ter me apoiado em qualquer que fosse minha decisão. Sem ela não teria alcançado esta vitória. Ao meu pai, que do jeito dele, sei que me ama e está de prontidão para me ajudar no que for preciso. Ao meu marido Lucas, que sempre ao meu lado, me fez acreditar que eu seria capaz, e por ter feito de tudo para que chegasse esse momento tão esperado. Aos meus filhos, Pedro e Isabella, que chegaram no percorrer dessa conquista, mas que me fizeram ver como a vida é maravilhosa e por me darem forças todos os dias para lutar pelos meus objetivos. À minha irmã Vivi, que mesmo lá de cima, está sempre dando um jeito de me mostrar que está ao meu lado, me mandando forças através de palavras positivas pelas pessoas maravilhosas que colocaram em meu caminho. Ao meu padrinho Lucas, que mesmo lá de cima também, sei que está iluminando meu caminho, por suas reflexões do tempo em que esteve presente em nossas vidas estarem tão fortes até hoje. Às minhas tias, que são maravilhosas por sinal, por estarem presentes nos momentos bons e nos ruins também, e por não permitirem que me sentisse só em momento algum. Aos meus avós, que mesmo as vezes de longe devido a correria do dia a dia, que de alguma forma, arrumaram um jeito de dar um telefonema para saber como eu estava e se fazerem presentes na minha vida. Ao meu tio Hélio, por ter feito o que estava ao seu alcance para me ajudar, e por ter feito questão de estar presente em todos os momentos mais importantes da minha vida. Nunca vou esquecer! Aos meus sogros, por ter cuidado tão bem dos meus filhos para que eu chegasse ao fim dessa conquista, sem que fosse necessário trancar a faculdade. A minha cunhada Renata, por ter me apoiado quanto a esta conquista e por ter me orientado quanto as algumas questões de trabalhos da faculdade. A minhas amigas, por mesmo distante, eu saber que posso contar com vocês e peço desculpa por ter me distanciado dessa forma durante a conquista dessa vitória. A minha amiga Rubiana, por ter me apoiado e me dado força para enfrentar esse momento tão difícil com palavras de carinho e aconchego. A minha orientadora Cláudia, por não ter desistido de mim, pelas broncas, que sem elas eu não alcançaria essa conquista e por ter transmitido confiança em mim. As minhas professoras, aquelas que me olharam transmitindo uma confiança de que eu seria capaz e que estavam torcendo e aguardando comigo este momento. “A manifestação mais cruel das desigualdades sociais em nosso país se dá no acesso à justiça, que começa com o comportamento do policial lá na ponta, revisando alguém, e acaba no sistema penitenciário. É aí que se experimentam as desigualdades do modo mais dramático.” Luiz E. Soares RESUMO A presente pesquisa buscou conhecer as ações desenvolvidas pelo Programa de Inclusão Social do Egresso do Sistema Prisional – PrEsp, para a inserção do egresso na sociedade. A escolha desta temática se deu em virtude da realização de estágio supervisionado em Serviço Social no mencionado Programa. Propôs-se como objetivos deste estudo: conhecer o Programa de Inserção Social do Sistema Prisional – PrEsp, em Uberaba, analisando sua contribuição para a inserção social dos egressos, bem como Identificar as ações desenvolvias pelo Presp em Uberaba, conhecer a realidade do egresso atendidos pelo Presp, além de identificar o perfil do egresso atendido pelo Presp para aproximação do objeto da pesquisa. Na busca do referencial teórico realizou-se a pesquisa bibliográfica e documental, a fim de investigar como ocorre essa inserção na vida dos egressos do sistema prisional, com a finalidade de contribuir com a garantia dos direitos da pessoa que passou pela privação de liberdade. Trata-se de um estudo exploratório, de abordagem quantitativa e qualitativa, no qual se realizaram entrevistas com pessoas que passaram pela punição de privação de liberdade e consulta dos formulários que são preenchidos pelos técnicos do PrEsp. A base teórica que orientou este estudo é o materialismo histórico dialético. Os resultados obtidos permitiram conhecer como se dão as ações do PrEsp e suas contribuições para o egresso do sistema prisional, assim como desvelar o perfil dos entrevistados. Palavras chaves: egresso do sistema prisional, inclusão social, serviço social LISTA DE FIGURAS Figura 1 – Sexo; Figura 2 – Escolaridade; Figura 3 – Inserção no Mercado de Trabalho; Figura 4 – Filhos; Figura 5 – Renda Familiar; Figura 6 – Tipo de Crime; Figura 7 – Tempo de Reclusão; Figura 8 – Uso de drogas lícitas e ilícitas. LISTA DE SIGLAS CEAPA - Central de Apoio as Penas e Medidas Alternativas LEP – Lei de Execução Penal NPC - Núcleo de Prevenção à Criminalidade ONU – Organizações das Nações Unidas PNSP – Plano Nacional de Segurança Pública PNSSP - Plano Nacional de Saúde para o Sistema Penitenciário PrEsp – Programa de Inclusão Social do Egresso do SistemaPrisional SEDS - Secretaria de Estado e Defesa Social SPEC - Superintendência de Prevenção a Criminalidade SUS - Sistema Único de Saúde VEC – Vara de Execução Criminal SUMÁRIO INTRODUÇÃO ________________________________________________12 CAPÍTULO 1 - Sistema Prisional _________________________________15 1.1 – Surgimento do Sistema Prisional como punição __________________15 1.2 O Sistema Prisional no Brasil __________________________________18 CAPÍTULO 2 - Inclusão Social do Egresso do Sistema Prisional _______26 2.1 Inclusão Social ______________________________________________26 2.2 – O Programa de Inclusão Social do Egresso do Sistema Prisional (PrEsp) em Uberaba ___________________________________________________30 CAPÍTULO 3 – A PESQUISA _____________________________________38 3.1 Metodologia ________________________________________________38 3.2 Análise de dados ____________________________________________40 CONSIDERAÇÕES FINAIS ______________________________________53 REFERÊNCIAS ________________________________________________55 APÊNDICE ___________________________________________________58 ANEXO ______________________________________________________62 12 INTRODUÇÃO A tarefa de desconstruir fatores estigmatizastes quanto às pessoas que cumpriram pena privativa de liberdade não é uma tarefa fácil, tendo em vista a forma como a sociedade e também o Estado voltam sua atenção para esta parcela da população. Na tentativa de conhecer melhor a realidade na qual o egresso do sistema prisional está inserido, propôs-se o estudo sobre as ações do Programa de Inclusão Social do Egresso do Sistema Prisional de Uberaba, espaço esse que buscar inserir o egresso na sociedade através da efetivação de seus direitos. O referido programa atende as demandas do egresso do sistema prisional em Uberaba e constituiu-se em campo de estágio supervisionado em Serviço Social, durante o qual surgiu o interesse para realizar esta pesquisa. Foi a partir da experiência de estágio que sugiram indagações quanto ao direitos sociais que deveriam ser efetivados aos egressos, assim como desvelar os desafios, por eles enfrentados após o cumprimento da pena privativa de liberdade. Este estudo tem como objetivo geral: conhecer o Programa de Inserção Social do Sistema Prisional – PrEsp, em Uberaba, analisando sua contribuição para a inserção social dos egressos E, como objetivos específicos a pesquisa buscou analisar os seguintes aspectos: identificar as ações desenvolvias pelo Presp em Uberaba; conhecer a realidade do egresso atendidos pelo Presp; identificar o perfil do egresso atendidos pelo Presp. O projeto de pesquisa foi submetido à aprovação do Comitê de Ética e Pesquisa da Universidade Federal do Triangulo Mineiro sob o protocolo de nº 2557. Além da pesquisa bibliográfica, realizou-se pesquisa de campo, com consulta aos formulários do primeiro atendimento dos egressos preenchidos pelos técnicos sociais do PrEsp. Foram realizadas também entrevistas semi- estruturadas com 6 egressos, utilizando-se o gravador para obter maior precisão no registro dos dados. A entrevista se deram a partir do plantão realizado pela pesquisadora no campo realizado em um dia no mês de janeiro de 2014. Foram entrevistados 6 egressos, que, após esclarecimento, aceitaram participar da pesquisa de forma de livre espontânea. 13 Foi realizada pesquisa bibliográfica, a fim de alcançar um maior embasamento teórico para melhor analise das entrevistas e classificação dos perfis dos egressos. Uma vez que foi realizado busca de livros, artigos e revistas online que valorizaram a leitura sobre o tema. Com referencial teórico baseado no materialismo histórico dialético, para se chegar a criticidade no que se diz respeito aos direitos das pessoas que cumpriram pena privativa de direitos. A presente pesquisa se justifica pela necessidade da efetivação de uma política que garanta os direitos dos egressos do sistema prisional, e pela importância de se aproximar da realidade que o egresso está inserido. Estudos como este podem contribuir para reflexão quanto a necessidade das práticas punitivas e seus reflexos causados na sociedade. No decorrer desta pesquisa constatou-se que existem diversos estudos que buscam desconstruir as práticas punitivas, afirmando que é possível acreditar que existe sociedade sem crime, pois Magalhães J. (2012) afirma que é de suma importância que se compreendam isso, pois cita uma cidade chamada Marinaleda, que fica no Sul da Espanha, onde não há policiais, nem desempregados, nem criminalidade. Magalhães J. (2012), afirma que a sociedade não precisa desse conceito criado pelo sistema de repressão e controle em que está posto. Pois não é verdade que em toda sociedade humana exista crime e que o crime é algo atemporal. Barros (2012) problematiza sobre “o discurso oficial” segundo o qual as pessoas que estão em privação de liberdade serão “reeducados e reintegrados à sociedade” através de políticas publicas de ressocialização. As críticas a essas políticas surgem primeiro porque elas são referidas às pessoas que devem ser “reparadas” e segundo que a pessoa que está em privação de liberdade nunca esteve de fato inserido socialmente. O presente trabalho se divide em três capítulos, sendo eles: O primeiro capítulo Sistema Prisional, faz uma breve contextualização quanto ao surgimento do Sistema Prisional como punição e de modo especial no Brasil. No capítulo dois se discute a Inclusão Social do Egresso do Sistema Prisional, trazendo inicialmente considerações sobre inclusão social, para depois tratar do surgimento do Programa de Inclusão Social do Egresso do Sistema Prisional e a desconstrução das práticas punitivas. No capítulo três 14 a Pesquisa traz a descrição da metodologia, apresentação e analise dos dados, através dos quais se pode identificar ações do PrEsp e conhecer a realidade do egresso. 15 1 - Sistema Prisional “... impossível adivinhar quantos dias, meses, anos, me separavam da liberdade; e realmente a ideia de ser posto na rua, sem armas, sem defesa, me causava arrepios. Medonho confessar isto: chegamos a temer a responsabilidade e o movimento, enervamo-nos a arrastar no espaço exíguo os membros pesados. Bambos, fracos, não nos aguentaríamos lá fora; a menor desgraça é continuarmos presos, inertes, descomedindo-nos em longos bocejos.” (Graciliano Ramos em Memória do Cárcere) 1.1 – Surgimento do Sistema Prisional como punição Para pesquisar sobre a inclusão social do egresso do sistema prisional faz-se necessário conhecermos como surgiram as punições para aqueles que contrariavam os detentores do poder, assim como se deu a gênese do sistema prisional. Para tanto, cabe aqui a sua breve contextualização. Na antiguidade não havia privação de liberdade, utilizava-se do encarceramento com o intuito de preservar o delituoso até a execução da pena, que se dava de diferentes formas, como morte de diversos tipos,mutilação, açoites, etc. Estes locais eram prisões de custódia e tortura. Nesta época as punições eram determinadas conforme a gravidade causada à vítima (CARDOSO,2006). Já na Idade Média, o desenvolvimento do sistema prisional relaciona-se com o desenvolvimento histórico da sociedade, que tinha o Direito Criminal como norte para suas punições. Este sistema adotado contribuiu para a manutenção da hierarquia, porque mantinha a diferenciação entre guerreiros, senhores feudais e servos. Neste período, houve uma redução da penade morte, devido ao aumento da mão de obra, pois necessitavam de trabalhadores nos centros urbanos e nesse sentido a pena de morte deixa de ser uma solução adequada. Dessa forma, fica explícito que o cumprimento das medidas de punição sempre foram determinadas por detentores do poder, pois as punições seguiam conforme a comodidade da classe dominante. Foi na Igreja Católica da Europa que se deu a gênese da nomenclatura “Penitenciários”, pois neste período a Igreja retomou o Direito Romano e criou locais para os transgressores dos códigos religiosos, usando esses locais para 16 tratar os “penitentes”, com intuito de estimulá-los a ter espírito de penitência, para que eles arrependessem e percebessem o “pecado” cometido. Assim, nasceu os “Penitenciários”, mas nestes lugares também havia torturas, abusos de poder por negligência do poder canônico. Com o passar do tempo, os “Penitenciários” se tornaram prisões, local usado como depósito de pessoas, onde ocorriam diversas torturas, como mortes, infecção de doenças e mutilações. Durante os séculos XVI e XVII, devido ao desenvolvimento econômico causado pela industrialização e o desenvolvimento do capitalismo monopolista, houve a expansão da situação de miséria por toda a Europa. Contudo, houve o aumento da criminalidade, diante da qual os detentores dos meios de produção passaram a achar necessário tomar medidas mais severas de punição. Foi no final do século XVI que a pena privativa de liberdade passou a ser adotada como estrutura de punição por encarceramento. Mas só no final do século XVIII, nos Estados Unidos, que a pena como encarceramento passou a ser tratada como “sistema penitenciário”, sendo então reconhecida como gênese da pena privativa de liberdade. Magalhães C. (2012) reforça que o ser humano deve ser entendido como sujeito e não o objeto. O desvio do sujeito pode ser compreendido como uma consequência da reação da sociedade (ou melhor, das contradições expostas pela condição Capital x Trabalho). Nessa perspectiva: Os grupos sociais criam o desvio ao fazer as regras cuja infração constitui desvio e ao aplicar essas regras a pessoas particulares e rotulá-las como marginais e desviantes [...] O desviante é alguém a quem aquele rótulo foi aplicado com sucesso; comportamento desviante é o comportamento que as pessoas rotulam como tal. (MAGALHÂES C., 2012, p. 92-93 apud BECKER, 1977, p. 60) O “criminoso” segundo Magalhães C. (2012, p. 91) é: “alguém que praticou um comportamento valorado pelo direito e veio a sofrer uma pena. Alguém que teve seu comportamento enquadrado em um tipo de pena”. Logo se entende que o criminoso é aquele sujeito que praticou um comportamento que se tornou criminalizado pelos procedimentos do direito penal. O objeto é o crime e não a criminalidade. Essas pragmáticas só reforçam e mantém vivo o “homem delinquente”. 17 Contudo, no século XIX começaram as construções das prisões com o intuito de corrigir os apenados, esses espaços eram conhecidos como “Casas de Correção”. Neles eram depositadas as pessoas consideradas mendigos, delinquente e imigrante, a fim de “reformar” suas condutas. Foi neste período que os senhores feudais criaram o crime de vadiagem e ociosidade, pois aqueles camponeses que não aguentavam a exploração de seus senhores e passaram a abandonar as terras e acumular a massa urbana eram considerados criminosos e tinham que pagar por seus crimes nas “Casas de Correção”, que posteriormente passaram a ser chamadas de “Casas de Trabalho”. Este novo nome se deu devido à exploração dos detentores do capital em relação a mão de obra dos reclusos, o que proporcionou uma administração lucrativa para o mercado. Contudo, passaram a substituir a pena de morte pelo confinamento. É importante ressaltar que essas formas de punições como privação de liberdade, que estava atrelada ao desenvolvimento do Estado, intensificou o avanço do mercado e o acumulo do capital. O aumento da população ocasionou a formação de um exército de mão de obra, exatamente o que o capital monopolista emergente precisava para explorar e impulsionar sua acumulação (CARDOSO, 2006). No século XX ocorreu a gênese da “Ciência das Prisões”, devido à evolução das elaborações teóricas e práticas. Tal ciência era ensinada nas universidades, e tinha como objeto as prisões, os condenados e as penas. A partir de então, Cardoso (2006) afirma ter sido considerada uma evolução, por começarem a discutir nos espaços acadêmicos a “Ciência das Prisões”. Através de congressos e produções cientificas que ocorreu o I Congresso Penitenciário Internacional em Londres, em 1872. Em 1955, a Organizações das Nações Unidas – ONU, construiu as Regras Mínimas para Tratamento dos Presos, nas quais constam como devem ser as instalações mínimas nas prisões, e como o condenado deve ser tratado, como sujeito de direitos. As instalações prisionais devem conter equipamentos de aprendizagem dando condições aos apenados a passarem por processos educativos e profissionais e, os espaços físicos devem permitir os seus deslocamentos. 18 Contudo, é perceptível que o surgimento dos crimes se deu conforme as condições dos sujeitos trabalhadores, ou dos que estavam a procura de trabalho, visto que as condições de vida se tornaram extremamente precária, por não terem o acesso ao mínimo necessário para sua sobrevivência. As punições surgiram como estratégia para manter a lógica do mercado e o controle da sociedade. 1.2 O Sistema Prisional no Brasil Segundo Cardoso (2006), foi nos primórdios da colonização do Brasil que chegaram centenas de nobres exilados de Portugal e da Europa, pois os portugueses implantaram o seu Código de Leis na Colônia, o qual em seu Livro V das Ordenações Filipinas do Reino colocava que o Brasil Colônia deveria ser o lugar de moradia para os chamados “degredados”. Assim, a primeira forma de punição adotada nas terras do Brasil Colônia foi o exílio. As penas eram aplicadas a pessoas que negavam a ordem vigente. Segundo Pedroso (2006), os delitos mais comuns da época eram os duelos, a prostituição, a entrada em propriedade privada, as falsificações de documentos e os contrabandos de pedras preciosas. Em 1824, foram implantadas no Brasil as “Casas de correção” que foram adotadas pela Constituição do Império. Estes locais surgiram para “corrigir” pessoas que praticavam a mendicância e a vadiagem. Essas “Casas de Correção” foram adotas como o novo modelo de trabalho, que na verdade deveriam ser locais arejados, seguros e que houvesse separação entre os detentos conforme os delitos cometidos, mas acabaram virando um local de “depósito de pessoas”. (PEDROSO, 2006). Em 1830 a pena de trabalho foi regularizada pelo Código Criminal, enquanto as Assembleias Legislativas Provinciais foram implantas pelo Ato Adicional em 1834, tendo o direito de adotar, nas “Casas de Correção”, o trabalho como modo de aprendizagem para a disciplina e ordem. Segundo Pedroso (2006), o Código Penal de 1890 implantou novas modalidades de pena: prisão celular, reclusão com trabalho obrigatório, prisão disciplinar, interdição, suspensão e perda do emprego público. A prisão celular foi utilizada na Idade Média, pela Igreja Católica, que se baseava no Direito Canônico. Ela era usada em pequenos quartos nos 19 mosteiros, tidos como cela, para castigar os religiosos infratores, obrigando-os a praticar penitencias e orações. Essas celas tinham um espaço distribuído por metro quadrado, onde ficavam pessoas condenadas por terem cometidos atos ilícitos, elas poderiam ser individuais ou coletivas e ficavam em prédios conhecidos como “Casas de Correção” e no mais tardar como prisões (GARBELINI, 2004). Na Primeira República, através do CódigoCriminal de 1890, adotou-se a prisão celular como forma de punição. Posteriormente essa modalidade de prisão também foi adotada para qualquer modalidade de delito. O avanço na prisão celular foi o isolamento do individuo, o que coibia sua socialização. Segundo Cardoso (2006), com o passar do tempo as “Casas de Correção” foram substituídas por prisões. Atualmente, a prisão mantém a defesa do trabalho para a recuperação da conduta desviante, mas sem manter a exploração da mão de obra, pois o Sistema Penitenciário no Brasil, devido ao desinteresse do domínio público, foi sendo utilizado para limpar as ruas, retirando os indesejáveis ou os contraproducentes do modo de produção do convívio com a sociedade. A Primeira Constituição da República manteve sua política de não legislar diretamente sobre a situação prisional no Brasil. No Código Penal da República, as referencias à execução penal eram feitas em sucintas linhas, deixando para o Código de Processo Penal dos estados brasileiros discorrerem sobre a execução da pena. Não havia leis que deviam ser seguidas nas penitenciárias, não existia preparo para as pessoas que nelas trabalhavam, os diretores eram escolhidos por questões políticas e não possuíam qualificação para exercer tal função. O que havia era a prisão como uma forma de limpar as ruas, com intuito de disciplinar os preguiçosos e os ditos não capazes para o trabalho. O fato é que no Brasil existe uma cultura de punição e não de preparação para a inclusão social do apenado. Foi em 1924 que ocorreu a humanização da pena de privação de liberdade no Brasil, com a gênese do Conselho Penitenciário e a regulamentação do benefício de livramento condicional. Cardoso (2006) cita que Miotto (1975) afirma que o segundo passo dessa humanização se deu com o surgimento da Inspetoria Geral Penitenciária 20 em 1934. Sua competência era gestar os recursos financeiros advindos da venda do selo penitenciário de todo país. Com a Constituição de 1934, as “Normas Gerais de Regime Penitenciário” colocou como competência da União suas legislações, inclusive podendo os estados brasileiros legislar supletivamente. Já em 1935, com a intenção de organizar o sistema penitenciário foi aprovado o “Código Penitenciário da República”, que tinha como parâmetro cuidar de todas as circunstancias referentes às condições que envolviam os apenados. Em 1937 houve um decreto que regulamentou e determinou a estrutura, as funções e o funcionamento da “Inspetoria Geral Penitenciaria”, especificando este como sendo o único órgão das principais linhas dos serviços penitenciários no país (PEDROSO, 2006). Houve um avanço significativo no mundo pós-Segunda Guerra Mundial, em 1948, devido à promulgação da Declaração Universal dos Direitos do Homem, que foi elaborada pela ONU. Segundo Cardoso (2006), foi nesta perspectiva que o Brasil foi gradativamente implantando as legislações pautadas nos Direitos Humanos, por ter se tornado signatário à ONU das “Regras Mínimas para o Tratamento do Preso”, comprometendo-se em melhorar o ambiente prisional com um tratamento humanizado da pessoa em privação de liberdade. É neste documento que o apenado surge como sujeito de direitos, nele contém as condições que os estabelecimentos prisionais devem oferecer a fim de garantir um processo educativo e profissional ao recluso, um espaço físico que garanta o seu deslocamento sem que prejudique sua saúde mental e física. Nesta perspectiva, surge o dever do Estado em garantir a execução da pena com o princípio da reabilitação social da pessoa em privação de liberdade, prevenir o delito e evitar a reincidência. Nesse sentido, destaca-se a necessidade de orientar e preparar o recluso para voltar ao convívio social. Em 1957, o Brasil promulgou a Lei nº 3.274, que discorre sobre as “Normas Gerais do Regime Penitenciário” e a sua efetivação se deu junto a divulgação das Regras Mínimas para Tratamento do Preso de 1955. Segundo Cardoso (2006), essas regras não foram aceitas pela sociedade, pois ela trazia 21 um novo conceito do apenado, considerando-o como uma pessoa sujeita de direitos, deveres e responsabilidade. Dessa forma, o apenado deixa de ser uma “coisa” e passa a ser reconhecido como sujeito de direitos, mesmo com seus direitos civis violados. Ele passa a adquirir o direito ao convívio familiar, social e comunitário e assim ser preparado para o sua inclusão social. O Brasil sempre se voltou para prevenção do delito e controle da criminalidade, principalmente com leis voltadas para as penas privativas de liberdade, pois não há preocupação em elaborar políticas sociais que busquem a inserção do egresso na sociedade. Existem dificuldades em humanizar a pena, devido ao contexto histórico ditatorial presente na ordem da Nação. Mas a Política Penitenciária no Brasil trata a pena não somente como a privação de liberdade, ela possui duas modalidades: restritiva de direitos e a privação de liberdade em prisão. Barros (2012, p. 64-65) utiliza da expressão de Robert Castel para ressaltar sinônimos e efeitos da prisão: 1) O encarceramento é sinônimo de ruptura e de interrupção da organização da vida fora dos muros. Ele destrói no sujeito o sentimento de domínio de seu destino, ele não possui mais autonomia, possibilidade de fazer escolhas. 2) A prisão é um mundo no qual o detento é essencialmente desresponsabilizado e infantilizados. Ele é confrontado a um universo de limitações que lhe impõe uma total submissão e impede a iniciativa pessoal. Ele é transformado em objeto de tratamento penitenciário. 3) O encarceramento impõe um modo de vida caracterizado pelo isolamento, promiscuidade e obrigação de se conformar a um regulamento que se introduz na intimidade de cada um e enquadra todos os detalhes da vida cotidiana. Atinge cada um em seu corpo, na satisfação de necessidade mais intimas, na imagem de si, na percepção do tempo e do espaço, na relação aos outros e ao mundo. 4) A experiência do encarceramento é a confrontação a uma desordem interior: perda de referencias, fragilização, separação da família e dos amigos, despossuindo o sujeito da identidade social – trata-se do apagamento simbólico do sujeito e do desejo – reduz o sujeito a seu corpo, que é o que lhe resta. Tão pouco, o discurso sobre o efeito da prisão é transformado, cria-se o discurso que prega a positividade do aprisionamento, que passa antão a ser visto como algo positivo. Tornar positivo aquele julgado negativo. A intenção de 22 punir, isolar e condenar é minimizada, em busca da reinserção, que surge como principal objetivo do sistema prisional. Segundo Cardoso (2006), a Política Penitenciária entende o apenado como um sujeito social, que por algum motivo específico entrou em conflito com a lei e recebe a sanção em forma de pena, através das instâncias Jurídicas, que se encontra dentro dos princípios normativos do Direito Penal. A pena restritiva de direitos é determinada ao apenado que fique submetido à proibição de alguns direitos, à seguir certas condições e também à cumprir obrigações específicas sem ser recolhido à prisão. Na privação de liberdade, o sujeito fica em condição de reclusa à prisão, ela é determinada para aqueles que entraram em conflito com a lei, mas que é julgado efetivamente necessário como por motivo de Justiça, de segurança social e de ordem pública. Os critérios para as prisões estão pautados de acordo com o crime e pela personalidade da pessoa que o cometeu. Neste tipo de pena, existem gradações, como progressão de regime prisional, que é realizada conforme a segurança do estabelecimento prisional, podendo ser máxima, média ou mínima e a configuração do regime prisional, podendo ser fechado, semiaberto, aberto e livramentocondicional. O nível de segurança do sistema prisional se refere ao estabelecimento em si, sendo que o regime diz respeito ao funcionamento do estabelecimento prisional. Os estabelecimentos prisionais podem conter condenados em regime fechado e semiaberto; a escolha do tipo de regime advém da gravidade do delito, da personalidade do delituoso e de sua conduta social. O regime fechado se dá em estabelecimento de segurança máxima (art. 33, do Código Penal), estabelecimento este denominado “penitenciária” (art. 87, da Lei de Execução Penal - LEP). Caso a pessoa seja condenada a pena superior a oito anos, deverá começar a cumpri-la em regime fechado obrigatoriamente. No regime semiaberto o apenado tem possibilidades de sair sem vigilância da prisão, embora menos ampla que no regime aberto. Ele pode sair a trabalho, participar de cursos profissionalizantes, tratamento de saúde, atividades religiosas, ou enquanto condição penal sair com beneficio penal para visitar a família em datas especiais, logo visando facilitar a inserção dos apenados à sociedade. É uma progressão de regime com a condição que o 23 condenado cumpra ao menos um sexto da pena no regime anterior, regulamentada pelo art. 112 da LEP. O regime aberto deve ocorrer em Casa de Albergado ou estabelecimento adequado. Ele é concebido aos apenados que não apresentarem periculosidade, que possuírem disciplina e responsabilidade para viver em semiliberdade. Essa progressão também pode ser direito para o condenado que tenha cumprido um sexto de sua pena em um dos regimes anteriores. Este regime e o posterior podem se estabelecer em sistemas prisionais de segurança mínima e quando não houver, o Estado deve desenvolver programas que deem suporte profissional que acompanhe o cumprimento da pena e do apenado. O livramento condicional é um direito público do apenado que se apresenta como uma liberdade provisória concedida para aqueles que preencham os requisitos antes mesmo do termino de sua pena. É fundamental ressaltar que tanto este direito quanto o regime anterior pode ser provisório caso haja descumprimento das normas que são pré-estabelecidas, impondo ao apenado que volte a cumprir a pena privativa de liberdade na penitenciária. A Ciência Penitenciária se preocupa com a humanização da pena, pois os teóricos da Criminologia e do Direito crítico questionam a sua execução, buscando construir legislações que efetivem sua humanização. Nesse sentido, é dever do Estado garantir condições que previnam o delito e as reincidências penais, para possibilitar as pessoas que passaram por privação de liberdade as devidas condições para o seu retorno no convívio social, através de políticas sociais. É com a promulgação da Lei de Execução Penal (LEP), Lei n.º7.210, de 11 de julho de 1984, que se busca garantir a “reabilitação” do apenado, nela é determinada como devem ser cumpridas a pena privativa de liberdade e a pena restritiva de direitos. Estes direitos estão previstos na LEP em seu artigo 1°: A execução penal tem por objetivo efetivar as disposições de sentenças ou decisão criminal e proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado e do internado. (BRASIL, 1984) 24 Em 1985 a LEP passou a ser a lei que regulamenta a execução da pena no Brasil, e desde então passou a ser alvo de estudos e pesquisas pelos juristas e estudiosos das ciências humanas e sociais. Segundo Cardoso (2006), em 1920 alguns adeptos à teoria crítica, como juristas, médicos, e sanitaristas apresentaram preocupações com a população carcerária, principalmente com a situação degradante presente no sistema prisional. Eles se uniram ao Estado para desenvolver estratégias, juntamente com movimentos de defesa dos Direitos Humanos, para a construção de uma legislação para a execução penal e a efetivação da humanização da pena privativa de liberdade. Contudo, apesar da promulgação da LEP, as condições de execução de penas ainda são precárias. Durante décadas esses conceitos que tratavam o apenado como sujeito coisificado permaneceram, prevalecendo a prática de encarcerar e punir, associada à falta de recursos humanos e instalações adequadas dos prédios. A terapia e o tratamento para os sujeitos em privação de liberdade ficaram somente nas propostas teóricas. Embora a esperança de alcançar a ‘recuperação’, ‘ressocialização’, ’readaptação’, ‘reinserção’ ou ‘reeducação social’ tenha penetrado formalmente nos sistemas normativos, questiona-se muito a intervenção estatal na esfera da consciência do presidiário, para se apurar se tem o Estado o direito de oprimir a liberdade interna do condenado, impondo- lhe concepções de vida e estilo de comportamento. O Estado democrático não pode impor ao condenado os valores predominantes na sociedade, mas apenas propô-los ao recluso, e este terá o direito de refutá-lo, se entender o caso, de não conformar-se ou de recusar adaptar-se às regras fundamentais. É preciso não esquecer que o direito, o processo e a execução penal constituem apenas um meio para a reintegração social, mas nem por isso o de maior alcance, porque a melhor defesa da sociedade se obtém pela política social do Estado e pela ajuda pessoal. (MIRABETE, 2004, p. 25). O cometimento do delito é reflexo da falência de teorias e de sistema punitivo. Contudo, a promulgação da LEP trouxe deslumbre a fim de enxergar uma oportunidade com novas perspectivas para a inclusão social, pois ela garante em seu artigo 10º, entre suas atenções básicas, o direito a assistência. A LEP traz uma nova perspectiva de “reeducar” os termos e as normais sociais, ela é baseada no movimento crítico e substitui o termo “tratamento“ para “assistência”, que é garantido como benefício na execução da pena. Ainda 25 com base no art. 10 da LEP, o desenvolvimento harmônico do apenado deve ser garantido através de serviços sociais, a fim de respeitar o contexto histórico presente em sua vida. Mas é facilmente perceptível pelos noticiários ou estudos desenvolvidos nos estabelecimentos prisionais no Brasil que mostram uma realidade oposta. A falta de aparelhos administrativos e estruturais nos diversos ambitos governamentais apresenta a falha na efetivação dos princípios defendidos pela LEP. Nesta perspectiva a Constituição Federal trata dos preso garantindo o respeito a sua integridade física e moral no seu artigo 5º, XLIX Art. 5- Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: III - ninguém será submetido à tortura nem a tratamento desumano ou degradante; XLIX - é assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral; (BRASIL, 1988). Contudo, o Sistema Prisional brasileiro é um retrato da sociedade desigual, que sofre pela ausência da efetivação das políticas sociais e para o enfrentamento da questão social, demonstra o descaso da política em estabelecer a cidadania para a situação dos reclusos. A problemática é que o direito ao atendimento das necessidades dos condenados pode ser entendido como um favorecimento, como um merecimento e não é reconhecido como uma questão de direito do cidadão, esta é a contradição presente na LEP. A LEP focaliza no delito, deixando o apenado em segundo plano. Esquecendo que ele é um sujeito com reflexos sócio-históricos e precisa de políticas sociais. Na contemporaneidade, existem diversos estudos que buscam desconstruir o fim das práticas punitivas, ressaltando que é possível acreditar em uma sociedade sem punições e sem crimes. 26 2 – Inclusão Social do Egressodo Sistema Prisional 2.1 – Inclusão Social Para discutir inclusão social, se faz necessário refletir, a priori, sobre política social e exclusão social. Para Faleiros (1991), as políticas sociais são formas de articulação de processos políticos e econômicos. Os processos políticos são necessários para a manutenção da ordem social enquanto aqueles estão vinculados à manutenção das riquezas produzidas no país, são resultados da junção entre Estado e Sociedade. Devido a relação capital versus trabalho, o Estado foi pressionado a implementar políticas sociais para a classe desfavorecida. Esse avanço de política social ocorreu devido ao avanço nas situações de doenças, criminalidade e violência, principalmente na área urbana. A violência, no Brasil, se destaca com o avanço das tecnologias, devido as grandes mudanças ocorridas no contexto do país, consequência de novas relações de trabalho e exclusão social. É no capitalismo pós-moderno que aumenta o número de pessoas em situações que se julgavam desestabilizadas para o trabalho, e então começa a cobrança da sociedade em relação aos “inúteis para o mundo”. Nesta perspectiva, reforça-se um Estado de atuação mínima na proteção social, com políticas de integração e não de inserção, em contraponto com o Estado Máximo de controle social, vigilante, onipotente, a fim de subtrair a esquecida assistência dos afastados modelos de bem-estar social. Cardoso (2006) faz uma discussão sobre a diferença entre crime e violência, no qual aquele é interpretado como uma conduta desviante do individuo na sociedade onde está inserido, e este varia de acordo com a particularidade das relações sociais, bem como varia em diferentes grupos, ela está diretamente ligada às condições estruturais presentes no seio da sociedade. Ao se falar em violência é importante desmistificar que os atos violentos sempre estão relacionados com a pobreza. A população de baixa renda está historicamente mais exposta às condições de vida precárias e vulneráveis, como também está mais exposta às condições de exclusão social. Cardoso ressalta que: 27 As pessoas que, de alguma forma, não conseguiram ser atendidas por políticas sociais, são potencialmente aquelas que um dia poderão compor a população penitenciária, uma vez que os levantamentos censitários informam que os apenados, em sua maioria, são provenientes de famílias pertencentes aos extratos de baixa renda e habitantes das periferias dos grandes centros urbanos. (CARDOSO, 2006, p. 63). É nesse processo, que Marx (apud CARDOSO, 2006) assimila a acumulação do capital com a expansão da população violenta, criminosa e marginalizada, devido à formulação do “exército industrial de reserva”. Urge salientar que a exclusão social se expandiu no processo de industrialização, mas já existia desde as sociedades pré-capitalistas. Ela está atrelada com as relações desenvolvidas pelo individuo na sociedade que está inserido. Segundo Pereira (1998), a exclusão social é um fenômeno multidimensional, pois não está somente relacionada com a ausência de renda, mas é a expressão de uma combinação de várias desvantagens, que impede o sujeito de pertencer à sociedade. O excluído está com o vinculo rompido com a família, com a escola, trabalho ou comunidade, ou ainda ele pode estar sem vinculo algum. Cardoso (2006) reflete que a exclusão social geralmente está relacionada com a pobreza, violência, crime e criminalidade. Essas condições geram medo, insegurança e falta de perspectiva no sujeito excluído ou incluído e, diante dessa situação a sociedade acaba forçando o Estado a desenvolver forma de controle e punição. A sociedade se esquece de que a criminalidade que vem se desenvolvendo em seu contexto, faz parte de uma população excluída das condições mínimas de sobrevivência. Essa população excluída fará parte de outro grupo de exclusão, os reclusos. Logo, entende-se que os apenados são excluídos, já por sua própria condição legal em que se encontram, pois são excluídos do convívio familiar, com seus vínculos quase todos fragilizados e em uma situação de precarização e vulnerabilidade de relações, tendo como parceiros, quase sempre, a criminalidade, drogadição e a violência. 28 A exclusão social é reflexo da não cidadania, ou seja, é causada pela falta de planejamento estatal na efetivação de políticas sociais que liga o acesso universal a bens e serviços. No entanto, para haver inclusão social do apenado é necessário que desenvolvam atividades no interior das unidades prisionais, a fim de propor ações e programas que possibilitem ao recluso a capacitação e execução de atividades laborativas de acordo com a ordem do trabalho na sociedade atual. Segundo Cardoso (2006), na maioria das unidades prisionais o que ocorre são atividades referentes à conservação da higiene dos estabelecimentos prisionais, como corredores, celas e banheiros, há também produção de artesanatos, costura e panificações. Quando há exceções, oferecem curso de inclusão digital e informática básica. O Estado brasileiro pensando em propor inclusão social para atender as necessidades dos apenados constituiu o Plano Nacional de Segurança Pública (PNSP) em 2000, o Projeto Nacional de Segurança Pública, em 2003, e o Plano Nacional de Saúde para o Sistema Penitenciário (PNSSP). O PNSP priorizava a ampliação do sistema prisional estadual e federal, redução das modalidades de violência, mas quase não houve inovações, pois seus propositores esqueceram que a LEP já previa no artigo 11 o direito a assistência e como ela deveria ser prestada. No Plano continha 124 ações sendo 13 referentes ao aperfeiçoamento do Sistema Prisional. Por se tratar de um Plano Nacional, suas diretrizes deveriam dar continuidade às ações previstas na LEP, mas ficaram como ofertas e em sua maioria não foram executadas. O resultado do Projeto Nacional de Segurança Pública propôs algumas saídas que exigiam profundas mudanças na sociedade e na economia, como: a distribuição de renda a fim de reduzir as desigualdades sociais; a geração de emprego e renda; a eliminação do racismo; o aumento da escolaridade e da desigualdade entre gêneros. Segundo Cardoso (2006), este projeto indicou um aumento considerável das condições de violência e foi apostado um alto custo financeiro no confinamento humano sem o desenvolvimento de políticas sociais especificas para a demanda. 29 O Projeto trouxe à tona a discussão da necessidade do Estado desenvolver políticas sociais desligadas das leis, pois escancarou a distancia entre a letra da Lei e as políticas sociais. As liberações de verbas, quando ocorrem, destinam-se em sua quase totalidade à construção de unidades prisionais. São mínimos os recursos destinados às áreas da educação e do trabalho dos presos ou ao treinamento de agentes de segurança penitenciária (BRAIL, 2003, p.71). A superlotação carcerária é um dos maiores problemas do sistema prisional, ainda que o Estado brasileiro realize constantemente a construção de novas unidades prisionais, a cada ano o déficit de vagas é maior, e o Projeto Nacional de Segurança Pública não discorre uma solução para tal problema. Segundo Cardoso (2006), a medida de destaque a partir do Plano e Projeto Nacional de Segurança Pública foi a implementação do Plano Nacional de Saúde do Sistema Penitenciário (PNSSP), formado com a participação de entidades de defesa dos Direitos Humanos, que sempre estavam presentes para interceder para melhorar as condições dos tratamentos às pessoas em situação de privação de liberdade. O PNSSP foi construído de acordo com os princípios do Sistema Único de Saúde (SUS): buscava a universalidade; a integralidade; a equidade; a descentralização hierarquizaçãoe regionalização das ações; a integração das instancias institucionais e a sustentabilidade das ações e a participação comunitária. Por conseguinte, os presídios deveriam ser locais que buscassem abrigar e ressocializar o apenado por meio de ações que proporcionassem a integralidade do ser humano. Mas a realidade mostra o contrário, esses locais se tornaram depósitos de pessoas, que ficam em situação de completo abandono. Mesmo com as Leis a favor do apenado, que rege de acordo com sua “reeducação”, os presídios no Brasil retratam a falta de vagas, cujo resultado é a superlotação nas celas, um alojamento subumano, obrigando os apenados a conviver em condições precárias, como consequência a má higienização ambiental e física; o revezamento para dormir; convivência com doenças infectocontagiosas. Como se não bastasse, ao cumprirem sua pena, os egressos do sistema prisional recebem o rótulo de ex-presidiários, sendo obrigados a enfrentar mais 30 um desafio após serem postos em “liberdade”. Têm de conviver com o preconceito da sociedade e a dificuldade para serem inseridos no mercado de trabalho. Enquanto estava em situação de privação de liberdade não obtiveram o que preconiza a LEP, pois não tiveram as condições de inclusão. O apenado ao cumprir sua pena (regime fechado e/ou semiaberto) recebe a liberdade, mas com o dever de finalizar as suas condições legais em regime aberto ou livramento condicional. No qual tem como obrigações frequentar o Programa de Inclusão Social do Egresso do Sistema Prisional (PrEsp). Quando não há estabelecimentos prisionais de segurança mínima, que segundo a LEP, deveria acolher o egresso que está em condição de regime aberto ou livramento condicional o Estado desenvolve estratégias governamentais ou não para incluí-lo á sociedade. Através de mandatos para serem acompanhados por um programa que possa lhe dar suporte quanto aos seus direitos, por meio de verificações de vagas de trabalhos e cursos profissionalizantes. 2.2 – O Programa de Inclusão Social do Egresso do Sistema Prisional (PrEsp) em Uberaba A aproximação da pesquisadora junto ao PrEsp se deu através da realização de estágio supervisionado em Serviço Social, como já mencionado, bem como por meio de visitas, observações e consulta a documentos e fontes eletrônicas. Os dados apresentados a seguir foram obtidos através de tais procedimentos, após os quais a pesquisadora mediante contatos com técnicos do PrEsp obteve a informação de alterações recentes quanto aos objetivos e fluxogramas do Programa, porém, os mesmos não foram disponibilizados. Desta forma, apresentam-se, neste momento, os dados e informações aos quais a pesquisadora teve efetivo acesso. Discorrer sobre o Programa de Inclusão Social do Egresso do Sistema Prisional (PrEsp) em Uberaba, exige inicialmente alguns esclarecimentos sobre o seu surgimento no Estado de Minas Gerais e da implantação do Instituto Elo. Bragatto (2010), afirma que devido ao aumento exorbitante dos indicadores de criminalidade em Minas Gerias, o governo criou a Secretaria de Estado e Defesa Social (Seds) a fim de reverter tais indicadores e traçou o 31 plano de uma Política de Segurança Pública que segue como base uma gestão estratégica a partir da integração de órgãos da defesa social, sendo seus integrantes: Defensoria Pública; Polícia Militar; Polícia Civil; Corpo de Bombeiros e Secretaria de Estado e defesa Social. Essa Política Estadual traçou como objetivo construir articulações entre as instituições e desenvolver programas de prevenção à criminalidade nas cidades de Minas Gerais, nas quais a qualidade de vida dos sujeitos estava sendo ameaçada devido ao grande índice de violência. Esses locais são: Fonte: Leite, 2009, p. 190 apud SEDS/SPEC, 2009 A finalidade desses Programas é diminuir a violência e atuar na prevenção à criminalidade e consequentemente melhor a qualidade de vida da população do Estado de Minas Gerais: Belo Horizonte, especialmente nos municípios já indicados, com a criação de trinta e oito Núcleos de Prevenção à Criminalidade (NPC), distribuídos em Minas Gerais. 32 Para a criação e efetivação das ações desenvolvidas nos NPC, foi estabelecida, em 2005, uma parceria entre a Superintendência de Prevenção à Criminalidade e o Instituto Elo. Bragatto (2010, p.24), ressalta que: A política de prevenção à criminalidade do Estado de Minas Gerais é desenvolvida através de um termo de parceria entre Estado e o Instituto Elo, que é uma Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP). O Instituto Elo reforça que as ações dos Programas sejam de cunho humanitário. Devido a este olhar considerado mais atento a questão social, a Spec determinou que a política de Minas Gerais, se tornasse em Política de Prevenção Social a Criminalidade. Porém, há uma discussão no bojo da Política Estadual de Prevenção à Criminalidade, sobre quais são os reais objetivos do Estado com essa política. Aponta-se que seu alvo seria a contenção de pobres, zelando pelo controle social, de forma que esses precisariam ser agregados à Política de Prevenção a Criminalidade antes que se torne um problema ao se envolverem com o crime. Assim o Estado, busca, na verdade, mediar os conflitos antes que virem um problema judicial. Apaziguar os problemas seria um meio de conter gastos. Bragatto (2010), faz crítica a essa Política, que é regida pela perspectiva de garantir acesso a alguns direitos para evitar que os usuários cometam crimes afim de reduzir custos, sendo que deveria, sim , enxergá-los como sujeitos de direitos. O fato é que, apesar de todas as críticas, os indicadores mostram que aonde os Programas são implantados há uma redução significativa na criminalidade, e os mesmos já servem de modelo para todos os estado brasileiros enquanto modelo de segurança pública. O PrEsp nasceu do decreto 43.295 de 2003, suas ações foram implantadas a partir de 2004 em três municípios de Minas Gerais. Atualmente é implementado em 11 municípios. Sendo eles: Belo Horizonte, Contagem, Betim, Santa Luzia, Ribeirão das Neves, Ipatinga, Governador Valadares, Uberlândia, Uberaba, Montes Claros e Juiz de Fora. O Programa trabalha em conformidade com a LEP e atende pessoas que passaram pela situação de privação de liberdade e encontram em 33 cumprimento de regime aberto, ou livramento condicional. A LEP define quem é o egresso que constitui público alvo do PrEsp, conforme se vê: I – O liberado definitivo, pelo prazo de 1 (um) ano a contar da saída do estabelecimento; II – O liberado condicional, durante o período de prova. Ampliando consideravelmente o disposto na lei e amparado por incorporações e adaptações da dinâmica sócio-jurídica, o Programa de Reintegração Social de Egressos do Sistema Prisional passou a atender o seguinte público: - Liberados definitivos do sistema penitenciário; - Livramento Condicional a partir de acordos firmados com as Varas de Execuções Criminais em cada município; - Prisão Domiciliar, nos casos em que há alguma condição imposta pelo juiz que viabilize a atuação do Programa; - Prisão Albergue nas mesmas condições do item anterior. (BRASIL, 1984, p.10 ) Busca-se, desta forma, desconstruir as vulnerabilidades, estigmas e violências sofridas pelos usuários do Programa, sendo que todas as ações devem ser pautadas na promoção social do individuo. O PrEsp tem como objetivo geral incluir seus usuários e familiares na sociedade, distanciado-os das condições que possam vir a causar a reincidência criminal, o programa objetiva ir além das condições legais do usuário, apesar de ele ter que seguir mínimas condições postas pela lei. De acordo com a LEP, aassistência ao egresso consiste em: Art 25. A assistência ao egresso consiste: I – na orientação e apoio para reintegrá-lo à vida em liberdade; II – na concessão, se necessário, de alojamento e alimentação, em estabelecimento adequado, pelo prazo de 2 (dois) meses; Parágrafo único. O prazo estabelecido no inciso II poderá ser prorrogado uma única vez, comprovado, por declaração do assistente social, o empenho na obtenção de emprego. (BRASIL, 1984, p.26 ) Em relação aos objetivos específicos do Programa, Leite (2009, p. 170) Expõe: - Ampliar as condições para o conhecimento e acesso do público aos direitos previstos na Lei de Execuções Penais; - Viabilizar o acesso aos direitos sociais para potencializar condições de cidadania; - Reduzir fatores estigmatizantes; - Apresentar alternativas descriminalizatórias de cumprimento de condicionalidades impostas pelo sistema penal; - Contribuir no fortalecimento de aspectos subjetivos dos usuários com vistas a diminuir os efeitos da prisionização; 34 - Contribuir na ressignificação de processos históricos e so- cioculturais de opressão. A fim de alcançar seus objetivos, o programa disponibiliza uma equipe multiprofissional, sendo eles: advogado, assistente social e psicólogo, os quais são denominados técnicos sociais. As ações do Programa são desenvolvidas em localidades que pode haver outros programas que também foram implantados pelo Instituto Elo. Caso haja mais de um NPC instalado na mesma cidade serão sempre PrEsp com Central de Apoio as Penas e Medidas Alternativas (CEAPA); e o Programa Fica Vivo com o Mediação de Conflitos. Leite (2009), explica a condição do PrEsp como possibilidade de equipamento público, caso não haja Casas de Albergados nas comarcas. Assim, os juízes das Varas de Execuções Criminais podem determinar que o sentenciado fique em condição de regime aberto e cumpra a pena em prisão domiciliar. O PrEsp recebe esse público, através de determinação judicial ou demanda espontânea, em vários municípios, porém tem como objetivo desenvolver acompanhamentos diferenciados junto ao Núcleo de Prevenção à Criminalidade. Leite (2009) especifica a metodologia do programa, as ações desenvolvidas são o acolhimento, que é realizado pelo técnico social no primeiro atendimento, sendo que o programa entende este como a forma de estabelecer vínculos do usuário com a equipe do programa. A postura que o técnico deve assumir neste acolhimento é a de se dispor ao diálogo, a fim de compreender em qual contexto social o sujeito está inserido e quais suas demandas; orientação aos direitos sociais básicos, aqui o profissional busca esclarecer as dúvidas do egresso e informar seus direitos básicos; acesso à educação, ela deve ser usada a fim de potencializar a consciência critica do ser humano, o programa busca provocar o interesse do egresso aos estudos; remição de pena por estudos, assim como o trabalho, um instrumento utilizado para ressocializar o individuo e construir valores, a LEP em seu artigo 126 preconiza que a cada 3 dias de trabalho, dentro do sistema prisional, 1 reclusão é remitido, essa determinação deve ser feita pelo juiz na execução, desta mesma forma, o egresso pode reduzir sua pena através dos estudos; formação profissionalizantes, o PrEsp trabalha em rede com instituições afim de possibilitar cursos gratuitos ao egressos; empregabilidade, o programa 35 estabelece vínculos com instituições que informam sobre as vagas existentes, devendo assim o técnico social informar e encaminhar o egresso; trabalhos em grupos; o programa desenvolve atividades grupais afim de possibilitar reflexões quanto a diversos temas presentes na sociedade, buscando potencializar o senso crítico e reflexivo do egresso O programa busca como estratégias fortalecer o trabalho em rede, e para isso, são constantes os encaminhamentos feitos para a defensoria pública, clínicas de tratamentos para dependentes de drogas psicoativas, regulamentação dos documentos, saúde, educação e vagas de trabalho. O PrEsp separa os atendimentos entre inscritos e incluídos, o primeiro são aqueles que estão iniciando no programa através de encaminhamentos ou procura espontânea, já o segundo são os que já estão aderidos ao PrEsp ha algum tempo, participando dos grupos e que já receberam vários encaminhamentos. Leite (2009), traz os números de incluídos ao programa de 2003 à 2009, separados por município: Leite (2009,p. 200) O Programa de Inserção Social do Egresso do Sistema Prisional foi implantado em 2006 em Uberaba, atende atualmente cerca de 400 egressos estando entre prisão domiciliar e livramento condicional e são encaminhados cerca de 20 primeiros atendimentos por mês da Vara de Execução Criminal - VEC. 36 No PrEsp realiza-se grupos reflexivos uma vez por mês, convidando todos os usuários do programa, sendo que a participação é voluntária. Os temas abordados são postos de forma a potencializar um conhecimento crítico e reflexivo ao participante. Eles variam entre: trabalho; preconceito; autoestima; família; drogadição; informações sobre direito. Podendo ser convidados para serem palestrantes dos grupos: alguns dos técnicos sociais; professores de universidades; defensores públicos e até mesmo usuários do programa que tenha um exemplo de vida que esteja disposto a socializar com os amigos. São realizadas duas festas anualmente, a festa junina, na qual os usuários são convidados juntamente com os seus familiares e a festa natalina que estes também são convidados. Toda a equipe do Instituto Elo de Uberaba participa das festas, sendo que no natal são arrecadados presentes para as crianças das famílias dos egressos. O programa desenvolveu fluxogramas dos atendimentos, que foram separadas por egressos em livramento definitivo, egressos em livramento condicional e prisão domiciliar, conforme se vê a seguir: Excluído: ¶ 37 De acordo com o fluxograma os atendimentos do egresso em livramento definitivo se dão mediante a demanda espontânea, caso a pessoa que sofreu privação de liberdade e tiver cumprido a pena e quiser ser acompanhado pelo programa por livre espontânea vontade é permitido, neste caso o egresso chega através de um encaminhamento e a equipe do PrEsp faz o acolhimento e o levantamento das necessidades do egresso, porém esta demanda é rara. Abaixo, como é possível observar, o egresso que deve cumprir a pena de livramento condicional é encaminhado pela Vara de Execução Criminal (VEC) e deve assinar no Programa periodicamente, de três em três meses. 38 3. – A PESQUISA 3.1 – Metodologia O presente capítulo constitui-se na apresentação e interpretação dos dados obtidos ao longo da pesquisa. Primeiramente será retomada de maneira breve a operacionalização dos procedimentos metodológicos utilizados para coleta de dados. Trata-se de uma pesquisa quanti-qualitativa, exploratória, documental. A pesquisa exploratória objetiva desenvolver, esclarecer e modificar conceitos e ideias. Para tal, o investigador deve realizar a revisão de literatura baseada em livros, artigos científicos, filmes e revistas, a fim de aperfeiçoar o senso crítico e obter maior acúmulo teórico-metodológico. Assim, a revisão de literatura permite maior cobertura de fenômenos do que aquela pesquisa diretamente (GIL, 2009). O campo desta pesquisa foi no Núcleo de Prevenção à Criminalidade (NPC) no município de Uberaba e serviu como amostra da realidade do egresso do SistemaPrisional de Uberaba. Minas Gerais. Neste Núcleo atuam dois programas: o Presp e o CEAPA, sendo que o NPC tem compromisso de exercer a política de prevenção social à criminalidade da Secretaria de Estado de Defesa Social (SEDS) em parceria com o Instituto Elo. Este espaço foi escolhido por ser a única instituição de Uberaba aberta para atender as demandas dos egressos a fim de reinserirem na sociedade. Dos programas existentes no NPC, o PrEsp constituiu-se foco desta pesquisa. As obrigações legais dos egressos são de passar pelo preenchimento de um formulário no primeiro atendimento feito pelo PrEsp, sendo que eles devem cumprir legalmente a condição de assinarem um livro, o qual fica no Programa, mensalmente quando estiverem em Regime Aberto, e trimestralmente quando estiverem em Livramento Condicional como uma progressão de regime assumido com a Vara de Execução Criminal juntamente com o PrEsp. Foram analisados os formulários preenchidos dos primeiros atendimentos feitos no PrEsp dos sujeitos desta pesquisa, visando obter dados 39 que permitiu identificar o perfil dos egressos que foram entrevistados e que constituíram amostra deste estudo. A proposta inicial era de entrevistar os egressos que começaram a participar do programa no mês de novembro de 2012, mas não foi possível, pois alguns já não eram mais integrantes do programa e entre os que permaneciam, alguns não aceitaram participar da entrevista e outros não se conseguiu estabelecer o contato. Assim, a seleção dos sujeitos foi feita mediante consulta aos egressos que compareceram ao PrEsp no dia em que a pesquisadora permaneceu no Núcleo para realização das entrevistas. Foram selecionados seis sujeitos, os quais receberam esclarecimentos sobre os objetivos da pesquisa e concordaram em participar da mesma, assinando o Termo de Consentimento livre e esclarecido (apêndice 1). Foram realizadas entrevistas semi-estruturas (apêndice 2), com a utilização de um gravador para o registro das informações com maior precisão. Posteriormente as entrevistas foram transcritas, e analisadas através da analise de conteúdos. Os trechos das entrevistas apresentados neste estudo são identificados com nomes fictícios, visando preservar a identidade dos sujeitos, conforme prevê a Resolução 196/96. A observação foi uma atividade fundamental no conjunto da investigação. Da analise do material coletado, emergiram as seguintes categorias empíricas: o preconceito, a dificuldade para conseguir entrar para o mercado de trabalho, a dificuldade para se relacionar entre grupos sociais. O Materialismo histórico dialético foi o referencial teórico utilizado para analise da pesquisa, a fim de alcançar a criticidade quanto a inserção social do egresso do sistema prisional, a partir dos dados coletados para analise dos condicionantes sociais para a sua inclusão. As variáveis quantitativas foram analisadas por meio de estatística descritiva, com dados absolutos e relativos, com auxílio do software Excel. Os resultados foram agrupados e apresentados sob a forma de gráficos. As variáveis qualitativas foram analisadas através do método por análise temática das entrevistas, seguindo as seguintes etapas: ordenação, classificação e 40 análise final (MINAYO, 1998). Após, ocorreu a releitura incessante de todo o material a fim de encontrar as convergências/divergências nas falas dos egressos para classificarmos as falas por eixo temático. 3.2 ANALISE DE DADOS A coleta de dados foi realizada no mês de janeiro de 2014, sendo o perfil do usuário atendido pelo PrEsp constituído a partir do levantamento das informações dos formulários, do Programa de Inclusão Social do Egresso do Sistema Prisional (PrEsp) de Uberaba. Esses formulários são preenchidos no momento que o egresso do sistema prisional está sendo inserido ao programa. Para constituição do perfil foram selecionados os itens: sexo, grau de instrução, situação profissional, filhos, renda familiar, tempo de reclusão e antecedentes criminais. Figura 1 _ Dados sobre a distribuição quando ao sexo: Fonte: Documentos internos PrEsp. Gráfico elaborado pela autora Na totalidade dos entrevistados, foram cinco do sexo masculino e um do sexo feminino. Este dado afirma a realidade quando ao número inferior de mulheres que são atendidas pelo PrEsp perto à quantidade dos homens atendidos. 41 É fundamental refletir sobre este dado, pois de seis entrevistados somente um era do sexo feminino, indicando uma prevalência do sexo masculino entre as pessoas que cumprem pena privativa de liberdade. Figura 2_ Dados sobre a distribuição quando ao grau de instrução: Fonte: Documentos internos PrEsp. Gráfico elaborado pela autora Sobre os dados da escolaridade, verifica-se que a maioria dos egressos abandonaram a escola antes de completarem o ensino médio, um dos entrevistados evadiu da escola antes de terminar o ensino fundamental, e um completou o ensino fundamental. É importante ressaltar que a educação é o melhor caminho para potencializar a consciencia crítica do indivíduo. Leite (2009) afirma que a baixa escolaridade é uma realidade descriminatória, presente na vida do sujeito em privação de liberdade, e isso se torna um agravante para sua inserção na sociedade. 42 A educação deve ser dialogal, pois somente agregando histórias poderá estabelecer interação de aprendizagem entre os sujeitos, principalmente entre aqueles já adultos, marcados em sua trajetória por violências e privações. (LEITE, 2009, p.176) Figura 3 _ Dados sobre a distribuição quando à situação profissional: Fonte: Documentos internos PrEsp. Gráfico elaborado pela autora Os dados coletados sobre a inserção no mercado de trabalho foram que cinco deles estavam inseridos no mercado de trabalho no momento em que foram atendidos pelo programa pela primeira vez e apenas um não estava. Ressalva-se que em sua totalidade nenhum dos entrevistados estava trabalhando com carteira assinada ao saírem do Sistema Prisional. O pedido de antecedentes criminais, documento exigido para inserção no mercado de trabalho, é a materialização do preconceito presente nas grandes empresas, ao se negarem a contratar uma pessoa que tenha passado pelo sistema prisional. Este fato apresenta-se como empecilho para o egresso que ao sair do sistema prisional deseja ter uma vida digna, com trabalho fixo e registrado para sustentar sua família. Ao encontrar as portas fechadas, pode ter como alternativa a reincidência criminal. 43 Devido a esta questão foi possível verificar nas entrevistas que o preconceito está enraizado no convívio social dos entrevistados. A maioria das empresas pedem os antecedentes criminais para admitir um funcionário, inviabilizando qualquer chance ao egresso, que queria trabalhar para alcançar os mínimos necessários para uma vida em paz. [...] qualquer loja que você pode ir hoje, procurar um serviço hoje, eles te pedem o antecedente criminal, aí já barra, você não faz nada, se não for tipo um caso dos convenio que tem na penitenciaria numas firmas lá pra você continuar trabalhando, mas só que eles não dão valor pra gente, eles quer às vezes continuar com aquele mesmo salário que tá lá, que ta pagando a gente entendeu? Que é meio salário mínimo que era, aí eles querem continuar com aquele salário. Eu acho no meu pensamento que é abusar do negocio, então se você for arrumar um serviço lá no Bretas, qualquer lugar “ah seus antecedentes criminais”, ai já não faz nada, já não faz. É difícil [...] mas aquele que realmente tá no crime, às vezes podia recuperar com os incentivos e não tem os incentivos. (João) Como é perceptívelna fala do João, tratar da inserção social do egresso do sistema prisional, na sociedade contemporânea é quase como uma utopia. Barros (2012) relata que a reinserção seria o que diz respeito à volta ao convívio social, mas convém refletir em qual convívio social. Esse grupo de pessoas que é reprimido e menosprezado, por não seguir o padrão da normalidade determinada pela sociedade capitalista, nunca estiver na verdade inserido na sociedade. Verifica-se que essa reinserção social não é simples, pois: A reintegração na sociedade do sentenciado significa, portanto, antes de tudo, corrigir as condições de exclusão social desses setores, para que conduzi-los a uma vida pós-penitenciária não signifique, simplesmente, como quase sempre acontece, o regresso à reincidência criminal, ou à marginalização secundária e, a partir daí, uma vez mais, à volta à prisão. (BARATTA, 2004 p.3 apud BARROS, 2012, p. 63-64). Reintegrar seria inserir as pessoas na sociedade, conduzi-las as novas condições intelectuais, sociais e culturais de forma a potencializar a autonomia e suas competências profissionais. O que Barros (2012) critica é que seria necessário que houvesse um mundo do trabalho livre, de forma que viabilizasse o desenvolvimento pessoal e coletivo, que fosse democrático e acolhesse sem restrições. Para que houvesse a reintegração do condenado, seria necessário ter condições que modificasse seu mundo de isolamento, e ainda transformasse a 44 sociedade, a fim de assumir a sua parte de responsabilidade nos problemas que são separados nas prisões. Barros (2012) afirma que foi criado um fetiche que ao colocar o “criminoso” na prisão ficariam todos em segurança. Logo, não o veriam mais, e estariam protegidos já que “todos estão presos”. Ocorre uma maquiagem da sociedade real. Os loucos vão para o manicômio, os velhos para os asilos e os criminosos para o presídio. Mas o que ocorre na vida real é que os condenados sofrem efeitos do encarceramento, que um dia deixarão marcas no mundo livre, reflexo do que sofreram naquele lugar. Logo, as prisões reproduzem, em seus intramuros, efeitos que intensificarão os atos “criminosos”, quando em liberdade acabam reincidindo à criminalidade. A fim de promover essa “recuperação”, o trabalho torna-se fundamental para seu reconhecimento, principalmente para egresso do sistema prisional. É o espaço crucial para recuperar o que estaria como um inútil para o mundo, fora das normas estabelecidas socialmente e fora da lei. O trabalho seria, sim, uma forma de inclusão do egresso, caso esse trabalho proporcionasse respeito, valorização e reconhecimento que garantisse condições decentes de existência do sujeito. Caso fosse um espaço de aprendizagem e de desenvolvimento humano. Figura 4 _ Dados sobre a distribuição quando aos filhos: Fonte: Documentos internos PrEsp. Gráfico elaborado pela autora 45 Sobre os dados referentes aos filhos, cinco dos entrevistados tinham filhos, quando foram preenchidos os formulários do primeiro atendimento, e apenas um sujeito não tinha filhos. Figura 5 - Dados sobre a distribuição quando à renda familiar: Fonte: Documentos internos PrEsp. Gráfico elaborado pela autora Quanto à renda familiar, foi analisado que dois dos sujeitos recebiam uma quantia inferior a um salário mínimo para toda família, sendo que três deles recebiam entre um e dois salários mínimos, e apenas um sujeito a renda familiar era entre dois e três salários mínimos, isso quando preencheram o formulário de primeiro atendimento. Pereira T. (2012) ressalta que os presos não têm consciência da hierarquia que estão inseridos, que existem os “chefes dos chefes dos chefes” da pessoa que está em privação de liberdade. Quem vai preso, são os que estão lá na base da pirâmide. Logo em sua maioria, são aqueles que têm a renda mínima. 46 Figura 6 - Dados sobre a distribuição quando ao tipo de críme cometido: Fonte: Documentos internos PrEsp. Gráfico elaborado pela autora Os dados obtidos nesta especificidade foram um sujeito que cometeu extorção mediante sequestro, dois de tráfico ilícito de drogras, dois de roubo e um de assassinato. É importante ressaltar que este dado não tem por finalidade julgar o tipo de crime que o egresso cometeu, mas traz um dado de que a maioria dos que foram presos é devido a algum tipo de roubo e ao tráfico ilícito de drogas. Tais dados coinscidem com outros estudos realizados: Vamos ver que a maioria é considerada perigosa, está presa por tráfico ou pequenos assaltos de rua, ou seja, crimes por uma bagatela: dez sacolas de cocaína e alguns poucos baseados. (PEREIRA, 2012, p. 98) Em seus estudos, a referida autora ressalta que a maioria de sujeitos que estão presos por uma “bagatela”, passaram entre três a quatro anos no sistema prisional. Ela sugere que, nesse caso, sejam aplicadas penas alternativas, e não penas de privação de liberdade. 47 É de suma importância compreender que a sociedade vigente sustenta a manutenção de uma vitrine civilizada, onde se quer ocultar a realidade de exploração e violência, mas na qual, na verdade cria-se uma dicotomia de “nós versus eles”, a que causa uma sensação de neutralidade e descompromisso com o outro. Figura 7 - Dados sobre a distribuição quando ao tempo de reclusão: Fonte: Documentos internos PrEsp. Gráfico elaborado pela autora Os dados quanto ao tempo que os entrevistados passaram em privação de liberdade mostram que dois sujeitos ficaram menos de um ano em reclusão, um ficou entre um a dois anos, dois de dois a três anos e um mais que três anos em privação de liberdade. Este dado serve apenas para reflexão crítica sobre o porque dos sujeitos ficarem presos por um tempo inferior a 3 anos? Como já cidado acima, Pereira (2012) reflete, porque não transformar as penas de privação de liberdade em pena restritiva de direitos, como penas alternativas. 48 Figura 8 - Dados sobre a distribuição quando aos antecedentes criminais: Fonte: Documentos internos PrEsp. Gráfico elaborado pela autora Os dados coletados sobre os antecedentes criminais retrataram que dois sujeitos já haviam cometido algum tipo de delito anteriormente ao cumprimento da pena que eles tinham acabado de cumprir, três deles não tinham cometido crime algum, ate então. Não foi possível coletar estes dados na sua totalidade, pois os formulários que são preenchidas pelos técnicos do programa, analisados para analise quantitativa desta pesquisa, já havia sofrido muitas mudanças e um deles não havia esta pergunta. O objetivo do PrEsp é diminuir a reincidencia criminal, mas até que ponto isso depende somente deste programa? Para que chegasse a este ponto, Barros (2012) discutiu que seria necessária a integração entre os programas sociais pertencentes à política pública e ainda a criação de novos programas de atenção ao preso, ao egresso e seus familiares, onde o foco principal fosse o acesso aos bens culturais e não o crime em si. Contudo, a sociedade contemporânea é intolerante, coercitiva, repressiva, punitiva, criminalizadora e prisional. Ela pune o sujeito que ela mesma criou, fruto da desigualdade pertencente ao sistema vigente. Segundo 49 Barros (2012, p.75) “Uma sociedade que não necessita de prisões certamente será uma sociedade melhor, com pessoas melhores.” Para análise do material coletado nas entrevistas, foram consideradas as falas dos entrevistados e a observação do comportamento dos egressos durante a gravação das entrevistas. As entrevistas foram realizadas nas salas onde são prestados os atendimentos pelos técnicos sociais aos usuários do