Prévia do material em texto
2013 Pedagogia da educação infantil Prof.ª Cristina Danna Steuck Prof.ª Lúcia Cristiane Moratelli Pianezzer Copyright © UNIASSELVI 2013 Elaboração: Prof.ª Cristina Danna Steuck Prof.ª Lúcia Cristiane Moratelli Pianezzer Revisão, Diagramação e Produção: Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri UNIASSELVI – Indaial. 373.2 S842p Steuck, Cristina Danna Pedagogia da educação infantil / Cristina Danna Steuck; Lúcia Cristiane Moratelli Pianezzer. Indaial : Uniasselvi, 2013. 279 p. : il ISBN 978-85-7830- 661-8 1.Educação infantil. 2. Pedagogia. I. Centro Universitário Leonardo da Vinci. III aPresentação Falar da Educação Infantil normalmente nos emociona. Em primeiro lugar pela responsabilidade que temos nas mãos, em seguida, pela dedicação e paciência que se fazem necessárias no convívio com crianças tão lindas, frágeis e pequenas. Por fim, nos emociona pela paixão que subitamente nasce no peito quando olhamos nos olhos de uma criança. Trabalhar com a Educação Infantil é simplesmente maravilhoso! Isso não quer dizer que seja fácil... Normalmente não é, justamente pela dedicação exigida do profissional que lida com esta faixa etária para o desenvolvimento e aprendizagem saudável dos educandos, em todos os aspectos. Ao folhear, ler e estudar este caderno, você encontrará materiais que poderão servir de suporte ou embasamento teórico para suas ações, enquanto educador. Você poderá, inclusive, refletir sobre o cotidiano das instituições de Educação Infantil e valer-se de uma série de dicas a fim de enriquecer sua prática pedagógica. Para tanto, dividimos o caderno em três unidades de estudo. Na Unidade 1, nosso foco se voltará às teorias defendidas por importantes teóricos, e faremos uma síntese sobre o papel da escola (Instituição de Educação Infantil) e do professor dentro de cada uma das teorias. Já na Unidade 2, abordaremos as questões que envolvem o espaço físico, a rotina e o tempo na Educação Infantil. Além disso, conheceremos como se dá o planejamento por parte do educador e como ele trabalha a construção da autonomia e da identidade nas crianças, apoiados nos eixos norteadores da Educação Infantil. Por fim, na Unidade 3, a nossa atenção se voltará sobre as múltiplas linguagens na abordagem de Reggio Emília, a importância da afetividade e das interações na Educação Infantil e o desenvolvimento de trabalhos por meio da pedagogia de projetos, uma “nova” perspectiva na arte de ensinar e aprender. Vale a pena conhecer cada detalhe desta pedagogia que envolve as áreas do conhecimento e a comunidade escolar, numa teia de conhecimentos gerada a partir do interesse das crianças. Ainda nesta unidade serão abordadas questões pertinentes à avaliação e ao registro. Por meio do estudo dos temas explanados neste caderno, pretendemos conduzi-lo(a) na construção de conhecimentos e na busca incessante do “saber”, acompanhado do “saber fazer”. Que nossas discussões teórico- práticas ajudem você na compreensão do universo infantil. IV Você já me conhece das outras disciplinas? Não? É calouro? Enfim, tanto para você que está chegando agora à UNIASSELVI quanto para você que já é veterano, há novidades em nosso material. Na Educação a Distância, o livro impresso, entregue a todos os acadêmicos desde 2005, é o material base da disciplina. A partir de 2017, nossos livros estão de visual novo, com um formato mais prático, que cabe na bolsa e facilita a leitura. O conteúdo continua na íntegra, mas a estrutura interna foi aperfeiçoada com nova diagramação no texto, aproveitando ao máximo o espaço da página, o que também contribui para diminuir a extração de árvores para produção de folhas de papel, por exemplo. Assim, a UNIASSELVI, preocupando-se com o impacto de nossas ações sobre o ambiente, apresenta também este livro no formato digital. Assim, você, acadêmico, tem a possibilidade de estudá-lo com versatilidade nas telas do celular, tablet ou computador. Eu mesmo, UNI, ganhei um novo layout, você me verá frequentemente e surgirei para apresentar dicas de vídeos e outras fontes de conhecimento que complementam o assunto em questão. Todos esses ajustes foram pensados a partir de relatos que recebemos nas pesquisas institucionais sobre os materiais impressos, para que você, nossa maior prioridade, possa continuar seus estudos com um material de qualidade. Aproveito o momento para convidá-lo para um bate-papo sobre o Exame Nacional de Desempenho de Estudantes – ENADE. Bons estudos! Esperamos que você se sinta motivado(a) a ir além dos escritos deste caderno, participando ativamente de todo o seu processo de ensino e aprendizagem, por meio de outras ferramentas de apoio como o Ambiente Virtual de Aprendizagem (AVA), trilhas de aprendizagens, fórum, enquete, materiais de apoio... Enfim, sinta-se acompanhado(a) e aplaudido(a) durante toda sua caminhada nesta Instituição. Bons estudos e profundas reflexões!!! Prof.ª Cristina Danna Steuck Prof.ª Lúcia Cristiane Moratelli Pianezzer NOTA V VI VII UNIDADE 1 – AS PRINCIPAIS CONCEPÇÕES TEÓRICAS DA EDUCAÇÃO INFANTIL: RELAÇÃO TEÓRICO-PRÁTICA .................................................... 1 TÓPICO 1 – A PEDAGOGIA WALDORF ....................................................................................... 3 1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................................. 3 2 RUDOLF STEINER (1861-1925) ...................................................................................................... 3 3 A PEDAGOGIA WALDORF ........................................................................................................... 5 4 METODOLOGIA .............................................................................................................................. 12 5 PAPEL DO PROFESSOR NA ESCOLA WALDORF .................................................................. 15 RESUMO DO TÓPICO 1 .................................................................................................................... 17 AUTOATIVIDADE ............................................................................................................................. 19 TÓPICO 2 – A PEDAGOGIA MONTESSORI ............................................................................... 21 1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................................. 21 2 MARIA MONTESSORI (1870-1952) .............................................................................................. 22 3 CASE DEI BAMBINI (Casa das Crianças) ................................................................................... 25 4 METODOLOGIA .............................................................................................................................. 27 5 PAPEL DO PROFESSOR NA EDUCAÇÃO MONTESSORI ................................................... 33 RESUMO DO TÓPICO 2 .................................................................................................................... 36 AUTOATIVIDADE ............................................................................................................................. 37 TÓPICO 3 – A PEDAGOGIA FREINET .......................................................................................... 39 1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................................. 39 2 CÉLESTIN FREINET (1886-1966) ...................................................................................................40 3 A PEDAGOGIA FREINET .............................................................................................................. 42 4 METODOLOGIA .............................................................................................................................. 48 5 PAPEL DO PROFESSOR NA PEDAGOGIA FREINET ............................................................ 55 RESUMO DO TÓPICO 3 .................................................................................................................... 60 AUTOATIVIDADE ............................................................................................................................. 62 TÓPICO 4 – O CONSTRUTIVISMO DE PIAGET ....................................................................... 63 1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................................. 63 2 JEAN WILLIAM FRITZ PIAGET (1896-1980) .............................................................................. 63 3 A TEORIA CONSTRUTIVISTA DE PIAGET ............................................................................. 67 4 O PAPEL DA ESCOLA E DO PROFESSOR PARA PIAGET ................................................... 74 RESUMO DO TÓPICO 4 .................................................................................................................... 78 AUTOATIVIDADE ............................................................................................................................. 79 TÓPICO 5 – O SOCIOINTERACIONISMO DE VYGOTSKY ................................................... 81 1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................................. 81 2 LEV SEMYNOVITCH VYGOTSKY (1896-1934) ......................................................................... 81 3 A TEORIA SOCIOINTERACIONISTA DE VYGOTSKY ........................................................ 85 4 O PAPEL DA ESCOLA E DO PROFESSOR PARA VYGOTSKY ............................................ 93 LEITURA COMPLEMENTAR ........................................................................................................... 95 sumário VIII RESUMO DO TÓPICO 5 .................................................................................................................... 98 AUTOATIVIDADE ............................................................................................................................. 100 UNIDADE 2 – DIVERSOS CONTEXTOS DA EDUCAÇÃO INFANTIL: ORGANIZAÇÃO DO TEMPO E DOS ESPAÇOS ............................................. 101 TÓPICO 1 – ORGANIZAÇÃO DO ESPAÇO FÍSICO E DOS AMBIENTES FACILITADORES NA EDUCAÇÃO INFANTIL .................................................... 103 1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................................. 103 2 ORGANIZAÇÃO DOS ESPAÇOS PARA CRIANÇAS DE 0 A 1 ANO DE IDADE .......................................................................................................................................... 103 2.1 SALA DE REPOUSO ................................................................................................................... 104 2.2 SALA DE ATIVIDADES .............................................................................................................. 105 2.3 FRALDÁRIO ................................................................................................................................. 109 2.4 LACTÁRIO ................................................................................................................................... 110 2.5 SOLÁRIO ...................................................................................................................................... 111 3 ORGANIZAÇÃO DOS ESPAÇOS PARA CRIANÇAS DE 1 A 6 ANOS ............................... 111 3.1 SALA DE ATIVIDADES .............................................................................................................. 113 3.2 SALA MULTIÚSO/BRINQUEDOTECA .................................................................................... 121 3.3 REFEITÓRIO .................................................................................................................................. 121 3.4 BANHEIROS .................................................................................................................................. 122 3.5 PÁTIO COBERTO ......................................................................................................................... 123 3.6 ÁREA EXTERNA .......................................................................................................................... 123 RESUMO DO TÓPICO 1 .................................................................................................................... 125 AUTOATIVIDADE ............................................................................................................................. 126 TÓPICO 2 – A ORGANIZAÇÃO DA ROTINA E O PLANEJAMENTO NA EDUCAÇÃO INFANTIL ............................................................................................ 127 1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................................. 127 2 A ORGANIZAÇÃO DO TEMPO E DA ROTINA ...................................................................... 128 3 ROTINA E PLANEJAMENTO: O PAPEL DO PROFESSOR ................................................... 133 LEITURA COMPLEMENTAR ........................................................................................................... 148 RESUMO DO TÓPICO 2 .................................................................................................................... 151 AUTOATIVIDADE ............................................................................................................................. 152 TÓPICO 3 – A CONSTRUÇÃO DA AUTONOMIA E DA IDENTIDADE DA CRIANÇA ....................................................................................................................... 153 1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................................. 153 2 O DESENVOLVIMENTO DA INDEPENDÊNCIA NA APRENDIZAGEM ......................... 154 3 A PEDAGOGIA DA AUTONOMIA, SEGUNDO PAULO FREIRE ....................................... 157 4 A CONSTRUÇÃO DA IDENTIDADE ......................................................................................... 167 RESUMO DO TÓPICO 3 .................................................................................................................... 171 AUTOATIVIDADE ............................................................................................................................. 173 TÓPICO 4 – OS EIXOS NORTEADORES DA EDUCAÇÃO INFANTIL: INTERAÇÃO, BRINCADEIRA E APRENDIZAGEM ........................................... 175 1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................................. 175 2 BRINCADEIRAS E JOGOS INFANTIS ........................................................................................ 176 3 MÚSICA E ARTES VISUAIS ......................................................................................................... 180 4 LINGUAGEM ORAL E ESCRITA ................................................................................................. 182 5 NATUREZA E SOCIEDADE ..........................................................................................................184 IX 6 EDUCAÇÃO E SAÚDE .................................................................................................................... 187 7 MATEMÁTICA ................................................................................................................................. 190 RESUMO DO TÓPICO 4 .................................................................................................................... 193 AUTOATIVIDADE ............................................................................................................................. 195 UNIDADE 3 – AÇÃO E INTERAÇÃO PEDAGÓGICA NA EDUCAÇÃO INFANTIL ......... 197 TÓPICO 1 – A CRIANÇA E AS MÚLTIPLAS LINGUAGENS .................................................. 199 1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................................. 199 2 A ABORDAGEM DE REGGIO EMÍLIA NA EDUCAÇÃO DA PRIMEIRA INFÂNCIA ......................................................................................................................................... 200 3 APRENDER E ENSINAR NA EDUCAÇÃO INFANTIL ........................................................... 205 RESUMO DO TÓPICO 1 .................................................................................................................... 212 AUTOATIVIDADE ............................................................................................................................. 214 TÓPICO 2 – A IMPORTÂNCIA DA AFETIVIDADE E DAS INTERAÇÕES NA EDUCAÇÃO INFANTIL ............................................................................................. 215 1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................................. 215 2 RELAÇÕES DE AFETIVIDADE NAS INTERAÇÕES DO DIA A DIA ................................. 216 3 PAIS E EDUCADORES: UMA IMPORTANTE PARCERIA NA EDUCAÇÃO DAS CRIANÇAS .............................................................................................................................. 223 4 OS QUATRO PILARES DA EDUCAÇÃO ................................................................................... 227 RESUMO DO TÓPICO 2 .................................................................................................................... 230 AUTOATIVIDADE .............................................................................................................................. 232 TÓPICO 3 – PROJETOS PEDAGÓGICOS NA EDUCAÇÃO INFANTIL ............................... 235 1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................................. 235 2 A PEDAGOGIA DE PROJETOS .................................................................................................... 236 3 O PROFESSOR NA PEDAGOGIA DE PROJETOS ................................................................... 242 4 AS CRIANÇAS E O GRUPO NA PEDAGOGIA DE PROJETOS ........................................... 244 5 AS FAMÍLIAS E A COMUNIDADE NESTA PEDAGOGIA ................................................... 246 RESUMO DO TÓPICO 3 .................................................................................................................... 247 AUTOATIVIDADE ............................................................................................................................. 248 TÓPICO 4 – AVALIAÇÃO E REGISTRO NA EDUCAÇÃO INFANTIL .................................. 249 1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................................. 249 2 A AVALIAÇÃO NA EDUCAÇÃO INFANTIL: CRIANDO ALTERNATIVAS QUE RESPEITEM A DIVERSIDADE ........................................................................................... 249 3 OBSERVAÇÃO, REGISTRO E AVALIAÇÃO FORMATIVA ................................................... 255 4 POR QUE E PARA QUE REGISTRAR? ........................................................................................ 257 4.1 PORTFÓLIO ................................................................................................................................. 260 4.2 DOSSIÊ .......................................................................................................................................... 261 4.3 ARQUIVO BIOGRÁFICO ........................................................................................................... 262 LEITURA COMPLEMENTAR ........................................................................................................... 264 RESUMO DO TÓPICO 4 .................................................................................................................... 266 AUTOATIVIDADE ............................................................................................................................. 268 REFERÊNCIAS .................................................................................................................................... 271 X 1 UNIDADE 1 AS PRINCIPAIS CONCEPÇÕES TEÓRICAS DA EDUCAÇÃO INFANTIL: RELAÇÃO TEÓRICO-PRÁTICA OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM PLANO DE ESTUDOS A partir desta unidade, você será capaz de: • conhecer os principais teóricos da Educação Infantil; • diferenciar as metodologias e concepções de cada teórico; • compreender o papel do professor e da escola dentro de cada concepção; • estabelecer relações entre as concepções teórico-pedagógicas; • relacionar as diferentes concepções com a prática diária da Educação In- fantil. Esta unidade está dividida em cinco tópicos. Em cada um deles, você encontrará atividades que o(a) ajudarão a compreender e fixar os conhecimentos adquiridos. TÓPICO 1 – A PEDAGOGIA WALDORF TÓPICO 2 – A PEDAGOGIA MONTESSORI TÓPICO 3 – A PEDAGOGIA FREINET TÓPICO 4 – O CONSTRUTIVISMO DE PIAGET TÓPICO 5 – O SOCIOINTERACIONISMO DE VYGOTSKY 2 3 TÓPICO 1 UNIDADE 1 A PEDAGOGIA WALDORF 1 INTRODUÇÃO 2 RUDOLF STEINER (1861-1925) Não há, basicamente, em nenhum nível, uma educação que não seja a autoeducação [...] Toda educação é autoeducação e nós, como professores e educadores, somos, em realidade, apenas o ambiente da criança educando-se a si própria. Devemos criar o mais propício ambiente para que a criança eduque-se junto a nós, da maneira como ela precisa educar-se por meio de seu destino interior (STEINER, 2000 [palestra proferida em 1923]). Vamos iniciar nossa caminhada conhecendo o teórico Rudolf Steiner? Você já ouviu falar nele ou nas escolas Waldorf? Sabe qual teoria ele desenvolveu e qual foi sua contribuição para a Educação Infantil? A Pedagogia Waldorf, criada por Steiner, tem como base a sua teoria do desenvolvimento humano: a antroposofia. Esta pedagogia não exige do aluno o pensamento abstrato, a não ser no Ensino Médio, e se desenvolve levando em consideração a fase em que as crianças se encontram. Pode ser considerada uma pedagogia holística, pois valoriza o desenvolvimento físico, etéreo e astral. E então, ficou curioso(a) para desvendar as características da Pedagogia Waldorf? Vamos lá! Para compreendermos a Pedagogia Waldorf, primeiramente estudaremos sobre a vida de Rudolf Steiner, tendo por base os textos de Trevisan (2006) e Canelada (2011). UNIDADE 1 | AS PRINCIPAIS CONCEPÇÕES TEÓRICAS DA EDUCAÇÃO INFANTIL: RELAÇÃO TEÓRICO-PRÁTICA 4 FIGURA 1 – RUDOLF STEINER FONTE: Disponível em: <http://norfleet1941.tripod.com/rudolf_ steiner.htm> Acesso em: 15 maio 2012. Steiner nasceu em 27 de fevereiro de 1861, na cidade de Kraljevec, na Áustria. Morou até os oito anos de idade na cidade de Pottschach, na Áustria, onde foi educadopelo pai, devido a um desentendimento com o professor. Foi o primeiro dos três filhos do casal que levava uma vida simples. Morava num edifício na estação de trens, até o pai ser transferido para uma aldeia de Neudörfl, nos Alpes. Ali iniciou seus estudos em uma escola, efetivamente, tendo contato com a geometria. Este contato foi tão importante para ele, que o deixou encantado. Steiner dizia que pela primeira vez havia encontrado a felicidade. Por volta dos oito anos teve seu primeiro contato com a paranormalidade, mantendo-a em segredo, pois a sociedade da época era muito preconceituosa. Para integrar seu dom à lucidez, iniciou estudos na área da matemática, da filosofia e da ciência natural. Após os dez anos de idade, frequentou o Liceu na cidade Wiener-Neustadt, próxima da sua cidade. Aprendeu sozinho sobre os cálculos integrais, estatística e geometria descritiva, sendo reconhecido no Liceu pela sua dedicação, recebendo nota máxima. Aos catorze anos dedicou-se ao estudo das obras de Kant, sem abandonar o mundo da matemática e das ciências naturais. Aos dezoito anos, graduou-se no Liceu e matriculou-se na Escola Politécnica de Viena, por conselho de seu pai. Nesta época, concluiu sua leitura sobre Kant e iniciou novas leituras no campo da Filosofia, desta vez com Fichte, Hegel e Schelling. Trabalhou no Arquivo Schiller-Goethe, entre 1880 e 1897, editando textos goethianos. TÓPICO 1 | A PEDAGOGIA WALDORF 5 Desse período em diante iniciou como autor e editor das obras científicas completas de Goethe e escreveu sua primeira obra: A Filosofia da Liberdade (1894). Tornou-se conferencista e escritor com o intuito de divulgar sua pesquisa científico-espiritual. Em 1914, casou-se com Marie von Sievers, sua colaboradora na Sociedade Antroposófica, criada por ele em 1913. Foi convidado pelo proprietário da fábrica de cigarros Waldorf-Astória, Emil Moet, em 1919, para proferir palestras para seus funcionários. Como o trabalho foi bem aceito, solicitaram que ele abrisse uma escola para os filhos dos trabalhadores da fábrica, com o apoio de Emil. Steiner gostou da ideia, porém exigiu que a escola fosse aberta para todas as crianças, que os professores compartilhassem dos mesmos ideais que ele e que o currículo escolar fosse unificado de 12 anos. Em 7 de setembro de 1919, foi aberta a primeira escola Waldorf – Die Freie Waldorfschule – A Escola Waldorf Livre, em Stuttgart, na Alemanha. Esta escola permanece ativa até os dias de hoje. Steiner faleceu no dia 30 de março de 1925, aos 74 anos, em Dornach, na Suíça, deixando diversas contribuições em áreas como: artes, medicina, farmacologia, agricultura, pedagogia, arquitetura, teologia e na vida social. Em 27 de fevereiro de 1956 foi fundada a primeira Escola Waldorf no Brasil, mais especificamente em São Paulo, por um pequeno grupo de amigos. Para preparar os professores de acordo com a Pedagogia Waldorf e auxiliar na fundação da escola, o grupo de amigos convidou professores da Escola Waldorf de Pforzheim, na Alemanha. A escola iniciou com apenas 28 crianças da Educação Infantil e o antigo primário. Como a escola evoluiu positivamente, em 1979 foi autorizado o funcionamento do Ensino Fundamental e, posteriormente, do Ensino Médio. Com o crescimento constante de novas escolas Waldorf, fundou-se a Federação das Escolas Waldorf no Brasil em 1998, que teve como princípio a consolidação da Pedagogia Waldorf. Atualmente existem diversas escolas Waldorf espalhadas pelo país, e seu crescimento vem se acentuando nos últimos anos. 3 A PEDAGOGIA WALDORF As escolas Waldorf, criadas por Steiner, se diferenciaram das demais por suas ideias e métodos pedagógicos diversificados, crescendo muito até os dias de hoje. O crescimento das escolas Waldorf foi contido apenas durante a Segunda Guerra Mundial (1939-1945) e durante os regimes comunistas. UNIDADE 1 | AS PRINCIPAIS CONCEPÇÕES TEÓRICAS DA EDUCAÇÃO INFANTIL: RELAÇÃO TEÓRICO-PRÁTICA 6 FIGURA 2 – ESCOLA WALDORF FONTE: Disponível em: <http://escolawaldorfrecife.com/nossa-escola/ educacao-infantil/ritmo-dia-a-dia-e-eventos/>. Acesso em: 12 abr. 2012. A principal característica das escolas Waldorf é a sua base na concepção de desenvolvimento humano introduzido por Steiner, que leva em conta as diversas características de crianças e adolescentes, que veremos mais adiante. Na Pedagogia Waldorf, a educação é formulada de acordo com estas características e diferenciada para cada faixa etária, percebendo a criança do ponto de vista espiritual, físico e anímico e evidenciando o desenvolvimento progressivo destes pontos. NOTA ANÍMICO: referente à alma, deriva do latim anima = alma. Estas escolas são diferentes das demais, pois não exigem o desenvolvimento do pensamento abstrato ou intelectual desde a infância. As crianças aprendem a ler após entrarem no 1ª série (atual 2º ano), e o uso do computador é feito apenas a partir da entrada no Ensino Médio, pois o seu uso induz ao pensamento lógico-abstrato. Esta pedagogia diferente tem suas bases na antroposofia, que, como já vimos, foi criada por Steiner. A antroposofia é “[...] uma linha de pensamento e investigação científica que abrange diversas áreas do conhecimento”. (TREVISAN, 2006, p. 15). TÓPICO 1 | A PEDAGOGIA WALDORF 7 NOTA Você sabe o que significa o termo ANTROPOSOFIA? Deriva das palavras ANTROPO = homem e SOFIA = saber, ciência. Em grego significa: conhecimento do homem. Agora que já sabemos o que significa o termo antroposofia, vamos conhecer um pouco mais sobre as suas bases e influência na Pedagogia Waldorf. De acordo com Costa (2005, p. 14), “Steiner concebeu o homem atual, como portador e comportador de quatro processos, que nada mais são que a introjeção dos três reinos evolutivos da natureza (mineral, vegetal e animal) e mais um, que seria o qualificador, o distintor da individualidade humana: o Eu”. A isto chamou de quadrimembração. FIGURA 3 – QUADRIMEMBRAÇÃO FONTE: As autoras UNIDADE 1 | AS PRINCIPAIS CONCEPÇÕES TEÓRICAS DA EDUCAÇÃO INFANTIL: RELAÇÃO TEÓRICO-PRÁTICA 8 Ainda segundo Steiner, o mineral seria o CORPO FÍSICO, que não muda, a não ser que sofra influência de forças externas, mas que, ao final de tudo, continua sendo o esqueleto, a base, o inorgânico, presente em todos os seres. Por outro lado, o homem, o animal e o vegetal possuem uma força vital, que faz com que eles nasçam, cresçam e morram. Esta força que dá a vida e a forma seria o CORPO ETÉRICO, representando a vitalidade, cujo auge se refere ao nascimento e seu fim representaria a morte, na velhice, quando o corpo etérico deixaria de existir para se tornar apenas físico, mineral. Mas há algo mais que constitui o homem. Ele não é apenas corpo físico e vida, ele age, possui instintos, “[...] ele reage, tem impulsos (procura alimentos, parceiros sexuais), manifesta atração (simpatia) e repulsa (antipatia) e também pode aprender”. (COSTA, 2005, p. 16). Estas características também estão presentes nos animais. Homem e animal possuem uma vida anímica, possuem alma, ou, como definiu Steiner, possuem um CORPO ASTRAL. Este CORPO ASTRAL é o que domina o corpo físico e o etérico e caracteriza-se por ser um corpo de sentimentos, movimentos, que constrói o espaço ao seu redor. Porém, durante a evolução nós, seres humanos, adquirimos um quê de diferente, que nos individualiza e nos torna únicos: o nosso EU. Somos diferentes dos outros seres, somos diferentes dos outros homens e possuímos consciência disto. Somos autoconscientes, temos consciência de nós perante o mundo, temos liberdade. Além destas características que definem o homem, Steiner procurou definir as principais atividades anímicas do ser humano. Vejamos: FIGURA 4 – HOMEM FONTE: Disponível em: <http://www.a77.com.br/desenhos/desenho_colorir_ homem_9a.php>. Acessoem: 27 fev. 2012. TÓPICO 1 | A PEDAGOGIA WALDORF 9 Segundo Canelada (2011, p. 16), a educação Waldorf cultiva em seus alunos: [...] o querer (agir) através da atividade corpórea em praticamente todas as aulas; o sentir, que é incentivado por meio de abordagem artística constante nas matérias, além de atividades artísticas e artesanais, específicas para cada idade; e o pensar, que vai sendo cultivado paulatinamente desde a imaginação dos contos, lendas e mitos no início da escolaridade, até o pensar abstrato rigorosamente científico no ensino médio. (CANELADA, 2011, p. 16). Além destas características, Steiner argumentou que o desenvolvimento humano não ocorre de forma linear e sim em ciclos de aproximadamente sete anos, o que chamou de setênios. Vamos conhecê-los? QUADRO 1 – OS TRÊS SETÊNIOS DEFINIDOS POR STEINER CICLOS IDADE CARACTERÍSTICAS 1º setênio 0-7 anos Base do desenvolvimento físico Caracteriza-se pela estruturação do corpo físico, por meio do corpo etérico. Nesta fase a criança é influenciada por tudo o que acontece ao seu redor, absorvendo a cor, o som, a forma, os sentimentos e o caráter das pessoas. Outra característica importante deste setênio é a imitação. Nesta fase, a criança aprende pelo exemplo, pelo ambiente, imitando tudo o que vê: os nossos gestos, nosso modo de falar, nossa maneira de comer etc. Por isto, neste período, é necessário que a criança se sinta amada, protegida. É o momento para a criança perceber que O MUNDO É BOM. Para Steiner os três primeiros anos de vida são decisivos para a criança. Para ele o andar, o falar e o pensar (que se desenvolvem neste setênio) evoluem de forma gradual e sequencial: se a criança não desenvolver bem o ato de andar, provavelmente terá dificuldades em relação ao falar e ao pensar. Neste período a criança expressa-se livremente, sem medo, utilizando o corpo inteiro, cabendo aos adultos a inserção da criança numa regularidade, numa rotina, com horários e tempos para realizar cada atividade. A partir dos três primeiros anos, a criança começa a diferenciar-se do mundo e inicia a afirmação do EU. Ex.: eu quero, é meu etc. Nesta fase também teria início o desenvolvimento da memória: por isto geralmente lembramos fatos da nossa infância ocorridos apenas a partir dos três anos. Este setênio marca, portanto, o desenvolvimento da autonomia. FIGURA 5 – CRIANÇA SEGURA, PROTEGIDA FONTE: Disponível em: <http://www.escolacaranda. com.br/content. asp?Categ=2&contentlD=26>. Acesso em: 28 abr. 2012. UNIDADE 1 | AS PRINCIPAIS CONCEPÇÕES TEÓRICAS DA EDUCAÇÃO INFANTIL: RELAÇÃO TEÓRICO-PRÁTICA 10 2º setênio 7-14 anos Base para o amadurecimento psicológico Neste setênio o corpo astral, ou anímico, é quem assume a liderança, e todo o desenvolvimento da criança está ligado às emoções, aos sentimentos. Segundo Steiner (apud COSTA, 2005), o corpo astral desenvolve-se em pequenas fases: dos 7 aos 9 anos, há uma alteração no formato do rosto; dos 9 aos 12 anos, há um maior crescimento do tórax e, dos 12 aos 14 anos, o alongamento dos membros. Próximo dos 10 anos, a criança pode sentir uma nova vivência do EU: uma espécie de solidão, irritação, podendo vivenciar nesta fase o amor platônico. Neste setênio o jovem identifica-se com o ritmo, com a musicalidade, sentindo prazer em cantar e ouvir música. Nesta fase, segundo Steiner, é o momento ideal de a criança vivenciar que O MUNDO É BELO, por isto é importante que ela tenha uma vivência da estética e do belo por meio de atividades artísticas e artesanais. A partir dos 12 anos, nasce a autoconsciência, o raciocínio próprio, que a levará a outros aprendizados. Por volta dos 14 anos, ocorre o despertar da sexualidade, a consciência do próprio corpo, o desenvolvimento do amor físico. No segundo setênio fixam-se os costumes como hábitos alimentares, de higiene, espirituais, etc. Nesta fase, atitudes de pessoas importantes para a criança podem facilitar ou dificultar um desenvolvimento sadio da sua vida psíquica e anímica. FIGURA 6 – CRIANÇAS COM INSTRUMENTOS MUSICAIS FONTE: Disponível em: <http:// pioneiro.clicrbs.com.br/rs/ noticia/2010/12/incluir-a-musica- na-rotina-das-criancas-desperta-a- curiosidade-e-o-desenvolvimento- motor-3134059.html>. Acesso em: 28 abr. 2012. 3º setênio 14-21 anos Base para o amadurecimento social Este setênio marca o amadurecimento do EU e sua autonomia. O jovem já é capaz de emitir julgamentos e de agir eticamente. Nesta fase, o adolescente apresenta um forte espírito crítico, colocando em xeque as opiniões dos demais. Recusa-se a aceitar a autoridade de qualquer pessoa e os valores só são aceitos se condisserem com o seu próprio raciocínio. As pessoas ao seu redor só serão respeitadas se forem honestas, verdadeiras. É a fase, segundo Steiner, de O MUNDO É VERDADEIRO. Para Steiner, esta é a hora certa de apresentar a ciência, o conceito, desenvolvendo o pensar lógico. Nesta fase há um amadurecimento da responsabilidade e é a época ideal para ensinar ao jovem os problemas da humanidade, fazendo-os vivenciar esta realidade e não apenas estudar sobre elas. Também é interessante que se estimule o jovem a estipular metas para o seu futuro. Por volta dos 21 anos, a maturidade intelectual e moral se estabiliza, acompanhadas da responsabilidade. FIGURA 7 – OS JOVENS E A CIÊNCIA FONTE: Disponível em: <http:// www.univates.br/noticias/8781- univates-realiza-6o-aprender- experimentando>. Acesso em: 28 abr. 2012. FONTE: Adaptado de: Costa (2005); Kügelgen (1984); Lanz (1998) TÓPICO 1 | A PEDAGOGIA WALDORF 11 Agora que já estudamos os setênios, vamos abordar outra importante contribuição de Steiner para a educação: o princípio dos temperamentos. Apesar de cada um possuir o seu Eu, nossa constituição física e anímica pode ser agrupada em quatro tipos básicos: sanguíneo, melancólico, colérico e fleumático. Lembre que normalmente cada pessoa apresenta características mais fortes de um ou dois temperamentos. Veja o quadro a seguir: QUADRO 2 – OS TEMPERAMENTOS TIPOS DE TEMPERAMENTO ELEMENTO DE LIGAÇÃO CARACTERÍSTICAS DA CRIANÇA Sanguíneo AR Ágil, leve, aérea. É muito alegre e inteligente, mas perde facilmente a concentração, tendo dificuldade em se fixar numa determinada tarefa. Adormece e acorda muito facilmente, prefere alimentos picantes e azedos. Para que a criança aprenda, é necessário que o adulto desenvolva uma relação afetiva com ela e dela com o objeto que deverá ocupar-se. Melancólico TERRA Pesada, triste. Está sempre isolada em seu mundo, desajeitada, seu corpo parece muito pesado para ela. Tem dificuldade em se relacionar com os colegas, demora a acordar e adormecer. Come pouco e prefere doce. Qualquer sofrimento a deixa arrasada. Não gosta de atividades físicas, jogos mais violentos e também não gosta do frio. Para trabalhar com ela, o adulto deve sugerir- lhe a musicalidade. Como se preocupa com as pessoas sofredoras, convém discutir com ela o sofrimento mundial. Colérico FOGO Tem corpo atlético, com membros curtos e nuca grossa. É muito atenta e concentrada, porém estoura, queima-se muito facilmente. Líder nata, é responsável, aplicada e corajosa, agindo sempre com muita energia. Para trabalhar com ela é preciso ter paciência e ser compreensível, levando-a ao extremo de si mesma, para que perceba que não é infalível. Fleumático ÁGUA Fica na sua. Possui intensa relação com o seu corpo etérico, estando em constante bem-estar. Dificilmente envolve-se com coisas diferentes, pois não quer perder a sua posição cômoda, por isso parece lenta, sonolenta e tem tendência à obesidade. Gosta muito da rotina e da ordem e é muito calma. É preciso que ela perceba que as outras crianças se interessam muito pelo assunto, para então demonstraralgum interesse para as novidades. FONTE: Adaptado de: Costa (2005); Kügelgen (1984); Lanz (1998); Trevisan (2006) Para entendermos melhor cada um dos temperamentos, vamos ilustrá-los com uma pequena história: Num caminho, quatro pessoas chegam sucessivamente a um obstáculo; uma pedra caiu e obstruiu sua passagem. A primeira pessoa, o sanguíneo, vem cantando; ao ver a pedra, brinca sobre ela e alegremente continua a viagem. UNIDADE 1 | AS PRINCIPAIS CONCEPÇÕES TEÓRICAS DA EDUCAÇÃO INFANTIL: RELAÇÃO TEÓRICO-PRÁTICA 12 E então! Conseguiu diferenciar cada um dos temperamentos? Foi capaz de encontrar-se em algum deles? Agora que já conhecemos a teoria do desenvolvimento humano proposta por Steiner, que é a base da Pedagogia Waldorf, que tal analisarmos como esta teoria é aplicada na prática? 4 METODOLOGIA Se você quer que seu filho seja brilhante conte a ele contos de fadas. Se você o quer muito brilhante, conte-lhe ainda mais contos de fadas. (Albert Einstein) É isto mesmo! Na Pedagogia Waldorf, contar histórias é uma forma de estimular o conhecimento. Para cada fase do desenvolvimento, são utilizadas histórias diferentes: prosas, versos, cantigas, contos, lendas, casos etc., que variam em sua forma e conteúdo para cada fase. Na Educação Infantil, os contos de fada são muito importantes. “Com suas imagens cheias de fantasias, eles são um alimento para as crianças, enriquecem seu vocabulário, ativam sua capacidade imaginativa, estimulam a criatividade e dão a elas suporte emocional e amparo para que se sintam felizes. E, mais do que tudo, que se sintam aceitas.” (TREVISAN, 2006, p. 46). E já que falamos sobre o conto na Educação Infantil, vamos explorar como são os Jardins de Infância na Pedagogia Waldorf? Tendo por base os setênios, que estudamos anteriormente, o foco da Educação Infantil está no brincar imitativo, na imaginação, por isto, mais do que nunca, a importância de se trabalhar com os contos de fadas, para que a criança desenvolva, aos poucos, o pensamento criativo e se prepare para as demais etapas do seu desenvolvimento escolar. Nesta fase a criança deve ser tratada com individualidade e respeito, estimulando o desenvolvimento do seu talento e da sua capacidade. Lembre-se de que nesta fase, segundo Steiner, a criança deve se sentir segura, para que possa concluir que O MUNDO É BOM. Tal qual numa família com irmãos, as classes de Jardim são formadas Pouco depois, um fleumático chega ao local, para um longo tempo; finalmente, encontra um desvio que lhe permite dar volta ao obstáculo e, vagarosamente, continua seu caminho. A seguir, chega o terceiro, o melancólico: “Claro, estas coisas só acontecem a mim”! Permanece muito tempo sentado sobre a pedra, refletindo até o ponto de esquadrinhar como o infortúnio chegou ao mundo, e por que esse infortúnio sempre há de lançar obstáculos precisamente nos caminhos que ele utiliza. Levanta-se e volta para casa. Finalmente, aproxima- se o colérico, com passo decidido: vê a pedra, detém-se por um segundo e logo a empurra com disposição, até que consegue tirá-la do caminho. Continua sua marcha, não deixando de voltar-se algumas vezes para contemplar com satisfação seu êxito. (KÜGELGEN, 1984, p. 38). TÓPICO 1 | A PEDAGOGIA WALDORF 13 por crianças de idades diferentes. Os mais novos aprendem com os mais velhos; os mais velhos cultivam respeito e carinho para com os pequenos. Nem tudo são flores, é claro. Brigas e desentendimentos fazem parte do aprendizado social e são acolhidos como tais pelo professor, assim como em casa pelos pais. (TREVISAN, 2006, p. 46). Nesta fase é importante que a criança cumpra rotinas preestabelecidas, para que organize a sua vida de forma segura. As atividades do currículo Waldorf seguem os ritmos da natureza, das estações do ano e dos afazeres do dia a dia, como: acordar, tomar café, escovar os dentes, entre outros. QUADRO 3 – RITMOS DA ESCOLA WALDORF RITMO ATIVIDADES Diário - Desenho ou pintura. - Música e poemas em diversas línguas (para formar o aparelho fonador e auditivo). - Brincar livre na sala de aula. - Culinária, modelagem, teatro - Lanche (antes as crianças re.citam um verso de agradecimento pelo alimento). - Brincar no jardim. - Histórias de contos de fadas ou teatro. Semanal - A cada dia da semana o professor estipula uma atividade diferente como modelagem, desenho, trabalhos manuais, pintura, culinária ou eurritmia. Mensal - A cada mês o professor escolhe um tema diferente, de acordo com a época do ano, para desenvolver nas rodas de histórias ou contos. Anual - A cada estação do ano o professor prepara festas, teatros, entre outros, para trabalhar e fortalecer as características de cada época. FONTE: Trevisan (2006) Assim, na Pedagogia Waldorf, os professores trabalham para desenvolver um ambiente de harmonia e incentivo à criatividade na Educação Infantil. Para isto, propõem atividades diversificadas como cuidar do jardim, fazer pão para o lanche, construir brinquedos, criar brincadeiras com materiais da natureza, dando grande importância ao movimento e ao desenvolvimento neurológico da criança. Nesta fase, o professor Waldorf deve ser digno de ser imitado, pois nessa imitação inconsciente estará fundamentando a moralidade da criança. Bem, agora que já sabemos como é organizada a Educação Infantil nas escolas Waldorf, vamos abordar rapidamente a organização do Ensino Fundamental e do Ensino Médio. Assim, no currículo do Jardim, as atividades percorrem um caminho organizado e habitual, que atende aos ritmos diários (brincar fora, brincar dentro, lanche), semanal (culinária, desenho, modelagem, pintura), mensal (um tema específico é trabalhado nas histórias e contos) e anual (que segue as estações do ano, celebradas com festejos e teatros). Um dia depois do outro. (TREVISAN,2006, p. 49). Vejamos, no quadro a seguir, quais atividades são realizadas com as crianças das escolas Waldorf, em cada ritmo: UNIDADE 1 | AS PRINCIPAIS CONCEPÇÕES TEÓRICAS DA EDUCAÇÃO INFANTIL: RELAÇÃO TEÓRICO-PRÁTICA 14 O Ensino Fundamental possui o mesmo currículo das outras escolas, porém voltado ao desenvolvimento do jovem para o espírito científico investigativo e para o exercício pleno da cidadania. Diversas atividades complementam o currículo como: marcenaria, atividades artísticas, filosofia, trabalhos manuais, música, astronomia, geometria, inglês, alemão, jardinagem, antropologia, mineralogia, botânica, entre outras. Neste setênio, como vimos anteriormente, a criança deve reconhecer que O MUNDO É BELO, por isto recebe uma formação voltada às artes. Nesta fase também se inicia a alfabetização da criança, e o professor deve conquistar uma autoridade amorosa. No Ensino Médio há uma maior preocupação com a formação social, por isto o jovem é levado a conhecer as diversas situações sociais que estão ao seu redor, a fim de tornar-se um cidadão crítico e ativo. Lembre-se de que nesta fase o aluno deve perceber que O MUNDO É VERDADEIRO, cabendo ao professor estabelecer uma relação de honestidade e confiança com o aluno. Durante os quatro anos do Ensino Médio, o jovem desenvolve uma pesquisa com um tema de seu interesse e, ao final do curso, a defende em forma de monografia. Independentemente da fase em que a criança se encontra, os alunos das escolas Waldorf não repetem o ano escolar. A avaliação das crianças não é realizada em forma de provas, exames etc., para fins estatísticos. Os professores [...] julgam todos os fatores que permitam avaliar a personalidade do aluno, quais sejam: o trabalho escrito, a aplicação, a forma, a fantasia, a riqueza de pensamentos, a estrutura lógica, o estilo, a ortografia e, além disso, obviamente os conhecimentos reais. Mas o julgamento geral sobre o aluno levará em conta o esforço real que ele fez (ou não fez)para alcançar tal resultado, seu comportamento, seu espírito social. (LANZ, 1998, p. 105). Os boletins anuais enviados aos pais relatam a biografia do aluno durante o ano todo, seus resultados, seu comportamento, seu esforço etc. Afinal, o principal objetivo das escolas Waldorf é preparar a criança para a vida real, desenvolvendo qualidades essenciais para que ela saiba lidar com o mundo em constante mudança, de forma criativa, flexível, responsável e com senso crítico. TÓPICO 1 | A PEDAGOGIA WALDORF 15 DICAS Ficou curioso(a) em aprofundar-se um pouco mais sobre a metodologia das escolas Waldorf? Veja nossas dicas de leitura: KÜGELGEN, Helmut von. A educação Waldorf: aspectos da prática pedagógica. São Paulo: Antroposófica, 1984. (Este livro reúne diversas palestras sobre os principais conceitos e métodos da Pedagogia Waldorf). TREVISAN, Helena Maria Ferreira. Filhos felizes na escola: pedagogia Waldorf, o ensino pela arte. São Paulo: Trevisan Editora Universitária, 2006. (Este livro apresenta um relato bem dinâmico de como ocorre a Educação Waldorf em sala de aula). 5 PAPEL DO PROFESSOR NA ESCOLA WALDORF Quando a gente aprende algo e dele não se esquece nunca mais, é porque o coração e a alma também foram tocados. (TREVISAN, 2006, p. 21). Uma importante característica da Pedagogia Waldorf é a relação de amor e profundo conhecimento entre o professor e seus alunos, já que o professor permanece com a turma durante diversos anos: um professor acompanha durante toda a Educação Infantil, outro durante todo o Ensino Fundamental e outro durante todo o Ensino Médio (neste último, recebendo a função de tutor, já que as disciplinas são ministradas por professores específicos). Além disso, a escola possui um médico escolar, que conhece profundamente a pedagogia e dá apoio aos professores: o médico-pedagógico. [...] o professor da classe é um dos pilares da Pedagogia Waldorf. Principalmente nos primeiros anos de vida, quando a criança está começando a entrar em contato com um ambiente que não é o da sua própria casa, é importante que ela sinta que na escola também tem uma família. Essa analogia transfere segurança e bem-estar, e ela passa a sentir que o professor é um substituto à altura de seus próprios pais e por quem nutrirá igualmente respeito e confiança. (TREVISAN, 2006, p. 28). Por isto que, para se tornar um professor Waldorf, além da formação normal de professor, é necessário realizar um curso específico na Pedagogia Waldorf, para conhecer profundamente a teoria de Rudolf Steiner. Além disso, de acordo com Trevisan (2006, p. 30), “[...] um exercício importante para um professor Waldorf é meditar séria e diariamente sobre cada aluno seu. O objetivo é encontrar respostas sobre como é possível ajudá-lo a expressar ao máximo o seu potencial e a desenvolver dons que ele não possui”. UNIDADE 1 | AS PRINCIPAIS CONCEPÇÕES TEÓRICAS DA EDUCAÇÃO INFANTIL: RELAÇÃO TEÓRICO-PRÁTICA 16 1 – Conhecimento profundo do ser humano. Envolve conhecer a antroposofia e os setênios e aperfeiçoar-se constantemente. 2 – Amor como base do comportamento social. O professor deve amar os seus alunos. 3 – Qualidades artísticas. O professor deve ser maleável, criativo e encarar cada aula como uma verdadeira obra de arte. Amar os seus alunos é algo primordial para quem quer ser professor e não apenas na Pedagogia Waldorf. Pense nisto! Não vá para a sala de aula se você não gostar de crianças. Seja um professor responsável e, principalmente, afetivo! Na escola Waldorf, o aluno não aprende apenas por meio de livros, mas principalmente com as pessoas, ele procura vivência e não apenas conhecimentos, e o professor tem um papel muito importante, pois trabalhará diversos conteúdos, das várias disciplinas existentes no currículo. “Não lhe bastará conhecer a matéria; ele deverá ainda usá-la conscientemente como meio pedagógico, expondo-a com entusiasmo”. (LANZ, 1998, p. 84). Você já deve ter percebido que o professor das Escolas Waldorf precisa ter um grande conhecimento da teoria de Steiner, além de diversas qualidades, não é mesmo? Vamos destacar três qualidades essenciais ao professor Waldorf, de acordo com Lanz (1998): 17 Neste tópico, prezado(a) acadêmico(a), você aprendeu que: • Steiner nasceu em 1861, na Áustria, e faleceu em 1925, aos sessenta e quatro anos, na Suíça. • A principal característica das escolas Waldorf é a sua base na concepção de desenvolvimento humano criada por Steiner, a antroposofia. • Steiner concebeu o homem atual como portador de quatro processos: mineral, vegetal, animal e o EU. • As principais atividades anímicas do ser humano, segundo Steiner, são: pensar, sentir, querer. • O desenvolvimento humano ocorre em ciclos de sete anos, que chamou de setênios: 0-7 anos; 7-14 anos e 14-21 anos. • A constituição física e anímica do ser humano pode ser agrupada em quatro tipos de temperamentos: sanguíneo, melancólico, colérico e fleumático. • Para a Pedagogia Waldorf, contar histórias é uma forma de estimular o conhecimento. • O foco da Educação Infantil está no brincar imitativo, na imaginação. Nesta fase, a criança deve ser tratada com respeito, com rotinas preestabelecidas, de forma a se sentir segura, para que possa concluir que O MUNDO É BOM. • Nesta fase, na Educação Infantil, o professor deve ser digno de ser imitado. • O Ensino Fundamental está voltado ao desenvolvimento do espírito científico investigativo e do exercício pleno da cidadania. Sua formação deve estar voltada para a estética, para as artes, para que reconheça que O MUNDO É BELO. • No Ensino Médio, há uma maior preocupação com a formação social. Nesta fase, o jovem deve perceber que O MUNDO É VERDADEIRO. • Os alunos da escola Waldorf não repetem o ano escolar, pois o objetivo das escolas Waldorf é preparar a criança para a vida real. RESUMO DO TÓPICO 1 18 • Uma importante característica da Pedagogia Waldorf é o amor e o profundo conhecimento do professor por seus alunos, já que ele permanece com a turma durante diversos anos. • Na escola Waldorf, o aluno não aprende de livros e sim de pessoas, por isto é importante que o professor tenha as seguintes qualidades: conhecimento profundo do ser humano; amor como base do comportamento social e qualidades artísticas. 19 AUTOATIVIDADE Caro(a) acadêmico(a)! Após ter realizado a leitura deste tópico, que tal refletir um pouco sobre esta teoria? 1 Qual aspecto da teoria de Steiner você achou mais interessante? Por quê? ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ 2 Em relação aos temperamentos, a história que usamos para ilustrar o assunto auxiliou você a identificar os diversos tipos de temperamento nas pessoas que o(a) rodeiam? Em qual temperamento você mais se enquadra? ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ 20 21 TÓPICO 2 A PEDAGOGIA MONTESSORI UNIDADE 1 1 INTRODUÇÃO O primeiro passo da educação é prover a criança de um meio que lhe permita desenvolver as funções que lhes foram designadas pela natureza. Isso não significa que devemos contentá-la e deixá-la fazer tudo o que lhe agrada, mas nos dispor a colaborar com a ordem da natureza, com uma de suas leis, que quer que esse desenvolvimentose efetue por experiências próprias da criança. (MONTESSORI, 1972 apud RÖHRS, 2010, p. 29). Você já ouviu falar em Maria Montessori ou na Pedagogia Montessori? E nas Casas das Crianças, ou Case Dei Bambini? Ou, quem sabe, já ouviu falar no Material Dourado? Neste tópico, vamos nos aprofundar um pouco sobre Maria Montessori e sua teoria, a Pedagogia Montessori, muito utilizada nas escolas brasileiras e do mundo todo. Se você já é professor(a), vai perceber que muitas das atividades desenvolvidas por Montessori já são utilizadas no seu dia a dia em sala de aula, porém, muitas vezes, sem saber a sua origem ou o real significado e importância de desenvolver cada uma delas. A Pedagogia Montessori tem por princípios a liberdade, a disciplina e a responsabilidade. Nela as crianças aprendem utilizando materiais didáticos especialmente elaborados para desenvolver os aspectos motores, intelectuais, racionais ou sensoriais de cada um. Além disso, a criança tem liberdade para escolher o material didático com o qual irá trabalhar. Por isto, os materiais didáticos elaborados por Montessori são desenvolvidos para atrair a atenção das crianças, desenvolvendo nelas a curiosidade por aprender e buscar o conhecimento. Nesta teoria, o professor é aquele que avalia o desenvolvimento e o comportamento das crianças, estimulando a busca pelo saber de forma criativa, lúdica e prazerosa, guiando as crianças durante a sua caminhada em busca do conhecimento, ajudando a tirar dúvidas e respondendo aos questionamentos que surgem durante as aulas. O professor é um grande observador da aprendizagem e do comportamento das crianças. Ficou curioso(a)? Vamos explorar um pouco mais esta teoria? UNIDADE 1 | AS PRINCIPAIS CONCEPÇÕES TEÓRICAS DA EDUCAÇÃO INFANTIL: RELAÇÃO TEÓRICO-PRÁTICA 22 2 MARIA MONTESSORI (1870-1952) Para iniciarmos, que tal conhecer um pouco sobre a história de vida de Montessori com base em autores como Montessori (1965), Machado (1980) e Röhrs (2010)? Vamos lá! FIGURA 8 – MARIA MONTESSORI FONTE: Disponível em: <http://www.infoescola.com/pedagogia/ metodo-montessoriano/>. Acesso em: 13 dez. 2011. NOTA O livro “Pedagogia Científica”, de Montessori, utilizado em boa parte do nosso texto, em forma de citações, é bastante antigo, datado de 1965. Por isto, algumas palavras apresentam escrita diferente da utilizada nos dias de hoje. Assim, por diversas vezes você encontrará palavras com acentuação gráfica “equivocada”, pois preferimos manter o texto original do livro. Montessori nasceu em 31 de agosto de 1870, no leste da Itália, na cidade de Chiaravalle. Era neta do geólogo e naturalista Antônio Stoppani e filha única do casal Alessandro Montessori e Renilde Stoppani. Quando tinha 12 anos, mudou- se com a família para Roma à procura de uma educação de melhor qualidade. Em 1896, concluiu o seu curso de medicina, tornando-se a primeira mulher italiana a concluir o curso. Seus estudos tinham como enfoque as neuropatologias e, logo após concluí-lo, foi trabalhar como assistente em uma clínica psiquiátrica da Universidade de Roma, onde se dedicou, por dois anos, ao estudo das crianças com retardo mental. TÓPICO 2 | A PEDAGOGIA MONTESSORI 23 Devido a seu grande interesse pelos anormais (nome utilizado na época para referir-se às crianças com deficiência), começou a estudar os trabalhos de Itard e Séguin, por meio de livros com relatos sobre seus métodos de ensino na educação destas crianças. [...] Itard deduziu uma série de exercícios capazes de modificar a personalidade, corrigindo defeitos que mantinham determinados indivíduos em estado de inferioridade. Efetivamente, Itard conseguiu fazer falar e ouvir a crianças semissurdas, as quais, sem este auxílio, estariam fadadas a permanecer para sempre anormais. (MONTESSORI, 1965, p. 29, grifos no original). No entanto, foram as teorias de Séguin que lhe chamaram a atenção. Séguin partiu das experiências de Itard, aplicando-as e modificando-as durante trinta anos, até chegar ao que denominou de método fisiológico (método baseado no estudo individual do discípulo). [...] Séguin, com meios analíticos semelhantes ao de Fechner, mais ricos, porém, não sòmente estudara centenas de crianças deficientes recolhidas nos asilos de Paris, mas transformara-as em criaturas humanas capazes de trabalhar ùtilmente para a sociedade e de receber uma instrução intelectual e artística. (MONTESSORI, 1965, p. 36). Tendo por base os estudos de Séguin, Montessori, em 1898, num congresso na cidade de Turim, defendeu que os deficientes e anormais não precisavam de médicos, mas sim de métodos pedagógicos que criassem um ambiente de ajuda ao aluno. Para ela, ao invés de internar as crianças com deficiência, seria necessário construir escolas onde, através da observação, os métodos de Séguin fossem aperfeiçoados, possibilitando até mesmo a formação de novos professores para atuação na área. Logo após sua participação no Congresso, seu antigo professor, ministro da Instrução Pública em Roma, chamou-a para realizar palestras sobre o ensino dos deficientes e anormais. Isto fez com que se despertasse o interesse dos que se dedicavam ao assunto. A partir de então a vida de Montessori voltou-se para a educação das crianças com deficiência. Lia tudo o que era publicado a respeito, aproveitando todas as sugestões que lhe eram dadas, realizando experiências e trabalhando fortemente na formação dos professores que vinham trabalhar com ela. Realizou viagens a Paris e Londres, conhecendo escolas e tudo o que havia de mais moderno em relação à educação destas crianças. Logo percebeu que poderia superar as teorias de Séguin, aperfeiçoando-as. Mandou fabricar os materiais didáticos que Séguin propunha, aperfeiçoando uns, excluindo outros e criando novos materiais para o trabalho a ser desenvolvido com as crianças. Tanto esforço trouxe ótimos resultados. “Usando esse método consegui que alguns deficientes do manicômio aprendessem a ler e a escrever corretamente; mais tarde, apresentando-se ao exame nas escolas públicas, juntamente com os escolares normais, obtiveram aprovação”. (MONTESSORI, 1965, p. 33). UNIDADE 1 | AS PRINCIPAIS CONCEPÇÕES TEÓRICAS DA EDUCAÇÃO INFANTIL: RELAÇÃO TEÓRICO-PRÁTICA 24 A partir de então, começou a questionar como as crianças com deficiência puderam superar os normais nos exames realizados. Concluiu que as escolas deveriam estar desorganizadas e os métodos ser péssimos, moldando e sacrificando todas as possibilidades das crianças. Tais resultados eram tidos como miraculosos pelos observadores. Eu, porém, sabia que se esses deficientes haviam alcançado os escolares normais nos exames públicos era, ùnicamente, por haverem sido conduzidos por uma via diferente: tinham sido auxiliados no seu desenvolvimento psíquico, enquanto as crianças normais haviam sido, pelo contrário, sufocadas e deprimidas. [...] Enquanto todos admiravam o progresso dos meus deficientes, eu meditava sobre as razões que faziam permanecer em tão baixo nível os escolares sãos e felizes, a ponto de poderem ser alcançados pelos meus infelizes alunos nas provas de inteligência. (MONTESSORI, 1965, p. 33). Depois de obter estes resultados, resolveu abandonar a Escola Ortofrenética e voltar aos estudos de Itard e Séguin, traduzindo-os para o italiano de próprio punho, chegando à conclusão de que o método de Séguin dava resultados mesmo quando aplicado aos alunos normais. Considerando-se incompleta, voltou a estudar, agora o curso de pedagogia e o de psicologia instrumental. Tais foram minhas conclusões. O importante não é observar, mas “transformar”. A observação fundara uma nova ciência psicológica; não “transformara”, porém, nem alunos nem escolas. Acrescentara alguma coisa às escolas comuns, deixando-as, no entanto, bem como seus métodos de instrução eeducação, estacionadas em seu estado primitivo. (MONTESSORI, 1965, p. 37). Montessori sentiu, ali, a necessidade de colocar em prática sua ideia de aplicar os métodos de Séguin com crianças normais. Porém, não sabia de que forma poderia realizar esta ação. Até que, em 1906, uma empresa que construía prédios pediu sua ajuda para a solução de um problema. Como os prédios que construíam eram para pessoas pobres e estes precisavam sair para trabalhar desde cedo, as crianças ficavam sozinhas durante o dia e estragavam o prédio. Assim, pediram para Montessori que ela criasse alguma forma de entretê-los e mantê-los quietos neste período em que estavam sem os pais. Para isto ofereceram uma sala em cada bloco e todo o pessoal de que ela precisasse. Criou-se assim a primeira Case dei Bambini, inaugurada em janeiro de 1907. Esta Casa das Crianças recebeu crianças entre os 3 e 7 anos e deu tão certo que, em abril, a empresa resolveu abrir outra, em outubro outra, chegando às diversas casas espalhadas pela Itália. As Casas de Crianças tornaram-se tão populares, que educadores de Roma e outras regiões do mundo vieram para conhecê-las e partiram entusiasmados com seus métodos. Um deles foi Freinet, conforme veremos no próximo tópico. Mais tarde, Teresa Bontempi introduziu as escolas na Suíça e pouco depois foi fundada uma escola Montessori, na Argentina. Em 1910, o método chegou aos Estados Unidos e, em 1911, a Paris. Em 1913, criou-se uma sociedade Montessori na Inglaterra. Nesta mesma época, uma sociedade de Milão e outra de Roma ofereceram-se para fabricar o material didático criado por Montessori, e a baronesa Alicia Franchetti pagou a TÓPICO 2 | A PEDAGOGIA MONTESSORI 25 primeira edição do livro Pedagogia Científica em que Maria Montessori falava sobre seu método. Em 1911, devido ao empenho de Maria Maraini Guerrieri, o método Montessori foi incluído em todas as escolas primárias da Itália. Maria Montessori faleceu em 6 de maio de 1952, com 81 anos. Hoje, seus livros estão traduzidos em diversas línguas, existindo escolas Montessori em todo o mundo, inclusive no Brasil. As sociedades Montessori não descuidam da formação dos professores, criando escolas específicas para eles; organizam conferências, criam novas escolas, cursos de férias, entre outros. DICAS Que tal conhecer um pouco mais sobre a vida de Maria Montessori? Sinopse: O filme Maria Montessori – uma vida dedicada às crianças é uma cinebiografia de Maria Montessori (1870-1952), médica, educadora e pedagoga italiana que criou um método educacional revolucionário. Acompanhe os principais momentos da trajetória de Montessori, a graduação em Medicina, a militância feminista, o trabalho pioneiro com crianças deficientes, a fundação da "Casa das Crianças", a relação com o filho Mario etc. Caso você não encontre o filme de Montessori nas locadoras, nos sites de busca da internet você encontra pequenos vídeos sobre a história de Montessori. FONTE: Disponível em: <http://www.submarino.com.br/ produto/7267124/dvd-maria-montessori:-uma-vida-dedicada-as-criancas>. Acesso em: 21 maio 2012. 3 CASE DEI BAMBINI (Casa das Crianças) E como eram as escolas criadas por Montessori? De que forma você as imagina? Vamos conhecer um pouco mais sobre elas? UNIDADE 1 | AS PRINCIPAIS CONCEPÇÕES TEÓRICAS DA EDUCAÇÃO INFANTIL: RELAÇÃO TEÓRICO-PRÁTICA 26 FIGURA 9 – MONTESSORI NA ESCOLA FONTE: Disponível em: <http://www. michaelolaf.net/maria.html>. Acesso em: 9 abr. 2012. FIGURA 10 – ESCOLA MONTESSORI FONTE: Disponível em: <http://www. controversia.com.br/blog/maria-montessori-a- mdica-que-valorizou-o-aluno/>. Acesso em: 10 abr. 2012. As Casas das Crianças, como o próprio nome sugere, eram ambientes criados especialmente para o atendimento às crianças, no intuito de melhorar o senso de responsabilidade de cada uma. Todos os espaços eram adaptados, assim como os móveis: pias, armários, cadeiras, entre outros. Ali elas podiam exercitar a liberdade e a disciplina, uma como dependente da outra. Mandei construir mesinhas de formas variadas, que não balançassem, e tão leves que duas crianças de quatro anos pudessem facilmente transportá-las; cadeirinhas de palha ou de madeira, igualmente bem leves e bonitas, e que fossem uma reprodução, em miniatura, das cadeiras de adultos, mas proporcionadas às crianças. Encomendei poltroninhas de madeira com braços largos e poltroninhas de vime, mesinhas quadradas para uma só pessoa, e mesas com outros formatos e dimensões [...]. (MONTESSORI, 1965, p. 42-43). Montessori criou também pequenos armários com cortinas ou pequenas portas, para que as crianças pudessem abrir e fechar os móveis e ali guardar os seus pertences. “Em cima da cômoda, sobre uma toalha, um aquário com peixinhos vermelhos. Ao longo das paredes, bem baixas, a fim de serem acessíveis às crianças, lousas e pequenos quadros sobre a vida em família, os animais, as flores [...]”. (MONTESSORI, 1965, p. 43). Poder-se-ia pensar que o deslocamento de mesas e carteiras causaria desordem e barulho, certo? Porém, este era o objetivo de Montessori. Que a criança aprendesse a disciplinar-se enquanto se movia ou interagia com o espaço. Não discipliná-la no sentido de proibi-la a movimentar-se, mas orientando para que a própria criança adquirisse controle e habilidade dos seus movimentos. “Se uma criança deixar cair ruidosamente uma cadeira, terá com êste insucesso uma prova evidente de sua própria incapacidade: em bancos, porém, seus movimentos passariam despercebidos. Assim, a criança terá ocasião de se corrigir e, aos poucos, verificaremos o seu progresso [...]”. (MONTESSORI, 1965, p. 44). TÓPICO 2 | A PEDAGOGIA MONTESSORI 27 De acordo com Montessori (1965), é disciplinado o indivíduo que é senhor de seus atos e que sabe seguir uma regra de vida. Devemos, pois, interditar à criança tudo o que pode ofender ou prejudicar o próximo, bem como todo gesto grosseiro ou menos decoroso. Tudo o mais – qualquer iniciativa, útil em si mesma ou de algum modo justificável – deverá ser-lhe permitido; mas deverá igualmente ser observada pelo mestre; eis o ponto essencial. (MONTESSORI, 1965, p. 46). Para Montessori (1965) a partir dos três anos a criança pode se tornar livre e independente para realizar todas as tarefas. O papel do professor é o de ajudar a criança a avançar no caminho da própria independência, estimulando-a a realizar as tarefas do dia a dia, sozinha. “Quando servimos as crianças, cometemos um ato servil para com elas. [...] Uma pessoa que se faz servir com freqüência não sòmente vive em dependência, mas definha na inanição e acaba por perder a sua atividade natural”. (MONTESSORI, 1965, p. 53, grifos no original). Assim, é papel do professor auxiliar a criança a ultrapassar os obstáculos que a impedem de desenvolver-se normalmente. 4 METODOLOGIA Com este pensamento, Montessori criou um programa conhecido como “exercícios de vida prática”, ou “exercícios no ambiente cotidiano”, como também foi chamado. Neles, as crianças vivenciavam uma vida real, realizando atividades do cotidiano. Em seu livro Pedagogia Científica, 1965, Montessori relata objetos que compunham o ambiente e auxiliavam na realização destes exercícios. “[...] os objetos estavam dispostos de molde a permitir-lhe atingir um fim determinado; por exemplo: certos quadros que ensinam a abotoar, dar laços, fazer nós etc.” (MONTESSORI, 1965, p. 58). FIGURA 11 – QUADROS PARA ABOTOAR FONTE: Disponível em: <http://www. sunrise-montessori.com/what_is_ montessori/montessori_index.php>. Acesso em: 15 abr. 2012. Quadros para abotoar – Entre outros objetos que exercitam as crianças na análise de seus movimentos, podemos referir [...] o quadro de madeira ao qual se fixam dois retângulos de tecido. Esses tecidos são unidos oufechados de diversos modos: com botões, presilhas, laços, fitas, colchetes, fechos automáticos etc. (posso citar o zíper também). Servem para desenvolver a habilidade os gestos que se fazem ao vestir-se; as duas peças de fazenda devem, primeiramente, ser justapostas com precisão de tal modo que, em ambos os tecidos, haja uma correspondência recíproca entre os buraquinhos por onde há de passar a fita, entre os botões e suas casas, entre os ilhoses e os laços etc. Isso requer da criança variadas manobras, por vezes bem complexas, que a levam a coordenar os gestos sucessivos que terá que fazer, um após o outro. (MONTESSORI, 1965, p. 88, grifos no original). UNIDADE 1 | AS PRINCIPAIS CONCEPÇÕES TEÓRICAS DA EDUCAÇÃO INFANTIL: RELAÇÃO TEÓRICO-PRÁTICA 28 Em outro momento, Montessori fala dos lavabos para as mãos, com panos para limpar, vassouras, escovas... e a criança tenha liberdade de escolher o trabalho que deseja desenvolver. FIGURA 12 – CRIANÇA BRINCANDO NO LAVABO FONTE: Disponível em: <http://privatepreschool.blogspot.com.br/2011/07/ montessori-preschool-what-sets-standard.html>. Acesso em: 23 mar. 2012. Com os exercícios da vida prática, Montessori propõe a estimulação dos músculos por meio de atividades atraentes e do dia a dia, como enrolar um tapete, lavar o chão, servir a mesa, abrir e fechar as portas ou janelas, entre outros, colocando o corpo todo em movimento, exercitando-o e aperfeiçoando-o cada dia mais. Abrir ou fechar uma porta, uma gaveta, distinguindo bem os vários gestos a fazer: enfiar a chave, mantendo-a em posição vertical; depois virá-la, e, finalmente, puxar a gaveta ou a porta. [...] Abrir convenientemente um livro, folheá-lo, virando as páginas uma a uma. [...] Sentar-se numa cadeira e, em seguida, levantar-se; transportar objetos, parar um instante antes de colocá-los em seu lugar; caminhar evitando obstáculos, isto é: não dando empurrões em pessoas ou coisas [...] Além destes, outra série de gestos integram-se ainda na vida prática da criança: são os que se referem às etiquetas nas relações sociais, tais como saudar alguém, recolher e entregar um objeto seu, caído no chão; evitar passar cortando o passo de outrem, escusar-se etc. (MONTESSORI, 1965, p. 89). Para Machado (1980), o ambiente proposto por Montessori educa pelas suas qualidades psicológicas, pelo clima afetivo que favorece uma nova forma de relacionamento entre professor e aluno e dos alunos entre si; percebe-se claramente o acolhimento, a aceitação e valorização de cada um, na sua individualidade, no seu ritmo de trabalho e de crescimento. Ainda de acordo com Machado (1980), ao utilizar os recursos propostos por Montessori, a criança se constrói, conquistando confiança em si mesma, resolvendo diversas situações que lhe são propostas. Pela tentativa erro/acerto, reconhece suas limitações e procura meio de vencê-los. TÓPICO 2 | A PEDAGOGIA MONTESSORI 29 Os recursos propostos por Montessori continham exercícios de paciência, de exatidão e de repetição, reforçando o poder de concentração de cada criança. Estes exercícios deviam ser realizados todos os dias como se fossem uma tarefa e não um passatempo e eram complementados com momentos de meditação e imobilidade. Para Montessori (1976 apud RÖHRS, 2010), os exercícios serviam para desenvolver atitudes e não apenas competências. Montessori criou a teoria da percepção e criou os materiais didáticos de forma que eles permitissem, ou simulassem, situações concretas e imediatas, favorecendo a abstração da criança. Esforçou-se em criar materiais didáticos que motivassem as crianças de tal forma a estimular um maior contato com a sua própria consciência. Um de seus principais focos são as atividades independentes, ou seja, cada criança escolhe o material com o qual irá trabalhar a cada dia. Para Montessori (1966 apud RÖHRS, 2010), o indivíduo é o que é, não por causa dos professores que ele teve, mas pelo que ele realizou sozinho. De acordo com Montessori (1966 apud RÖHRS, 2010), as crianças percebem intuitivamente o seu crescimento e o quanto de conhecimento adquiriram ao realizarem cada atividade, manifestando esta consciência em forma de alegria, felicidade. “Essa tomada de consciência sempre crescente favorece a maturidade. Se damos a uma criança o sentimento de seu valor, ela se sente livre e seu trabalho não lhe pesa mais” (MONTESSORI, 1966 apud RÖHRS, 2010, p. 28). O material didático desenvolvido por Montessori tem a função de ajudar a criança a crescer tranquilamente, a “crescer na paz”, adquirindo a tão esperada responsabilidade, objetivo dos trabalhos de Montessori com as crianças. Os materiais didáticos desenvolvidos por Montessori constituem-se em cinco grupos: FIGURA 13 – MATERIAIS DIDÁTICOS MONTESSORI FONTE: As autoras UNIDADE 1 | AS PRINCIPAIS CONCEPÇÕES TEÓRICAS DA EDUCAÇÃO INFANTIL: RELAÇÃO TEÓRICO-PRÁTICA 30 Entre os materiais didáticos desenvolvidos por Montessori, podemos citar o Material Dourado. Você já deve ter ouvido falar dele. Ele é formado geralmente por peças de madeira em formato de cubo, placa, barra e cubinhos e é muito utilizado na Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental para ensinar as quatro operações fundamentais da matemática. No Caderno de Metodologia e Conteúdos Básicos de Matemática, você irá conhecer um pouco mais sobre a utilização e a confecção deste material. FIGURA 14 – MATERIAL DOURADO FONTE: Disponível em: <http://www.gescomercial.com.br/loja/index. php?option=com_zoo&task=item&item_id=1&Itemid=76>. Acesso em: 14 abr. 2012. Além do Material Dourado, talvez você conheça outros materiais didáticos desenvolvidos por Montessori. Observe as figuras a seguir: FIGURA 15 – MATERIAL DIDÁTICO 1 FONTE: Disponível em: <http://montessori-n-such.com/detail.aspx?ID=2320>. Acesso em: 14 abr. 2012. TÓPICO 2 | A PEDAGOGIA MONTESSORI 31 FIGURA 16 – MATERIAL DIDÁTICO 2 FONTE: Disponível em: <http://montessori-n-such.com/detail. aspx?ID=1333>. Acesso em: 14 abr. 2012. Você já viu algum destes materiais? Já os utilizou em suas aulas? Muitos destes materiais estão disponíveis nas escolas e, às vezes, ficam parados, sem uso, por não sabermos explorá-los. Caso a sua escola não tenha estes materiais disponíveis, você pode criá-los utilizando materiais diversos como potes, madeira, entre outros, é só usar a criatividade. Além destes, muitos outros materiais didáticos foram criados por Montessori. Quer conhecer um pouco mais? Veja a nossa indicação de leitura: DICAS INDICAÇÃO DE LEITURA: MONTESSORI, Maria. Pedagogia científica: a descoberta da criança. São Paulo: Flamboyant, 1965. Este livro foi o primeiro escrito por Montessori e relata sua experiência e seu método, desde o início da sua caminhada como professora. FONTE: Disponível em: <http://www.sebodomessias.com.br/sebo (S(iiag4r45q3bb3u55hgrgv0ad))/detalheproduto.aspx?idItem=666169>. Acesso em: 15 jun. 2012. Todos os materiais didáticos desenvolvidos por Montessori foram metodicamente criados e padronizados, de tal forma que a criança que escolhesse livremente brincar com um dos objetos, fosse conduzida, sem saber, a desenvolver- se intelectualmente pelas situações previamente determinadas. UNIDADE 1 | AS PRINCIPAIS CONCEPÇÕES TEÓRICAS DA EDUCAÇÃO INFANTIL: RELAÇÃO TEÓRICO-PRÁTICA 32 Para cada um dos sentidos havia um exercício que promovia o desenvolvimento de todas as funções corporais. Esses exercícios eram praticados em grupo e socializados através de uma discussão, reforçando seu aspecto social de educação. Quando a criança se encontra diante do material, ela responde com um trabalho concentrado, sério, que parece extrair o melhor de sua consciência. Parece realmente que as crianças estão atingindo a maior conquista de que seus espíritos são capazes: o material abreà inteligência vias que, nessa idade, seriam inacessíveis sem ele (MONTESSORI, 1969, p. 197-198 apud RÖHRS, 2010, p. 23). Desta forma, o professor deixa de ser o centro do processo educativo e passa a agir de fora. Sua tarefa é observar cientificamente e descobrir as necessidades e possibilidades dos alunos. De acordo com Montessori (1972, p. 38 apud RÖHRS, 2010, p. 22), “[...] para que [a criança] progrida rapidamente, é necessário que a vida prática e a vida social estejam intimamente misturadas à sua cultura”. FIGURA 17 – CRIANÇAS BRINCANDO COM OS JOGOS NO JARDIM DA ESCOLA MONTESSORI FONTE: Disponível em: <http://www.michaelolaf.net/maria.html> Acesso em: 16 abr. 2012. Para Montessori (1965), a educação das crianças deve ser equilibrada desde o início, produzindo impressões positivas de expectativa e comportamento a fim de desenvolver estruturas e esquemas com os quais novas experiências serão confrontadas. TÓPICO 2 | A PEDAGOGIA MONTESSORI 33 Para ser eficaz, uma atividade pedagógica deve consistir em ajudar as crianças a avançar no caminho da independência; assim compreendida, esta ação consiste em iniciá-la nas primeiras formas de atividade, ensinando-as a serem autossuficientes e a não incomodar os outros. Ajudá-las a aprender a caminhar, a correr, subir e descer escadas, apanhar objetos do chão, vestir-se e pentear-se, lavar-se, falar indicando claramente as próprias necessidades, procurar realizar a satisfação de seus desejos: eis o que é uma educação na independência. (MONTESSORI, 1965, p. 71). Ainda de acordo com Montessori (1965), existem momentos em que a criança está mais receptiva a determinadas experiências (aprender a linguagem, ter domínio das relações etc.), ao que chamou de períodos sensíveis na aprendizagem. Se neste momento a criança receber a atenção necessária, o professor pode promover períodos de aprendizagem intensa e eficaz. Caso o professor deixe passar este momento, as possibilidades que a criança oferece serão para sempre perdidas. Maria Montessori tentou criar uma ciência da educação, cuja abordagem constituía-se numa ciência da observação, exigindo de todos os participantes do processo educativo uma formação nesses métodos, permitindo maior controle e verificação científica. Montessori pensou num educador diferente: “No lugar da palavra [ele deve] aprender o silêncio; no lugar de ensinar, ele deve observar; no lugar de se revestir de uma dignidade orgulhosa que quer parecer infalível, se revestir de humildade”. (MONTESSORI, 1976, p. 123 apud RÖHRS, 2010, p. 24). 5 PAPEL DO PROFESSOR NA EDUCAÇÃO MONTESSORI FIGURA 18 – MONTESSORI COM AS CRIANÇAS FONTE: Disponível em: <http://www.bayareamontessoriassociation. com/> Acesso em: 16 abr. 2012. UNIDADE 1 | AS PRINCIPAIS CONCEPÇÕES TEÓRICAS DA EDUCAÇÃO INFANTIL: RELAÇÃO TEÓRICO-PRÁTICA 34 Para Montessori, cada criança leva dentro de si as potencialidades do homem que virá a ser um dia, podendo desenvolver, assim, suas capacidades físicas, emocionais, intelectuais e espirituais ao máximo. A Pedagogia Científica leva em consideração uma escola que permite o desenvolvimento das manifestações espontâneas e da personalidade da criança. “[...] deve surgir uma pedagogia do estudo individual do escolar, isto sòmente será possível graças à observação de crianças livres, isto é, de crianças observadas e estudadas em suas livres manifestações, sem nenhum constrangimento. (MONTESSORI, 1965, p. 25, grifos no original). Para que isto aconteça, tornava-se necessário “[...] despertar na consciência do educador o interesse pelas manifestações dos fenômenos naturais em geral, levando-o a amar a natureza e sentir a ansiosa expectativa de todo aquele que aguarda o resultado de uma experiência que preparou com cuidado e carinho”. (MONTESSORI, 1965, p. 13, grifos no original). Montessori entende o trabalho do professor como o de um guia: [...] ensinando o manuseio do material, a procura de palavras exatas, orientando cada trabalho; guia ao impedir qualquer desperdício de energia ou, eventualmente, restabelecendo o equilíbrio. Verdadeiro guia no caminho da vida, ele não instiga nem estanca; satisfaz-se com sua tarefa ao indicar a esse valioso peregrino, que é a criança, o caminho certo e seguro. (MONTESSORI, 1965, p. 88). FIGURA 19 – PROFESSOR MONTESSORI FONTE: Disponível em: <http://www.bayareamontessoriassociation.com/>. Acesso em: 17 abr. 2012. De acordo com Montessori (2003), tornar-se um “professor Montessori” é tornar-se um alegre observador e livrar-se da onipotência. TÓPICO 2 | A PEDAGOGIA MONTESSORI 35 Se o professor puder realmente penetrar no prazer de ver as coisas nascendo e crescendo sob seus próprios olhos e puder vestir-se com o traje da humildade, muitos prazeres – que são negados àqueles que assumem infalibilidade e autoridade diante de uma classe – estarão reservados a ele. (MONTESSORI, 2003, p. 123). Para Montessori (2003), o professor torna-se vencedor ao renunciar ao poder e à autoridade, atingindo uma paciência, um imenso interesse em assistir, a paciência de um cientista. O mestre há de ter não só a capacidade de um preparador de laboratório, como também o interesse de um observador ante os fenômenos naturais. Segundo nossa metodologia, deverá ser mais ”paciente” que “ativo”; e sua paciência se alimentará de uma ansiosa curiosidade científica e de respeito pelos fenômenos que há de observar, É necessário que o mestre entenda e viva seu papel de observador [...]. (MONTESSORI, 1965, p. 69). E então, caro(a) acadêmico(a), você observa as crianças com as quais trabalha ou convive no seu dia a dia? Que tal exercitar-se para isto? Afinal, esta é uma qualidade importante ao educador! Inicie observando as crianças que lhe são mais próximas: filhos, sobrinhos, primos..., não apenas no sentido de olhá-las, mas, sim, de percebê-las, compreendê-las. 36 RESUMO DO TÓPICO 2 Neste tópico, você aprendeu que: • Montessori nasceu em 1870, na Itália, onde concluiu o curso de medicina. Sempre se interessou pelo ensino das crianças deficientes. Faleceu em 1952, com 81 anos. • As casas das crianças eram espaços adaptados ao tamanho da criança, de forma a desenvolver o senso de responsabilidade de cada uma. • O papel do professor é ajudar a criança a avançar na própria independência, estimulando-a a realizar as tarefas do dia a dia, sozinha. • Montessori criou o programa com exercícios da vida diária, para que as crianças pudessem vivenciar a vida real realizando atividades do cotidiano. • Os exercícios propostos por Montessori estimulavam a paciência, a exatidão e a repetição, reforçando a concentração da criança. • Montessori criou diversos materiais didáticos, com o intuito de motivar a criança a ter maior contato com a sua própria consciência. • Os materiais didáticos de Montessori constituem-se em cinco grupos: material sensorial; material de linguagem; material de matemática; material de ciências e material de conteúdo adulto. • Todos os materiais criados por Montessori, que a criança pode escolher livremente, fazem com que ela, mesmo sem saber, desenvolva-se intelectualmente. • Para Montessori, o professor deixa de ser o centro do processo educativo e passa a agir de fora, observando. • Existem períodos sensíveis de aprendizagem, aos que o professor deve estar atento, a fim de estimular a criança para o aprendizado ao qual está mais sensível. Se o professor deixar passar este período, esta possibilidade de intervenção estará para sempre perdida. • Para Montessori, ser um professor Montessori é tornar-se um alegre observador e livrar-se da onipotência. Deve renunciar ao poder da autoridade, atingindo uma intensa paciência e um imenso interesse em assistir. 37 1 Prezado(a) acadêmico(a)! Você já conhecia os materiais didáticospropostos por Montessori? Utiliza algum deles em suas aulas? Quais? De que forma? ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ___________________________________________________________________ 2 Para Montessori o professor tem um papel importante. Qual é? ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ___________________________________________________________________ ___________________________________________________________________ 3 De que forma a criança aprende na educação Montessori? ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ AUTOATIVIDADE 38 39 TÓPICO 3 A PEDAGOGIA FREINET UNIDADE 1 1 INTRODUÇÃO Em vez de considerar, como faz a escola tradicional, que a criança nada sabe e que ao educador cabe ensinar-lhe tudo – o que é pretensioso e irrealizável – partimos, para o nosso ensino, das tentativas naturais à ação, à criação, ao amor do belo, à necessidade de se exprimir e de se exteriorizar. Ajudamos o indivíduo a realizar-se e a apurar, pela ação, o seu sentido artístico e latente [...] nele preservamos e cultivamos o seu sentido literário, poético, científico, matemático; e, com este expediente, vamos sempre mais alto e mais longe [...]. (FREINET, 1977, p. 237). Você já ouviu falar em Freinet ou na Pedagogia do Bom Senso? E na Pedagogia do Trabalho ou na Pedagogia do Êxito? É bem provável que já tenha ouvido falar nas aulas-passeio (ou estudos de campo), na troca de correspondências entre escolas ou nos cantinhos pedagógicos, certo? Estas atividades foram desenvolvidas por Freinet e encontram-se difundidas em milhares de escolas. Mas será que Freinet foi um professor tradicional? O que você pensa a respeito? Você conhece os conceitos e atividades desenvolvidas por ele? Bem longe de ser um educador tradicional, Freinet foi um observador sensível e atencioso. Percebeu que a escola existente na época era muito autoritária e insensível com os alunos e procurou formas de aproximar a escola do dia a dia das crianças. Abandonou os manuais escolares tradicionais e criou um novo modo de trabalho junto com os seus alunos, procurando responder às indagações que surgiam no cotidiano, nas diferentes áreas do conhecimento. Freinet sugeriu, através de suas publicações, que alunos e professores criassem seus próprios textos e fichas de estudo para a aplicação das aulas. Freinet foi um professor bastante ativo e preocupado com a educação. Realizou diversos estudos e pesquisas, publicou diversos artigos e debates, viajou muito em busca de novidades, procurando sempre inovar suas práticas pedagógicas. E então, acadêmico(a), vamos estudar um pouco mais sobre a vida de Freinet? UNIDADE 1 | AS PRINCIPAIS CONCEPÇÕES TEÓRICAS DA EDUCAÇÃO INFANTIL: RELAÇÃO TEÓRICO-PRÁTICA 40 2 CÉLESTIN FREINET (1886-1966) Para entendermos Freinet um pouco melhor, vamos nos apoiar nos textos de Elias (2008), Sampaio (1989) e Oliveira (2005). FIGURA 20 – FREINET FONTE: Disponível em: <http://www.pedagogiaemfoco.pro.br/ per06.htm>. Acesso em: 15 maio 2012. Célestin Freinet nasceu em 15 de outubro de 1896, na cidade de Gars, região de Provença no sul da França. Sua infância e juventude foi no campo, em uma área rural, em meio aos valores e comportamentos do homem do campo, o que influenciou sua atividade na pedagogia. Seus primeiros estudos foram em uma escola sem muitos recursos e com métodos pedagógicos tradicionais. Na adolescência mudou-se para Nice a fim de cursar o Magistério. Entre os anos 1914 e 1918, no período da Primeira Guerra Mundial, Freinet alistou-se no exército, interrompendo seus estudos no magistério. Em 1914, lutou na guerra e foi prejudicado pelos gases tóxicos utilizados no campo de batalha. Ganhou baixa do exército, pois os gases afetaram seus pulmões para o resto da vida. Antes de concluir o Curso Normal, iniciou suas atividades como professor- adjunto na aldeia de Bar-sur-Loup, em 1920, onde desenvolveu algumas das suas principais técnicas: a aula-passeio e o livro da vida. Entre 1921 e 1924 fundou uma cooperativa de trabalho junto com os aldeões e deu início às primeiras correspondências entre as escolas. Preocupado com a qualidade do ensino e engajado em conhecer novas práticas, Freinet visita escolas consideradas de vanguarda da pedagogia mundial, de Petersen, em Iena; de Altona, em Hamburgo; escolas soviéticas vanguardistas e politécnicas; as escolas de Decroly e de Montessori, respectivamente, na França e Itália; e a Casa dos Pequeninos, criada por Claparède, em Genebra. (ELIAS, 2008, p. 25). TÓPICO 3 | A PEDAGOGIA FREINET 41 Envolvido pelas ideias da Escola Nova e influenciado pelos teóricos que debatiam uma nova concepção de educação, infância e escola, trabalhou ativamente com seus alunos de forma a construir práticas pedagógicas vivas. NOTA ESCOLA NOVA é um movimento em prol da renovação do ensino que foi especialmente forte na Europa, na América e no Brasil, na primeira metade do século XX. Este movimento é contra o ensino tradicional centrado no professor e nos materiais didáticos prontos, propondo uma educação mais ativa e centrada no aluno. No Brasil este movimento tornou-se mais visível a partir da década de 30, com o Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova (1932). Para conhecer um pouco mais sobre este movimento no Brasil, acesse: <http://www.dominiopublico.gov.br/pesquisa/DetalheObraForm.do?select_action=&co_ obra=205210>. Em 1927, suas ideias e práticas já eram bastante conhecidas e divulgadas para além da sua escola e aldeia. Neste mesmo ano fundou a Cooperativa do Ensino Leigo, visando ao desenvolvimento e intercâmbio dos instrumentos pedagógicos criados por ele. Mais ou menos por esta época casou-se com Élise, uma artista plástica que havia vindo trabalhar com ele meses atrás. Editou o livro “A Imprensa na Escola” e criou a revista “La Gerbe” (o ramalhete), contendo poemas infantis. Mudou-se para Saint-Paul de Vence, juntamente com Élise, sua parceira e divulgadora ativa dos seus trabalhos. Nesta mesma época, Freinet participou de um Congresso Internacional de Educação em Tours, publicando o primeiro número da Biblioteca de Trabalho, composto por brochuras escritas por seus alunos, e o fichário escolar cooperativo. Em 1932, o movimento educacional iniciado por Freinet já havia conquistado adeptos na Espanha e Bélgica. Entre 1933 e 1939, Freinet intensifica a troca de correspondência entre escolas, tornando-se alvo de desconfianças dos conservadores franceses e, por causa disto, é exonerado da função de professor em Saint-Paul de Vence, mas continuou trabalhando na cooperativa. Depois de algum tempo, com a ajuda de doações, Freinet abre a sua própria escola: a Escola de Vence, mas o Ministério da Educação não a reconhece oficialmente, por não seguir os métodos pedagógicos da época. Apesar disto, Freinet trabalha arduamente criando o Conselho Cooperativo (gestão participativa), os jornais murais, a imprensa escolar, as fichas autocorretivas,a correspondência escolar, os ateliers de arte, as aulas-passeio e o Livro da Vida (mais à frente nos aprofundaremos mais em cada uma destas metodologias). Juntamente com Romain Rolland lança o movimento Frente da Infância. UNIDADE 1 | AS PRINCIPAIS CONCEPÇÕES TEÓRICAS DA EDUCAÇÃO INFANTIL: RELAÇÃO TEÓRICO-PRÁTICA 42 Com o início da Segunda Guerra Mundial, Freinet é preso e vai para o campo de concentração de Var, onde adoece novamente do pulmão. Neste período em que passou preso, Freinet aproveitou para dar aulas aos seus companheiros de prisão e escrever suas obras pedagógicas. Élise se esforça em libertá-lo e, após um ano, finalmente consegue. Ao sair, Freinet passa a integrar o Movimento da Resistência Francesa. Após o final da Segunda Guerra, Freinet e Élise reorganizam a escola e a cooperativa em Vence. Entre 1947 e 1956, Freinet cria o ICEM (Institut Coopératif de l'École Moderne, em português, Instituto Cooperativo da Escola Moderna) e lança uma campanha em nível nacional em favor da reforma do número máximo de alunos em sala de aula: 25, algo que antes girava em torno de 40 alunos. No ano seguinte, seus seguidores fundam a Federação Internacional dos Movimentos da Escola Moderna (FIMEM), que atualmente reúne educadores de mais de 40 países. A partir dos anos 50 a Pedagogia Freinet já estava consolidada e ao falecer, em 1966, com 80 anos, Freinet já era reconhecido mundialmente como crítico da escola tradicional e reformulador das teorias da Escola Nova. DICAS E aí, acadêmico(a)? Ficou curioso(a) ou apaixonado(a) por Freinet? Quer conhecer um pouco mais sobre ele? Assista ao filme Célestin Freinet, da Coleção Grandes Educadores, Edições Paulinas. SINOPSE: Célestin Freinet foi um dos maiores educadores do século XX. Pedagogo humanista, autodidata, político e sindical, sintetizou em sua obra as aquisições da psicologia e da pedagogia, tornando- as aplicáveis às práticas cotidianas em classe. A Pedagogia Freinet é um conjunto original de propostas teóricas, instrumentos e técnicas assentadas em alguns princípios e eixos pedagógicos: cooperação, livre expressão, responsabilidade, solidariedade, comunicação e documentação. Freinet, através de seu método natural de aprendizagem, deixa um importante legado para a formação de seres íntegros, sociais e políticos, capazes de trilhar seus destinos individual e socialmente na construção de uma sociedade democrática e pacífica. FONTE: Disponível em: <http://cineaprendizagem.blogspot.com.br/2010/08/celestin- freinet.html>. Acesso em: 16 maio 2012. 3 A PEDAGOGIA FREINET Célestin Freinet foi professor primário durante quase toda a sua vida, desenvolvendo sua teoria com base na sua prática pedagógica. Isto o torna diferente de outros teóricos ou pensadores da educação, que apenas pensaram sobre a escola sem vivenciar o dia a dia da sala de aula. TÓPICO 3 | A PEDAGOGIA FREINET 43 As propostas pedagógicas de Freinet, desenvolvidas conjuntamente com as crianças, visavam desenvolver o gosto pelo trabalho, pela escola e torná-las cidadãos críticos e conscientes do seu meio social. De acordo com Elias (2008, p. 13), Freinet “[...] propõe a edificação de uma escola prazerosa, onde a criança queira estar, permanecer, onde o coração, a afetividade e as emoções predominem, onde haja alegria e prazer para descobrir e aprender”. Freinet entendia que a educação deveria proporcionar à criança a realização de um trabalho existente na vida real. Para realizar suas propostas de ensino, Freinet pesquisava de que forma a criança pensava e como construía o conhecimento. Por meio da observação sabia de que forma, quando e como intervir na aprendizagem da criança e despertar nela a vontade de aprender. No seu Livro de Notas, que veio a substituir o Diário de Guerra, Freinet anotava todos os dias tudo o que ouvia dos alunos, os termos repletos de poesia, as observações e gestos originais e espontâneos, tudo, enfim, que o ajudasse a conhecer melhor a personalidade de cada criança, seus sucessos e insucessos. Otimista, vê na ação educativa o motor condutor do progresso social e moral da sociedade. (ELIAS, 2008, p. 23). Para Sampaio (1989), a Pedagogia Freinet veio atender à necessidade vital da criança de chegar ao seu pleno desabrochar como um indivíduo autônomo, um ser responsável socialmente, codetentor e coedificador de uma cultura. Sua pedagogia centrava-se em quatro eixos: FIGURA 21 – EIXOS DA PEDAGOGIA FREINET FONTE: As autoras UNIDADE 1 | AS PRINCIPAIS CONCEPÇÕES TEÓRICAS DA EDUCAÇÃO INFANTIL: RELAÇÃO TEÓRICO-PRÁTICA 44 A prática pedagógica de Freinet tem por base a cooperação entre educadores, entre estudantes e entre ambos. Freinet acreditava tanto no trabalho cooperativo que criou diversas cooperativas, como vimos anteriormente, lançando o movimento pedagógico cooperativo. Freinet (1975, p. 21) dizia que ele e seus companheiros haviam “rompido o círculo do individualismo estéril". Sua proposta pedagógica unia a cooperação do trabalho coletivo e a valorização da produção individual da criança, ou seja, respeitava o ritmo da criança, mas fazia com que ela percebesse que pertencia a um grupo e que sua produção tinha valor não apenas para si, mas também para o grupo no qual convivia, podendo ser inclusive ampliada e modificada com o auxílio dos colegas. De acordo com Elias (2008, p. 42), [...] a Pedagogia Freinet pode ser vista como uma prática coletiva, uma vez que tem por objetivo maior o desenvolvimento da compreensão crítica da realidade e a ação participativa na transformação, segundo as necessidades de todos. Portanto, o sujeito da ação coletiva e da educação não é o indivíduo, mas o conjunto de pessoas que participam do processo. Segundo Sampaio (1989), a Pedagogia Freinet conseguia esta cooperação por desenvolver as seguintes capacidades: FIGURA 22 – CAPACIDADES DESENVOLVIDAS PELA PEDAGOGIA FREINET FONTE: As autoras TÓPICO 3 | A PEDAGOGIA FREINET 45 Para garantir o desenvolvimento destas capacidades, Freinet criou diversas técnicas, que veremos no próximo item, e as Invariantes Pedagógicas, que darão suporte para o professor utilizá-las. ESTUDOS FU TUROS No item: PAPEL DO PROFESSOR NA ESCOLA FREINET, veremos um pouco mais sobre as invariantes pedagógicas propostas por Freinet. Freinet trabalha com uma proposta que privilegia a aprendizagem por meio de experiências. Para ele, se a criança acertar um experimento, irá repeti-lo por diversas vezes até avançar com a cooperação do professor. De acordo com Elias (2008, p. 47), As características da Pedagogia Freinet [...] são a cooperação, a comunicação compartilhada e a tomada de decisões. Empenhada numa atividade que a requisite física e psicologicamente, a criança é naturalmente disciplinada, concentra-se nas atividades e se realiza, ao descobrir suas potencialidades. Na proposta de Freinet, a relação professor/aluno é muito importante no processo de aprendizagem da criança. Além disso, o professor não deve nunca ignorar o aspecto político e social da comunidade onde a escola está inserida, pois sua pedagogia deve preocupar-se com a formação de um ser social atuante e crítico. Sua trajetória, portanto, enquanto professor primário, leva-o a estabelecer um paralelo entre educação e política. Centrado na ideia do trabalho, valoriza o homem, o coletivo, o homem da periferia e das classes trabalhadoras, considerando ser necessário levar o educando a construir a própria realidade histórico-social. (ELIAS, 2008, p. 14). Para Freinet (1975), o professor deve mesclar seu trabalho com a vida em comunidade, criando associações, conselhos, eleições, enfim, instigando diversas maneiras de participação e colaboração para a formação do aluno, direcionando sua pedagogia em defesa da fraternidade, do respeito e do crescimento cooperativoe feliz da sociedade. A sua proposta pedagógica exige uma postura frente à vida que difere de tudo o que se ensinava nas escolas. Na prática, procurava seguir o empenho dos alunos e transformá-los pelo trabalho, por uma vivência coletiva, permeada pelo meio ambiente, pela ação. Para ele, a liberdade faz parte do aprendizado histórico-social. (ELIAS, 2008, p. 17). 46 UNIDADE 1 | AS PRINCIPAIS CONCEPÇÕES TEÓRICAS DA EDUCAÇÃO INFANTIL: RELAÇÃO TEÓRICO-PRÁTICA FIGURA 23 – CRIANÇAS BRINCANDO/APRENDENDO FONTE: Disponível em: <http://inventariodamemoria.blogspot.com. br/2012/01/liberdade-de-brincar.html>. Acesso em: 4 set. 2012. Freinet sempre deu muita importância ao trabalho que, para ele, é o centro das atividades escolares, fazendo com que a criança exerça o seu poder e cresça por meio dele. Por isso sua teoria é muito conhecida como Pedagogia do Trabalho. De acordo com Elias (2008, p. 46), O trabalho é o grande princípio, o motor e a filosofia de sua pedagogia [...], que parte da atividade para chegar às outras aquisições. Para ele, influenciado pela filosofia marxista, a escola pretendida e pensada é a escola do trabalho, perfeitamente integrada no processo geral da vida: a criança torna-se sujeito e o professor, aquele que orienta, estimula e facilita a aprendizagem. O trabalho permite aos homens se estruturar e educar ao mesmo tempo em que transformam a natureza. Para Freinet (1975), o aprender deveria passar pela experiência de vida e isso só é possível pela ação, através do trabalho, que engloba a pesquisa, a documentação e a experimentação. O trabalho desenvolve o pensamento lógico e inteligente. Nele o ser humano se exprime e se realiza. Não significa educação pelo trabalho manual e sim a união entre intelectualidade e manipulação, pensamento e ação; o desenvolvimento do pensamento até o lógico e inteligente ocorre a partir de ocupações materiais. E, para chegar ao valor educativo do trabalho, propõe inicialmente a observação, em seguida a expressão, depois a experimentação; o valor educativo destas operações está no resultado da união das três. (FREINET apud GADOTTI, 1997, p. 177). De acordo com Elias (2008), a sala de aula é um lugar que convida ao trabalho e Freinet distingue quatro etapas educativas: pré-ensino, jardins de infância, escola maternal e infantil e escola elementar, que veremos no quadro a seguir: TÓPICO 3 | A PEDAGOGIA FREINET 47 QUADRO 4 – ETAPAS EDUCATIVAS DA EDUCAÇÃO FREINET PERÍODO FAIXA ETÁRIA DEFINIÇÃO METODOLOGIA Período de pré- ensino Do nascimento até por volta dos dois anos. É o período da prospecção por tentativa, quando a criança procura familiarizar-se com o mundo. Para esse período prevê atividades em parques, jardins públicos e espaços livres, nos quais as crianças possam ter contato direto com a natureza através de experiências tateantes. Período correspondente ao jardim de infância Dos 2 aos 4 anos. É o período de adaptação ou arrumação, no qual a criança não se contenta em conhecer por simples curiosidade. Nesse período que precede a educação sistemática, o educador deve deixar a criança entregue a múltiplas experiências, as quais serão como que ensaios preparatórios para que atinja por si a eficiência social, antes de atingir a etapa seguinte. A escola maternal e infantil Dos 4 aos 7 anos. É o período em que a criança inicia a ordenação de sua personalidade. Nesse período tem início a educação sistemática. Para chegar a esta etapa a criança já conquistou o meio em que vive adquirindo diversas experiências, iniciando agora o período do trabalho: o trabalho-jogo e o jogo-trabalho. A escola elementar Dos 7 aos 14 anos. É o período no qual brincadeira e trabalho se confundem. Freinet propõe para essa faixa etária outra organização da classe, com oficinas especializadas para trabalhos manuais, intelectuais e artísticos, não deixando de lado o trabalho junto à natureza. FONTE: Adaptado de: Elias (2008) A liberdade também é um aspecto importante nas práticas pedagógicas propostas por Freinet, significando a capacidade de o ser humano vencer as barreiras e obstáculos impostos pela vida. Em seus estudos, Freinet propôs que o professor deveria almejar uma escola ideal, criativa e libertadora e estudar o que impede a escola de ser assim. 48 UNIDADE 1 | AS PRINCIPAIS CONCEPÇÕES TEÓRICAS DA EDUCAÇÃO INFANTIL: RELAÇÃO TEÓRICO-PRÁTICA DICAS Quer saber mais sobre a Pedagogia FREINET? Veja as nossas indicações de leitura: FREINET, Célestin. Para uma escola do povo. São Paulo: Martins Fontes, 2001. FREINET, Célestin. Pedagogia do bom senso. São Paulo: Martins Fontes, 2004. A proposta educacional de Freinet é uma educação que respeita a criança como ela é, a diversidade, a individualidade de cada um, auxiliando na formação da sua personalidade por meio da vivência de sua cidadania. Seu objetivo é formar uma criança responsável, consciente dos seus atos e crítica na sua contribuição para a sociedade. Sua metodologia parte do impulso criador da criança e de técnicas adequadas, como veremos a seguir. 4 METODOLOGIA A metodologia utilizada por Freinet baseia-se em diferentes técnicas pedagógicas, criadas por ele, com o intuito de “[...] envolver todas as crianças no processo de aprendizagem, respeitando seus direitos de crescer em liberdade, independente das diferenças de caráter, inteligência ou meio social”. (ELIAS, 2008, p. 13). Foi com base nestas técnicas, que Freinet desenvolveu todo o seu trabalho na educação. Vamos conhecê-las? - Cooperativa escolar – é uma forma de organização em que todos participam. Professor e alunos realizam um acordo, definindo os princípios, objetivos e meios que serão utilizados pelo grupo para alcançar as metas. Todas as atividades são realizadas de forma cooperativa. O grupo contém um coordenador e um redator, reúne-se para avaliar os objetivos alcançados e o que falta ser feito para alcançar as metas. - Planos de trabalho – são elaborados pelos professores e crianças, de forma conjunta, a cada início de ano e geram grande motivação do grupo para a aprendizagem do programa. O programa curricular que deve ser cumprido é apresentado às crianças pelo professor, que explica os motivos de estudar tais conteúdos e propõe que seja feito um plano mensal e semanal para cumprir o programa. Após a distribuição do programa ao longo do ano, as crianças escolhem livremente quais materiais e que estratégias serão utilizadas para o alcance dos objetivos. TÓPICO 3 | A PEDAGOGIA FREINET 49 - Texto livre – é a base da Pedagogia Freinet. São escritos, como o próprio nome diz, de forma livre, sem cobranças em relação ao tema ou ao formato, expressando a vontade da criança, sua curiosidade e o que ela considera mais importante. Não há um momento específico para a produção do texto. Ele é escrito espontaneamente, no momento em que a criança sentir vontade. De acordo com Sampaio (1989), só assim o texto apresentará espontaneidade, vida, criação, ligação íntima e permanente com o meio e a expressão profunda de cada criança ou jovem. FIGURA 24 – CRIANÇA ESCREVENDO FONTE: Disponível em: <http://www.pedagogiaaopedaletra.com/posts/ as-dificuldades-da-linguagem-escrita-na-educacao-infantil/>. Acesso em: 13 ago. 2012. O texto livre, porém, não nasce sozinho. A criança precisa ser estimulada a produzir, percebendo que o que escreve é importante para as outras pessoas, pais, comunidade e outras escolas para onde os jornais e cartas são enviados. Assim ela irá produzir seus textos com maior prazer e vontade. Após a escrita individual, o grupo irá escolher um dos textos para ser [...] aperfeiçoado coletivamente, quer no que diz respeito à verdade do conteúdo, quer na suaforma sintática gramatical e ortográfica. A obra que depois é dada aos pequenos tipógrafos é o resultado do nosso método natural de trabalho, que respeita o pensamento infantil, mas contribui com seu auxílio técnico, enquanto espera que a criança esteja em condições de caminhar pelo seu pé e de nos trazer textos e poemas que só teriam a perder com a nossa intervenção. (FREINET, 1974, p. 21). - Imprensa escolar – é um tipo de tipografia montada na escola, pelo meio da qual os alunos imprimem seus próprios textos para envio aos pais, aos membros da comunidade em geral e, por que não, para outras escolas. 50 UNIDADE 1 | AS PRINCIPAIS CONCEPÇÕES TEÓRICAS DA EDUCAÇÃO INFANTIL: RELAÇÃO TEÓRICO-PRÁTICA FIGURA 25 – CRIANÇA MANUSEANDO O TIPÓGRAFO FONTE: Disponível em: <http://fr.wikipedia.org/wiki/Fichier:Imprimerie_Freinet_4. jpg>. Acesso em: 14 ago. 2012. Para Freinet (1974) o uso da imprensa na escola é importante para a valorização do registro do pensamento da criança e para que a criança desmistifique o texto impresso que antes só via em revistas, livros e jornais. Além disso, o fato de imprimir um texto para que outro o leia faz com que a criança tenha mais responsabilidade com a qualidade do texto que produz, estabelecendo uma relação íntima com este texto. É necessário que a criança planeje o espaço que o texto irá ocupar graficamente, o tamanho e tipo da fonte a ser usado e a página em que ele será impresso. A impressão do texto faz com que ele se torne algo concreto, passível de manipulação. - Jornal na escola – para o jornal, a criança "[...] não escreve apenas o que interessa a ela; escreve aquilo que, nos seus pensamentos, nas suas observações, nos seus sentimentos e nos seus atos é susceptível de interessar os seus camaradas e de vir a interessar os seus correspondentes". (FREINET, 1974, p. 21). O jornal permite a interação com a comunidade, com os pais e com outras escolas, levando a produção gráfica e literária das crianças a diversos lugares. É produzido de forma cooperativa, reunindo textos de diversas crianças. Sua impressão é feita diariamente e reunida no formato de jornal, para ser enviado mensalmente aos correspondentes da escola. TÓPICO 3 | A PEDAGOGIA FREINET 51 FIGURA 26 – CRIANÇAS SELECIONANDO TEXTOS E IMAGENS PARA O JORNAL DA ESCOLA FONTE: Disponível em: <http://javiercasani.edu.glogster.com/de-la-imprenta-al- blog/>. Acesso em: 17 jul. 2012. - Correspondência entre escolas – de acordo com Sampaio (1989), a correspondência abre a escola para a vida, e a vida se mistura com a vida das crianças. É com a correspondência escolar que a criança faz a aprendizagem da vida cooperativa, tão essencial na Pedagogia Freinet. A criança deve contar com os outros e confiar neles. Uma classe se corresponde com outra só depois de os professores terem se comunicado e organizado os pares de alunos correspondentes. Os professores também trocam correspondências e esse vínculo é demais importante. Após a escolha dos pares, as crianças preparam o gráfico para identificar os correspondentes e indicar a periodicidade das cartas enviadas. (SAMPAIO, 1989, p. 195). Além dos textos e imagens produzidos pelas crianças, a correspondência contém informações sobre a região onde a escola está localizada, fitas com gravações, presentes elaborados pela criança ou pela própria família, receitas de comidas típicas e outras coisas sobre a sua comunidade que a criança tenha interesse em compartilhar. - Livro da vida – é um documento em que ficam registrados todos os acontecimentos importantes do grupo. Constitui-se de uma grande folha onde podem ser coladas outras, conforme a necessidade. Nele as crianças escrevem, colam desenhos, notícias, fotos, recortes, registrando toda a evolução do grupo. De acordo com Oliveira (2005, p. 10), o livro da vida 52 UNIDADE 1 | AS PRINCIPAIS CONCEPÇÕES TEÓRICAS DA EDUCAÇÃO INFANTIL: RELAÇÃO TEÓRICO-PRÁTICA [...] é o registro dos acontecimentos mais marcantes da classe. Nele o professor e/ou alunos inserem textos produzidos na classe como também podem registrar um fato importante que ocorreu na turma ou fora dela como um passeio, uma visita, atividade marcante vivida pelo aluno, pelo grupo de alunos, pela família e pela comunidade. Este registro vai se constituindo ao longo do ano como um diário da classe ilustrado com desenhos, fotografias, relatos, depoimentos que passam a fazer parte da memória do grupo. Este documento pode ser lido tanto pelos colegas, quanto pelos pais. É o que, nos dias de hoje, chamamos de portfólio, e que contém o registro de todas as atividades desenvolvidas pela criança, demonstrando a sua evolução durante o período que passou na escola. ESTUDOS FU TUROS Fique atento(a)! Na Unidade 3 estudaremos um pouco mais sobre os portfólios. - Fichário escolar – são fichas de assuntos específicos que são elaboradas pelas crianças, substituindo os livros didáticos ou manuais. Os fichários apresentam questões relacionadas à vida das crianças, propostas de atividades e formas de utilização dos materiais. O fichário é classificado por assunto e reunido para publicação e aquisição das outras escolas para uso em sala de aula. As escolas que adquirem os fichários realizam a sua ampliação com as suas próprias experiências. - Jornal mural – é onde as crianças expressam seus anseios, desejos, críticas e opiniões em relação ao funcionamento do grupo e da escola, sendo assinado por elas. Configura-se em uma grande folha de papel dividida em três colunas (que deve ser trocada semanalmente), com as frases: Eu proponho, Eu critico, Eu felicito. - Fichário autocorretivo – são fichas individuais que propõem problemas e apresentam soluções, favorecendo o ritmo próprio da criança na aquisição do conhecimento e possibilitando que a criança se aproxime da Zona de Desenvolvimento Proximal proposta por Vygotsky. Fazem parte deste fichário: • fichas-teste – apresentam problemas a ser resolvidos pelas crianças e permitem avaliar seu desenvolvimento; • fichas-correção – oferecem um trabalho complementar para as crianças que se confundiram ou não souberam resolver as fichas-teste. São uma forma de as crianças vencerem suas limitações individuais com o auxílio de alguém mais experiente. TÓPICO 3 | A PEDAGOGIA FREINET 53 - Biblioteca – para Freinet, é um centro de cultura onde estão disponíveis todos os materiais produzidos pelas crianças, os materiais recebidos de outras escolas ou da comunidade por meio da troca de correspondências, os livros, o canto da impressora, do audiovisual, da leitura, um canto para exposições, um escritório e uma sala para reuniões. - Cantos das atividades – Freinet divide o espaço escolar em cantos de trabalho com atividades diferenciadas. Em cada canto, as crianças encontram o material que necessitam e ao alcance de suas mãos de forma organizada. Há também uma bancada ou mesa para a realização das atividades. Estes cantos absorvem um pequeno número de crianças e estimulam a cooperação, já que elas deverão negociar entre si para poder trabalhar no canto que mais lhe interessa. Com o grupo dividido em grupos menores, o professor não consegue dar atenção a todos ao mesmo tempo, fazendo com que cada grupo procure a solução para os problemas que enfrentam, desenvolvendo a autonomia. FIGURA 27 – CANTOS DE ATIVIDADES NA ESCOLA FREINET FONTE: Disponível em: <http://www.ursusminor.info/msk/freinet.htm>. Acesso em: 15 jul. 2012. 54 UNIDADE 1 | AS PRINCIPAIS CONCEPÇÕES TEÓRICAS DA EDUCAÇÃO INFANTIL: RELAÇÃO TEÓRICO-PRÁTICA - Estudo do meio – é a ideia base da Pedagogia do Trabalho proposta por Freinet. Como o próprio nome já diz, é o estudo do meio onde a criança vive, seja ele físico ou social. Por meio dele, a criança é inserida em seu meio ambiente, desenvolvendo um olharcrítico sobre as transformações que realiza nele. Por meio de entrevistas e pesquisas de campo as crianças procuram documentos para compor um registro ilustrado do local em que vivem. Sempre que fazem novas descobertas, ampliam o registro já existente. FIGURA 28 – ESTUDO DO MEIO FONTE: Disponível em: <http://adrianaoliveiralima.blogspot.com. br/2011/10/2-celestin-freinet.html>. Acesso em: 14 jun. 2012. - Aula-passeio – forma que Freinet encontrou para trazer a alegria e o entusiasmo das crianças para a sala de aula, aproximando o trabalho em sala da vida real das crianças e demostrando que a educação é muito mais eficiente se baseada no prazer da criança. ESTUDOS FU TUROS Na Unidade 2, falaremos um pouco mais sobre os cantinhos das atividades como forma de planejamento do espaço físico em sala de aula. Esta divisão por cantinhos é inclusive sugerida pelo MEC, nos Parâmetros Básicos de Infraestrutura para Instituições de Educação Infantil. TÓPICO 3 | A PEDAGOGIA FREINET 55 FIGURA 29 – AULA-PASSEIO FONTE: Disponível em: <http://seteeducadores.blogspot.com.br/2011/06/7- aula-passeio-freinet-percebeu-e.html>. Acesso em: 13 jun. 2012. Para Freinet (1976, p. 24), a aula-passeio “[...] não era tempo perdido, pois todas as disciplinas escolares tiravam proveito disso”. Nos passeios realizados pela comunidade as crianças observavam os animais, as pedras, as plantas e recolhiam pequenos objetos para levar à sala de aula. Para treinar a pesquisa, que permite a livre expressão, organiza saídas diárias pelas estreitas ruas da vila, onde as crianças observam o trabalho dos marceneiros, ferreiros, dos agricultores, as diversas estações, o céu, os pássaros, o vento etc., trazendo para a sala de aula muitas riquezas: fósseis, nozes, avelãs, folhas, argilas... e até animais. [...] São as aulas-passeio que trazem vida à sala: as observações são comunicadas, comparadas, avaliadas e registradas no Livro da Vida. (ELIAS, 2008, p. 61, grifos no original). Assim que retornavam, eles escreviam no quadro um resumo do passeio que era comentado, transformado e ampliado pelas crianças. Ao final da reformulação do texto, cada criança o copiava em seu caderno. Desta forma, Freinet fazia com que suas aulas fossem animadas e vivas e possibilitava que as crianças conhecessem o seu meio de forma mais aprofundada, contribuindo para a construção coletiva do conhecimento. 5 PAPEL DO PROFESSOR NA PEDAGOGIA FREINET Como vimos anteriormente, as propostas pedagógicas de Freinet centravam-se em uma educação do trabalho. Neste sentido, o papel do professor era o de criar um ambiente laborioso na escola, estimulando as crianças a realizar experiências procurando as respostas às inquietações e necessidades individuais e do grupo, sempre com o auxílio dos colegas. O professor apenas organizaria o trabalho a ser desenvolvido. 56 UNIDADE 1 | AS PRINCIPAIS CONCEPÇÕES TEÓRICAS DA EDUCAÇÃO INFANTIL: RELAÇÃO TEÓRICO-PRÁTICA FIGURA 30 – PROFESSOR E ALUNO FONTE: Disponível em: <http://www.pedagogiaaopedaletra.com/posts/ relacao-professoraluno-na-educacao-infantil/>. Acesso em: 3 jul. 2012. Nas propostas pedagógicas de Freinet (1977), o professor é responsável pela questão metodológica e, segundo ele, conseguirá bons resultados mesmo sem uma preparação especial desde que seja intuitivo, sensível, equilibrado e tiver domínio e autoridade. Para Freinet, de acordo com Elias (2008, p. 46), “[...] cabe à escola e ao professor oferecer modelos, estimular experiências, criar uma atmosfera de trabalho, acompanhar e interpretar suas hipóteses pessoais, não reduzindo sua ação a um ensino estreito, acanhado, exclusivamente escolar e individualista”. O professor deveria limitar-se apenas “[...] à organização do trabalho, sem imposições ou ameaças. Para Freinet, a capacidade de trabalho valoriza o indivíduo, transformando-o em ator eficaz e responsável perante a comunidade e a própria sociedade”. (ELIAS, 2008, p. 47-48). Outra função do professor seria a de colaborar para o êxito das crianças. Freinet não via o erro como algo importante didaticamente. “Os erros são apenas um acidente de percurso, uma pedra na qual se tropeça, um muro que se pode evitar, uma árvore caída que se desloca ou que se contorna; no entanto, a caminhada continua, estimulada até pelas dificuldades que superamos ou ultrapassamos”. (FREINET, 1977, p. 35). Para ele o fracasso desmotiva e deixa a criança instável e insegura. É papel do professor auxiliar a criança a superar o erro de forma afetiva. Para Freinet “[...] só o educador que conhece intimamente a criança e sua natureza psicológica, suas tendências e possibilidades poderá ajudá-la a desenvolver ao máximo sua personalidade, em função das necessidades do meio a que pertence”. (ELIAS, 2008, p. 46). TÓPICO 3 | A PEDAGOGIA FREINET 57 De acordo com Sampaio (1989), para garantir que os professores interessados na Pedagogia Freinet utilizassem as técnicas de forma eficiente, Célestin Freinet organizou uma coleção de princípios para guiar o professor na sua utilização. A estes princípios Freinet chamou de invariantes, porque são aplicadas da mesma forma a qualquer criança, independente da sua cultura. Para cada uma das invariantes, Freinet associou um teste para que o professor pudesse avaliar a sua prática pedagógica. São 32 invariantes, organizadas em três grupos: a natureza da criança, as reações da criança e as técnicas educativas, conforme nos apresenta Sampaio (1989): QUADRO 5 – INVARIANTES PEDAGÓGICAS GRUPO INVARIANTE A NATUREZA DA CRIANÇA 1. A criança é da mesma natureza que o adulto. 2. Ser maior não significa necessariamente estar acima dos outros. 3. O comportamento escolar de uma criança depende do seu estado fisiológico, orgânico e constitucional. AS REAÇÕES DA CRIANÇA 4. A criança e o adulto não gostam de imposições autoritárias. 5. A criança e o adulto não gostam de uma disciplina rígida, quando isto significa obedecer passivamente uma ordem externa. 6. Ninguém gosta de fazer determinado trabalho por coerção, mesmo que, em particular, ele não o desagrade. Toda atitude imposta é paralisante. 7. Todos gostam de escolher o seu trabalho mesmo que essa escolha não seja a mais vantajosa. 8. Ninguém gosta de trabalhar sem objetivo, atuar como máquina, sujeitando-se a rotinas das quais não participa. 9. É fundamental a motivação para o trabalho. 10. É preciso abolir a escolástica. - 10- a. Todos querem ser bem-sucedidos. O fracasso inibe, destrói o ânimo e o entusiasmo. - 10- b. Não é o jogo que é natural na criança, mas sim o trabalho. 11. Não são a observação, a explicação e a demonstração-processos essenciais da escola-as únicas vias normais de aquisição de conhecimento, mas a experiência tateante, que é uma conduta natural e universal. 12. A memória, tão preconizada pela escola, não é válida, nem preciosa, a não ser quando está integrada no tateamento experimental, onde se encontra verdadeiramente a serviço da vida. 58 UNIDADE 1 | AS PRINCIPAIS CONCEPÇÕES TEÓRICAS DA EDUCAÇÃO INFANTIL: RELAÇÃO TEÓRICO-PRÁTICA AS TÉCNICAS EDUCATIVAS 13. As aquisições não são obtidas pelo estudo de regras e leis, como às vezes se crê, mas sim pela experiência. Estudar primeiro regras e leis é colocar o carro na frente dos bois. 14. A inteligência não é uma faculdade específica, que funciona como um circuito fechado, independente dos demais elementos vitais do indivíduo, como ensina a escolástica. 15. A escola cultiva apenas uma forma abstrata de inteligência, que atua fora da realidade e fica fixada na memória por meio de palavras e ideias. 16. A criança não gosta de receber lições autoritárias. 17. A criança não se cansa de um trabalho funcional, ou seja, que atende aos rumos de sua vida. 18.A criança e o adulto não gostam de ser controlados e receber sanções. Isso caracteriza uma ofensa à dignidade humana, sobretudo se exercida publicamente. 19. As notas e classificações constituem sempre um erro. 20. Fale o menos possível. 21. A criança não gosta de sujeitar-se a um trabalho em rebanho. Ela prefere o trabalho individual ou de equipe numa comunidade cooperativa. 22. A ordem e a disciplina são necessárias na aula. 23. Os castigos são sempre um erro. São humilhantes, não conduzem ao fim desejado e não passam de paliativo. 24. A nova vida da escola supõe a cooperação escolar, isto é, a gestão da vida pelo trabalho escolar pelos que a praticam, incluindo o educador. 25. A sobrecarga das classes constitui sempre um erro pedagógico. 26. A concepção atual das grandes escolas conduz professores e alunos ao anonimato, o que é sempre um erro e cria barreiras. 27. A democracia de amanhã prepara-se pela democracia na escola. Um regime autoritário na escola não seria capaz de formar cidadãos democratas. 28. Uma das primeiras condições da renovação da escola é o respeito à criança e, por sua vez, a criança ter respeito aos seus professores; só assim é possível educar dentro da dignidade. 29. A reação social e política, que manifesta uma reação pedagógica, é uma oposição com a qual temos que contar, sem que se possa evitá-la ou modificá-la. 30. É preciso ter esperança otimista na vida. FONTE: Adaptado de: Sampaio (1989) E então, prezado(a) acadêmico(a), o que dizer destas invariantes? Simplesmente fantásticas, não é mesmo? Autoavaliar-se é o caminho! Esta atitude é muito importante para o professor. De acordo com Freinet, TÓPICO 3 | A PEDAGOGIA FREINET 59 [...] a postura do educador deve ser a daquele que possui conhecimentos, mas sabe que são relativos. Sabendo que há diversas possibilidades a seguir, estará sempre atento aos seus alunos, acompanhando as suas aquisições naturais, participando da organização da classe, como membro do grupo, parceiro e orientador do aluno nas investigações. (ELIAS, 2008, p. 41). As atividades pedagógicas propostas pelos professores das escolas Freinet não devem ser algo espontâneo e, sim, cuidadosamente planejado, com objetivos bem claros e precisos do que se pretende alcançar. Com base no seu planejamento inicial, o professor deve conversar com seus alunos e buscar formas de atingir estes objetivos, é o que Freinet chama de Cooperativa de Trabalho e que já vimos anteriormente. Em relação à avaliação dos alunos, Freinet defendia a avaliação contínua na qual professores e alunos se reúnem semanalmente para discutir os resultados, os conteúdos estudados e verificar o que realmente foi compreendido e se ainda há alguma dificuldade em relação ao que foi estudado. Outra forma de avaliação são as fichas autocorretivas em que as próprias crianças podem avaliar o seu desenvolvimento. Para Freinet, A escola e o professor necessitam trabalhar as relações no grupo e a responsabilidade de cada um, tendo como meta o crescimento pessoal/social da classe. Não se deve ter pressa. Se o educador não tiver paciência, não der tempo para o aluno assimilar os conteúdos, não fará mais que um trabalho de superfície, o qual não só pode ser inútil, como perigoso. E, finalmente, reconhecerá que o saber não é um acúmulo de conhecimentos, mas uma maneira de enfrentar qualquer situação para depois analisá-la e comunicá-la. (ELIAS, 2008, p. 40-41, grifos no original). Podemos perceber que a Pedagogia Freinet é muito mais do que uma simples proposta pedagógica e sim uma forma de perceber a criança de forma autônoma, com direito de escolha, liberdade de expressão, opinião própria e direito de fazer críticas. Percebemos nas práticas pedagógicas de Freinet o direito da criança de ser respeitada e valorizada, podendo assim desenvolver sua capacidade criativa e imaginativa. 60 RESUMO DO TÓPICO 3 Neste tópico, você aprendeu que: • Célestin Freinet nasceu em 15 de outubro de 1896, no sul da França. Concluiu o curso normal, foi professor e criou diversas cooperativas de trabalho. Faleceu em 1966, aos 80 anos. • As propostas pedagógicas de Freinet eram desenvolvidas em conjunto com as crianças, visando desenvolver o gosto pelo trabalho, pela escola, tornando-as cidadãos críticos e conscientes. • Propôs a criação de uma escola prazerosa, onde a criança queira permanecer, onde a afetividade predomine e haja alegria em aprender. • Sua pedagogia centrava-se em quatro eixos: cooperação; comunicação; documentação e afetividade. • A proposta pedagógica de Freinet valorizava a produção individual da criança, o trabalho cooperativo e coletivo, respeitando o ritmo da criança e privilegiando a aprendizagem por meio de experiências. • Para Freinet, o professor deve participar ativamente da comunidade onde a escola está inserida. • Freinet distingue quatro etapas educativas: período pré-ensino; período correspondente aos jardins de infância; a escola maternal e infantil e a escola elementar. • Outro aspecto importante da pedagogia Freinet é a liberdade. • Freinet criou diversas técnicas pedagógicas: cooperativa escolar; planos de trabalho; texto livre; imprensa escolar; jornal da escola; correspondência entre escolas; livro da vida, fichário escolar; jornal mural; fichário autocorretivo; biblioteca; cantos das atividades, o estudo do meio e as aulas-passeio. • Para Freinet, o professor deve criar um clima de trabalho na escola, estimulando as crianças a realizar experiências, com a ajuda dos colegas, procurando responder a suas inquietações. • Freinet via o erro como um acidente de percurso, e o professor deve auxiliar a criança a superar este erro de forma afetiva. 61 • Freinet criou 32 invariantes pedagógicas, a fim de orientar o professor da sua pedagogia. • Para Freinet o professor deve autoavaliar-se constantemente. Seu planejamento não deve ser espontâneo, mas cuidadosamente planejado. • Freinet defendia a avaliação contínua dos alunos. 62 1 Caro(a) acadêmico(a)! Como você pôde perceber, Freinet criou diversas metodologias, a fim de colocar em prática o que acreditava enquanto professor. E você, utiliza alguma técnica de Freinet em suas aulas? Quais? Descreva de que forma as aplica em sala de aula. ___________________________________________________________________ ___________________________________________________________________ ___________________________________________________________________ ___________________________________________________________________ ___________________________________________________________________ ___________________________________________________________________ ___________________________________________________________________ 2 Se você ainda não é professor(a), quais metodologias criadas por Freinet achou mais interessantes? Descreva ao menos três e justifique a sua escolha. ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ AUTOATIVIDADE 63 TÓPICO 4 O CONSTRUTIVISMO DE PIAGET UNIDADE 1 1 INTRODUÇÃO 2 JEAN WILLIAM FRITZ PIAGET (1896-1980) […] é na medida em que nós nos adaptamos aos outros que tomamos consciência de nós mesmos. É na medida em que descobrimos que os outros não nos compreendem espontaneamente, e que nós, da mesma forma, não os compreendemos, que nos esforçamos para modelar nossa linguagem de acordo com osmil acidentes que criam essa inadaptação, e que nos tornamos aptos para a análise simultânea dos outros e de nós mesmos. (PIAGET, 1967, p. 201). Quem nunca ouviu falar de Jean Piaget, não existe, não é mesmo? E de sua teoria, a Epistemologia Genética, o que você sabe? Já ouviu falar em construtivismo? Vamos relembrar um pouco. No Caderno de Estudos da disciplina Psicologia Geral e do Desenvolvimento, você estudou os princípios do desenvolvimento cognitivo de Piaget e os estágios do desenvolvimento. Já no caderno da disciplina de Psicologia da Educação e Aprendizagem, você estudou sobre a concepção construtivista, sobre os conceitos de assimilação e acomodação, sobre o processo de equilibração e sobre o erro no processo de aprendizagem. Você está lembrado(a)? Neste tópico iremos conhecer um pouco mais sobre a vida de Piaget e sobre a teoria construtivista. Embarque nesta viagem e venha desvendar conosco os principais conceitos desta teoria. Primeiramente, vamos conhecer um pouco mais sobre a vida de Jean Piaget, com base nos textos de Munari (2010), Ferreiro (2001) e Ferrari (2012). 64 UNIDADE 1 | AS PRINCIPAIS CONCEPÇÕES TEÓRICAS DA EDUCAÇÃO INFANTIL: RELAÇÃO TEÓRICO-PRÁTICA FIGURA 31 – PIAGET FONTE: Disponível em: <http://pedagogia.tripod.com/infantil/ piaget.htm>. Acesso em: 12 maio 2012. Piaget nasceu em 9 de agosto de 1896, em Neuchâtel na Suíça. Iniciou seus estudos na área de biologia, depois psicologia, epistemologia e educação. Foi professor da Universidade de Genebra por 25 anos, escreveu mais de cinquenta livros, tornando-se conhecido no mundo todo pelos seus estudos. Seu primeiro livro, “A linguagem e o pensamento na criança”, foi publicado em 1924. Morreu em 1980 em Genebra, na Suíça. Casou-se com Valentine Châtenay, com quem teve três filhos: Jacqueline, Lucienne e Laurent. A infância de seus três filhos foi a grande fonte de observação de suas pesquisas, o que chamou de “ajustamento progressivo do saber". FIGURA 32 – PIAGET E SUA FAMÍLIA FONTE: Disponível em: <http://revistaescola.abril.com.br/formacao/ formacao-continuada/esquemas-acao-piaget-sujeito-epistemico- jean-617999.shtml?page=2>. Acesso em: 14 maio 2012. TÓPICO 4 | O CONSTRUTIVISMO DE PIAGET 65 DICAS Quer conhecer um pouco mais sobre a vida de Piaget? Veja nossa indicação de filme: Sinopse: Biólogo de formação, psicólogo que estudou o desenvolvimento cognitivo, filósofo por afinidade, Piaget construiu uma obra longa, coerente e sistematizada. Os conceitos que cunhou marcaram o campo da Pedagogia a tal ponto que muitos o consideram, erroneamente, um educador. Para guiar o professor que pretende conhecer melhor o tema, este vídeo apresenta de forma clara os principais conceitos piagetianos. Conforme Yves de La Taille, a teoria de Piaget é importante para todos os adultos que lidam com crianças, pois ajudam a entender não apenas o desenvolvimento da inteligência, mas suas decorrências, como a formação do comportamento e da personalidade da criança. FONTE: Disponível em: <http://cineaprendizagem.blogspot.com.br/2010/08/biologo-de- formacao-psicologo-que.html>. Piaget sempre foi um grande observador. Já aos onze anos realizou o seu primeiro trabalho científico, resultado da observação de um pássaro em uma praça da cidade onde morava. A partir da sua formação em biologia, iniciou suas pesquisas sobre o desenvolvimento do conhecimento nos seres humanos, a Epistemologia Genética, procurando responder de que forma a inteligência era desenvolvida. Com apenas quinze anos já havia publicado seus trabalhos em importantes revistas da época. Piaget sentia-se seduzido ao realizar pesquisas científicas. Perceba, na força de suas palavras, a paixão que tinha pelas pesquisas: Esses estudos, por prematuros que fossem, foram de grande utilidade para minha formação científica; além disso, funcionaram, poderia dizer, como instrumentos de proteção contra o demônio da filosofia. Graças a eles, tive o raro privilégio de vislumbrar a ciência e o que ela representa antes de sofrer as crises filosóficas da adolescência. Ter tido a experiência precoce destes dois tipos de problemática constituiu, estou convencido, o motivo secreto da minha atividade posterior em psicologia. (PIAGET, 1976, p. 3). Para Piaget, o método científico era a única forma de acesso ao conhecimento e, por isso, procurou inseri-lo na escola. Muito animado com este novo projeto, foi para Paris trabalhar nos laboratórios de Binet, onde descobriu a riqueza do pensamento infantil. Foi nesta época que ele elaborou o seu método crítico de interrogação da criança, buscando compreender de forma sistemática os processos lógico-matemáticos do raciocínio da criança. 66 UNIDADE 1 | AS PRINCIPAIS CONCEPÇÕES TEÓRICAS DA EDUCAÇÃO INFANTIL: RELAÇÃO TEÓRICO-PRÁTICA FIGURA 33 – PIAGET ESTUDANDO FONTE: Disponível em: <http://sergioflima.pro.br/blogs/index.php/ sergio-blog/nao-faca-isto-em-casa>. Acesso em: 18 mar. 2012. Em Paris, Piaget centrou suas pesquisas em crianças hospitalizadas, porém, quando se mudou para Genebra, iniciou seus estudos na escola Casa das Crianças do Instituto Jean-Jacques Rousseau, dedicando-se ao desenvolvimento e aperfeiçoamento dos sistemas e práticas educativas, e depois nas escolas primárias de Genebra, investigando as crianças em sua vida no dia a dia. Não estando muito interessado com a educação, mudou-se para Neuchâtel onde foi substituir seu antigo professor. Em 1929, em Genebra, assumiu o cargo de diretor do Bureau Internacional de Educação (BIE), o que fez com que percebesse os elementos político-sociais que permeiam as ações educacionais, permanecendo na função até 1968. Durante todos esses anos, Piaget redigiu o “Discurso do Diretor”, coleção esta com aproximadamente 40 textos, nos quais se encontravam os elementos básicos das suas propostas educacionais, atribuindo grande importância à educação. Para Piaget (1934 apud MUNARI, 2010 p. 17), “[...] somente a educação pode salvar nossas sociedades de uma possível dissolução, violenta ou gradual”. No período da Segunda Guerra Mundial, Piaget declarou: “Após os cataclismos que marcaram estes últimos meses, a educação constituirá, uma vez mais, o fator decisivo não só da reconstrução, mas, inclusive e sobretudo, da construção propriamente dita” (PIAGET, 1940 apud MUNARI, 2010, p. 17), demonstrando que acreditava na força da educação para ultrapassar as diferenças ideológicas e políticas da época. Piaget não foi um pedagogo, mas foi um nome muito influente na educação e dedicou a sua vida à pesquisa do processo de aquisição do conhecimento pela criança. Para ele o desenvolvimento do pensamento infantil se dá em quatro estágios (que veremos mais adiante), desde o nascimento até o início da adolescência. Suas descobertas tiveram grande impacto no campo educacional, principalmente quando se referia à transmissão de conhecimentos que, segundo Piaget, dependiam de dois fatores: TÓPICO 4 | O CONSTRUTIVISMO DE PIAGET 67 • a criança só aprende se ela tiver condições de absorver determinado conhecimento; • mesmo tendo condições, a criança só irá se interessar por conteúdos que ainda lhe façam falta, que ainda não sejam de seu conhecimento. 3 A TEORIA CONSTRUTIVISTA DE PIAGET - Fases do desenvolvimento - Organização e adaptação - Assimilação e acomodação - Esquemas (estruturas mentais) - Equilibração A teoria de Piaget é bastante complexa e resulta de muitos anos de pesquisa e dedicação ao estudo do desenvolvimento da inteligência da criança. Neste caderno não detalharemos sua obra, mas traremos aspectos importantes de sua teoria, que consideramos necessários para seu conhecimento: DICAS Caso você tenha interesse em aprofundar-se nos estudos sobre Piaget, existem diversos livros que apresentam a sua teoria. Exemplos: CUNHA,Maria Auxiliadora Versiani. Didática fundamentada na teoria de Piaget. Rio de Janeiro: Forense, 1973. FARIA, Analia Rodrigues. Desenvolvimento da criança e do adolescente segundo Piaget. São Paulo: Ática, 1989. FURTH, Hans G. Piaget na sala de aula. Rio de Janeiro: Forense, 1986. GORMAN, Richard M. Descobrindo Piaget: um guia para educadores. Rio de Janeiro: Livros Técnicos e Científicos, 1976. NICOLAS, André. Introdução ao pensamento de Jean Piaget. Rio de Janeiro: Zahar, 1978. Sugerimos também alguns livros escritos por Piaget, vale a pena conhecê-los: PIAGET, Jean. Para onde vai a educação? Rio de Janeiro: J. Olympio, 1973. ______. A linguagem e o pensamento da criança. Rio de Janeiro: Fundo de Cultura, 1961. ______. A construção do real na criança. Rio de Janeiro: Zahar, 1975. ______. O nascimento da inteligência na criança. Rio de Janeiro: Zahar, 1975. ______. Psicologia e pedagogia. Rio de Janeiro: Forense, 1970. 68 UNIDADE 1 | AS PRINCIPAIS CONCEPÇÕES TEÓRICAS DA EDUCAÇÃO INFANTIL: RELAÇÃO TEÓRICO-PRÁTICA Em seus estudos sobre a Epistemologia Genética, Piaget verificou que o desenvolvimento da criança tem início ainda no período intrauterino e se estende até a adolescência, evoluindo de forma cada vez mais complexa, em etapas sucessivas, ao que chamou de fases ou períodos do desenvolvimento. FIGURA 34 – PERÍODOS DO DESENVOLVIMENTO FONTE: As autoras Dependendo da qualidade das interações de cada sujeito com o meio, as estruturas mentais – condições prévias para o aprendizado [...] – vão se tornando mais complexas até o fim da vida. Em cada fase do desenvolvimento, elas determinam os limites do que os indivíduos podem compreender. (FERNANDES, 2012, p. 1). Vamos conhecer de forma resumida cada um destes períodos? TÓPICO 4 | O CONSTRUTIVISMO DE PIAGET 69 PERÍODO IDADE DESCRIÇÃO Período Sensório- Motor 0 a 2 anos Neste período a criança começa a administrar seus reflexos básicos, gerando ações de prazer e desenvolvendo a percepção de si mesma e dos objetos que estão à sua volta. Mama, suga, puxa, prende, pega um objeto e o leva à boca, afasta um objeto para pegar outro etc. É o período que antecede a linguagem. Seu vocabulário vai da repetição de algumas sílabas até a utilização da palavra-frase, representando seu desejo ou sentimento em relação ao objeto. FIGURA 35 – CRIANÇA LEVANDO OBJETO À BOCA FONTE: Disponível em: <http://revistacrescer. globo.com/Revista/ Crescer/0,,EMI298885-16891,00. html>. Acesso em: 16 maio 2012. Período Pré- operatório 2 a 7 anos Este é o período do surgimento da linguagem, do desenho, da imitação, da dramatização etc. A partir dos 2 anos a criança cria imagens mentais do objeto ou da ação, o que chamamos de faz de conta, jogo simbólico ou período da fantasia. Assim, consegue transformar uma simples caixa de fósforos num carrinho, um pedaço de madeira num cavalinho etc. Neste período costuma dar vida aos objetos, colocando a boneca para dormir, ou dizendo que ela está com fome. Pode também dizer que a bicicleta precisa descansar um pouco, ou que o carro da mamãe foi dormir na garagem. Neste período a linguagem é um monólogo coletivo. Todos falam ao mesmo tempo, sem responder ao que o outro está falando. A partir dos 4 anos, já existe um desejo de compreender o que acontece ao seu redor. É a “idade dos porquês”, pois questiona tudo o tempo todo. Já consegue dramatizar a fantasia, mesmo que não acredite nela, distinguindo a fantasia do real. Organiza coleções e conjuntos sem incluir conjuntos menores em maiores. Seu pensamento continua centrado no seu próprio ponto de vista e, em relação à linguagem, já consegue adequar as suas respostas às dos colegas. FIGURA 36 – CRIANÇAS FANTASIADAS FONTE: Disponível em: <http:/ www.juraemprosaeverso.com.br/ FotografiasEDesenhos/Carnaval. htm>. Acesso em: 16 maio 2012. QUADRO 6 – FASES DO DESENVOLVIMENTO PROPOSTAS POR PIAGET 70 UNIDADE 1 | AS PRINCIPAIS CONCEPÇÕES TEÓRICAS DA EDUCAÇÃO INFANTIL: RELAÇÃO TEÓRICO-PRÁTICA Período Operatório Concreto 7 a 11 anos É o período em que a criança desenvolve a noção de tempo e espaço, casualidade, ordem, velocidade etc. Já conserva a noção de número, peso, volume e substância, conseguindo ordenar por tamanho e em conjuntos, compreendendo o mundo de forma lógica ou operatória. Socialmente organiza-se em grupos onde pode ser o líder ou aceitar ser liderado. Consegue compreender e estabelecer regras, estabelecendo compromissos. Já consegue conversar socialmente, porém sem discutir pontos de vista para chegar a um consenso. FIGURA 37 – CRIANÇA MEDINDO FONTE: Disponível em: <http:// www.fvc.org.br/galeria-fotos-25- anos.shtml?ft=8p>. Acesso em: 16 maio 2012. Período Operatório Abstrato 11 anos em diante Este período é o início da fase adulta, em termos cognitivos, onde o adolescente tem domínio do pensamento lógico/dedutivo, relacionando conceitos abstratos e criando hipóteses. A partir deste período, consegue discutir conceitos antes de chegar à conclusão sobre algum assunto. Continua organizando-se em grupo, porém consegue estabelecer relações de cooperação e reciprocidade. FIGURA 38 – JOVENS DISCUTINDO CONCEITOS FONTE: Disponível em: <http:// www.maraba.pa.gov.br/prefeitura- e-ministerio-publico-discutem- politicas-de-protecao-a-crianca-e- ao-adolescente>. Acesso em: 17 maio 2012. FONTE: Adaptado de: Fernandes (2012), Ferrari (2012), Peterson e Felton-Collins (2002) e Munari (2010) De acordo com Piaget (apud PETERSON; FELTON-COLLINS, 2002), existem quatro fatores que auxiliam a criança a passar de um período para o outro: TÓPICO 4 | O CONSTRUTIVISMO DE PIAGET 71 FIGURA 39 – FATORES PARA PASSAR DE UM PERÍODO DO DESENVOLVIMENTO AO OUTRO FONTE: As autoras A inteligência, segundo Piaget (1996), é um mecanismo de adaptação do organismo a uma nova situação proposta pelo meio que o cerca, sempre em busca de um equilíbrio. Assim, o desenvolvimento da inteligência ocorre por meio de estímulos e exercícios constantes, podendo ser potencializada através de intervenções cada vez mais complexas. FIGURA 40 – PIAGET OBSERVANDO AS FASES DO DESENVOLVIMENTO FONTE: Disponível em: <http://revistaescola.abril.com.br/formacao/ formacao-continuada/esquemas-acao-piaget-sujeito-epistemico- jean-617999.shtml>. Acesso em: 15 jun. 2012. 72 UNIDADE 1 | AS PRINCIPAIS CONCEPÇÕES TEÓRICAS DA EDUCAÇÃO INFANTIL: RELAÇÃO TEÓRICO-PRÁTICA Para Piaget (1982, p. 18), a atividade intelectual não pode ser separada do funcionamento "total" do organismo. “Do ponto de vista biológico, a organização é inseparável da adaptação: são os dois processos complementares de um mecanismo único, sendo o primeiro o aspecto interno do ciclo do qual a adaptação constitui o aspecto exterior”. Ou seja, a organização, segundo Piaget (1982), é a habilidade do indivíduo de integrar as sensações e os estímulos recebidos, transformando-os e organizando-os em novas estruturas físicas e psicológicas (também chamadas esquemas), aos quais se adapta. Esta adaptação acontece por meio da assimilação e da acomodação. NOTA O que são estes esquemas, de acordo com Piaget? Em sua teoria, os esquemas, ou estruturas mentais/cognitivas, são a forma de organização e adaptação do indivíduo ao meio. Estes esquemas mudam de forma contínua, por meio das interações com o meio, tornando- se cada vez mais complexos. Por exemplo: ao nascer, o indivíduo possui poucos esquemas, apenas de reflexo (como vimos anteriormente: sugar, mamar, morder etc.). Porém, à medida que realiza interações com o meio, vai desenvolvendo e aprimorando seus esquemas mentais/ cognitivos, que, como vimos anteriormente nos períodos de desenvolvimento, vão desde a evolução na fala até o desenvolvimento do pensamento abstrato, entre outros aspectos.Vamos falar então da assimilação e da acomodação? A assimilação, de acordo com a teoria de Piaget, é a comparação/classificação dos objetos do mundo exterior (estímulos) com os esquemas mentais/cognitivos já existentes. Por exemplo: a criança possui um esquema mental do que é um peixe: vive na água e nada naturalmente, possui escamas, barbatanas, guelras etc. Ao conhecer um tubarão, vai tentar comparar com o esquema mental de peixe que já possui: nada, vive na água, possui guelras, barbatanas. No entanto, vai verificar que o tubarão é um peixe que não tem escamas e, após aprender essa variante, vai adaptar o seu conceito geral de peixe, acrescentando a ele os peixes que não têm escama. A isto chamamos de acomodação. Para Piaget (1996, p. 18), “[...] chamaremos acomodação (por analogia com os "acomodatos" biológicos) toda modificação dos esquemas de assimilação sob a influência de situações exteriores (meio) ao quais se aplicam”. TÓPICO 4 | O CONSTRUTIVISMO DE PIAGET 73 QUADRO 7 – ASSIMILAÇÃO E ACOMODAÇÃO PEIXES FIGURA 41 – PEIXE FONTE: Disponível em: <http:// www.antares.com.br/~cbpds/ salgada.html>. Acesso em: 13 jun. 2012. FIGURA 42 – TUBARÃO FONTE: Disponível em: <http:// noticias.terra.com.br/ciencia/ noticias/0,,OI3791768-EI238,00-Cientista s+descobrem+esconderijo+do+tubarao frade+no+inverno.html>. Acesso em: 13 jun. 2012. CARACTERÍSTICAS COMUNS - nadam; - vivem na água; - possuem guelras; - têm barbatanas etc. VARIANTES - possui escamas; - esqueleto vertebrado (ossos) etc. - pele lisa; - esqueleto cartilaginoso etc. FONTE: As autoras Na teoria construtivista, portanto, a acomodação acontece quando a criança não possui uma estrutura mental ou cognitiva da nova informação ou estímulo, quando não consegue assimilar o que lhe foi apresentado (PIAGET, 1996). A partir desta dificuldade, a criança modifica um esquema já existente, como aconteceu no exemplo anterior, no qual a criança modificou o seu esquema mental em relação ao peixe após ser confrontada com uma variação do que já conhecia, ou cria um novo esquema, pelo fato de a informação não corresponder a nada que já conheça. Após ter acomodado a nova informação, assim que estiver frente a um estímulo parecido, fará a assimilação com a nova estrutura mental já criada. Podemos perceber, desta forma, que os esquemas, ou estruturas mentais, são construídos pouco a pouco, dando lugar às novas acomodações. Para isto, passam por um período de equilibração. A teoria da equilibração, de acordo com Piaget (1982), é um ponto de equilíbrio no processo de assimilação e acomodação, no qual a criança consegue interagir com o meio de forma eficiente. Este equilíbrio é necessário porque, se a criança apenas assimilasse os estímulos do meio, possuiria poucos esquemas mentais e não seria capaz de reconhecer as diferentes informações. Por outro lado, se a criança apenas acomodasse os estímulos recebidos, teria uma grande quantidade de esquemas em sua mente, para cada informação um esquema, o que impediria a criança de visualizar o todo. (PIAGET, 1996). 74 UNIDADE 1 | AS PRINCIPAIS CONCEPÇÕES TEÓRICAS DA EDUCAÇÃO INFANTIL: RELAÇÃO TEÓRICO-PRÁTICA Bom, agora que já estudamos um pouco da sua teoria, vamos nos ater ao que Piaget pensa sobre a escola e o professor. 4 O PAPEL DA ESCOLA E DO PROFESSOR PARA PIAGET A principal meta da educação é criar homens que sejam capazes de fazer coisas novas, não simplesmente repetir o que outras gerações já fizeram. Homens que sejam criadores, inventores, descobridores. A segunda meta da educação é formar mentes que estejam em condições de criticar, verificar e não aceitar tudo o que a elas se propõe. Jean Piaget Por defender a pesquisa em sala de aula, Piaget é extremamente contra os métodos pedagógicos coercivos. Para ele, “[...] no terreno da educação, o exemplo deve desempenhar um papel mais importante do que a coerção” (PIAGET, 1948 apud MUNARI, 2010, p. 17). A escola deveria convidar o aluno a experimentar, reconstruindo o que precisa aprender. Para ele, não se aprende apenas vendo o professor experimentar, ou realizando exercícios já organizados. “Só se aprende a experimentar, tateando, por si mesmo, trabalhando ativamente, ou seja, em liberdade e dispondo de todo o tempo necessário”. (PIAGET, 1949 apud MUNARI, 2010, p. 18). As ações educativas deveriam ser ações de estímulo à pesquisa, à experimentação. A escola ideal, segundo Piaget (1949 apud MUNARI, 2010), não teria livros nem manuais obrigatórios para os alunos, mas obras de referência utilizadas de forma livre. Os manuais seriam apenas de uso do professor. Piaget defende que a escola utilize métodos ativos, fruto do trabalho espontâneo, orientado por perguntas anteriormente planejadas, frutos do trabalho de redescoberta e reconstrução das verdades, sem recebê-las prontas. Como vimos no começo deste tópico, Piaget iniciou seus estudos sobre o desenvolvimento da inteligência bem cedo, procurando novos métodos e enfoques, confrontando seus estudos com trabalhos científicos da época e dando um grande impulso aos debates sobre a educação, o que acontece até os dias de hoje. Piaget foi um grande defensor de uma educação ativa, em que a criança é agente do seu conhecimento e o constrói progressivamente, por meio da experimentação. Esta educação ativa já havia sido defendida por outros estudiosos, como Montessori, Freinet, Decroly e Claparède, nos quais Piaget se apoiava. TÓPICO 4 | O CONSTRUTIVISMO DE PIAGET 75 FIGURA 43 – PIAGET OBSERVANDO AS CRIANÇAS REALIZANDO ATIVIDADES FONTE: Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/folha/ livrariadafolha/799404-livros-de-piaget-influenciam-educacao-30-anos-apos- sua-morte.shtml>. Acesso em: 13 jun. 2012. Em relação a algumas disciplinas específicas da época, como o ensino das ciências naturais, Piaget se posiciona: Aqueles que, por profissão, estudam a psicologia das operações intelectuais da criança e do adolescente sempre se surpreendem com os recursos de que dispõe todo aluno normal, desde que se lhe proporcionemos meios de trabalhar ativamente, sem constrangê- lo com repetições passivas [...]. Desse ponto de vista, o ensino das ciências é a educação ativa da objetividade e dos hábitos de verificação. (PIAGET, 1952 apud MUNARI, 2010, p. 19). Já em relação ao ensino da matemática para os pequenos, dizia ser importante proporcionar a eles esquemas de ação nos quais pudessem se basear futuramente, já que a criança nesta fase estava mais desenvolvida no aspecto sensório-motor do que no da lógica verbal. A compreensão matemática não é questão de aptidão da criança. É um erro supor que um fracasso em matemática obedeça a uma falta de aptidão. A operação matemática deriva da ação: resulta que a apresentação intuitiva não basta, a criança deve realizar por si mesma a operação manual antes de preparar a operação mental. [...] Em todos os domínios da matemática, o qualitativo deve preceder ao numérico. (PIAGET, 1950 apud MUNARI, 2010, p. 19). Além destas duas áreas, ciências naturais e matemática, Piaget defendia uma educação ativa, por meio da experimentação, também para outras áreas, como a aprendizagem de uma língua, que são menos técnicas. “É necessário estabelecer entre as crianças, sobretudo entre os adolescentes, relações sociais, apelar para a sua atividade e para a sua responsabilidade”. (PIAGET, 1948 apud MUNARI, 2010, p. 20). 76 UNIDADE 1 | AS PRINCIPAIS CONCEPÇÕES TEÓRICAS DA EDUCAÇÃO INFANTIL: RELAÇÃO TEÓRICO-PRÁTICA De acordo com Munari (2010), para Piaget é muito importante que a pedagogia parta do conhecimento do aluno, do que a criança já conhece. “A pedagogia é uma arte, enquanto que a psicologia é uma ciência; mas se a arte de educar supõe atitudes inatas insubstituíveis, ela requer ser desenvolvida por meiodos conhecimentos necessários sobre o ser humano que se educa”. (PIAGET, 1948 apud MUNARI, 2010, p. 20). FIGURA 44 – PIAGET CONVERSANDO COM AS CRIANÇAS FONTE: Disponível em: <http://revistaescola.abril.com.br/formacao/ formacao-continuada/conhecimento-previo-esquemas-acao- piaget-621931.shtml>. Acesso em: 14 jun. 2012. Levar em consideração o que a criança já sabe é de suma importância para o professor. Este conhecimento prévio é o passo inicial para a construção de um novo conhecimento, em que a criança elabora novas estruturas mentais ou reconfigura as já existentes. A pedagogia reflexiva, proposta por Piaget, faz com que a criança reflita sobre o novo conteúdo e não apenas o aceite sem questionar. Este novo conteúdo torna-se significativo e amplia o conhecimento prévio da criança, tornando-o mais complexo. Mas de que forma o professor pode verificar os conhecimentos prévios dos seus alunos? Como você, caro(a) acadêmico(a), faria esta sondagem? Que estratégias utilizaria? Bem, num primeiro momento imaginamos que você deva ter pensado: “conversaria com as crianças”. Mas será que esta é a melhor forma de verificar o conhecimento prévio do seu aluno na proposta de Piaget? Lembre-se de que Piaget não está necessariamente preocupado com a aprendizagem dos conteúdos e, sim, com o processo de desenvolvimento da inteligência da criança. Por isto, devemos avaliar em que fase do desenvolvimento a criança se encontra e se o conteúdo a ser ensinado irá trazer algo que a criança ainda não conhece. TÓPICO 4 | O CONSTRUTIVISMO DE PIAGET 77 A melhor forma de realizar este levantamento é propor desafios, situações-problema, que obriguem a criança a utilizar o conhecimento que possui para resolvê-los. Para Piaget, a inteligência só é possível de ser desenvolvida porque existem os conhecimentos prévios que podem ser ampliados. É assim que todos nós nos desenvolvemos. Cada novo conhecimento é agregado e passa a tornar-se conhecimento prévio quando tivermos um novo desafio pela frente. Nossas estruturas mentais se modificam, se reestruturam para que possamos compreender a nova realidade. Piaget não deu receitas prontas, não criou nenhum manual de didática para os professores, mas demonstrou que cada fase do desenvolvimento da criança, com características específicas, apresenta novas possibilidades de conhecimento, de aperfeiçoamento, fazendo com que o professor perceba quais estímulos poderá utilizar a fim de favorecer da melhor forma este desenvolvimento. De acordo com Lima (1980, p. 131), Aceitar o ponto de vista de Piaget, portanto, provocará turbulenta revolução no processo escolar [...] Quem quiser segui-lo tem de modificar, fundamentalmente, comportamentos consagrados, milenarmente (aliás, é assim que age a ciência, e a pedagogia começa a tornar-se uma arte apoiada, estritamente, nas ciências biológicas, psicológicas e sociológicas). Onde houver um professor ‘ensinando’... aí não está havendo uma escola piagetiana. Você está disposto(a) a ser um(a) professor(a) diferente? 78 RESUMO DO TÓPICO 4 Neste tópico, você aprendeu que: • Piaget nasceu em 9 de agosto de 1896, na Suíça e sempre foi um grande observador. Formou-se em biologia e foi professor universitário durante 25 anos. • Boa parte da sua pesquisa veio da observação das etapas do desenvolvimento dos seus próprios filhos. • Piaget não foi um pedagogo, mas sua pesquisa sobre o processo de aquisição do conhecimento da criança trouxe diversas contribuições para a educação. • Piaget identificou que o desenvolvimento ocorre em quatro períodos: sensório- motor (0-2 anos); pré-operatório (2-7 anos); operatório-concreto (8-11 anos) e operatório-formal (12-14 anos). • Existem quatro fatores que ajudam a criança a passar de um período de desenvolvimento para outro: o amadurecimento; a experiência; a interação social e o equilíbrio. • A organização (aspecto interno) e a adaptação (aspecto externo) são inseparáveis. • A assimilação é a comparação do mundo exterior com os esquemas mentais já existentes. • A acomodação é toda modificação dos esquemas de assimilação (estruturas mentais), sob a influência do meio. • A teoria da equilibração é um ponto de equilíbrio entre o processo de assimilação e acomodação. • Piaget é contra os métodos educativos coercivos. Para ele o exemplo é mais importante. • Não se aprende apenas vendo o professor experimentar, a criança precisa experimentar também, ser ativa no processo de aprendizagem. • A educação deve partir do conhecimento do aluno. 79 Caro(a) acadêmico(a)! Neste tópico, você conheceu um pouco mais sobre Piaget e sua teoria, o construtivismo. Para sintetizar o conhecimento construído através da leitura do texto, responda aos seguintes questionamentos: 1 Qual é o nome da teoria de Piaget? ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ 2 Descreva de forma breve três dos principais conceitos desta teoria. ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ 3 Cite dois aspectos importantes da educação para Piaget. ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ AUTOATIVIDADE 80 81 TÓPICO 5 O SOCIOINTERACIONISMO DE VYGOTSKY UNIDADE 1 1 INTRODUÇÃO 2 LEV SEMYNOVITCH VYGOTSKY (1896-1934) Desde os primeiros dias do desenvolvimento da criança, suas atividades adquirem um significado próprio num sistema de comportamento social e, sendo dirigidas a objetivos definidos, são refratadas através do prisma do ambiente da criança. O caminho do objeto até a criança e dessa até o objeto passa através de outra pessoa. Essa estrutura humana complexa é o produto de um processo de desenvolvimento profundamente enraizado nas ligações entre história individual e história social. (VYGOTSKY, 1991, p. 33). Com certeza você já ouviu falar muito de Vygotsky e do sociointeracionismo, não é mesmo? Logo nas primeiras disciplinas do seu curso – Psicologia Geral e do Desenvolvimento e Psicologia da Educação e Aprendizagem –, você já estudou sobre ele e sua teoria. Está lembrado (a)? De qualquer forma, neste tópico iremos conhecer um pouco mais sobre a sua história de vida e os conceitos básicos de sua teoria para a educação, como: zona de desenvolvimento proximal, mediação, relação entre desenvolvimento e aprendizagem, entre outros. Também veremos como Vygotsky percebe o papel da escola e do professor em sua teoria. E então, preparado(a) para aprofundar seus conhecimentos sobre Vygotsky? Para explanar sobre a vida de Vygotsky, vamos utilizar como base os escritos de Veer; Valsiner (2001) e Rego (2004). Lev Semynovich Vygotsky nasceu em novembro de 1896, na cidade de Orsha, na Rússia (na época, União Soviética). Era o segundo filho (de um total de oito) de uma família judaica que possuía boas condições financeiras e proporcionou a todos os filhos uma excelente educação. 82 UNIDADE 1 | AS PRINCIPAIS CONCEPÇÕES TEÓRICAS DA EDUCAÇÃO INFANTIL: RELAÇÃO TEÓRICO-PRÁTICA FIGURA 45 – VYGOTSKY FONTE: Disponível em: <http://sitepsicologia.webnode.com/lev-vygotsky/>. Acesso em: 12 fev. 2012. Em sua juventude seus passatempos favoritos eram as coleções de correspondências em esperanto, de selos e de xadrez. “Vygotsky participava ativamente, junto com um círculo de amigos, de discussões de assuntos altamente abstratos, como a filosofia da história de Hegel e o papel do indivíduo na história”. (VEER; VALSINER, 2001, p. 18). Também foi um admirador da poesia e dos teatros locais da época. NOTA Você sabe o que é o esperanto? O esperanto é uma língua auxiliar de comunicação internacional, criada em 1887 pelo médico e linguista judeu-polonês Dr. Lázaro Luís Zamenhof. É amplamente usado nos protocolos de conversação e nas páginas de relacionamento (facebook, Orkut etc.). É uma língua internacional e neutra, que não pertence a nenhuma nação. É conhecida pela facilidade de aprendizagem, seja pela gramática regular e sem exceções, seja pelos radicais colhidos do latim e das línguas mais faladas no Ocidente. A proposta do esperanto é que cada povo continue a falar sua própria língua materna, mas que use o idioma neutro nas comunicações internacionais. FONTE: Disponível em: <http://esperanto.org.br/bel/>; <http://www.esperanto.ufc.br/>. Acesso em: 24 jan. 2013. TÓPICO 5 | O SOCIOINTERACIONISMO DE VYGOTSKY 83 Sua educação inicial foi com professores particulares. Mais tarde, frequentou turmas mais adiantadas (do antigo Ginásio) numa escola judaica particular de Gomel, onde se graduou com medalha de ouro em 1913. Entre 1914 e 1917 estudou Direito e Literatura na Universidade de Moscou. Nesta época, os interesses de Vygotsky ampliaram-se para os problemas da psicologia e da pedagogia. Entre 1917 e 1924, lecionou em vários institutos, como a Escola Noturna para Trabalhadores Adultos, os Cursos Preparatórios para Pedagogos, a Escola Trabalhista Soviética e o Colégio Pedagógico. Este último viria a desempenhar um papel importante no desenvolvimento de Vygotsky como cientista, pois foi aí que ele montou um pequeno laboratório psicológico no qual os alunos podiam fazer investigações práticas simples. Nesse laboratório, realizou suas primeiras experiências sobre reações dominantes e respiração, que proporcionaram o material para sua primeira palestra sobre investigação reflexológica e psicológica [...]. Enquanto trabalhava no Colégio Pedagógico de Gomel, também começou a preparar um de seus primeiros livros importantes: Psicologia Pedagógica. (VEER; VALSINER, 2001, p. 22). FIGURA 46 – VYGOTSKY LECIONANDO AOS TRABALHADORES FONTE: Disponível em: <http://www.vigotski.net/espelho.html>. Acesso em: 15 fev. 2012. Vygotsky fundou, juntamente com seu amigo Dobkin e seu primo David, a editora Eras e Dias (que publicou apenas dois livros), e a revista literária Urze (também de vida curta). Nesta mesma época chefiou a seção de teatro do Departamento de Educação Popular, em Gomel. Em 1920, Vygotsky e sua família foram acometidas pela tuberculose, e um de seus irmãos faleceu devido à doença. Vygotsky conseguiu recuperar-se, porém, pelo restante de sua vida, sofreu com as consequências da doença, resultando na sua morte em 1934. 84 UNIDADE 1 | AS PRINCIPAIS CONCEPÇÕES TEÓRICAS DA EDUCAÇÃO INFANTIL: RELAÇÃO TEÓRICO-PRÁTICA Em 1924, casou-se com Roza Smekhova (com a qual teve duas filhas) e mudou-se para Moscou, onde foi trabalhar no Instituto de Psicologia Experimental de Karnilov. Nos últimos anos de sua vida morou com sua mulher e seus filhos num quarto de um apartamento lotado. “Para ganhar seu sustento, Vygotsky assumiu uma quantidade enorme de trabalhos editoriais para editoras e uma pesada carga de aulas que envolviam viagens constantes entre Moscou, Leningrado e Kharkov” (VEER; VALSINER, 2001, p. 25). FIGURA 47 – VYGOTSKY E SUA FILHA EM 1932 FONTE: Disponível em: <http://revistaescola.abril.com.br/gestao- escolar/vygotsky-conceito-pensamento-verbal-639053.shtml>. Acesso em: 25 fev. 2012. Na manhã de 11 de junho de 1934, após ter sofrido por diversos dias com hemorragias decorrentes da tuberculose, Vygotsky faleceu aos 38 anos. Apesar de Vygotsky e Piaget terem nascido no mesmo ano e viverem na mesma época, e suas teorias terem vários pontos parecidos, eles não se conheceram. Piaget só conheceu as obras de Vygotsky por volta de 1960, quando estas chegaram ao Ocidente, e lamentou não terem se conhecido. No Brasil a teoria de Vygotsky é estudada há aproximadamente quatro décadas, já que suas obras chegaram aqui apenas em meados da década de 80. Apesar de não ter elaborado uma teoria pedagógica, suas ideias trouxeram diversas contribuições para a educação, principalmente no que diz respeito ao processo de aprendizagem. TÓPICO 5 | O SOCIOINTERACIONISMO DE VYGOTSKY 85 DICAS DICA DE FILME: Coleção Grandes Educadores – Lev Vygotsky SINOPSE - Lev Vygotsky se preocupa em entender o funcionamento psicológico do ser humano, integrando aspectos biológicos e culturais. Com relação à educação, a teoria de Vygotsky enfatiza o papel da aprendizagem no desenvolvimento humano, valorizando a escola, o professor e a intervenção pedagógica. Talvez por isso, suas ideias têm tido tanta repercussão entre os educadores do Ocidente, apesar de sua distância no tempo e espaço (viveu na antiga União Soviética e morreu há mais de 60 anos). A produção de Vygotsky foi vasta: escreveu cerca de 200 trabalhos científicos que foram pontos de partida para inúmeros projetos de pesquisa posteriores, desenvolvidos por seus colaboradores e seguidores, e ainda centrais na agenda de psicologia da educação contemporânea. FONTE: Disponível em: <http://www.paulus.com.br/dvd-arendt-filosofos-e-a- educacao_p_2875.html>. Acesso em: 27 fev. 2012. 3 A TEORIA SOCIOINTERACIONISTA DE VYGOTSKY A teoria de Vygotsky é bastante complexa e ainda pouco conhecida, já que poucas de suas obras foram traduzidas para o português. Também pode ser considerada incompleta, já que, por causa da sua doença, não conseguiu concluir algumas pesquisas, apenas lançou ideias e conceitos que não chegaram a ser desenvolvidos por ele. No entanto, sua obra é tão intensa e, como já dissemos, complexa, que optamos por tratar aqui apenas dos conceitos básicos e mais utilizados na educação: FIGURA 48 – CONCEITOS BÁSICOS DO SOCIOINTERACIONISMO FONTE: As autoras 86 UNIDADE 1 | AS PRINCIPAIS CONCEPÇÕES TEÓRICAS DA EDUCAÇÃO INFANTIL: RELAÇÃO TEÓRICO-PRÁTICA Para Vygotsky a aquisição dos conhecimentos só acontece por meio da interação social/cultural da criança com o meio e de forma mediada. “No trabalho de Vygotsky, verifica-se uma visão de desenvolvimento baseada na concepção de um organismo ativo, cujo pensamento é construído gradativamente num ambiente que é histórico e social”. (RODRIGUERO, 2000, p. 101). É por meio das interações com o meio social que a criança se desenvolve. Com o auxílio dos adultos, as crianças passam a assimilar habilidades básicas, como sentar, falar, andar, comer com talheres, tomar água no copo etc. Por meio das interações constantes com o adulto ou crianças mais experientes, vai desenvolvendo processos psicológicos mais complexos. (REGO, 2004). Desde o nascimento, o bebê está em constante interação com os adultos, que não só asseguram sua sobrevivência, mas também medeiam sua relação com o mundo. Os adultos procuram incorporar as crianças à sua cultura, atribuindo significado às condutas e aos objetos culturais que se formaram ao longo da história. O comportamento da criança recebe influências dos costumes e objetos de sua cultura [...]. (REGO, 2004, p. 59). Esta influência do meio sociocultural na criança é fácil de ser ilustrada, por meio da história de Amala e Kamala: as meninas-lobo: As meninas-lobo, Amala e Kamala, foram descobertas em 1920, na Índia, vivendo no meio de uma família de lobos. A primeira tinha um ano e meio e morreu um anomais tarde. Kamala, de oito anos de idade, viveu até 1929. As duas meninas não tinham nada de humano e seu comportamento era exatamente semelhante ao dos irmãos lobos. Elas eram incapazes de permanecer em pé, somente engatinhavam, apoiando-se sobre os joelhos e cotovelos para os pequenos trajetos e sobre as mãos e os pés para os trajetos mais longos. TÓPICO 5 | O SOCIOINTERACIONISMO DE VYGOTSKY 87 Só comiam carne crua ou podre, comiam e bebiam como os animais, lançando a cabeça para frente e lambendo os líquidos. Na instituição onde foram acolhidas, passavam o dia acabrunhadas e prostradas, num canto onde o sol não as alcançava; eram ativas e faziam muito barulho durante a noite, procurando fugir e uivando como lobos. Não sabiam chorar nem rir. Kamala viveu oito anos na instituição que a acolheu, humanizando- se lentamente. Foram necessários oito anos para que a menina aprendesse a andar e pouco antes de morrer tinha um vocabulário de somente 50 palavras. Atitudes afetivas foram aparecendo aos poucos. Ela chorou pela primeira vez por ocasião da morte da irmã Amala e a partir daí começou a se apegar, mesmo que de forma lenta, às pessoas que cuidavam dela. Kamala era rudimentarmente inteligente e isto lhe permitiu aprender a comunicação por gestos, inicialmente, e depois por palavras de um vocabulário básico, aprendendo a executar pedidos simples. FONTE: Disponível em: <http://www.mdig.com.br/index.php?itemid=5252>. Acesso em: 24 jan. 2013. E então, conseguiu identificar como a falta de um ambiente social e humanizado influencia o comportamento do ser humano? “O desenvolvimento está intimamente relacionado ao contexto sociocultural em que a pessoa se insere e se processa de forma dinâmica (e dialética) através de rupturas e equilíbrios provocadores de contínuas reorganizações por parte do indivíduo”. (REGO, 2004, p. 58). Desta forma, a cultura é que fornece à criança os elementos simbólicos de representação da realidade, permitindo que ela construa a sua interpretação do mundo real que a rodeia. Esta interpretação é mediada, só se constrói na presença do outro. Este outro pode ser tanto o homem, quanto os objetos que a rodeiam, como ferramentas, signos (em especial a linguagem), técnicas culturais etc. Vygotsky ressalta a importância de dois elementos básicos no processo de mediação: QUADRO 8 – INSTRUMENTO E SIGNO INSTRUMENTO SIGNO Tem a função de regular as ações sobre os objetos. Regula as ações sobre o psiquismo das pessoas. O instrumento, ou ferramenta, é o meio pelo qual o homem aperfeiçoou a sua relação com o trabalho, na transformação da natureza. Ex.: Lembrar, comparar, relatar etc. Com o auxílio dos signos, o homem passa a controlar sua atividade psicológica, ampliando sua atenção, sua memória e a possibilidade de acúmulo de informações. 88 UNIDADE 1 | AS PRINCIPAIS CONCEPÇÕES TEÓRICAS DA EDUCAÇÃO INFANTIL: RELAÇÃO TEÓRICO-PRÁTICA FONTE: Adaptado de: Rego (2004) Desta forma, o instrumento provoca mudanças externas, ampliando a possibilidade de intervenção do homem na natureza. Ex.: trator, faca, computador etc. Os homens não apenas produzem os seus próprios instrumentos para tarefas específicas, como são capazes de armazená- los para uso posterior, preservando-os, aperfeiçoando-os e transmitindo suas funções aos membros do seu grupo. FIGURA 49 – INSTRUMENTO: FACA FONTE: Disponível em: <http:// www.diariosergipano.com.br/ler. php?op=noticia&id=1998> Acesso em: 3 mar. 2012. Um importante sistema simbólico que o homem utiliza para organizar os signos, e que foi fonte de diversos estudos de Vygotsky, foi a linguagem. Por meio da linguagem o homem designa os objetos do mundo exterior (faca - serve para se alimentar); estipula ações (serve para cortar); insere qualidades (lisa, cortante) e faz relações com os objetos (está próxima, abaixo etc.). FIGURA 50 – CORTANDO COM A FACA FONTE: Disponível em: <http://www. ameliasdesalto.com/2012/03/para-o- pao-nao-esfarelar.html>. Acesso em: 3 mar. 2012. É assim que, por meio dos signos e instrumentos, o ser humano vai interagindo com os outros. Por meio da troca com os outros e consigo mesmo, vai internalizando o conhecimento e formando a sua consciência. Por isto, pode- se dizer que a criança não é apenas ativa, mas interativa, pois constrói o seu conhecimento por meio das relações inter e intrapessoais. Todas as funções psicointelectuais superiores aparecem duas vezes no decurso do desenvolvimento da criança: a primeira vez, nas atividades coletivas, nas atividades sociais, ou seja, como funções interpsíquicas; a segunda, nas atividades individuais, como propriedades internas do pensamento da criança, ou seja, como funções intrapsíquicas. (VYGOTSKY, 1988, p. 114, grifos no original). Desta forma, o processo de internalização, por parte da criança, nas interações que estabelece com o meio, envolve processos específicos como: Nesse sentido, de acordo com Sarmento; Rapoport e Fossati (2008, p. 34), “[...] assim como o desenvolvimento das funções psicológicas superiores acontecem no bojo da cultura, das práticas sociais, também o psiquismo humano se constrói a partir das relações sociais que o ser humano vai estabelecendo no decorrer de sua vida”. DIFERENTES MODOS DE PARTICIPAÇÃO APROPRIAÇÃOSIGNIFICAÇÃO TÓPICO 5 | O SOCIOINTERACIONISMO DE VYGOTSKY 89 De acordo com Vygotsky, existem ao menos dois níveis de desenvolvimento: QUADRO 9 – NÍVEIS DE DESENVOLVIMENTO REAL POTENCIAL O desenvolvimento real é tudo aquilo que a criança consegue realizar sozinha, sem a ajuda de ninguém, pois já possui um conhecimento consolidado a respeito do assunto. Ex.: Saber andar de bicicleta, recortar, resolver um problema etc. FIGURA 51 – CRIANÇA ANDANDO DE BICICLETA FONTE: Disponível em: <http:// kitsegifts.blogspot.com. br/2012_05_01_archive.html>. Acesso em: 14 mar. 2012. O desenvolvimento potencial é quando a criança consegue realizar tarefas mais complexas, por instrução ou auxílio de um adulto, ou pela interação com as outras crianças. Ex.: Uma criança de cinco anos pode não conseguir montar sozinha um quebra-cabeças que tenha muitas peças, mas com a assistência de seu irmão mais velho ou mesmo de uma criança de sua idade, mas que já tenha experiência neste jogo, pode realizar a tarefa. (REGO, 2004, p. 73). FIGURA 52 – CRIANÇAS MONTANDO QUEBRA-CABEÇAS FONTE: Disponível em: <http://www. pedagogiaaopedaletra.com/posts/ melhorando-a-concentracao/>. Acesso em: 14 mar. 2012. FONTE: Adaptado de: Rego (2004), Salvador (2006), Davis e Oliveira (1994), Sarmento, Rapoport e Fossati (2008) De acordo com Vygotsky (1991), a distância entre o que a criança já sabe fazer de forma autônoma (zona de desenvolvimento real) e o que consegue realizar com a ajuda dos outros (zona de desenvolvimento potencial), é o que chamou de Zona do Desenvolvimento Proximal (ZDP). [...] a zona de desenvolvimento proximal define aquelas funções que ainda não amadureceram, que estão em processo de maturação, funções que amadurecerão, mas que estão presentes em estado embrionário. Essas funções poderiam ser chamadas de “brotos” ou “flores” do desenvolvimento, ao invés de “frutos” do desenvolvimento. (VYGOTSKY, 1991, p. 97). No entanto, devemos levar em consideração que, de acordo com Vygotsky, a Zona de Desenvolvimento Proximal não é algo intrínseco da criança, ela ocorre durante o processo de interação social. 90 UNIDADE 1 | AS PRINCIPAIS CONCEPÇÕES TEÓRICAS DA EDUCAÇÃO INFANTIL: RELAÇÃO TEÓRICO-PRÁTICA 1 O desenvolvimento das bases psicológicas para o aprendizado de matérias básicas não vem antes do aprendizado, mas se desenvolve numa interação contínua com as suas contribuições. 2 O aprendizado precede o desenvolvimento em muitas áreas. 3O aprendizado de uma matéria influencia o desenvolvimento das funções superiores para além dos limites da matéria específica. Retomando um pouco a teoria de Piaget, que vimos no tópico anterior, percebemos que na teoria construtivista, o processo de aprendizagem depende do estágio do desenvolvimento em que a criança se encontra. Assim, o papel do professor seria o de identificar em qual estágio do desenvolvimento a criança se encontra e, a partir dali, programar a aprendizagem da criança de acordo com o que ela é capaz de fazer naquele momento. Já no sociointeracionismo de Vygotsky, é o aprendizado que possibilita, orienta e estimula os processos de desenvolvimento. Ou seja, a aprendizagem vem antes do desenvolvimento. Para Vygotsky (1991): É na Zona de Desenvolvimento Proximal, de acordo com Vygotsky, que a aprendizagem vai ocorrer. Neste sentido, o papel do professor é o de favorecer esta aprendizagem, mediando a criança em sua relação com o meio. Temos assim, um processo interativo entre aprendizagem e desenvolvimento, que ocorre em um contexto cultural, desenvolvendo-se com o auxílio dos mecanismos de aprendizagem propostos pelo mediador (professor ou outra criança). Por isto é importante que o professor inove a sua prática, procurando compreender a realidade sociocultural das suas crianças, a fim de que a educação se torne realmente significativa e construtiva, levando a criança ao desenvolvimento consciente da sua autonomia social. Em relação à tomada de consciência, Vygotsky afirma que a relação da criança, com a natureza e com outras crianças no nível da consciência, acontece de forma natural e espontânea. Somente aos poucos é que ela vai tomando consciência da consciência que já possui e, aos poucos, vai compreendendo seus atos sobre o meio que a cerca. A partir deste momento, os atos da criança deixam de ser espontâneos e passam a ser sociais e históricos. Para Vygotsky (1991) a autoconsciência é o estado supremo do homem. Para Vygotsky, não apenas o ensino sistematizado (disciplinas escolares) é responsável pela ampliação do conhecimento na Zona de Desenvolvimento Proximal, mas também o brinquedo. Para Vygotsky (1991), porém, o papel do brinquedo não é o de proporcionar prazer para a criança, já que outras atividades como chupar o bico são muito mais prazerosas, e o fato de nem sempre ganhar traz frustração e descontentamento para a criança. Assim, a função primordial do brinquedo é satisfazer algumas necessidades das crianças. TÓPICO 5 | O SOCIOINTERACIONISMO DE VYGOTSKY 91 No início da idade pré-escolar, quando surgem os desejos que não podem ser imediatamente satisfeitos ou esquecidos e permanece ainda a característica do estágio precedente de uma tendência para a satisfação imediata dos desejos, o comportamento da criança muda. Para resolver essa tensão, a criança em idade pré-escolar envolve-se num mundo ilusório e imaginário onde os desejos não realizáveis podem ser realizados, e esse mundo é o que chamamos de brinquedo. (VYGOTSKY, 1991, p. 106). FIGURA 53 – CRIANÇA BRINCANDO FONTE: Disponível em: <http://paternidadejustica.wordpress. com/2011/09/07/a-importancia-do-brincar/>. Acesso em: 18 mar. 2012. Desta forma, é por meio do brinquedo que a criança aprende a agir de forma cognitiva, satisfazendo suas necessidades não apenas pelo que lhe é externo, mas por meio das motivações internas. Assim, para Vygotskyedvvxaq (1991), a criança começa a agir independente daquilo que vê. Desta forma, não é o brinquedo em si que a satisfaz e, sim, a situação imaginária através da qual a criança atribui significados. “O papel e a situação imaginária são fundamentais na atividade lúdica, pois através deles ocorre uma reestruturação radical das ações da criança e dos significados com os quais ela atua” (SARMENTO; RAPOPORT; FOSSATI, 2008, p. 40). Vygotsky acrescenta a esta relação a presença de regras. “[...] não existe brinquedo sem regras. A situação imaginária de qualquer forma de brinquedo já contém regras de comportamento, embora possa não ser um jogo com regras formais estabelecidas [...]”. (VYGOTSKY, 1991, p. 108). Assim, ao esforçar-se em desempenhar corretamente o que observa, a criança atua em um nível superior ao que se encontra no momento. “No brinquedo a criança sempre se comporta além do comportamento habitual de sua idade, além de seu comportamento diário: no brinquedo é como se ela fosse maior do que é na realidade”. (VYGOTSKY, 1991, p. 117). 92 UNIDADE 1 | AS PRINCIPAIS CONCEPÇÕES TEÓRICAS DA EDUCAÇÃO INFANTIL: RELAÇÃO TEÓRICO-PRÁTICA FIGURA 54 – CRIANÇA IMITANDO OS ADULTOS FONTE: Disponível em: <http://zaroio.net/br/imagem/27283/ crianca_imitando_pessoas_andando/>. Acesso em: 24 mar. 2012. Desta forma, segundo Rego (2004), mesmo que exista uma distância entre o comportamento real da criança e o seu comportamento por meio do brinquedo, sua atuação no mundo imaginário, por meio de regras estabelecidas, criam uma Zona de Desenvolvimento Proximal, impulsionando conceitos e processos de desenvolvimento. DICAS Vamos conhecer um pouco mais sobre a teoria de Vygotsky? Veja nossa indicação de livros que tratam sobre a teoria de Vygotsky: SMOLKA, Ana Luiza B.; GÓES, Maria Cecília Rafael de (Org.). A linguagem e o outro no espaço escolar: Vygotsky e a construção do conhecimento. Campinas: Papirus, 1994. RATNER, Carl. A psicologia sócio-histórica de Vygotsky: aplicações contemporâneas. Porto Alegre: ARTMED, 1995. Veja também a indicação de livros escritos por Vygotsky: VYGOTSKY, Lev Semynovich. A construção do pensamento e da linguagem. São Paulo: Martins Fontes, 2009. ______. Pensamento e linguagem. São Paulo: Martins Fontes, 1999. ______. A formação social da mente. São Paulo: Martins Fontes, 1994. ______; LEONTIEF, Alexis N.; LURIA, Alexander Romanovich. Linguagem, desenvolvimento e aprendizagem. São Paulo: Ícone, 2006. TÓPICO 5 | O SOCIOINTERACIONISMO DE VYGOTSKY 93 4 O PAPEL DA ESCOLA E DO PROFESSOR PARA VYGOTSKY Para Vygotsky, a educação não deve ficar esperando o desenvolvimento intelectual da criança e sim estimulá-la, para que, quanto mais aprenda, mais se desenvolva mentalmente. Lembre-se de que, para Vygotsky, a aprendizagem vem antes do desenvolvimento, sendo assim, quanto mais a criança aprender, mais irá se desenvolver. FIGURA 55 – CRIANÇA APRENDENDO FONTE: Disponível em: <http://indikabem.com.br/header/educacao/ como-desenvolver-a-atencao-e-a-memoria/>. Acesso em: 4 abr. 2012. Vygotsky “[...] chama a atenção para o fato de que a escola, por oferecer conteúdos e desenvolver modalidades de pensamento bastante específicas, tem um papel diferente e insubstituível, na apropriação pelo sujeito da experiência culturalmente acumulada”. (REGO, 2004, p. 104). Por isto, para ele, a escola não pode se limitar ao que a criança já sabe, às etapas intelectuais que já alcançou e, sim, conduzi-la para novos estágios de desenvolvimento, que a criança ainda não incorporou. No próprio brinquedo, como vimos anteriormente, a criança procura atuar em relação àquilo que ainda não é, mas que virá a ser. Então a educação não pode apenas se propor a lhe oferecer o que ela já conhece. Deve, sim, propor desafios e estimulá-la a ir mais longe. A escola desempenhará bem seu papel, na medida em que, partindo daquilo que a criança já sabe (o conhecimento que ela traz de seu cotidiano, suas ideias a respeito dos objetos, fatos e fenômenos, sua “teorias” acerca do que observa no mundo), ela for capaz de ampliar e desafiar a construção de novos conhecimentos, na linguagem vygotskiana, incidir na zona de desenvolvimento potencial dos educandos. Desta forma poderá estimular processos internos que acabarão por se efetivar, passando a constituir a base que possibilitará novas aprendizagens. (REGO, 2004, p. 108). O papel do professor, portanto, é ode interferir na zona de desenvolvimento proximal de seus alunos, a fim de provocar avanços que não ocorreriam de forma espontânea. A Zona de Desenvolvimento Proximal é onde a escola e o professor devem atuar. É entre a Zona de Desenvolvimento Real e a Zona de Desenvolvimento Potencial que o professor deve agir, como mediador, intervindo na aprendizagem do aluno, para que ele se desenvolva. Segundo Rego (2004, p. 110), 94 UNIDADE 1 | AS PRINCIPAIS CONCEPÇÕES TEÓRICAS DA EDUCAÇÃO INFANTIL: RELAÇÃO TEÓRICO-PRÁTICA O paradigma esboçado sugere, assim, um redimensionamento do valor das interações sociais (entre os alunos e o professor e entre as crianças) no contexto escolar. Essas passam a ser entendidas como condição necessária para a produção de conhecimentos por parte dos alunos, particularmente aquelas que permitam o diálogo, a cooperação e troca de informações mútuas, o confronto de pontos de vista divergentes e que implicam a divisão de tarefas onde cada um tem uma responsabilidade que, somadas, resultarão no alcance de um objetivo comum. Cabe, portanto, ao professor não somente permitir que elas ocorram, como também promovê-las no cotidiano das salas de aula. Para Vygotsky (1991), a escola é o local onde, intencionalmente, a intervenção pedagógica faz acontecer o processo ensino-aprendizagem. O objetivo da escola, portanto, é fazer com que os conceitos espontâneos da criança, de senso comum, se transformem em conhecimentos científicos, através da mediação e da interação. Nesta teoria, a criança não é apenas sujeito da aprendizagem e, sim, aquela que aprende os valores, a linguagem e o próprio conhecimento, com o outro. FIGURA 56 – CRIANÇA INTERAGINDO COM O OUTRO FONTE: Disponível em: <http://cidadedaesperanca.wordpress. com/2010/02/>. Acesso em: 5 abr. 2012. É por isto que a escola necessita ser um local privilegiado de interações, de diálogo, de transformação. A escola precisa proporcionar e estimular o desenvolvimento de todo o potencial da criança. Os postulados de Vygotsky parecem apontar para a necessidade de criação de uma escola bem diferente da que conhecemos. Uma escola em que as pessoas possam dialogar, duvidar, discutir, questionar e compartilhar saberes. Onde há espaço para transformações, para as diferenças, para o erro, para as contradições, para a colaboração mútua e para a criatividade. Uma escola em que professores e alunos tenham autonomia, possam pensar, refletir sobre o seu próprio processo de construção de conhecimentos e ter acesso a novas informações. Uma escola em que o conhecimento já sistematizado não é tratado de forma dogmática e esvaziado de significado. (REGO, 2004, p. 118). TÓPICO 5 | O SOCIOINTERACIONISMO DE VYGOTSKY 95 E então, vai ficar esperando para que esta nova escola surja? Que tal modificar a sua prática a fim de tornar a aprendizagem mais significativa? Se você ainda não é professor, reflita sobre o que você considera ser a melhor forma de ser um professor. Será que ela é mesmo a melhor e única forma de lecionar? Pense nas teorias apresentadas até agora. Reflita no tipo de professor que você quer ser, no tipo de aluno que quer formar... Não esqueça: depende de você fazer a diferença para aquela criança que está em sala de aula. Comece agora, é só dar o primeiro passo! Para complementar os seus estudos neste tópico, vamos conhecer um pouco sobre o construcionismo. Esta teoria leva em consideração o computador como uma ferramenta de aprendizagem e foi elaborada por Seymund Papert, com base no construtivismo de Piaget. CONSTRUCIONISMO: O COMPUTADOR COMO FERRAMENTA DE APRENDIZAGEM Assumindo um panorama alternativo à linha instrucionista, surgiu o computador como uma ferramenta educacional. Valente (1993, p. 12) explica que “[...] segundo esta modalidade, o computador não é mais o instrumento que ensina o aprendiz, mas a ferramenta com a qual o aluno desenvolve algo, e, portanto, a aprendizagem ocorre pelo fato de estar executando uma tarefa por meio do computador”. Fica explícita a ideia de que com o “computador ferramenta” o aluno será o sujeito promotor de uma ação, ou seja: seu lugar deixa de ser o de espectador e passa a ser o de agente. Existem vários softwares que podem propiciar o uso do computador como uma ferramenta, com este sentido estrito, tal como tratado aqui. Entre eles destacam-se as planilhas eletrônicas, os gerenciadores de bancos de dados, os mecanismos de busca na internet, as ferramentas de cooperação e comunicação em rede e também as linguagens de programação. Planilhas eletrônicas são softwares que permitem a criação e manipulação de folhas de cálculo, gráficos e também armazenar informações visando à pesquisa, relatórios e estatísticas. São exemplos de planilhas o Excel do pacote de aplicativos Microsoft Office e Calc do pacote de aplicativos Open Office. Os gerenciadores de bancos de dados permitem criar coleções de informações em um formato devidamente estruturado, de forma a proceder a sua rápida recuperação (pesquisa), relacionamento e compartilhamento. Os gerenciadores de bancos de dados constituem-se como base para os sistemas de informações que atendem a diversas áreas, sendo largamente usados, por exemplo, em bibliotecas, hospitais, comércio, indústria, internet etc. Exemplos: MySql, Oracle, Firebird, Postgress e MS-SQL Server. LEITURA COMPLEMENTAR 96 UNIDADE 1 | AS PRINCIPAIS CONCEPÇÕES TEÓRICAS DA EDUCAÇÃO INFANTIL: RELAÇÃO TEÓRICO-PRÁTICA Os mecanismos de buscas na internet são ferramentas que permitem ao usuário realizar buscas a conteúdos específicos dentro da rede mundial de computadores. Ultimamente tem sido o ponto de partida para a navegação na rede, sendo muito conhecidos o Google, Alta Vista, Yahoo, entre outros. As ferramentas de cooperação e comunicação em rede constituem meios virtuais de troca de mensagens e ações cooperativas na internet. Enquadram-se o correio eletrônico (e-mail), as ferramentas de troca sincrônica de mensagens (MSN, por exemplo) e também as plataformas de EAD tais como o Moodle e o Teleduc. Linguagens de programação são softwares que proporcionam um ambiente de expressão de raciocínio visando à solução de problemas por meio do computador. Em outras palavras, uma linguagem de programação permite a criação de softwares específicos. BASIC, PASCAL, FORTRAN, C++, JAVA, LOGO são nomes de algumas dessas ferramentas. Ainda no prefácio de seu livro “LOGO: Computadores e Educação” (tradução do original Mindstorms – Children, Computers and Powerfull Ideas), Papert, ao criticar o paradigma instrucionista, introduz o seu pensamento mostrando que o computador pode e deve ser utilizado como uma máquina de produção de conhecimento. [...] a frase “instrução ajudada pelo computador” (computer- aidedinstruction) significa fazer com que o computador ensine a criança. Pode-se dizer que o computador está sendo usado para “programar” a criança. Na minha perspectiva é a criança que deve programar o computador e, ao fazê-lo, ela adquire um sentimento de domínio sobre um dos mais modernos e poderosos equipamentos tecnológicos e estabelece um contato íntimo com algumas das ideias mais profundas da ciência, da matemática e da arte de construir modelos intelectuais. (PAPERT, 1980, 1985, p.17). Nessa forma alternativa de uso da máquina, alunos e professores passam a ter a chance de elaborar projetos para solução de situações-problemas das mais diversas áreas. Isso pode ser conseguido, por exemplo, com o uso das linguagens de programação como suporte à elaboração de programas de computador que representam essas soluções. Papert (1986) sugeriu o termo construcionismo para designar a modalidade em que um aluno utiliza o computador como uma ferramenta com a qual ele constrói seu conhecimento. Valente (1993) afirma que Papert usou o termo construcionismopara “mostrar um outro nível de construção do conhecimento: a construção do conhecimento que acontece quando o aluno elabora um objeto de seu interesse, como uma obra de arte, um relato de experiência ou um programa de computador” (VALENTE, 1993, p. 40). Percebe-se que o uso do computador nessa abordagem se configura de maneira antagônica à inicialmente introduzida com o instrucionismo. TÓPICO 5 | O SOCIOINTERACIONISMO DE VYGOTSKY 97 FIGURA 2.3 – LINHAS DE ENSINO-APRENDIZAGEM USANDO O COMPUTADOR A Figura 2.3 apresenta as duas linhas de ensino-aprendizagem – instrucionismo e construcionismo – sugerindo uma comparação entre elas. Nota- se, em ambos os casos, a presença do computador, do aluno, de um professor e de um software. As diferenças estão no sentido da direção do ensino, no tipo de software utilizado, na postura a ser adotada pelo educador e na caracterização do aluno dentro do processo. Como visto anteriormente, no instrucionismo tem-se o computador pré-programado ensinando a um aluno – espectador do processo – por meio de um software da modalidade CAI. No construcionismo de Papert o processo é invertido. O educando precisa assumir postura ativa e passar a ensinar ao computador a cumprir uma determinada tarefa. Isso é conseguido por meio de um software, que em nosso caso é uma LPC. Configura-se nas duas abordagens a mediação do processo de aprendizagem pelo professor. Por ora, indica-se que a atuação desse tutor deverá ser compatível com as possibilidades oferecidas por cada linha. Em tempo, serão apresentadas as características inerentes a esses profissionais, as quais são decisivas para o sucesso de suas intervenções pedagógicas. A abordagem construcionista é sintetizada em seu objeto de estudo: um problema e a sua compreensão, a elaboração de uma estratégia de solução no computador, pelo aluno, mediado por um profissional da educação; e no ferramental: um computador e uma linguagem de programação usados para a construção do conhecimento. Baseando-se nisto, a próxima seção enfoca o conceito de linguagem de programação e seu uso no meio educacional. FONTE: LIMA, Márcio Roberto de. Construcionismo de Papert e ensino-aprendizagem de programação de computadores no ensino superior. 2009. 143 f. Dissertação (Mestrado em Educação) – Departamento de Educação, Universidade Federal de São João Del-Rei, São João Del-Rei, 2009. Disponível em: <http://www.ufsj.edu.br/portal2-repositorio/File/ mestradoeducacao/Dissertacao1.pdf>. Acesso em: 9 maio 2012. 98 RESUMO DO TÓPICO 5 Neste tópico, você aprendeu que: • Lev Semynovich Vygotsky nasceu em novembro de 1896, na Rússia. Formou-se em Direito e Literatura na Universidade de Moscou. Faleceu aos 38 anos, por consequência de uma tuberculose adquirida catorze anos antes. • Apesar de Vygotsky e Piaget terem nascido no mesmo ano e terem diversos pontos em comum em suas teorias, nunca chegaram a se conhecer. • Vygotsky não elaborou uma teoria pedagógica, mas suas ideias trouxeram diversas contribuições para a educação. • Os conceitos básicos da teoria de Vygotsky são: mediação/interação; processos de internalização; níveis de desenvolvimento; Zona de Desenvolvimento Proximal; tomada de consciência; relação desenvolvimento e aprendizagem; função do brinquedo no desenvolvimento da criança. • A aquisição do conhecimento só acontece pela interação sociocultural da criança com o meio, de forma mediada. • A cultura é que fornece elementos simbólicos de representação da realidade, permitindo que a criança construa a sua interpretação do mundo que a rodeia. Para Vygotsky existem dois elementos básicos no processo de mediação: o instrumento e o signo. • O processo de internalização envolve aspectos específicos como: significação; apropriação e diferentes modos de participação. • Existem pelo menos dois níveis de desenvolvimento: o real e o potencial. A distância entre o que a criança já sabe fazer (real) e o que consegue realizar com a ajuda dos outros (potencial) chama-se Zona de Desenvolvimento Proximal. • Para Vygotsky a aprendizagem vem antes do desenvolvimento. Somente aos poucos é que a criança vai despertando a consciência da consciência que possui. • O brinquedo é responsável pela ampliação do conhecimento na Zona de Desenvolvimento Proximal. A função do brinquedo não é proporcionar prazer para a criança e, sim, satisfazer imediatamente o seu desejo. A criança aprende a agir de forma cognitiva por meio do brinquedo. • Para Vygotsky, quanto mais a criança aprende, mais se desenvolverá. A educação tem um papel insubstituível na apropriação da experiência cultural acumulada socialmente. 99 • O papel do professor é o de interferir na Zona de Desenvolvimento Proximal, provocando avanços que não ocorrem de forma espontânea. A função da escola é fazer com que os conceitos da criança, em nível de senso comum, se transformem em conceitos científicos. 100 1 Neste tópico, você conheceu um pouco mais sobre a vida e a teoria de Vygotsky. Com base nestes conhecimentos, elabore o seu próprio conceito de Zona de Desenvolvimento Proximal. ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ 2 Em sua opinião, como o professor pode fazer o papel de mediador no processo ensino-aprendizagem para dar conta da proposta teórica de Vygotsky? ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ AUTOATIVIDADE 101 UNIDADE 2 DIVERSOS CONTEXTOS DA EDUCAÇÃO INFANTIL: ORGANIZAÇÃO DO TEMPO E DOS ESPAÇOS OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM PLANO DE ESTUDOS A partir desta unidade você será capaz de: • compreender como ocorre a organização dos espaços na Educação Infantil; • perceber a importância do planejamento e da rotina; • identificar aspectos que contribuam para o desenvolvimento da autono- mia e identidade da criança; • aprofundar seu conhecimento a respeito dos Eixos Norteadores da Educa- ção Infantil. Esta unidade está dividida em quatro tópicos. Em cada um deles, você en- contrará atividades que o(a) ajudarão a compreender e fixar os conhecimen- tos adquiridos. TÓPICO 1 – ORGANIZAÇÃO DO ESPAÇO FÍSICO E DOS AMBIENTES FACILITADORES NA EDUCAÇÃO INFANTIL TÓPICO 2 – A ORGANIZAÇÃO DA ROTINA E O PLANEJAMENTO NA EDUCAÇÃO INFANTIL TÓPICO 3 – A CONSTRUÇÃO DA AUTONOMIA E DA IDENTIDADE DA CRIANÇA TÓPICO 4 – OS EIXOS NORTEADORES DA EDUCAÇÃO INFANTIL: IN- TERAÇÃO, BRINCADEIRA E APRENDIZAGEM 102 103 TÓPICO 1 ORGANIZAÇÃO DO ESPAÇO FÍSICO E DOS AMBIENTES FACILITADORES NA EDUCAÇÃO INFANTIL UNIDADE 2 1 INTRODUÇÃO O espaço físico não apenas contribui para a realização da educação, mas é em si uma forma silenciosa de educar. Como afirma Antônio Vinão Frago, referindo-se ao espaço escolar, este não é apenas um “cenário” onde se desenvolve a educação, mas sim “uma forma silenciosa de ensino”. (BRASIL, 2006a, p. 8). Pela afirmação anterior, pode-se perceber a importância que tem a organização dos espaços destinados à Educação Infantil, no processoensino- aprendizagem. É sobre isto que iremos falar neste tópico: a organização do espaço físico e o papel do professor nesta organização. Traremos informações sobre a estrutura física e a organização dos espaços conforme indicação dos Parâmetros Básicos de Infraestrutura para Instituições de Educação Infantil, elaborados pelo MEC (2006a), assim como dicas e sugestões de organização dos espaços pelo professor, além de dicas de objetos e materiais a serem disponibilizados às crianças em cada um dos espaços trabalhados. Que bom que estamos juntos nesta caminhada. Com certeza você já ouviu falar em muitas das dicas que traremos neste tópico. Também deve conhecer muitas outras que não aparecem no texto, mas que são muito importantes para a organização dos espaços na Educação Infantil. Que tal socializar esse conhecimento com os seus colegas de turma? Abraços e boa troca de experiências! 2 ORGANIZAÇÃO DOS ESPAÇOS PARA CRIANÇAS DE 0 A 1 ANO DE IDADE Os espaços para crianças de 0 a 1 ano de idade devem privilegiar o cuidar e o educar e serem organizados de forma a desenvolver as crianças de forma plena. As crianças de 0 a 1 ano, com seus ritmos próprios, necessitam de espaços para engatinhar, rolar, ensaiar os primeiros passos, explorar materiais diversos, observar, brincar, tocar o outro, alimentar-se, tomar banho, repousar, dormir, satisfazendo, assim, suas necessidades essenciais. Recomenda-se que o espaço a elas destinado esteja situado em local silencioso, preservado de áreas de grande movimentação e proporcione conforto térmico e acústico. (BRASIL, 2006a, p. 11). UNIDADE 2 | DIVERSOS CONTEXTOS DA EDUCAÇÃO INFANTIL: ORGANIZAÇÃO DO TEMPO E DOS ESPAÇOS 104 Desta forma, de acordo com os Parâmetros Básicos de Infraestrutura para Instituições de Educação Infantil (2006a), o espaço para esta faixa-etária deve estar organizado de forma a conter: FIGURA 57 – ORGANIZAÇÃO DOS ESPAÇOS PARA CRIANÇAS DE 0 A 1 ANO FONTE: As autoras Este documento (BRASIL, 2006a) sugere ainda que a construção destes espaços observe os seguintes aspectos: FIGURA 58 – ASPECTOS CONSTRUTIVOS DOS ESPAÇOS PARA CRIANÇAS DE 0 A 1 ANO FONTE: As autoras Agora que você já sabe o que observar na construção dos espaços, vamos abordar a organização de cada ambiente. Acompanhe! 2.1 SALA DE REPOUSO Como o próprio nome diz, é um espaço destinado ao repouso/descanso das crianças desta faixa-etária (0 a 1 ano de idade). Por isto, deve conter colchões, colchonetes, entre outros, onde as crianças possam dormir tranquilamente, com conforto e segurança. TÓPICO 1 | ORGANIZAÇÃO DO ESPAÇO FÍSICO E DOS AMBIENTES FACILITADORES NA EDUCAÇÃO INFANTIL 105 FIGURA 59 – SALA DE REPOUSO FONTE: Disponível em: <http://revistaescola.abril.com.br/creche-pre-escola/ roteiro-didatico-identidade-autonomia-creche-634707.shtml?page=8.2>. Acesso em: 13 jul. 2012. DICAS Lembre-se: evite utilizar tapetes nos ambientes, pois eles acumulam poeira e dificultam a limpeza dos espaços, possibilitando o surgimento de diversas doenças, entre elas as alérgicas. Agora, vamos pensar um pouco como o professor pode organizar este espaço: - deixar um espaço adequado entre os colchões, se possível, de forma a facilitar a circulação entre eles; - colocar música ambiente (clássica, de relaxamento), que acalme e favoreça o descanso das crianças; - pendurar móbiles (elaborados com diversos materiais), para que a criança possa se distrair enquanto descansa. 2.2 SALA DE ATIVIDADES É o espaço reservado para a realização das atividades previstas pelo professor no planejamento. Necessita ser um espaço amplo, que permita à criança a exploração do ambiente e dos objetos que ali se encontram. Conforme os Parâmetros Básicos de Infraestrutura para Instituições de Educação Infantil (BRASIL, 2006a), sugere-se que este espaço contenha: UNIDADE 2 | DIVERSOS CONTEXTOS DA EDUCAÇÃO INFANTIL: ORGANIZAÇÃO DO TEMPO E DOS ESPAÇOS 106 • espelhos amplos, onde as crianças possam se ver, se perceber. “Quando o bebê se vê diante de um espelho favorece o conhecimento de si e do mundo, porque a criança vê sua imagem refletida no espelho e, pela sua ação, identifica- se como distinta de outras crianças e dos objetos”. (KISHIMOTO, 2010, p. 3); • bancadas, prateleiras e/ou armários para guardar brinquedos, com altura em torno de 0,65 cm, para que as crianças tenham acesso livre a eles. Para que o ambiente fique bem organizado, os brinquedos devem ser disponibilizados em estantes baixas, em locais separados, “[...] com mobiliário adequado, em caixas etiquetadas para a criança saber onde guardar. Esse hábito se adquire durante a brincadeira, em local tranquilo, com opções interessantes e o apoio constante e afetivo da professora”. (KISHIMOTO, 2010, p. 8); • portas que deem acesso ao solário, ao pátio ou parque, para que elas possam tomar sol. De acordo com Kishimoto (2010, p. 9), os “[...] bebês devem ter acesso a um solário próximo a sua sala, com brinquedos, para brincadeiras interativas com as professoras. Crianças que começam a andar devem ser separadas daquelas que correm”, para que a professora possa dar atenção adequada a cada uma; • janelas de acordo com a altura das crianças, para que elas possam visualizar o ambiente externo. “A criança explora o mundo, vendo casas, prédios, morros, florestas, árvores com flores e frutos, pássaros, animais, nuvens, céu, plantações, rios, riachos e o mar, jardins, ruas, bueiros, lixos, fumaça das fábricas, mangues, supermercado e carros [...]”. (KISHIMOTO, 2010, p. 12). FIGURA 60 – SALA DE ATIVIDADES 1 FONTE: Disponível em: <http:// marleideias.blogspot.com.br/2010/12/ bercarios.html>. Acesso em: 17 jun. 2012. FIGURA 61 – SALA DE ATIVIDADES 2 FONTE: Disponível em: <http://www. lookfordiagnosis.com/mesh_info. php?term=Ber%C3%A7%C3%A1rios&lang=3>. Acesso em: 17 jun. 2012. TÓPICO 1 | ORGANIZAÇÃO DO ESPAÇO FÍSICO E DOS AMBIENTES FACILITADORES NA EDUCAÇÃO INFANTIL 107 DICAS Neste espaço, além dos tapetes, é necessário evitar a utilização de brinquedos com pequenas peças, pois as crianças desta faixa etária levam tudo à boca e podem engolir ou se sufocar com peças pequenas. De acordo com Kishimoto (2010), existem alguns aspectos a ser considerados na seleção dos brinquedos para os bebês: - TAMANHO – O brinquedo deve ser duas vezes mais largo do que a mão fechada da criança (punho). - DURABILIDADE – Não disponibilizar vidros, copos plásticos ou brinquedos muito duros que podem se quebrar facilmente durante o uso. - CORDAS E CORDÕES – Devem ser evitados, pois podem enroscar no pescoço da criança. - BORDAS CORTANTES OU PONTAS – Deve-se eliminar este tipo de brinquedo. - NÃO TÓXICOS – Evitar os brinquedos produzidos com tintas ou materiais tóxicos, já que os bebês os colocam na boca. - NÃO INFLAMÁVEL – Cuidar para que não seja um brinquedo que pegue fogo. - LAVÁVEL, QUE PODE SER LIMPO – Evitar principalmente bonecas e brinquedos com tecidos. - DIVERTIDO – O brinquedo deve ser interessante e atraente. É importante observar estes aspectos, pois a criança coloca o brinquedo na boca com grande frequência, procurando vivenciar diferentes sensações, como duro, mole, macio, áspero, ampliando assim as experiências sensoriais que já possui e iniciando sua caminhada na compreensão de conceitos, já que o professor, ao estar atento à brincadeira da criança, vai nomeando as texturas dos objetos. Texturas, cores, odores, sabores, sons são experiências que a criança adquire no contato com móbiles coloridos, sonoros e brinquedos com diferentes texturas, formas, saquinhos com ervas aromáticas. Os objetos de uso cotidiano são importantes itens para ampliar as experiências sensoriais. Objetos feitos com materiais naturais ou de metal, como bucha, escova de dente nova, pente de madeira oude osso, maçã ou limão, argola de madeira ou de metal, chaveiro com chaves, bolas de tecido, madeira ou borracha, sino e outros, dentro de um cesto de vime, sem alças, grande e com base plana, serve para a exploração livre do bebê que fica sentado. (KISHIMOTO, 2010, p. 3). UNIDADE 2 | DIVERSOS CONTEXTOS DA EDUCAÇÃO INFANTIL: ORGANIZAÇÃO DO TEMPO E DOS ESPAÇOS 108 Por volta dos seis meses, os bebês fazem uso da mão para pegar, encaixar, segurar, sentir, enfim, manipular os objetos e brinquedos disponíveis. “A criança, nessa fase, pensa com as mãos”. (KISHIMOTO, 2010, p. 4). Por isto é importante dispor diversos materiais diferentes para que a criança possa explorá-los, senti- los, conhecê-los, conforme nos orienta Kishimoto (2010, p. 4): Pinos de encaixe coloridos, no formato de carrinho ou trem, chamam sua atenção e os bebês querem saber o que se pode fazer com tais objetos. Usar o corpo como instrumento de conhecimento é característico de bebês e crianças pequenas. Eles gostam de entrar em caixas, em buracos, túneis, passagens estreitas, apreciam empurrar, puxar, subir, encaixar, empilhar. Há brinquedos e materiais que auxiliam o conhecimento do mundo físico, entre os quais, as bolas que são ótimas para apertar, conhecer sua textura, cor, deixar cair para ver como rolam. Há bolas com diferentes funções: produz som no toque, possui face espelhada, que auxilia o conhecimento de si, e buracos, que deixam o bebê enfiar o braço e a mão para explorá-los. [...] Outros brinquedos de construção podem servir para os pequenos empilharem e para os maiores construírem novos espaços para as brincadeiras imaginárias. (KISHIMOTO, 2010, p. 4). O mais importante é que o professor esteja atento às curiosidades dos bebês, e disponibilize novos desafios, estimulando cada vez mais o processo de conhecimento das crianças. Materiais simples como colchões, tecidos, lençóis servem para fazer um túnel, uma cabana (para elas se esconderem), balançar as crianças, transportá-las de um lado para outro (puxando-as com os colchões ou lençóis), para rolar, dar cambalhotas, engatinhar, entre outros. Não perca a oportunidade de utilizar os materiais encontrados no dia a dia, para estimular cada vez mais os bebês e se divertir. Módulos de espuma resistente, revestidos de tecidos emborrachados, de fácil limpeza, servem para criação de estruturas para exploração motora com rampas para subir e descer, pontes, para passar por baixo. Acoplados e outros módulos com buracos e túneis constituem experiências desafiadoras em que o movimento é a linguagem privilegiada. (KISHIMOTO, 2010, p. 4). Outros brinquedos interessantes, que não necessariamente precisam ser comprados e sim criados pelo(a) professor(a), são os balanços, que podem ser pendurados dentro da sala. Eles podem ser feitos com pneus, tecidos, cordas, materiais recicláveis, de forma a torná-los mais confortáveis e menos duros (que os tradicionais de madeira), e assim não machucar as crianças que os utilizam nem as que passam perto. Outro material que pode ser construído e que lembra um pouco o balanço é feito com tecidos e elásticos (grandes e resistentes), no qual a criança senta, encostando os pés no chão, e se balança empurrando os pés para cima e para baixo (dando pulos). Da mesma forma, os cavalinhos podem ser criados com madeira roliça, pintados com a turma e ficar disponíveis em sala. Triciclos sem pedal ou carrinhos/caixas de empurrar e puxar fazem a criança que começa a andar usar amplos movimentos. Cavalinhos e balanços possibilitam balançar e cavalgar, cubos servem para empilhar. Bancadas de brinquedos para martelar possibilitam a compreensão de que o pino penetra na bancada. É a descoberta da relação entre o martelar e o deslocar. (KISHIMOTO, 2010, p. 4). TÓPICO 1 | ORGANIZAÇÃO DO ESPAÇO FÍSICO E DOS AMBIENTES FACILITADORES NA EDUCAÇÃO INFANTIL 109 Como você percebeu diversos brinquedos/objetos podem ser criados ou reutilizados, de forma a promover e estimular o desenvolvimento dos bebês. A seguir, segue uma lista de sugestões de materiais a serem disponibilizados aos bebês em sala: QUADRO 10 – SUGESTÕES DE BRINQUEDOS E MATERIAIS Idade Sugestões Bebês (0 a 1 ano e meio) - Chocalhos, móbiles sonoros, sinos, brinquedos para morder, bolas de diversos tamanhos, cores e texturas, blocos macios, livros e imagens coloridas, brinquedos de empilhar, encaixar, espelhos. - Objetos com texturas (mole, rugoso, liso, duro) e coloridos, que fazem som (brinquedos musicais ou que emitem som), de movimento (carros e objetos para empurrar), para encher e esvaziar. - Brinquedos de parque. - Brinquedos para bater. - Cesto com objetos de materiais naturais, metal e de uso cotidiano. - Colcha, rede e colchonete. - Estruturas com blocos de espuma para subir, descer, entrar em túneis. FONTE: Kishimoto (2010) 2.3 FRALDÁRIO O fraldário é o local onde são guardadas as fraldas e materiais de higiene e é utilizado para a troca de fraldas e higienização das crianças. FONTE: As autoras FIGURA 62 – FRALDÁRIO U.E.I. BAIRRO JOÁO PAULO II JOSÉ LINO KUHNEN, INDAIAL SC UNIDADE 2 | DIVERSOS CONTEXTOS DA EDUCAÇÃO INFANTIL: ORGANIZAÇÃO DO TEMPO E DOS ESPAÇOS 110 Além de possuir piso e paredes de fácil limpeza e janelas com boa ventilação, os Parâmetros Básicos de Infraestrutura para Instituições de Educação Infantil (BRASIL, 2006a) orientam que este espaço contenha: • bancada para troca de fraldas, com colchonete; • tanque com torneira para higienização das mãos; • banheira em material térmico, com ducha de água quente e fria; • armários e prateleiras para guardar as fraldas e materiais de higienização; • cabides para pendurar toalhas e sacolas; • lixeira com tampa. É importante que este espaço possua móbiles ou outros materiais com os quais a criança possa se distrair durante a troca. Também é importante que o professor converse com a criança e aproveite o momento para fazer massagens relaxantes... “brinque de esconder e achar com uma fralda, dizendo “cucu”, “escondeu”, “achou”. Quando toma a iniciativa e esconde outros brinquedos o bebê já domina a brincadeira e expressa de forma prazerosa, repetindo sua nova experiência, variando as situações”. (KISHIMOTO, 2010, p. 3). DICAS No banho e troca de fraldas, evitar ações mecanizadas e dar atenção a cada criança, brincando, movimentando seus braços, pernas, comentando cada gesto. Brincar: onde está o nariz? Aqui! Onde está a barriga? Aqui! Apontar para a parte do corpo da criança (KISHIMOTO, 2010). Não deixe de utilizar a criatividade e interagir com ela neste momento tão especial... 2.4 LACTÁRIO O lactário é o local destinado para o preparo e higienização das mamadeiras. Para isto, deve-se observar que o espaço esteja próximo à sala de atividades, a fim de facilitar o transporte dos utensílios, e distante da lavanderia e dos banheiros (BRASIL, 2006a). TÓPICO 1 | ORGANIZAÇÃO DO ESPAÇO FÍSICO E DOS AMBIENTES FACILITADORES NA EDUCAÇÃO INFANTIL 111 DICAS Você pode permitir que a criança imite a ação durante a alimentação, dando de comer ao bichinho, à boneca, limpando o rosto com o guardanapo, entre outros (KISHIMOTO, 2010). O momento da alimentação é muito importante para a criança experimentar novos sabores, sentir os aromas. Aproveite este momento para estimulá-la a provar alimentos diferentes. 2.5 SOLÁRIO 3 ORGANIZAÇÃO DOS ESPAÇOS PARA CRIANÇAS DE 1 A 6 ANOS O solário é um espaço livre e descoberto, onde as crianças possam tomar banho de sol. De acordo com os Parâmetros Básicos de Infraestrutura para Instituições de Educação Infantil (BRASIL, 2006a), este espaço deve estar interligado à sala de atividades, e ser de uso exclusivo das crianças de 0 a 1 ano. Seu acesso deverá ser fácil, sem desníveis, permitindo o trânsito de carrinhos de bebê, e possuir dimensãocompatível com o número de crianças da turma (aproximadamente 1,50m² por criança). Neste espaço podem ser realizadas diversas brincadeiras e atividades com os bebês. Puxá-los com carrinhos de madeira (em que uma criança ou duas vão sentadas), e passear pelo espaço externo da instituição é uma atividade interessante. Da mesma forma, aproveite este espaço para deixar a criança brincar com a água, a terra, a areia, ou fazer “experiências com tintas, alimentos, plantas e outros materiais, para explorar e ver o que acontece, movidas pela curiosidade”. (KISHIMOTO, 2010, p. 4). Cabe ao(à) professor(a), conforme o seu planejamento, criar opções diferenciadas para o desenvolvimento integral dos bebês, exercitando a sua capacidade criativa. Agora que já vimos cada um dos espaços para crianças de 0 a 1 ano de idade, vamos explorar de que forma ocorre a organização dos espaços para as crianças com mais de um ano? O espaço físico para a criança de 1 a 6 anos deve ser visto como um suporte que possibilita e contribui para a vivência e a expressão das culturas infantis – jogos, brincadeiras, músicas, histórias que expressam a especificidade do olhar infantil. (BRASIL, 2006a, p. 16). UNIDADE 2 | DIVERSOS CONTEXTOS DA EDUCAÇÃO INFANTIL: ORGANIZAÇÃO DO TEMPO E DOS ESPAÇOS 112 Desta forma, a organização dos espaços para crianças de 1 a 6 anos abrange a organização da instituição de Educação Infantil em si, pois as crianças utilizarão praticamente todos os espaços presentes. Para tanto, [...] as propostas pedagógicas das instituições de Educação Infantil deverão prever condições para o trabalho coletivo e para a organização de materiais, espaços e tempos que assegurem [...]: - os deslocamentos e os movimentos amplos das crianças nos espaços internos e externos às salas de referência das turmas e à instituição; - a acessibilidade de espaços, materiais, objetos, brinquedos e instruções para as crianças com deficiência, transtornos globais de desenvolvimento e altas habilidades/superdotação. (BRASIL, 2010, p. 19-20). Neste caderno focaremos a discussão e apresentação dos espaços mais utilizados pelas crianças de 1 a 6 anos, como: FIGURA 63 – ESPAÇOS PARA CRIANÇAS DE 1 A 6 ANOS FONTE: As autoras No entanto, queremos afirmar que a organização dos demais espaços (lavanderia, cozinha, depósito, recepção, secretaria, direção, almoxarifado, sala de professores) também é importante para o desenvolvimento das atividades e da rotina da instituição. Em relação aos aspectos construtivos, os Parâmetros Básicos de Infraestrutura para Instituições de Educação Infantil (BRASIL, 2006a) orientam que sejam observados os seguintes aspectos: TÓPICO 1 | ORGANIZAÇÃO DO ESPAÇO FÍSICO E DOS AMBIENTES FACILITADORES NA EDUCAÇÃO INFANTIL 113 FIGURA 64 – ASPECTOS CONSTRUTIVOS FONTE: As autoras Tendo observado os elementos para a construção dos espaços, vamos analisar de forma detalhada os ambientes mais utilizados pelas crianças de 1 a 6 anos? 3.1 SALA DE ATIVIDADES A sala de atividades é destinada às crianças de determinada faixa etária (sala de referência), conforme a organização da instituição. Para isto, é necessário que o professor, de acordo com o planejamento, organize a sala de forma a facilitar e estimular o processo ensino-aprendizagem. A professora/professor, junto com as crianças, prepara o ambiente da Educação Infantil, organiza-o a partir do que sabe que é bom e importante para o desenvolvimento de todos e incorpora os valores culturais das famílias em suas propostas pedagógicas, fazendo-o de modo que as crianças possam ressignificá-lo e transformá-lo. A criança pode e deve propor, recriar e explorar o ambiente, modificando o que foi planejado. (BRASIL, 2006a, p. 9). UNIDADE 2 | DIVERSOS CONTEXTOS DA EDUCAÇÃO INFANTIL: ORGANIZAÇÃO DO TEMPO E DOS ESPAÇOS 114 As salas de atividades são espaços lúdicos, podendo ser organizadas em cantinhos (da leitura, da brincadeira, dos jogos, do desenho, da massinha, entre outros), e necessitam ser acessíveis, dinâmicos, vivos, brincáveis, fáceis de serem explorados e modificados. Sugere-se que estes ambientes variados, de acordo com Horn (2005, p. 29), sejam: [...] separados por estantes, prateleiras, móveis, possibilitando que a criança possa visualizar a figura do adulto, não necessitando deste para realizar diferentes atividades. Nesse modo de organizar o espaço, existe a possibilidade de as crianças se descentrarem da figura do adulto, sentirem segurança e confiança ao explorarem o ambiente, terem oportunidades para contato social e para gozar momentos de privacidade. FIGURA 65 – CANTINHOS - U.E.I. BAIRRO JOÁO PAULO II - JOSÉ LINO KUHNEN, INDAIAL - SC FONTE: As autoras A forma como são organizadas as salas nas instituições de Educação Infantil depende do planejamento do professor, dos objetivos que pretende alcançar, do que quer desenvolver/estimular nas crianças, tornando-se parte integrante da prática pedagógica. A organização das salas de forma linear, com mesas e cadeiras, sem a organização de cantos diversificados, onde a criança não tem a possibilidade de escolher com qual atividade quer brincar e depende exclusivamente do que o professor selecionou para a turma toda desenvolver ao mesmo tempo reflete uma visão tradicional/cartesiana da educação, e há muito tempo deixou de ser indicada para o trabalho com as crianças. A organização dos espaços da Educação Infantil em cantinhos/ambientes facilitadores da aprendizagem [...] podem favorecer diferentes tipos de interações em que o professor tem papel importante como organizador dos espaços onde ocorre o processo educacional. Tal trabalho baseia-se na escuta, diálogo e observação das necessidades e interesses expressos pelas crianças, transformando-as em objetivos pedagógicos. (BRASIL, 2006a, p. 10). TÓPICO 1 | ORGANIZAÇÃO DO ESPAÇO FÍSICO E DOS AMBIENTES FACILITADORES NA EDUCAÇÃO INFANTIL 115 Desta forma, é muito importante o professor pensar qual a concepção que tem das crianças, que crianças quer formar (dependentes, adestradas ou autônomas, ativas, independentes). A organização dos espaços é um elemento curricular importante na Educação Infantil, pois dá suporte e cria oportunidades de diferentes formas de aprendizagem, [...] por meio das interações possíveis entre crianças e objetos e delas entre si. Assim considerado, o espaço na educação infantil não é somente um local de trabalho, um elemento a mais no processo educativo, é, antes de tudo, um recurso, um instrumento, um parceiro do professor na prática educativa. (HORN, 2005, p. 29). Por ser um parceiro da prática educativa, a organização dos ambientes/ espaços não deve ser engessada, permanecendo a mesma organização durante o semestre/ano todo. Os ambientes (cantinhos) precisam ser organizados conforme o planejamento do professor ou o interesse das crianças, e ser modificados a cada certo período de tempo: mensalmente, a cada dois ou três meses, conforme o (des)interesse das crianças pelos espaços, as necessidades do planejamento do professor, entre outros. O importante é criar outras possibilidades de interação para as crianças, em que elas mesmas possam contribuir na organização e definição dos ambientes a serem criados. Com base nestas definições, vamos trazer algumas opções de ambientes facilitadores/cantinhos que você pode utilizar na organização das salas de Educação Infantil: a) Cantinho da fantasia Neste ambiente pode haver um baú ou cabideiro com várias opções de roupas (masculinas e femininas), chapéus e sapatos de adultos, com as quais a criança possa se vestir, se olhar no espelho, brincar de festa à fantasia, imitar a mamãe, o papai, a professora, entre outros. É o espaço em que a criança pode soltar a imaginação e tornar-se adulta, mesmo que de mentirinha. U.E.I. BAIRRO JOÁO PAULO II - JOSÉ LINO KUHNEN, INDAIAL - SC FIGURA 66 – CANTINHO DA FANTASIA 1 FONTE: As autoras FIGURA 67 – CANTINHO DA FANTASIA 2 FONTE: As autoras UNIDADE 2 | DIVERSOS CONTEXTOS DA EDUCAÇÃO INFANTIL: ORGANIZAÇÃO DO TEMPO E DOS ESPAÇOS 116 b) Cantinho da leitura Ambiente aconchegante, com baú ou estante cheia de livros de diferentes tamanhos, cores e texturas, de histórias variadas, apenas com imagens, com sons, de pano, de plástico, entre outros, que podem ser livremente manipulados pelas crianças para contar, recontar, criar e ouvir novas histórias. Também pode haver almofadas (que cada criança traz para a instituição no início do ano), para as crianças sentarem nos momentos de leitura, ou até mesmo para ouvir uma história contada pela professora. As histórias do mundo encantado dos contos de fadas, dos reis, bruxas e super-heróis têm uma estrutura contendo palavras como: “Era uma vez” “Depois” “E viveram felizes para sempre”. O começo, meio e fim proporcionado por este gênero de literatura auxilia a criança a ampliar narrativas. Ao agregar a natureza lúdica, no recontar histórias, a expressão livre de experiências, vivências e formas de ver o mundo penetram nas narrativas infantis. Nas histórias recriadas, pelas crianças, a branca de neve virou morena das neves, trazendo as questões da diversidade, o lobo, da história da Chapeuzinho Vermelho, desdobrou-se no lobo do “bem” e do “mal”. (KISHIMOTO, 2010, p. 6). FIGURA 68 – CANTO DA LEITURA - U.E.I. BAIRRO JOÁO PAULO II - JOSÉ LINO KUHNEN, INDAIAL - SC FONTE: As autoras DICAS Ouvir e recontar histórias faz com que as crianças sintam o prazer de contar histórias sobre elas mesmas, seus familiares, bichos de estimação, estimulando a sua capacidade narrativa. Você pode estimular as crianças a levarem os livros para casa, para os pais efetuarem a leitura, e depois relatarem como foi a experiência. Várias são as formas de incentivar a criança a criar o hábito da leitura. Experimente! TÓPICO 1 | ORGANIZAÇÃO DO ESPAÇO FÍSICO E DOS AMBIENTES FACILITADORES NA EDUCAÇÃO INFANTIL 117 U.E.I . BAIRRO JOÁO PAULO II - JOSÉ LINO KUHNEN, INDAIAL - SC FIGURA 69 – CANTINHO DOS BRINQUEDOS 1 FONTE: As autoras FIGURA 70 – CANTINHO DOS BRINQUEDOS 2 FONTE: As autoras d) Cantinho dos jogos Neste ambiente podem ser disponibilizados diversos tipos de jogos, como: quebra-cabeça, memória, dominó, bingo, jogos das profissões, encaixes, jogos de percurso, loto, entre outros. Os jogos [...] auxiliam o letramento matemático, a relacionar os instrumentos de trabalho às profissões e animais domésticos e selvagens. Blocos lógicos servem para classificação de cores, formas e espessuras, mas a criança pode dar outros usos, como empilhar, juntar os blocos para criar formas de animais e objetos, ou um bloco virar sabonete, pente ou comida na brincadeira imaginária. (KISHIMOTO, 2010, p. 7-8). e) Cantinho das artes Este ambiente pode conter: massinhas, folhas de diversas texturas, cores e tamanhos, cartolinas, canetinhas, lápis de cor, giz de cera, tesouras sem pontas, lápis, borracha, som, música, tintas, banda rítmica, latas lacradas com diversos tipos de grãos (para formar sons diferentes), tecidos, entre outros. c) Cantinho dos brinquedos Neste ambiente podem ser disponibilizados diversos tipos de brinquedos, estimulando “diferentes usos e atividades. Os confeccionados com materiais naturais da região costumam ser mais atrativos”. (BRASIL, 2006b, p. 28). Entre os brinquedos que podem ser disponibilizados, citamos: bolas (de diversos tamanhos e cores), boliches (de tecido e de plástico), bambolês, pião, triciclos, “[...] bonecas e acessórios, como berço, carrinho, caminhões de diferentes tipos (cegonha, caçamba, bombeiro), posto de gasolina, fantoches, bichinhos e kit médico, ampliando o repertório das brincadeiras”. (KISHIMOTO, 2010, p. 5). UNIDADE 2 | DIVERSOS CONTEXTOS DA EDUCAÇÃO INFANTIL: ORGANIZAÇÃO DO TEMPO E DOS ESPAÇOS 118 Brincar de bandinha rítmica apropriada a crianças pequenas possibilita experimentar diferentes instrumentos. O brincar de fazer som inclui o movimento do corpo. Um papel amassado ou o bater palmas expressam a sonoridade que se cria com as mãos. Soprar uma pena ou bater na água mostra o poder de fazer coisas: a pena que voa e a água espirra. [...] Brincar com tinta, fazer tinta com plantas, com terra e utilizá-las para expressar o prazer de misturar, de ver as cores e, depois, representar coisas de que gosta é outra modalidade de linguagem plástica que requer materiais apropriados. Crianças gostam de fazer marcas, para expressar sua individualidade e as tintas são ferramentas para essa finalidade. As massinhas, argila, gesso ou materiais para desenhar, pintar, fazer colagens e construções com diferentes objetos são linguagens plásticas que dão prazer às crianças. (KISHIMOTO, 2010, p. 5). f) Cantinho das atividades domésticas Neste ambiente podem ser disponibilizadas panelinhas, pratinhos, colheres, copos, xícaras, potes, frascos, fogãozinho (que pode ser construído com caixas de papelão), pia com torneira (sem água, é claro), mamadeiras, canecas, geladeira, armário, micro-ondas (estes últimos três itens também podem ser construídos com caixas de papelão), ferro de passar, mesinhas, cadeiras, almofadas, vassouras pequenas, entre outros objetos. U.E.I . BAIRRO JOÁO PAULO II - JOSÉ LINO KUHNEN, INDAIAL - SC FIGURA 71 – CANTINHO DAS ATIVIDADES DOMÉSTICAS 1 FONTE: As autoras FIGURA 72 – CANTINHO DAS ATIVIDADES DOMÉSTICAS 2 FONTE: As autoras g) Cantinho do salão de beleza Este ambiente pode possuir espelhos, cadeiras, armários, estantes, frascos vazios de shampoos, desodorantes, perfumes, pentes, escovas, toalhinhas, tiaras, prendedores de cabelo, secadores de brinquedo, pedaços de madeira para fazer de sabonete, tudo o que lembre um salão de beleza (infantil) e estimule a fantasia, a interação, o cuidado etc. TÓPICO 1 | ORGANIZAÇÃO DO ESPAÇO FÍSICO E DOS AMBIENTES FACILITADORES NA EDUCAÇÃO INFANTIL 119 FIGURA 73 – CANTINHO DO SALÃO DE BELEZA - U.E.I. BAIRRO JOÁO PAULO II - JOSÉ LINO KUHNEN, INDAIAL - SC FONTE: As autoras h) Cantinho do mercado Este espaço pode conter rótulos de diversos materiais, vendidos habitualmente nos mercados como: materiais de higiene, alimentação, limpeza, entre outros. “[...] fazer compra em supermercado, pagando com “dinheiro” feito pelas crianças, são exemplos de brincadeiras que introduzem no mundo da matemática a criança, que já começa a fazer hipóteses de como medir e quantificar”. (KISHIMOTO, 2010, p. 7). Além disso, a criança desenvolve a noção de valores e poder de compra e aprende a importância de economizar para poder adquirir os produtos/objetos desejados. Como você pode perceber, caro(a) acadêmico(a), são várias as possibilidades de organização dos espaços em sala de aula e você, enquanto professor(a), pode criar outros ambientes ou subdividir os que indicamos, por exemplo: ao invés de fazer o cantinho da arte, fazer o cantinho da massinha, da bandinha rítmica, variando os espaços de tempos em tempos para estimular as crianças. Pode também disponibilizar a cada dia apenas um material ou objeto para as crianças manusearem, exemplo: um dia tintas e papéis, outro dia bandinha rítmica, em outro, massinha, e assim por diante. O fundamental é estimular o desenvolvimento integral da criança, em todos os aspectos. Para ampliar a lista de materiais que podem ser disponibilizados às crianças de 1 a 6 anos, apresentamos, a seguir, algumas sugestões de Kishimoto (2010): UNIDADE 2 | DIVERSOS CONTEXTOS DA EDUCAÇÃO INFANTIL:ORGANIZAÇÃO DO TEMPO E DOS ESPAÇOS 120 Idade Sugestões Crianças pequenas (1 ano a 3 anos e 11 meses) - túneis, caixas e espaços para entrar e esconder-se; - brinquedos para empurrar, puxar, bater; - bolas de diversos tamanhos e cores, cordas, bambolês, papagaio (pandorga, pipa), perna de pau, amarelinha; - quebra-cabeças simples, jogos de memória e de percurso; - livros de história, fantoches (de diversas formas, tamanhos e cores) e teatro; - blocos, encaixes; - massinha e tinturas de dedo; - bonecas/os, brinquedos, mobiliários e acessórios para brincadeiras de faz de conta; - sucata doméstica e industrial e materiais da natureza. Sacolas e latas com objetos diversos de uso cotidiano para exploração; - TV, computador, aparelho de som, CD; - triciclos e carrinhos para empurrar e dirigir; - tanques/canchas de areia, brinquedos de areia e água; - estruturas para trepar, subir, descer, balançar, esconder; - materiais de artes e construções; - tecidos diversos; - bandinha rítmica. Crianças maiores (4 a 6 anos) - boliches, jogos de memória, quebra-cabeça, dominó, blocos lógicos, loto, jogos de profissões e outros temas; - materiais de arte, pintura, desenho; - CD com músicas, danças, TV, máquina fotográfica, gravador, aparelho de som, computador, impressora; - jogos de construção, brinquedos para faz de conta e acessórios para brincar; - teatro e fantoches (de famílias de diversas etnias, de animais, de personagens do folclore, entre outros); - materiais e brinquedos estruturados e não estruturados; - bandinha rítmica; - brinquedos de parque, tanques de areia e materiais diversos para brincadeiras na água e areia; - sucata doméstica e industrial e materiais da natureza; - papéis, papelão, cartonados, revistas, jornais, gibis, cartazes e folhas de propaganda; - bola, corda, bambolê, pião, papagaio, cinco marias, bilboquê, perna de pau, amarelinha, varetas gigantes, triciclos, carrinhos; - livros infantis, letras móveis, material dourado, globo, mapas, lupas, balança, peneiras, copinhos e colheres de medida. FONTE: Adaptado de: Kishimoto (2010) QUADRO 11 – SUGESTÕES DE BRINQUEDOS E MATERIAIS PARA CRIANÇAS DE 1 ANO A 6 ANOS TÓPICO 1 | ORGANIZAÇÃO DO ESPAÇO FÍSICO E DOS AMBIENTES FACILITADORES NA EDUCAÇÃO INFANTIL 121 A sala multiúso é um espaço destinado para a realização de atividades diferenciadas, propostas pelo professor no planejamento, como: a) assistir a vídeos, filmes, DVDs - este tipo de atividade não deve ocorrer diariamente, pois, em casa, a maioria das crianças já passa muito tempo em frente à televisão. Por isto também é importante que a televisão não fique na sala de atividades e sim num espaço específico para este momento; b) ouvir uma história ou manusear os livros - apesar de a própria sala de atividades ter um ambiente para a leitura, o fato de as crianças se deslocarem para um novo espaço, mais silencioso, para ouvir uma história, assistir a um teatro de fantoches, entre outros, faz com que elas se tornem mais receptivas e atentas; c) escutar uma música, dançar, fantasiar-se etc. - como vimos anteriormente, estas atividades também podem ser realizadas na sala de atividades conforme o planejamento do professor. Caso não seja possível ter em cada sala um espaço com roupas e sapatos de adultos para as crianças brincarem (canto da fantasia), este espaço também pode ser utilizado para isto, já que todas as turmas podem ter acesso a ele. 3.3 REFEITÓRIO O refeitório é o espaço utilizado para as crianças se alimentarem, estimulando que elas se sirvam e se alimentem sozinhas assim que possível, de forma a desenvolver a sua autonomia. Também é um espaço de socialização entre crianças de diversas faixas etárias. Conforme os Parâmetros Básicos de Infraestrutura para Instituições de Educação Infantil (BRASIL, 2006a), este espaço deve se localizar próximo da cozinha e contar com um mobiliário móvel, de forma a possibilitar diversas formas de organização do ambiente e prevendo a utilização por 1/3 das crianças do turno maior, intercalando as turmas no horário da alimentação. 3.2 SALA MULTIÚSO/BRINQUEDOTECA FIGURA 74 – REFEITÓRIO - U.E.I. BAIRRO JOÁO PAULO II - JOSÉ LINO KUHNEN, INDAIAL - SC FONTE: As autoras UNIDADE 2 | DIVERSOS CONTEXTOS DA EDUCAÇÃO INFANTIL: ORGANIZAÇÃO DO TEMPO E DOS ESPAÇOS 122 DICAS Este espaço também pode ser decorado com móbiles, desenhos das crianças, deixando-o ainda mais divertido e interessante para elas. Os móveis devem ser adaptados ao tamanho das crianças, possibilitando que elas se sentem, se levantem e se alimentem sozinhas. 3.4 BANHEIROS O ideal é que estejam próximos das salas das crianças, porém bem longe da cozinha e do refeitório, sem ter ligação direta com eles. De acordo com os Parâmetros Básicos de Infraestrutura para Instituições de Educação Infantil (BRASIL, 2006a), os pisos e paredes precisam ser de fácil limpeza, as janelas com boa iluminação, as portas não devem conter chaves nem trincos e os lavatórios precisam ser adequados de acordo com a altura das crianças (algo em torno de 0,60 cm), os sanitários também necessitam ser pequenos. FIGURA 75 – LAVATÓRIO - U.E.I. BAIRRO JOÁO PAULO II - JOSÉ LINO KUHNEN, INDAIAL - SC FONTE: As autoras É importante que os banheiros sejam adequados ao tamanho das crianças, para permitir que elas façam uso do espaço de forma cada vez mais autônoma. Para as crianças identificarem qual o banheiro correto a ser utilizado (para os meninos e para as meninas), é interessante identificá-los com figuras que lembrem objetos utilizados por eles ou até mesmo imagens de meninos e/ou meninas. TÓPICO 1 | ORGANIZAÇÃO DO ESPAÇO FÍSICO E DOS AMBIENTES FACILITADORES NA EDUCAÇÃO INFANTIL 123 3.5 PÁTIO COBERTO 3.6 ÁREA EXTERNA O pátio coberto precisa ser amplo, para que todas as crianças da instituição consigam usá-lo ao mesmo tempo. Também se necessita prever a sua utilização para festas ou reuniões com os pais e para a realização das atividades físicas em dias de chuva. De acordo com os Parâmetros Básicos de Infraestrutura para Instituições de Educação Infantil (BRASIL, 2006a), caso a instituição não possua um espaço coberto, próprio para estes fins, pode-se utilizar o refeitório. Este espaço necessita ser amplo para poder ser usado por todas as crianças da instituição, para as festas da escola ou comunidade, para as atividades físicas e de lazer, entre outros. Por ser uma área descoberta, é mais comum ser utilizada em dias nublados ou com sol. Além disso, os Parâmetros Básicos de Infraestrutura para Instituições de Educação Infantil (BRASIL, 2006a, p. 26) sugerem que estes espaços contemplem, sempre que possível: [...] duchas com torneiras acessíveis às crianças, quadros azulejados com torneira para atividades com tinta lavável, brinquedos de parque, pisos variados, como, por exemplo, grama, terra e cimento. Havendo possibilidades, deve contemplar anfiteatro, casa em miniatura, bancos, brinquedos como escorregador, trepa-trepa, balanços, túneis etc. Deve ser ensolarada e sombreada, prevendo a implantação de área verde, que pode contar com local para pomar, horta e jardim. DICAS Nestes espaços é comum encontrar canchas de areia para as crianças brincarem. No entanto, é importante que a areia seja cercada e coberta, evitando assim que animais como os gatos defequem e contaminem a areia, causando doenças nas crianças que utilizam o espaço. Também é importante disponibilizar brinquedos ou objetos que possam ser transformados, transportados e manipulados facilmente pelas crianças. Caso a instituição tenha playground, é preciso ficar atento se está em boas condições de uso e observar como as crianças farão uso dos brinquedos. Por serem bastante ativas, pode acontecer de tentarem pular de onde “não devem” ao invés de escorregar ou descer pelaescada, subir por caminhos inadequados e fáceis de causar uma queda, pelo simples fato de se sentirem desafiadas pelas novidades. No mais, o playground é um espaço de interação, com diversos “[...] desafios motores, como morros, estruturas para escalar, pular, descer, girar, balançar”. (KISHIMOTO, 2010, p. 9). UNIDADE 2 | DIVERSOS CONTEXTOS DA EDUCAÇÃO INFANTIL: ORGANIZAÇÃO DO TEMPO E DOS ESPAÇOS 124 FIGURA 76 – PLAYGROUND - U.E.I. BAIRRO JOÁO PAULO II - JOSÉ LINO KUHNEN, INDAIAL - SC FONTE: As autoras Caro(a) acadêmico(a)! Chegamos ao final de mais um tópico. Gostou das dicas que disponibilizamos no decorrer do texto? No próximo tópico traremos diversas informações sobre a organização do tempo e da rotina pelo professor da Educação Infantil. Não perca, continue conosco! UNI Agradecimentos especiais à Secretaria Municipal de Educação de Indaial - SC e à Unidade de Educação Infantil Bairro João Paulo II - José Lino Kuhnen, pela disponibilização dos espaços nas fotografias que ilustraram este tópico. 125 RESUMO DO TÓPICO 1 Neste tópico, você aprendeu que: • Os espaços para crianças de 0 a 1 ano de idade devem ser organizados privilegiando o cuidar e o educar, a fim de desenvolver as crianças de forma plena. Deve conter: sala de repouso, sala para atividades, fraldário, lactário e solário. • O espaço físico para crianças de 1 a 6 anos de idade deve possibilitar e contribuir para a vivência e a expressão das culturas infantis, por meio de jogos, brincadeiras, músicas e histórias. Os espaços mais utilizados pelas crianças desta faixa etária são: sala de atividades, sala multiúso, refeitório, banheiro, pátio coberto e área externa. • As salas de atividades são espaços lúdicos, organizados em cantinhos. Entre eles, podemos citar: cantinho da fantasia, da leitura, dos brinquedos, dos jogos, das artes, das atividades domésticas, do salão de beleza, do mercado. • A forma como são organizadas as salas nas instituições de Educação Infantil depende do planejamento do professor, dos objetivos que ele pretende alcançar, do que quer desenvolver/estimular nas crianças, sendo parte integrante da prática pedagógica. • Por ser um parceiro da prática educativa, a organização dos ambientes não deve ser engessada e sim modificada periodicamente. 126 AUTOATIVIDADE Você se lembra de que, lá no início do tópico, pedimos para socializar as dicas de organização dos espaços que você conhece e que não foram indicadas no caderno? Mãos à obra! Complete o quadro a seguir, informando a faixa etária, o espaço onde esta dica pode ser utilizada (sala de atividades, refeitório, banheiros etc.) e a dica em si. Socialize suas ideias com os colegas no momento da correção das autoatividades. Bom trabalho! Faixa etária Espaço Dica 127 TÓPICO 2 A ORGANIZAÇÃO DA ROTINA E O PLANEJAMENTO NA EDUCAÇÃO INFANTIL UNIDADE 2 1 INTRODUÇÃO A palavra ROTINA normalmente nos remete a algo sempre igual, realizado da mesma maneira, todos os dias, com horários preestabelecidos, de maneira chata, sem graça e cansativa, não é mesmo? Pois é importante deixar claro que esta definição para rotina acontece em 90% dos casos, na concepção dos adultos. ROTINA para as crianças é algo muito mais interessante e significa, basicamente, tudo o que eles terão para fazer durante o período em que estiverem na escola. Isso exige, por parte dos educadores, planejar criativamente atividades novas e diferentes, respeitando os mesmos espaços e tempos disponíveis na unidade escolar. O melhor de tudo isso é saber que cada instituição tem liberdade para decidir como serão as suas rotinas, contando com o apoio e participação de seus gestores e equipe pedagógica. Em alguns casos, até os pais e crianças podem opinar. Ficou curioso(a)? Quer saber mais? Continue conosco, então! FIGURA 77 – ROTINA PLANEJADA FONTE: Disponível em: <http://revistaescola.abril.com.br/educacao-infantil/0-a-3- anos/rotina-planejada-espaco-aprender-629267.shtml>. Acesso em: 7 ago. 2012. UNIDADE 2 | DIVERSOS CONTEXTOS DA EDUCAÇÃO INFANTIL: ORGANIZAÇÃO DO TEMPO E DOS ESPAÇOS 128 2 A ORGANIZAÇÃO DO TEMPO E DA ROTINA Depois de acordar, mamar. Depois de mamar, sorrir. Depois de sorrir, cantar. Depois de cantar, comer. Depois de comer, brincar. Depois de brincar, pular. Depois de pular, cair. Depois de cair, chorar. Depois de chorar, falar. Depois de falar, correr. Depois de correr, parar. Depois de parar, ninar. Depois de ninar, dormir. Depois de dormir, sonhar. FONTE: PERES, S.; TATIT, P.; DEARDYK, E. Depois de. Intérpretes: Sandra, Paulo e Edith. In: SANDRA; PAULO; EDITH. Canções de ninar. São Paulo: Eldorado, p1999. 1 CD. Faixa 5. AUTOATIVIDADE Para você, acadêmico(a), as rotinas são importantes na Educação Infantil? Elas auxiliam na organização do trabalho pedagógico dos educadores? De que forma? Pense um pouco sobre isso e escreva sua opinião: _____________________________________________________________________ _____________________________________________________________________ _____________________________________________________________________ _____________________________________________________________________ _____________________________________________________________________ De acordo com Barbosa (2006, p. 35), A importância das rotinas na educação infantil provém da possibilidade de constituir uma visão própria como concretização paradigmática de uma concepção de educação e de cuidado. É possível afirmar que elas sintetizam o projeto pedagógico das instituições e apresentam a proposta de ação educativa dos profissionais. A rotina é usada, muitas vezes, como o cartão de visitas da instituição, quando da apresentação desta aos pais ou à comunidade ou como um dos pontos centrais de avaliação da programação educacional. Mas afinal, o que faz parte dessa rotina? Como elaborar uma rotina que satisfaça as necessidades dos bebês e crianças pequenas? Absolutamente tudo o que acontece na instituição, seria a resposta. Desde o horário de entrada e saída das crianças, a hora do lanche, da higiene, da história, da brincadeira, do canto, entre outras atividades que compõem o cotidiano da Educação Infantil. A rotina nada mais é do que um esquema, uma pauta do que se vai fazer e de como será feita esta ou aquela atividade. TÓPICO 2 | A ORGANIZAÇÃO DA ROTINA 129 Antes de tudo é preciso lembrar que, em tudo que se faz na Educação Infantil, há que se estabelecer uma fortíssima relação entre o cuidar e o educar. As necessidades básicas das crianças como a alimentação, o descanso e a higiene são tão importantes quanto as necessidades de interação, afetividade e cognição. Quando conseguimos atender as nossas crianças em suas necessidades básicas, aliando-as às finalidades educativas, estamos muito próximos daquilo que consideramos a educação ideal. Com os bebês não é fácil manter uma rotina fixa, pois eles dormem mais, trocam mais vezes de fralda, choram mais, querem colo..., mas, à medida que vão crescendo, também passam a incorporar estas rotinas, tão fundamentais ao seu desenvolvimento. Em relação aos demais, sugerimos que essa rotina seja exposta em sala, com figuras, desenhos ou imagens fotografadas do próprio grupo, representando cada atividade a ser desenvolvida. Quando a criança visualiza a sequência das atividades daquele dia, sente-se mais segura e tranquila. Crianças menores adoram saber o que vai acontecer. Desta forma também aprendem a esperar, compreendendo que nem tudo acontece na hora e do jeito que elas desejam. FIGURA 78 – SABENDO APROVEITAR O TEMPO FONTE: Disponível em: <http://revistaescola.abril.com.br/educacao- infantil/0-a-3-anos/como-aproveitar-bem-tempo-creche-planejamento- rotina-educacao-infantil-bebes-criancas-535435.shtml>.Acesso em: 7 ago. 2012. UNIDADE 2 | DIVERSOS CONTEXTOS DA EDUCAÇÃO INFANTIL: ORGANIZAÇÃO DO TEMPO E DOS ESPAÇOS 130 O que temos que levar em conta na hora de planejar nossa rotina de maneira que saibamos aproveitar o tempo de que dispomos com nossas crianças? Devemos levar em conta principalmente a idade das crianças. Não se aconselha planejar atividades que ultrapassem o tempo de concentração delas; também não se pode dar pouco tempo às brincadeiras no parque, porque elas vão reclamar; os recados e combinados muitas vezes não serão compreendidos de primeira, ou seja, com as crianças menores, a repetição dos comandos é absolutamente natural, até que todos compreendam as normas e estejam adaptados a elas. Conheça, a seguir, um exemplo de rotina na Educação Infantil, para cada dia da semana. Note que algumas atividades aparecerão na rotina de todos os dias, pois são consideradas essenciais: a acolhida, o parque e as brincadeiras, a leitura de história, a roda do canto, o lanche, a higiene, o descanso e a despedida. Já as demais atividades e momentos de socialização vão sendo encaixados à rotina, de acordo com a disponibilidade dos professores ou o ritmo do grupo: QUADRO 12 – ROTINAS Segunda-feira Terça-feira Quarta-feira Quinta-feira Sexta-feira Acolhida Acolhida Acolhida Acolhida Acolhida Parque e brincadeiras Parque e brincadeiras Parque e brincadeiras Parque e brincadeiras Parque e brincadeiras Psicomotricidade Inglês Musicalização Formação Psicomotricidade Roda do canto Roda do canto Roda do canto Roda do canto Roda do canto Higiene (troca de fraldas) - descanso Higiene (troca de fraldas) - descanso Higiene (troca de fraldas) - descanso Higiene (troca de fraldas) - descanso Higiene (troca de fraldas) - descanso Lanche Lanche Lanche Lanche Lanche Escovação Escovação Escovação Escovação Escovação Leitura de história Leitura de história Leitura de história Leitura de história Leitura de história Atividade artística/ jogo Atividade artística/jogo Atividade artística/jogo Atividade artística/jogo Atividade artística/jogo Despedida Despedida Despedida Despedida Despedida FONTE: As autoras TÓPICO 2 | A ORGANIZAÇÃO DA ROTINA 131 A rotina planejada não deve ser considerada pronta e acabada, ou seja, fechada a novos desafios e tampouco gerar frustrações ao educador pela não realização de algum item em função de outro mais interessante ou pela falta de tempo hábil para seu cumprimento. Esta rotina precisa ser flexível e prever novas situações, auxiliando as crianças a lidarem com os imprevistos. ATENCAO Vale destacar também, prezado(a) acadêmico(a), que na elaboração das rotinas é interessante equilibrar sua intensidade, intercalando atividades mais calmas e agitadas, individuais ou coletivas, que incentivem a concentração ou a cooperação, que estimulem a autonomia ou o trabalho em equipe. É muito importante também pensar nas crianças que permanecem o dia todo na instituição e gerar uma rotina diversificada e criativa, para que elas não se aborreçam. Sugerimos que a primeira coisa do dia seja a apresentação da rotina às crianças, controlando o nível de ansiedade do grupo. FIGURA 79 – ROTINA DO DIA FONTE: Disponível em: <http://amigasdaedu.blogspot.com.br/2011/03/sugestao- de-painel-para-rotina-na.html>. Acesso em: 7 ago. 2012. UNIDADE 2 | DIVERSOS CONTEXTOS DA EDUCAÇÃO INFANTIL: ORGANIZAÇÃO DO TEMPO E DOS ESPAÇOS 132 DICAS A rotina pode ser alterada e, por que não, até ser combinada com as crianças, que “ajudam” a professora a montar a sequência das atividades no varal de fotos ou quadro de rotinas daquele dia. Experimente! As crianças, desta forma, sentir-se-ão protagonistas em seu próprio processo de ensino e aprendizagem. E a questão do tempo, como funciona para as crianças? Quando a criança passa a compreender a sequência das atividades e a sua duração, começa a desenvolver as primeiras noções de tempo. Essas noções se desenvolvem durante a primeira infância, num processo relativamente longo. Não é nada incomum ouvirmos uma criança pequena dizer que “amanhã eu fui no meu avô” ou que” amanhã eu fiz aniversário”. Isso mostra a confusão que a questão do tempo ainda provoca nelas durante o processo de desenvolvimento. Por isso, é importante estabelecer com elas uma rotina, por meio de uma sequência de acontecimentos numa determinada ordem com início, meio e fim. Segundo Jaume (apud ARRIBAS, 2004, p. 35): Toda a segurança que a criança irá sentir no ambiente escolar se dá no adequado planejamento das atividades. Portanto, o tempo é fator essencial neste planejamento. São necessários pontos de referência estáveis, que se repitam diariamente. É desta forma que a criança se estrutura, tendo a segurança do que virá depois. As crianças, ao visualizarem, por exemplo, a rotina do dia e encontrarem a figura do lanche, são capazes de descobrir o que vem antes dele (que está no meio da manhã ou da tarde) e o que vem depois; percebem que, quando a professora realiza uma atividade artística ou jogo, já se aproxima a hora de ir embora e, desta forma, mesmo sem conhecer as horas, estabelecem suas próprias relações com a questão do tempo. Com o avançar da idade, sentem-se interessadas em saber sobre as horas, os dias da semana, os meses... e assim por diante. TÓPICO 2 | A ORGANIZAÇÃO DA ROTINA 133 FIGURA 80 – O TEMPO FONTE: Disponível em: <http://vidasetechaves.wordpress.com/author/ alinevianacruz/>. Acesso em: 7 ago. 2012. Barbosa (2006, p. 151) questiona: “A quem pertence o tempo? Às instituições? Aos professores? Às crianças em grupo ou no singular? Um dos objetivos centrais da temporalização da vida das crianças está relacionado à estruturação do tempo coletivo, mas deve-se fazer isso sem deixar de respeitar os tempos pessoais.” DICAS Para o aprofundamento teórico destas e outras questões pertinentes à Educação Infantil, sugerimos a leitura das seguintes bibliografias: LOPES, Amanda Cristina Teagno. Educação infantil e registro de práticas. Cortez, 2009. SCHILLER, P.; ROSSANO, J. Ensinar e aprender brincando: mais de 750 atividades para a educação infantil. Porto Alegre: Artmed, 2008. MILLER, K. Educação infantil: como lidar com situações difíceis. Porto Alegre: 2008. KRAEMER, Maria Luíza. Aprendendo com criatividade. São Paulo: Autores Associados, 2010. 3 ROTINA E PLANEJAMENTO: O PAPEL DO PROFESSOR De acordo com Ostetto (2004), o(a) educador(a) deve assumir o planejamento educativo como um momento reflexivo, pois ele não é apenas um papel que preencherá, é atitude e envolve todas as ações e situações cotidianas presentes em seu trabalho pedagógico. E quando este(a) mesmo(a) educador(a) pensar a rotina, deve fazê-lo de modo a criar espaço para os cuidados básicos em consonância com a aprendizagem das crianças por meio da interação individual ou coletiva. UNIDADE 2 | DIVERSOS CONTEXTOS DA EDUCAÇÃO INFANTIL: ORGANIZAÇÃO DO TEMPO E DOS ESPAÇOS 134 FIGURA 81 – PLANEJAMENTO FONTE: Disponível em: <http://educainfantilotc.blogspot.com.br/2012/05/ planejamento-da-educacao-infantil-maio.html>. Acesso em: 8 ago. 2012. Neste sentido, o planejamento torna-se indispensável. Todos os detalhes devem ser pensados, pois muitos momentos diferentes formam a proposta pedagógica da Educação Infantil, que hoje, não pode mais ser encarada de maneira assistencialista, ou seja, o lugar onde as crianças recebem apenas os “cuidados” e... a educação, o estímulo e a cognição não têm espaço. Considerando a quantidade de horas que as crianças passam no cenário “escola”, é fácil pensar que este ambiente será de significação relevante na história e na vida delas e que, portanto, deve ser devidamente pensado eplanejado em função dos objetivos, dos sujeitos. Trata-se de utilizar a escola como uma ferramenta pedagógica. (MUNTAÑOLA, 1980 apud ARRIBAS, 2004, p. 364). O(A) educador(a) infantil deve ser consciente da importância de seu papel na vida das pequenas crianças, conhecê-las profundamente, estabelecer laços de afetividade com elas e, principalmente, estar ciente de todas as etapas que compõem o desenvolvimento infantil. Desta forma planejará suas ações pautadas nas Múltiplas Linguagens e nos Eixos Norteadores, possibilitando o desenvolvimento integral das crianças. TÓPICO 2 | A ORGANIZAÇÃO DA ROTINA 135 ESTUDOS FU TUROS Ficou interessado(a) em saber quais são os eixos norteadores da Educação Infantil? O Tópico 4 desta unidade abordará com mais profundidade cada um destes eixos, aguarde! Na hora de planejar, o que não pode faltar? Em primeiríssimo lugar, o respeito pelas crianças em suas especificidades, de acordo com a faixa etária do grupo. Em seguida, deve-se pensar nas experiências essenciais às crianças, como: a brincadeira, o movimento, a autonomia, a identidade, a linguagem oral, a música e a arte. Vale a pena investir num planejamento que se aproveite destas “palavras mágicas” tão presentes no mundo infantil. Para Ostetto (2004, p. 190), Elaborar um “planejamento bem planejado” no espaço da Educação Infantil significa entrar na relação com as crianças (e não com os alunos!), mergulhar na aventura em busca do desconhecido, construir a identidade de grupo junto com as crianças. Assim, mais do que conteúdos da matemática, da língua portuguesa e das ciências, o planejamento na Educação Infantil é essencialmente linguagem, formas de expressão e leitura do mundo que nos rodeia e que nos causa espanto e paixão por desvendá-lo, formulando perguntas e convivendo com a dúvida. Prezado(a) acadêmico(a). A seguir traremos dicas de como se pode planejar a rotina, levando em consideração os eixos norteadores da Educação Infantil, com responsabilidade, criatividade e, acima de tudo, comprometimento com a difícil, porém encantadora, arte de cuidar/educar na Educação Infantil. Para isso, traremos as mesmas atividades sugeridas na rotina semanal que criamos, elencando seus principais objetivos e incorporando-os à prática, pode ser? Vamos lá, então! a) Acolhida • É um dos momentos mais importantes, pois conforme o próprio nome já diz: é o momento de acolher, receber a criança e oferecer-lhe a certeza de que estará em boas mãos enquanto os pais não estarão com ela. UNIDADE 2 | DIVERSOS CONTEXTOS DA EDUCAÇÃO INFANTIL: ORGANIZAÇÃO DO TEMPO E DOS ESPAÇOS 136 • Essa acolhida precisa ser calorosa, amorosa, verdadeira. • A criança precisa sentir que a professora está feliz em vê-la e que está disposta a estar com ela, em todos os momentos, até a volta dos pais. FIGURA 82 - ACOLHIDA FONTE: Disponível em: <http://educandooamanha.blogspot.com.br/2012/01/ educacao-infantil-duvidas-mais.html>. Acesso em: 8 ago. 2012. b) Parque/brincadeiras • As crianças amam os parques porque se divertem ao ar livre. Nestes espaços é que se possibilita facilmente desenvolver atitudes de preservação ecológica (o professor deve aproveitar essa oportunidade). • Enquanto brinca a criança interage e convive com os colegas, desenvolvendo sua imaginação, autonomia, identidade e movimento. • Crianças transformam tudo o que encontram em brinquedos. Adoram a caixa de areia e brinquedos de plástico que facilitem seu transporte de um canto a outro ou que se transformam em panelas de comida ou formas de bolo, para as incríveis receitas ali mesmo preparadas. • É através da brincadeira que a criança entende o mundo, ampliando seu universo de informações. • Brincar é um direito que as crianças têm – o professor pode e deve envolver- se nas brincadeiras e tornar estes momentos tão prazerosos em experiências educativas. TÓPICO 2 | A ORGANIZAÇÃO DA ROTINA 137 FIGURA 83 – PARQUES FONTE: Disponível em: <http://www.escolagatoxadrez.com.br/galeria_ exibir.asp?ID=72>. Acesso em: 8 ago. 2012. c) Roda do canto/musicalização • É a hora de “pôr a voz para fora”... Até as crianças mais tímidas adoram cantar. • Através da música é possível estreitar laços com as crianças e até mesmo com as próprias famílias, quando se faz, por exemplo, um resgate das canções de ninar. • As canções podem vir acompanhadas de palmas, rodas, cirandas, dramatizações..., ampliando a atenção e a percepção sonora das crianças. • Aos poucos, a criança vai ampliando seu repertório, desenvolvendo cada vez mais a fala, a escuta atenta, a participação e a memória. • Através do manuseio de instrumentos musicais ou de sucata, as crianças começam a compreender os diferentes ritmos e sons. • Todos devem participar na escolha das canções. Cabe ao professor coordenar esta tarefa (em forma de rodízio, ajudante do dia). • É importante selecionar músicas de qualidade, sempre! UNIDADE 2 | DIVERSOS CONTEXTOS DA EDUCAÇÃO INFANTIL: ORGANIZAÇÃO DO TEMPO E DOS ESPAÇOS 138 FIGURA 84 – RODA DO CANTO FONTE: Disponível em: <http://projetosparaeducacaoinfantil.blogspot.com.br/>. Acesso em: 8 ago. 2012. DICAS Você já ouviu falar nos CDs da “Palavra Cantada”? Em 2012, foi lançado um CD em comemoração aos 10 anos de sucesso. Sandra Peres e Paulo Tatit são músicos compositores e produtores. Eles escrevem canções infantis que valorizam a inteligência e a sensibilidade inata das crianças, integrando a riqueza da tradição musical brasileira a um novo repertório. Vale a pena conhecer! FIGURA 85 – CD PALAVRA CANTADA FONTE: Disponível em: <http://www.pirlimpimpimbrinquedos.com.br/ cds/cd-palavra-cantada-10-anos.html>. Acesso em: 11 ago. 2012. TÓPICO 2 | A ORGANIZAÇÃO DA ROTINA 139 d) Higiene/escovação/descanso • É um dos primeiros sentimentos de independência de que a criança desfruta na instituição. Para ela, escovar os dentes ou lavar as mãos sozinha representa uma grande conquista, tanto que é bem comum a professora ter que intervir para que feche a torneira, pois ela perde literalmente a noção do tempo, enquanto “brinca” com a água. • Quando participa efetivamente dos cuidados com o próprio corpo, a criança aprende a conhecê-lo melhor. Aos poucos, vai aprendendo a lavar e secar as mãos, fazer xixi e cocô sem utilizar a fralda e limpar-se sozinha (este é um processo lento que precisa ser estimulado gradativamente); dar descarga, assoar o nariz e escovar os dentes. • Durante a escovação é importante auxiliar de perto as crianças e administrar o creme dental sobre a escova – elas acabam “comendo mais creme” do que escovando os dentes, até porque hoje eles possuem cheiros e gostos bastante atrativos. • As fraldas devem ser trocadas sempre que houver necessidade e com todos os cuidados possíveis. É importante evitar a exposição das crianças – sugerimos um cantinho mais reservado da sala. Enquanto a criança está sendo trocada, o ideal é que se converse, cante ou que se sorria para ela, transformando este momento em algo gostoso, natural. Deve-se evitar qualquer comentário negativo à criança, por exemplo: “Nossa, que cocô fedido”, ou, então, “Meu chapéu, quanto cocô você fez hoje!” entre outros, pois a criança pode entender que você não gosta de limpá-la, preferindo trancar suas fezes. Para Gutierrez (apud ARRIBAS, 2004, p. 36), Os hábitos relacionados à higiene têm duas vertentes: uma de relação, outra de educação. No aspecto de relação, a limpeza se apresenta para criar uma imagem positiva do próprio corpo. Este modelo vem dos adultos. No aspecto da educação, é necessário perceber a riqueza dos prazeres que a higiene proporciona ao corpo, a abundância de sensações que ativa e seu significado para a saúde psicofísica, assim como a quantidade de valores e diretrizes que transmitenos hábitos que estão relacionados a ela. • O momento do descanso é muito mais comum nas creches ou escolas de tempo integral onde as crianças permanecem mais tempo, sendo opcional nas escolas onde ficam apenas durante quatro horas. Ele deve representar um momento tranquilo na rotina da criança. Para isso sugerimos berços ou colchonetes em salas específicas, distantes do barulho e com música clássica ao fundo. A criança poderá auxiliar na hora de arrumar as “camas”, sentindo-se segura nesta tarefa por estar acompanhada da professora e demais colegas. Outra dica interessante é deixá-la trazer de casa seu travesseiro, cheirinho ou bichinho de pano (antialérgico) para a hora do descanso. UNIDADE 2 | DIVERSOS CONTEXTOS DA EDUCAÇÃO INFANTIL: ORGANIZAÇÃO DO TEMPO E DOS ESPAÇOS 140 FIGURA 86 – HORA DO SONINHO FONTE: Disponível em: <ttp://mimosesuspiros.blogspot.com.br/2011/02/hora-de- dormir.html>. Acesso em: 11 ago. 2012. • Na hora de despertar as crianças de seu soninho, deve-se fazê-lo com muita cautela, com voz baixa, afago nos cabelos, delicadeza. Nem todas as crianças despertam bem humoradas e dispostas. e) Alimentação • Ao se dirigir ao lanche ou refeição, cada criança (com exceção dos bebês que devem ser alimentados e conduzidos ao local) deve ser incentivada a: • carregar sua própria lancheira ou prato de comida até a mesa, com equilíbrio e cuidado; • sentar-se à mesa e aguardar que todos estejam acomodados; • cantar ou rezar, conforme o hábito da instituição; • abrir a lancheira ou servir-se sozinha; • trazer ou comer alimentos saudáveis; • abrir potes, segurar o prato e os talheres, controlar a quantidade de comida que leva à boca, comer mastigando bem e segurar seu copo com líquido. • Assim que terminar, cada criança deve: • recolher suas coisas; • jogar cada lixo na lixeira adequada (plásticos, papel, restos de comida...); • os maiores já podem até deixar a louça suja na pia; • aguardar os colegas terminarem ou a professora liberá-los para a escovação. TÓPICO 2 | A ORGANIZAÇÃO DA ROTINA 141 • Desta forma trabalham-se diferentes conceitos com as crianças: autonomia (enquanto realizam as tarefas sozinhas), alimentação saudável e tranquila, paciência (ao aguardarem o tempo dos outros colegas para concluírem sua refeição), reciclagem (na separação dos lixos), cooperação (um podendo ajudar o outro), empatia e solidariedade (quando a professora os auxilia nas tarefas mais difíceis) e finalmente alegria, porque comer deve ser algo prazeroso e feliz para as crianças. • Podem-se experimentar diferentes estratégias com as crianças para que elas desenvolvam hábitos de alimentação saudável. Uma boa dica é oferecer aulas de culinária – as crianças adoram! Outra dica é construir com elas uma horta escolar, onde elas desenvolvam o gosto pelo plantar, cuidar e colher os alimentos, levando-os posteriormente à mesa, em forma de salada, sopa ou torta de legumes. O ideal é envolvê-las também no processo de cozimento ou preparo destes alimentos. Elas sentem-se desafiadas a experimentar tudo o que venha a ser fruto do trabalho e envolvimento delas, porém é importante respeitar o gosto de cada criança, não devendo obrigá-las a comer o que não gostam. FIGURA 87 – ALIMENTAÇÃO FONTE: Disponível em: <http://enfermped.wordpress.com/2008/02/05/a- alimentacao-no-bebe-i-artigo-de-cristina-faria/>. Acesso em: 11 ago. 2012. f) Formação • Em todos os momentos da rotina é preciso trabalhar valores com as crianças. Estes valores referem-se aos conteúdos atitudinais, ou seja, atitudes que as crianças têm com elas mesmas e com os outros. UNIDADE 2 | DIVERSOS CONTEXTOS DA EDUCAÇÃO INFANTIL: ORGANIZAÇÃO DO TEMPO E DOS ESPAÇOS 142 • Devem-se trabalhar questões pertinentes ao convívio familiar e escolar, como a questão das brigas, palavrões, mentiras, preguiça, birra infantil, teimosia, choro desnecessário, falta de limites, desrespeito com os colegas ou com a natureza, desperdício, desobediência, intolerância, entre outros. • O professor pode aproveitar as situações que observa no dia a dia para trabalhar estes conceitos, e isto pode ser feito através de canções, teatros de fantoches, dramatizações, leitura de histórias ou roda da conversa. • Pode-se aproveitar toda e qualquer oportunidade para trabalhar a formação humana entre as crianças, pois desta forma favoreceremos seu crescimento emocional e pessoal, que poderá lhes servir por toda a vida. • A escola precisa trabalhar mais os conceitos atitudinais entre as crianças, desde o berçário, para que tenhamos no futuro pessoas mais humanas, sensíveis e comprometidas com o bem-estar da humanidade. FIGURA 88 – PARCERIA FONTE: Disponível em: <http://www.msccruzeiros.com.br/br_pt/Um-Cruzeiro-Msc/ Criancas-E-Jovens.aspx>. Acesso em: 11 ago. 2012. g) Leitura de história • Ler histórias é fundamental em todas as idades, mas na Educação Infantil este ato é ainda mais valorizado, pois, pelo fato de as crianças ainda não lerem, ouvir histórias torna-se essencial para o desenvolvimento da imaginação, da fantasia e do encantamento. • Ler para os pequenos nos traz sensações agradáveis, pois eles interagem com a história, acreditam em tudo o que ouvem e os olhos brilham e arregalam-se diante de cada nova página ou gravura. TÓPICO 2 | A ORGANIZAÇÃO DA ROTINA 143 • As crianças amam os livros e muitas vezes são fiéis a eles, pedindo que se leia a mesma história “milhões” de vezes (chegam a decorar trechos, é impressionante o tamanho do fascínio que uma história bem lida pode acarretar nas crianças). • O professor pode incentivá-las a “ler” as imagens sozinhas, manusear livremente as obras e contar espontaneamente o que “leram” aos colegas. • Quanto mais livros na sala, melhor! • Ao professor cabem duas tarefas básicas e, diríamos até, obrigatórias: 1ª - selecionar obras de qualidade para ler às crianças; 2ª - preparar anteriormente a leitura, para dar à história mais vida, entonação e emoção. FIGURA 89 – HORA DA HISTÓRIA FONTE: Disponível em: <http://revistacrescer.globo.com/ Crescer/0,19125,EFC820337-2216,00.html>. Acesso em: 11 ago. 2012. UNIDADE 2 | DIVERSOS CONTEXTOS DA EDUCAÇÃO INFANTIL: ORGANIZAÇÃO DO TEMPO E DOS ESPAÇOS 144 h) Psicomotricidade/movimento • Quando falamos em psicomotricidade, não estamos nos referindo apenas aos momentos de recreação, de educação física, pois ela se encontra até mesmo no ato de abrir e fechar a mochila, pegar os materiais na estante ou recolher os brinquedos, afinal usamos o corpo o tempo todo para aprender. • A recreação/educação física trabalha com atividades/exercícios, que estimularão ainda mais o corpo, para que a criança se descubra e desenvolva a consciência corporal. • Esta descoberta do próprio corpo, através da psicomotricidade, trará às crianças o desenvolvimento da atenção, percepção visual e auditiva, coordenação motora ampla e fina, orientação espacial, lateralidade, além da habilidade em observar, comparar, medir, classificar e ordenar. • Através destes momentos desenvolve-se uma série de novas sensações nas crianças: alegria, cooperação, competição, liberdade, diversão, disputa, equilíbrio, agilidade, flexibilidade, resistência, respiração adequada, compreensão de regras, limites, vitórias e derrotas (aprendendo a ganhar e perder), autocontrole, paciência, tolerância, entre outras. • A massagem e o alongamento são excelentes recursos para a estimulação corporal dos bebês, aconselhados igualmente às crianças maiores. FIGURA 90 – PSICOMOTRICIDADE FONTE: Disponível em: <http://www.prefrolante.com.br/secoes/noticias/ conteudo.php?id=650>. Acesso em: 11 ago. 2012. TÓPICO 2 | A ORGANIZAÇÃO DA ROTINA 145 i) Atividade artística/jogo • A hora de realizar atividades é o momento em que o professor consegue perceber a evoluçãoindividual de cada uma de suas crianças. É o momento de fazê-las experimentar toda a sua autenticidade, criatividade, imaginação e percepção de mundo. • Para cada dia, pedem-se novos desafios: recortar, colar, pintar, desenhar, realizar contagens, estabelecer relações, construir conceitos, enfim, deixar o espaço livre para manifestarem todo tipo de conhecimento. • As atividades precisam ser elaboradas com antecedência, dentro do planejamento do professor, respeitando a faixa etária do grupo, de forma criativa e contextualizada, de acordo com a temática escolhida. • Estas atividades agrupadas por temas ou semestres devem compor um portfólio individual da criança, para que sirvam de registro escrito e possam ser acompanhadas e apreciadas pelas famílias. • O jogo com objetivos pedagógicos significa um importante instrumento educativo às crianças. Brincando elas aprendem uma série de conceitos e regras. O professor pode criar ou adaptar os jogos de acordo com as temáticas de estudo. • Quando a criança não leva o jogo para casa, para mostrar aos pais, pode- se realizar um registro fotográfico de cada etapa e montar um pequeno informativo, explicando o objetivo, as regras e o resultado daquele jogo. Todos recebem este informativo e, cada dia, uma criança pode levar o jogo para casa e ensiná-lo aos pais, com o compromisso de trazê-lo de volta no dia seguinte. Os pais podem escrever um depoimento a respeito do dia em que o “jogo” esteve em sua casa e podem inclusive fotografar este momento, para que fique registrado no portfólio de todas as crianças. FIGURA 91 – JOGO EM FAMÍLIA FONTE: Disponível em: <http://www.ludomania.com.br/wp/?p=483>. Acesso em: 14 ago. 2012. UNIDADE 2 | DIVERSOS CONTEXTOS DA EDUCAÇÃO INFANTIL: ORGANIZAÇÃO DO TEMPO E DOS ESPAÇOS 146 j) Linguagem oral/inglês • Na Educação Infantil, a língua estrangeira acontece muito mais na oralidade, não há obrigação de registros escritos. Ela se dá através da música, de pequenos vídeos, de conversação e jogos (brincadeiras). • O ideal é que a professora utilize o vocabulário da criança e dentro da temática estudada pelo grupo, pois, havendo contextualização, há maior compreensão de uma segunda língua. • Sugere-se a introdução dessa segunda língua após os três anos de idade, já que os menores encontram-se ainda no processo de aquisição da língua materna. FIGURA 92 – AULAS DE INGLÊS FONTE: Disponível em: <http://englishandcompany.wordpress.com/2011/05/18/ como-as-criancas-aprendem-ingles/>. Acesso em: 14 ago. 2012. k) Despedida • Despedir-se é um momento tão especial quanto acolher. É necessário entregar a criança aos pais com todo o carinho e atenção. Deve-se relatar a eles qualquer fato que tenha sido importante na rotina daquele dia, em relação àquela criança: machucou-se, bateu no colega, teve dor, chorou, foi ao banheiro muitas vezes, não comeu, entre outras questões que possam ser pertinentes ao conhecimento dos pais. • Também é interessante relatar pequenos progressos, falas engraçadas, momentos em que exercitou autonomia, liderança... enfim, os pais adoram receber notícias deste tipo ao buscarem seus filhos. Esta relação os aproxima dos professores, estabelecendo laços de confiança e tranquilidade. TÓPICO 2 | A ORGANIZAÇÃO DA ROTINA 147 • Antes de entregar a criança, deve-se verificar se ela está levando para casa tudo o que trouxe para a instituição (casaco, mochila, sapato, camisa reserva, material de higiene... eles vivem esquecendo coisas na escola); se está com o rosto, o nariz e as mãos limpas (nenhum pai aprecia receber a criança em condições ruins de higiene). • Despedir-se da criança com um abraço ou beijo estreita seus laços com ela e lhe passa a certeza de que deseja revê-la no dia seguinte. FIGURA 93 – DESPEDIDA FONTE: Disponível em: <http://www.sonhocerto.com/sonhar-com-beijo>. Acesso em: 14 ago. 2012 UNIDADE 2 | DIVERSOS CONTEXTOS DA EDUCAÇÃO INFANTIL: ORGANIZAÇÃO DO TEMPO E DOS ESPAÇOS 148 FIGURA 94 – SILVIA ULISSES DE JESUS FONTE: Disponível em: <http://revistaescola.abril.com.br/educacao- infantil/0-a-3-anos/rotina-planejada-espaco-aprender-629267. shtml?page=2>. Acesso em: 14 ago. 2012. LEITURA COMPLEMENTAR Prezado(a) acadêmico(a), selecionamos uma reportagem da Revista Nova Escola, 2011, que traz um projeto vencedor do Prêmio Victor Civita - Educador Nota 10, abordando a questão do EDUCAR e CUIDAR na EDUCAÇÃO INFANTIL. Vale a pena conhecer! Veja a foto da professora nota 10! NA ROTINA PLANEJADA, O ESPAÇO PARA APRENDER Projeto vencedor do Prêmio Victor Civita - Educador Nota 10 mostra o valor de um programa detalhado. Baseado na articulação entre a aprendizagem e os cuidados diários, ele faz a diferença no desenvolvimento das competências de crianças até três anos. É FUNDAMENTAL QUE O CUIDADO E A EDUCAÇÃO CAMINHEM JUNTOS Trabalhando com crianças em fases de desenvolvimento distintas, a professora Sílvia pensou nas especificidades de cada faixa etária. Os objetivos de aprendizagem para os pequenos de 4 a 8 meses eram diferentes daqueles pensados para os de até 12 meses e também para os com mais de um ano de idade. TÓPICO 2 | A ORGANIZAÇÃO DA ROTINA 149 A cada avanço, um novo desafio era proposto. Enquanto os mais novos eram estimulados a olhar no espelho para ampliar a consciência de si, por exemplo, os maiores, de 12 a 18, eram convidados a identificar os colegas e a si próprios em fotos. Quando a brincadeira envolvia explorar melecas e tintas, o desafio era incrementar novas cores e texturas, colocando areia para a mistura ficar mais áspera ou água para ficar mais diluída, por exemplo, a fim de proporcionar novas experiências. "Cada atividade desenvolve uma competência, e isso não ocorre da mesma maneira com todos. Por isso, é importante planejar pensando nas especificidades de cada um do grupo. Não dá para fazer uma lista única de objetivos para todas as crianças", explica Pryscilla Sugarawa, coordenadora pedagógica da ONG Ação Comunitária, em São Paulo. Não era apenas nesses momentos de pintura ou brincadeira, porém, que o aprendizado ocorria. No banho, por exemplo, era hora de trabalhar o reconhecimento do corpo, com falas que estimulassem a criança e estreitassem os laços entre ela e a educadora. "Dizer que vai lavar o pé e a cabeça e anunciar as ações que vai realizar, sempre olhando no olho da criança, é essencial na construção de vínculos. Isso precisa ser estimulado sempre, até nas situações que parecem mais corriqueiras, mas que são importantes para que ela amplie seu conhecimento de mundo", explica Maria Cecília da Silva, doutora em Psicologia Clínica e docente da Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo (SBPSP). Para que o cuidar e o educar caminhem juntos, é importante que a família participe e compreenda os objetivos do planejamento. Quando começou o trabalho, Sílvia notou que o relacionamento com as famílias poderia ser enriquecedor para as atividades realizadas na creche e, principalmente, para o desenvolvimento das competências dos bebês. Na reunião inicial, ela buscou mais informações sobre cada criança, conversando em grupo e depois individualmente, e procurou entender as especificidades de cada um. O que eles comiam? Como dormiam? Andavam ou engatinhavam? Tinham objetos de apego? As respostas embasaram o planejamento. Estabelecer um contato frequente com os pais, porém, foi difícil. A maior parte dos familiares trabalhava muito e não comparecia às reuniões, alegando falta de tempo. Eles enxergavam a creche como um espaço para deixar os filhos enquanto não podiam tomar conta deles, não como um ambiente favorável à aprendizagem. Por isso, a professora se aproximou dos pais ainda na fase da adaptação. Aproveitando a presença deles na creche durante esse período, ela conversouindividualmente com todos para conhecer os hábitos de cada família e reforçou a importância da participação de todos nas reuniões. O REGISTRO DOS AVANÇOS DE CADA CRIANÇA É PASSADO AOS PAIS O contato teve continuidade ao longo do ano, com diários e portfólios, além de reuniões periódicas, nas quais Sílvia aproveitava para explicar, com linguagem clara e acessível, as fases do desenvolvimento das crianças e o que ela esperava avançar com cada uma. "Tirava fotos de tudo e mostrava nas reuniões, desde UNIDADE 2 | DIVERSOS CONTEXTOS DA EDUCAÇÃO INFANTIL: ORGANIZAÇÃO DO TEMPO E DOS ESPAÇOS 150 um bebê segurando a colher na hora do almoço até as brincadeiras monitoradas, explicando o que faziam e, principalmente, o porquê das atividades realizadas na creche", explica ela. Essa estratégia trouxe avanços visíveis. As famílias passaram a participar mais ativamente: ao fim de cada semana, levavam o diário do seu filho para casa. No início da semana seguinte, esses registros eram devolvidos à professora, com relatos de todas as experiências em casa: um havia provado uma fruta nova, outro que tinha ficado em pé se apoiando na parede e até quem estivesse com gripe. Tudo era considerado pela professora para entender mudanças comportamentais cotidianas, como alterações no sono, falta de apetite e vontade de brincar com os colegas. Essas informações eram inseridas no planejamento, de modo que a educadora podia reavaliar a rotina de atividades de acordo com as mudanças e avanços alcançados por cada criança. "Se o profissional tem esse material, consegue se reorganizar e continuar seguindo com seus objetivos", afirma Pryscilla. FONTE: JESUS, Silvia Ulisses de. Na rotina planejada, o espaço para aprender. Revista Nova Escola, São Paulo, n. 242, 2011. Reportagem de Bianca Bibiano. Disponível em: <http://revistaescola.abril.com.br/educacao-infantil/0-a-3-anos/rotina-planejada-espaco- aprender-629267.shtml?page=1>. Acesso em: 14 ago. 2012. 151 RESUMO DO TÓPICO 2 Neste tópico, você aprendeu que: • Rotina é tudo o que acontece na instituição, desde o horário de entrada e saída das crianças, a hora do lanche, da higiene, da história, da brincadeira, do canto, entre outras atividades que compõem o cotidiano da Educação Infantil. • É preciso estabelecer uma fortíssima relação entre o cuidar e o educar. • As necessidades básicas das crianças como a alimentação, o descanso e a higiene são tão importantes quanto as necessidades de interação, afetividade e cognição. • Devemos levar em conta, principalmente, a idade das crianças. Não se aconselha planejar atividades que ultrapassem o tempo de concentração delas. • Na elaboração das rotinas é interessante equilibrar a intensidade delas, intercalando atividades mais calmas e agitadas, individuais ou coletivas, que incentivem a concentração ou a cooperação, que estimulem a autonomia ou o trabalho em equipe. • A rotina planejada não deve ser considerada pronta e acabada, ou seja, fechada a novos desafios e tampouco gerar frustrações ao educador pela não realização de algum item em função de outro mais interessante ou pela falta de tempo hábil para seu cumprimento. Esta rotina precisa ser flexível e prever novas situações, auxiliando as crianças a lidarem com os imprevistos. • Quando o(a) educador(a) pensa sua rotina, ele(a) deve criar espaço para os cuidados básicos em consonância com a aprendizagem das crianças através da interação individual ou coletiva. 152 A partir de tudo o que você aprendeu a respeito dos espaços, tempo, planejamento e eixos norteadores da Educação Infantil, elabore uma rotina semanal (diferente desta que criamos no caderno) para uma turma de crianças de três anos. Capriche! Seja criativo(a) e explore ao máximo tudo o que você considera importante para esta faixa etária. AUTOATIVIDADE Segunda-feira Terça-feira Quarta-feira Quinta-feira Sexta-feira 153 TÓPICO 3 A CONSTRUÇÃO DA AUTONOMIA E DA IDENTIDADE DA CRIANÇA UNIDADE 2 1 INTRODUÇÃO Quando falamos em autonomia logo nos vem à cabeça a questão da independência, ou seja, o “saber se virar sozinho”, pois um sujeito autônomo é aquele que sabe aonde quer chegar e os caminhos que precisa percorrer, seguindo suas próprias leis e tomando decisões, sem precisar da opinião ou ajuda constante do outro. E isto não é tão fácil quanto parece, principalmente se não formos “desafiados” para isso, desde a primeira infância. Quando não somos estimulados a desenvolver a autonomia, nos tornamos cidadãos normalmente acomodados e passivos diante das adversidades da vida, aceitando com tranquilidade as “coisas” tais como se apresentam. Dê uma olhada à sua volta e verifique: entre os adultos que o(a) cercam, quantos preferem deixar que os outros decidam, intercedam por eles ou liderem ações simples do dia a dia por não se sentirem capazes, desafiados ou competentes para a realização daquela determinada função? Quantas vezes, eles deixam de tentar sozinhos algo que com certeza dariam conta, por pura insegurança, falta de iniciativa ou medo de errar? Com as crianças isso dificilmente acontece. Elas são naturalmente autônomas e não se preocupam com o que os outros vão dizer, se estarão “certas ou erradas”, se “estragarão algo” na tentativa de “consertar”, se aquilo tem que ser feito “desse ou daquele jeito”, enfim, dificilmente pedem opinião, pois seguem seus instintos: são corajosas e curiosas por natureza. Para tratarmos destas questões, abordaremos neste tópico o desenvolvimento da independência na aprendizagem, a pedagogia da autonomia de acordo com Paulo Freire e a construção da identidade, como pressupostos para uma infância autônoma, consciente e feliz. Boa leitura! 154 UNIDADE 2 | DIVERSOS CONTEXTOS DA EDUCAÇÃO INFANTIL: ORGANIZAÇÃO DO TEMPO E DOS ESPAÇOS FIGURA 95 – AUTONOMIA FONTE: Disponível em: <http://blogespacocrescer.blogspot.com. br/2012/03/autonomia-ii.html>. Acesso em: 1 maio 2012. 2 O DESENVOLVIMENTO DAINDEPENDÊNCIA NA APRENDIZAGEM Prezado(a) acadêmico(a)! Como futuro(a) educador(a), uma pergunta pode pipocar seus pensamentos neste momento: Como desenvolver a independência/ autonomia nas crianças? A resposta, porém, é muito simples: dando-lhes a oportunidade de fazer escolhas. Isso mesmo, deixando-as tomar decisões, não o tempo todo, é lógico, mas em determinadas situações. Este exercício tão simples fará a grande diferença na vida de nossas crianças, constituindo-as como “sujeitos ativos e participativos” no próprio processo de ensino e aprendizagem. Quando o professor toma todas as decisões na condução da aula, há pouco espaço para a construção autônoma, pois é ele quem decide tudo: o que vai acontecer, como vai acontecer, quem fará o que e de que forma tem que ser feita esta ou aquela atividade. Perde-se, neste momento, a grande oportunidade de desenvolver a criatividade, a responsabilidade, a iniciativa e a independência, que funcionariam como geradoras de autonomia. Já o professor que permite em suas aulas atividades que levarão as crianças a pensar, a tentar sozinhas e a gerir o próprio conhecimento, em comunhão com o grupo de maneira dinâmica, promove situações de aprendizagens significativas. TÓPICO 3 | A CONSTRUÇÃO DA AUTONOMIA E DA IDENTIDADE DA CRIANÇA 155 Para isso, cabe ao professor “facilitar” a independência das crianças deixando brinquedos e materiais ao alcance delas em mobília mais baixa, em caixotes ou prateleiras. Desta forma, o acesso a estes materiais será favorecido, como já vimos no Tópico 1 desta unidade, dispensando o auxílio da professora. O professor pode também simular momentos em que ele precisará da ajuda das crianças, como, por exemplo, na preparação da mesa do lanche, na entrega de materiais ou atividades para a turma, enfim, pode criar situações em queas crianças desenvolvam a autonomia ajudando/cooperando com os colegas ou com a professora, mudando a forma autoritária e individualista a que estamos acostumados na maioria das escolas. Segundo Ceccon, Oliveira e Oliveira (1982, p. 71), “[...] a escola como está organizada não estimula a solidariedade, a ajuda mútua entre os alunos ou o trabalho em equipe”. E é isto que queremos e precisamos mudar! Outra dica bem interessante é criar o “ajudante do dia” que auxiliará a professora e a turma em tudo o que for preciso. As crianças adoram e cooperam com muita disposição e alegria. Como afirma Kamii (1997, p. 108): A essência da autonomia é que as crianças tornem-se aptas a tomar decisões por si mesmas. Mas, [...] a autonomia significa levar em consideração os fatos relevantes para decidir agir da melhor forma para todos. Não pode haver moralidade quando se considera apenas o próprio ponto de vista. É preciso encorajar a criança a tentar sozinha, desde as mais simples tarefas como: pendurar, abrir e fechar a lancheira, lavar as mãos, escovar os dentes, retirar e depois guardar o próprio lanche, comer sozinha, recortar, colar, desenhar, falar em voz alta, entre outras coisas. No início, a criança precisa conhecer a rotina; precisa de modelos do que deve ser feito; precisa que a ensinemos a fazer, que a acompanhemos passo a passo durante as primeiras tentativas, mas aos poucos, vai tornando-se cada vez mais autônoma e do seu jeito, dentro do seu ritmo e faixa etária, vai conquistando sua independência. FIGURA 96 – INDEPENDÊNCIA FONTE: Disponível em: <http://rainha.notredame.org.br/noticias/ historico-de-noticias/jardim-i-a-da-professora-mara-cristina-vono/>. Acesso em: 1 maio 2012. 156 UNIDADE 2 | DIVERSOS CONTEXTOS DA EDUCAÇÃO INFANTIL: ORGANIZAÇÃO DO TEMPO E DOS ESPAÇOS E como fazer isso? Para auxiliá-lo(a) na compreensão deste tópico, trazemos dicas práticas de como desenvolver a autonomia das crianças, tornando-as independentes e felizes na realização de tarefas: QUADRO 13 – DICAS PARA DESENVOLVER A AUTONOMIA DAS CRIANÇAS Converse com os pais para que as crianças tragam seu próprio material à sala de aula. Assim que chegarem à sala, receba a todos de maneira atenciosa e carinhosa e incentive as crianças a pendurarem sua mochila ou guardarem seus materiais sozinhas, em local previamente combinado. Dê as coordenadas, mas deixe que a criança execute sozinha seus pedidos. Exemplo: escolha brinquedos na caixa, pegue uma almofada e junte-se ao grupo, busque a pasta de atividades etc. Na hora do canto ou da história, sente-se com uma almofada no chão e aguarde que todos façam o mesmo à sua volta. Se for necessário, nas primeiras vezes, dê o comando. Com o passar do tempo, quando você se sentar, eles entenderão o que têm que fazer sem que você o diga. Na hora do lanche, incentive-as a lavar as mãos e a usar o banheiro sozinhas. Os menores (0 a 3 anos) precisarão de ajuda, os maiores (4 a 6 anos) já tentarão sozinhos. Ainda na hora do lanche, demonstre a forma de sentar, de abrir a lancheira, retirar, abrir e fechar os potes ou garrafinhas, servir-se ou conduzir o prato até a mesa e, aos poucos, deixe as crianças tentar. Cada dia, deve ser dado um pouquinho mais de autonomia à criança. Ela precisa ser encorajada a tentar, mesmo que mostre resistência ou diga que não consegue. Mostre a ela que é capaz, pois ela confia em você. Incentive-a a comer sozinha, por mais “lambança” que faça, ela se sente feliz e vitoriosa quando consegue. Após lanchar, comece todo o ritual novamente: jogar o lixo na lixeira, guardar no pote o que sobrou, fechar o pote, guardar na lancheira, fechar o zíper e ir até a sala de aula, levar o prato de comida até a pia (tudo isso sozinha e no seu ritmo). Algumas crianças farão mais depressa que outras, o que pode gerar ansiedade nas que ainda não terminaram, preferindo abandonar tudo para juntar-se ao grupo. Neste momento, o professor deve fazê-la recuar e, pacientemente, acompanhá-la em todo o seu processo, mostrando a ela que o mais importante é concluir a tarefa e não ser a mais rápida. TÓPICO 3 | A CONSTRUÇÃO DA AUTONOMIA E DA IDENTIDADE DA CRIANÇA 157 Na hora da escovação, cada criança deve identificar seu material de higiene (ela encontrará meios para isso, pois ainda não sabe ler) e encaminhar-se ao tanque para escovar os dentes sozinha. Observe a necessidade de auxiliar os que ainda não escovam direitinho e os ajude de maneira bem sutil, demonstrando, com sua escova nos seus dentes, como a criança deverá escovar os dentes dela. Desta forma, você não lhe tirará a autonomia e ela não se sentirá incapaz de realizar aquela tarefa sozinha. Durante as atividades, deixe as crianças buscarem os materiais necessários, já disponíveis e ao alcance delas: tinta guache, cola, tesoura..., deixe-as opinar em relação à cor, ao formato, ao tipo de atividade que irão desenvolver. Permita que sugiram, na hora do canto, as canções preferidas e que cada dia crianças diferentes possam opinar. Estimule atividades cooperativas onde as crianças precisem se ajudar. Sempre que acabarem de brincar, incentive as crianças que recolham e guardem seus brinquedos. O mesmo acontecerá com os materiais pedagógicos ou livros. Ensine-as o lugar das coisas e espere que de maneira autônoma elas desenvolvam esta função, mas, se isto não acontecer, faça o papel de “mediador”, até que este gesto seja internalizado. Estimule suas crianças a fazerem perguntas e evite responder a questões que elas têm condições de responder sozinhas, ou seja, incentive-as a pensar, devolvendo-lhes a pergunta. Isso traz resultados mágicos, faça a experiência! FONTE: As autoras Gostou das dicas? Esperamos que sim! Elas são bastante simples, porém fundamentais para o desenvolvimento da independência na aprendizagem e na vida das crianças! 3 A PEDAGOGIA DA AUTONOMIA, SEGUNDO PAULO FREIRE Quando se lê o sumário da obra de Paulo Freire, “Pedagogia da Autonomia - Saberes necessários à prática educativa”, percebe-se que é um livro de grande valor educativo..., um livro gigante, apesar de apresentar tamanho bem menor do que grande parte dos livros que circulam por aí. 158 UNIDADE 2 | DIVERSOS CONTEXTOS DA EDUCAÇÃO INFANTIL: ORGANIZAÇÃO DO TEMPO E DOS ESPAÇOS O sumário traz, em sua sequência, frases/tópicos marcantes a respeito da palavra ensinar, que poderiam nos servir perfeitamente como base de todo nosso trabalho. Leia a amostra do sumário na sequência e perceba a profundidade poética atribuída ao verbo ENSINAR, por Freire (1996): QUADRO 14 – SUMÁRIO DO LIVRO PEDAGOGIA DA AUTONOMIA 1. Ensinar exige rigorosidade metódica 2. Ensinar exige pesquisa 3. Ensinar exige respeito aos saberes dos educandos 4. Ensinar exige criticidade 5. Ensinar exige estética e ética 6. Ensinar exige a corporeificação das palavras pelo exemplo 7. Ensinar exige risco, aceitação do novo e rejeição a qualquer forma de discriminação 8. Ensinar exige reflexão crítica sobre a prática 9. Ensinar exige o reconhecimento e a assunção da identidade cultural 10. Ensinar não é transferir conhecimento 11. Ensinar exige consciência do inacabamento 12. Ensinar exige o reconhecimento do ser condicionado 13. Ensinar exige respeito à autonomia do ser do educando 14. Ensinar exige bom senso 15. Ensinar exige humildade, tolerância e luta em defesa dos direitos dos educadores 16. Ensinar exige apreensão da realidade 17. Ensinar exige alegria e esperança 18. Ensinar exige a convicção de que a mudança é possível 19. Ensinar exige curiosidade 20. Ensinar é uma especificidade humana 21. Ensinar exige segurança, competência profissional e generosidade 22. Ensinar exige comprometimento 23. Ensinar exige compreender que a educação é uma forma de intervenção no mundo 24. Ensinar exige liberdadee autoridade 25. Ensinar exige tomada consciente de decisões 26. Ensinar exige saber escutar TÓPICO 3 | A CONSTRUÇÃO DA AUTONOMIA E DA IDENTIDADE DA CRIANÇA 159 27. Ensinar exige reconhecer que a educação é ideológica 28. Ensinar exige disponibilidade para o diálogo 29. Ensinar exige querer bem aos educandos FONTE: As autoras De todos os tópicos listados por Freire (1996), escolhemos alguns para uma abordagem mais profunda (não teríamos como abordar todos, embora sejam igualmente importantes). Faremos agora uma pequena reflexão, amparados por Freire (1996), sobre cada um dos itens selecionados anteriormente: Ensinar exige respeito aos saberes dos educandos Sabemos que todas as crianças têm saberes socialmente construídos quando chegam à instituição de Educação Infantil. Elas conhecem com propriedade e sabem se posicionar a respeito de determinados assuntos, a ponto de surpreender quem estiver disposto a ouvi-las, sobretudo as crianças a partir dos três anos. Partir do conhecimento prévio das crianças nos dá subsídios para elaborar atividades ou projetos. Por exemplo, se uma criança convive com o descaso das autoridades em relação ao lixo despejado no riacho próximo de sua casa, pode- se discutir com a criança a respeito da postura dos habitantes e das autoridades, as consequências desta atitude para os demais munícipes, o problema da contaminação da água, a importância do tratamento para o consumo, enfim... uma série de assuntos poderão surgir a partir dessa situação trazida pela criança. 160 UNIDADE 2 | DIVERSOS CONTEXTOS DA EDUCAÇÃO INFANTIL: ORGANIZAÇÃO DO TEMPO E DOS ESPAÇOS Ensinar exige reflexão crítica sobre a prática FIGURA 97 – LIXO NO RIO FONTE: Disponível em: <http://criancaesperanca.globo.com/platb/ecerj/tag/ poluicao/>. Acesso em: 1 maio 2012. Freire (1996, p. 34) desafia: “Por que não estabelecer uma necessária “intimidade” entre os saberes curriculares fundamentais aos alunos e a experiência social que eles têm como indivíduos?” Todo professor precisa ter consciência de que necessita refletir sobre a sua prática todos os dias, pois sempre há algo que se possa fazer diferente, fazer melhor ou de outras maneiras para não cair na rotina ou na zona de conforto, dois perigosos labirintos que levam o professor ao desânimo e/ou decadência profissional. Para Freire (1996, p. 43) [...] na formação permanente dos professores, o momento fundamental é o da reflexão crítica sobre a prática. É pensando criticamente a prática de hoje ou de ontem que se pode melhorar a próxima prática. [...] quanto mais me assumo como estou sendo e percebo a ou as razões de ser de por que estou sendo assim, mais me torno capaz de mudar. TÓPICO 3 | A CONSTRUÇÃO DA AUTONOMIA E DA IDENTIDADE DA CRIANÇA 161 FIGURA 98 – PROFESSOR CRIATIVO FONTE: Disponível em: <http://www.fvc.org.br/premio-victor-civita/ vencedores/?pagina=11p>. Acesso em: 1 maio 2012. Ensinar não é transferir conhecimento Existe algo que, segundo Freire (1996, p. 53), é fundamental ao educador: [...] saber que ensinar não é transferir conhecimento, mas criar as possibilidades para a sua própria produção ou a sua construção. Quando entro em uma sala de aula devo estar sendo um ser aberto a indagações, à curiosidade, às perguntas dos alunos, a suas inibições; um ser crítico e inquiridor, inquieto em face da tarefa que tenho – a de ensinar e não a de transferir conhecimento. Se sou capaz de oferecer momentos de construção de conhecimentos, estabelecer metas para que o aprendizado ocorra de fato e se planejo com esta convicção e com esta consciência, torno-me, neste momento, um educador por excelência. FIGURA 99 – EDUCADOR DE SUCESSO FONTE: Disponível em: <http://www.fvc.org.br/premio-victor-civita/ vencedores/lisiane-hermann-oster-676131.shtml>. Acesso em: 1 maio 2012. 162 UNIDADE 2 | DIVERSOS CONTEXTOS DA EDUCAÇÃO INFANTIL: ORGANIZAÇÃO DO TEMPO E DOS ESPAÇOS Ensinar exige respeito à autonomia do ser do educando Respeito é uma das palavras mais belas no vocabulário dos professores em relação às crianças. Cabe a eles respeitar cada pequeno ser que lhe chega às mãos, independentemente da idade, classe social, cor, raça, credo ou religião. Professor que ama o que faz não faz distinções, não tem nenhum tipo de preconceito ou preferência. Dá de si o que há de melhor e busca o que há de melhor nos outros, respeitando a autonomia e a identidade de cada educando. Leva com amor a profissão e é coerente em sua prática. De acordo com Freire (1996, p. 66), “O respeito à autonomia e à dignidade de cada um é um imperativo ético e não um favor que podemos ou não conceder uns aos outros”. FIGURA 100 – EDUCAÇÃO PARA TODOS FONTE: Disponível em: <http://upedagogas.blogspot.com.br/2009/03/ contribuicao-da-musica-para-o_21.html>. Acesso em: 1 maio 2012. Ensinar exige alegria e esperança A alegria de estar com as crianças deve ser comparada ao tempero essencial de um prato que se espera degustar todos os dias. Quando estamos com fome, o tempero se torna ainda mais marcante. É assim que deve ser o nosso “gosto” para as crianças. Um gosto que desperta a fome de saber, de aprender, de viver novos conhecimentos, de compartilhar ideias, de arriscar novos “pratos”, cada dia mais saborosos, diferentes e dispostos a deixar as crianças com água na boca, com gostinho de quero mais. Um prato recheado de alegria e esperança, pois, de acordo com Freire (1996, p. 80), TÓPICO 3 | A CONSTRUÇÃO DA AUTONOMIA E DA IDENTIDADE DA CRIANÇA 163 Há uma relação entre a alegria necessária à atividade educativa e a esperança. A esperança de que professor e alunos juntos podem aprender, ensinar, inquietar-se, produzir e, juntos igualmente, resistir aos obstáculos à alegria. [...] a esperança faz parte da natureza humana. FIGURA 101 – ALEGRIA NA ESCOLA FONTE: Disponível em: <http://educandomundo.blogspot.com.br/2009/11/ pratique-alegria-em-suas-aulas.html>. Acesso em: 1 maio 2012. Ensinar exige curiosidade Feliz do professor que tem alunos curiosos; Feliz do professor que tem alunos questionadores; Feliz do professor que tem alunos pesquisadores; Feliz, feliz, feliz! Feliz do aluno que tem professores que estimulam sua curiosidade; Feliz do aluno que tem professores que o incentivam a buscar respostas para seus questionamentos; Feliz do aluno que tem professores que reconhecem a importância da pesquisa e da mesma forma se tornam pesquisadores; Feliz, feliz, feliz! 164 UNIDADE 2 | DIVERSOS CONTEXTOS DA EDUCAÇÃO INFANTIL: ORGANIZAÇÃO DO TEMPO E DOS ESPAÇOS Freire (1996, p. 95) reforça: Como professor devo saber que sem a curiosidade que me move, que me inquieta, que me insere na busca, não aprendo nem ensino. Exercer a minha curiosidade de forma correta é um direito que tenho como gente e a que corresponde o dever de lutar por ele, o direito à curiosidade. [...] o exercício da curiosidade convoca a imaginação, a intuição, as emoções, a capacidade de conjecturar, de comparar, na busca da perfilização do objeto ou do achado de sua razão de ser. Ensinar exige comprometimento FIGURA 102 – ALUNOS CURIOSOS E PESQUISADORES FONTE: Disponível em: <http://revistaescola.abril.com.br/educacao-infantil/4-a-6-anos/ pesquisa-experimentacao-sistematizacao-brincadeiras-pre-escola-608035.shtml>. Acesso em: 1 maio 2012. Impossível formar-se professor sem saber disso. Sem ter a certeza de que o nosso comprometimento com a educação é quase que integral, ou seja, ocupará grande parte do nosso tempo, de nossa dedicação e do nosso empenho, enquanto profissionais conscientes de nossa importância. Para Freire (1996, p. 108), [...] não é possível exercer a atividade do magistério como se nada ocorresse conosco. Como impossível seria sairmos na chuva expostos totalmente a ela, sem defesas,e não nos molhar. Não posso ser professor sem me pôr diante dos alunos, sem revelar com facilidade ou relutância minha maneira de ser, de pensar politicamente. Não posso escapar à apreciação dos alunos. E a maneira como eles me percebem tem importância capital para o meu desempenho. Daí, então, que uma das minhas preocupações centrais deva ser a de procurar a aproximação cada vez maior entre o que eu digo e o que eu faço, entre o que pareço ser e o que realmente estou sendo. TÓPICO 3 | A CONSTRUÇÃO DA AUTONOMIA E DA IDENTIDADE DA CRIANÇA 165 FIGURA 103 – PROFESSOR COMPROMETIDO FONTE: Disponível em: <http://www.ivanilson.com/2010/09/professor-do- ensino-infantil-nao-e-baba.html>. Acesso em: 1 maio 2012. Ensinar exige querer bem aos educandos Para ensinar às crianças, é preciso querer bem a elas. É preciso conhecê-las, compreendê-las e, sobretudo, amá-las. Este querer bem, para Freire (1996, p. 159), [...] significa, de fato, que a afetividade não me assusta, que não tenho medo de expressá-la. Significa esta abertura ao querer bem a maneira que tenho de autenticamente selar o meu compromisso com os educandos, numa prática específica do ser humano. A minha abertura ao querer bem significa a minha disponibilidade à alegria de viver. Justa alegria de viver, que, assumida plenamente, não permite que me transforme num ser “adocicado” nem tampouco num ser arestoso e amargo. FIGURA 104 – PROFESSOR AFETIVO FONTE: Disponível em: <http://www.zenitude.com.br/blog/criancas-criadas- com-afeto-tem-hipocampo-maior-revela-estudo>. Acesso em: 1 maio 2012. 166 UNIDADE 2 | DIVERSOS CONTEXTOS DA EDUCAÇÃO INFANTIL: ORGANIZAÇÃO DO TEMPO E DOS ESPAÇOS Para finalizar esta reflexão sobre ensinar de Paulo Freire, vamos usar uma frase de sua autoria que diz: “A alegria não chega apenas no encontro do achado, mas faz parte do processo da busca. E ensinar e aprender não podem se dar fora da procura, fora da boniteza e da alegria.” (FREIRE, 1996, p. 159). FIGURA 105 – PAULO FREIRE FONTE: Disponível em: <http://ufabloguei.blogspot.com/2010_04_24_ archive.html>. Acesso em: 12 jan. 2012. DICAS Se você ficou curioso(a) e deseja conhecer os itens do sumário que não foram abordados neste caderno, leia o livro “Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa” de Paulo Freire, 1996. São Paulo: Paz e Terra. FIGURA 106– LIVRO PEDAGOGIA DA AUTONOMIA FONTE: Disponível em: <http://globalizei.blogspot.com. br/2011/12/pedagogia-da-autonomia-paulo-freire.html>. Acesso em: 10 set. 2012. TÓPICO 3 | A CONSTRUÇÃO DA AUTONOMIA E DA IDENTIDADE DA CRIANÇA 167 4 A CONSTRUÇÃO DA IDENTIDADE Prezado(a) acadêmico(a)! Você sabe o que significa identidade? Reconhece que as crianças a possuem? Acredita que ela já vem pronta ou vai sendo construída ao longo da vida? Sabe como desenvolvê-la nas crianças? AUTOATIVIDADE Anote suas considerações sobre o assunto: _____________________________________________________________________ _____________________________________________________________________ _____________________________________________________________________ _____________________________________________________________________ ________________________________________________________ Identidade tem a ver com “quem somos”, com o grupo do qual fazemos parte, em que acreditamos, o que de fato praticamos, nossas crenças, valores ou ideais, enquanto seres aprendentes. Essa identidade vai sendo construída à medida que interagimos com os outros ao longo da vida. Enquanto crescemos, vamo-nos desenvolvendo em todos os sentidos, inclusive na construção do próprio eu, passando a compreender de fato e gradativamente “quem somos”. Nossa identidade, recém-construída, não é fixa, ela pode mudar e se refazer o tempo todo, dependendo das necessidades ou experiências vividas. Não somos sempre iguais nem temos sempre os mesmos comportamentos, às vezes, apresentamos identidades distintas, pois, se num momento somos solidários, no momento seguinte podemos ser extremamente egoístas; se num instante parecemos bonzinhos, segundos mais tarde, podemos demonstrar o quanto somos tiranos. Temos, portanto, identidades diferentes e necessitamos ter liberdade de nos posicionar também de diferentes maneiras. 168 UNIDADE 2 | DIVERSOS CONTEXTOS DA EDUCAÇÃO INFANTIL: ORGANIZAÇÃO DO TEMPO E DOS ESPAÇOS FIGURA 107 – CONSTRUÇÃO DE IDENTIDADE FONTE: Disponível em: <http://drickaalmeida.blogspot.com. br/2011/06/seja-exemplo.html>. Acesso em: 2 maio 2012. Aos poucos, as crianças também vão descobrindo que não existe uma única maneira de ser. Passam a se posicionar diante das diversas identidades que vão desenvolvendo e compreendem em si as mudanças, sendo então capazes de compreendê-las também nos outros. De acordo com Moyles (2010, p. 71), [...] uma criança pequena pode saber que é uma “ótima autora” quando as pessoas gostam das suas histórias na escola, que é a “menininha amada” da mamãe e do papai, a “irmã mais velha boazinha” do irmãozinho bebê ou a “irmã menor chata” da irmã mais velha quando ela quer participar das brincadeiras dos mais velhos. FIGURA 108 – DIVERSAS IDENTIDADES FONTE: Disponível em: <http://revistacrescer.globo.com/Revista/ Crescer/0,,EMI270697-18485,00-BRINCAR+DE+FAZ+DE+CONTA+E+ESSENCI AL.html>. Acesso em: 2 maio 2012. TÓPICO 3 | A CONSTRUÇÃO DA AUTONOMIA E DA IDENTIDADE DA CRIANÇA 169 De acordo com o Parecer CNE/CEB nº 20/2009, aprovado em 11 de novembro de 2009, no documento intitulado Revisão das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil: Cada criança apresenta um ritmo e uma forma própria de colocar- se nos relacionamentos e nas interações, de manifestar emoções e curiosidades, e elabora um modo próprio de agir nas diversas situações que vivencia desde o nascimento conforme experimenta sensações de desconforto ou de incerteza diante de aspectos novos que lhe geram necessidades e desejos e lhe exigem novas respostas. Assim busca compreender o mundo e a si mesma, testando de alguma forma as significações que constrói, modificando-as continuamente em cada interação, seja com outro ser humano, seja com objetos. Cabe às instituições de Educação Infantil assegurar às crianças a manifestação de seus interesses, desejos e curiosidades ao participar das práticas educativas, valorizar suas produções, individuais e coletivas e trabalhar pela conquista por elas da autonomia para a escolha de brincadeiras e de atividades e para a realização de cuidados pessoais diários. Tais instituições devem proporcionar às crianças oportunidades para ampliarem as possibilidades de aprendizado e de compreensão de mundo e de si próprias trazidas por diferentes tradições culturais e a construir atitudes de respeito e solidariedade, fortalecendo a autoestima e os vínculos afetivos de todas as crianças. (BRASIL, 2009). E agora, caro(a) acadêmico(a), ficou um pouco mais fácil? Para auxiliá- lo(a), traremos algumas dicas de como estimular o desenvolvimento saudável da identidade das crianças, nas instituições de Educação Infantil: • Reconheça a importância da “construção da identidade” para a aprendizagem e o desenvolvimento. • Apoie e incentive a criança diante da posição ou mudança de identidade que adotar. • Incentive movimentos de autoconhecimento e autoestima entre as crianças para que elas aprendam a se conhecer e a se ver como os outros a conhecem e a veem. • Provoque situações que levem as crianças a manifestarem seus sentimentos de diversas maneiras. • Crie situações para que interajam com o grupo e deixe-as livres para que possam tomar decisões e ocupar posições enquanto se relacionam socialmente. • Seja sensível a tudo aquilo que as crianças lhe disserem, preste atenção a elas. 170 UNIDADE 2 | DIVERSOS CONTEXTOS DA EDUCAÇÃO INFANTIL:ORGANIZAÇÃO DO TEMPO E DOS ESPAÇOS Para Moyles (2010, p. 84) [...] Se a criança sente que os adultos importantes da sua vida se importam com ela, a valorizam e a aceitam como ela é, provavelmente terá uma autoestima elevada. Para ajudar as crianças que estão desenvolvendo seu senso de self e garantir que sua autoestima se mantenha elevada, os profissionais devem conhecer e ser sensíveis aos discursos aos quais a criança tem acesso – assim, compreenderão melhor como ela está escolhendo se posicionar ou está sendo posicionada pelos outros. Os profissionais também precisam ter em mente a natureza multifacetada e fluida da identidade e procurar dar à criança acesso a uma grande variedade de discursos e “maneiras de ser”. • Deixe espaço para que as crianças possam manifestar os próprios gostos e preferências, como, por exemplo, escolhendo a brincadeira, o livro ou a música que irão cantar. • Favoreça atividades para que elas percebam suas habilidades e limites e sejam capazes de perceber-se como um ser único e especial, no meio de tantos outros igualmente únicos. • Não esqueça que este processo de autoconhecimento inicia quando a criança nasce e a acompanha até o final da vida, sendo marcado pela história, pela cultura, pela família e pelo ambiente onde vive esta criança. Valorize, portanto, cada um destes detalhes. • Não faça comparações, cada criança é única. • Chame cada criança pelo nome, evite apelidos ou diminutivos. • Fique atento(a) às diferentes manifestações das crianças (gestos, atitudes, choro...), elas podem se comunicar com você, mesmo sem saber ou querer falar. • Sinta-se importante durante todo o processo de construção da identidade das crianças. 171 RESUMO DO TÓPICO 3 Neste tópico, você acabou de ver que: • Sujeito autônomo é aquele que sabe aonde quer chegar e os caminhos que deve percorrer, seguindo suas próprias leis e tomando decisões, sem precisar da opinião ou ajuda constante do outro, e esse aprendizado se inicia na infância. • Para desenvolver a independência/autonomia nas crianças basta dar-lhes a oportunidade de fazer escolhas. • Quando o professor toma todas as decisões na condução da aula, há pouco espaço para a construção autônoma, pois é ele quem decide tudo: o que vai acontecer, como vai acontecer, quem fará o quê e de que forma tem que ser feita esta ou aquela atividade. Perde-se, então, a grande oportunidade de desenvolver a criatividade, a responsabilidade, a iniciativa e a independência, que funcionariam como geradoras de autonomia na criança. • O professor que permite em suas aulas atividades nas quais as crianças são levadas a pensar, a tentar sozinhas e a gerir o próprio conhecimento em comunhão com o grupo, de maneira dinâmica, conduz a situações de aprendizagens significativas. • Partir do conhecimento prévio das crianças nos dá subsídios para elaborar atividades ou projetos. • Todo bom professor tem consciência de que necessita refletir sobre a sua prática todos os dias, pois sempre há algo que ele possa fazer diferente, fazer melhor ou de outras maneiras. • Se somos capazes de oferecer momentos de construção de conhecimentos, de estabelecer metas para que o aprendizado ocorra de fato, se planejamos com esta convicção e com esta consciência, tornamo-nos educadores por excelência. • Professor que ama o que faz não faz distinções, não tem nenhum tipo de preconceito ou preferência. Dá de si o que há de melhor e busca o que há de melhor nos outros, respeitando a autonomia e a identidade de cada educando. Conduz sua profissão com amorosidade, sendo coerente em sua prática. • Ensinar exige comprometimento. É impossível formar-se professor sem saber disso. • Para ensinar as crianças é preciso querer bem a elas. É preciso conhecê-las, compreendê-las e, sobretudo, amá-las. 172 • Identidade tem a ver com “quem somos”, com o grupo do qual fazemos parte, em que acreditamos, o que de fato praticamos, nossas crenças, valores ou ideais, enquanto seres aprendentes. • Não somos sempre iguais nem temos sempre os mesmos comportamentos, às vezes, apresentamos identidades distintas, pois, se num momento somos solidários, no momento seguinte podemos ser extremamente egoístas; se num instante parecemos bonzinhos, segundos mais tarde, podemos demonstrar o quanto somos tiranos. • Temos, portanto, múltiplas identidades e necessitamos ter liberdade de nos posicionar também, de múltiplas maneiras. 173 1 Caro(a) acadêmico(a)! Vamos ver se você entendeu todas as dicas sugeridas para o desenvolvimento da autonomia nas crianças, abordadas neste tópico? Assinale com V as alternativas verdadeiras e com F, as falsas: ( ) Converse com os pais para que tragam o material ou lancheira do filho para dentro da escola, até a sala de aula. ( ) Assim que as crianças chegarem à sala, receba a todos de maneira atenciosa e pendure a lancheira da criança imediatamente. ( ) Dê as coordenadas, mas deixe que a criança execute sozinha seus pedidos. ( ) Permita que as crianças sugiram, na hora do canto, as canções preferidas e que a cada dia crianças diferentes possam opinar. 2 Escolha, entre os 29 itens do sumário do livro “Pedagogia da Autonomia”, de Paulo Freire, cinco frases/tópicos marcantes para você, a respeito da palavra ensinar, que poderiam lhe servir como base de um trabalho bem feito. Justifique sua escolha. ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ AUTOATIVIDADE 174 175 TÓPICO 4 OS EIXOS NORTEADORES DA EDUCAÇÃO INFANTIL: INTERAÇÃO, BRINCADEIRA E APRENDIZAGEM UNIDADE 2 1 INTRODUÇÃO Sabemos que a Educação Infantil faz parte da primeira etapa da educação básica. Por ser a primeira, necessita ser muito especial, pois se trata da BASE educacional das crianças. Esta BASE tem que ser sólida, tem que ter qualidade no atendimento, no planejamento e na formação continuada dos profissionais. Entre os vários fatores que formam os EIXOS NORTEADORES DA EDUCAÇÃO INFANTIL, encontram-se as MÚLTIPLAS LINGUAGENS, e é sobre cada uma delas que falaremos neste tópico. FIGURA 109 – MÚLTIPLAS LINGUAGENS FONTE: As autoras 176 UNIDADE 2 | DIVERSOS CONTEXTOS DA EDUCAÇÃO INFANTIL: ORGANIZAÇÃO DO TEMPO E DOS ESPAÇOS Aproveite esta nova oportunidade para ampliar seu conhecimento e bons estudos! FIGURA 110 – AS MÚLTIPLAS LINGUAGENS FONTE: Disponível em: <http://portaldoprofessor.mec.gov.br/jornal. html?idEdicao=45>. Acesso em: 12 maio 2012. 2 BRINCADEIRAS E JOGOS INFANTIS Toda criança adora brincar e enquanto brinca desenvolve tantas aprendizagens que vale a pena refletir sobre elas e sobre a sua importância, dentro do processo de ensino e aprendizagem. Conforme Nascimento (2000, p. 1), A criança não é um adulto que ainda não cresceu, ela tem características próprias. Para alcançar o pensamento adulto (abstrato), ela precisa percorrer todas as etapas de seu desenvolvimento físico, cognitivo, social e emocional. Brincando, a criança desenvolve potencialidades; ela compara, analisa, nomeia, mede, associa, calcula, classifica, compõe, conceitua, cria, deduz etc. Sua sociabilidade se desenvolve; ela faz amigos, aprende a compartilhar e a respeitar o direito dos outros e as normas estabelecidas pelo grupo e a envolver-se nas atividades apenas pelo prazer de participar, sem visar recompensasnem temer castigos. Brincando, a criança estará buscando sentido para sua vida. Sua saúde física, emocional e intelectual depende, em grande parte, dessa atividade lúdica. TÓPICO 4 | OS EIXOS NORTEADORES DA EDUCAÇÃO INFANTIL: INTERAÇÃO, BRINCADEIRA E APRENDIZAGEM 177 FIGURA 111 – BRINCADEIRA NA EDUCAÇÃO INFANTIL FONTE: Disponível em: <http://www.objetivojr.com.br/?p=216>. Acesso em: 12 maio 2012. Perceba, prezado(a) acadêmico(a), como é grande a lista de vantagens que se esconde num simples brincar para o desenvolvimento de aprendizagens significativas. Vamos a elas: Enquanto brinca, a criança desenvolve: Ela aprende também a: 178 UNIDADE 2 | DIVERSOS CONTEXTOS DA EDUCAÇÃO INFANTIL: ORGANIZAÇÃO DO TEMPO E DOS ESPAÇOS FIGURA 112 – APRENDENDO A DIVIDIR FONTE: Disponível em: <http://revistaescola.abril.com.br/creche-pre-escola/>. Acesso em: 12 maio 2012. Por tudo isso, Nascimento (2000, p. 1) afirma que: Brincar é tão importante para a criança como trabalhar é para o adulto. É o que a torna ativa, criativa, e lhe dá a oportunidade de relacionar- se com os outros; também a faz feliz e, por isso, mais propensa a ser bondosa, a amar o próximo, a ser solidária. Enquanto a criança brinca percebe a necessidade do outro e passa a preferir brincar em companhia de mais crianças do que sozinha, mesmo que essa parceria, às vezes, seja conflituosa e frustrante. Com isso, desenvolve sua inteligência emocional, tão importante para o crescimento. Em grupo, especialmente através de jogos, ela aprende também o significado de “ganhar e perder”. Prezado(a) acadêmico(a)! Não é novidade alguma que a criança utiliza múltiplas maneiras de se comunicar ou se expressar, concorda? Durante os jogos ou brincadeiras o que fica evidente é o movimento como linguagem, não apenas como ato de mover-se, pois, enquanto se movimenta, a criança é capaz de expressar seus sentimentos, quer sejam eles manifestados por gestos, emoções TÓPICO 4 | OS EIXOS NORTEADORES DA EDUCAÇÃO INFANTIL: INTERAÇÃO, BRINCADEIRA E APRENDIZAGEM 179 ou posturas corporais, principalmente quando a criança ainda não fala. O corpo demonstra aquilo que a criança sente ou quer falar e nós, educadores, precisamos ter sensibilidade para perceber isso. Conforme o Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil (BRASIL, 1998, p. 18): O movimento para a criança pequena significa muito mais do que mexer partes do corpo ou deslocar-se no espaço. A criança se expressa e se comunica por meio dos gestos e das mímicas faciais e interage utilizando fortemente o apoio do corpo. A dimensão corporal integra- se ao conjunto da atividade da criança. [...] Pode-se dizer que no início do desenvolvimento predomina a dimensão subjetiva da motricidade, que encontra sua eficácia e sentido principalmente na interação com o meio social, junto às pessoas com quem a criança interage diretamente. A internalização de sentimentos, emoções e estados íntimos poderão encontrar na expressividade do corpo um recurso privilegiado. FIGURA 113 – MOVIMENTO INFANTIL FONTE: Disponível em: <http://fazendodancanaescola.blogspot.com. br/2009/03/o-movimento-e-danca-na-educacao.html>. Acesso em: 12 maio 2012. 180 UNIDADE 2 | DIVERSOS CONTEXTOS DA EDUCAÇÃO INFANTIL: ORGANIZAÇÃO DO TEMPO E DOS ESPAÇOS 3 MÚSICA E ARTES VISUAIS FIGURA 114 – MÚSICA E ARTE FONTE: Disponível em: <http://www.educacional.com.br/>. Acesso em: 12 maio 2012. As crianças adoram cantar ou ouvir música, certamente porque desde muito pequeninas esta linguagem as acompanha, desde as canções de ninar dos pais ao gosto musical que a própria família lhes impõe, muitas vezes de maneira inconsciente. Quanto mais estimulada a ouvir, cantar e até mesmo tocar diferentes ritmos musicais, maior será o desenvolvimento da criança; ela será capaz de produzir sons com o próprio corpo ou com diferentes objetos, ampliando seu repertório. Por isto é importante ao educador selecionar músicas de qualidade, como citamos anteriormente. A música está diretamente ligada à sensibilidade, à expressão e à alegria. É muito importante que ofertemos diferentes oportunidades de apreciação e fazer musical para as crianças, tais como: os sons da natureza, do corpo, de diferentes instrumentos musicais, de jogos cantados, exploração de ritmos, gestos, canções de roda ou parlendas, o que as desenvolverá social e intelectualmente. A música tem que ser entendida como uma linguagem e não como uma forma de estratégia para banalizá-la. Tem que mostrar um amplo universo de sons para o aluno. Isso vai ajudá-lo a ampliar seus sentidos, como a visão, o tato e, principalmente, a audição. Nosso propósito com essas aulas não é o de formar músicos profissionais, mas, como música é cultura, ela vai despertar nessa pessoa também o senso crítico, fazendo com que esse indivíduo não aceite passivamente todo esse material cultural descartável. (LIMA apud LAGINSKI, 2012). As artes plásticas ou visuais também compõem a lista de preferências da criança na Educação Infantil. Quando ela tem a oportunidade de manusear diferentes materiais e criar suas próprias obras, manifesta no mesmo instante uma série de sentimentos, ampliando assim sua percepção de mundo. TÓPICO 4 | OS EIXOS NORTEADORES DA EDUCAÇÃO INFANTIL: INTERAÇÃO, BRINCADEIRA E APRENDIZAGEM 181 De acordo com o Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil (BRASIL, 1998, p. 89): Na infância as artes visuais estão presentes desde muito cedo. As crianças rabiscam, desenham, mesmo que não tenham papéis e lápis. Utilizam-se do próprio corpo, usam gravetos, rabiscam na areia, mas já se expressam através dessa linguagem. [...] as artes visuais devem ser concebidas como uma linguagem que tem estrutura e características próprias, (e ocorre) por meio da articulação dos aspectos: (a) fazer artístico - centrado na exploração, expressão e comunicação de produção de trabalhos de arte [...]; (b) apreciação - percepção do sentido que o objeto propõe [...] (c) reflexão - considerado tanto no fazer artístico quanto na apreciação, é pensar sobre todos os conteúdos do objeto artístico [...]. FIGURA 115 – FAZENDO ARTE FONTE: Disponível em: <http://www.sejaobjetivo.com.br/infantil/galeria_de_fotos/ salto/2011/infantil1_fase1b/pintura_livre_pincel/default.htm>. Acesso em: 12 maio 2012. Prezado(a) acadêmico(a)! Vale lembrar que a criança se expressa através do desenho, mas que, no início, ela só faz “rabiscos”, depois passa a dar formas e contornos. Durante todo este processo ela precisa ser compreendida e valorizada para que exerça de forma espontânea e saudável sua evolução. Enquanto educador ofereça o maior número de materiais artísticos à criança, dê-lhe autonomia para criar e perceba que ela os experimentará com entusiasmo, criatividade e imaginação, que lhe são tão naturais. 182 UNIDADE 2 | DIVERSOS CONTEXTOS DA EDUCAÇÃO INFANTIL: ORGANIZAÇÃO DO TEMPO E DOS ESPAÇOS 4 LINGUAGEM ORAL E ESCRITA A fala é o principal veículo de comunicação entre a criança, os familiares, professores e colegas. Por meio da fala, a criança expressa seus sentimentos, desejos ou angústias. Este desenvolvimento pode acontecer através de conversas informais (roda da conversa) ou planejadas, como numa entrevista ou apresentação. Deve-se proporcionar estes momentos em sala de aula ou mesmo fora dela, e é importante incentivar que todos falem, que todos opinem, que manifestem seus interesses e que saibam compartilhar com o grupo o que pensam e o que sentem a respeito de determinado assunto, fazendo-se compreender. Neste tipo de atividade, exercita- se também a escuta, outro fator determinante na aprendizagem. Enquanto a criança fala e é ouvida pelos colegas e pela professora, ela sente-se importante, ampliando sua leitura de mundo, apropriando-se de novos conceitose aumentando sua capacidade de argumentação. Na roda da conversa, enquanto a criança narra seu final de semana, por exemplo, é possível descobrir muitas coisas a respeito de uma rotina familiar tranquila ou de uma convivência familiar complicada, que, porventura, esteja afetando a vida desta criança. Enquanto relata, ela expressa desejos, sentimentos, medos, abusos, enfim, fatos reais do seu dia a dia. Temos que ficar bem atentos aos “sinais” que as crianças nos dão e criar um ambiente que valorize e incentive o diálogo e a livre expressão da criança. FIGURA 116 – A CONVERSA NO MEIO DA BRINCADEIRA FONTE: Disponível em: <http://www.marupiara.com.br>. Acesso em: 12 maio 2012. TÓPICO 4 | OS EIXOS NORTEADORES DA EDUCAÇÃO INFANTIL: INTERAÇÃO, BRINCADEIRA E APRENDIZAGEM 183 A leitura também faz parte da linguagem oral, e não é só à leitura de livros que estamos nos referindo, existe a leitura de mundo (pessoas, ambientes, espaços), de objetos, de imagens ou de músicas, que ajudarão no desenvolvimento da criança. Mesmo sem ler o código escrito, a criança pode abrir um livro ou revista e inventar a história a partir das imagens que vê e do conhecimento prévio que possui. Quem nunca se encantou vendo uma criança com um livro nas mãos lendo as imagens como se lesse realmente a história? FIGURA 117 – LEITURA DE IMAGEM FONTE: Disponível em: <http://revistaescola.abril.com.br/educacao-infantil/4- a-6-anos/literatura-educacao-infantil-comecar-muitos-livros-584120.shtml>. Acesso em: 12 maio 2012. Para desenvolver crianças leitoras, é preciso que o educador seja apaixonado pelos livros e faça da leitura uma atividade diária, desde a Educação Infantil. Para isso, faz-se necessário ter um bom acervo literário na instituição, se possível montar um cantinho de leitura dentro da própria sala de aula, onde as crianças tenham oportunidade de manusear diferentes materiais impressos como: livros, revistas, jornais, panfletos etc. Sabemos que a maioria das crianças de creche e pré-escola ainda não lê o código escrito, por isso esta tarefa cabe ao educador, mas é muito interessante deixá-las manusear os diferentes materiais, observar a imagens e levar as obras preferidas para casa. Ao escolher o livro que lerá para a turma, nunca se esqueça, futuro(a) educador(a), de que você precisa preparar a leitura com antecedência, para que possa dar a devida entonação à história. Crianças amam histórias bem contadas e não é legal fazer feio nesta hora, concorda? 184 UNIDADE 2 | DIVERSOS CONTEXTOS DA EDUCAÇÃO INFANTIL: ORGANIZAÇÃO DO TEMPO E DOS ESPAÇOS Em relação à linguagem escrita, é possível afirmar que ela acontece naturalmente, dentro do processo construído com a criança até então. A criança da Educação Infantil vai avançando em sua etapa alfabética à medida que mantém contato com as letras e com os livros, num mundo de descobertas e aprendizagens. A escrita é um produto da cultura humana e se insere no percurso do desenvolvimento da função simbólica. Portanto, a criança, para adquiri-la precisa efetivar uma série de realizações do domínio da função simbólica. Uma delas é ser capaz de dar significado a uma forma, capacidade que ela adquire realizando colagens, dobradura, desenho, brincadeiras, principalmente, de faz de conta e outras que incluem especificamente a representação. A partir disto, podemos afirmar que a escrita é uma linguagem em construção na criança pequena. Exercendo as atividades próprias do desenvolvimento da função simbólica – o desenho, a narrativa pelo movimento e a narrativa oral – a criança estará construindo as bases, por assim dizer, necessárias para a leitura e para a escrita. (LIMA, 2002, p. 28). FIGURA 118 – LINGUAGEM ORAL E ESCRITA FONTE: Disponível em: <http://escolaarvoredogaropaba.blogspot.com. br/2011/03/o-desfile-das-letras.html>. Acesso em: 13 maio 2012. Conforme a imagem anterior, pode-se trabalhar com letras móveis, cartelas ou listas de palavras oferecendo reais possibilidades de escrita e leitura enquanto as crianças brincam e interagem com os colegas. 5 NATUREZA E SOCIEDADE As crianças têm verdadeiro fascínio pela natureza e estabelecem com ela laços de afetividade. Este é, sem dúvida alguma, o assunto de maior interesse e curiosidade das crianças, que, com o auxílio do educador, pode possibilitar descobertas, questionamentos, experiências e diferentes formas de investigações. TÓPICO 4 | OS EIXOS NORTEADORES DA EDUCAÇÃO INFANTIL: INTERAÇÃO, BRINCADEIRA E APRENDIZAGEM 185 De acordo com Tiriba (2005 apud BRASIL, 2006c, p. 17-18): Da mesma forma que defendemos uma perspectiva educacional que respeite a diversidade cultural e promova o enriquecimento permanente do universo de conhecimentos, atentamos para a necessidade de adoção de estratégias educacionais que permitam às crianças, desde bebês, usufruírem da natureza, observarem e sentirem o vento, brincarem com água e areia, atividades que se tornam especialmente relevantes se considerarmos que as crianças ficam em espaços internos às construções na maior parte do tempo em que se encontram nas instituições de Educação Infantil. Criando condições para que as crianças desfrutem da vida ao ar livre, aprendam a conhecer o mundo da natureza em que vivemos, compreendam as repercussões das ações humanas nesse mundo e sejam incentivadas em atitudes de preservação e respeito à biodiversidade, estaremos difundindo uma concepção de educação em que o ser humano é parte da natureza e não seu dono e senhor absoluto. FIGURA 119 – NATUREZA FONTE: Disponível em: <http://sonhosestrelaseclaridades.blogspot.com. br/2011/11/criancas-e-natureza.html>. Acesso em: 14 maio 2012. As crianças percebem a natureza enquanto observam o voo dos pássaros ou borboletas, enquanto experimentam a textura de folhas, enquanto sentem o perfume das flores e até mesmo enquanto vigiam o caminhar das formigas. As crianças têm mais tempo e maior sensibilidade para observar os pequenos animais do jardim, para sentirem a brisa no rosto ou a garoa nos cabelos. Para elas, nem o sol é tão forte que as impeça de brincar e nem a chuva tão prejudicial à saúde, como dizem os adultos. Sujar os pés na lama, encher os olhos de areia ou fartar-se de tanto rolar na grama faz parte do show, conhecido por elas como VIDA. 186 UNIDADE 2 | DIVERSOS CONTEXTOS DA EDUCAÇÃO INFANTIL: ORGANIZAÇÃO DO TEMPO E DOS ESPAÇOS FIGURA 120 – DIA DE CHUVA FONTE: Disponível em: <http://lapsosdeumamentebipolar.blogspot.com. br/2010/08/um-dia-de-chuva.html>. Acesso em: 14 maio 2012. Nos primeiros anos de vida, a criança vai aprendendo inúmeras possibilidades sobre o mundo que está à sua volta, com suas cores e texturas. Aos poucos, ela vai estabelecendo contatos com a natureza e construindo novos conhecimentos. Percebe que a natureza interage com ela e vice-versa. Compreende que os outros também participam desta comunhão e que são igualmente responsáveis pela natureza. Surge, neste momento, a noção de sociedade e, junto com ela, a corresponsabilidade em relação aos cuidados com a vida, com o próximo e com a natureza. É fundamental, prezado(a) acadêmico(a), que, enquanto educadores, nos esforcemos para despertar nas crianças a consciência de que todos somos responsáveis pelas questões ambientais. Esta consciência precisa ser estimulada nas crianças desde bem pequeninas e nas pequenas atitudes do dia a dia, quer sejam em relação à questão do lixo, do desperdício, dos cuidados com a água, como com os animais, com as plantas, com o solo, com o ar, pequenas ações que poderão salvar o planeta. E qual é a melhor maneira de fazer tudo isso? Nossa dica é a de formar sujeitos que percebam o quanto precisam dos recursos naturais para sua sobrevivência. Sujeitos que, desde a Educação Infantil, aprendam a pesquisar, a ser críticos, reflexivos e participativos,que saibam tomar decisões e desenvolver ações humanas em favor da vida e do planeta. Segundo o Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil (BRASIL, 1998, v. 3, p. 172): TÓPICO 4 | OS EIXOS NORTEADORES DA EDUCAÇÃO INFANTIL: INTERAÇÃO, BRINCADEIRA E APRENDIZAGEM 187 Dada a grande diversidade de temas que este eixo oferece, é preciso estruturar o trabalho de forma a escolher os assuntos mais relevantes para as crianças e o seu grupo social. As crianças devem, desde pequenas, ser instigadas a observar fenômenos, relatar acontecimentos, formular hipóteses, prever resultados para experimentos, conhecer diferentes contextos históricos e sociais, tentar localizá-los no espaço e no tempo. Podem também trocar ideias e informações, debatê-las, confrontá-las, distingui-las e representá-las, aprendendo, aos poucos, como se produz um conhecimento novo ou por que as ideias mudam ou permanecem. FIGURA 121 – CRIANÇA E CIÊNCIA FONTE: Disponível em: <http://www.ioc.fiocruz.br/pages/informerede/corpo/ informeemail/2007/2308/mat_01_23_08.html>. Acesso em: 14 maio 2012. 6 EDUCAÇÃO E SAÚDE Quando falamos em saúde, nos referimos a uma das mais importantes palavras do dicionário dos pais em relação aos filhos. Cuidar da saúde física, mental e social de nossas crianças é uma tarefa fundamental, para que se garanta o bem-estar e a qualidade de vida delas. Esse cuidado envolve a saúde individual e coletiva, física e mental, em relação ao próprio corpo, à higiene, ao ambiente, à alimentação, aos relacionamentos, enfim, a tudo que possa vir a transformar e/ ou melhorar a vida das crianças e ao que nós, educadores, devemos estar atentos. 188 UNIDADE 2 | DIVERSOS CONTEXTOS DA EDUCAÇÃO INFANTIL: ORGANIZAÇÃO DO TEMPO E DOS ESPAÇOS FIGURA 122 – HÁBITOS DE HIGIENE FONTE: Disponível em: <http://revistaguiainfantil.uol.com.br/ professores-atividades/97/artigo213727-1.asp>. Acesso em: 14 maio 2012. De acordo com Oliveira (2008, p. 185): Os cuidados básicos são vários: de início exige-se atenção para as condições de habitabilidade da instituição: limpeza, ventilação, insolação, segurança e higiene de seus equipamentos. Locais inseguros ou insalubres devem ser reformados de imediato. Às crianças devem ser oferecidas água potável e alimentação adequada. Se quisermos formar certos hábitos nas crianças, precisamos criar situações que os promovam. Existem cuidados que podem facilitar o atendimento e favorecer autonomia nas aprendizagens em relação à saúde das crianças, por exemplo: pias e privadas baixas; espelhos em vários lugares; toalhas individuais e escovas de dente ao alcance das crianças. São coisas simples que farão toda a diferença. FIGURA 123 – AUTONOMIA FONTE: Disponível em: <http://crescendocomjesus.wordpress. com/2011/04/14/desenhos-para-colorir-saude-do-corpo/>. Acesso em: 14 maio 2012. TÓPICO 4 | OS EIXOS NORTEADORES DA EDUCAÇÃO INFANTIL: INTERAÇÃO, BRINCADEIRA E APRENDIZAGEM 189 DICAS Querendo saber mais a respeito deste assunto, leia o livro A criança e seu desenvolvimento: perspectivas para se discutir a educação infantil, de Zilma Ramos de Oliveira (Org.). São Paulo: Cortez, 1995. Oliveira (2008, p. 187) também lembra que: No que diz respeito à saúde, as crianças devem ser continuamente observadas para acompanhamento e detecção precoce de sinais e sintomas a ser comunicados à família e encaminhados aos serviços de saúde. O conhecimento, pelos educadores, de medidas de primeiros socorros é fundamental. A prescrição de medicamentos só pode ser feita sob estrita observação médica. Crianças com necessidades educacionais especiais devem ser atendidas segundo orientações básicas dadas por pessoal especializado. Tudo isso requer eficiente comunicação da creche ou pré-escola com as famílias das crianças. FIGURA 124 – DOENÇAS INFANTIS FONTE: Disponível em: <http://omeubebeefeliz.wordpress. com/2010/08/18/doencas-e-alergias/>. Acesso em: 14 maio 2012. 190 UNIDADE 2 | DIVERSOS CONTEXTOS DA EDUCAÇÃO INFANTIL: ORGANIZAÇÃO DO TEMPO E DOS ESPAÇOS Zilma Ramos de Oliveira (2008, p. 188) desafia os leitores de seu livro “Educação infantil: fundamentos e métodos”, e nós queremos também desafiá-lo(a), caro(a) acadêmico(a), pode ser? Então vá até a página da autoatividade deste tópico e realize a questão DESAFIO. ATENCAO 7 MATEMÁTICA Por mais incrível que possa parecer, a matemática surge muito cedo na vida da criança, que é capaz de realizar uma série de raciocínios matemáticos (à sua maneira, é lógico): resolver pequenos problemas, efetuar contagens, agrupamentos ou seriações e, para isso, utiliza muitas vezes o próprio corpo ou pequenos objetos, tais como pedrinhas ou botões. Os jogos e brincadeiras que envolvem regras, noções espaciais (em cima, embaixo, atrás), conceitos, organização, sequência, geometria e contagem oral são excelentes recursos para a construção de conhecimentos matemáticos que poderão se dar, naturalmente, enquanto brincam. FIGURA 125 – GEOMETRIA COM BOTÕES FONTE: Disponível em: <http://fabriciabiaso.blogspot.com.br/2009/07/ matematica-na-educacao-infantil.html>. Acesso em: 14 maio 2012. Jogos de encaixe, brinquedos de empilhar ou ordenar, quebra-cabeças, jogos da memória ou de formas geométricas são sempre bem-vindos para o trabalho com este importante eixo, pois ensinam na prática o que ainda é abstrato na teoria. TÓPICO 4 | OS EIXOS NORTEADORES DA EDUCAÇÃO INFANTIL: INTERAÇÃO, BRINCADEIRA E APRENDIZAGEM 191 Sobre isso, Smole (2003, p. 9-13) afirma que: As crianças devem perceber que é bom ser capaz de explicar e justificar seu raciocínio e que saber como resolver um problema é tão importante quanto obter sua solução. Esse processo exige que as atividades contemplem oportunidades para as crianças aplicarem sua capacidade de raciocínio e justificarem seus próprios pensamentos durante a tentativa de resolução dos problemas que se colocam. Acreditamos que, desde a escola infantil, as crianças podem perceber que as ideias matemáticas encontram-se inter-relacionadas e que a matemática não está isolada das demais áreas do conhecimento. FIGURA 126 – JOGOS DE MATEMÁTICA FONTE: Disponível em: <http://construtoresdecidadania.blogspot.com. br/2010/06/eventos-abeu-2010-matematica-em-cena.html>. Acesso em: 14 maio 2012. Prezado(a) acadêmico(a)! As crianças adoram os números e eles estão em toda parte: nos jogos, brincadeiras, músicas infantis, histórias, enfim, eles fazem parte do cotidiano das crianças. Cabe a todos nós, educadores, estimular e fortalecer os laços entre a matemática e a vida real das crianças. Sejamos criativos e aproveitemos ao máximo todos os recursos existentes, além de uma boa dose de criatividade e imaginação, para levar nossas crianças a pensar, ou seja, exercitar o raciocínio lógico, formular respostas e não apenas reproduzir respostas prontas; criar e resolver situações problemas e comunicar-se matematicamente com o mundo à sua volta. 192 UNIDADE 2 | DIVERSOS CONTEXTOS DA EDUCAÇÃO INFANTIL: ORGANIZAÇÃO DO TEMPO E DOS ESPAÇOS DICAS Se você se considera um futuro educador leitor e pesquisador e está interessado em saber mais a respeito de como trabalhar a resolução de problemas com as crianças pequenas, confira esta dica de leitura: SMOLE, S. K; DINIZ, I. M; CÂNDIDO, P. Resolução de problemas: matemática de 0 a 6 anos. Porto Alegre: Artes Médicas Sul, 2000. É com esta reflexão que encerramos o tópico e o(a) convidamos a permanecer firme em seus estudos, rumo à Unidade 3 deste caderno, na qual falaremos um pouco mais sobre a brincadeira, a linguagem corporal, musical e afetiva, dentro da abordagem de Reggio Emília. Agradecemos sua companhia! Siga em frente, com o mesmo empenho e dedicação! 193 RESUMO DO TÓPICO 4 Neste tópico, você acabou de aprender que:• Entre os vários fatores que formam os EIXOS NORTEADORES DA EDUCAÇÃO INFANTIL, encontram-se as MÚLTIPLAS LINGUAGENS: brincadeiras e jogos infantis; música e artes visuais; linguagem oral e escrita; natureza e sociedade; educação e saúde; matemática. • Enquanto a criança brinca, ela desenvolve: autonomia, criatividade, identidade, imaginação, imitação, senso de justiça, convivência e socialização. • Ela aprende também a ouvir a opinião do outro; esperar a vez de falar ou de jogar; ceder de vez em quando; respeitar o grupo; cooperar e a cumprir regras; criar e recriar; resolver conflitos; respeitar limites; adquirir novos conhecimentos; emprestar o brinquedo; construir objetos ou lugares para brincar; compartilhar e ouvir ideias. • Enquanto se movimenta, a criança é capaz de expressar seus sentimentos, quer sejam eles manifestados por gestos, emoções ou por postura corporal, principalmente quando a criança ainda não fala. • Quanto mais estimulada a ouvir, cantar e até mesmo tocar diferentes ritmos musicais, maior será o desenvolvimento da criança. • A música está diretamente ligada à sensibilidade, à expressão e à alegria. É muito importante que ofertemos diferentes oportunidades de apreciação e fazer musical às crianças. • A fala é o principal veículo de comunicação entre a criança, os familiares, professores e colegas. Através da fala, a criança expressa seus sentimentos, desejos ou angústias. • Para desenvolver crianças leitoras, é preciso que o educador seja apaixonado pelos livros e faça da leitura uma atividade diária, desde a Educação Infantil. • As crianças percebem a natureza enquanto observam o voo dos pássaros ou borboletas, enquanto experimentam a textura de folhas, enquanto sentem o perfume das flores e até mesmo enquanto vigiam o caminhar das formigas. • É preciso formar sujeitos que percebam o quanto precisam dos recursos naturais para sua sobrevivência. Sujeitos que, desde a Educação Infantil, aprendam a pesquisar, a ser críticos, reflexivos e participativos, que saibam tomar decisões e desenvolver ações humanas em favor da vida e do planeta. 194 • Os jogos e brincadeiras que envolvem regras, noções espaciais (em cima, embaixo, atrás), conceitos, organização, sequência, geometria e contagem oral são excelentes recursos para a construção de conhecimentos matemáticos que poderão se dar, naturalmente, enquanto brincam. • Jogos de encaixe, brinquedos de empilhar ou ordenar, quebra-cabeças, jogos da memória ou de formas geométricas são sempre bem-vindos para o trabalho com este importante eixo, pois ensinam na prática o que ainda é abstrato na teoria. 195 1 DESAFIO: Procure entrevistar a diretora ou coordenadora de uma creche para conhecer quais são as doenças mais comuns nas diferentes idades das crianças e nos diferentes momentos do ano. Compartilhe com seus colegas de sala, no próximo encontro, o resultado de sua pesquisa. ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ 2 Faça uma lista contendo cinco vantagens de se trabalhar a brincadeira e os jogos infantis como recursos pedagógicos: ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ 3 Faça uma lista das vantagens de se trabalhar a música e a dança na rotina escolar. ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ___________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ AUTOATIVIDADE 196 197 UNIDADE 3 AÇÃO E INTERAÇÃO PEDAGÓGICA NA EDUCAÇÃO INFANTIL OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM PLANO DE ESTUDOS A partir desta unidade você será capaz de: • compreender que as múltiplas linguagens fazem parte da vida das crian- ças na Educação Infantil; • identificar a importância da afetividade e das interações no relacionamen- to com as crianças; • aprofundar seu conhecimento a respeito dos projetos pedagógicos desen- volvidos na Educação Infantil; • reforçar a necessidade da observação, registro e avaliação formativa na Educação Infantil. Esta unidade está dividida em quatro tópicos. Em cada um deles, você encon- trará atividades que o(a) ajudarão a compreender e fixar os conhecimentos adquiridos. TÓPICO 1 – A CRIANÇA E AS MÚLTIPLAS LINGUAGENS TÓPICO 2 – A IMPORTÂNCIA DA AFETIVIDADE E DAS INTERAÇÕES NA EDUCAÇÃO INFANTIL TÓPICO 3 – PROJETOS PEDAGÓGICOS NA EDUCAÇÃO INFANTIL TÓPICO 4 – AVALIAÇÃO E REGISTRO NA EDUCAÇÃO INFANTIL 198 199 TÓPICO 1 A CRIANÇA E AS MÚLTIPLAS LINGUAGENS UNIDADE 3 1 INTRODUÇÃO “A linguagem está no mundo e nós estamos na linguagem”. Pierce FIGURA 127 – A CRIANÇA E O MUNDO FONTE: Disponível em: <http://wwwsercriancaebigcba. blogspot.com.br/2012/02/eu-no-mundo-ou-o-mundo-em- mim.html>. Acesso em: 9 jan. 2012. Desde que a criança nasce é apresentada ao mundo e comunica-se imediatamente com ele, seja através do choro, do sorriso, do pedido de colo, da calma aparente diante de uma canção de ninar ou até mesmo na forma de birra infantil. À medida que vai crescendo, essa comunicação torna-se mais ampla e a criança passa a demonstrar, através da fala, dos olhares, desenhos, imitações ou gestos, o que sabe, o que pensa que sabe (por meio das hipóteses), o que conhece e o que pretende conhecer do mundo que está à sua volta. Ela aprende enquanto se senta para ouvir uma história, imagina cenas através das imagens que vê, deixa-se encantar pelo tom de voz de quem lê, embarca em suas próprias fantasias e sente-se imensamente feliz, a ponto de sorrir enquanto ouve cada nova palavra ou expressão proferida pela professora. UNIDADE 3 | AÇÃO E INTERAÇÃO PEDAGÓGICA NA EDUCAÇÃO INFANTIL 200 Nesta fase, o “tocar, o sentir, o brincar, o experimentar, o vivenciar e o interagir” recebem toda a força que carregam em suas palavras e devem constituir os eixos da ação pedagógica na Educação Infantil. Estas palavras passam a fazer sentido à medida que se encontram nas atividades do dia a dia como pintar, desenhar, cantar, dançar, brincar e interagir com os colegas. Partindo desse pressuposto, traremos para seu conhecimento, caro(a) acadêmico(a), a abordagem de Reggio Emília na educação da primeira infância e, na sequência, reflexões e conceitos que definam o aprender e o ensinar na Educação Infantil. Boa leitura! 2 A ABORDAGEM DE REGGIO EMÍLIANA EDUCAÇÃO DA PRIMEIRA INFÂNCIA A criança é feita de cem. A criança tem cem mãos, cem pensamentos, cem modos de pensar, de jogar e de falar. Cem sempre, cem modos de escutar as maravilhas de amar. Cem alegrias para cantar e compreender. Cem mundos para descobrir. Cem mundos para inventar. Cem mundos para sonhar. A criança tem cem linguagens [...]. (Loris Malaguzzi)DICAS Se você gostou deste trecho da poesia de Loris Malaguzzi, sugerimos a leitura do livro “As Cem Linguagens da Criança”, escrito por Carolyn Edwards, Lella Gandini e George Forman. Através desta leitura, você conhecerá quem foi Loris Malaguzzi e se encantará por sua história de vida e paixão pela educação. TÓPICO 1 | A CRIANÇA E AS MÚLTIPLAS LINGUAGENS 201 FIGURA 128 – CAPA DO LIVRO SUGERIDO FONTE: Disponível em: <http://www.euescrevo.com.br/mercado- de-trabalho/educacao/dica-de-leitura-as-cem-linguagens-da- crianca/>. Acesso em: 9 jan. 2012. Caro(a) acadêmico(a)! Diferentemente do que você está pensando, Reggio Emília não é o nome de algum teórico ou de uma escola, trata-se de uma cidade de aproximadamente 130.000 habitantes, no nordeste da Itália. Esta cidade tornou-se conhecida e valorizada por ter um dos melhores sistemas de educação do mundo para a primeira infância. O que torna a cidade um fenômeno, em termos de educação, é o fato de que a proposta pedagógica não ocorre num contexto de elite ou de educação particular e, sim, em nível municipal de ensino. As crianças pequenas são desafiadas o tempo todo a explorarem o ambiente e manifestarem as suas linguagens verbais e não verbais no uso de palavras, gestos, movimentos, brincadeiras, música, artes cênicas ou visuais. Por meio destas manifestações, desenvolvem a criatividade, a curiosidade, o espírito investigativo e, por consequência, uma série de habilidades e competências. O principal professor, inspirador e organizador desta proposta pedagógica desenvolvida em Reggio Emília, foi Loris Malaguzzi. De acordo com Hoyuelos (2004), o trabalho de Malaguzzi apresentava duas constantes: projetar e ter confiança no futuro. UNIDADE 3 | AÇÃO E INTERAÇÃO PEDAGÓGICA NA EDUCAÇÃO INFANTIL 202 FIGURA 129 – LORIS MALAGUZZI FONTE: Disponível em: <http://redesolarebrasil.blogspot.com/2011/02/ homenagem-loris-malaguzzi-2302-data-do.html>. Acesso em: 9 jan. 2012. A história de amor de Malaguzzi pela educação começou logo após o término da Segunda Guerra Mundial (1939-1945), quando se iniciava o processo de reconstrução das escolas públicas de Reggio Emília. Malaguzzi desejava uma escola que rompesse com o formato anterior, determinado pelos fascistas. Queria uma escola que lutasse contra o tédio e a acomodação e que, acima de tudo, contribuísse com a formação humana. O lema deste importante educador era “PARA AS CRIANÇAS É PRECISO OFERECER O MELHOR”. E o que seria este melhor? Pare por um instante e pense sobre isso. Tente formular oralmente pelo menos cinco itens que definam para você, caro(a) acadêmico(a), “esse melhor” que se pode oferecer às crianças. Em seguida, vá até a página de autoatividades, ao final deste tópico, e escreva todos os itens que lhe vieram à mente neste momento. Este é um importante exercício. Se você, enquanto educador(a), mentalizá-lo todas as vezes em que planejar suas aulas, verá a diferença! ATENCAO Na opinião de Malaguzzi (apud EDWARDS; GANDINI; FORMAN, 1999), esse melhor era ter um espaço onde as crianças fossem acolhidas, ouvidas, desafiadas, estimuladas de todas as formas e nas mais diferentes linguagens, levando-as a se tornarem autônomas em todos os sentidos. TÓPICO 1 | A CRIANÇA E AS MÚLTIPLAS LINGUAGENS 203 Barbosa e Horn (2008, p. 118-121) sintetizaram alguns princípios que regem a pedagogia reggiana, que resumiremos no quadro a seguir: A escola/instituição de Educação Infantil O professor As crianças Não tem muros, é conectada com as crianças e a cidade onde está localizada – com as diversas organizações políticas, sociais e culturais e, de modo especial, com as famílias. C o n s i d e r a a s i n ú m e r a s potencialidades das crianças e respeita sua cultura. Acredita que elas são competentes e curiosas e as impulsiona a usarem suas capacidades para prever, resolver problemas, planejar, encontrar soluções, o r g a n i z a r s e u t r a b a l h o , e s t a b e l e c e r r e l a ç õ e s e compreender como funciona o mundo, construindo sua história. São pessoas, não apenas alunos. Malaguzzi afirmou: “É necessário que estejamos convencidos, nós, os adultos, de que as crianças não possuem apenas direitos, mas que são portadoras de uma cultura própria. Que têm capacidade de elaborar cultura, que podem construir sua cultura e contaminar a nossa”. (apud HOYUELOS, 2004, p. 56). Tem uma proposta pedagógica transparente, que considera o entorno físico e social como um parceiro na construção dos processos de conhecimento. Em vez de ser falante, aprende a escutar as crianças. “Escutar” através da observação, da sensibilidade, da atenção, das diferentes linguagens. São ouvidas e valorizadas como pessoas que têm algo a dizer e que precisam ser escutadas. P o s s u i u m a p e d a g o g i a sistêmica, porque nasce de uma relação entre pessoas. Entende que é preciso dialogar, conversar sobre tudo e , fundamentalmente, entre todos. Entende que todos os seres humanos têm cem linguagens, principalmente as crianças e por isso oferece a elas muitas experiências com diferentes linguagens, assim como diferentes formas de representação, como o desenho e a modelagem, para que elas possam tornar visíveis as suas aprendizagens. A o p a s s a r e m d e u m a l inguagem para outra , d e s c o b r e m q u e c a d a transformação gera algo de novo, complexifica e faz aprender sobre aquela l inguagem express iva , comunicativa, simbólica, cognitiva, ética, metafórica, l ó g i c a , i m a g i n a t i va e relacional. Cuida de sua “memória” através da documentação que é um processo para o registro da leitura e dos valores dos processos de aprendizagem das crianças, constituindo-se em um instrumento de interpretação e d e c o n h e c i m e n t o . A documentação é suporte para a pesquisa do professor, para o conhecimento do grupo, para a proposição de conteúdos. Cuida da qualidade dos espaços escolares que refletem uma nova forma de pensar a educação. A organização do ambiente é uma linguagem silenciosa que sugere conteúdos, ideias, relações e propostas. Os espaços são elaborados para trabalhar em grupo, conversar, refletir, revisar as experiências e teorias para, assim, poder encontrar ordem e significado. São vistas como pessoas c a p a z e s d e d i a l o g a r , a rgumentar e re f le t i r . É e s s e n c i a l q u e e l a s participem e sintam-se parte, protagonistas e responsáveis p e l o s a c o n t e c i m e n t o s presentes e futuros. QUADRO 15 – PRINCÍPIOS DA PEDAGOGIA REGGIANA UNIDADE 3 | AÇÃO E INTERAÇÃO PEDAGÓGICA NA EDUCAÇÃO INFANTIL 204 Investe na formação permanente dos professores a partir daquilo que os próprios educadores produzem, acreditando que as competências educativas nascem da interação com a prática educativa e com as crianças – e quem está com elas. Enxerga todos os adultos e crianças como seres criativos, capazes de gerar aprendizagem. S ã o e s t i m u l a d a s e m ateliês, que representam e s p a ç o s e s p e c i a i s d e q u e s t i o n a m e n t o s , d e atenção à arte, à estética, à i n ve s t i g a ç ã o v i s u a l e à cr iat ividade. Estes espaços possuem objetos e instrumentos que podem gerar fazeres e pensares, d e s p e r t a n d o a s c e m linguagens. Na pedagogia de Reggio Emília, acredita-se que quanto mais sensível for o adulto, quanto mais ele conhecer sobre as diferentes áreas de conhecimentos, mais ele será capaz de oferecer às crianças situações de aprendizagens diferentes. Trabalha os conteúdos dentro da pedagogia de projetos, c o n s t r u i n d o v í n c u l o s e relações com as crianças. Planejarigorosamente que perguntas fazer, quais materiais utilizar, como documentar a experiência, colocando em ação a ideia de coensino entre adulto e criança. Recebem de seus professores “vestígios do mundo”, sobre os quais farão perguntas e os auxiliarão a construir caminhos. Desse modo, as crianças criam vínculos entre os conhecimentos, os pontos de intersecção e as aprendizagens. O trabalho é desenvolvido com projetos e na dimensão de Reggio Emília; projetar significa prever e antecipar ideias. C a r a c t e r i z a o e n s i n o p r i n c i p a l m e n t e p e l a oportunidade da palavra dada às crianças, pelo prestar atenção ao que observam, dialogam e brincam, enfim, por tudo o que pode interessá-las. No trabalho com projetos, elas vivenciam uma rica experiência nos pequenos o u g r a n d e s g r u p o s e percebem que suas ideias voltam, voam alto ou se diluem. O conhecimento c h e g a - l h e s a t r a v é s d e conversas, de diálogos, discussões, negociações ou de organizações de ideias, capazes de gerar novos conhecimentos. FONTE: Adaptado de: Barbosa e Horn (2008, p. 118-121) ESTUDOS FU TUROS Prezado(a) acadêmico(a)! Se você ficou interessado(a) em saber mais sobre projetos pedagógicos na Educação Infantil, falaremos mais sobre este assunto. Aguarde! A maneira de tratar a educação e as crianças em Reggio Emília deve ir além de ser apenas exemplo de uma experiência precursora e bem-sucedida de trabalho e, sim, servir como fonte inspiradora de novas posturas, olhares e fazeres pedagógicos. TÓPICO 1 | A CRIANÇA E AS MÚLTIPLAS LINGUAGENS 205 FIGURA 130 – MENINOS FELIZES FONTE: Disponível em: <http://menina-voadora.blogspot.com/2011/02/ criancas-sorrindo.html>. Acesso em: 9 jan. 2012. 3 APRENDER E ENSINAR NA EDUCAÇÃO INFANTIL No início desta unidade, mais precisamente na Introdução, pontuamos diferentes maneiras ou recursos dos quais a criança se utiliza para aprender no seu dia a dia. Desde o momento em que vem ao mundo, a criança inicia o processo de aquisição de diferentes aprendizagens. O ambiente lhe possibilitará todos os recursos necessários às primeiras descobertas, cheiros, gostos e sensações. Ninguém precisa, por exemplo, ensinar ao bebê recém-nascido o que ele tem de fazer quando o peito da mãe se aproxima de sua boca. Tudo acontece como num “passe de mágica”, afetivo, biológico e natural. FIGURA 131 – AMAMENTAÇÃO FONTE: Disponível em: <http://mamaraopeito.blogspot. com/2009/03/amamentacao-la-carte.html>. Acesso em: 9 jan. 2012. UNIDADE 3 | AÇÃO E INTERAÇÃO PEDAGÓGICA NA EDUCAÇÃO INFANTIL 206 Segundo o Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil - RCNEI (BRASIL, 1998, p. 21), “[...] a criança é um ser social que nasce com capacidades afetivas, emocionais e cognitivas, podendo aprender nas trocas sociais com diferentes crianças e adultos cujas percepções e compreensões da realidade também são diversas”. Aprender e ensinar são, portanto, palavras que se inter-relacionam e se complementam. Quanto mais aprendo, melhor ensino. Quanto mais ensino, mais aprendo. O aprendizado transcende os espaços de uma escola, de uma sala de aula com horários preestabelecidos de aprendizagem ou rotina. Ele está em todo lugar e em qualquer tempo, fazendo-nos companhia do primeiro ao último dia de nossas vidas. Que bom que é assim, não é mesmo, caro(a) acadêmico(a)? Enquanto você lê este caderno, internaliza uma série de conceitos, realiza reflexões que poderão lhe abrir novos caminhos e, consequentemente, ampliar sua forma de aprender e ensinar. ATENCAO O educador, que tem essa concepção de que aprende enquanto ensina, também é capaz de enxergar com outros olhos suas crianças, valorizando-as, compreendendo-as em suas diferenças e dificuldades. Preocupa-se em ofertar para elas um ambiente escolar rico e desafiador, que realmente as “prepare para a vida”, em todos os níveis do comportamento humano: biológico, psicológico e social. No mundo contemporâneo, as informações circulam a uma velocidade surpreendente, e o educador precisa sentir-se desafiado o tempo todo para buscar novos conhecimentos, viabilizando outras formas de repassá-los e apropriando- se de recursos que sejam capazes de atrair as crianças. Ele precisa conhecer as novas mídias (as crianças já as conhecem), sem se esquecer de dar especial atenção à formação integral dos educandos, os valores humanos como: solidariedade, respeito, cidadania, responsabilidade, justiça, entre tantos outros, igualmente relevantes na formação das crianças. TÓPICO 1 | A CRIANÇA E AS MÚLTIPLAS LINGUAGENS 207 FIGURA 132 – AS CRIANÇAS E A TECNOLOGIA FONTE: Disponível em: <http://demervalgalvao.blogspot.com. br/2012/10/criancas-digitais-elas-estao-crescendo.html>. Acesso em: 10 jan. 2012. Aprender é muito mais do que ouvir, exercitar e reproduzir conteúdos programáticos. Apreender (escrito com dois “ês”) significa tomar o conhecimento para si, apropriar-se dele. É deste tipo de aprendizagem que estamos falando. Da aprendizagem que tem objetivo, contexto e significação para a vida das crianças, desde a mais tenra idade. É importante ressaltar, prezado(a) acadêmico(a), que a criança da Educação Infantil está protegida por documentos importantes que lhe garantem direitos em relação ao seu atendimento e desenvolvimento integral. Entre eles podemos citar: RCNEI (Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil), DCNEI (Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil) e PNQEI (Parâmetros Nacionais de Qualidade da Educação Infantil) que traduzem as políticas estabelecidas em leis nacionais, servindo como base para todo o país. O professor da Educação Infantil necessita ter uma postura pedagógica que articule as múltiplas linguagens com o objetivo de atingir suas metas educativas. É fundamental que ele desperte nas crianças o desejo de aprender, de construir e de vivenciar o conhecimento em todas as suas vertentes, através da música, da arte, da dança, da escrita, da fala, do teatro, do raciocínio lógico-matemático, da relação com a natureza, da inventividade, da criatividade, da autonomia, da interação com os colegas e professores e, especialmente, da ALEGRIA, no mais amplo sentido da palavra. A grande questão é oferecer às crianças diferentes possibilidades de comunicação, expressão e aprendizagem, com todas as especificidades, criando novos conceitos ou até mesmo recriando ou ressignificando conceitos já existentes. Nas palavras de Zabalza (1998, p. 52), UNIDADE 3 | AÇÃO E INTERAÇÃO PEDAGÓGICA NA EDUCAÇÃO INFANTIL 208 A criança aprende muito enquanto brinca e interage com os colegas. Para Piaget (apud FONTANA; CRUZ, 1997, p. 120), A brincadeira infantil é uma assimilação quase pura do real ao eu. É uma atividade utilizada pela criança para assimilar uma infinidade de acontecimentos, de objetos e relações que ela ainda não compreende. [...] é na brincadeira do faz de conta, que ele chama de jogo simbólico, que as crianças revivem e repensam acontecimentos interessantes do seu dia a dia. Por meio das brincadeiras, as crianças vivem situações do mundo real e aprendem a elaborar o seu imaginário, a buscar a realização de seus desejos e, portanto, a estruturar o pensamento. Entender as brincadeiras das crianças é fundamental para possibilitar-lhes que representem os papéis que escolheram para brincar: brincar de casinha, sendo mãe, pai e filhos; brincar com panelinhas ou de boneca; jogar futebol, saltar, correr, pular; brincar de herói ou bandido, recriando os heróis que fazem parte do seu cotidiano, de sua sociedade. A dimensão estética é diferente da psicomotora, embora estejam relacionadas. O desenvolvimento da linguagem avança por caminhos diferentes dos da sensibilidade musical. A aprendizagem denormas requer processos diferentes dos necessários para a aprendizagem de movimentos psicomotores finos. Sem dúvida, todas essas capacidades estão vinculadas (neurológica, intelectual, emocionalmente), mas pertencem a âmbitos diferentes e requerem, portanto, processos (atividades, materiais, orientações) bem diferenciados de ação didática. Prezado(a) acadêmico(a)! A partir deste momento, vamos reforçar determinados assuntos já apresentados no Tópico 4 da Unidade 2, ou seja, apresentaremos alguns dos eixos norteadores, na forma também de múltiplas linguagens, defendidas por importantes teóricos: FIGURA 133 – CRIANÇAS BRINCANDO FONTE: Disponível em: <http://encantadoresdaleitura.blogspot. com/2011/04/criancas-brincando.html>. Acesso em: 10 jan. 2012. TÓPICO 1 | A CRIANÇA E AS MÚLTIPLAS LINGUAGENS 209 Para Vygotsky (1998, p. 48), A brincadeira é uma necessidade da criança. Ela se desenvolve no contexto das práticas histórico-culturais e surge do interesse de dominar o mundo. Por isso, ela age sobre os objetos como fazem os adultos. Durante o desenvolvimento das brincadeiras, são estabelecidas relações humanas e sociais. [...] é no brinquedo que a criança aprende a agir numa esfera cognitiva, exercendo uma enorme influência no seu desenvolvimento, ou seja, a brincadeira tem um papel fundamental no desenvolvimento da criança, porque permite que, ao substituir um objeto por outro, ela opere com o significado das coisas, dando um passo importante em direção ao pensamento conceitual, que se baseia nos significados e não nos objetos. Já para Ferraz e Fuzari (1993, p. 86), “Brincar na infância é o meio pelo qual a criança vai organizando suas experiências, descobrindo e recriando seus sentimentos e pensamentos a respeito do mundo, das coisas e das pessoas com as quais convive”. Assim, estamos possibilitando a descoberta e o conhecimento, de forma prazerosa, do mundo que rodeia as crianças, fazendo com que aprendam a lidar com o respeito mútuo, divisão de tarefas, de brinquedos e a se expressarem, ampliando as suas experiências. Juntamente com o brincar, outra importante linguagem se manifesta. Estamos falando da linguagem corporal. É através do corpo que a criança estabelece contato com o mundo e com as pessoas que a rodeiam. É com o próprio corpo que ela experimenta as mais diversas emoções e sensações. De acordo com o RCNEI (BRASIL, 1998, p. 21), [...] O diálogo afetivo que se estabelece com o adulto, caracterizado pelo toque corporal, pelas modulações da voz, por expressões cada vez mais cheias de sentido, constitui-se em espaço privilegiado da aprendizagem. A criança imita o parceiro e cria suas próprias reações: balança o corpo, bate palmas, vira ou levanta a cabeça etc. FIGURA 134 – LINGUAGEM CORPORAL FONTE: Disponível em: <http://diariodonordeste.globo.com/ materia.asp?codigo=285245>. Acesso em: 10 jan. 2012. UNIDADE 3 | AÇÃO E INTERAÇÃO PEDAGÓGICA NA EDUCAÇÃO INFANTIL 210 As crianças adoram aliar os movimentos (gestos, dança, faz de conta) à música, surgindo então outra importante linguagem, a musical. Através dela, sensações e sentimentos podem ser experimentados, laços afetivos, culturais e sociais podem ser fortalecidos e novos conhecimentos podem ser oportunizados. “Quem canta seus males espanta”, já diz um ditado popular, não é mesmo? Toda criança adora cantar, tocar e dançar, isto faz parte de seu repertório infantil. Diante disso, cabe a nós, adultos, oferecer-lhes situações prazerosas de interação e estimuladas ao máximo, pois, segundo Rosseti-Ferreira (2007, p. 113), As experiências musicais ampliam o repertório de linguagem e sentimentos. Nesse sentido, a linguagem musical é excelente meio para o desenvolvimento da expressão, do equilíbrio, da autoestima e autoconhecimento, além de poderoso meio de integração social. DICAS E por falar em “quem canta seus males espanta”, sugerimos o livro de mesmo nome, de Theodora Maria Mendes de Almeida, Editora Caramelo, que vem acompanhado de CD para que a festa seja completa. Todos nós sabemos que cantar é uma das brincadeiras mais divertidas da criança. Neste livro foram resgatadas 73 cantigas de roda, entre elas: O sapo não lava o pé; Cai, cai, balão; Ciranda cirandinha... enfim, canções típicas do Brasil. Além disso é ricamente ilustrado por trabalhos, recortes e ilustrações feitas por crianças. Vale a pena conhecer. FONTE: Disponível em: <http://www.fnac.com.br/quem-canta-seus- males-espanta-com-cd--FNAC,,kids-405074-2130.html>. Para finalizar, não poderíamos deixar de mencionar a linguagem que pode ser considerada uma das mais significativas, quando o assunto é Educação Infantil: a linguagem afetiva. É através das emoções que a criança manifesta seus desejos ou angústias. Conforme afirmam Mahoney e Almeida (2004, p. 18), “O afetivo é, portanto, indispensável para energizar e dar direção ao ato motor e ao cognitivo. Assim como o ato motor é indispensável para a expressão do afetivo, o cognitivo é indispensável na avaliação que estimulará emoções e sentimentos”. TÓPICO 1 | A CRIANÇA E AS MÚLTIPLAS LINGUAGENS 211 FIGURA 135 – AFETIVIDADE FONTE: Disponível em: <http://www.educacional.com.br/login/acessorestrito. asp?restr=0&URL=http://blog.educacional.com.br/blogdiversidade/2010/02/05/ deficiencia-intelectual-e-sexualidade>. Acesso em: 10 jan. 2012. Prezado(a) acadêmico(a)! Falaremos mais sobre afetividade no próximo tópico, aguarde! Esperamos que você tenha compreendido a relação entre ensinar e aprender na Educação Infantil. Que tenha percebido, também, o quanto as múltiplas linguagens são essenciais para o desenvolvimento infantil, pois são elas que abrem as portas do mundo às crianças, desdobrando-se na construção de novos conhecimentos, à medida que interagem com seus semelhantes. Não existe alguém que nunca teve um professor na vida, assim como não há ninguém que nunca tenha tido um aluno. Se existem analfabetos, provavelmente não é por vontade dos professores. Se existem letrados, é porque um dia tiveram seus professores. Se existe Prêmio Nobel, é porque seus alunos superaram seus professores. Se existem grandes sábios, é porque transcenderam suas funções de professores. Quanto mais se aprende, mais se quer ensinar. Quanto mais se ensina, mais se quer aprender. Içami Tiba 212 Neste tópico, você aprendeu que: • Reggio Emília é uma cidade de aproximadamente 130.000 habitantes, do nordeste da Itália, que se tornou conhecida e valorizada por ter um dos melhores sistemas de educação do mundo para a primeira infância. • A proposta pedagógica em Reggio Emília não ocorre num contexto de elite ou de educação particular e, sim, em nível municipal de ensino. • O principal professor, inspirador e organizador desta proposta pedagógica desenvolvida em Reggio Emília, foi Loris Malaguzzi. • O lema deste importante educador era “PARA AS CRIANÇAS É PRECISO OFERECER O MELHOR”, o que para ele significava ter um espaço onde as crianças fossem acolhidas, ouvidas, desafiadas, estimuladas de todas as formas e nas mais diferentes linguagens, levando-as a se tornarem autônomas em todos os sentidos. • Aprender e ensinar são palavras que se inter-relacionam e se complementam. Quanto mais aprendo, melhor ensino. Quanto mais ensino, mais aprendo. • O aprendizado transcende os espaços de uma escola, de uma sala de aula e horários preestabelecidos de estudo. Ele está em todo lugar e em qualquer tempo. • O educador, que tem essa concepção de que aprende enquanto ensina, também é capaz de enxergar com outros olhos suas crianças, valorizando-as, compreendendo-as em suas diferenças e dificuldades. Preocupa-se em ofertar para elas um ambiente escolar rico e desafiador, que realmente as “prepare para a vida”, em todos os níveis do comportamento humano: biológico,psicológico e social. • Aprender é muito mais do que ouvir, exercitar e reproduzir conteúdos programáticos. Apreender significa tomar o conhecimento para si, apropriar- se dele. A aprendizagem deve ter objetivo, contexto e significação para a vida de nossas crianças, para tanto necessita da participação efetiva delas. • A criança da Educação Infantil está protegida por documentos importantes que lhe garantem direitos em relação ao seu atendimento e desenvolvimento integral. Entre eles podemos citar os RCNEI, DCNEI e PNQEI. RESUMO DO TÓPICO 1 213 • O professor da Educação Infantil deve ter uma postura pedagógica que articule as múltiplas linguagens com o objetivo de atingir suas metas educativas. • Ele precisa despertar nas crianças o desejo de aprender, de construir e de vivenciar o conhecimento em todas as suas vertentes, através da música, da arte, da dança, da escrita, da fala, do teatro, do raciocínio lógico-matemático, da relação com a natureza, da inventividade, da criatividade, da autonomia, da interação com os colegas e professores e especialmente, da ALEGRIA, no mais amplo sentido da palavra. • A criança aprende muito enquanto brinca e interage com os colegas. • Juntamente com o brincar, outra importante linguagem se manifesta: a linguagem corporal. É através do corpo que a criança estabelece contato com o mundo e com as pessoas que a rodeiam. É com o próprio corpo que ela experimenta as mais diversas emoções e sensações. • As crianças adoram aliar os movimentos (gestos, dança, faz de conta) à música, surgindo então outra importante linguagem, a musical. Através dela, sensações e sentimentos podem ser experimentados, laços afetivos e sociais podem ser fortalecidos e novos conhecimentos podem ser oportunizados. • A linguagem, que pode ser considerada uma das mais significativas quando o assunto é Educação Infantil, é a linguagem afetiva, pois é através das emoções que a criança manifesta seus desejos ou angústias. 214 Caro(a) acadêmico(a)! Através da leitura do Tópico 1 da Unidade 3, você foi levado a algumas importantes reflexões. Através da realização das atividades a seguir, você poderá exercitar a sua aprendizagem, colocando estas reflexões no papel, vamos lá? 1 De acordo com Malaguzzi, “PARA AS CRIANÇAS É PRECISO OFERECER O MELHOR”. Em sua opinião, como esse “melhor” poderia ser definido? Cite algumas características ____________________________________________________________________ ___________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ___________________________________________________________________ 2 Quando Loris Malaguzzi afirma que as crianças têm “cem linguagens”, o que ele quer dizer com isso? ____________________________________________________________________ ___________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ 3 Escreva de cinco a dez linguagens que você, futuro(a) educador(a), considera essenciais para ser desenvolvidas entre as crianças da Educação Infantil ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ AUTOATIVIDADE 215 TÓPICO 2 A IMPORTÂNCIA DA AFETIVIDADE E DAS INTERAÇÕES NA EDUCAÇÃO INFANTIL UNIDADE 3 1 INTRODUÇÃO Caro(a) acadêmico(a)! Tudo o que você estudou até aqui, refere-se a duas palavras fundamentais que compõem o universo da Educação Infantil: afetividade e interação. Quando não há um ambiente acolhedor, afetivo e interativo, entre educadores e educandos, dificilmente haverá aprendizagens significativas. Quando não há vínculos positivos entre as pessoas que compartilham dos mesmos espaços e interesses podem surgir barreiras emocionais que impeçam o “prazer de conviver, ensinar e aprender em grupo”. Vida de grupo dá muito trabalho e muito prazer. Porque eu não construo nada sozinho; tropeço a cada instante com os limites do outro e os meus próprios, na construção da vida, do conhecimento, da nossa história. (FREIRE, 1993, p. 26). FIGURA 136 – TRABALHO EM GRUPO FONTE: Disponível em: <http://revistaescola.abril.com.br/planejamento-e- avaliacao/interacoes/parceiros-acao-431402.shtml>. Acesso em: 11 jan. 2012. 216 UNIDADE 3 | AÇÃO E INTERAÇÃO PEDAGÓGICA NA EDUCAÇÃO INFANTIL Aprendizagem, afetividade e interação caminham juntas. Justamente por isso, prezado(a) acadêmico(a), abordaremos este conteúdo no presente tópico, enfocando as relações de afetividade nas interações do dia a dia da Educação Infantil; a parceria positiva entre os pais e educadores na educação das crianças e os quatro pilares da educação, considerados pela UNESCO as “quatro aprendizagens essenciais”. Bons estudos e novas aprendizagens! 2 RELAÇÕES DE AFETIVIDADE NAS INTERAÇÕES DO DIA A DIA FIGURA 137 – AMIZADE E INTERAÇÃO FONTE: Disponível em: <http://portifoliokaremevsusp.blogspot.com/2010/11/ semana-3-perspectivas-atuais-das.html>. Acesso em: 11 jan. 2012. Quando uma criança vai à escola, jardim ou creche pela primeira vez, normalmente chora. Ela não chora porque é manhosa ou medrosa, mas por não perceber no novo espaço vínculos afetivos. Ela não conhece ninguém, e, por mais simpáticos que sejam os professores ou funcionários, eles dificilmente conseguem conquistar sua confiança nos primeiros dias. A criança rompe naquele momento o “segundo cordão umbilical” que a liga à família, aos parentes mais próximos, à babá, à sua casa, aos seus brinquedos. É como se estivesse nascendo novamente num mundo completamente diferente daquele habitado por ela, até então. Aos poucos, esse “novo espaço”, tão assustador, vai parecendo-lhe mais amistoso, acolhedor e menos estranho. A criança, mesmo que de maneira tímida, TÓPICO 2 | A IMPORTÂNCIA DA AFETIVIDADE E DAS INTERAÇÕES NA EDUCAÇÃO INFANTIL 217 passa a trocar olhares com outros colegas, começa lentamente a deixar-se encantar pela professora, confia nela e sente-se segura ao seu lado. Percebe, também, que está rodeada de amigos e que nada de ruim vai lhe acontecer, então deixa de chorar ou exigir a presença dos pais. Isso pode durar um dia, uma semana ou até mesmo um mês. Cada criança tem seu tempo para adaptar-se, cabe à instituição e aos pais respeitarem esse tempo. Conforme Gandini e Edwards (2002, p. 136), O processo de inserimento requer um ambiente cuidadosamente planejado e preparado, que transmita mensagens imediatas de acolhimento e respeito às crianças e famílias. [...] O principal indicador de acolhimento que os pais podem receber é o fato de serem convidados a passar o maior tempo possível na creche. Quando a instituição de Educação Infantil finalmente passa a fazer parte do “mundo infantil” da criança e estabelece vínculos afetivos com ela, conquista todo o seu amor e carinho, a sua afeição e respeito e, por que não dizer, a sua paixão e curiosidade, que lhe são tão peculiares. DICAS Entre os diversos autores que trabalharam sobre o tema “AFETIVIDADE E EMOÇÃO”, combinando aspectos da psicologia com a educação, destaca-se Henri Wallon, educador e médico francês, que viveude 1879 a 1962. Para Wallon, a emoção estaria relacionada ao componente biológico do comportamento humano, referindo-se a uma reação de ordem física. Wallon foi o primeiro a levar, não só o corpo da criança, mas também suas emoções para dentro da sala de aula. Para aprofundar seus estudos sobre ele, sugerimos: GALVÃO, Izabel. Henri Wallon: uma concepção dialética do desenvolvimento infantil. Petrópolis: Vozes, 1995. DANTAS, Heloysa. A infância da razão: uma introdução à psicologia da inteligência de Henri Wallon. Manole, 1990. WALLON, Henri. As origens do caráter na criança. São Paulo: Nova Alexandria, 1986. WALLON, Henri. As origens do pensamento na criança. São Paulo: Manole, 1989. TAILLE, Yves de la; OLIVEIRA, Marta Kohl de; DANTAS, Heloysa. Piaget, Vygotsky e Wallon: teorias psicogenéticas em discussão. São Paulo: Summus Editorial, 1992. FONTE: WALLON, Henri. Disponível em: <http://revistaescola.abril.com.br/historia/pratica- pedagogica/educador-integral-423298.shtml>. 218 UNIDADE 3 | AÇÃO E INTERAÇÃO PEDAGÓGICA NA EDUCAÇÃO INFANTIL As crianças, em geral, sentem necessidade do toque, do olhar carinhoso, do ouvido atento e do sorriso acolhedor do professor, pois, devido às tecnologias e à correria da atualidade, as relações estão cada vez mais distantes, as famílias cada vez menores, os pais cada vez mais envolvidos com seus compromissos profissionais e, muitas vezes, ausentes no lar, o que leva muitas famílias a comporem um cenário contraditório, em que as crianças têm tudo em termos materiais, mas são carentes de afeto. “As crianças têm necessidade do pão: do pão do corpo e do pão do espírito. Mas necessitam ainda mais do teu olhar, da tua voz, do teu pensamento e da tua promessa”. (FREINET apud ELIAS, 1997, p. 91). FIGURA 138 – PROFESSORES AFETIVOS FONTE: Disponível em: <http://vidaeducacao.com.br/?cat=86>. Acesso em: 12 jan. 2012. Os profissionais precisam estar afetiva e profissionalmente preparados para receber estas crianças, num espaço acolhedor e diversificado, para que possam ser atendidas também em suas necessidades básicas. No dia a dia da Educação Infantil, é possível perceber e transformar esta necessidade afetiva, em momentos de interação positiva, através de trabalhos em grupo, conversas coletivas, atividades cooperativas, cantos, teatros, brincadeiras ou “roda” – da conversa, da história e de muitas outras coisas, pois, conforme Ostetto, (2006, p. 158), “A roda, feito espiral em movimento circular ascendente, une todos, e o seu movimento a cada volta modifica o desenho do cotidiano, da prática pedagógica, integrando papéis e histórias, incorporando as diferenças”. TÓPICO 2 | A IMPORTÂNCIA DA AFETIVIDADE E DAS INTERAÇÕES NA EDUCAÇÃO INFANTIL 219 FIGURA 139 – RODA DE NOTÍCIAS FONTE: Disponível em: <http://www.diariodeourinhos.com.br/noticia. asp?codnot=4213>. Acesso em: 12 jan. 2012. Vejamos alguns motivos para utilizar a roda como recurso pedagógico: 220 UNIDADE 3 | AÇÃO E INTERAÇÃO PEDAGÓGICA NA EDUCAÇÃO INFANTIL A roda fortalece os vínculos afetivos do grupo, pois eles passam a sentir-se parte da vida do outro a partir do momento em que estabelecem relações, quer seja como ouvintes ou como protagonistas da vida real. Para Warschauer (1993, p. 50), [...] a roda é o momento privilegiado da rotina em que a troca entre os participantes do grupo ocorre. Sentar-se de forma que todos se vejam, em círculo, já é um convite a querer falar e ouvir. O respeito pela individualidade é a base de construção do grupo. De acordo com Freire (1993, p. 162), [...] é no encontro do grupo que nos defrontamos com as diferenças. É no grupo que aprendemos esse difícil processo de conviver com as divergências, os conflitos, as diferenças. Isso tudo envolve e significa processo de construção de conhecimento, significa processo de apropriação do saber de cada um para deflagrar o que ainda não se conhece. FIGURA 140 – RODA DE AMIGOS FONTE: Disponível em: <http://carolcampos.wordpress.com/2009/08/11/como- trabalhar-em-grupo-em-sala-de-aula/>. Acesso em: 12 jan. 2012. O interessante desta posição circular é a questão de que não há início e nem fim, nem o primeiro ou o último, ou ainda diferença nos posicionamentos, todos se encontram numa mesma linha, juntos e em equilíbrio. Todos estão incluídos e têm as mesmas chances de participação, o que facilita a união, distanciando-se da competição e da disputa de poder. De acordo com Ostetto (2006, p. 158), [...] mais do que fazer a roda e chamar para o encontro, por si só já é uma ação carregada de simbolismo, entra em jogo o exercício de uma atitude e um pensamento circular. Pensar circularmente significaria não pensar em linha reta, na afirmação da verdade, da única voz, do conhecimento único. Significaria abrir-se ao diálogo, ao acolhimento da dúvida e da diversidade, à construção de múltiplos enredos afirmados no encontro das singularidades de crianças e adultos, de alunos e professores. Não uma técnica, procedimento metodológico, mas um modo de agir, de ser, de acolher. TÓPICO 2 | A IMPORTÂNCIA DA AFETIVIDADE E DAS INTERAÇÕES NA EDUCAÇÃO INFANTIL 221 1 Por falar em cumplicidade, parceria, amizade, prezado(a) acadêmico(a), relembre momentos de sua vida escolar. Em seguida, pense num professor que tenha marcado positivamente sua fase estudantil, desde a Educação Infantil até os dias atuais. De quem você se lembrou? Escreva o nome deste professor ou professora e registre o fato que marcou você. ______________________________________________________________ ______________________________________________________________ _____________________________________________________________ ______________________________________________________________ _____________________________________________________________ _____________________________________________________________ 2 Em seguida, descreva as qualidades desse professor. O que fez com que ele ou ela merecesse ser lembrado(a) por você? ______________________________________________________________ ______________________________________________________________ ______________________________________________________________ ______________________________________________________________ _____________________________________________________________ _____________________________________________________________ Além de tudo, a roda nos aproxima das crianças e nos torna, de certa forma, “cúmplices”, parceiros e amigos, ampliando de maneira natural nossos vínculos afetivos. FIGURA 141 – RODA DA CONVERSA FONTE: Disponível em: <http://miartioli.blogspot.com/2011/04/roda-da- conversa.html>. Acesso em: 12 jan. 2012. AUTOATIVIDADE 222 UNIDADE 3 | AÇÃO E INTERAÇÃO PEDAGÓGICA NA EDUCAÇÃO INFANTIL Provavelmente, estimado(a) acadêmico(a), o que fez com que você lembrasse o(a) profissional escolhido(a) foram suas qualidades relativas à afetividade entre ambos, ou seja, como este(a) professor(a) era com você, modo de tratar, se era querido(a), carinhoso(a), atencioso(a) etc. Dificilmente você o(a) escolheu por questões cognitivas, por algo que ele(ela) tenha lhe ensinado, falando de conteúdos propriamente ditos. Bons professores merecem ser lembrados também pelos ensinamentos que nos trazem, é lógico, mas só o serão se aliarem afetividade à sua prática. Para Snyders (apud ELIAS, 1997, p. 92), O aluno aprende realmente bem o que o cativa, numa atmosfera de aula que lhe pareça segura, com um professor que saiba criar afinidades. Eis por que a escola, ao mesmo tempo, tem que conciliar o intelectual e o afetivo e constitui um lugar privilegiado para operar essa conciliação. A alegria na escola só é possível na medida em que o intelectual e o afetivo conseguem não se opor. FIGURA 142 – CONSTRUÇÃO