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Canadian International Development Agency Shirley Rodrigues Maia Denise Teperine Dias Lilia Giacomini Sandra R. S. Higino Mesquita Vula Maria Ikonomidis Estratégias de ensino para favorecer a aprendizagem de pessoas com Surdocegueira e Deficiência Múltipla Sensorial Um guia para instrutores mediadores 1ª Edição São Paulo Grupo Brasil 2008 Colaboração na revisão geral: Rosângela Gavioli Prieto Revisão ortográfica: Walkíria de Assis Diagramação: Inês Igino e Cisinando Carlos da Costa Lima Foto da capa: Arquivo AHIMSA Impressão: Ciclo Gráfica e Fotolito Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil). S616 Sugestões de estratégias de ensino para favorecer a aprendizagem de pessoas com Surdocegueira e Deficiência Múltipla Sensorial: um guia para instrutores mediadores / Shirley Rodrigues Maia... et al. -- São Paulo: Grupo Brasil de Apoio ao Surdocego e ao Múltiplo Deficiente Sensorial / CIDA, 2008. 102 p. ISBN: 978-85-62252-01-3 Vários autores 1. Mediação 2. Instrutor mediador 3. Surdocegueira 4. Deficiência múltipla sensorial 5. Inclusão I. Título CDD 22ª ed. 305.9081 Grupo Brasil de Apoio ao Surdocego e ao Múltiplo Deficiente Sensorial Rua Baltazar Lisboa, 212 - Vila Mariana CEP: 04110-060 - São Paulo - SP Telefone: 55 11 5579-5438 / 5579-0032 grupobrasil@grupobrasil.org.br Prefixo editorial: 62252 Distribuição gratuita “Minha mão é para mim o que a sua audição e visão são para você. Todas as minhas idas e vindas giram em torno da mão como um eixo. É a mão que me liga ao mundo dos homens e das mulheres. A mão é o sensor com o qual atravesso o isolamento e a escuridão e agarro cada prazer, cada atividade que meus dedos encontram”. (Helen Keller) À todos alunos com Surdocegueira e Deficiência Múltipla Sensorial que nos estimulam a aprender e enfrentar os desafios do processo de ensino e aprendizagem. Sumáro Introdução......................................................................................09 Capítulo I Surdocegueira e Deficiência Múltipla Sensorial.......................................11 Terminologia e definição ....................................................................11 Surdocegueira pré-lingüistica.............................................................12 Surdocegueira pós-lingüistica ............................................................12 Deficiência Múltipla Sensorial .............................................................13 Capítulo II Comunicação da pessoa com surdocegueira pré-lingüistica......................17 Interação, Comunicação e Linguagem..................................................18 A Comunicação e a Intervenção ..........................................................21 Capítulo III Estratégias de Ensino........................................................................27 Re-significando as estratégias de ensino...............................................27 Princípio de interação........................................................................28 Mediação........................................................................................37 Estratégias de ensino........................................................................38 Capítulo IV Instrutor Mediador ...........................................................................41 Quem é esse profissional ...................................................................41 Intervenção para pessoa com surdocegueira e para pessoa com deficiência múltipla sensorial.............................................................................44 O que é a Mediação para as pessoas com surdocegueira e para pessoas com deficiência múltipla sensorial..............................................................45 Níveis de Interação do Instrutor Mediador com a pessoa surdocega e/ou com deficiência múltipla sensorial .......................................................47 Descrição para o Trabalho de um Instrutor Mediador ...............................49 Qual é o papel do instrutor mediador? ..................................................50 Criar ambiente reativo ......................................................................50 Capítulo IV Sugestões de Estratégias de Ensino para Desenvolvimento da Aprendizagem e Autonomia Pessoal ...........................................................................61 1. Para Orientação e Mobilidade em ambientes internos na escola..............61 2. Para informar sobre espaços que existem no ambiente escola................64 3. Sinalizando móveis no ambiente......................................................66 4. Identificação de objetos no ambiente................................................67 5. Organizando as referências para espaços, atividades e pessoas.............68 6. Estratégias de Comunicação ...........................................................72 Referências.....................................................................................95 Entre em contato..............................................................................99 Introdução Este livro busca oferecer idéias de estratégias de ensino para pessoas que atuam na função de instrutores mediadores na educação de pessoas com Surdocegueira e Deficiência Múltipla Sensorial. Ele surgiu da experiência de profissionais que atuam em uma instituição especializada localizada em São Paulo desde 1991, na educação de pessoas com Surdocegueira e Deficiência Múltipla Sensorial e do projeto Girassol, organizado pelo Grupo Brasil de Apoio ao Surdocego e ao Múltiplo Deficiente Sensorial, formado para estudos das manifestações tardias da rubéola e apoiado pela Canadian International Development Agency (CIDA) Canadá em 2004, o qual promoveu a formação dos profissionais do Grupo Brasil no George Brown College em Toronto no Canadá na área de Formação de Instrutores Mediadores. As sugestões de estratégias descritas nas próximas páginas visam a apoiar o processo de inclusão das crianças com Surdocegueira e Deficiência Múltipla Sensorial na rede regular de ensino bem como sua inclusão social. As estratégias foram organizadas em função das necessidades educacionais e sociais das pessoas com Surdocegueira e Deficiência Múltipla Sensorial. É com muito carinho que nós, Vula, Sandra, Denise, Shirley e Lilia escrevemos um pouco da nossa experiência nesses anos neste trabalho com pessoas com Surdocegueira e Deficiência Múltipla Sensorial. Gostaríamos ainda de agradecer imensamente a colaboração e sugestões da Prof. Dra. Rosângela Gavioli Prieto, pela incansável leitura e revisão ortográfica de Walkíria de Assis e a formatação e digitação de Inês Igino e Cisinando Carlos. Esperamos que este guia possa auxiliar aos profissionais que atuarão na função de Instrutores Mediadores, promovendo a garantia do acesso e permanência dessa população na escola, assim como a sua inclusão na família e comunidade a sua volta o qual está inserido. As Autoras 09 Capítulo I Surdocegueira e Deficiência Múltipla Sensorial Terminologia e definição A terminologia “Surdocegueira” sofreu muitas alterações, conforme relata (MAIA, 2004): Desde que surgiu o primeiro atendimento ao surdocego por volta de 1.800, conforme apresentação feita no Curso da Centrau (Centro de Reabilitação da Audição do Paraná) em 1996, por profissionais da Sense Internacional - Inglaterra, as seguintes denominações foram usadas: Dificuldade de Aprendizagem Profunda e Múltipla (DAPM), Múltipla Deficiência Severa, Surda com Múltipla Deficiência, Cegocom Deficiência Adicional, Múltipla Privação Sensorial (MPS), Dupla Deficiência Sensorial e finalmente surdocegueira (MAIA, 2004: p. 05). Já este último termo (surdocegueira) também sofreu e sofre algumas alterações, visto que em alguns países adotam o termo hifenizado surdo- cegueira. No entanto, o termo surdocego e surdocegueira sem hífen, foi proposta por Salvatore Lagati em 1991, que defendeu na IX Conferência Mundial de Orebro - Suécia, a necessidade do reconhecimento da surdocegueira como deficiência única. Para (LAGATTI, 1995) a terminologia Surdocego sem hífen se deve a condição de que ser surdocego não é simplesmente a somatória da deficiência visual e da deficiência auditiva e sim de uma condição única que leva a pessoa a ter necessidades específicas para desenvolver comunicação, orientação e mobilidade e de acessar informações sobre o mundo para conquistar a autonomia pessoal e inserir-se no mundo. Assim, ao aceitar esta terminologia temos que levar em consideração as necessidades reais da criança, jovem ou adulto com surdocegueira. A terminologia sem o hífen foi adotada para a língua inglesa, espanhola e portuguesa. 11 Após a leitura de várias definições sobre surdocegueira, como por exemplo, da Espanha, Estados Unidos, Reino Unido e outras, que retratam esta deficiência de forma a não valorizar estas pessoas sinalizando mais “o que falta” nelas do que suas capacidades, o Grupo Brasil, uma rede nacional criada em 1997 por pais, pessoas com surdocegueira e profissionais, resolveu organizar uma definição mais positiva, como veremos a seguir. Surdocegueira O Grupo Brasil define surdocegueira como: Uma deficiência que apresenta perda auditiva e visual concomitantemente em diferentes graus, levando a pessoa surdocega a desenvolver várias formas de comunicação para entender e interagir com as pessoas e o meio ambiente, de forma a ter acesso às informações, vida social com qualidade, orientação, mobilidade, educação e trabalho (GRUPO BRASIL, 2003, p. 01). Quanto ao surgimento da surdocegueira, podemos classificá-la como: Surdocegueira pré-lingüística Surdocegueira pré-linguística é a terminologia adotada para identificar pessoas que nascem surdocegas e/ou adquire a surdocegueira na mais tenra idade, ou seja, antes da aquisição de uma língua (português ou Língua Brasileira de Sinais - LIBRAS). Também conhecida como surdocegueira congênita, caracterizada pela perda de visão e audição durante a gestação. Sua ocorrência é mais freqüente em pessoas com seqüelas da rubéola congênita. Surdocegueira pós-lingüística A denominação surdocegueira pós-linguística é utilizada para designar pessoas, criança, jovem ou adulto, que adquirem a surdocegueira após a aquisição de uma língua (português ou LIBRAS). 12 Surdos congênitos com cegueira adquirida Este grupo é composto por pessoas que nascem surdas e adquirem a deficiência visual. Nesse grupo incluem-se as pessoas de Síndrome de Usher. Cegos congênitos com surdez adquirida São desta forma classificadas as pessoas que a deficiência visual ocorre durante a gestação e, posteriormente, são acometidas por perda auditiva. Como exemplos podem ser citados os casos de manifestção de catarata congênita e de diabetes em idade juvenil ou adulta. Surdocegueira adquirida É a classificação adotada para identificar pessoas que adquiriram a perda da visão e da audição após a aquisição de uma língua (português ou LIBRAS). É uma situação mais encontrada em pessoas que sofreram, por exemplo, acidente de carro, Acidente Vascular Cerebral (AVC), ou choque anafilático por medicação. Outra deficiência que merece destaque hoje na educação é a deficiência múltipla sensorial que passamos a definir logo abaixo. Na literatura especializada são encontradas várias definições para deficiência múltipla. Neste trabalho são registradas e comentadas algumas definições consideradas as mais relevantes para organização de programas de atendimento e estruturação de estratégias de ensino. Segundo material produzido pela Secretaria de Educação Especial (SEESP) do Ministério da Educação (MEC), deficiência múltipla é uma: Expressão adotada para designar pessoas que têm mais de uma deficiência. É uma condição heterogênea que identifica diferentes grupos de pessoas, revelando associações diversas de deficiências que afetam funcionamento individual e o seu relacionamento social. (BRASIL, 2000: p. 47). Essa definição traz a complexidade da deficiência múltipla quanto ao funcionamento individual, pois cada pessoa constrói sua experiência e desenvolve conhecimento nas atividades naturais como, por exemplo: preparar o lanche, cuidar do aquário e organizar suas roupas. Para (ORELOVE E SOBSEY, 2005), São pessoas com acentuadas limitações no funcionamento cognitivo, associada a limitações em outros domínios, nomeadamente no domínio motor e ou sensorial (visão ou audição), as quais põem em risco o acesso ao desenvolvimento e à aprendizagem e a leva a requerer apoio permanente. (ORELOVE E SOBSEY, 2005: p. 29). Uma pessoa com deficiência múltipla muitas vezes não consegue realizar essas atividades sem apoio permanente ou não conseguem ter a informação precisa para fazer escolhas ou realizar propriamente a atividade. O relacionamento social torna-se difícil quando a pessoa não apresenta motivação ou interesse para compartilhar informações. As pessoas com deficiências múltiplas necessitam de mediação. O Grupo Brasil de Apoio ao Surdocego e ao Múltiplo Deficiente Sensorial define que a pessoa com Deficiência Múltipla Sensorial Visual (MDVI denominação internacional) é aquela que tem a Deficiência Visual (baixa visão ou cegueira) associada a uma ou mais deficiências (intelectual, física/motora) ou a Distúrbios Globais do Desenvolvimento e Comunicação e que necessita de programas que favoreçam o desenvolvimento das habilidades funcionais visando o máximo de independência possível e uma comunicação eficiente. E a pessoa que com Deficiência Múltipla Sensorial Auditiva (MDHI denominação internacional) é aquela que tem deficiência auditiva/surdez associada à deficiência intelectual ou a deficiência física/motora ou a ambas, ou a Distúrbios Globais do Desenvolvimento. Pode ocorrer com as pessoas com MDVI e ou com MDHI outras associação tais como: graves problemas de saúde, 14 sendo necessários cuidados específicos ou uso de equipamentos para respiração e alimentação. Essas associações limitam a interação social e as respostas aos estímulos naturais do ambiente, exigindo o uso de várias abordagens para promover o desenvolvimento da aprendizagem dessas crianças. 15 Capítulo II Comunicação da pessoa com surdocegueira pré-lingüística No presente estudo será dado enfoque específico ao Surdocego Pré- lingüístico. De todos os problemas que a surdocegueira traz o mais evidente, segundo (PEASE, 2000), é na área de comunicação. A citada autora comenta que crianças com visão e audição intactas conversam enquanto brincam e, mesmo antes da fala se desenvolver, as crianças usam habilidades pré-lingüísticas para interagir com o outro durante uma atividade partilhada, seja apontando, mostrando um objeto ou mantendo contato visual. PEASE também discorre sobre a maneira “natural” com que a criança estabelece um elo entre o aqui e agora e suas experiências prévias ou futuras, conforme a linguagem vai se desenvolvendo. No entanto, a mesma autora afirma que nenhum destes processos ocorre naturalmente na criança surdocega pré-lingüística. Logo, torna-se necessário criar um ambiente comunicativo que ela possa compreender, assim como também é preciso estabelecerum programa individual para ajudá-la a se comunicar com os outros de maneira apropriada. (PEASE, 2000) relata que: Professores e cuidadores precisam adaptar seu modo de comunicação para tornar consciente e evidente o que parece acontecer instintivamente entre mães e bebês típicos e ver cuidadosamente o valor de estratégias específicas para crianças surdocegas (PEASE, 2000: p. 41). Para poder usar de estratégias específicas (PEASE, 2000) explica a importância de se entender como a linguagem de uma criança típica se desenvolve, segundo alguns parâmetros de: a) Ação direta à linguagem formal; b) Comportamentos reflexivos à comunicação intencional; 17 c) Elementos simples a combinações; d) Contextualizado a descontextualizado; e) Um vocabulário limitado a um extenso. Outro ponto importante é saber o contexto em que a linguagem se desenvolve. Segundo (PEASE, 2000), as crianças aprendem linguagem: · Através de interações com adultos familiares: crianças aprendem linguagem com outros. O bebê compreende que suas respostas (movimentos, sons, etc) produzem um efeito no outro e, então, a linguagem se torna uma “via de duas mãos”. · No contexto de atividades que ocorrem normalmente: as atividades rotineiras de um bebê formam um contexto natural para desenvolver linguagem. · Em ambientes seguros: aprendizagem só ocorre livre de stress. A linguagem se desenvolve melhor em ambientes que ofereçam segurança e conforto e com um adulto que responda e dê atenção às tentativas comunicativas da criança. · Com o apoio dos adultos: o termo scaffolding (andaime) para descrever como o adulto oferece exatamente a quantidade de suporte necessária e suficiente para a criança, por exemplo, desenvolver rotinas simples ou realizar uma atividade prática. Porém, este dá espaço para a criança fazer sua própria contribuição e que, gradualmente, com o tempo, vai removendo seu apoio até a criança conseguir realizar a tarefa completa por si só. Interação, Comunicação e Linguagem (VIÑAS, 2004) diferencia os três conceitos, pois muitas vezes são usados como sinônimos. A mencionada autora coloca que esta diferenciação é fundamental para compreender como se produz a aquisição de linguagem 18 e também ajuda a compreender porque as pessoas com surdocegueira somente podem adquirir linguagem se o processo for induzido mediante uma intervenção adequada. Para (VIÑAS, 2004), a palavra interação se refere ao efeito de algo em algo e que a interação social se refere a uma mudança no comportamento de uma pessoa como conseqüência da “ação” de um interlocutor, mas que não é sabido se este tinha a intenção de conseguir algo ou se queria mesmo produzir o que produziu ou ainda se age de maneira arbitrária que pode gerar no outro uma nova reação. A palavra comunicação, segundo (VIÑAS, 2004), significa que o efeito da interação social que se pretende e, portanto, se inicia e se mantém intencionalmente. É dizer, de forma desejada, mediante um processo de análise e comparação por parte dos interlocutores, as mensagens produzidas por ambos. Estes iniciam assim uma negociação do significado de suas respectivas ações, e o acordo nesta negociação é fundamental porque constitui a base da interação comunicativa e do processo de comunicação. A comunicação precisa da interação e inclui a interpretação de sinais que tem um significado que foi negociado até o ponto de ser compartilhado. A visão que (VIÑAS, 2004) tem sobre linguagem é que esta resulta de uma combinação estruturada, de acordo com regras pré-estabelecidas destes sinais ou símbolos que representam significados já compartilhados, com o objetivo de comunicar uma mensagem. Deve ser interpretada como um sistema de elementos (sinais ou símbolos) que resultam relevantes comunicativamente porque remetem a objetos ou aspectos que os representam. Toda linguagem pressupõe a existência de símbolos, independente da modalidade (fala, escrita, sinais da língua de sinais, símbolos pictográficos, entre outras) e a capacidade para estabelecer 19 correspondências entre significantes e significados. (VIÑAS, 2004) explica que: A aquisição de elementos simbólicos ou sinais e sua combinação para o desenvolvimento de uma linguagem estão ligadas ao conhecimento da realidade, a possibilidade de interação social, a capacidade de representação e também à intenção de comunicar (VIÑAS, 2004: p. 314). A citada autora considera os níveis de intervenção necessários para desenvolver comunicação e adquirir linguagem, a saber: Primeiro nível: a interação Objetivos: - estabelecer uma relação positiva e de confiança; - motivar o interesse da pessoa com surdocegueira para que participe na interação com os outros; - desenvolver a compreensão de que suas ações têm um efeito nas ações dos outros; - criar um ambiente motivante que desperte o interesse e anime à interação; e - favorecer as expressões emocionais corporais referentes à sua própria experiência. Segundo nível: a comunicação Objetivos: - propor conhecimento da realidade através da exploração e experimentação (interesse pelo mundo, atenção compartilhada); - favorecer o desenvolvimento de expressões naturais; - propiciar e desenvolver a representação simbólica através da negociação de significados; - motivar o diálogo conversacional (troca de turnos); e - desenvolver a capacidade de imitação. 20 Terceiro nível: a aquisição de uma linguagem Objetivos: - aumentar o vocabulário partilhado; - estabelecer categorias; - propiciar a regulação da ação conjunta; - favorecer o avanço do sinal natural ao sinal convencional; - motivar a capacidade de fazer inferências dedutivas; e - desenvolver uma linguagem simbólica. A Comunicação e a Intervenção De acordo com (REYES, 2004), a comunicação é a chave para o acesso à aprendizagem, ao conhecimento e à relação com os outros. O autor relata que dentro de programas de atenção à pessoas surdocegas uma parte muito importante é o desenvolvimento e a potencialização das habilidades comunicativas, através do ensino de um adequado sistema de comunicação a cada indivíduo. A intervenção, no caso de surdocegos pré-lingüísticos, seria a fim de construir o mundo na mente da criança (REYES, 2004). Na intervenção proposta por (VIÑAS, 2000) nota-se o que é preciso desenvolver e quais habilidades são necessárias para se desenvolver comunicação e depois adquirir linguagem. A questão do desenvolvimento de uma comunicação no estágio pré- lingüístico e a aquisição de linguagem tem sido vistas como resultados complexos da interação do desenvolvimento cognitivo da criança e das suas experiências sociais (STILLMAN e BATTLE, 1984). (STILLMAN e BATTLE, 1984) apontam que, durante o desenvolvimento normal da criança, a habilidade comunicativa se desenvolve à medida que: a criança adquire, sistematicamente, a compreensão de objeto e ambiente social e os meios para controlá-los e influenciá-los; atinge uma 21 separação entre seu “eu” e o meio para que aspectos do ambiente possam ser representados e referidos tanto mentalmente quanto por meio de ações; e, adquire conhecimento de símbolos para uso interno (nos pensamentos) e externo (para comunicar seus pensamentos a outros). (STILLMAN e BATTLE, 1984) realizaram um estudo sobre Van Dijk e seus pressupostos teóricos baseados em WERNER e KAPLAN. (STILLMAN e BATTLE, 1984) descrevem os estudos de Werner e Kaplan sobre o desenvolvimento das habilidades representacionais e simbólicas subjacentes à linguagem. Eles afirmam que o passo fundamental para o desenvolvimento destas habilidades é a compreensão por parte da criança, da separaçãode seu “eu” do meio. Os estágios iniciais que demonstram tal compreensão é a mudança funcional no foco primário do comportamento da criança por sua necessidade de satisfação para a aquisição de conhecimentos sobre pessoas e objetos no meio. Segundo (STILLMAN e BATTLE, 1984), baseando-se nesses estudos Van Dijk elaborou uma abordagem metodológica educacional focada nos precursores cognitivos e sociais da linguagem. Este método foca no desenvolvimento destas habilidades, dentro de um contexto de interação social, onde a comunicação não é vista como uma habilidade independente, mas como um aspecto cognitivo e um reflexo do desenvolvimento cognitivo revelado durante interações sociais. O programa proposto por Van Dijk não deve ser entendido como uma seqüência de atividades comunicativas realizadas isoladamente, mas em algo que estabelece e permeia todas as atividades diárias da criança. São propostas seis etapas seqüenciais principais: nutrição, ressonância, movimentos co-ativos, referência não-representativa, imitação e gestos naturais, onde não há um limite formal entre as etapas e a criança pode freqüentar mais de uma (STILLMAN e BATTLE, 1984). A fase da relação de apego e confiança (nutrição) consiste no desenvolvimento de um vínculo afetivo entre a criança e o adulto. Van Dijk 22 descreve esta fase como o momento em que se procura desenvolver com a criança uma relação de segurança que a faça sentir-se confortável consigo mesma e com o outro (BRASIL, 2003). A ressonância consiste no movimento corpo a corpo, sendo que a iniciativa do movimento parte da criança. O objetivo desta fase consiste na introdução de modalidades de comunicação baseadas no movimento. Neste período, estabelece-se um vínculo corporal entre o adulto e a criança, a partir do qual o adulto passa a fazer parte do universo dela. A ação corporal permite estabelecer um diálogo por meio do movimento, e a partir dele, o adulto poderá introduzir sinais indicativos marcando o início e o término do movimento, ampliando-o e sistematizando-o. O movimento co-ativo ou mão sobre mão, caracteriza-se pela ampliação comunicativa entre o estimulador e a criança, em um espaço mais amplo. Nesta etapa, o professor realiza ações junto à criança, por meio do contato lado a lado e aos poucos a distância física entre eles vai sendo ampliada. O objetivo do trabalho nesta fase consiste em ampliar os recursos de comunicação e a ação motora da criança no espaço, bem como possibilitar o desenvolvimento da habilidade de antecipação de acontecimentos em uma área determinada (BRASIL, 2003). O objetivo da fase da referência não representativa consiste em propiciar condições para que a criança compreenda alguns símbolos indicativos de atividades, pessoas e situações. A partir do momento em que a criança consegue reconhecer e localizar as partes do corpo, o professor pode iniciar o uso de representações mais abstratas mediante a utilização de objetos de referência. Para tanto, é importante que os objetos de referência utilizados retenham uma equivalência simbólica com o real e com a atividade a ser desenvolvida. Os objetos viabilizam o contato e a condição concreta de manutenção do diálogo entre a criança e o adulto (BRASIL, 2003). 23 (STILLMAN e BATTLE, 1984), quando enumeram áreas que enfocam o desenvolvimento do comportamento imitativo, citam: 1) A compreensão pela criança da correspondência entre suas ações e as ações observadas nos outros; 2) A capacidade de a criança imitar o adulto, demonstrando que compreendeu como deverá realizar as ações; 3) A capacidade de a criança ampliar a imagem mental dos objetos com os quais mantêm contato, seja pela visão, audição ou tato. (VAN DIJK, 1983) assinala que, depois que a criança for capaz de utilizar espontaneamente uma série de gestos naturais no contexto de uma rotina diária contínua, pode-se introduzir gestos da língua de sinais (no caso brasileiro, LIBRAS - Língua Brasileira de Sinais) por meio dos processos de desnaturalização e descontextualização (BRASIL, 2003). Pode-se fazer um paralelo, entre os autores mencionados no presente trabalho, ou seja, (VIÑAS, 2004) e (VAN DIJK, 1983). É possível notar que na proposta de Viñas, que seu primeiro nível é o da interação e propõe o estabelecimento de um vínculo e o desenvolvimento da compreensão de que suas ações influenciam as ações do outro é consonante com as etapas de nutrição e ressonância de Van Dijk. O segundo nível proposto por Viñas com relação à comunicação estaria relacionado com os movimentos co- ativos, referência não-representativa, imitação de Van Dijk, por estabelecer que é o momento da atenção compartilhada e da troca de turnos. Enquanto o terceiro nível de acordo com Viñas seria a formalização de um sistema e ampliação de vocabulário, o que entraria ainda nas etapas de imitação e gestos naturais de Van Dijk. Este paralelo encontra- se exposto no Quadro 1. 24 Quadro 1. Paralelo entre os níveis de (VIÑAS, 2004) e (VAN DIJK, 1983) Percebe-se que (PEASE, 2000) traz parâmetros que também se encaixam na abordagem de Van Dijk, pois ela estabelece que há a necessidade de caminhar de uma comunicação reflexiva a uma mais intencional, de uma situação contextualizada a uma descontextualizada onde no início os elementos são simples passando então a avançados e finalizando com a ampliação de vocabulário. Como visto, diversos autores se colocam em relação ao surdocego pré- lingüístico e a importância da comunicação para seu desenvolvimento e há certa consonância em seus pontos de vista. O que fica mais marcante é a evidência que a comunicação não se desenvolve ou se desenvolve de maneira limitada na população referida, apontando para a necessidade fundamental de se estabelecer um programa de intervenção específico e individual. (MAIA, 2004) aponta para o fato que a realização de orientação e atendimento ao surdocego, objetivando independência e autonomia, requer conhecimentos básicos e específicos em sistemas de comunicação individualizado e apropriado para cada surdocego. Conforme (MAIA, 2004): Os profissionais que dispõem desses conhecimentos específicos são poucos na atual realidade brasileira, mas é grande o número de pessoas com surdocegueira e múltipla deficiência que necessitam de orientação Vinãs (níveis) Van Dijk (etapas) Interação Nutrição e ressonância Comunicação Formalização de um sistema e ampliação de vocabulário Movimentos co-ativos referência não representativa imitação Imitação e gestos naturais 25 específica básica para ter condições mínimas de qualidade de vida, ou seja: comunicação, independência nas atividades de vida diária (alimentação, higiene e vestimenta) e orientação e mobilidade visando autonomia para realização dessas ações (MAIA, 2004: p. 2). Pode-se perceber que há a necessidade em se qualificar e capacitar profissionais que estejam aptos a atuar e prestar serviços junto a esta população. Em outros países, como o Canadá, além de professores especializados, há outros profissionais formados para atender a pessoa com surdocegueira, chamados instrutores mediadores. 26 Capítulo III Estratégias de Ensino “Re-significando as estratégias de ensino” A aquisição de conhecimentos está vinculada à interação comunicativa estabelecida nas trocas de experiência compartilhadas que ocorrem em situações vivenciadas pelas pessoas. (VAN DIJK, 2004: p. 12) define essa interação comunicativa como “um processo através do qual os indivíduos influenciam mutuamente no comportamento do outro”. Aprender, portanto, passou a ser considerado a possibilidadee a disponibilidade da pessoa buscar e adquirir conhecimentos que passassem a fazer parte de seu cotidiano. Pensemos agora no que nos diz (HELEN KELLER, 2001) ao referir-se à atitude dos educadores: Quantos professores existem à testa de classe numerosa e como são poucos os que sabem ensinar de fato! Para trabalhar com proveito, os alunos não podem estar subjugados pelo pavor: devem sentir-se tão a gosto como nas horas de descanso; têm necessidades de expandir-se para gozar a vitória das respostas certas... (HELLEN KELLER, 2001: p. 41). Ao concebermos que a aprendizagem acontece de forma diferenciada para todos os indivíduos, no caso das pessoas com surdocegueira e/ou com deficiência múltipla sensorial, devemos estar atentos às estratégias de ensino que possibilitem vivenciar propostas significativamente, passo a passo, respeitando suas possibilidades e habilidades. Partiremos de alguns pontos iniciais para refletirmos o que envolve as estratégias de ensino: · Princípio de interação · Mediação · Estratégias de ensino 27 Princípio de interação Van Dijk ao referir-se à pessoa com surdocegueira deixa claro que é por meio da troca de experiências e informações através da interação com o outro que os mesmos poderão aprender sobre o mundo. Mais do que pelo uso de métodos no trabalho, ele nos coloca que o verdadeiro educador dessas pessoas é quem consegue realmente uma interação comunicativa com ela (VAN DIJK, Apud AMARAL, 2002: p. 127). Conhecendo mais profundamente a vida de Helen Keller, poderemos observar as inúmeras vezes que relata a grande importância contida na construção de uma relação pessoal e confiante citada por Van Dijk como importante no processo de inter-relação, estabelecida entre ela e sua professora, e o quanto essa ação influenciou seu desenvolvimento. Tomemos conhecimento de uma dentre muitas maneiras que essas ações ocorreram: Foi o gênio de minha professora, sua inefável atração e inexcedível generosidade, que garantiram o êxito dos primeiros anos de minha educação. Porque ela sabia aproveitar as boas oportunidades para insuflar-me os conhecimentos no espírito. Tudo o que estudei com ela era motivo de prazer. Ela compreendia perfeitamente que o espírito da criança é como o regato que saltita pelas pedras do leito afora, refletindo ora bosques de espinheiro, ora flocos de belas nuvens (HELLEN KELLER, 2001: p. 41). Esses autores enfatizam a importância do processo de inter-relação que propicia àqueles com privação sensorial interagir no meio e com o meio. Proporcionar esse contato, com diferentes pessoas e ambientes contribuirá para a construção de sua identidade e para a capacidade da pessoa com surdocegueira exprimir suas decisões e fazer escolhas melhorando sua qualidade de vida. A comunicação é o meio pelo qual todos os seres humanos estabelecem relações sociais, é através dela que o sujeito expressa seus desejos e necessidades. Antes de uma criança aprender a falar, ela sabe se comunicar, através do choro, sorriso, fazendo uso de gestos por mais 28 singelos que sejam. Comunicação é conceituada como “algo que vai mais além do que uma mera recepção e expressão de linguagem falada ou escrita” (MCINNES; TREFFRY, 1988: p. 61). Conforme Van Dijk, em seus estudos, uma pessoa com surdocegueira poderá não desenvolver a fala, porém ela sempre terá possibilidade de se comunicar. Isso será possível se acreditarmos que ao estabelecermos inter-relação com a pessoa que está expressando algo, estaremos decodificando sua mensagem dando-lhe sentido e respondendo a ela, essa ação poderíamos denominar, segundo o autor citado, de interação comunicativa. Cabe então às pessoas que interagem com a pessoa surdocega e/ou com deficiência múltipla sensorial, respeitar a individualidade, especificamente de cada situação e o tempo de elaboração, permitindo assim que os mesmos possam ser interlocutores e não executores de tarefas. (CUSHMAN, 1992) na afirmação sobre a interação comunicativa nos auxilia na compreensão da grandeza dessa ação: É importante dar à criança a oportunidade de aprender a expressar-se sem antecipar automaticamente suas necessidades (...). Por exemplo, se você sabe que a criança tem fome, em lugar de colocar frente a ela, diga- lhe tem vontade de comer. Igualmente permita que se produza uma “pausa”, não se apresse sempre a completar o que trata de descrever. Algumas crianças só necessitam de mais tempo para expressar algo e agradecem que se lhes der a possibilidade de fazê-lo (CUSHMAN, 1992: p. 11). Ao afirmarmos, portanto, que linguagem está diretamente ligada à combinação de signos lingüísticos e que comunicação vai além do oral, não devemos deixar de refletir quando (VYGOTSKY, 1991: p. 5) cita que “o entendimento entre as mentes é impossível sem alguma expressão mediadora...”. Pensando na pessoa com surdocegueira e/ou com deficiência múltipla 29 sensorial, que não tem as informações nítidas visuais e auditivas, o mundo ao ser apresentado a ela poderá ser compreendido como algo confuso, com possibilidade de perigos onde as aventuras e descobertas estão distantes de seu alcance. Se o instrutor mediador não tiver conhecimento a respeito das necessidades da pessoa com surdocegueira e/ou com deficiência múltipla sensorial, e não souber usar os diferentes sistemas de comunicação com e sem apoio, além da fala e Libras, não estará desempenhando o papel enquanto mediador da ampliação de conhecimento e descoberta constante no dia-a-dia. Apoiando-nos nas definições anteriormente citadas de (CUSHMAN, 1992), (MCINNES E TREFFRY, 1998), essas pessoas com surdocegueira e/ou deficiência múltipla sensorial poderão encontrar-se nessa determinada situação desacredito na possibilidade do estabelecimento de um vínculo, na qual a interação comunicativa possa ser estimulada, desenvolvida, explorada e ampliada. Torna-se primordial, portanto que a comunicação seja o centro da intervenção. Todas as pessoas envolvidas diretamente com as pessoas surdocegas e/ou com deficiência múltipla sensorial, devem observá-las e procurar responder a sua forma de comunicação o mais cedo possível, como pode ser lido a seguir: Dito simplesmente é impossível não comunicar. Todos comunicam, ainda que de diferentes níveis de simbolização e com formas de comunicação diversas. O estabelecimento do caráter comunicativo de vários comportamentos depende da forma como o ambiente responde às primeiras reações do bebê: este se habitua a ser respondido ou não e estas primeiras trocas são determinantes para o estabelecimento da própria intenção comunicativa (AMARAL, 1997: p. 11). Conforme a mesma autora, a comunicação poderá ser, receptiva ou expressiva para pessoas com surdocegueira e/ou deficiência múltipla sensorial. No entanto alguns pontos são fundamentais para que elas ocorram, como: envolvimento, à vontade de trocar informações com 30 alguém, algo para transmitir, alguém a quem transmitir e uma forma de como transmitir, conforme a Declaração de Direitos da Comunicação¹ terá a garantia de que estaremos buscando uma melhora da qualidade de vida possibilitando a autonomia e independência. Considerando essas reflexões e ressignificando nosso olhar, algumas mudanças em nossa prática que se referem a essa interação, poderão torná-la significativa se lançarmos mão de alguns aspectos, tais como: 1. Uso de uma abordagem colaborativa e funcional: Por abordagem colaborativa entendemos que esta é ligada a uma programação educacional de pessoas com deficiência múltipla sensorial e surdocegueira. “Ela centra suas ações nas necessidades e nos valores das famílias e da pessoa com deficiência, visandoqualidade de vida” (NUNES, 2007: p. 20). Por abordagem funcional entendemos que se centra nas necessidades atuais e futuras das pessoas com Surdocegueira e Deficiência Múltipla Sensorial visando autonomia e independência nas realizações das atividades no dia-a-dia (MAIA & GIACOMINI, 2007). · Família: é membro da equipe; · Programas de Atendimentos: Trabalho em Educação e Saúde em parceira; · Atividades funcionais: são aquelas que envolvem habilidades utilizadas imediatamente pelos alunos e que são planejadas pelo professor com materiais reais, isto é, da vivência do aluno (MAIA & GIACOMINI, 2007). 2. Estabelecimento de vínculo com a criança: Quando ocorrem as perdas concomitantes de visão e audição as pessoas com surdocegueira necessitam de referências para identificar com quem está, o que vai fazer, e onde vai estar, por isso é importante manter a ¹National Joint Committe for the Communication needs of Persons with Severe Disabilities (1992). Guidelines for Meeting the Communicantion Needs of Persons with sever Disabilities. ASHA, 34 (March, supp.7) 1-8. 31 princípio a referência de uma pessoa para que ela consiga reconhecer e sentir-se segura. · Relação de confiança: Por exemplo: O professor escolhe um objeto como referência pessoal e passa a utilizá-lo e apresenta a pessoa com surdocegueira toda vez que estiver próximo dela ou ao interagir com ela. · Dar o tempo necessário: cada criança vai ter o seu tempo para formar este vínculo. Alguns em poucas semanas já aceitam e reconhecem a professora e as pessoas mais próximas do seu cotidiano. Outros têm mais dificuldades de formar este vínculo e podem demorar meses para que isto ocorra. · Aceitação ou não do toque: Neste processo de sentir-se seguro, ocorre que muitas pessoas com surdocegueira e/ou com deficiência múltipla sensorial resistem a princípio a ter uma interação, sendo necessário um tempo maior para estabelecimento do vínculo. Podem também ser resistente ao toque, ou seja, defesa tátil. Por defesa tátil entendemos que é a forma como a criança experimenta e reage de maneira negativa e emocionalmente às sensações do tato, segundo (AYRES, 1989). 3. Estabelecer uma rotina previsível com uma comunicação consistente e atividades claras de transição: Para entendermos o que é uma rotina previsível podemos dar um exemplo para ficar mais claro. Quando as famílias conseguem organizar os horários em casa permitindo que haja antecipação pela pessoa com deficiência das atividades que ela irá realizar. Essa rotina deve ocorrer com maior freqüência na vida pessoa com surdocegueira e da pessoa com deficiência múltipla sensorial para organizá-la. O uso de diferentes sistemas de comunicação para antecipar a rotina vai permitir uma comunicação consistente, na qual a pessoa com surdocegueira e a pessoa com deficiência múltipla sensorial identifica o que vai ser realizado. 32 · Considerar o nível de comunicação: Considerar o nível de comunicação e ser consistente exige do mediador ou professor conhecer qual o sistema de comunicação da pessoa surdocega (Libras, Braille, escrita, movimento corporal, expressão corporal etc.) para poder preparar as estratégias e o material de uso do aluno no sistema de comunicação que ele domina. Ou iniciar no sistema mais básico de comunicação (gestos indicativos e naturais) e depois iniciar o processo de comunicação através dos objetos de referência. · Usar diferentes sistemas de comunicação: conhecer os diferentes sistemas para estar atento às necessidades de seu aluno. · Planejar e implementar sistemas de comunicação: escolher os melhores sistemas de comunicação para seu aluno e buscar sempre novos sistemas à medida que ele vai avançando no entendimento da comunicação. · Reforçar a antecipação e participação - criar ritmo: Promover atividades que levam a troca de turnos (minha vez sua vez). O professor realiza o movimento com o aluno e espera que ele repita qualquer movimento ou sinalização para dizer que quer continuar a brincadeira. · Usar referências sensoriais para início e término de atividade: No uso de referências sensoriais para indicar o início e o fim da atividade podemos dar como exemplo, o calendário. Ao escolher o material a ser utilizado (caixas de sapatos, cestos de plásticos e etc.) para disposição dos objetos de referências que antecipam as atividades, colocar cores ou texturas diferentes para a caixa inicial e para caixa que indica que a atividade acabou, fazendo assim, uma diferenciação em tamanho e cor (Por exemplo, o que se pode constatar na Figura 43 e 45). 33 4. Aprender sistematicamente sobre o estilo de aprendizagem individual de cada pessoa: Conhecer o estilo de aprendizagem é observar como a pessoa com surdocegueira e/ou com deficiência múltipla processa a informação recebida utilizando os canais sensoriais (visão, audição - residuais, olfato, tato, paladar, vestibular, cinestésico e proprioceptivo). · Focalizar o processo de aprendizagem e não só o resultado: Garantir o entendimento passo a passo para o aluno é mais importante e significativo do que fazer toda a atividade. O resultado só se torna significativo quando o aluno entendeu cada parte do processo da atividade e assim, entende o seu resultado. · Ter informações de todos que atuam com a criança: Estar em contato constante com todos que trabalham com a pessoa, observando como ocorrem as respostas para implementar ou rever as estratégias utilizadas. · Observar como ocorrem as respostas: É necessário observar a criança como um todo. Temos que estar atentos a cada detalhe, pois, uma confirmação de que gostou de uma brincadeira pode resultar na expressão de uma sobrancelha que se move, de um pé balançando ou mesmo na modificação de um tônus muscular que se enrijece para dizer que está respondendo à nossa solicitação. · Estar atento às necessidades da criança, para poder rever as atividades: É preciso estar atento por qual canal sensorial à criança dá mais respostas e buscar atividades que contemplem este canal sensorial. Por exemplo: se a criança aprende mais por movimentos (cinestesia), temos que selecionar atividades como circuitos de brincadeiras, ir ao parque e outras para garantir sua compreensão para aquilo que estamos planejando. 34 5. Ser paciente: · Dar o tempo necessário: Aguardar o tempo necessário para a pessoa com surdocegueira e/ou com deficiência múltipla sensorial processar a informação. Crianças com deficiência múltipla precisam de mais tempo para processar todas as informações recebidas. · Ser sensível a fadiga da pessoa e a necessidade de descanso: Ser paciente, no sentido de verificar se no dia anterior ocorreu algum contratempo (convulsão, dores, problema de respiração) com a pessoa. Aqui também é importante saber sobre a etiologia da criança, pois isto nos dará informações de algumas síndromes que necessitam de mais tempo de descanso, como por exemplo, as crianças nascidas com rubéola, que é esperado um quadro de cansaço maior para caminhar por apresentarem encurtamento de tendão. 6. Evite guiar as mãos da pessoa: · Convide-a dar respostas, através de todos os meios: Quando uma pessoa apresenta deficiências sensoriais combinadas (visão e audição) eles passam a utilizar os outros sentidos sensoriais remanescentes: tato, olfato, paladar, cinestésico, proprioceptivo e vestibular para integração das informações recebidas e na organização do pensamento estruturando e formando os conceitos sobre o que está à sua volta. A pessoa com surdocegueira a princípio só vai se interessar e reconhecer o que chegar as suas mãos, pois geralmentepodem apresentar resistência na interação com o outro por insegurança. Deixar as mãos da pessoa surdocega ou da pessoa com deficiência múltipla sensorial livre, permite que eles a utilizem para explorar e quando não se sente motivado. · Usar mãos sobre mãos: a técnica do uso da mão sobre mão, ou seja, a mão da professora ou do mediador fica abaixo da mão da pessoa 35 com deficiência, guiando e favorecendo: segurança, confiança e motivação para explorar ou tocar pessoas, animais e objetos. Desta forma a pessoa com surdocegueira e/ou com deficiência múltipla sensorial poderá ser convidada a respostas, fazer escolhas e querer interagir com mais pessoas por adquirir a relação de confiança. 7. Implemente um meio ambiente consistente: · Estabelecer um lugar com limites espaciais e de conteúdo: é importante que a criança possa pouco a pouco reconhecer os ambientes que elas freqüentam através de objetos de referência que estão neste ambiente e saber que conteúdo ou atividade é realizado neste espaço. · Oferecer tempo necessário para explorar: é importante oferecer o tempo que cada criança necessita para que elas comecem a explorar cada espaço e possam se sentir seguras, e assim, consigam identificar esses lugares, começando a formar mapas mentais desses ambientes. · Usar objetos que convide a respostas: podemos usar objetos que convidem as crianças a terem respostas visuais, auditivas, proprioceptivas, motoras (cinestésicas). Esses brinquedos ou brincadeiras servem para que as crianças procurem pedir ou saber que determinados lugares têm estes objetos ou podem ser realizadas as brincadeiras preferidas. 8. Use objetos e equipamentos estimulantes: · Brinquedos de causa e efeito: brinquedos que quando ligados, apertados em seguida produzem som, luz, vibração. · Jogos multisensoriais que promovam uma interação comunicativa: brincadeiras que englobam movimento, música, estimulação visual, propriocepção, sentido vestibular, tátil. Por exemplo, promover circuito de brincadeiras para que sejam contemplados esses sentidos sensoriais. 36 · Software com comunicação alternativa: existem vários tipos, como o JAWS, o Dos-Vox, Virtual Vision que são sintetizadores de voz para as pessoas que podem ouvir e não podem ver. Esses sintetizadores de voz podem ler o que aparece na tela do computador e os programas de Windows, internet e outros. Já as pessoas que não podem ver e nem ouvir podem fazer uso do display Braille que é um aparelho que transmite as informações da tela do computador em celas de Braille e assim, as pessoas surdocegas podem ler e acessar. Temos uma citação de Helen Keller que confirma esses níveis de interação: Minha vida é uma crônica de amizades. Meus amigos, todos à minha volta criam meu mundo renovado a cada dia. Sem sua carinhosa atenção, toda a coragem que eu pudesse juntar não seria suficiente para manter meu coração batendo forte para a vida. (HELLEN KELLER, 2001: p. 40) Mediação A pessoa com surdocegueira e/ou com deficiência múltipla sensorial tem suas vias de audição e visão prejudicadas, porém a ela deve ser dada a oportunidade de desenvolver o uso dos outros sentidos e seu corpo como um todo, enriquecendo e reorganizando assim seu esquema corporal. Segundo a metodologia de Van Dijk, o movimento é básico para descobrir e interagir com o meio ambiente. Este movimento necessita do apoio de uma interação de perto e significativa com uma pessoa de cuidados em particular, de forma a fornecer segurança e encorajar a pessoa surdocega e o deficiente múltiplo a explorar o ambiente (AMARAL, 2002: p. 127). Vivenciar todas as propostas significativamente, passo a passo, da mais simples à mais complexa oferece ao Surdocego e ao Deficiente Múltiplo a oportunidade de participar do mundo. Eles necessitarão conviver com pessoas que estejam disponíveis a mediar essa vivência auxiliando-os a conhecer e interpretar o que está a sua volta. Aprendendo posturas, conceitos, habilidades, linguagem, comunicação, desenvolvendo sua 37 autoconfiança e identidade própria. O mundo exterior passará a ser constituído pelo estímulo dos sentidos e não recopiado de forma mecânica através das mãos do vidente. Hoje em dia, concebemos que a aprendizagem acontece de forma diferenciada para todos os indivíduos, no caso do Surdocego e do Deficiente Múltiplo devemos cuidar para que o tato, olfato, paladar, sejam estimulados, bem como seus resíduos auditivos e visuais. Esses estímulos podem auxiliar de maneira que as informações possam ser construídas gradativamente em seu cérebro, de forma que a pessoa venha construir imagens compreendendo o que está a sua volta. Pensemos em cada um dos nossos sentidos e as possibilidades que eles podem nos oferecer como caminho para uma interação comunicativa. Estratégias de ensino Falamos aqui em procurar compreender como a pessoa aprende, seu estilo de aprendizagem, que segundo (KEEFE, 1979) foi sistematizado como: Um conjunto de fatores cognitivos, psicológicos, emocionais e características que servem como indicador relativo de como a pessoa percebe, interage e responde ao ambiente de aprendizagem. Algumas contribuições que podem auxiliar no aprendizado das pessoas referem-se a estarmos atentos ao seu estilo de aprendizagem, isso poderá: · Auxiliar o professor e a escola a ser sensível às especificidades e particularidades que os alunos trazem para sala de aula; · Servir de orientação para planejar as atividades; · Ajudar a aprender de outras maneiras e favorecer aspectos pessoais não desenvolvidos anteriormente. Para compreendermos o estilo de aprendizagem necessitamos: 38 · Providenciar registro sobre como as pessoas percebem, interagem e respondem ao ambiente de aprendizagem; · Esforço consciente do mediador em expandir seu leque de técnicas e estratégias; · Saber as preferências do aluno. Algumas sugestões para promover a aprendizagem das pessoas coletando dados e registrando qual é seu estilo de aprendizagem possibilitará: · Promover uma pesquisa, em sala de aula, para obter informações sobre os estilos de aprendizagem que os alunos estão utilizando para realizar a pesquisa; · Estabelecer experiências que ajudem o aluno a aprender de forma significativa; · Ter inventários sobre estilos de aprendizagem. Ao coletarmos e registrarmos todas essas informações compreenderemos como essas se processam para cada uma das pessoas. Dessa maneira estaremos contemplando espaço para vivências reais na elaboração de atividades funcionais, que são a oportunidade dos alunos de demonstrarem suas habilidades funcionais nas atividades que são planejadas pelo professor com materiais do dia a dia deles. As diferentes estratégias de ensino poderão ocorrer por meio de adaptações necessárias e do uso de Tecnologia Assistiva², respeitando as possibilidades e habilidades de cada aluno. ²O Comitê de Ajudas Ténicas (CAT), conceituou o termo Tecnologia Assistiva como área do conhecimento de característica interdisciplinar que engloba produtos, recursos, metodologia, estratégias, práticas e serviços que objetivam promover a funcionalidade, relacionada à atividade e participação de pessoas com deficiência, incapacidade ou mobilidade reduzida, visando sua autonomia, independência, qualidade de vida e inclusão social. (CAT, 2007). 39 Capítulo IV Instrutor Mediador Quem é esse Profissional? Quando no referimos às pessoas com surdocegueira e/ou com deficiência múltipla sensorial as necessidades de comunicação, orientação e mobilidade e de estar em interação com o mundo requerem dos profissionais um trabalho de intervenção contínua. A intervençãobaseia-se no fato de que outra pessoa possa ser mediadora do mundo, está parece ser a chave para a pessoa com surdocegueira e/ou com deficiência múltipla sensorial compreender o mundo no qual está inserido, fazendo parte do mesmo de maneira autônoma. O termo foi criado no Canadá, ele é utilizado para designar a pessoa que é especializada em intermediar o mundo para a pessoa com surdocegueira ou deficiência múltipla sensorial. Profissionais da The W. Ross Mac Donald School Deafblind Resource Services (Canadá), que organizam as atividades a serem realizadas com as pessoas com surdocegueira e com deficiência múltipla sensorial, sistematizaram o processo de intervenção como uma metodologia que permite aos indivíduos surdocegos e deficientes múltiplos sensoriais receber informação não distorcida (visual e auditiva) por serem incapazes de obter por si mesmos, de tal forma que possam interagir com o meio ambiente e, portanto ter a capacidade de estabelecer e manter um controle máximo sobre suas vidas. No Brasil, adotamos o nome de “INSTRUTOR-MEDIADOR” para designar este profissional, pois está mais próximo de nossa realidade e aos trabalhos que estão sendo desenvolvidos com essa população. O papel de intervenor, sistematizada pela The W. Ross Mac Donald School Deafblind 41 Resource Services, representa o profissional que fornece intervenção para uma pessoa surdocega e deficiente múltipla sensorial. Ele faz a mediação entre a pessoa que é surdocega e o seu ambiente para capacitá-la a se comunicar com o mesmo efetivamente e receber informações não distorcidas do mundo a seu redor. Nós do Grupo Brasil estamos preocupados e envolvidos em realizar cursos para formação de profissionais que facilitem o processo de inclusão, bem como promovam qualidade neste processo. Esse profissional deverá ser capacitado e habilitado em comunicação e em outros aspectos relacionados a surdocegueira e a deficiência múltipla sensorial e que possa trabalhar junto da equipe educacional da unidade de ensino. Falamos aqui de uma pessoa que deverá proporcionar o acesso à informação, ambientes e materiais, orientado pela equipe diretiva da escola e do professor, para que possa adequar e/ou adaptar os conteúdos educacionais de acordo com o programa individual do aluno e as necessidades do mesmo. As estratégias para isso envolvem primordialmente o estabelecimento da comunicação que poderá guiar o aluno através das atividades e exploração prática de materiais e ambiente, de acordo com seu estilo de aprendizagem. É um profissional que não pode substituir o professor e nem ser substituído por outros profissionais, pois ele tem conhecimento de um sistema alternativo de comunicação e formas individuais de comunicação do aluno que abrangem a recepção e a expressão oferece informações conceituais e adicionais sobre o que ocorre ao redor do aluno para sua total compreensão. Sua função é de estar sempre com o aluno em todos os lugares que ele freqüenta e se necessário preparar e adaptar materiais para que ele possa entender e participar das atividades, principalmente as escolares. As primeiras experiências demonstram que o desempenho dos alunos foi melhor com a presença dos instrutores mediadores. 42 Maia descreveu que a criação da função do instrutor mediador e as suas atividades a serem desenvolvidas com a pessoa com surdocegueira e/ou deficiência múltipla sensorial no Brasil foram idealizadas após a formação de profissionais do Grupo Brasil, no College Brown, em 2004, no Canadá. Um breve histórico sobre o Intervenor foi descrito por (SOUZA, 2006), cuja sistematização é apresentada a seguir. Em 1960 foram identificados no Canadá muitos casos de crianças surdocegas por seqüelas da Síndrome da Rubéola Congênita, muitas destas crianças foram para escolas nos EUA para serem educadas. Neste mesmo ano professores do Canadá foram para a Perkins School for the Blind em Massachussets EUA para receber treinamento e trabalhar com crianças surdocegas. Em 1965, os estudantes canadenses tiveram que retornar dos EUA, pois havia muitos casos de surdocegueira nos EUA também. No Canadá foi iniciado um programa de atendimento para surdocegos na W. Ross Macdonald School em Brantford pela professora Jacquie McInnes, esposa de John MacInnes, a princípio eram atendidos apenas 3 (três) alunos surdocegos. Após alguns anos de atendimento ao surdocego, os canadenses desenvolveram a filosofia da “Intervenção” baseada no fato de que outra pessoa mediando o mundo para pessoa surdocega parece ser a “chave” para o sucesso. O primeiro termo escolhido para nomear esta pessoa foi “Mediador”, mas este termo já era usado para nomear alguns profissionais na área de educação. Eles procuravam um termo exclusivo para a pessoa que trabalhava intermediando o mundo para o surdocego, assim o termo INTERVENOR foi escolhido e é utilizado para designar a pessoa que é especializada em intermediar o mundo para o surdocego. Ele faz a mediação entre a pessoa com surdocegueira e/ou com deficiência múltipla sensorial e o seu ambiente para capacitá-la a se comunicar efetivamente e receber informações não distorcidas do mundo ao seu redor. 43 Intervenção para pessoa com surdocegueira e para pessoa com deficiência múltipla sensorial O que significa? É o processo que permite às pessoas surdocegas e as pessoas com deficiência múltipla sensorial receber informações não distorcidas; isto é, as imagens visuais e os sons, por não conseguirem obtê-los por si mesmos, de tal forma que possam interagir com o meio ambiente e, portanto ser capaz de estabelecer e manter um controle máximo sobre suas vidas, conforme sistematização dos profissionais da instituição The W. Ross Macdonald School Deafblind Resource Services, Brantford, Ontário. A Intervenção parece ser um conceito simples, fácil de explicar e mais fácil ainda de implementar. Na realidade, é um PROCESSO organizado para interceder entre a criança, o jovem, ou o adulto com surdocegueira e/ou com deficiência múltipla sensorial e o ambiente de forma que a deficiência ou as deficiências serão minimizadas e, portanto, permitirá a pessoa com deficiência estabelecer e manter o máximo controle sobre sua vida. O processo de intervenção (mediação) não é definido pelas habilidades do instrutor mediador, mas sim pelas necessidades das pessoas com surdocegueira e/ou as pessoas com deficiência múltipla sensorial. Segundo a Canadian Deafblind & Rubella Association (CDBRA-1995), os princípios do conceito de “intervenção” são: 1. Uma total e incondicional crença e respeito pela pessoa com surdocegueira e/ou com a pessoa com deficiência múltipla sensorial. 2. Todas as pessoas com surdocegueira e/ou com deficiência múltipla sensorial podem beneficiar-se da intervenção. 3. Todas as pessoas com surdocegueira e/ou com deficiência múltipla sensorial têm acesso correto a informação em seu modo preferencial. 44 4. Intervenção é “fazer com, não fazer por”. 5. Não devemos fazer suposições a respeito das habilidades das pessoas com surdocegueira e/ou com deficiência múltipla sensorial. 6. Intervenção não é uma fórmula “milagrosa”, mas ela provê mais oportunidade para as pessoas com surdocegueira para receber a informação, processar e desenvolver conceitos e comunicação. 7. Nunca subestime a importância da interação entre o instrutor- mediador e a pessoa com surdocegueira e/ou com deficiência múltipla sensorial. 8. Intervenção é sempre uma forma de promover: antecipação, motivação, comunicação e confirmação. 9. Intervenção deve ser utilizada em todas as situações para poder aprender através dasexperiências. 10.Cada intervenção requer uma forma específica para cada pessoa com surdocegueira e/ou com deficiência múltipla sensorial, isto vai variar de acordo com a necessidade. 11.O foco da intervenção deverá estar sempre centrado na necessidade específica da pessoa com surdocegueira e/ou com deficiência múltipla sensorial. O que é Mediação para as pessoas com surdocegueira e para pessoas com deficiência múltipla sensorial Conforme (MCINNES, 1995), a mediação é baseada no conceito filosófico de que O que você acredita ser verdade é verdade para você. A aplicação deste conceito à pessoa com surdocegueira e/ou com deficiência múltipla sensorial significa que ela deve ser capaz de tomar decisões, de acordo com observações obtidas do meio em que ela se insere, dentro de um período razoável de tempo. Portanto, podemos interpretar a mediação 45 como senso uma interação do individuo com o seu ambiente e não um trabalho que alguém faça para uma pessoa com essas deficiências. Seria então uma antecipação, informando sempre a esta pessoa o que vai acontecer, fazer escolhas apropriadas, planejar ações futuras, modificar habilidades para melhorar o desempenho, planejar ações e interagir com sucesso no ambiente. Temos que dar ênfase a dois aspectos importantes na mediação tanto das pessoas com surdocegueira como das que possuem deficiência múltipla sensorial: 1. O conhecimento e as habilidades adquiridas com a mediação de uma pessoa, não significa que o instrutor mediador deve utilizar os mesmos recursos com outra pessoa que apresente a mesma deficiência, por isso a necessidade de uma supervisão constante. 2. A Formação Continuada e o Treinamento em Comunicação Alternativa, a Tecnologia Assistiva e outros métodos são necessários para dar suporte a essas pessoas, além do entendimento de como a deficiência influi em todos os estágios do desenvolvimento. A utilização apropriada de técnicas e métodos individualizados é de grande importância para a melhoria da qualidade de vida destas pessoas. O papel fundamental do instrutor mediador é o de dar informações objetivas, cuidar para que não sejam distorcidas e que permitam às pessoas que apresentam essas deficiências, praticar e desenvolver habilidades de forma a assumirem responsabilidades. 46 Níveis de Interação do Instrutor Mediador com a pessoa surdocega e/ou com deficiência múltipla sensorial Nos Quadros, abaixo apresentados, estão registrados os níveis de interação entre o mediador e a pessoa surdocega e/ou com deficiciência múltipla sensorial³. Quadro 1 - Nível Imediato Com propósito de: • Ir ao encontro das necessidades imediatas; • Programa de implementação; • Apoio na tomada de decisões. Quadro 2 - Nível Básico Procurar suprir as necessidades de: • Antecipação; • Motivação; • Comunicação; • Generalização para apresentar material em nível apropriado de: Alerta, Aquisição, Aplicação, Transferência. Quadro 3 - Nível Base Aumentar o nível de controle e responsabilidade que a pessoa surdocega e a pessoa com deficiência múltipla sensorial tem sobre: • Quem será o instrutor mediador; • Que atividades serão conduzidas quando, como, por quanto tempo, e quão bem; • Como o instrutor mediador irá fornecer a intervenção necessária. ³Quadros adaptados de MacInnes (1995). 47 Ao observarmos a Tabela 1 entenderemos o processo interativo da mediação. Tabela 1. Descrição para o Trabalho Fonte: Guia de Auto Avaliação para Intervenor - Canadá, 1995. Objetivos do Instrutor Mediador Seqüência de Interação entre ambos Seqüência de Reação Resposta Individual ATENÇÃO Motivar a criança a querer fazer a atividade e introduzir a linguagem à mesma. CO-ATIVA 1 + 1 = 1 RESISTE A ATIVIDADE Tolera atividade proporcionada pelo instrutor mediador AQUISIÇÃO Aprender as seqüências, rotinas. Habilidades e atitudes necessárias para conduzir e relacionar a atividade com o instrutor mediador. Linguagem apropriada para todos. CO-OPERATIVA 1 + 1 = 11/2 COOPERA PASSIVAMENTE Dá assistência, orientação. Aprecia se envolve com a atividade e com o instrutor mediador. Responde cooperativamente . Mostra atenção ao passo, requer perguntas. APLICAÇÃO Aplicar o conhecimento, habilidade. Atitude para conduzir a atividade com sucesso resolve problemas que naturalmente venham dela. REATIVA 1 + 1 = 2 CONDUZ Através da atividade com questionamento. Problema ocasional resolve com assistência. IMITA Variações feitas na atividade pelo instrutor mediador ele resolve o problema sem assistência. GENERALIZAÇÃO INICIA Conduz a atividade numa variedade de situações e combinando todas ou parte delas com conceitos para se resolver problemas mais complexos e criar atividades mais complexas. Inicia a atividade por prazer. Confiança no sucesso e aprovação antecipada. 48 Descrição para o Trabalho de um Instrutor Mediador O papel do instrutor mediador é promover a mediação para bebês, crianças, jovens ou adultos com surdocegueira e/ou com deficiência múltipla sensorial. Mediação é definida como o processo interativo que ocorre entre o instrutor mediador e a pessoa com surdocegueira e/ou com deficiência múltipla sensorial. O processo de mediação é definido pelas necessidades de cada indivíduo e não pelas habilidades do instrutor mediador. (MCINNES, 1998: p.35). Segundo (MCINNES, 1995) o processo de mediação promove: 1. Informações suficientes não distorcidas para levar a pessoa com surdocegueira e/ou com deficiência múltipla sensorial a: · Tomar decisões apropriadas; · Formar conceitos corretos; · Antecipar eventos futuros. 2. Motivação para a pessoa com surdocegueira e/ou com deficiência múltipla sensorial agir nas decisões através de: · Ligação emocional; · Interação por empatia; · Informações corretas e completas sobre a interação da pessoa com o ambiente. 3. O Apoio necessário para capacitar a pessoa com surdocegueira e/ou com deficiência múltipla sensorial a ter decisões com sucesso em um tempo razoável irão depender da compreensão e de habilidades necessárias para: · Assumir controle sobre sua vida; · Assumir responsabilidade por suas ações e decisões; · Treinar futuros instrutores mediadores para apoiar nas suas necessidades específicas. 49 Qual é o papel do instrutor mediador? Criar ambiente reativo · Evitar deixar a pessoa com surdocegueira e/ou com deficiência múltipla sensorial tentando completar a atividade sem mediação apropriada; · Tomar tempo para explorar o ambiente e examinar os materiais a serem usados na atividade; · Assegurar que a pessoa com surdocegueira e/ou com deficiência múltipla sensorial entenda o sucesso da atividade, durante e logo depois da mesma; · Tirar tempo para desenvolver a linguagem através do uso do enfoque da comunicação alternativa (uso de vários sistemas de comunicação); · Discutir e revisar o que aconteceu após cada tentativa usando o enfoque comunicação alternativa; · Reconhecer que a prioridade para cada atividade é o envolvimento direto da a pessoa com surdocegueira e/ou com deficiência múltipla sensorial e não o término da atividade; · Fornecer apoio suficiente para assegurar que a atividade seja finalizada em tempo razoável; · Gerenciar atividades e organizando o ambiente para assegurar que a pessoa com surdocegueira e/ou com deficiência múltipla sensorial tenha a oportunidade de fazer escolhas durante a atividade;· Desenvolver um estilo de vida com a linguagem essencial para implementá-la como base para toda outra habilidade e desenvolvimento de conceito; · Usar diariamente, semanalmente, e mensalmente, e/ou um diário individual, como base para diálogo sobre atividades passadas e eventos; 50 · Usar calendários diários, semanais, e/ou mensais para encorajar a pessoa com surdocegueira e/ou com deficiência múltipla sensorial a antecipar atividades futuras; · Usar calendários diários, semanais, e/ou mensais para envolver a pessoa com surdocegueira e/ou com deficiência múltipla sensorial no planejamento ou agendamento do seu tempo; · Envolver a pessoa com surdocegueira e/ou com deficiência múltipla sensorial na construção de calendários diários, semanais, e mensais ao fazê-lo por símbolos representativos em tempo apropriado e no local. Motivando a pessoa com surdocegueira e/ou com deficiência múltipla sensorial a tomar decisões sobre a seqüência de eventos dentro de uma rotina: · Reagir apropriadamente a um pedido de mudança de planos; · Reagir apropriadamente a um pedido para terminar ou prorrogar uma atividade; · Reagir apropriadamente a um pedido para repetir a atividade; · Usar atividades de rotina para promover a conscientização e interação com outras pessoas. Tentar motivar a pessoa com surdocegueira e/ou com deficiência múltipla sensorial para melhorar seu nível de funcionamento para: · Assegurar que a pessoa com surdocegueira e/ou com deficiência múltipla sensorial o reconheça antes que ele comece ou recomece uma atividade; · Ter como primeira prioridade: a melhoria da qualidade do contato social que eu tenho com a pessoa com surdocegueira e/ou com deficiência múltipla sensorial; 51 · Usar técnicas apropriadas para indicar o grau de aprovação ou não de ações sociais individuais; · Tirar tempo para tornar a pessoa alerta sobre o efeito de suas reações nos outros e suas reações neles; · Indicar a pessoa com surdocegueira e/ou com deficiência múltipla sensorial meu grau de aprovação ou não de cada tentativa durante a aquisição de habilidade e estágios de aplicação de desenvolvimento de habilidade; · Cuidar para seguindo os estágios da seqüência de interação e ao enfatizar e encorajar a pessoa com surdocegueira e/ou com deficiência múltipla sensorial a escolher entre as atividades a serem completadas; · Ter outras pessoas para dar saudações apropriadas pelas tarefas bem realizadas; · Atraindo a atenção da pessoa surdocega e/ou com deficiência múltipla que trabalho quando da satisfação ou conformidade de normas e expectativas sociais; · Comentar com as pessoas surdocegas e/ou com deficiência múltipla sensorial que quando estou com meus amigos falo positivamente das realizações deles. É importante o instrutor mediador ter em mente que um dos papéis mais importantes é fornecer motivação ao mostrar aprovação apropriada das ações da pessoa com surdocegueira e/ou com deficiência múltipla sensorial. Principalmente, em muitos casos, ao se lidar com bebês e crianças, a pessoa provendo a mediação será o fator motivacional e não a atividade em si. A pessoa com surdocegueira e/ou com deficiência múltipla sensorial não consegue receber e assimilar muitos dos fatores motivacionais extrínsecos, particularmente que dependem de receber informação não distorcida. Reconhecimento de aprovação de colegas e da 52 sociedade, a habilidade de comparar o esforço presente com tentativas prévias ou um modelo desejado e a habilidade de ligar tentativas de sucesso ou conceitos para se formarem ações ou idéias mais complexas dependem somente de moderação apropriada. Tentar promover comunicação receptiva e expressiva para a pessoa com surdocegueira e/ou com deficiência múltipla sensorial pelo uso do diálogo e por: · Empregar o enfoque de comunicação total; · Usar a forma apropriada de comunicação manual e a apresentação simultânea oral de toda a comunicação concomitantemente; · Pedir a pessoa com surdocegueira e/ou com deficiência múltipla sensorial para optar e comunicar as escolhas a respeito de qual atividade irá fazer; · Pedir a pessoa com surdocegueira e/ou com deficiência múltipla sensorial a optar e comunicar escolhas referentes às comidas a serem preparadas; · Pedir ao indivíduo para escolher e comunicar estas opções quando for comer fora; · Pedir a pessoa com surdocegueira e/ou com deficiência múltipla sensorial para fazer e comunicar escolhas a respeito do tempo de manutenção das atividades associadas ao seu estilo de vida; · Pedir a pessoa com surdocegueira e/ou com deficiência múltipla sensorial para escolher a roupa que ele/ela quer usar; · Pedir a pessoa com surdocegueira e/ou com deficiência múltipla sensorial para indicar que atividades de autocuidados ele pretende fazer e quando; · Ao fazerem planos, pedindo a pessoa com surdocegueira e/ou 53 com deficiência múltipla sensorial para indicar que atividades de rotina ele/ela gostariam de fazer em determinado dia; · Pedir a pessoa com surdocegueira e/ou com deficiência múltipla sensorial para me dizer suas escolhas de lazer ou recreação ao montar o calendário; · Pedir para pessoa com surdocegueira e/ou com deficiência múltipla sensorial a escolher quem ele/ela quer para mediar ao planejar atividades semanais; · Pedir a pessoa com surdocegueira e/ou com deficiência múltipla sensorial para indicar qual instrutor mediador estará dando suporte a ele/ela durante uma atividade em particular. Encorajando a comunicação expressiva através de: · Fazer perguntas do tipo: “Por quê?”; · Perguntar a pessoa com surdocegueira e/ou com deficiência múltipla sensorial para explicar suas escolhas; · Ajudar a pessoa com surdocegueira e/ou com deficiência múltipla sensorial a fazer perguntas do tipo “quem”; · Ajudar a pessoa com surdocegueira e/ou com deficiência múltipla sensorial a fazer perguntas “Por quê?”; · Manter e usar lista de compras e outras; · Manter um diário individual de forma útil a ele/ela; · Encorajar a pessoa com surdocegueira e/ou com deficiência múltipla sensorial a falar sobre o que aconteceu no dia anterior; · Falar sobre o que você e ele/ela irão fazer quando você for mediar novamente; · “Escrever” letras, usando meio apropriado, para amigos e família; · Pedir para dizer ”como” completar o trabalho/rotina; · Discutir alternativas possíveis durante o dia com a pessoa com surdocegueira e/ou com deficiência múltipla sensorial; 54 · Indicar quando termina uma atividade ou quando não quiser mais participar dela, poderá participar em outro momento; · Iniciar conversa com os outros; · Fazer perguntas do tipo QUANDO; · Fazer perguntas do tipo ONDE; · Fazer perguntas do tipo QUEM; · Fazer perguntas do tipo O QUÊ; · Identificar Tecnologia Assistiva apropriada; · Utilizar os recursos técnicos que ele deseje usar; · Facilitar seus esforços para encontrar e se comunicar com seus semelhantes. Tentar promover habilidade contínua em todas as áreas para: · Usar os objetivos identificados para as áreas de resultado chave como um guia para desenvolvimento de habilidades; · Usar um número suficiente de repetições e empregando técnicas de apresentação para torná-lo consciente sobre a habilidade e como ela se relaciona as já existentes antes de empregá-la; · Começar cada nova habilidade provendo direção física e linguagem apropriada para assegurar seu sucesso; · Prover assistência apropriada e perguntando, combinando com o enfoque da Comunicação Total para assegurar sucesso durante o estágio de AQUISIÇÃO; · Promover a solução do problema, durante o estágio
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