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Módulo 3 Leitura Sumplementar

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Leitura suplementar - Módulo 3 
Curso Controles Institucional e Social dos Gastos Públicos 
ANÁLISE: TEMPO DE RECONSTRUIR (EDITORIAL, O ESTADO DE SÃO PAULO, 
13/09/2016) 
 Sérgio Ricardo de Brito Gadelha 
 
Leia o seguinte editorial, o qual envolve tema relevante sobre a economia brasileira: 
 “(...) A reforma política, a modernização trabalhista, a revisão das normas da Previdência, a 
atualização do sistema tributário, a reavaliação das funções do Estado e da operação do 
governo são temas obrigatórios de qualquer discussão consequente sobre o futuro do País (...). 
Questões institucionais envolvem muito mais que direitos básicos, obrigações, forma de 
governo e regras de operação dos chamados Poderes da República. Exemplo: nem todos 
percebem, no dia a dia, como as normas constitucionais afetam os custos da economia 
brasileira e limitam - de fato, severamente - as possibilidades de crescimento da produção e de 
criação de empregos decentes e úteis. 
Coleção de nobres princípios e de bons propósitos, a Constituição de 1988, tanto na forma 
original quanto depois de grande número de emendas, engessa as finanças públicas, facilita o 
desperdício, dificulta o equilíbrio fiscal, cria ambiente favorável à inflação e impõe obstáculos 
ao crescimento econômico. 
A chamada Constituição Cidadã estabelece direitos e impõe obrigações ao Tesouro Nacional 
sem cuidar de como financiá-las. Distribui recursos e tarefas entre os níveis de governo sem 
levar em conta as proporções entre meios e fins. Consagra um sistema tributário mal 
concebido e incompatível com as necessidades de uma economia aberta à concorrência 
internacional. 
A estrutura de impostos e contribuições encarece o investimento e a produção e diminui a 
competitividade brasileira. A reforma desse sistema já virá com muito atraso. 
A proposta de um teto para o aumento da despesa pública, enviada ao Congresso (...) é só um 
passo inicial para a correção de algumas dessas - para usar uma palavra suave - inadequações. 
Mas a Constituição formulada com bons sentimentos e belas intenções é só uma das fontes de 
problemas legais, a começar, é claro, pelas vinculações criadas sem pragmatismo, sem visão de 
futuro e sem racionalidade administrativa. Erros desse tipo se multiplicam facilmente, quando 
 
 
 
 
 
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se propõem, por exemplo, planos educacionais com metas de despesas mínimas, como se a 
solução dos grandes problemas dependesse apenas do volume de despesas - ideia contrariada 
pela experiência dos países mais avançados. 
Eficiência e qualidade são pelo menos tão importantes quanto as somas destinadas aos vários 
programas. De modo geral, determinam os graus de sucesso ou de insucesso. Comparem-se, 
por exemplo, os gastos e os padrões educacionais da Coreia e do Brasil. 
Mas eficiência e qualidade são atributos de ações governamentais. A incompetência e o 
desleixo na elaboração e na execução de programas, no caso brasileiro, são irmãos gêmeos do 
desperdício de recursos e da fragilidade fiscal. A qualidade da administração pública tem sido 
um problema crônico do governo brasileiro, atenuado ocasionalmente com ações de reforma 
sempre abandonadas em pouco tempo. A ineficiência da INFRAESTRUTURA, para citar um 
exemplo, é componente desse quadro, assim como o baixo desempenho dos estudantes 
brasileiros em testes internacionais. 
Os brasileiros têm mais uma oportunidade, agora, de atacar essas questões e de reconstruir o 
País segundo modelos melhores para todos. Se for desperdiçada, quem sabe quando surgirá a 
próxima?” 
Comentários acerca do editorial 
A reportagem acima discuti, dentre outros temas, sobre a Proposta de Emenda à Constituição 
(PEC) nº 241, atual Emenda Constitucional nº 95, promulgada para reequilibrar as contas 
públicas e viabilizar a recuperação da economia brasileira ao mudar alguns dispositivos da 
Constituição Federal de 1988 para criar o chamado “Novo Regime Fiscal”. Esse regime prevê 
que as despesas públicas não poderão crescer acima da inflação oficial do ano anterior, isto é, 
se a inflação deste ano for de 7%, esse será o teto de crescimento da soma de todos os gastos 
federais no ano seguinte. 
A Emenda Constitucional nº 95 prevê um limite anual de despesas para os Três Poderes ao 
longo dos próximos 20 anos, dessa forma, os gastos públicos só poderão aumentar de acordo 
com a inflação do ano anterior. Em outras palavras, os futuros governantes terão o desafio de 
limitar o avanço do gasto público à inflação do ano anterior, mas só poderão mexer em 
algumas despesas. Para se ter uma ideia, no orçamento de 2017, o governo federal tem, 
aproximadamente, R$ 1,3 trilhão em gastos primários (excluindo os juros da dívida pública) 
aprovados e, deste total, 83,4% são despesas que o governo não pode cortar. 
 
 
 
 
 
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Nesse grupo de despesas, encontram-se os gastos com a Previdência Social, que consomem 
mais de 40% do orçamento federal. Assim, sobram apenas 16,7% que o governo pode mexer, 
que são as chamadas despesas discricionárias. Observe, portanto, que a margem para se 
decidir onde cortar gastos públicos é bastante limitada. Dito de outra forma, o espaço para 
deslocar as despesas discricionárias (que podem ser cortadas) é muito pequeno, havendo ou 
não reforma da Previdência Social. Como as áreas de saúde e educação têm um limite mínimo 
de gastos que não podem ser alterados, então sobrariam áreas menores para cortar gastos 
públicos, como investimento em infraestrutura, pesquisa, ciência e tecnologia, segurança 
pública e meio ambiente, entre outros. Por sua vez, o restante das despesas, como a folha de 
servidores e abono salarial, é congelado. 
As áreas de saúde e educação só terão que obedecer à regra de teto dos gastos a partir de 
2018. A atual equipe econômica argumenta que a referida PEC fixa apenas um piso mínimo e 
que nada impede que o orçamento para educação e saúde suba acima da inflação, desde que 
se respeite o teto global. Ou seja, se o governo gastar menos em outras áreas, poderá 
aumentar os recursos para essas duas áreas específicas. 
O gasto público alcançou um patamar insustentável e seu crescimento precisa ser contido. Por 
essa razão, a Emenda Constitucional nº 95 é fundamental para o Brasil recuperar a 
credibilidade entre os investidores e voltar a crescer. Um dos pontos positivos da proposta é a 
reavaliação de prioridades e do tamanho do governo, pois dever-se-á utilizar os recursos 
públicos escassos de forma eficiente. De forma resumida, os pontos favoráveis são: 
• A Emenda Constitucional nº 95 coloca uma trava para a expansão do gasto público, 
que não poderá crescer acima da inflação do ano anterior, fazendo com que, aos 
poucos, a dívida pública caia e traga a sustentabilidade ao país. A inflação deve ser 
medida pelo IPCA do ano anterior. 
• Os Três Poderes da União (Executivo, Judiciário e Legislativo) terão limites 
individualizados de gastos públicos. Além disso, órgãos federais com autonomia 
administrativa e financeira também deverão cumprir este limite. Isso inclui, por 
exemplo, o Tribunal de Contas da União (TCU), o Ministério Público da União (MPU), a 
Defensoria Pública da União, fundos, fundações e empresas estatais. 
• A Emenda Constitucional nº 95 é vista por investidores e pelo mercado como a 
primeira medida econômica efetiva por parte do atual governo, pois sinaliza um 
compromisso de longo prazo de controle das contas públicas, contribuindo para o 
 
 
 
 
 
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aumento da confiança de empresas do setor privado e de consumidores. Essa melhora 
na confiança é essencial para a retomada do investimento privado e para o consumo 
das famílias. Com o aumento do consumo e do investimento, o Brasil poderá voltar a 
crescer. 
• Essa Emenda traz uma solução de longo prazo para o déficit público brasileiro. A 
validade é de 20 anos, e essa proposta poderá ser revisada uma vez por mandato 
presidencial, isto é, trata-se de uma espécie de “proteção” das contas públicas do país 
para atos de futuros governantes que possam comprometer a retomada da 
estabilidade econômica. Somente a partir do décimo ano, o Presidente da República 
que estiver no poder poderá enviar um projeto de lei para mudar a forma de correção 
do teto. Além disso, não se poderá editar medidas provisórias. Mas essa Emenda 
Constitucional poderá ser revista daqui a quatro ou cinco anos para não engessar a 
administração federal, se a economia brasileira se recuperar nesse período. 
• Sabe-se que o nível de endividamento do governo dificulta uma maior redução da taxa 
básica de juros brasileira, a taxa Selic. Nota-se que, quanto maior o déficit fiscal, mais 
arriscado fica emprestar dinheiro para o Brasil, e mais caro ficam os juros relacionados 
à dívida pública. Entretanto, se as contas públicas estiverem sob controle, o país 
poderá manter uma taxa de juros menor. Devemos nos lembrar que a taxa Selic é 
referência para as taxas de juros cobradas em linhas de crédito ao consumidor e a 
empresas, por exemplo. 
• Com um limite para se gastar, os futuros governantes deverão pensar melhor onde 
alocar os recursos públicos. Precisamos nos lembrar que o problema da escassez na 
ciência econômica reside no fato de que os recursos produtivos (fatores de produção) 
são limitados frente às necessidades humanas ilimitadas. Se, por um lado, no exercício 
de sua função alocativa, o governo procura fornecer bens e serviços públicos à 
sociedade, por outro lado, existe uma restrição orçamentária dos recursos públicos. E 
nem sempre “gastar mais” significa “gastar melhor”, de modo que o governo precisa 
fornecer esses bens e serviços públicos de maneira eficiente. No entanto, existe uma 
crença errônea de que, se colocarem mais recursos em determinadas áreas do setor 
público, como educação e saúde, a qualidade do ensino ou a saúde pública irão 
melhorar. A Emenda Constitucional nº 95 irá contribuir para um aumento da eficiência 
do gasto público e irá forçar uma definição de prioridades para o Brasil. 
• É importante destacar que, pelas atuais regras da Emenda Constitucional nº 95, as 
áreas da saúde e educação só terão que obedecer à regra de teto dos gastos a partir 
 
 
 
 
 
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de 2018, logo, deverão ter uma base para o teto superior. Já nos anos seguintes, o 
governo ressalta ainda que os investimentos nessas duas áreas poderão crescer acima 
da inflação. Para o governo, o que vale é o teto total, isto é, se o governo gastar menos 
em outras áreas, poderá aumentar os recursos para as áreas de saúde e educação. 
• No caso do teto estabelecido para cada um dos Três Poderes da União (“limites 
individualizados”), será factível compensar um possível descumprimento desse teto 
entre órgãos do mesmo Poder. Por exemplo, no Poder Judiciário, se um determinado 
tribunal ultrapassar o limite de gastos em um ano, outro órgão desse mesmo Poder 
que estiver com sobra poderá ceder sua parte, desde que o total de gastos públicos 
não ultrapasse o teto do Poder Judiciário. Um tribunal não poderá compensar esse 
limite com um órgão do Poder Legislativo, por exemplo, pois se tratam de órgãos de 
Poderes diferentes. 
• A Emenda Constitucional nº 95 prevê punições caso algum dos Três Poderes da União, 
ou órgãos a eles vinculados, descumpram o limite de crescimento de gastos, por 
exemplo, o impedimento de se reajustar salários e contratar pessoal. Explicando 
melhor, caso o limite não seja respeitado, a Emenda Constitucional nº 95 prevê que o 
Poder ou órgão responsável ficará proibido, a partir do ano seguinte, a: 
1. dar aumentos e reajustes salariais a servidores públicos; 
2. criar cargo, emprego ou função que implique aumento de despesa; 
3. mudar a estrutura de carreira que implique aumento de despesa; 
4. contratar pessoal, exceto para reposição de vagas; 
5. abrir novos concursos públicos; 
6. criar despesas obrigatórias; 
7. criar ou aumentar auxílios, vantagens, bônus e abonos para servidores; 
8. reajustar despesas obrigatórias acima da inflação. 
• Existem cinco situações em que os gastos não precisam obedecer à regra do teto: 
1. transferências constitucionais, como o repasse de recursos da exploração de 
petróleo a estados e municípios; o repasse de impostos arrecadados pela 
União a municípios, estados e fundos; cotas do salário-educação a estados e 
municípios; despesas com a polícia civil, militar e o corpo de bombeiros militar; 
2. créditos extraordinários somente em casos imprevisíveis e urgentes, como 
guerra, comoção interna ou calamidade pública; 
3. despesas com eleições pela justiça eleitoral; 
4. outras transferências obrigatórias por lei em função de receitas vinculadas; 
 
 
 
 
 
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5. despesas com aumento de capital de empresas estatais não dependentes. 
• Os órgãos municipais e estaduais não estão sujeitos a tal limite. Mas o governo federal 
pretende enviar uma proposta que limite o crescimento dos gastos dos governos 
subnacionais, semelhante à Emenda Constitucional nº 95, que é válida apenas para a 
União. 
Contudo, para os críticos, a Emenda Constitucional nº 95 ameaça políticas sociais, pois haverá 
prejuízos para a população de baixa renda e redução dos gastos sociais. Em resumo, os 
principais pontos contrários à Emenda Constitucional nº 95 são: 
• Falso diagnóstico do real problema fiscal do país. Esse problema está relacionado à 
forte queda da arrecadação tributária e ao aumento do gasto com a dívida pública. As 
principais causas para o crescimento do endividamento público seriam os gastos com 
pagamento de juros da dívida pública, as renúncias fiscais e a política de acúmulo de 
ativos (reservas internacionais e créditos junto ao Banco Nacional de Desenvolvimento 
Econômico e Social – BNDES), com remuneração menor que as taxas de juros do 
mercado. 
• Haverá uma redução drástica dos gastos nas áreas de saúde e educação, pois, como o 
ritmo de algumas despesas obrigatórias tende a continuar a crescer, como os gastos 
com a Previdência Social, o congelamento de aumento nos gastos públicos provocaria 
o “estrangulamento” nessas duas áreas. 
• A regra não considera mudanças demográficas e crescimento do PIB. Explicando 
melhor, o teto não considera o crescimento e envelhecimento da população na regra 
que corrige os gastos públicos, nem o crescimento do PIB. A mudança desses 
indicadores pode trazer novas necessidades de investimento em bens e serviços 
públicos. Dito de outro modo, a Emenda Constitucional nº 95 irá colocar em risco 
políticas sociais. 
• O prazo de vigência do teto é considerado longo demais (20 anos). Para os críticos 
dessa proposta, é difícil prever as necessidades futuras do país. Não há flexibilidade 
para ajustar as contas públicas e mudar a regra no futuro. 
• A Emenda Constitucional nº 95 irá dificultar o investimento público e poderá prolongar 
a atual crise econômica. Argumenta-se que, como a Emenda Constitucional nº 95 irá 
conter o crescimento dos gastos públicos e reduzir a capacidade de investimento do 
Estado,isso pode tornar ainda mais lenta a retomada do crescimento econômico. 
 
 
 
 
 
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• Embora diversos outros países tenham aprovado regras para definir o crescimento das 
despesas públicas, não se tem conhecimento de modelo semelhante aplicado no 
exterior. Por exemplo, na União Europeia, o limite para o gasto público está associado 
à taxa de crescimento de longo prazo do PIB, e não à inflação. Como não há 
referências no exterior, há incertezas dos efeitos dessa medida na economia e até 
mesmo de sua viabilidade. 
Referência 
Tempo de reconstruir. Disponível em: http://opiniao.estadao.com.br/noticias/geral,tempo-de-
reconstruir,10000075626. Acesso em: 9 fev. 2017.

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