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TEMA_10_APLICACAO_DA_LEI_PENAL

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APLICAÇÃO DA LEI PENAL 
 
 
Neste próximo tópico, será estudado um tema bem amplo, a aplicação da lei penal. 
A aplicação da lei penal se divide em aplicação da lei penal no tempo e em aplicação da lei 
penal no espaço. 
A análise da aplicação da lei penal do tempo ocorre quando se objetiva verificar se uma deter-
minada lei que entrou em vigor pode ou não retroagir ou ultra-agir. Já a análise da aplicação da lei penal 
no espaço se dá quando se objetiva saber se cabe a aplicação da lei penal brasileira no caso concreto – 
como por exemplo, no caso de crime que ocorre no estrangeiro e que é praticado por brasileiro ou contra 
um brasileiro, ou praticado a bordo de uma embarcação ou aeronave brasileiras. 
 
1. APLICAÇÃO DA LEI PENAL NO TEMPO 
Sobre o estudo da aplicação da lei penal no tempo, deve-se atentar, primeiramente, para o 
tempo do crime, o qual está disposto no art. 4º do CP. 
 
 
 
 
 
 
 
O art. 4º do CP adota a chamada teoria da atividade. 
Veja um exemplo: 
Fabiano, na véspera de seus 18 anos, ou seja, com 17 anos, 11 meses e 29 dias, atirou em Mar-
celo com dolo de matar. No dia seguinte, Fabiano completa 18 anos de idade e, dois dias depois, Marcelo 
vem a óbito. Diante deste exemplo, faz-se necessário observar o momento da conduta do agente. Assim 
 
Tempo do crime 
 
Art. 4º, CP – Considera-se praticado o crime no momento da ação ou 
omissão, ainda que outro seja o momento do resultado. 
 
 
 
 
 
 
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sendo, no momento da conduta praticada por Fabiano, ele era considerado penalmente inimputável. Em 
consequência disso, Fabiano não responderá por crime, mas sim por ato infracional. 
Veja outro exemplo, o de crime permanente: 
Teodorico sequestrou Cássio. Teodorico tinha 17 anos e alguns meses de idade quando levou 
Cássio para o cativeiro. Tendo mantido Cássio ainda em cativeiro, Teodorico completou 18 anos de idade 
e, posteriormente a isto, Cássio foi libertado. Por se tratar de hipótese de crime permanente, Teodorico 
poderá responder pelo crime de sequestro, haja vista que, quando Cássio saiu do cativeiro, Teodorico já 
tinha 18 anos de idade. 
Isso ocorre porque, nos casos de crimes permanentes, como por exemplo sequestro e cárcere 
privado, a conduta se protrai, ou seja, se prolonga no tempo. É como se conduta tivesse sendo praticada 
a cada minuto. Assim, se o agente completa 18 anos de idade com a vítima em cativeiro, ele poderá res-
ponder penalmente pelo crime de sequestro ou cárcere privado. 
Ao estudar sobre a lei penal no tempo, é muito importante saber que a lei que está sendo 
analisada pode ser benéfica ou maléfica. Pois, se a lei for maléfica ao réu, ela não retroagirá, ou seja, é 
irretroativa, e somente em casos excepcionais a lei maléfica poderá se projetar à frente. Atente-se, por-
tanto, que a lei maléfica só poderá ser contabilizada para condutas praticadas a partir da sua vigência. 
 
ATENÇÃO: Recentemente, a Lei 13.497/17 transformou o crime previsto no art. 16 do Estatuto 
do desarmamento (Lei 10.826/03) em crime hediondo. Ou seja, a Lei 13.497/17 incluiu mais um crime no 
rol de crimes hediondos. 
 
Assim, se, em 2016, uma pessoa praticou o crime previsto no art. 16 do Estatuto do desarma-
mento, crime de posse ou porte ilegal de arma de fogo de uso restrito, ou seja, antes da Lei 13.497/17 
entrar em vigor, ela não poderá responder penalmente por esse crime como se fosse hediondo, haja vista 
que a Lei 13.497/17 trata-se de lei maléfica e, portanto, não poderá retroagir. 
Diferentemente da lei maléfica, a lei benéfica retroage e se projeta no tempo, alcançando, in-
clusive, os crimes praticados antes da data da sua vigência. É dotada de um elemento chamado de extra-
atividade, devido ao seu caráter de retroatividade e ultra-atividade. 
 
 
 
 
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 ATENÇÃO: A ultra-atividade da lei benéfica ocorre quando a lei pode ser aplicada na sentença 
mesmo estando revogada. Por exemplo, imagine uma pessoa que tenha cometido o crime de tráfico à 
época da antiga lei de drogas (Lei 6.368/76), que previa pena 03 a 12 anos. Esta pessoa responderá pe-
nalmente conforme a pena prevista na Lei antiga. Primeiro, porque a nova Lei de drogas (11.343/06) prevê 
uma pena de 05 a 15 anos, ou seja, é maléfica ao réu, e, portanto, não poderá retroagir. E, segundo, que 
a antiga Lei de Drogas (11.343/06), por possuir pena de 03 a 12 anos, é mais benéfica ao réu. Assim, ainda 
que esteja revogada, poderá ultra-agir, ou seja, se projetar no tempo para ser aplicada na sentença. 
Veja como está disposto o fenômeno da lei maléfica na Constituição Federal Brasileira de 1988, 
em seu art. 5º: 
 
 
 
 
 
 
 
Em contrapartida, a lei maléfica poderá ultra-agir excepcionalmente, conforme o art. 3º do CP: 
 
 
 
 
 
 
 
 
O art. 3º do CP dispõe sobre as leis excepcionais e as leis temporárias, as quais são dotadas, 
portanto, da ultra-atividade gravosa. O que significa dizer que, por exemplo, se, durante um lapso tem-
poral, uma determinada lei prevê como crime a conduta de vender produto acima do preço tabelado, em 
 
Lei excepcional ou temporária 
 
Art. 3º - A lei excepcional ou temporária, embora decorrido o período 
de sua duração ou cessadas as circunstâncias que a determinaram, 
aplica-se ao fato praticado durante sua vigência. 
 
 
Art. 5º, CF/88: 
 
XXXIX - não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem 
prévia cominação legal; 
 
XL - a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu; 
 
 
 
 
 
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época de crise econômica, a pessoa que praticar esta conduta, no período de vigência da lei, poderá ser 
denunciada, processada e condenada penalmente, inclusive se a referida lei não estiver mais em vigor. 
 
Veja também o que estabelece o enunciado 711 do STF acerca da aplicação da lei penal mais 
gravosa nos casos de crime continuado e crime permanente: 
 
 
 
 
 
 
A partir da leitura do enunciado acima, imagine um caso de crime permanente, por exemplo, o 
crime de sequestro. 
Exemplo: 
Nesta hipótese, a vítima está presa em cativeiro, ou seja, a conduta está se prolonga no tempo. 
De repente, durante esse período em que a vítima está em cativeiro, é sancionada uma nova lei, aumen-
tando a pena do crime de sequestro ou cárcere privado. Assim sendo, como a lei foi sancionada antes da 
cessação da permanência do crime de sequestro, o agente responderá penalmente conforme a previsão 
da nova lei. Desta maneira, veja o esquema a seguir: 
 
 
APLICAÇÃO DA LEI 
PENAL NO TEMPO
LEI BENÉFICA 
EXTRA-ATIVIDADE
RETROATIVIDADE
ULTRA-ATIVIDADE
LEI MALÉFICA
IRRETROATIVIDADE
ULTRA-ATIVIDADE 
GRAVOSA 
EXCEPCIONAL
ENUNCIADO 711 DO STF 
A lei penal mais grave aplica-se ao crime continuado ou ao crime 
permanente, se a sua vigência é anterior à cessação da continui-
dade ou da permanência. 
 
 
 
 
 
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Nos casos em que exista mais de duas leis, como por exemplo, a Lei A, a Lei B e a Lei C, e cada 
uma delas trata de um assunto diferente, qual delas será aplicada no caso concreto? Aquela que for mais 
benéfica pro réu. 
 
2. APLICAÇÃO DA LEI PENAL NO ESPAÇO 
Assim como é importante estudar o tempo do crime para compreender a aplicação da lei penal 
no tempo, é muito importante estudar o lugar do crime para compreender a aplicação da lei penal no 
espaço. 
O lugar do crime está previsto no art. 6º do CP, o qual adota a teoria mista ou teoria da ubiqui-
dade: 
 
 
 
 
Diferentemente da teoria da atividade (prevista no art.4º do CP), que estabelece que o tempo 
do crime deve ser considerado no momento da conduta do agente, a teoria mista (ou da ubiquidade) 
estabelece como lugar do crime tanto o lugar em que ocorreu a ação ou omissão da conduta, seja no todo 
ou em parte, quanto o lugar onde se produziu ou deveria se produzir o resultado. 
 
Exemplo: 
Sandro atirou em Juan em território brasileiro. Juan, cambaleando, atravessa a fronteira e vem 
a óbito no Paraguai. Pergunta-se: Qual é o lugar do crime? Brasil e Paraguai, pois, em relação ao lugar do 
crime, a teoria é mista. 
Se o crime for praticado no Brasil, será aplicado o princípio da territorialidade, ou seja, será 
aplicada a lei brasileira ao crime que foi cometido em território nacional, seja pela ação ou pelo resultado 
ter ocorrido no Brasil. Este princípio está disposto no art. 5º do CP. Veja: 
 
 
Lugar do crime 
 
Art. 6º - Considera-se praticado o crime no lugar em que ocorreu a 
ação ou omissão, no todo ou em parte, bem como onde se produziu 
ou deveria produzir-se o resultado. 
 
 
 
 
 
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Para uma melhor compreensão acerca da lei penal no espaço e os princípios da territorialidade 
e da extraterritorialidade, observe o esquema a seguir: 
 
LEI PENAL NO ESPAÇO
PRINCÍPIO DA 
TERRITORIALIDADE
Aplicação da lei brasileira ao 
crime cometido no território 
nacional. 
Território nacional em sentido estrito 
(solo, subsolo, rios, lagos, lagoas, mar 
territorial e espaço aéreo 
correspondente.
Território nacional por extensão -
embarcações e aeronaves brasileiras 
públicas ou a serviço do governo onde 
quer que se encontrem e as privadas e 
mercantes que se encontrem em alto 
mar ou no espaço aéreo 
correspondente.
PRINCÍPIO DA 
EXTRATERRITORIALIDADE
Aplicação ao crime cometido em 
território estrangeiro
EXTRATERRITORIALIDADE 
INCONDICIONADA (inciso I)
- Princípio real da defesa ou da 
proteção (alíneas "a", "b"e "c");
- Princípio da Universalidade (alínea 
"d") .
EXTRATERRITORIALIDADE 
CONDICIONADA (inciso II)
- Princípio da Universalidade 
(alínea "a");
- Princípio da personalidade ativa 
(alínea "b");
- Princípio da bandeira (alínea "c")
Territorialidade 
 
Art. 5º, CP - Aplica-se a lei brasileira, sem prejuízo de convenções, 
tratados e regras de direito internacional, ao crime cometido no territó-
rio nacional. 
 
 
 
 
 
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Observa-se, portanto, que estes dois princípios, o da territorialidade e o da extraterritoriali-
dade, regem a lei penal no espaço. 
Pelo princípio da territorialidade, há aplicação da lei brasileira a um crime que tenha ocorrido 
no Brasil. Já pelo princípio da extraterritorialidade, há aplicação da lei brasileira a crime cometido em 
território estrangeiro. Desta maneira, no caso da pessoa que viaja para os Estados Unidos e que comente 
um crime em território estadunidense, deve ser analisado se esta hipótese se encaixa no art. 7º do CP, o 
qual dispõe sobre a extraterritorialidade. 
Considera-se, inclusive, que, por uma questão de soberania, a aplicação do princípio da territo-
rialidade é a regra. Enquanto, a aplicação da lei brasileira em território estrangeiro é excepcional, por isso 
devem ser observados os incisos I e II do art. 7º do CP. 
O inciso I do art. 7º do CP estabelece a extraterritorialidade incondicionada, o que significa 
dizer que a lei brasileira será aplicada independentemente de o agente ter sido condenado ou absolvido 
em território estrangeiro. Como é o caso de crime praticado contra Presidente da República do território 
estrangeiro. O que não poderá ocorrer é a dupla punição pelo mesmo crime, ou seja, o agente não poderá 
ser condenado pela lei brasileira e pela lei estrangeira em decorrência do mesmo crime praticado, con-
forme prevê o art. 8º do CP. 
 
 
 
 
 
. 
 
Assim, se a pessoa foi condenada e cumpriu sua pena de 10 anos em território estrangeiro e se, 
no Brasil, foi condenada a uma pena de 15 anos, ela não poderá cumprir 15 anos, mas sim, tão somente 
a pena de 5 anos em território nacional. 
 
 
Pena cumprida no estrangeiro 
 
Art. 8º, CP - A pena cumprida no estrangeiro atenua a pena imposta 
no Brasil pelo mesmo crime, quando diversas, ou nela é computada, 
quando idênticas. 
 
 
 
 
 
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Já a extraterritorialidade, prevista no inciso II do art. 7º do CP, é condicionada, o que significa 
dizer que, para que seja aplicada a lei brasileira em território estrangeiro, todas as condições previstas no 
§2º do art. 7º do CP devem estar presentes cumulativamente. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Exemplo: 
Imagine a hipótese de uma gestante que viajou para estrangeiro e lá descobriu que o aborto 
era permitido. Posteriormente, se internou em uma clínica e realizou o aborto. Neste caso, não poderá 
ser aplicada a lei penal brasileira, pois, conforme prevê a alínea “b” do §2º do art. 7º do CP, o fato deve 
ser punível também no país em que foi praticado. Como o aborto era permitido nesse país estrangeiro, a 
mulher não poderá responder por lei penal brasileira. Estando ausente, portanto, uma das condições pre-
vistas no §2º do art. 7º do CP, não poderá ser aplicada a lei penal brasileira, mediante o princípio da 
extraterritorialidade condicionada. 
 
Para que seja aplicado no caso concreto os princípios da territorialidade e da extraterritoriali-
dade, é fundamental entender o conceito de território nacional. 
 
 
 
Extraterritorialidade 
 
Art. 7º do CP: 
 
§ 2º - Nos casos do inciso II, a aplicação da lei brasileira depende do 
concurso das seguintes condições: 
 a) entrar o agente no território nacional; 
 b) ser o fato punível também no país em que foi praticado; 
 c) estar o crime incluído entre aqueles pelos quais a lei brasileira 
autoriza a extradição; 
 d) não ter sido o agente absolvido no estrangeiro ou não ter aí cum-
prido a pena; 
 e) não ter sido o agente perdoado no estrangeiro ou, por outro mo-
tivo, não estar extinta a punibilidade, segundo a lei mais favorável. 
 
 
 
 
 
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Conceito de território nacional 
Território, em sentido jurídico, é o âmbito espacial sujeito à soberania do Estado. 
Já o território em sentido estrito corresponde a solo, subsolo e águas fluviais e lacustres (rios e 
lagos), todos limitados pelas fronteiras políticas e o mar territorial, além do espaço aéreo correspondente. 
Quanto ao conceito de mar territorial, este já causou muita discussão, pois no âmbito interno, 
fixaram-se 200 milhas a partir da baixa-mar saindo para o mar aberto. Este conceito é dado pelo Decreto-
lei 1.098/70 (mar territorial é a área chamada de baixa-mar do litoral continental). Contudo, tal limite foi 
amplo demais, acabando por não ser aceito internacionalmente, o que trouxe a necessidade de fixar um 
novo conceito de mar territorial, desta vez, um conceito internacional. Em âmbito internacional, o mar 
territorial é a faixa ao longo da costa que compreende 12 milhas. Conceito este dado pela Lei 8.617/93, 
que revogou o DL. 1.098/70. 
A disciplina do território nacional por extensão encontra-se no art. 5º, §1º, do CP. Aqui já se 
tem a aplicação da Lei brasileira fora do conceito lato de território nacional. Trata-se de uma ficção do 
que seria também território brasileiro, ou seja, uma extensão, uma equiparação do território nacional em 
sentido lato. Seriam os navios e aeronaves públicos brasileiros que se encontrem e os navios e aeronaves 
privados brasileiros em alto-mar (mar de ninguém) ou espaço aéreo correspondente. 
 
ATENÇÃO: Serão considerados como crimes ocorridos em território brasileiroaqueles pratica-
dos em aeronaves ou embarcações públicas brasileiras, onde quer que elas se encontrem, ou se estiverem 
a serviço do governo brasileiro. Exemplo: Avião da Presidência da República sobrevoando território euro-
peu. Se dentro deste avião houver crime, entende-se que este ocorreu em território brasileiro, pois se 
trata de território por extensão. 
Outro exemplo é o caso de embarcação privada ou mercante brasileira que esteja em alto-mar. 
Por se entender que alto-mar não é território demarcado por outros países, havendo crime nesta região 
dentro de uma embarcação brasileira, será o crime considerado como ocorrido em território brasileiro. 
Salienta-se que há o §1º do art. 5º do CP dispõe sobre duas hipóteses de embarcação e aero-
nave: 
 
 
 
 
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a) embarcação ou aeronave pública, ou a serviço do governo, as quais serão consideradas como 
território brasileiro onde quer que elas estejam. 
b) embarcação privada ou mercante brasileira ou aeronave privada brasileira, as quais só serão 
consideradas como território brasileiro se estiverem em alto-mar ou em espaço aéreo correspondente a 
alto mar. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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