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A Igreja não tardou em condenar o Liberalismo


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A Igreja não tardou em condenar o Liberalismo 
 
 
Mais do que nunca é necessário saberem os nossos 
militantes provar, por textos indiscutíveis e fatos 
precisos, que, para denunciar os nocivos resultados do 
individualismo do último século, os católicos sociais não 
esperaram que o socialismo se tornasse poder ameaçador. 
Para eles respingamos, portanto, na história do século 
passado, alguns fatos particularmente sugestivos. 
 
 
*** 
 Chefe incontestado do movimento social católico na 
Alemanha foi o bispo von Ketteler, contemporâneo de 
Marx e Lasalle. 
 
 Desde 1848, ano da publicação do Manifesto 
comunista, Mons. von Ketteler pronunciou na catedral de 
Mogúncia os seus dois célebres sermões sobre a 
propriedade, dos quais damos uma súmula no capítulo 
seguinte. 
 
 No seu discurso de 25 de julho de 1869, perante um 
auditório de operário da zona industrial do Main, assim 
dizia: “O caráter fundamental, que dá importância e 
significação ao movimento operário, constituindo, para 
bem dizer, a sua essência, é a tendência para a associação 
operária que tem por fim pôr a união das forças ao serviço 
dos interesses dos operários. A religião só pode apoiar 
tais associações e desejar que elas surtam efeito em prol 
da classe operária”. 
 
 Em seguida, o bispo de Mogúncia examinou cada uma 
das reivindicações que os operários deverão fazer triunfar 
pela força dos agrupamentos profissionais: 
 
 “A primeira reivindicação da classe operária é um 
aumento de salário correspondente ao valor real do 
trabalho... A religião exige que o trabalho humano não 
seja tratado como mercadoria, nem avaliado pura e 
simplesmente segundo as flutuações da oferta e da 
procura. 
 
 A segunda reivindicação da classe operária é a 
diminuição das horas de trabalho... Em toda a parte onde 
o tempo do trabalho exceda os limites que impõem a 
natureza e o interesse da saúde, os operários têm direito 
bem fundado de combater, mediante ação comum, 
semelhante abuso do poder capitalista... 
 
 A terceira reivindicação da classe operária visa obter 
dias de descanso... Neste ponto a religião não só está 
convosco, mas muito antes de vós fez prevalecer à 
necessidade desses dias... Também a tal respeito os 
princípios da economia social e os partidos que os 
seguem incorreram em crime que branda realmente 
vingança ao céu e não cessam de cometê-los todos os 
dias... O tempo de descanso deve ser computado no do 
trabalho, tanto quanto em razão mesmo deste, o descanso 
se tornar necessário e se impuser como condição do 
trabalho a fazer. 
 
 Uma quarta reivindicação da classe operária é a 
proibição de trabalharem as crianças durante a época em 
que ainda são obrigadas a frequentar a escolas. Julgo que 
semelhante trabalho das crianças é monstruosa crueldade 
do nosso tempo. Equiparo-o ao assassínio, a fogo lento, 
do seu corpo e da sua alma... 
 
 A quinta reivindicação da classe operária tende a 
excluir das fábricas as mulheres e, sobretudo as mães de 
família. A religião exige que a mãe passe o dia em casa a 
fim de desempenhar a sua alta e santa missão para com o 
homem e os filhos. 
 
 Há um sexto postulado: a moça solteira também não 
deveria ser empregada nas fábricas.” 
 
 O bispo acrescentou, entretanto, que segundo o seu 
intento, este postulado não implicava uma indicação 
absoluta, sem exceção no que concerne às moças 
solteiras; mas pedia a todos os católicos que se 
associassem energicamente ao movimento tendente a 
salvaguardar a moralidade da juventude nas fábricas e 
oficinas. Era para a classe operária “uma questão de honra 
e um dever imposto pela religião.” 
 
 Após haver enunciado as seis reivindicações, o bispo 
timbrou em fazer notar que não esgotara o assunto. Quis 
ater-se às reformas que realizáveis mais imediatamente 
lhe pareciam. Concluiu o discurso com a enumeração das 
obras que têm por fim facilitar a economia, a aquisição 
duma pequena propriedade, a instituição, enfim, de 
cooperativas operárias não só de consumo como mesmo 
de produção. 
 
 No mesmo ano, Mons. von Ketteler apresentava à 
assembleia dos bispos alemães em Fulda um relatório em 
que as mesmas idéias eram expendidas não menos 
vigorosamente e que concluía pela indicação das medidas 
de proteção legai que os católicos do Centro não 
tardariam em fazer votar. O relator declarava sentir ter 
constatado que o clero, na sua mor parte, não estava 
bastante consciente da gravidade do mal-estar social e, 
portanto, convir, antes de tudo, iniciar os jovens clérigos 
nos problemas sociais. 
 
 Confrontando os textos de Ketteler com os da 
Encíclica “Rerum Novarum”, compreende-se que Leão 
XIII, numa conversa com o Snr. Decurtns, tenha chamado 
o bispo de Mogúncia “seu ilustre precursor”. 
 
 O principal continuador da obra do Mons. von 
Ketteler foi o cônego Hitze, que, após o falecimento de 
Windthorst, tornou-se um dos chefes do Centro alemão. 
Hitze resumiu o programa social dos católicos do seu país 
numa brochura publicada no começo de 1880 sob o título 
“A quintessência da questão social”. A questão social, ao 
seu ver, consiste essencialmente “em se procurar uma 
organização social que corresponda às condições 
modernas da produção, tal qual a organização social da 
idade média correspondia às condições em que se achava, 
então, a produção nas cidades e aldeias”. Hitze assinala o 
perigo da produção que denomina anárquica, isto é, “que 
ultrapassa consideravelmente as possibilidades de 
consumo... O verdadeiro senhor nas nossas sociedades é 
o capitalista, porque todos – industriais, empresários, 
patrões, empregados e operários – estão a mercê do 
capital. A solução deve ser buscada na organização social 
das profissões. É mister tornar menos precária a situação 
dos assalariados, criando-se maior reciprocidade de 
deveres, maior solidariedade entre patrões e operários. A 
nossa época, que se proclama democrática, não pode 
admitir que o operário continue a ser uma mercadoria que 
se compra ou vende segundo as cotações do mercado”. 
 
*** 
 
 Na Áustria, o programa do barão Vogelsang 
preconizava, há mais de cinquenta anos, o seguro social, 
a fixação legal de salário mínimo e do juro de capitais que 
pelos respectivos donos não são aplicados diretamente a 
alguma obra de produção. 
 
 O caráter radical deste programa explica-se pelos 
abusos intoleráveis da usura que então exerciam os 
judeus, nomeadamente na Galícia e na Morávia. 
 
 No conceito de Vogelsang e de seus amigos, o único 
remédio eficaz para a decomposição da sociedade era a 
organização corporativa obrigatória de todos os ofícios 
ou profissões. A sociedade - ponderavam eles – não deve 
ser uma simples justaposição de indivíduos, senão uma 
federação de coletividades ou de agrupamentos sociais. O 
voto não deveria representar um conjunto de interesses 
individuais, mas ser a expressão dos grandes interesses 
sociais. 
 
 Desde 1883, o grupo dos católicos austríacos fazia 
votar o regime da corporação obrigatória para a pequena 
indústria. A increpação, que lhes faziam, de quererem 
voltar à antiga feudalidade, Vogelsang e seus amigos 
obtemperavam: O que se chama abusos feudais são as 
usurpações da força bruta, os excessos do poder, as 
iniquidades de toda a sorte que certos senhores 
cometeram. Se procurarmos, em compensação, os 
princípios do regime feudal, podemos enuncia-lo mais ou 
menos deste modo: É pelo implemento contínuo do dever 
socialque se justifica o exercício contínuo do direito 
individual; não se é senhor senão para servir àqueles que 
o não são; a proteção do fraco é a condição do poderio e 
o resgate da grandeza; a propriedade, enfim, é menos uma 
riqueza do que uma função. Numa palavra, não se trata 
de restaurar a sociedade da idade média, mas de inspirar-
nos, para reorganizar a sociedade atual, no ideal, no ideal 
social dos séculos de fé (1). 
 
 
*** 
 Na Suiça foi um católico fervoroso, Decurtins, lente 
da Universidade de Friburgo, que teve a iniciativa da 
primeira conferência internacional para a proteção dos 
trabalhadores, conferência que no ano de 1890 realizou-
se em Berlim, a pedido do imperador da Alemanha. 
 
 Em longa memória enviada ao Parlamento Federal 
suisso, Decurtins afirmou que somente a legislação 
internacional concernente à proteção do trabalho podia 
abrir caminho para a luta contra a anarquia da produção. 
“Justamente porque o mercado da mão de obra e a própria 
indústria são coisas internacionais, os direitos do trabalho 
não poderiam por mais tempo continuar detidos no seu 
desenvolvimento pelas barreiras que separam as nações”. 
 
 A Conferência em Berlim, na qual a Santa Sé foi 
representada por Mons. Kopp, príncipe-bispo de Breslau, 
quase não teve resultados imediatos, mas ficou ventilada 
a questão e dado o impulso. Já nenhuma influência era 
capaz de sustar os progressos duma reforma reclamada 
simultaneamente pela justiça e pelo interesse comum. 
 
*** 
 
 Na França, o conde de Mun e o marquês de La Tour 
du Pin defenderam, desde 1875, na revista 
“L’Association Catholique”, as idéias caras a todos os 
católicos sociais. A citada revista é fonte preciosa de 
documentos para os historiadores do movimento social. 
Nela encontra-se, entre outros, o texto completo duma 
comovente carta dirigida em 1845 por Mons. Rendu, 
bispo de Annecy, ao rei da Sardenha. Este prelado, 
denunciando os abusos de que era testemunha, declarava: 
 
 “A expansão da indústria tem produzido abusos de tal 
forma odiosos que é preciso remontar até ao paganismo 
para deparar semelhante dureza e desprezo da 
humanidade. É mesmo de estranhar que a opinião, ou o 
que assim se convencionou chamar, não reclame contra 
uma desordem que arremete contra a sociedade como a 
vaga impelida pela tempestade vinda do meio do oceano. 
Grande zelo manifestou-se em prol da abolição da 
escravidão...; mas ninguém ousa propor que se aplique 
um curativo à chaga mais dolorosa e repugnante da 
humanidade. Ouvem bem os gritos que ela faz os 
desgraçados soltarem, mas calam-se porque temem o 
poder dos que os comprimem para que deles saia 
ouro.(2)” 
 
 
*** 
 
 A história do movimento social do século passado 
relata poucos episódios mais significativos do que as 
intervenções do Cardeal Manning em 1889 por ocasião 
da greve dos estivadores de Londres e do Cardeal 
Gibbons, de Baltimore, em 1887, a favor dos Cavalheiros 
do Trabalho. 
 
 Relatando o primeiro destes episódios, o Padre G. 
Guitton escreveu que “ante os fatos e algarismos 
aduzidos pelo Cardeal, era difícil negar que se 
justificavam as reivindicações dos grevistas. Destes, 
porém, se tinham assenhoreado alguns agitadores, entre 
outros o famoso John Burns, para exacerbar as paixões. 
 
 Ceder seria covardia, traição da ordem social. A isto o 
octogenário não hesitou em obtemperar que não cedendo 
o que se faria era apenas fornecer novo alimento ao 
incêndio de ódios e que os único fundamento da 
verdadeira ordem social é a prática da justiça”. 
 
 “Mas, my Lord, objetavam-lhe, é socialismo o que 
fazeis”. E o Cardeal renovando sem saber o dito de Leão 
XIII a La Tour du Pin, declarava: “Não sei se para vós é 
socialismo. Para mim é puro cristianismo” (3) 
 
 Certos tópicos das conferências, feitas pelo Cardeal 
Manning em 1874, sobre os direitos e a dignidade do 
trabalho, ficarem célebres. Lembremos o mais 
conhecido: 
 
 “Se o fim da vida é multiplicar as varas de casimira e 
de algodão, se a glória da Inglaterra consiste em produzir 
tais artigos e outros similares na maior quantidade 
possível e pelo mais baixo custo, então avancemos no 
caminho em que estamos. Ao contrário, se a vida 
doméstica dum povo é a verdadeira vida, se a paz e a 
honra do lar, se a educação dos filhos, os deveres de 
esposa e de mãe, os deveres de marido e de pai estão 
inscritos numa lei natural de outra importância que a de 
qualquer lei econômica, se todas estas coisas são sagradas 
ao inverso das que se vendem no mercado, então- declaro 
– cumpre agir consequentemente. Se, em certos casos, a 
não regulamentação do trabalho conduz a destruição da 
vida doméstica, à negligência da educação dos filhos, se 
transforma as mulheres e as mães em máquinas vivas, os 
esposos e os pais (perdoem-me a palavra) em bestas de 
carga que levantam antes do sol e à noite voltam ao pouso 
extenuados pela fadiga e mal tendo força para comerem 
um pedaço de pão e a tirarem-se a um grabato para 
dormir: a vida de família não existe mais e neste andar 
não podemos continuar. Sei que abordo um assunto 
difícil, mas creio ser preciso encará-lo calmamente, com 
justiça e vontade bem firme de pôr o trabalho e seus 
lucros em segundo plano, a moralidade e a vida de família 
no primeiro!”. 
 
 E numa carta a Mons. Doutre loux, bispo de Liége, o 
Cardeal Manning acrescentava: “Fazer passar o trabalho 
e o salário antes das necessidades da vida humana e 
doméstica e solapar a ordem estabelecida por Deus e pela 
natureza, é arruinar a sociedade humana no seu princípio 
vital. A economia da indústria é regida pela suprema lei 
moral que determina, limita e confere as suas operações”. 
 
 Alguns anos mais tarde, um discípulo do Cradeal 
Manning, Mons. Bagshave, bispo de Nottingham, 
escrevia: 
 
 “As classes abastadas falam em caridade, mas se 
quisessem restituir aos pobres o que a estes devem em 
rigorosa justiça, veriam logo que as somas devidas são 
infinitas superiores às suas pretensas caridades”. 
 “Um governo não pode, certamente, considerar-se 
justo quando tolera que num país, como a Irlanda, onde 
os campônios se consomem na mais dura miséria, doze 
milhões de acres de terras sejam entregues a pastos pelo 
capricho dos Lords, enquanto sobre vinte milhões de 
acres de terras irlandesas há apenas três que dão produtos 
próprios para a alimentação do homem”. (4). 
 
 Eis dois extratos duma memória enviada pelo Cardeal 
Gibbons ao Cardeal Simeoni, Secretário de Estado de 
Leão XIII em defesa da “Associação dos Cavalheiros do 
Trabalho” que o arcebispo de Québec julgara dever 
condenar: “Se muitos bispos se inquietam com as 
tendências, segundo lhe parecem, revolucionárias das 
novas associações, outros em número não menor, dentre 
os quais o Cardeal Manning e eu mesmo, alarmam-se 
igualmente ante o perigo que corre a Igreja de ser 
apresentada em nossa época como aliada dos poderosos e 
ricos e adversária dos fracos e pobres, porque tal aliança, 
embora aparente, não só causaria inaudito mal à Igreja 
como também subverteria toda a nossa história. Nunca, 
ao nosso ver, semelhante coisa deve acontecer. O único 
poder do mundo, que há quase dezoito séculos tem sido 
protetor das classes pobres e dos fracos, não iria 
abandoná-los na hora da angústia. Mui sabiamente o 
próprio Cardeal Manning ponderou: “As condições em 
que ora se acham as classes inferiores não podem durar 
mais; sobre tais alicerces é impossível que algum edifíciosubsista”. 
 
 E sabido que Leão XIII anuiu à tese do Cardeal 
Gibbons. 
 
*** 
 
 No seu livro “Vingt-cinq annés d’Action Sociale”, o 
snr. Verhaegen rememorou os primórdios do movimento 
democrático cristão na Bélgica. 
 
 Durante os sessenta primeiros anos da nossa 
independência nacional, a atividade dos católicos belgas 
é inteiramente absorvida pelas obras de ensino, de 
patronato e de beneficência. Todavia, a revista 
“L’Economie sociale” publicou uma série de artigos em 
que um industrial católico, o snr. M. J. De Jaer, assinalou 
o perigo: “Enquanto os socialistas seguem em toda a parte 
um idêntico sistema de propaganda, a burguesia em toda 
a parte assume para com eles a mesma atitude inábil, 
pouco corajosa e pouco leal. Semelhante atitude faz 
pensar na do avestruz que esconde a cabeça na areia para 
se safar do perigo... Há sociedades onde se faz o operário 
conhecer apenas os seus direitos. São más. Outras obras 
existem onde sob o ponto de vista da solução da questão 
social, talvez pouco melhores sejam”. 
 
 No Congresso católico de Malines, realizando em 
1864, houvera maioria para defender com o snr. Carlos 
Périn a doutrina do patrono e da caridade e rejeitar de 
resoluções do snr. Duepétiaux pedindo, não só que, 
mediante lei, se fixasse a idade mínima para admissão nas 
fábricas, se limitasse a 12 horas a duração da labuta 
quotidiana e para as mulheres se proibissem trabalhos 
subterrâneos, como também a regulamentação da higiene 
nas oficinas, a inspeção administrativa do trabalho e 
acordos internacionais para a unificação da legislação 
social. 
 
 Infelizmente, vozes como as de De Jaer e Ducpétiaux, 
durante demasiado tempo, elevaram-se no deserto. 
 
 Mais atendido não fora um grande orador francês, o 
snr. Ugustin Cochin, quando no Congresso de 1863 
declarava: “Muitíssimas vezes os industriais incubem a 
caridade de completar os salários e preferem dar sob a 
forma de socorro o que o operário acharia mais digno e 
mais seguro receber em pagamento”. 
 
 No capítulo do Tomo II da História da Bélgica 
Contemporânea, consagrado à história social do nosso 
país (5), o professor Defourny recorda que no mesmo ano 
de 1864 um grande industrial de Gand, blasonado 
progresso e filantropia, jactava-se de haver reduzido a 
tarefa das crianças a 12 horas por dia e com isso auferir 
produção tão vantajosa quanto os seus concorrentes que 
mantinham a duração de 14 horas. Parecia-lhe, contudo, 
que 12 horas de trabalho eram o mínimo abaixo do qual 
não se deveria cogitar de descer. 
 
*** 
 
 Liga Democrática Belga, fundada em princípios de 
1891, começou por agrupar algumas organizações 
esparsas nos principais centros operários. O conjunto das 
resoluções votadas pelos seus congressos anuais constitui 
um programa social completo que, nas linhas essenciais 
não diverge do adotado pelos católicos sociais e de outros 
países. 
 
 Os dirigentes mais autorizados do movimento 
democrático cristão foram então os snrs. Helleputte, 
Verhaegen, Kurth, o padre Pottier, de Ponthière, Léon 
Mabille, Levie, Victor Delporte, Eylenbosch e simples 
operários, dos quais o mais influente era o tecelão 
Bruggeman, de Gand. Os seus nomes ficaram gravados 
na memória grata dos trabalhadores cristãos. Todos 
sabiam ser sustentados por Mons. Doutreloux e 
Stillemans, bispos respectivamente de Liège e de Gand. 
 
 As reformas sociais que preconizavam, pouco diferem 
das que defendia a revista francesa “L’Association 
Catholique”. Podem ser reduzidas a quatro idéias 
fundamentais: condenação do regime individualista 
fundado na pretensa liberdade do trabalho; organização 
profissional ou corporativa e internacional; repressão da 
usura e dos abusos do capitalismo sob todas as suas 
formas. 
 
 A estas indicações sumárias seja-nos permitido ajuntar 
o que escrevemos, em 1899, ao sair da Universidade, na 
tese doutoral consagrada às greves dos mineiros e à ação 
socialista. Essa página parece-nos apresentar algum 
interesse porque relata as impressões dum estudante da 
Universidade posto pela primeira vez em contato com a 
realidade: 
 
 “Custa-se a imaginar na hora atual, apesar dos motins 
sangrentos que acompanharam as greves nas minas de 
carvão, quanto ódio e quanta sede de vingança 
apoderavam-se dos mineiros quando os oradores dos 
meetings lhes faziam passar pelos olhos, exagerando-os, 
o lúgubre cortejo dos incríveis abusos revelados pelos 
inquéritos privados e oficiais: depauperamento do corpo 
pela demasiada duração dum trabalho quase ininterrupto; 
embrutecimento do espírito por falta completa de 
educação e instrução profissional, tornada inútil em 
muitas profissões pela introdução do trabalho parcelar; 
trabalho nos domingos; trabalho à noite; trabalho das 
crianças e das mães; locais estreitos, baixos mal arejados, 
ora superaquecidos, ora frios e úmidos; alimentação 
deficiente; salários por vezes irrisórios, pagos 
irregularmente e desfalcados por frequentes multa e 
retenções consideráveis e arbitrárias: obrigação de se 
abastecerem a preços usuários nas casas dos contra-
mestres; quase nenhuma regulamentação fixas das 
condições do trabalho; ausência quase total de várias 
precauções elementares contra acidentes, tanto mais 
numerosos por serem ainda muito imperfeitas as 
instalações; abandono frequente dos feridos, doentes e 
velhos, consequência fatal da inexistência de qualquer 
organização de seguro ou de caixas de pensão e 
aposentadoria; abusos desenfreados dos sub-contratos e 
do regateio; aglomeração de famílias numerosas em 
casebres miseráveis, por vezes infectos. 
 
 A tudo isto juntai o isolamento do operário e a sua 
impossibilidade de agir em razão do desaparecimento de 
uniões profissionais legalmente constituídas; a ausência, 
muitas vezes, quase completa de relações diretas entre 
operários e industriais; esquecerem-se os ricos dos 
encargos da propriedade; enfim, e sobretudo, a 
sufocação, em muitos operários, de crença numa vida 
futura, deixando-os sem aquilo que a esta vida pode dar 
um sentido, tirando-lhes coma esperança todo o freio 
moral para que na sua existência empanada e aviltada não 
vejam senão um curto parênteses entre dois nadas. 
 
 Ao proletário agro por tanta amargura vinde agora 
pintar, em traços impressionantes e à vontade 
enegrecidos, o contraste exasperador entre a sua 
miserável vida e a opulência requintada de “parasitas 
fartos”; dizei e repeti que a causa única de tudo isto é o 
egoísmo cínico de patrões açambarcadores; afirmai ser, 
no entanto, o trabalho dele a fonte única de fortuna do 
rico; descrevei-lhe o abuso como inerente essencialmente 
ao uso, o mal-estar transitório como um mal inelutável; 
pregai-lhe a teoria da luta das classes... e perguntai-vos se 
esse operário, a quem repetem periodicamente tais coisas, 
não está fatalmente destinado a se tornar um revoltado...” 
(6) 
 
 
*** 
Tudo quanto acabamos de lembrar em nada altera o fato 
de, durante longos anos, os católicos sociais não terem 
sido acompanhados pela maioria dos seus 
correligionários. Aos católicos belgas, considerados no 
seu conjunto, será aplicável este asserto de Pio XI: “As 
diretrizes tão autorizadas de Leão XIII quebraram as 
oposições e desarmaram as desconfianças”? 
 
 É certo que no seio de vários grupos intelectuais e nos 
meios operários a Encíclica “Rerum Novarum” retiniu 
profundamente, mas é preciso também reconhecer a 
alhures se organizou a seu respeito uma espéciede 
conspiração do silencia. 
 
(1) Cf. Léon Grégoire, Le pape, les catholiques et la 
question sociale. Paris. 1907, 4e. éd., p. 20. 
 
(2) L’Association Catholique, Année 1881, T. II, P. 325, 
Cf. Guitton, 1891, Une date dans l’histoire des 
Travailleurs. Paris, Ed. Spes, 1931. 
 
(3) Guitton, op. Cit, p. 57. 
 
(4) Cf. Nitti, Le socialisme catholique, Paris, 
Guillaumin, 1894, ch. XI. 
 
(5) Bruxelles, Dewit, 1929, p. 272. 
 
(6) Nos greves houlleres et l’Action Socialiste, 
Bruxelles, Goemare, 1900, p. 324. 
 
 
PARA CITAR 
 
 
G.-C Rutten. O. P. A Doutrina Social da Igreja, segundo 
as Encíclicas Rerum Novarum e Quadragesimo Anno, 
1947, Agir, Pág. 32-46 
<http://www.apologistascatolicos.com.br/index.php/apol
ogetica/igreja-catolica/743-a-igreja-nao-tardou-em-
condenar-o-liberalismo> 
 
	A Igreja não tardou em condenar o Liberalismo

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