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Rebeca Fogaça Porto 
 
 
 
A MÚSICA NA FORMAÇÃO DO MUSICOTERAPEUTA 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Faculdades Metropolitanas Unidas 
 
FMU 
 
2007 
 
 
 
Rebeca Fogaça Porto 
 
 
 
A MÚSICA NA FORMAÇÃO DO MUSICOTERAPEUTA 
 
 
 
 
 
 
Trabalho apresentado para a 
Conclusão de Curso sob a 
orientação da Profa Mestre 
Maristela Pires da Cruz Smith. 
 
 
Faculdades Metropolitanas Unidas 
 
FMU 
 
2007 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Para Marili Macruz, Cláudia 
Maradei Freixedas e Mara 
Campos, mestras queridas, 
mulheres sensacionais. 
À minha madrinha, Carin 
Zwilling, companheira de 
todas as horas. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
“Eu não quero ouvir as notas. 
Quero ouvir o espírito. Ele está 
dentro de vocês, não na 
música”. 
 Arturo Toscanini (1867-1957) 
 
AGRADECIMENTOS 
 
Expresso meus sinceros agradecimentos à minha orientadora, Maristela Pires da Cruz 
Smith. 
Aos meus amigos, pela amizade e pelo carinho, mesmo quando eu não estava disponível 
para estar junto com eles – eles estiveram comigo. 
Aos meus pais, Maria José Fogaça e Renato Carlos Porto, que me alimentam de música 
desde que vim à luz. 
Ao meu tio Mario Xavier Rabello Júnior, pela ajuda na formatação desta monografia. 
À minha madrinha Carin Zwilling, pela querida presença, pelo carinho e apoio 
incondicional. 
À Marili Macruz Ferreira da Silva, pelo alimento musical nos primeiros anos de minha 
formação pianística e musical. 
À Cláudia Maradei Freixedas, pelas valiosas aulas de conjunto de flauta-doce, 
preparando-me para tocar em grupo e descobrir quão maravilhoso é estar conectada a mais 
pessoas e a fazer um trabalho de qualidade. 
À Mara Campos, pela inesquecível experiência no Coral Infanto-Juvenil, na Escola 
Municipal de Música, à qual dedico o presente trabalho. 
À Sabrina Sanches Martins, por seu afeto incondicional e pela presença querida. 
Ao amigo João Carlos Macruz, pelo apoio e pelo carinho, me ajudando a encontrar as 
músicas para um momento difícil de minha vida, durante a formação acadêmica. 
Aos profissionais da área de musicoterapia que forneceram seus depoimentos, 
enriquecendo, com o relato da própria experiência, o presente trabalho. 
A todos os meus pacientes, de ontem, de hoje e de amanhã, por suas valiosas 
contribuições no meu crescimento profissional e pessoal. 
A todos os professores que contribuíram para o enriquecimento do trabalho. 
A minha família, sempre presente. 
Muito obrigada a todos! 
 
 
 
 
 
 
RESUMO 
 
O presente trabalho tem por objetivo enfatizar a importância da música na formação do 
musicoterapeuta, uma vez que este utiliza seus elementos – som, ritmo, melodia e harmonia, para 
facilitar e promover o processo de comunicação, relação, aprendizagem, mobilização, expressão, 
organização e outros objetivos terapêuticos relevantes. A música é a relação entre os sons e não o 
próprio som. Compreender e fazer música é, primeiro, ser dotado da faculdade de perceber 
intervalos e de estabelecer intervalos entre eles. Ouvir, escutar a música não basta, 
evidentemente, para despertar o senso musical. É necessário que ao menos uma vez a música e o 
ato de fazê-la tenham suscitado uma forte emoção psíquica, uma tensão motora decisiva em todo 
ser.E a condição necessária para tanto é precisamente fazer música. E para fazer música com seu 
paciente, o musicoterapeuta necessita de conhecimentos musicais que o tornem hábil a criar, a 
improvisar, a acompanhar e a interagir com ele no fazer musical. 
 
 
ABSTRACT 
 
 
This work has the objective to stress the importance of music on musictheraphyst 
background, now and them that he or she makes use of it’s elements – sound, rhythm, melody and 
harmony, to facilitate and foment the process of communication, relationship, apprenticeship, 
mobilizing, expression, organization and other relevant therapeutic objectives. Music is the 
relationship between sounds, not the sound itself. Comprehending and making music is first be 
endowed of faculty to perceive intervals and found intervals between them. To hear and listen 
music is not enough, evidently, to arouse music sense. Its necessary that once in a while music 
and making music had aroused a strong psychological emotion, a stretched motive decisive in all 
of the self. And the necessary condition for that is exactly making music. And for making music 
with your patient, the musictheraphyst needs music knowledge that make him able to create, to 
improvise, to go along with and to join with him on making music. 
 
LISTA DE FIGURAS 
 
 
Sessão musicoterápica com paciente com Transtorno de Linguagem.............................. 6 
Sessão musicoterápica com pacientes portadores de Síndrome de Down........................ 33 
Número Correspondente de Figuras Musicais.................................................................. 53 
Partitura Tradicional......................................................................................................... 55 
Partitura não-convencional............................................................................................... 56 
Sessão musicoterápica com criança portadora de paralisia cerebral................................. 71 
Setting musicoterápico...................................................................................................... 77 
Alunos em aula de música, na Escola Lourenço Castanho............................................... 80 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
ÍNDICE 
 
PREFÁCIO...................................................................................................................................... 1 
INTRODUÇÃO............................................................................................................................... 2 
1. OUVIR ATIVO: OUVINDO A MÚSICA.............................................................................. 6 
2. A MÚSICA E A MEDICINA EM DIFERENTES CONTEXTOS DA HISTÓRIA ............ 16 
3. O CONCEITO DE MÚSICA EM MUSICOTERAPIA........................................................ 19 
4. FORMAÇÃO MUSICAL DO MUSICOTERAPEUTA....................................................... 36 
5. A MÚSICA NO CONTEXTO CLÍNICO ............................................................................. 57 
6. A IMPROVISAÇÃO MUSICAL DO MUSICOTERAPEUTA ........................................... 73 
CONCLUSÃO............................................................................................................................... 84 
EPÍLOGO ...................................................................................................................................... 86 
REFERÊNCIAS ............................................................................................................................ 87 
ANEXO ......................................................................................................................................... 90 
 
 
 
 
1 
PREFÁCIO 
 
Uma vez ouvi uma história que ilustrou o poder que a música tem sobre os seres humanos 
e a natureza1. 
Havia um jovem indígena, que era muito feio; entretanto, tocava flauta tão lindamente, 
que todas as mulheres da aldeia logo se apaixonaram por ele. Mas só uma era correspondida. O 
casal apaixonado logo quis marcar a data do casamento. 
Um dia, porém, o jovem saiu para caçar. Sua noiva, percebendo sua demora,começou a 
ficar apreensiva, e foi em busca do amado. Encontrou-o morto, ao lado do lago – ele havia sido 
mordido por uma cobra. 
A moça chorou sua dor – tão grande era seu pesar, que todos os dias ela ia ao local, chorar 
pelo noivo. 
Vendo a grande tristeza da noiva, o jovem pediu a Tupã que fizesse algo para minorar o 
sofrimento de sua amada. Tupã então criou um pássaro que, apesar de feio, tinha o mais belo 
canto, - tão belo, que todos que o ouvissem ficariam apaixonados: homens, mulheres, crianças, os 
animais do céu e da terra. 
E foi assim que o uirapuru passou a ser a alegria de todos os seres vivos daquela aldeia. 
É com essa história que eu inicio e justifico este trabalho: nós, musicoterapeutas, através 
da nossa ferramenta de trabalho – a música – podemos fazer o amor florescer nos corações 
daqueles que nos procuram, tornando-nos verdadeiros uirapurus, tornando mais alegre a vida 
daqueles que nos procuram, ajudando-os a se tornarem pessoas mais saudáveis, autoconfiantes e 
criativas. 
 
 
 
 
1 Tive oportunidade de ouvir essa história em um curso que do qual participei, de 1o a quatro de maio de 
2003, cujo tema era “Imaginar, criar, expressar”- desenvolvendo a arte de contar histórias”, ministrado por Mônica 
Rosales e Izildinha Carvalho. 
 
2 
 
INTRODUÇÃO 
 
No início era o caos e o som. Um mundo incógnito intrigava o homem, munido 
de sentidos e da inteligência. Partindo da percepção decontínua, o homem 
começou a criar ordenações, mitologias e rituais, que aplacassem um pouco a sua 
incompreensão e desproteção frente a natureza que ora o acalentava, ora o 
aterrorizava. Criando seus símbolos, pôde expressar valores e expressar a 
realidade vivida (...). (MILLECCO, BRANDÃO e MILLECO FILHO, p. 3). 
 
A música constitui ferramenta interdisciplinar necessária à construção do conhecimento. 
Graças a ela a história consegue estabelecer uma relação entre Beethoven e Iluminismo, Wagner 
e Schopenhauer, forma-sonata e Eisenstein, sistema tonal e racionalismo, Stravinsky e Bérgson 
(tempo duração e tempo espaço), Eisler e a música ideologicamente comprometida, tornando 
sedutora a descoberta de que existe música na história, na pintura, poesia, ciência, e assim por 
diante. Mesmo a psicanálise encontra em certa medida um interlocutor na música em razão de 
que esta favorece a constituição de uma dialética da alteridade por meio da inscrição da pulsão no 
campo da cultura. 
A música pode originar-se nos expressivos sons vocais, os quais são importantes na 
manutenção da relação mãe-bebê e pode vir a representar uma forma não-verbal ou pré-verbal 
relacionada com a infância. 
Em tempos antigos, existiam nas tribos as “músicas de cura” executadas por pajés ou 
xamãs para afastar os espíritos que causavam as enfermidades. Existe este procedimento ainda 
hoje nas pajelanças das tribos indígenas do Brasil. Como essas músicas serviam de comunicação 
com os espíritos causadores das enfermidades, também atingiam outro aspecto, o próprio 
paciente, produzindo efeitos catárticos ou psicológicos que auxiliavam na cura. 
Os gregos procuravam, através de um saber racional, reflexivo, conhecer a essência de 
todas as coisas. Os primeiros filósofos procuravam encontrar os elementos que constituíam a 
natureza do homem. A doença consistia no desequilíbrio destes elementos – como, por exemplo, 
o frio e o calor – que deveriam ser reequilibrados, para o retorno da saúde do ser humano. Nesse 
processo de equilíbrio, a música, por ser a ordenação e a harmonia dos sons, provocava tanto a 
3 
depuração catártica das emoções como a de enriquecer a mente e dominar as emoções através de 
melodias que levam ao êxtase. 
O poder da música para a concentração e para a manipulação das emoções humanas não 
está interessando apenas os músicos e estudiosos da música – psicólogos, produtores de cinema e 
políticos também se interessam por esses novos campos, como meio para atingir os seus 
objetivos. 
Todas as tarefas e movimentos do cotidiano têm seu ritmo – os ritmos circadianos: 
levantar, tomar café, andar, correr; estes ritmos têm de estar em sintonia com nosso ritmo interno 
– o metabolismo, o batimento cardíaco, a circulação. O exterior reflete o interior. 
O ritmo é ação e movimento em ondas de expansão e contração – inspiração e expiração – 
pontuadas no tempo (longas, curtas), que se repetem e se diferenciam, criando uma ordem e 
coerência, uma continuidade e vida, tendo como guia um pulso. Dá energia ao corpo e faz vibrar 
a alma de entusiasmo e alegria, que se potencializam no indivíduo e no grupo. Trabalha o 
impulso volitivo, a presença de espírito, a coordenação motora, a segurança individual e a 
integração social. Estabelece uma linguagem que facilita a comunicação; desperta a sensação de 
união, força e liberdade. 
A melodia é movimento no espaço. Os tons flutuam nas diversas alturas criando imagens 
e pensamentos; reverberam nos sentimentos acordando as memórias do passado. A melodia 
desperta a atividade de reflexão interior reconhecendo os tons na sua essência; promove a 
expressão de gestos significativos repletos de conteúdo, que se tornam linguagem. Em cada 
melodia movem-se forças que tecem fios de pensamentos, que são experimentados no próprio 
movimento. Assim como o pensar é a corrente estruturadora da organização humana, o elemento 
melódico é o princípio ordenador na música, pois em cada elemento da música se revelam 
movimentos interiores plenos de conteúdo. Essa experiência nos é proporcionada pela audição. 
A harmonia concentra os elementos melódicos em acordes, como pensamentos 
condensados que se tornam emoções. Ela abarca o elemento rítmico dando-lhe sentido no seu 
percurso, através das modulações. A harmonia aproxima melodia e ritmo promovendo um 
diálogo entre eles, aprofundando a estrutura e o conteúdo musical, apoiando-se no sentir, 
vibrando e transformando estruturas emocionais. Finalmente, a harmonia integra o ser homem 
com o ser música. 
4 
Pretendo dissertar sobre a importância da consciência do musicoterapeuta acerca dessas 
propriedades – ritmo, melodia e harmonia – consciência que deve ser desenvolvida durante sua 
formação ou, se for o caso, antes mesmo desta. A música é a principal ferramenta de trabalho do 
musicoterapeuta, que deve ter conhecimentos musicais suficientes para ajudar o paciente na 
busca de suas questões. 
A produção e introdução da música numa sessão terapêutica facilitam a terapia 
considerando que ajuda o paciente a ter um foco interno, que promove estrutura e o faz crescer 
emocionalmente. A música é um mecanismo que permite ao indivíduo se auto-explorar através 
de meios não-verbais. Na prática, o paciente apresenta uma idéia musical que o musicoterapeuta 
apóia, ajudando o paciente a desenvolvê-la e organizá-la; o terapeuta aceita o que é apresentado e 
não altera ou não tenta mudar isto para que o paciente possa reconhecer a sua produção. 
 
A Musicoterapia é o campo da medicina que estuda o complexo som-ser humano-som, para utilizar 
o movimento, o som e a música, com o objetivo de abrir canais de comunicação no ser humano, 
para produzir efeitos terapêuticos, psicoprofiláticos e de reabilitação no mesmo e na sociedade. 
(BENENZON, 1988). 
 
Esta definição tem logo após a definição do conceito de música, limitando-se a um mundo 
de fenômenos acústicos e de movimento, que envolvem e tornam possível o fenômeno musical. 
A música é arte e ciência, elementos estes que correspondem a um processo evolutivo do ser 
humano. 
Voltando ao conceito de Musicoterapia uma vez esclarecida a limitação da parte de 
música, observa-se alguns aspectos do outro componente – a terapia. 
Estapalavra vem do grego, therapéia,2 que quer dizer: “servir; parte da medicina os 
preceitos e remédios para o tratamento e cura das enfermidades”. Portanto, é o momento de dizer 
que a Musicoterapia, segundo a própria palavra, tem como objetivo fundamental à terapia. 
Este conceito, talvez simplista, tem por objetivo valorizar o aspecto terapêutico sobre o 
musical. 
Se a musicoterapia é definida como um campo da medicina, conceituemos a medicina. 
Medicina vem do latim e significa: “ciência e arte de precaver e de curar enfermidades”. 
O objetivo da Musicoterapia, no campo da medicina, é universal, com contribuição ao 
desenvolvimento do ser humano como totalidade indivisível e única. 
 
2 Termo citado por J. C. RIBAS, Música e Medicina. EDIGRAF, São Paulo, 1957 
5 
O ser humano não pode ser separado por partes – corpo e mente, psique e soma, matéria e 
espírito, pois ele é todo; a Musicoterapia é o campo que mais se dirige à totalidade do ser 
humano. 
Atualmente o campo da medicina é arado por diversos profissionais e especialistas que 
são formados em medicina, mas que, sem dúvida, contribuem no sentido de treinar, reabilitar e 
recuperar o indivíduo enfermo ou incapacitado. São os educadores, técnicos, psicólogos e 
paramédicos, como os musicoterapeutas. 
Observando as palestras de musicoterapeutas diversos, comecei a sentir falta de um 
sentido para a música. Muitos recorriam aos educadores musicais para suplantar suas dúvidas, e 
eu sempre me perguntava – se o musicoterapeuta não domina certas questões da área musical, por 
que não aprimorar-se? Por que não reconhecer que um educador musical pode auxiliar seu 
trabalho, se este encontra dificuldade para realizar determinados procedimentos musicais? Assim, 
como divulgamos nossa área, nossa especificidade, querendo mostrar, por exemplo, nossa 
diferença em relação ao educador musical, por que não chamar esse mesmo educador para 
auxiliar-nos quando as dúvidas aparecem? Foi a partir daí que concebi a idéia do presente 
trabalho. 
O musicoterapeuta utiliza propriedades musicais – som, ritmo, melodia e harmonia, com 
um dado objetivo, a fim de criar canais de comunicação com seu(s) paciente(s). O 
musicoterapeuta fica entre a formação tradicional – erudita – para o domínio dos conceitos de 
teoria musical, com a finalidade de acompanhar musicalmente o paciente, realizar o registro 
musical das sessões, imprescindíveis nos relatórios, ou uma liberdade para criar a partir da sua 
própria musicalidade, tão necessária para lidar com a demanda do paciente. Qual seria o ideal na 
formação musical do musicoterapeuta? 
Este trabalho tem por objetivo pesquisar o nível da formação dos profissionais e 
estudantes de musicoterapia, levantar a bibliografia, com autores de diferentes correntes de 
pensamento; fundamentar os primeiros elementos musicais, teóricos, para que o musicoterapeuta 
possa dar continuidade ao processo e ser capaz de registrá-los. 
O musicoterapeuta que domina os elementos musicais tem facilidade para registrar 
passagens musicais de um processo facilidade para criar a partir dos seus próprios conhecimentos 
musicais. 
6 
Pergunta-se: onde estão os limites desse campo e quem são os que os exercem? Onde está 
situado o musicoterapeuta? 
 
 
1. OUVIR ATIVO: OUVINDO A MÚSICA 
 
Não é suficiente ter ouvidos para poder escutar. Colocar-se à escuta consiste em responder 
a um apelo de forma deliberada. 
A escuta é uma capacidade específica que se utiliza preferencialmente do ouvido a fim de 
integrar, graças a ele, mensagens sonoras, entre as quais inscreve-se a música. 
 
O homem evoluído caminha em direção à escuta. Não se trata de uma visão puramente 
metafísica, mas de uma realidade concreta que dá ao ouvido sua razão de ser e à música o 
sentido de sua existência. Pensando bem, o ouvido é na verdade uma antena aberta para a 
comunicação, no sentido mais amplo do termo. Ele está longe de se limitar simplesmente 
ao órgão anatômico, como costumamos pensar. Ele pode chegar a transformar o homem, 
visto como um todo, em um ouvido (TOMATIS; JACCQUES, 1991). 
 
O musicoterapeuta precisa estar atento às sutilezas que o som ou a música traz – seja a 
música trazida pelo paciente, seja a música que escolherá para a sessão. Segundo QUEIROZ 
(2002), cada tipo de ouvinte responde à música a partir de uma diferente reação, que pode ser 
motora-instintiva (ou física), emocional e mental; cada uma delas podendo ocorrer de modo ativo 
/ interativo, resultando seis tipos básicos de ouvintes, isto é, seis tipos básicos de reação à música: 
Física: - Receptiva = Fisiológica- reações orgânicas (involuntárias, como dor, alteração 
do batimento cardiaco, calor, tontura); 
 Interativa = Cinestésica – reação por movimentos do corpo (voluntários ou quase 
reflexos, como palmas, batida de pé); 
 Emocional: - Receptiva = Sensitiva – reação pela exacerbação de sentimentos ou da 
memória emocional; 
 - Interativa = Imaginativa – reação pela criação de imagens (fantasia imaginativa 
pictórica ou simbólica); 
7 
Intelectual: - Receptiva = Associativa – reação por associação de qualidades (músicas 
doces, violentas, alegres, nobres, misteriosas); 
 Interativa = Analítica – reação por raciocínio avaliador (o pensamento crítico, raciocínio 
por comparação técnica, avaliação lógica). 
O autor procura ressaltar esses três níveis – fisiológico, emocional e intelectual, pois as 
três funções são atuantes em todo ser humano. Porém, é a função preponderante que define a 
“reação fundamental” ou “tipo de ouvinte”. No final, os três níveis interagem de tal modo que, 
sem uma avaliação acurada, parece que todas as pessoas reagem à música física, emocional e 
intelectualmente, sem qualquer distinção ou ênfase entre os níveis de reação (QUEIROZ, 2002). 
O receptor – seja o paciente que ouve a música ou o musicoterapeuta que escuta a 
improvisação do paciente – deve estar atento às suas reações em relação à audição, para que haja 
maior clareza na hora de pontuar ao paciente o que foi observado e mesmo no preenchimento do 
relatório. 
 
 
 
 
 
 
 
Fonte: SMITH, M. – Preparo do setting musicoterápico para início de sessão. Clínica de Musicoterapia da FMU, 
2006. I álbum (08 foto): color; 10,0x7,5 cm. 
8 
 
 
Segundo os estudos de Pierre Schaeffer (1991) no Tratado dos Objetos Musicais, os 
modos de escuta se dariam do seguinte modo: 
Ouvir – ouvir o que é apresentado à percepção (passivo). Ouve-se o que se passa, sem se 
dirigir necessariamente ao fato, apesar desse fato poder estar influenciando o indivíduo de 
diversas formas; 
Escutar – dar-se conta, dirigir a escuta (ativo). Há um direcionamento ao objeto, uma 
busca de identificação, escutando o que é interessante; 
Entender – é intencional; o que é apresentado dá-se em função da intenção de quem ouve; 
Compreender – há a atribuição de significados, efetuando-se relações que podem não 
estar diretamente ligadas às características do objeto (BARANOW, apud. SCHAEFFER, 2002). 
O ouvir e o escutar são a realidade concreta e estão ligadas à escuta natural, na qual o som 
informa sobre o acontecimento que o gerou; e o entender e compreender são valores abstratos, 
ligados à escuta cultural. 
A música, segundo BARANOW (2002), não é só conduzida pela escuta, em suas infinitas 
interações, mas a música contemporânea orienta para uma significação e impele o indivíduo, no 
mínimo, a “escutar”. 
 A audição está presente desde a vida intra-uterina e, segundo WROBEL (2002)3, temos a 
primeira etapado ritornello, ou seja, o caos, a escuridão: o feto no útero materno, as primeiras 
sensações, os primeiros registros auditivos. Desde essa fase, passando pelo nascimento e pela 
primeira infância, os sons já estão sendo registrados e armazenados na memória auditiva do 
pequeno ser. A primeira etapa do ritornello corresponde à vivência do feto e do bebê, suas 
impressões sonoras nesse período mergulhado na escuridão, em que as cantigas de ninar e o 
balanço corporal da mãe cumprem o papel de ajudar a iluminar o caminho da vida. À medida que 
o bebê cresce, começa a repetir o que ouve, ocorrendo a aprendizagem natural, espontânea, 
imitativa, que caracteriza a primeira infância. Conforme relata a professora de música Berenice 
Guedes Mussnich (2000), em seu artigo Vivências Musicais: 
 
 
3 WROBEL, V.B. Acerca do Ritornello e Musicalização Infantil. Revista Brasileira de Musicoterapia, Ano V, 
Número 6, 2002. 
9 
(...) Constatei e confirmei, conforme havia observado nos meus filhos, que o bebê desde que 
nasce realiza naturalmente exercícios musicais que podem e devem ser estimulados pelas 
pessoas que o rodeiam e que são preciosos para o desenvolvimento afetivo, da fala, bem como 
os desenvolvimentos psicológico e psicomotor. A construção do seu lugar no espaço no tempo 
é ligada a sua escuta, percepção do tempo e memória dos timbres e das entonações que 
remontam a vida intra-uterina. Tudo para ele é música, especialmente a voz de sua mãe e das 
pessoas que o rodeiam. Indiscutíveis contribuições possuem as Cantigas de Ninar, 
especialmente aquelas entoadas pelas mães, sem preocupação maior do que a emoção 
compartilhada. Essa emoção ( comunicação pré-verbal) permite um contato que só pode ser 
veiculado pela Cantiga de Ninar que é relacionada com o espaço transicional por Winnicott e 
que, segundo Alicia Fernandez, é o mesmo da aprendizagem. 4 
 
 
Seria maravilhoso que todos pudessem ter essa experiência, da mãe ou do pai cantarolar 
uma melodia para seu bebê. Infelizmente, nem sempre isso é possível: numa sociedade como a 
que vivemos, em que o grau de ansiedade com o tempo mantém-se constantemente elevado, os 
contatos básicos e intuitivos – como o de despender meia hora para cantarolar uma melodia para 
um bebê – são praticas que tendem a ser alijada dia-a-dia. Muitas vezes, as mães nem sequer 
dispõem de um repertório para cantarolar. O aprendizado natural de canções que passavam de 
pais para filhos há muito já foi interrompido. Então, cantar o quê? Como cantar? Quais melodias 
e quais letras? Mais do que isso – o que ouvir? O que foi que ouvimos? O que ouvimos no dia-a-
dia? 
O mercado de consumo não perde tempo e oferece suas respostas: CDs contendo músicas 
delicadas, muitos com sons de caixinha de música que reproduzem trechos do repertório clássico 
europeu, até mesmo fitas de vídeo para entreter bebês “de zero a quatro anos!” Um bebê precisa 
do toque, do olhar, do cuidado de outras pessoas! Podemos observar que as palavras “cantar” e 
“encantar” têm a mesma raiz – e é isso que deve acontecer quando cantamos para os bebês: um 
verdadeiro ritual de encantamento. 
Não só para os bebês, mas também para pacientes adultos que precisam ser embalados, 
que precisam desse encantamento, precisam ouvir a voz amiga que canta e encanta, que acolhe e 
que está ali junto dele. 
Mas, primeiro, o que ouvimos? Como ouvimos? Como reproduzimos aquilo que 
ouvimos? Como um musicoterapeuta deveria ouvir? 
Acredito que a resposta está no silêncio. Buscar no silêncio o próprio encantamento, ouvir 
o canto interno e reproduzí-lo. Basta ouvir e sentir. 
 
4 MUSSNICH, B.G. Vivências Musicais, In: http://www.psicopedagogia.com.br/artigo.asp?entrID=33 
 
10 
 
 
1.1. O Silêncio 
O som não existe no vácuo. Sendo onda de pressão, necessita de um meio material para 
propagar-se.No entanto, a ausência de som, o silêncio, em grau absoluto, parece produzir em 
qualquer indivíduo a mesma sensação que produziu em Pascal: 
“O silêncio dos espaços infinitos me assusta” 5. 
 
Na verdade, a cultura do Ocidente parece rejeitar o silêncio, atribuindo-lhe um caráter 
negativo, pois, em ultima instância, “o silêncio é a morte” (VALENTE, apud. SCHAFER, 1991). 
Como recurso para superar a morte, o homem constrói sua própria paisagem sonora circundante. 
Para o compositor de hoje, o silêncio é primordial, porque ele está se perdendo na 
paisagem sonora.Assim sendo, o silêncio é matéria-prima da música. 
No tratamento de pacientes em coma, o musicoterapeuta se encontra as possibilidades e 
limites musicoterápicos, coloca-se em posição de escuta da dinâmica familiar, o uso da 
estimulação direta com o (a) paciente e a dinâmica de comunicação dos familiares com o 
paciente. 
O Porta-voz Sonoro Musical é aquele familiar ou amigo que fala sobre o paciente, que 
pode ajudar nos dados sonoro-musicais e dados fundamentais, tais como a causa do coma, 
tempo, acesso aos médicos para obter informações médicas. Muitas vezes ele pode falar 
do silêncio, mas não pode falar com o silêncio e em silêncio. Este referencial não é 
estático, e o porta-voz sonoro-musical também pode ser um comunicador. Cabe ao 
musicoterapeuta uma escuta bastante atenta. 
O Comunicador do Silêncio é possuidor de uma dinâmica de comunicação global – voz, 
olhar, corpo, tato, escuta, percepção, som, intuição – o comunicador escuta o silêncio e se 
comunica com ele, vivendo o grito do silêncio, sem se deixar ensurdecer ou emudecer. 
(COELHO, 1999)6. 
 
Já dizia um ditado: o silêncio é de ouro. O silêncio é, na verdade, um recipiente dentro do 
qual é colocado um evento musical. O silêncio protege o evento musical contra o ruído. Os 
eventos musicais precisam desta proteção, por serem acontecimentos sensíveis. Assim, sendo, o 
silêncio é a característica mais cheia de possibilidade da música. Mesmo quando cai depois de 
 
5 SCHAFER, M. – Apud Blaise PASCAL. 
 
6 COELHO, L. A Escuta do Silêncio: atendimento de pacientes em coma. I Fórum Paulista de Musicoterapia, 1999. 
11 
um som, reverbera com o que foi esse som e essa reverberação continua até que outro som o 
desaloje ou ele se perca na memória. Logo, mesmo indistintamente, o silêncio soa. 
 
O homem gosta de fazer sons e rodear-se com eles. Silêncio é o resultado da rejeição da 
personalidade humana. O homem teme a ausência de som como teme a ausência de vida. 
(SCHAFER, 1991, p. 71). 
 
Assim sendo, ouçamos o silêncio, deixemos que ele soe, para que a música possa existir 
dentro de nós mesmos! 
 
 
1.2. A Melodia 
Uma melodia é como levar um som a um passeio. O movimento sonoro das canções que 
ouvimos nos leva a algum lugar na qual, freqüentemente, já estivemos ou gostaríamos de estar. 
Para obter uma melodia, é preciso movimentar o som em diferentes altitudes 
(freqüências). Uma melodia pode ser qualquer combinação de sons. 
O que faz uma boa melodia? Os livros teóricos trazem sempre muitas regras e quase 
sempre são aplicadas. Nossos ouvidos também estão adequados a esse sistema, pois a audição 
torna-se agradável. Eis as regras mais importantes: 
 
- Quase todas as notas da melodia deverão ser escolhidas da escala de sete notas na qual se 
baseia essa melodia. Quando qualquer das cinco notas são utilizadas devem, em geral, 
aparecer em posições não acentuadas, sem ênfase, de modo a não prejudicarem a 
harmonia prevalecente. 
- Na maioria, as notas de uma melodia devem ser notas de uma escala adjacente.Os saltos 
devem ser poucos, e os grandes saltos, raros. 
- Para fugir da monotonia, as notas individuais não deverão ser excessivamente repetidas, 
sobretudo em posições enfatizadasna melodia. 
- As resoluções harmônicas, como as cadências, devem ocorrer em pontos de estresse 
rítmico numa melodia. 
- Da mesma forma, as acentuações rítmicas devem realçar o contorno da melodia. 
Mudanças de direção melódica devem, de modo geral, cair em articulações ritmicamente 
importantes. 
12 
- A melodia deve ter apenas um exemplo do seu tom mais alto e, de preferência, também 
do mais baixo. 
- Os saltos devem sempre aterrissar num dos sete tons da escala, não num dos cinco tons 
cromáticos. O ouvido sempre escuta um salto de forma enfatizada ( isto é – o cérebro é 
mais atento aos saltos, pois eles definem as fronteiras das submelodias); então, saltar para 
um tom cromático viola a regra que diz que não se deve jamais enfatizar esses tons. 
- Inversamente, uma melodia não deve nunca saltar de um tom cromático. A dissonância de 
um tom cromático cria uma tensão que precisa ser resolvida. Mas os saltos aumentam a 
tensão e, assim, contradizem essa necessidade. 
 
O sistema tonal ocidental estava colonizado por todo o globo, quando alguns musicólogos 
alegaram que esse mesmo sistema está esgotado. Depois de séculos de experimentação, os 
compositores todas as relações úteis que nossos sistemas de escala tem para oferecer – da 
Bachiana à escala de microtons. 
Cabe aos musicoterapeutas estarem abertos para ouvi-las. 
 
1.3. Sobre o Ruído 
O ruído é definido como qualquer som indesejado. Esta definição, entretanto, faz de 
“ruído” um termo relativo; porém nos dá a flexibilidade de que necessitamos quando os referimos 
ao som. O trânsito do lado de fora da sala de concerto atrapalha a música – isto é ruído. Porém, 
contextualizando o ruído à música, como fez John Cage – as portas foram escancaradas e o 
público foi informado de que o trânsito fazia parte da peça – os sons deixaram de ser ruídos 
(SCHAFER, p. 138). 
Ao compreender o desenho da paisagem sonora como um desafio composicional que 
envolve a todos, e ao aproximar ouvinte e ambiente sonoro pela escuta, o autor reforçou a 
possibilidade estética, tão bem defendida pelo compositor norte-americano John Cage. Sob tal 
perspectiva, as fronteiras entre música e não-música e o papel da escuta como algo que constrói e 
se constrói na própria música, e vice-versa, começam a habitar uma certa “zona de 
indiscernibilidade”(...). (SANTOS, p. 96). 
 
13 
Quem se dispuser a escutar o som real do mundo, hoje, e toda a série dos ruídos em série que há 
nele, vai ouvir uma polifonia de simultaneidades que está perto do ininteligível e insuportável. Não 
só pela quantidade de coisas que soam, pelo índice entrópico que parece acompanhar cada som 
com uma partícula de tédio, como por não se saber mais qual é o registro da escuta, a relação 
produtiva que a escuta estabelece com a música (WISNIK, p. 53). 
 
Correndo por fora da tradição da música erudita, músicas populares continuaram a fazer 
os seus sons, que se misturaram em democráticas mixagens e assumiram lugares singulares na 
modernidade. O imã da música puxa agora de novo para o questionamento e a criação sobre o 
pulso, o tempo, o ritmo. Essas músicas devem ser relidas ou escutadas em nova situação. Elas 
fazem parte do processo de codificação das relações entre som, ruído e silêncio como modos de 
admitir fases e defasagens, de trabalhar sobre o caráter simultaneamente rítmico e arrítmico do 
mundo (grifo do autor). Ali, no pulso do pulso, pode estar se formulando uma outra coisa, para a 
qual é preciso produzir uma escuta correspondente. É preciso dizer também que, em todo esse 
processo, a canção (ou certa linha de canções) funciona como um verdadeiro equilibrador 
ecológico: as canções são a reserva de oxigenação da música e do mundo simbólico. 
A música tornou-se sincrônica, simultânea. A sincronicidade ultrapassou os campos de 
produção em que ela se dividia. É preciso que a reflexão sobre música dê conta dessa 
simultaneidade e seja capaz de ver situações novas. 
 
(...) O fato de ouvirmos os ruídos ambientais dentro de um contexto musical tende a transformar 
nossos hábitos de escuta em relação a esses sons, possibilitando uma escuta musical do nosso 
cotidiano sonoro. Uma outra noção de música começa a se delinear, confundindo-se com a de 
“paisagem sonora”.(SANTOS, p. 55). 
 
 
Uma possível distinção entre música e ruído, as possibilidades diferenciadas entre 
fenômeno acústico e fenômeno acústico/musical e as qualidades inerentes a cada plano, 
ZUCKERKANDL (1973) ainda argumenta: 
 
(... ) os tons transcendem a sensação auditiva de dentro do audível, uma transcendência interior. 
Diferente de sons não musicais que vão para um audível além. Neste ultimo caso, o fenômeno 
acústico transforma-se em música. Neste ponto, o escopo e a dimensão da própria audição 
transborda, ouvir já não está mais confinado a estímulos externos, é mais do que tom e ainda tom, é 
mais do que audição e ainda audição (BRABO, apud. ZUCKERKANDL, 1973). 
 
 
Com esses argumentos, podem-se relacionar os modos de audição musical (sensorial e 
intelectual) em dois planos: a audição sensorial, atuando como reforçador da experiência acústica 
14 
no plano concreto, que se mantém na superficialidade estrutural, e a audição intelectual, atuando 
como fator facilitador da experiência abstrata, a partir da acústica, possibilitando uma imersão 
estrutural7. 
 
 
1.4. Considerações acerca da escuta musical 
Quando falamos de música sempre atrelamos tal idéia a presença do som. A música dá-se 
na forma de sons. A formulação é tão precisa que não questionamos nós mesmos sobre isso. 
Empenhamo-nos em pesquisas musicais e sonoras, mapeando os significados dos sons ou 
maravilhando-se sobre como tais significados se dão, visto que não aprendemos a música como 
aprendemos nossa linguagem verbal – associando sons específicos à significados específicos. 
A música é feita de sons. Que sons? Sons musicais. E o que são sons musicais? São sons 
que estão presentes na música. Então a música é feita de sons presentes na música, e a roda da 
tautologia gira sem fim enevoando qualquer pensamento a respeito da música que não coloque 
em questão a própria noção de música (FERRAZ, 1999). 
O som é um tipo de perturbação, uma vez que se pode ouvir através da imaginação ou 
mesmo sonhando com um som. Ao dizer “ouço um som”, estamos apenas nos valendo de um 
artifício consensual para compartilhar alguns tipos de perturbações, e mesmo este quadro de 
perturbações pode ser ampliado, - ele não se dá independentemente das estruturas e histórias de 
escuta de cada indivíduo. 
A música é um dos espaços de escuta possíveis. E é importante lembrar que, neste caso, a 
escuta musical não fala apenas daquilo que foi disparado pelo som, mas daquilo que foi disparado 
pela idéia de música. É da idéia de música que passamos a falar. Podemos imaginar uma música, 
podemos nos lembrar de uma música ou sonhar com uma música. Alguém poderia nos dizer algo 
como – “calma, você está se referindo a um som imaginado”.Não, não estaríamos nos referindo a 
um som imaginado, pois o objeto da música não é o som, mas a própria música – basta tentarmos 
agora lembrar e imaginar o som do fagote, o som da voz de Elis Regina, ou o som da harpa. Ao 
falar de uma escuta musical temos um território especifico de agenciamento que não se dá apenas 
na forma de blocos de som e silêncio, mas na forma de blocos de pensamento e duração, e uma 
 
7 BRABO, R. – Audição Musical e Respostas a Dilemas Morais. São Caetano do Sul, 2003. 
15 
série de intensidades – ora nomináveis, ora não – cujo objeto não é o som, mas qualidade da 
sensação musical. 
A escuta musical não é assim um terreno a priori que se delimite para solucionarquestões 
sonoras, mas um território que se define pelo próprio ato de escuta musical – escuta essa que não 
necessariamente necessitou da presença do som, a ponto de podermos afirmar – e por que não? – 
que o surdo pode ouvir (FERRAZ, p.35). 
Houve um processo de configuração em que a noção de musicalidade fez-se ao mesmo 
tempo em que se fez à escuta em que o sujeito distingue-se como observador. A música em si não 
comunica, ela é um espaço de comunicações possíveis e, se o receptor a quiser, senão ela não 
comunica nada. Ela é sempre um espaço de escutas possíveis, mesmo que alguém não a queira 
ouvir. 
Conforme FERRAZ (1999, p.36): 
 
(...) Valendo por mim lembrar que potencializar a comunicabilidade da música significa 
antes potencializar uma cadeia de significantes e significados que serão a princípio 
compartilhados pela linguagem verbal, uma interação musical que seja experienciada 
como tal por demais sujeitos a ponto de compartilharem também seus sinificados. 
 
De um modo geral, a atitude do homem ante a música parece estar diretamente 
relacionada aos sons ambientais de seu tempo e, sob essa perspectiva, não podemos deixar de 
observar as mudanças radicais no pensamento musical do século XX. 
16 
2. A MÚSICA E A MEDICINA EM DIFERENTES CONTEXTOS DA 
HISTÓRIA 
Em virtude da precariedade de inibição e de maturidade propriamente intelectual, os 
povos primitivos são espetacularmente vibráteis à música.8 
Os povos primitivos, em face dos efeitos tão estranhos e poderosos neles desencadeados 
pelos ritmos musicais, não cogitaram de explicá-los a custa de jogo prosaico e de leis 
psicofisiológicas. No tempo dos povos primitivos a música era colocada sob influência de 
misteriosas entidades superiores – a música não só seria de origem sobrenatural, mas poderia agir 
sobre o mundo sobrenatural, constituindo uma espécie de veículo entre os homens e as potências 
superiores. Daí a música a figurar freqüentemente nas cerimônias místicas dos povos primitivos 
havendo mesmo nascido junto da religião. 
Os povos primitivos, na ignorância das verdadeiras causas dos fenômenos e na angústia 
oriunda da incapacidade de explicar racionalmente os fatos existentes, apressavam-se a atribuir 
todo o ocorrido a uma intervenção das potências ocultas. Nas cerimônias religiosas presididas 
pelos médicos-feiticeiros, o canto e a música instrumental rudimentar, muitas vezes associada a 
dança, conseguiam que os “maus espíritos” saíssem, curando enfermos. A música exerceria uma 
função de exorcismo, de purificação ou de conjuração. Na superstição do povo primitivo, as 
virtudes mágicas da música seriam mesmo, transmitidas aos instrumentos produtores da música. 
Entre os egípcios, as doenças continuaram a ser atribuídas a intervenções de deuses malévolos, e 
suscetíveis de cura pela magia, que invocava a proteção dos deuses amigos do homem. Da 
mesma maneira, entre assírios, persas, babilônios e outros povos da antiguidade oriental, 
dominou o conceito sobrenatural das moléstias e, por isso, de males só curáveis pela magia, 
estando a medicina, deste modo, subordinada a religião. Em meio às superstições e crenças, a 
música foi se impondo como recurso de encantamento e de magia, suscetível de acarretar os 
efeitos mais diversos, inclusive a cura dos transtornos do corpo e do espírito.As primeiras 
referências acerca da influência da música sobre o organismo humano são provavelmente as 
encontradas num papiro médico egípcio datado de 2.500 a.C. 
 
8 Este capítulo versa sobre o livro de J. C. RIBAS, Música e Medicina. EDIGRAF, São Paulo, 1957. 
 
17 
Entre os hebreus, a música, revestida de poderes sobrenaturais, desempenhava papel de 
relevo nas práticas religiosas, conforme se depreende na leitura da Bíblia. Os antigos israelitas, a 
exemplo dos povos primitivos, serviam-se de cantos e de instrumentos para obterem estados de 
excitação psíquica. 
Na antiguidade clássica, a música continuou acolhida como uma dádiva dos deuses aos 
homens. Em testemunho do prestígio atribuído à música pelas religiões antigas, a mitologia 
greco-romana está superlotada de deuses, semi-deuses e heróis, que inventam instrumentos, 
compõem e se recreiam com música. Anfião, com a música de sua lira, constrói miraculosamente 
os baluartes de Tebas. 
Nos textos mitológicos, os heróis exercem muitas vezes funções de médicos e, na cura das 
doenças, recorrem à música, velha aliada da medicina. Apolo era deus da música e também da 
medicina. Não só seria capaz de disseminar doenças, com as suas flechas, mas, se assim o 
quisesse, de atraí-las para si, deixando os homens a salvo dos males. Em virtude desta crença, a 
cidade de Tebas, quando dizimada pela peste, ou cantos fervorosos a Apolo. 
Os gregos deram à música um sistema ou escala. Na civilização helênica, surgiram os 
modos – dórico, frígio, lídio, mixolídio, eóleo, lócrio e jônio, sendo cada um deles associados a 
determinadas qualidades. 
A civilização romana, no tocante aos conhecimentos médicos e musicais, se aberberou 
dos ensinamentos gregos. Asclepíapes de Bitínia, retórico e depois médico em Roma, não só 
descreveu precisamente sintomas de doenças mentais e interpelou-os à luz de curiosas teorias, 
mas também preconizou normas de tratamento. Na sua opinião, “a harmonia musical e um 
concerto de vozes eram medidas terapêuticas muito valiosas”. 
Na Idade Média, houve uma estagnação no domínio da medicina e a humanidade voltou a 
mergulhar no mais intenso misticismo. As doenças, principalmente de natureza mental, tornaram 
a ser consideradas decorrentes da influência de demônios. 
Na Idade Média, a música, à sombra do cristianismo, nas catedrais católicas, viveu uma 
época de esplendor através do cantochão, do canto ambrosiano, e no renascimento com a 
polifonia católica. A música tornou-se a linguagem pela qual o crente se aproxima do céu, atinge 
maior elevação espiritual, confessa os seus anseios a Deus e obtém estado de purificação. Na 
missa católica, o toque da campainha favorece nos fiéis a sensação de maior proximidade com 
Deus. 
18 
Nos primeiros tempos da Igreja os sacerdotes preconizavam o canto nos templos, sem 
intervenção de instrumentos musicais. Depois, a música sacra, que vinha se servindo de salmos 
extraídos da Bíblia e de cantos de culto hebraico, adquiriu caracteres mais próprios e definidos. 
No século IV, em Milão, Santo Ambrósio, Pai da Hinodia Cristã, compôs o Canto Ambrosiano. 
No século XVI, ao mesmo tempo que desponta a música profana e popular, irrompe outra face de 
florescimento da música sacra, graças à Reforma Protestante.De todas as artes, somente a música 
foi posta conscientemente a serviço da fé protestante. A música proclama Lutero, melômano, 
instrumentista e compositor. É a “arte dos profetas, e a única arte, além da teologia, que tem o 
poder de acalmar as agitações da alma e afugentar o demônio”. Lutero cria o Coral Protestante, 
de estrutura polifônica, onde, pela primeira vez, os crentes entoam hinos na língua do povo, e não 
em latim. 
Na Idade Média, considerou-se a música uma linguagem não só capaz de por o crente em 
comunicação com Deus, mas ainda de agir sobre o comportamento deste e de demais criaturas. 
Daí se patenteou à necessidade de ser utilizada em obediência a um critério ético, a exemplo do 
que aconselhava a sabedoria grega. 
Na Renascença, com o florescimento das ciências, a medicina libertou-se das superstições 
medievais e voltou a trilhar os rumos inerentes à verdadeira medicina. 
Com o ressurgimento da medicina, voltou-se a estudar o doente mental sob critério 
científico, admitindo-se que as perturbações psíquicas decorressem de alterações do próprio 
indivíduo,particularmente do cérebro. 
Ao lado do desenvolvimento das ciências, progrediam também as artes, inclusive a 
música, que se desvencilhou da religião e se tornou profana, graças ao incremento da chamada 
música popular. Desde as invasões dos bárbaros, a Europa era percorrida por músicos 
ambulantes, os bardos, que se compraziam em recolher e disseminar a música popular de 
diversos povos. Não demorou muito para que os próprios nobres, impelidos pelo espírito 
aventureiro, se lançassem a compor músicas e vagueassem pelas aldeias e castelos, no objetivo 
cavalheiresco de enaltecer com música suas damas distantes e fizessem felizes os ouvintes. 
Foram os trovadores na França, os minstrels na Inglaterra e os Minnesingers na Alemanha. Nesse 
tempo das cavalarias, já se constatava certamente que as melodias, com estranho poder de 
encantamento e de recreação, encerravam aqueles efeitos terapêuticos, que tornariam mais tarde 
um lugar-comum dizer-se que a música é um refrigério, um refúgio, um bálsamo. 
19 
3. O CONCEITO DE MÚSICA EM MUSICOTERAPIA 
Os musicoterapeutas utilizam um amplo espectro de experiências musicais em seu 
trabalho com os pacientes. Desta forma, concebem as fronteiras da música de uma forma muito 
abrangente. Em Definindo Musicoterapia (2000), Bruscia cita Gertrude Orff (1974), que descreve 
a musicoterapia como a utilização de “materiais musicais”, como “fala-rítmico-fonética, fala, 
ritmos livres e métricos, movimento, melodias na fala no canto e no manejo do instrumento. 
O desafio para os musicoterapeutas é que essas perspectivas nem sempre são relevantes 
ou abrangentes o suficiente para o universo da prática clínica. Segundo BRUSCIA (2000), há 
muitos fatores em ação em um contexto terapêutico que influenciam a forma como definimos e 
delimitamos a música.O autor define como os mais importantes: 
- as preferências, as habilidades e as aquisições musicais do cliente são sempre aceitas 
sem julgamento; como resultado, os padrões estéticos e artísticos na musicoterapia são mais 
amplos e mais inclusivos do que aqueles de outros profissionais da música. 
- o paciente é prioridade na terapia, e não a música. 
- a musicoterapia opera assumindo que a experiência musical possui significado para os 
clientes, e que os clientes podem usar a música para fazer mudanças significativas em suas vidas. 
- na musicoterapia, a música é mais do que as próprias peças ou sons; cada experiência 
musical envolve uma pessoa, um processo musical específico e um produto musical de 
algum tipo. 
- - os aspectos multissensoriais da música são fundamentais para sua aplicação terapêutica, 
mas dilatam as fronteiras da experiência musical. 
- de forma semelhante, as superposições e relações entre a música e as outras artes são 
muito exploradas com propósitos terapêuticos e isso também contribui para tornar as fronteiras da 
experiência musical mais inclusivas. (BRUSCIA, p.100). 
Se a musicoterapia envolve a utilização exaustiva de qualquer coisa que esteja contida na 
música, incluindo as vibrações e as ressonâncias, como o musicoterapeuta deve atuar frente aos 
conhecimentos que possui frente a essas propriedades musicais? Se possui uma formação 
educação musical precária, como pretenderá seguir os seus objetivos numa dada sessão, com um 
determinado paciente? 
 
 
20 
A investigação por observação em música descreve os acontecimentos no momento em que 
ocorrem. Pode envolver a definição, o registro, a análise e as interpretações da situação presente, a 
sua caracterização ou os processos dos fenômenos musicais. O enfoque está, portanto, nas 
condições dominantes na música ou em situações musicais, ou no comportamento de uma pessoa 
ou de um grupo numa situação musical (KEMP, p.88, 1995). 
 
Nas áreas da educação musical e da musicoterapia, tanto músicos como investigadores se 
preocupam com dois aspectos gerais do comportamento: a atenção dada a um estímulo (a música) 
e a resposta ao mesmo (a interpretação, a composição, a verbalização, a utilização da música com 
finalidades extramusicais). 
Como constitutiva do ser humano, a musicalidade encontra-se em nossa estrutura 
biológica (no sistema nervoso). Pelos estudos da Psicologia da Música, buscou-se mapear áreas 
cerebrais responsáveis pela reposta à música. Estudos mais recentes de Neurociências têm 
defendido a idéia de que não existem partes fixas no cérebro responsáveis pela audição musical, e 
sim toda uma rede neuronal de interações que se estabelece em contato com a música. 
Com base neste conceito de musicalidade e interação neuronal, para o setting 
musicoterápico e para o atendimento clínico, temos um universo de incertezas com alguns pontos 
previsíveis. O que fazer para compreender melhor a produção musical que surge em uma sessão 
musicoterápica? Barcellos (1999), em seus estudos sobre “tecido musical”, sugere o modelo 
Tripartido de Molino para atender as dimensões desta produção musical, por envolver tanto a 
obra do autor (o paciente) como aquele quem a escuta (o musicoterapeuta). 
Em um atendimento musicoterápico, musicoterapeuta e paciente experienciam interações 
musicais. Para a melhor visualização de tais momentos musicais, o musicoterapeuta transcreve os 
acontecimentos em partituras. A notação tradicional de partitura é parcialmente possível, pois 
certos acontecimentos musicais, se “congelados”, nada significam para a análise musical no 
contexto musicoterápico. 
A descrição se dá, deste modo, na forma de texto sobre a pauta, de alguns movimentos 
corporais que acompanham as sonoridades. Por outro lado, essa mesma forma de transcrição, 
colocando-nos como parte de uma obra, em uma mesma grade musical, possibilita a visualização 
das interações e intervenções. 
Numa sessão de musicoterapia esses aspectos são claramente observados e devem ser 
levados em conta, para a apresentação do caso e para realizar os relatórios. 
 
21 
3.1. O Musicoterapeuta e a Música 
A questão da relação do musicoterapeuta com a música ainda gera controvérsias: se por um 
lado o musicoterapeuta deve ter noções básicas de teoria musical e saber tocar um instrumento, 
por outro, a exigência é menor: o musicoterapeuta não precisa ser um músico formado – como 
afirma BENENZON (1985)9, como o músico erudito, com vocação para ser músico e não 
terapeuta, pois o músico formado como tal tem, intrinsecamente, o pré-juízo musical estético de 
sua evolução e desenvolvimento musical, pois o pré-juízo musical o impede de aceitar com 
inteira liberdade ritmos “não-estéticos” ou a desafinação de um paciente. O musicoterapeuta 
precisa estar livre do pré-juízo musical em relação à produção musical de seu paciente. Sendo 
assim, muitas vezes os musicoterapeutas acabam deixando de aprimorar-se musicalmente, 
sabendo que não precisarão ser tão “perfeitos” em sua atuação musical, empobrecendo a 
qualidade de seu trabalho. O paciente não precisa saber música, não precisa saber tocar um 
instrumento ou ter um canto afinado. O musicoterapeuta tem a obrigação de preocupar-se em 
saber tocar um instrumento, cantar, da maneira como puder, de forma afinada, pois ele é a 
referência do paciente. 
Um exame de avaliação musical deveria fazer parte da classificação para todos aqueles 
que aspiram à carreira de musicoterapeuta, conforme o Manual de Musicoterapia (1985): o 
exame descrito no manual consiste na interpretação de uma partitura musical elegida pelo 
aspirante no instrumento de seu conhecimento; improvisação e criação de canções infantis; 
ditados rítmicos e melódicos, leitura à primeira vista, afinação (BENENZON, p.66-67). 
Naturalmente, o aspirante não necessita de um conhecimento escolástico musical, porém a 
interpretação de partitura no instrumento de seu conhecimento,ditados rítmicos e melódicos já 
seriam de grande valia para aquele que deseja tornar-se musicoterapeuta. 
O musicoterapeuta trabalha em equipe, e deve por isso ter a noção exata da sua atuação 
musical na sessão com seu paciente, para poder expor para a equipe os objetivos, os progressos e 
os retrocessos, além de trabalhar os aspectos não-verbais presentes na música. Entre as possíveis 
técnicas e especialidades encontramos o psicodrama, a psicodança, a psicomotricidade, a 
expressão corporal, técnicas de relaxamento, estimulação precoce, e muitas outras. 
 
9 BENENZON, R. Teoria da Musicoterapia. São Paulo: Summus, 1988. 
22 
Este é um dos aspectos que dificultam a aquisição de um rol específico. Por outro lado, 
freqüentemente observa-se em alguns musicoterapeutas, inclusive em alguns músicos, uma 
espécie de onipotência no que diz respeito ao uso do som e da música. Este fator se faz evidente 
quando o musicoterapeuta enfoca seu trabalho para uma musicoterapia passiva, usando técnicas 
receptivas. 
É como se o musicoterapeuta se identificasse com o poder mágico da estrutura abstrata 
que o som teve para o homem primitivo desde tempos remotos. Tal atitude pode provocar 
dificuldade na integração das equipes de saúde. 
A musicoterapia freqüentemente promove uma autoconsciência (física, emocional, social 
e intelectual); a música é um mecanismo que permite ao indivíduo se auto-explorar através de 
meios não-verbais. Conforme as técnicas citadas, o cliente apresenta uma idéia musical que o 
musicoterapeuta apóia, ajudando o cliente a desenvolvê-la, e possivelmente, organizá-la; o 
musicoterapeuta aceita o que é apresentado e não o altera. 
 
 
3.2. Murillo Brito e a Canção Desencadeante10 
Para Murillo Brito, considera-se fundamental para um bom desenvolvimento do processo 
musicoterápico, que o paciente se submeta a alguns estágios em seu tratamento. Dentre os 
estágios já é considerado que o paciente – ou quem puder fazê-lo – respondam questões que 
constam na ficha musicoterápica, a fim de que o musicoterapeuta possa recolher dados referentes 
a sua história sonora e lançar mão de estímulos compatíveis com essa. Através da testificação, 
visando o estabelecimento de algum tipo de diálogo sonoro e conseqüentemente o 
estabelecimento da relação terapêutica. 
Quando um paciente é indicado para a musicoterapia, na maioria dos casos, este chega 
sem, evidentemente, conhecimentos dos dados de sua história sonora-musical, imprescindíveis 
para o bom funcionamento do processo. É árdua a tarefa de realizar o levantamento de sua ficha 
musicoterápica pois, segundo a experiência de Brito na área psiquiátrica – o paciente psiquiátrico 
não tem condições de informar dados que possam ser importantes para o conhecimento de sua 
 
10 BRITO, M – A canção desencadeante. Revista Brasileira de Musicoterapia, Ano IV, Número 
5, 2001. 
23 
história sonora ou porque a família desconhece, ou por outros diferentes motivos, o 
musicoterapeuta não tem acesso a estes mesmos familiares. 
Segundo o autor, isso não impede que o musicoterapeuta lance mão de algum tipo de 
canção que possa vir a impactar seu paciente. Brito ainda ressalta que, na área psiquiátrica, a 
música popular é, dentre as várias possibilidades de expressão musical, a que o paciente mais 
elege para se manifestar e extravasar, através dela, seu momento psíquico e sua história. A 
música está presente em toda parte: nas ruas, nas casas, morros e praias, - lugares onde todos 
possam estar. Acrescente-se isso ao fato de que, quando uma canção faz sucesso, dada a imensa 
musicalidade do povo brasileiro, uma grande parte da população que tem acesso a essa música a 
assimila e divulga oralmente, gerando um processo que mistura mecanismos da música popular 
com a música folclórica. 
Deste modo, quando um paciente psiquiátrico de baixa renda, inserido uma instituição 
pública, chega para iniciar um processo musicoterápico, está impregnado de canções que 
povoaram ou ainda povoam sua vida, mesmo que, em função do seu quadro clínico, não tenha 
condições para lembrar-se delas ou mesmo de cantá-las. 
Diante da escassez de dados sobre esse paciente, mas conhecendo a história da MPB e as 
canções que foram mais representativas das décadas nas diferentes classes sociais, o 
musicoterapeuta pode, com grande margem de sucesso, lançar mão de uma canção que impacte o 
paciente e o estimule a começar a se expressar, desencadeando um processo ativo. 
A utilização da canção desencadeante pelo musicoterapeuta não leva a riscos de haver 
algum tipo de estranheza cultural e/ou musical por parte do paciente. Com o crescente 
desenvolvimento de comunicação de massa, uma canção de sucesso atinge, indiscriminadamente, 
todas as regiões do país e, sem considerarmos os aspectos éticos dessa questão, padroniza o perfil 
musical de um determinado contingente populacional. 
Logo, a canção desencadeante, por ser uma canção amplamente difundida, ao ser 
introduzida num contexto musicoterápico, permite ao paciente a expressão da mesma e serve de 
estímulo para que novos conteúdos e informações advenham dessa expressão, além de 
possibilitar ao paciente, provavelmente, a sensação do musicoterapeuta estar em consonância 
com seu universo sonoro e o posterior compartilhar de experiências musicais e sentimentos e 
sensações que estas podem acarretar. 
 
24 
 
 
 
3.3. A Música no Contexto Terapêutico 
Algumas teorias levantam questões importantes para o campo da musicoterapia, teorias 
diversas que dão à música o seu significado e sobre que tipos de significações podem derivar da 
música. 
As três principais teorias sobre a significação na música a serem consideradas pelos 
musicoterapeutas são: o formalismo absoluto, o referencialismo e o expressionismo absoluto 
(BRUSCIA,2000). 
 
a “significação” de um trabalho artístico é diferente da significação de todas as outras experiências 
humanas.Os eventos estéticos, como os sons da música só significam a si próprios; o significado é 
completamente sui generis e essencialmente diferente de qualquer outra coisa no mundo que não 
seja musical...A experiência da arte, para o Formalismo, é uma experiência primariamente 
intelectual; é o reconhecimento e a apreciação da forma por si própria.Esse reconhecimento e 
apreciação, embora de caráter intelectual, são chamados pelos formalistas de “emoção” – 
geralmente de “emoção estética.Mas essa assim chamada “emoção é única – ela não tem 
contraparte em outra experiência emocional (BRUSCIA, pp.104-105, apud. REIMER, pp. 
20-21). 
 
Todos os significados encontrados na música são inerentes à música e somente à música, 
e como tais são independentes e diferentes de todas as significações encontradas em outras artes 
ou no universo fora da arte. 
Para o formalismo absoluto, quando a música é utilizada na terapia, ela não pode ser 
considerada uma arte porque ela não retira seu significado estritamente da apreciação intelectual 
de sua beleza formal. Os formalistas absolutos são essencialmente elitistas – acreditam que a 
maioria das pessoas não são capazes de alcançar uma verdadeira experiência estética da música, 
contanto que tenham talento ou que tenham sido submetidos a um treinamento musical e, 
portanto, para as massas a música serve fundamentalmente com treinamento (BRUSCIA, apud. 
REIMER, 1970). 
Os referencialistas acreditam que os significados centrais da música e da experiência 
musical encontram-se fora do trabalho musical propriamente dito, nos fenômenos, idéias, 
eventos, sentimentos não-artísticos ou extra-musicais comunicados através da música. A música 
25 
comporta significadopor referir, representar, simbolizar ou por expressar o universo (não 
musical) da experiência humana. As composições, improvisações e apresentações contemplam os 
ouvintes com mensagens sobre a vida, o universo, a experiência humana e os musicistas 
envolvidos em criá-las; e os processos de composição, de improvisação, de execução e de escuta 
nos dão oportunidades para vivenciarmos e trabalharmos os vários aspectos da condição humana. 
Por essa razão, há uma relação muito próxima e direta com a música e aquele que faz a música. 
Ao contrário dos formalistas, os referencialistas acreditam que a música é um reflexo dos 
músicos envolvidos em sua criação e cada experiência de escutar música é um reflexo do ouvinte. 
A perspectiva referencialista é coerente com os princípios básicos da musicoterapia, 
principalmente no que diz respeito àquelas linhas acadêmicas que enfatizam a utilização da 
música na terapia. O musicoterapeuta referencialista acredita que a música é uma linguagem 
universal que os indivíduos podem usar para expressar a condição humana, assim como suas 
próprias idéias, sentimentos e identidades. O valor da música é dado pelo fato dela estender para 
além de si própria e para além do domínio da arte e da estética. 
A terceira posição – a dos expressionistas – é uma integração do formalismo absoluto com 
o referencialismo. 
 
Os componentes estéticos em um trabalho artístico têm qualidade semelhante à qualidade inerente 
a toda experiência humana.Quando alguém partilha as qualidades do conteúdo estético de um 
trabalho artístico também estará partilhando as qualidades com as quais se fazem todas as 
experiências humanas. A relação entre as qualidades do trabalho artístico e as qualidades da 
experiência humana é percebida pelo observador do trabalho como “significativas”. A significação 
da experiência – a relação entre as qualidades estéticas e as qualidades da vida – será convincente, 
vital e penetrante na mesma medida com que um trabalho contém qualidades estéticas, 
convincentes, vitais e penetrantes, e na mesma medida com que essas qualidades podem ser 
experimentadas pelo observador. O âmago da experiência de partilhar as qualidades estéticas 
significativas do trabalho artístico é o sentido mais profundo da natureza da vida humana 
(BRUSCIA, pp.106-107, apud. REIMER, pp.24-25). 
 
Portanto, é no conteúdo do trabalho artístico que se pode encontrar insights e, quanto mais 
profunda a experiência das qualidades estéticas, mais profundo poderá ser o sentido da 
significação obtida. 
A definição básica de música em musicoterapia pode ser apresentada da seguinte maneira, 
segundo BRUSCIA (p.111): 
 
A música é uma instituição humana na qual os indivíduos criam significados e beleza através do 
som, utilizando as artes da composição, da improvisação, da apresentação e da audição. A 
26 
significação e a beleza derivam-se das relações intrínsecas criadas entre os próprios sons e das 
relações extrínsecas criadas entre os sons e outras formas de experiência humana. Como tal, a 
significação e a beleza podem ser encontradas na música propriamente dita (isto é, no objeto ou 
produto), no ato de criar ou experimentar a música (isto é, no processo), no músico (isto é, na 
pessoa) e no universo. 
 
A música é definida como uma instituição. Como as outras artes, possui um padrão 
organizado e permanente de interação humana centrado em um conjunto de valores que são 
compartilhados por uma comunidade e reciprocamente relacionados com essa comunidade com 
funções, objetivos, costumes, tradições e regras específicas. Quando definida como instituição, a 
música é específica da espécie e conseqüentemente universal; no entanto, os critérios pelos quais 
ela é definida como uma forma de arte são culturalmente definidos. 
Na musicoterapia, os elementos básicos utilizados nas várias combinações incluem: o 
paciente, o terapeuta, a música (em todas as suas variações e manifestações) e, em alguns casos, 
um grupo de pacientes. Também podem ser incluídas as pessoas significativas da vida do 
paciente e outras formas de arte e artefatos. 
Embora tais elementos possam combinar-se de diversas maneiras, o elemento-chave é a 
música – determina como todos os outros elementos e compostos se combinam, interagem e 
afetam entre si. É a forma com que a experiência musical do paciente foi estruturada que 
determinará as reações e relações possíveis entre os outros elementos compostos. 
 Portanto, a interação paciente-música é o núcleo central da musicoterapia que molda as 
dinâmicas com todas as outras relações. 
São seis os modelos dinâmicos, que se diferenciam de acordo com o foco da experiência 
do paciente, se é nas propriedades: 1) objetivas; 2) universais; 3) subjetivas; 4) coletivas; 5) 
estéticas; ou 6) transpessoais da música. 
 
 
3.4. A Natureza das Intervenções em Musicoterapia 
O fato da música poder servir como parceira do terapeuta no processo de intervenção, 
revela muito acerca da essência da natureza da musicoterapia. Se o musicoterapeuta pode 
utilizar, tanto a música por si só, quanto em parceria com a sua intervenção pessoal para alcançar 
os objetivos terapêuticos, deve haver muitas semelhanças entre as funções do terapeuta e as 
funções da música. 
27 
O importante é abordar a singularidade da natureza das intervenções da musicoterapia – 
onde terapeuta e música trabalham em conjunto para ajudarem o paciente. A principal questão é o 
que torna as intervenções de musicoterapia diferentes de qualquer outra forma de terapia, ou 
ainda as verdadeiras e singulares intervenções que pertencem ao campo da musicoterapia. 
 A resposta se encontra em três elementos que definem e diferenciam a musicoterapia de 
outras modalidades de terapia: o som, a beleza e a criatividade. 
A musicoterapia é centrada no som, portanto um bom musicoterapeuta deve ter um 
ouvido, se não apurado – educado e atento o bastante para perceber a expressão de problemas 
através do som, os relacionamentos gerados a partir do som, encontro de soluções e bem-estar 
através do mesmo. 
A musicoterapia é centrada na beleza. O contexto para a experiência sonora da 
musicoterapia é sempre um contexto estético – é sempre pela busca da beleza e do sentido que a 
beleza traz para a vida através da música. Escutando ou criando música, como recurso 
terapêutico, o paciente experimenta a beleza e o sentido da vida e, ao longo do processo aprende 
a trabalhar e a vencer problemas e desafios que fazem parte do caminhar na vida. Do mesmo 
modo que a música apresenta tensões e conclusões, movendo-se no sentido da mudança para a 
resolução, o ser humano trabalha para tornar-se íntegro e viver de forma mais completa. Quando 
essa jornada em direção à integridade ocorre com o refinamento de uma forma artística, esta 
ocorre em um contexto estético – a jornada é percorrida de forma muito mais pungente, mais 
potente e mais notável (BRUSCIA,p.46). 
A musicoterapia é centrada na criatividade. O meio pelo qual o som torna-se belo e 
significativo consiste num processo de criatividade. Quando o paciente ouve ou cria música, isto 
envolve ser criativo com os sons, explorá-los, nas diferentes formas a qual podem ser arranjados, 
percebidos e interpretados. Ambos – processo criativo e processo terapêutico – envolvem a 
resolução de problemas, exploração de alternativas e opções, utilizar todos os recursos 
disponíveis, escolher o melhor caminho para resolver uma dada questão, selecionar qual das 
opções é mais prazerosa e em seguida, organizar todas as decisões em um produto ou resultado 
que seja belo e significativo. 
Na musicoterapia, o processo de resolver “problemas musicais” é concebido de forma 
semelhante ao processo de resolver “problemas da vida”,e acredita-se que as habilidades 
adquiridas para encontrar soluções musicais se generalizam para as situações da vida. 
28 
Na terapia, as intervenções são baseadas em três critérios: 1) o paciente tem de necessitar 
ajuda externa para alcançarem seus objetivos em termos de saúde; 2) deve ser uma intervenção 
com um propósito, independentemente do resultado; e 3) a intervenção deve ser conduzida por 
um terapeuta em um contexto de uma relação paciente-terapeuta. 
Quando o terapeuta utiliza os sons e padrões organizados da música para influenciar 
diretamente o corpo ou o comportamento do paciente de modo observável, ou ainda quando 
utiliza estímulos não-musicais para induzir respostas musicais especificas do paciente, a música é 
utilizada como experiência objetiva. Na condição de estímulo, as propriedades da música são 
utilizadas para mediação ou reforço para induzir respostas observáveis não-musicais do paciente. 
O modo como uma pessoa escuta, improvisa ou executa a música é uma manifestação 
direta da singularidade da identidade da pessoa como ser humano, refletindo quem a pessoa é e a 
forma como ela lida com as várias situações exemplificadas pela música. Do mesmo modo, 
quando duas ou mais pessoas executam ou ouvem música juntas, a sua experiência musical 
compartilhada é igualmente singular – não haverá duas outras pessoas que irão interagir, 
comunicar ou se relacionar com outra da mesma maneira. Estamos falando da música como uma 
experiência subjetiva (BRUSCIA, p. 148). 
Na música-como-processo, é o próprio processo de fazer ou executar música que é 
também o processo de mudança terapêutica. 
 Sempre que a música é utilizada como processo, o resultado é algum tipo de produto 
musical – improvisação, composição, execução, gravação, percepção, notação , entre outros. Esse 
produto musical é um reflexo de tudo o que aconteceu durante o processo – documenta tudo o 
que foi externalizado, trabalhado, transformado, pelos que executavam ou ouviam música. Uma 
improvisação fornece uma representação daquele que improvisa e da forma como ele se relaciona 
com seu mundo, com o outro e com o objeto, do mesmo modo que uma composição ou execução 
musical fornecem o mesmo tipo de representação do compositor ou do executante. Fazendo um 
paralelo com essa afirmação, as respostas daquele que escuta música fornecem uma 
representação do ouvinte e de como ele se relaciona com o mundo do eu, do outro e do objeto. 
Na música como experiência coletiva encontramos, desde os tempos remotos, uma música 
como parte integrante de rituais criados e compartilhados pela comunidade e forneceu uma 
identidade compartilhada para as pessoas que pertenciam a ela, além de prover um continente e 
um espelho da psique coletiva da espécie. 
29 
O terapeuta utiliza as experiências musicais coletivas como uma base para a terapia do 
indivíduo ou da comunidade. A música pode ser utilizada de três formas : como um ritual, como 
identidade coletiva ou como um arquétipo. 
 
3.5. Música e musicalidade 
A música é uma das melhores maneiras de manter a atenção de um ser humano devido a 
constante mistura de estímulos novos e estímulos já conhecidos. 
Entre outras coisas, a música é uma forma de som estruturado, como a linguagem, e a 
musicalidade é a aptidão de reagir aos estímulos musicais e criar música. O individuo que está 
ouvindo ou, através de outros sentidos, percebendo as numerosas variações daqueles sons 
musicais, está criando música. 
(...) Eventos musicais e físicos pertencem a ordens diferentes de existência, assim o que ocorre é 
uma quebra real do mundo da percepção, todas as sensações audíveis, incluindo sensações de tom 
com um evento acústico, são ou reações do ouvido a estímulos externos, ou alucinações. Ouvir 
qualidades dinâmicas da audição é outra coisa. É a percepção direta de eventos não-materiais. A 
dinâmica das qualidades dos tons dá ao ouvido acesso direto para tais eventos. (BRABO, apud. 
ZUCKERKANDL, 1973, p. 100). 
 
Aspectos humanos fundamentais estão contidos nos diversos meios como uma pessoa 
vivencia a música, seja ela deficiente ou não. Todas as pessoas respondem a estímulos musicais, 
de modo que, em maior ou menor extensão, todas as pessoas são musicais. 
Mesmo entre aqueles que possuem as mais graves deficiências pode-se encontrar um ser 
musical, que, através da musicoterapia, tem oportunidade de participar de alguma atividade 
musical, ao invés de permanecer no isolamento devido à deficiência. 
A música, numa sala de concerto, pode transformar fisionomias, captando as pessoas 
musicalmente, não só entretendo o público, mas transmitindo um tipo de apelo ético aos ouvintes, 
que poderiam ser expressas por: esqueçam a banalidade, a ruindade – elevem os sentimentos mais 
puros e mais calorosos! 
 
Creio que a música aciona forças morais de três formas diferentes: como mensagem, como 
intérprete e como critério de valores morais. O mais difícil é falar da primeira – dizer até que ponto 
a música me parece ser uma mensagem do reino do sentimento ético (WALTER, 1935). 
 
Segundo o autor, surgiria a seguinte pergunta: quais são as forças que vivem na música, 
que apelam à moralidade, além da musicalidade? 
30 
É importante frisar que o essencial da música continua sendo sua força e efeitos musicais. 
Devemos diferenciar, porém, o que a própria música nos conta, daquilo que um compositor quer 
contar-nos através da música. É próprio da música ir da dissonância para a consonância – ela 
anseia pela pacificação.Isso não impede que o compositor possa contar-nos, por meio desta 
linguagem, de sofrimento, inquietude e desespero. Sabemos que a matéria é dominada pela lei da 
gravidade, e que isso não impede que uma estrutura pesada de metal como o aeroplano se eleve 
no ar e mantenha vôo. A analogia se iguala perfeitamente a esta realidade: nos dois casos triunfa 
a força humana sobre a qualidade básica de um elemento. 
 
(...) Aqui, sendo encerrada no profundo prazer de uma grande reconciliação, está a razão principal 
da felicidade que a música transmite ao ouvinte. Nossa íntima saudade, nosso profundo anseio por 
harmonia – harmonia no significado supramusical transcendental da palavra – sente-se confirmada, 
apaziguada no decurso da música. E, nesse sentido, a música parece-me uma mensagem – uma 
mensagem ética elevada – que dos mistérios do mundo soante traz, à parte ética de nosso ser, uma 
mensagem que nos faz feliz. (...) (WALTER, p.16). 
 
O autor faz uma comparação interessante, entre o canto em uníssono e o canto a várias 
vozes – no uníssono os cantores tornavam-se massa; no canto em várias vozes tornavam-se 
comunidade. O poder da música, que tem como meta a comunidade harmoniosa, a sociabilização, 
é uma prova superior da existência e da intensidade das forças morais, e essa comunidade não se 
restringe somente aqueles que se juntaram para fazer música: a nossa arte inclui os ouvintes no 
mesmo círculo mágico. 
Em Audição Musical e Respostas a Dilemas Morais, BRABO (p.7, 2003) propõe o 
seguinte esquema: 
Audição Musical – Dilema Moral – Julgamento Moral – Tomada de Decisão. 
O autor levanta a questão entre a audição musical e a interferência da mesma nas repostas 
a questões morais em alunos de cursos de graduação. A Teoria da Música Pura e a Teoria dos 
Afetos são seu ponto de partida. Na primeira, a música está provida de qualquer elemento 
expressivo, pois a Teoria da Música Pura trata a música como a formalização de idéias musicais. 
Na segunda, a música é uma expressão de emoções como raiva, alegria, inveja, compaixão. 
 
Ambos, Platão e Aristóteles, se interessaram pelo poder da música e sua influência sobre o espírito 
humano, o que os levou a sugerir aos específicos de certos

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