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Direito Tributario - Luis Eduardo Schoueri- parte do cap 4 páginas-1-2,263-281

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tacitamente admitiu que este obtivesse recursos financeiros para tanto. Daí a
competência anexa do art. 80 do CTN:
Art. 80. Para efeito de instituição e cobrança de taxas, consideram-se
compreendidas no âmbito das atribuições da União, dos Estados, do
Distrito Federal ou dos Municípios aquelas que, segundo a Constitu-
ição Federal, as Constituições dos Estados, as Leis Orgânicas do Dis-
trito Federal e dos Municípios e a legislação com elas compatível,
competem a cada uma dessas pessoas de direito público.
3.5 Síntese das taxas
Em síntese: taxas são espécies tributárias, cobradas por todas as pessoas
jurídicas de direito público, nos âmbitos de suas competências, justificadas
pelo princípio da equivalência, destinadas a cobrir os custos do Estado (i) no
exercício de seu poder de polícia; ou (ii) na prestação, efetiva ou potencial,
de serviços públicos específicos e divisíveis.
4 Contribuição de melhoria
A contribuição de melhoria, conquanto vetusta no ordenamento, é rara-
mente instituída pelos poderes públicos, que preferem financiar suas obras
por meio de recursos destinados a seus gastos gerais.
4.1 Exemplos de contribuição de melhoria em outros
ordenamentos
A história da contribuição de melhoria em outros ordenamentos já foi pub-
licada, no vernáculo, por João Baptista Moreira, que chegou a tecer um quadro
sinótico geral, iniciando em 1000 a.C., quando já se encontravam expropriações,
mediante indenização, para obras de saneamento, na Ilha de Eubeia
88
. É muito
difícil fixar, com precisão, a data em que foi criada, pela primeira vez, uma
263/1199
contribuição de melhoria, tal como hoje se entende. Ensina Antonio Chaves, forte
em Deodato e Cannan, que já nos idos de 1250 foi cobrada uma contribuição na
Inglaterra, decorrente das obras de reparação do dique de Romney, destacando-
se, também, as lembranças de Giaquinto, sobre um ato legislativo inglês de 1662
e dois decretos do Conselho de Luís XIV, de 1672 e 1678, que impuseram a vári-
os proprietários contribuir, em proporção às vantagens que delas retiravam, com
as despesas de alargamento das vias às quais faziam frente seus prédios
89
.
Nos Estados Unidos, a contribuição de melhoria (special assessment) iniciou-
se por lei de 1691, de Nova Iorque, dali se irradiando de cidade em cidade. Poss-
ivelmente em função deste desenvolvimento descentralizado, relata Bilac Pinto
90
,
em sua monografia sobre contribuições de melhoria, que constitui até hoje a mais
completa obra sobre o tema, que a special assessment não encontra, naquele
país, uma fisionomia própria, sendo mais adequado se falar na special assess-
ment dessa ou daquela região. Assim, julga Bilac Pinto mais adequado referir-se
a contribuições de melhoria por tipos, a partir de dois critérios, o de extensão do
melhoramento e o do cálculo do montante das contribuições. Pelo primeiro
critério, seriam as contribuições locais, de zona e gerais. Já no segundo critério,
teríamos os assessments de custo e os de benefício.
No conceito apresentado por Bilac Pinto, os assessments de custo e os de
benefício estariam ligados ao que os americanos considerariam decorrentes do
poder de polícia, com a distinção de que, nestes casos, o objetivo culminante não
seria a arrecadação de tributos, mas o exercício do poder regulamentar, tendente
à preservação de ordem pública e ao estabelecimento de regras de boa vizin-
hança, higiene e urbanidade. Os exemplos do autor seriam os assessments de
custo de passeio e os de limpeza de estradas, nas imediações da propriedade.
Assim, o assessment teria como única função remunerar o poder público, por
gastos em que este incorreu, no lugar do particular. Não se questionaria, assim, a
ocorrência de qualquer benefício. Os assessments de benefício, por outro lado,
compreenderiam as obras públicas realizadas pelos governos que importassem
benefício para a propriedade particular
91
.
Também na Europa são encontrados institutos cujas características podem
assemelhá-los à contribuição de melhoria do Brasil.
Na Alemanha, a Erschliessungsbeitrag de hoje, que corresponde à con-
tribuição de melhoria por obra pública nova e a Strassenbeitrag (Verbesserungs-,
Erweiterungs-, ou Modernisierungsbeitrag), contribuições por melhoramento,
ampliação e modernização encontram suas raízes no direito prussiano, onde, em
1875, já houve a Fluchtliniegesetz (lei de recuo e alinhamento de fachadas), que,
264/1199
além de tratar de desapropriação, criou um tributo para a construção da via
pública, Strassenanliegerbeitrag que, como diz o nome, era cobrada dos confin-
antes da rua. Desde o início, pois, nota Moreira, o referido tributo que, na Ale-
manha constitui um tertium, ao lado dos impostos e das taxas, tinha excluído de
seu conceito a variável valorização imobiliária, por sua impraticabilidade, sendo a
hipótese tributária a obra pública e a base de cálculo o seu custo
92
. Ela deve
cobrir os custos para a aquisição e desocupação do espaço físico onde se fará a
obra pública e para seu primeiro capeamento, inclusive iluminação, servindo para
os casos de obras concernentes a vias públicas, locais de estacionamento e
praças (exceto parques infantis)
93
.
Na Inglaterra, há a “Betterment Tax”, cujas origens, como acima mencionado,
remontam a 1215. Importante, naquele país, foi, entretanto, o “Tower Bridge Act”,
de 1895. Conforme mostra Moreira, embora seja a “Betterment Tax” tratada
como um exemplo de tributação baseada no critério-benefício, a verdade é que
também naquele país a única variável que se considera é o custo da obra
94
.
Na Espanha, conhecem-se as contribuições especiais, cuja hipótese
tributária consiste “na obtenção, pelo obrigado tributário, de um benefício ou de
um aumento de valor de seus bens em consequência da realização de obras
públicas ou do estabelecimento ou ampliação dos serviços públicos”95. Vê-se aí
englobada a contribuição de melhoria brasileira, embora não se limite a tanto, já
que também se cogita de ampliação de serviços públicos. Por outro lado, merece
nota que a contribuição não se esgota na hipótese de aumento de valor dos
bens, mas atinge, igualmente, outra forma de benefício.
4.2 A contribuição de melhoria no Brasil até a Emenda
Passos Porto
No Brasil, embora já houvesse, no século XVIII, a cobrança de finta baseada
em Ordenação portuguesa, os antecedentes históricos que mais parecem
assemelhar-se às atuais contribuições de melhoria se encontram nas “taxas de
calçamento”, cobradas no Distrito Federal, por força do Decreto 1.029, de 06 de
julho de 1905, em razão da qual metade do custo de pavimentação das ruas
deveria correr por conta dos proprietários confinantes. Tais “taxas” foram cobra-
das em outras cidades mas, conforme Bilac Pinto, foi em São Paulo que elas
ganharam maior notoriedade, com a “questão do calçamento”, em virtude do
265/1199
número de ações em juízo questionando sua constitucionalidade, o que foi
provido pela Corte de Apelação paulista, para quem a taxa violava a Constituição
Federal e o Código Civil
96
.
A contribuição de melhoria foi, pela primeira vez, abrigada pela Constituição
Federal em 1934, quando o art. 124, inserido na “Ordem Econômica e Social”,
assim dispôs:
Art. 124 – Provada a valorização do imóvel por motivo de obras públicas, a
administração que as tiver efetuado poderá cobrar dos beneficiados con-
tribuição de melhoria.
Escrevendo na época da vigência deste texto constitucional, Bilac Pinto
sustentou ser sua ratio a correção de “uma situação que o Estado moderno não
poderia tolerar por muito tempo: as obras públicas, realizadas com o concurso de
todos os contribuintes, beneficiavam, quase sempre, a um pequeno número
deles. (...) Estes últimos, por motivo de melhoramentospúblicos, viam
valorizarem-se suas propriedades e nada pagavam. Era o mais evidente exemplo
de enriquecimento injusto, em detrimento da coletividade”. A novidade trazida por
Bilac Pinto foi a de que a contribuição de melhoria não se baseava, assim, na
teoria do benefício, propugnada por alguns financistas de então, segundo a qual
os indivíduos deveriam contribuir aos encargos públicos, segundo os benefícios
ou vantagens que lhe adviessem. Esta teoria apresentava entraves intransponí-
veis, dos quais o principal era o de se isentarem dos impostos os ricos e os po-
derosos. Daí a famosa afirmação de Richelieu, de que ao povo caberia contribuir
com seus bens; à nobreza, com seu sangue e ao clero, com suas preces. A prin-
cipal consequência negativa da teoria do benefício se revelou a partir de quando
o Estado passou a assumir funções sociais. Em razão da adoção da teoria do be-
nefício, os pobres deveriam pagar mais impostos que os ricos, por serem justa-
mente os que mais utilizariam dos serviços do Estado (assistência, saúde, edu-
cação etc.). O absurdo é evidente, daí ter sido descartada.
Na Carta de 1937, não se fez qualquer menção à contribuição de melhoria,
surgindo, então, dúvidas quanto a sua constitucionalidade, resolvidas, afinal, em
sentido afirmativo, pelo Supremo Tribunal Federal, em acórdão de Philadelpho
Azevedo
97
.
266/1199
A discussão parlamentar que antecedeu à Constituição de 1946 não deixou
de lado o cabimento, ou não, da contribuição de melhoria. Relata Rubens Gomes
de Sousa
98
que, naquela ocasião, levantou-se a opinião do professor Mario
Mazagão, combatendo aquela contribuição, sob o fundamento de que, se a real-
ização de obras públicas só se justifica havendo interesse geral seria injusto que
alguns contribuintes fossem obrigados a contribuir para seu custo; ao mesmo
tempo, Mazagão afirmava que não haveria como justificar a contribuição pela ob-
tenção, pelos proprietários, de um benefício especial, porque neste caso a obra
pública não seria eticamente justificável, vez ter sido uma fonte de enriqueci-
mento particular e não a satisfação de uma necessidade de ordem geral. O
próprio Sousa demonstra a fragilidade de tais argumentos, como segue: “Com
efeito, se por um lado a questão de ser ou não justificada a necessidade da obra
pública projetada é um problema geral e não específico da contribuição de mel-
horia, por outro lado parece inegável que, no estado atual da vida em sociedade,
qualquer melhoria, mesmo muitas das normalmente efetuadas por particulares
para o seu próprio gozo, revertem de certo modo em benefício da comunidade
em geral. Como observa justamente Pontes de Miranda, a obra pública, embora
necessariamente localizada, represente sempre um benefício para toda a
comunidade, dando em resultado que, se as referidas obras fossem financiadas,
com os impostos gerais, estariam na realidade sendo pagas em quota propor-
cionalmente maior pelos que dela se beneficiam apenas indireta ou potencial-
mente. A cobrança de uma contribuição especial do beneficiado direto é, assim,
um imperativo da justiça distributiva”.
Venceram o debate aqueles que defendiam a existência de uma contribuição
de melhoria. Na Constituição de 1946, ela foi inserida na ordem tributária: o artigo
30, inciso I, conferiu a competência à União, Estados, Distrito Federal e Municípi-
os para cobrá-la “quando se verificar valorização do imóvel, em consequência de
obras públicas”. O parágrafo único do mesmo artigo esclarecia que “a con-
tribuição de melhoria não poderá ser exigida em limites superiores a despesa
realizada, nem ao acréscimo de valor que da obra decorrer para o imóvel
beneficiado”.
Visando a regulamentar o dispositivo constitucional acima, Aliomar Baleeiro e
Fernando Nóbrega apresentaram à Câmara Federal o projeto de lei n. 5.
Fundamentava-se tal projeto na competência conferida, então, à União, para le-
gislar sobre “normas gerais de direito financeiro” (art. 50, inciso XV, letra b). Tal
projeto foi, já naquela época, duramente criticado por Carlos Alberto A. de Car-
valho Pinto, professor catedrático de Ciência das Finanças na Faculdade de
267/1199
Direito da Universidade de São Paulo, o qual, em longo artigo, argumentava que,
embora fosse assegurada à União a competência para conceituar a contribuição
de melhoria, unificando-a nacionalmente, tal faculdade normativa e genérica não
permitiria “uma legislação regulamentar ou detalhada, capaz de obstar aos Esta-
dos e Municípios o inalienável exercício de sua autonomia tributária, no caso es-
pecialmente relevante pela necessidade de adaptação do tributo às suas peculi-
aridades regionais e possibilidades administrativas. (...) o projeto de lei n. 5 in-
fringe esse imperativo de ordem constitucional e prática, ao descer a detalhes de
regulamentação que, se admissíveis para efeito das obras federais, jamais po-
deriam constituir norma obrigatória para as entidades públicas menores”
99.
Não obstante o alerta do catedrático, foi baixada a Lei n. 854, de 10.10.49,
cujo grau de detalhes revela a influência de referido projeto de lei.
A sistematização do ordenamento tributário brasileiro se deu por meio da
Emenda Constitucional n. 18/65, que expressamente abrigou a contribuição de
melhoria entre as espécies de tributos, dispondo seu art. 19:
Art. 19 – Compete à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municí-
pios, no âmbito de suas respectivas atribuições, cobrar contribuição de
melhoria para fazer face ao custo de obras públicas de que decorra valoriz-
ação imobiliária, tendo como limite total a despesa realizada e como limite
individual o acréscimo de valor que da obra resultou para cada imóvel
beneficiado.
Pela primeira vez, pois, o Constituinte passou a impor limites quantitativos à
cobrança da contribuição de melhoria, distinguindo-se o limite total (custo da obra
pública realizada) e o individual (acréscimo de valor resultante da obra).
Foi em tal panorama constitucional que se editou a Lei n. 5.172, de 25.10.66,
que posteriormente passou a se denominar Código Tributário Nacional. Este
tratou da contribuição de melhoria em dois artigos: o de número 81, cujo texto
apenas reproduz, com pequenas modificações, o que já dispunha a Emenda
Constitucional n. 18/65, e o de número 82, que apresenta “requisitos mínimos”
para a lei que instituir aquela contribuição. O § 1o do mesmo art. 82 dispõe sobre
o cálculo da contribuição:
268/1199
§ 1o A contribuição relativa a cada imóvel será determinada pelo rateio da
parcela do custo da obra a que se refere a alínea c do inciso I, pelos imó-
veis situados na zona beneficiada em função dos respectivos fatores indi-
viduais de valorização.
Em 1967, o texto constitucional deixou de fazer referência expressa ao limite
individual, para a cobrança da contribuição de melhoria, passando a exigir, apen-
as, no art. 19, § 3o, que o total da arrecadação com a contribuição de melhoria
não ultrapassasse o custo da obra pública. Vale notar, outrossim, que a con-
tribuição de melhoria continuava a pressupor, para sua cobrança, uma valoriza-
ção dos imóveis, já que, nos termos do inciso III do mesmo artigo, a contribuição
seria exigida dos “proprietários de imóveis valorizados pelas obras públicas que
os beneficiaram”.
Em 24 de fevereiro de 1967, surgiu o Decreto-lei n. 195 que, revogando ex-
pressamente a Lei n. 854/49, tratou detalhadamente da contribuição de melhoria.
O referido Decreto-lei não contrariava o Código Tributário Nacional.
Por meio da Emenda Constitucional n. 1/69, a contribuição de melhoria voltou
a ter previstos os limites individual e global, nos seguintes termos:
Art. 18 – Além dos impostos previstos nesta Constituição, compete à Un-
ião, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios instituir: (...)
II – contribuição de melhoria, arrecadada dos proprietários de imóveis val-
orizados por obras públicas, que terá como limitetotal a despesa realizada
e como limite individual o acréscimo de valor que da obra resultar para
cada imóvel beneficiado.
4.3 A “Emenda Passos Porto”
269/1199
Em 1o de dezembro de 1983, vem a Emenda Constitucional n. 23 (“Emenda
Passos Porto”), que modificou o inciso II do art. 18 da Constituição de então, que
passou a ter a seguinte e sucinta redação:
II – contribuição de melhoria, arrecadada dos proprietários beneficiados
por obras públicas, que terá como limite total a despesa realizada.
As mudanças no texto foram claras: substituía-se o termo “valorizados” por
“beneficiados”, ao mesmo tempo que se excluía a referência ao “limite individual”.
Em face da análise do dispositivo legal acima transcrito, parece claro o intuito
do constituinte derivado, em 1983: a contribuição de melhoria já não mais se
deveria sujeitar ao regime complexo imposto pelo Decreto-lei n. 195/67, que es-
pelhava uma contribuição “de benefício”, adotando-se, agora, uma contribuição
“de custo”, bem mais simples e que, seguindo o exemplo da “Erschlies-
sungsbeitrag” alemã, teria como único parâmetro o custo da obra, de cuja realiza-
ção o constituinte já presumia (presunção legal) a ocorrência de valorização.
Tal entendimento ecoou em algumas decisões judiciais:
Inexiste no texto anual da Constituição a exigência da configuração anteri-
or do tributo, a valorização da obra considerada. O benefício, pois, passa a
ser um corolário da prova da existência do fato gerador típico e único que é
a existência de obras públicas realizadas. Divergente se torna a caracteriz-
ação, pois, do fato gerador, na nova Constituição (art. 145, III, da anterior,
art. 18, II, e Emenda Constitucional n. 23/83), a exigir a obra pública e o
imóvel valorizado pela mesma100.
Com a edição da Emenda Constitucional n. 23, o fato gerador, do aludido
tributo deixou de ser a valorização experimentada pelo imóvel em razão da
obra executada, para ser a realização da obra executada, em si mesma,
ao mesmo tempo em que era eliminado o limite individual relativo ao lança-
mento do tributo, o que também veio a ocorrer com o limite total, quando
da promulgação da vigente ordem constitucional (CF, art. 145, III). Em out-
ras palavras, a contribuição de melhoria atualmente pode ser exigida pelo
Município pela só realização da obra pública, desamarrada de qualquer
270/1199
limite total ou individual no seu lançamento e sem limitação constitucional a
determinado rol de contribuintes. Na espécie, o impetrado obedeceu às
normas dos arts. 17 e 18 da Lei Municipal n. 516/85, ao indicar, como con-
tribuintes do tributo, os proprietários dos imóveis beneficiados pela obra
pública e ao distribuir o custo da obra entre eles, sendo certo que nenhum
óbice legal existia ao critério adotado de repartição do custo segundo a
metragem de frente de cada imóvel. Por via de consequência, forçoso é re-
conhecer que os lançamentos mencionados na exordial encontram suporte
legal na referida legislação municipal, que, por não colidir com as normas
constitucionais vigentes, foi por elas recepcionada, sendo, pois, irrelevante
a não observância, pelo impetrado, dos requisitos do Decreto-lei n. 195/
67101.
Na verdade, este Tribunal já se manifestara em inúmeras oportunidades
pelo entendimento da simplificação da instituição da contribuição de mel-
horia, por força da vigência da Emenda Constitucional n. 23/83, que alter-
ara a Constituição Federal de 1967, na redação da Emenda Constitucional
01/69. Em que pesem os bem lançados fundamentos da r. sentença, im-
pressiona, em sentindo contrário ao entendimento ali adotado, o de que
não se pode compreender modificação constitucional inútil, resultando dela
interpretação semelhante à do texto anterior. Se benefício é valorização,
admitindo-se que o valor da contribuição não possa superar a segunda,
modificou-se a Constituição, mas mantido restou o limite individual; teria
havido assim apenas alteração na redação, permanecendo em efeitos
idênticos a norma. Inútil seria a Emenda Passos Porto. Mas, se é assim,
porque a sua promulgação? Não se aceitando a existência de norma ou
modificação dela inúteis, não há como concluir-se a não ser pelo afasta-
mento do limite individual da cobrança e da não permanência da valoriza-
ção como fato gerador, outorgando-se às expressões ‘valorizados’ e ‘bene-
ficiados’ sentidos diversos. Em consequência, não é mais exigível constar
do edital referência à valorização de cada imóvel ou do fator de absorção
ou valorização (voto vencedor do Juiz Maurício Vidigal, RT 624/107).
Confira-se, dentre outros, no mesmo sentido os seguintes julgados: RT
626/104, 7a Cam., rel. Oswaldo Caron, com elucidativo voto vencedor de-
clarado pelo hoje Desembargador Regis de Oliveira: 624/107, 2a Câm., rel.
Bruno Netto. Afastava-se, desta forma, a exigência da valorização de cada
imóvel, decorrente de obra pública. Bastava ter sido o imóvel beneficiado
pela obra, dispensando-se a valorização imobiliária. Caberia ao
271/1199
proprietário ou possuidor demonstrar em Juízo que seu imóvel não teve
qualquer benefício, ou, mesmo, sofreu desvalorização em decorrência da
obra102.
Não merecem reparos as decisões acima quando reconhecem que não teria
sentido uma Emenda Constitucional que não produzisse qualquer efeito. Se o
constituinte substituiu os termos “valorizados” por “beneficiados”, evidentemente
assentiu com a realidade de que é possível que uma obra pública beneficie de-
terminado imóvel, sem que isso implique, necessariamente, valorização.
Não obstante, no Supremo Tribunal Federal o requisito da valorização ainda
parece ter permanecido. Em caso julgado pela 2a Turma
103
, o Ministro Célio
Borja, relator, deixa claro que a Emenda Passos Porto não teria retirado da con-
tribuição de melhoria sua natureza de special assessment, exigindo a valorização
do imóvel, citando e endossando doutrina de Luiz José de Mesquita que afirma
que “a substituição de ‘imóveis valorizados’ por ‘imóveis beneficiados’, embora
revele falta de técnica legislativa e possa conduzir a subjetivismo no apreciar ‘os
imóveis beneficiados por obras públicas’, contudo, não destrona a ‘valorização’
como critério final e objetivo no aferimento do benefício trazido pela obra pública,
objeto da contribuição”.
Igual entendimento foi manifestado pela mesma 2a Turma foi clara em de-
cisão que recebeu a seguinte ementa:
EMENTA: RECURSO EXTRAORDINÁRIO. Constitucional Tributário. Con-
tribuição de melhoria. Art. 18, II, CF/67, com a redação dada pela EC n. 23/
83.
Não obstante alterada a redação do inciso II do art. 18 pela Emenda Con-
stitucional n. 23/83, a valorização imobiliária decorrente de obra pública –
requisito ínsito à contribuição de melhoria – persiste como fato gerador
dessa espécie tributária.
RE conhecido e provido104.
272/1199
4.4 A contribuição de melhoria no texto constitucional
de 1988
Compreendida a origem da contribuição de melhoria, resta ver como ela
vem hoje regulada no texto constitucional. Eis o que diz seu artigo 145:
Art. 145. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão
instituir os seguintes tributos:
(...)
III – contribuição de melhoria, decorrente de obras públicas
Vê-se, assim, que, omitindo qualquer referência com relação a limites
quantitativos para sua cobrança, o constituinte optou por indicar apenas sua
hipótese tributária possível, no caso, uma única atividade estatal: a realização
de obras públicas.
4.5 Justificação da contribuição de melhoria
A contribuição de melhoria justifica-se tendo em vista que obras públicas
podem beneficiar a um determinado grupo, geralmente localizado nas prox-
imidades da obra, não se legitimando que toda a coletividade suporte o custo
da obra que, afinal, veio em benefício maior de alguns. É verdade que a toda
obra pública é feita no interesse da coletividade – o que justificaria que todos
a suportassem. Entretanto,tal axioma não pode esconder a constatação de
que há alguns que têm um benefício mais imediato. Daí estar aberta a opção,
para o legislador, de exigir uma contribuição de melhoria para o custeio das
obras públicas, no lugar de ver estas sustentadas pela receita geral dos impos-
tos (estes sim, como se verá abaixo, suportados por toda a coletividade).
Por outro lado, se é verdadeiro que a realização de uma obra pública nova
pode implicar um benefício maior a alguns proprietários de imóveis,
justificando-se, daí, a exação, o raciocínio não pode ser estendido a meras
obras de conservação e manutenção. Nesse caso, não há que cogitar uma
273/1199
vantagem extraordinária por parte daqueles proprietários, mas meros gastos
gerais, no interesse da coletividade, a serem cobertos por impostos
105
.
4.6 Limite individual: benefício ou valorização
Surgiu com o texto constitucional de 1988, mais uma vez, a questão com
relação à exigência de valorização do imóvel, para que se dê a cobrança do
tributo. É de notar que o emprego da expressão “benefício”, e não “valoriza-
ção”, parece indicar que o constituinte não impôs que se verificasse valoriza-
ção do imóvel para que houvesse a cobrança da taxa. Tal entendimento
reforça-se quando se considera toda a evolução desta espécie tributária em
textos constitucionais anteriores, que culminaram com a exclusão do limite
individual.
Todavia, no passado, os textos constitucionais exigiam a valorização e,
por esse motivo, o artigo 81 do Código Tributário Nacional previu como lim-
ite individual da contribuição de melhoria “o acréscimo de valor que da obra
resultar para cada imóvel beneficiado”.
Como sintetizam Ives e Rogério Vidal Gandra da Silva Martins, “benefício
imobiliário abrange campo maior do que valorização imobiliária. Na verdade, o
benefício abrange campo maior do que valorização imobiliária. Na verdade, o be-
nefício é gênero, do qual a valorização é espécie. Pode ocorrer benefício no
imóvel, sem, contudo, haver valorização do mesmo”
106
.
Com efeito, valorização é categoria econômica, cuja constatação depende de
elementos externos à relação Fisco-contribuinte. Pode haver valorização de
imóvel, sem que esta decorra de obra pública, assim como pode uma benfeitoria
não implicar qualquer valorização. Basta, por exemplo, que se esteja em época
de alta recessão, para que nenhuma benfeitoria implique aumento do valor de
imóvel, já que ninguém estará disposto a comprá-lo, ou ninguém estará disposto
a pagar preço maior que o já alcançado. O núcleo da contribuição de melhoria
passou a ser, pois, como bem diz o nome do tributo, a “melhoria”, o “melhora-
mento”, a “benfeitoria”, decorrente de obras públicas.
Confirmando tal entendimento, cite-se Bernardo Ribeiro de Moraes:
274/1199
Como o fato gerador da contribuição de melhoria é a execução da obra
pública, a base de cálculo do tributo deverá ser o custo da respectiva obra.
No sistema anterior, em que o objeto da contribuição de melhoria era a val-
orização imobiliária, muitos autores exigiam que a base de cálculo desse
tributo fosse a valorização imobiliária, o que tornava o tributo de difícil per-
cepção. (...) Como a contribuição de melhoria é um instrumento de custeio
da obra pública, a base de cálculo dessa espécie tributária será, não o be-
nefício, mas o custo da obra que se deseja financiar. Assim exige a Con-
stituição107.
Assim, parece claro que, pelo texto constitucional de 1988, a contribuição de
melhoria já não mais se caracteriza como benefit assessment, sendo autorizada
a cost assessment.
Parte da doutrina entende que desde a edição da Emenda Passos Porto o
limite individual a que se referem o Código Tributário Nacional e o Decreto-Lei
195/67 teria sido superado. Ora, se o Decreto-lei n. 195/67 tivesse sido revogado
em 1983, com a edição da “Emenda Passos Porto”, por ser com ela conflitante,
não se poderia, agora, pretender aplicá-lo sob o regime constitucional de 1988.
É nesse sentido o posicionamento de Sacha Calmon Navarro Coelho:
48. Caducidade do Decreto-Lei n. 195/67:
O Decreto-Lei n. 195/67 caducou antes da Constituição de 1988. É que
este diploma legal regulava, com o caráter de lei complementar, uma con-
tribuição de melhoria baseada no critério valorização, como previsto na
Constituição de 1967 e na Emenda n. 1/69. Ocorre que em 1983 a
Emenda Constitucional n. 23 de 01/12, chamada “Passos Porto”, alterou
fundamentalmente o tipo de contribuição de melhoria existente, optando
pelo critério custo. (...)
A intenção era claríssima: substituir o critério valorização pelo critério
custo. Em sendo assim, desde aquela época, o Dec.-lei 195/67 tornou-se
incompatível – venia permissa das opiniões em contrário – a Constituição
de 1967. Tê-lo como vigente agora implicaria repristinação atípica, e o que
é pior, em subordinar a Constituição vigente a um texto anterior, até
mesmo a carta outorgada de 1967, antecipando a escolha do tipo de
275/1199
contribuição pelo legislador complementar, que poderá até se omitir, deix-
ando a escolha às pessoas políticas. A melhor exegese está em considerar
de eficácia contível o art. 145, III, da CF vigente, do contrário estar-se-á a
presumir que o legislador disse o que não quis dizer. Onde a Constituição
não distingue, quando podia fazê-lo, não cabe ao intérprete distinguir. O
minus dixit na espécie seria temeridade. Isto posto, os Municípios são
competentes, assim como os Estados e a União, para adotarem o tipo de
contribuição de melhoria que julgarem conveniente, até e enquanto não
sobrevenha lei complementar108.
A seguir tal entendimento, deve-se concluir que as pessoas jurídicas de
direito público não estariam adstritas aos limites impostos pelo Decreto-lei n. 195/
67, na instituição de sua contribuição de melhoria. Possível, pois, a instituição da
contribuição, desde que presente o elemento “melhoria” que com “valorização”
não se confunde. Limite para a contribuição de melhoria permaneceria sendo, ex-
clusivamente, o custo da obra (cost assessment).
Entretanto, o fato de o Código Tributário Nacional, fazendo as vezes de lei
complementar, incluir aquele requisito, traz argumento relevante para os que de-
fendem aquela exigência.
Afinal, o “fato gerador” definido pelo Código Tributário Nacional vai aquém,
não além do que dispõe a Constituição. Um imóvel valorizado por obra pública
certamente sofreu uma melhoria. Do mesmo modo, o Decreto-Lei 195/67, com-
plementando o Código Tributário Nacional, positiva essa exigência.
Noutras palavras, conquanto seja possível cogitar uma melhoria em um
imóvel sem valorização, o legislador complementar elegeu a valorização como
critério para aferição daquela melhoria. Fazendo-o, agiu dentro de sua competên-
cia, enquanto norma geral, devendo ser observado o que dispõe o Código
Tributário Nacional
109
.
Em síntese, embora não pareça ser requisito constitucional a valorização do
imóvel, não há antinomia entre o Código Tributário Nacional e a Constituição
Federal. Simplesmente, o legislador complementar, no uso de sua competência,
definiu o alcance da contribuição de melhoria autorizada pela Constituição. Ob-
viamente, nova lei complementar poderia vir a dispensar o requisito da valoriza-
ção. Não o fazendo, entretanto, deve-se seguir o que dispõe a lei complementar
em vigor.
276/1199
Por outro lado, não havendo benefício, não se justifica a cobrança da con-
tribuição de melhoria. Não há razão para alguns proprietários suportarem o
custo de uma obra pública que não os beneficiou de modo diferente do resto
da coletividade. Parece válido o exemplo da construção de uma via elevada,
trazendo notórios prejuízos aos proprietários dos imóveis circunvizinhos, que
passaram a residir “debaixo da ponte”. Nada justificaria a cobrança de um
tributo para que eles suportassem a obra que os prejudicou. Seria, joc-
osamente, uma “contribuição de pioria”, inaceitávelno ordenamento jurídico.
4.7 Limite total
Além do limite individual, o Código Tributário Nacional oferece outra di-
ficuldade a ser enfrentada pelo legislador na instituição de uma contribuição
de melhoria: seu limite total é a despesa realizada.
O texto constitucional de 1988 não é explícito com relação a esse limite, que
caracteriza, como visto, a cost assessment.
Entretanto, da própria ideia de justificação para os tributos pode-se inferir tal
limitação. O raciocínio é imediato: por que razão os proprietários confinantes com
uma obra pública estariam obrigados a concorrer sozinhos com as despesas
gerais do Estado?
Ou seja: a justificativa para a cobrança da contribuição de melhoria está no
fato de que aqueles proprietários foram, afinal, mais beneficiados pela obra.
Assim, é justo que eles financiem seu custo. Não se justifica, entretanto, que eles
ultrapassem aquele custo. Com razão Hugo de Brito Machado, quando, critic-
ando doutrina contrária, afirma: “cobrar mais do que o custo da obra, a título de
contribuição de melhoria, tendo-se como limite apenas a valorização imobiliária, é
cobrar imposto sobre aquela valorização, sem previsão constitucional”
110.
Além do argumento acima, soma-se o que já se falou acerca do papel da lei
complementar: se o próprio Código Tributário Nacional previu o limite total da
contribuição como custo da obra, não há que tolerar lei ordinária municipal, es-
tadual ou federal que contrarie tal limite.
4.8 Taxa ou contribuição
277/1199
Dado que tanto as taxas como as contribuições de melhoria se justificam a
partir do sinalagma estabelecido, poder-se-ia questionar se é mera opção do le-
gislador decidir por um ou por outro tributo para o custeio de obras públicas.
A resposta – advirta-se – é relevante, já que a instituição de uma contribuição
de melhoria é bem mais rígida que a de uma taxa. A mera leitura do artigo 82 do
Código Tributário Nacional já aponta para isso, ao indicar toda uma série de re-
quisitos para sua instituição, muitos deles prévios à própria cobrança:
Art. 82. A lei relativa à contribuição de melhoria observará os seguintes re-
quisitos mínimos:
I – publicação prévia dos seguintes elementos:
a) memorial descritivo do projeto;
b) orçamento do custo da obra;
c) determinação da parcela do custo da obra a ser financiada pela contribuição;
d) delimitação da zona beneficiada;
e) determinação do fator de absorção do benefício da valorização para toda a zona
ou para cada uma das áreas diferenciadas, nela contidas;
II – fixação de prazo não inferior a 30 (trinta) dias, para impugnação pelos interessa-
dos, de qualquer dos elementos referidos no inciso anterior;
III – regulamentação do processo administrativo de instrução e julgamento da impug-
nação a que se refere o inciso anterior, sem prejuízo da sua apre-
ciação judicial.
§ 1o A contribuição relativa a cada imóvel será determinada pelo rateio da parcela do
custo da obra a que se refere a alínea c, do inciso I, pelos imóveis situ-
ados na zona beneficiada em função dos respectivos fatores indi-
viduais de valorização.
§ 2o Por ocasião do respectivo lançamento, cada contribuinte deverá ser notificado
do montante da contribuição, da forma e dos prazos de seu pagamento
e dos elementos que integram o respectivo cálculo.
Vê-se que, quando é o caso de contribuição de melhoria, o poder público fica
adstrito à observância de diversas exigências.
Não surpreende, dadas as condições para sua cobrança, que a contribuição
de melhoria seja pouco utilizada. Algumas vezes, ela surge sob o manto de
278/1199
“taxa”, como se a denominação fosse relevante para a configuração da espécie
tributária. Didático, nesse ponto, o artigo 4o do Código Tributário Nacional, que –
não é demais repisar – ensina e determina:
Art. 4o A natureza jurídica específica do tributo é determinada pelo fato
gerador da respectiva obrigação, sendo irrelevantes para qualificá-la:
I – a denominação e demais características formais adotadas pela lei.
Assim é que caem por terra, por exemplo, as “taxas asfálticas”, ou “taxas de
pavimentação”, cobradas por diversas municipalidades para a pavimentação de
vias públicas. Sob o nome de “taxa”, não há serviço público específico e divisível.
A via asfaltada em questão não pode ser razoavelmente dividida em unidades in-
dividuais de fruição de um “serviço público”, nem tampouco se cogita poder de
polícia. É vera obra pública, que beneficia, por certo, de modo especial, os imó-
veis lindeiros. Para tal caso o constituinte previu a contribuição de melhoria.
Neste sentido, já em 1972 o Supremo Tribunal Federal enfrentou o tema de
uma contribuição de melhoria, apelidada de “taxa de construção e pavi-
mentação”, de Curitiba, entendendo o Plenário do Tribunal que “encobrindo a
taxa em questão, por seus pressupostos, o fato gerador da contribuição de mel-
horia, regulado pela Lei Federal n. 854/49, não pode prevalecer o lançamento im-
pugnado, por contravir às exigências de seu art. 3o”
111. No referido julgado, foi de-
cisivo o voto do Ministro Bilac Pinto, estudioso da matéria. De fato, de início, o
Ministro Thompson Flores havia entendido que, por se tratar de uma taxa, não
precisaria seguir os requisitos exigidos de uma contribuição de melhoria. Após a
demonstração do Ministro Bilac Pinto de que, em verdade, ali se escondia uma
contribuição de melhoria, a despeito de sua denominação, o próprio relator se viu
convencido e o Plenário acompanhou, por unanimidade, aquele entendimento.
Mais recente, mas no mesmo teor, cite-se decisão do Plenário concernente a
“taxa de pavimentação asfáltica” do Município de Santo André, julgada inconstitu-
cional pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal, por ser “tributo que tem por
fato gerador benefício resultante de obra pública, próprio de contribuição de mel-
horia”, sem que tivessem sido observadas as “formalidades legais que con-
stituem o pressuposto do lançamento dessa espécie tributária”
112. Neste caso, o
Ministro Ilmar Galvão, relator, apontou que “o lançamento da contribuição de
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melhoria pressupõe o preenchimento, pelo ente político credor, das formalidades
estabelecidas nos arts. 5o e seguintes do DL n. 195/67”, evidenciando, daí, frus-
trada a tentativa do Município de fugir daquelas exigências, confirmadas pelo Su-
premo Tribunal Federal. Citem-se as palavras do Ministro Ilmar Galvão:
O caráter teratológico dessa opção, todavia, é manifesto. Com efeito, di-
ante do sistema tributário brasileiro, não há confundir-se taxa com con-
tribuição de melhoria, já que esta tem por hipótese o benefício acarretado
a imóvel, por obra pública, enquanto aquela incide sobre a utilização
efetiva ou potencial de serviços públicos específicos e divisíveis, prestados
ao contribuinte ou postos à sua disposição (art. 18, I e II, da EC 01/69 e
art. 145, II e III, da CF/88). Assim sendo, inviável se torna a pretensa
opção entre taxa e contribuição de melhoria.
O que se teve, no caso, foi lançamento, a título de taxa, de tributo que
somente poderia ser exigido como contribuição de melhoria, já que iniden-
tificável o serviço público específico e divisível, que houvesse sido
prestado pela Municipalidade ao recorrido, ou posto à disposição deste.
E o que foi lançado como taxa não pode ser automaticamente trans-
mudado, em contribuição de melhoria, à falta de observância dos pres-
supostos já mencionados.
4.9 Momento da publicação do edital
Um último ponto que poderia gerar alguma dúvida seria quanto ao momento
em que deve ser publicado o edital previsto no art. 82 do Código Tributário Na-
cional: se o texto legal fala em “publicação prévia”, não esclarece prévia a quê.
Ou seja: seria a publicação prévia à obra ou prévia à cobrança?
Se prevalecer o texto do referido artigo 82, parece mais acertado entender
que seria prévia à obra. Afinal, a ideia de “memorial descritivo do projeto”, ou “or-çamento” implica inexistência da obra. Se esta está concluída, já não se publica
um mero orçamento, mas um relatório. Ademais, fala a lei complementar em obra
“a ser financiada”, o que mais uma vez evidencia a ideia de que o edital em
questão haveria de ser anterior à obra.
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Não obstante, argumenta-se que somente após a conclusão da obra é que se
saberia com precisão qual o seu custo, podendo-se avaliar, então, quanto acres-
ceram de valor os imóveis beneficiados. Por isso, sustenta-se que a publicação
deve anteceder a cobrança e não a realização da obra
113
. Foi este o entendi-
mento do Supremo Tribunal Federal, quando o relator, Ministro Octavio Gallotti,
entendeu que, desde que a lei específica tenha sido promulgada antes do início
da realização da obra, o edital pode ser publicado mesmo depois de aquela ter
sido encerrada, já que o “escopo do edital não é o de ensejar a impugnação da
feitura da obra, mas o de possibilitar a contestação da exigência de incremento
trazido ao valor do imóvel adjacente, e esse objetivo pode surtir efeito com a di-
vulgação anterior à cobrança, mesmo posterior à conclusão da obra”
114.
Argumento interessante para tal tese, que se encontra em decisões do Su-
perior Tribunal de Justiça, é o de que o Decreto-Lei 195/67, posterior ao Código
Tributário Nacional, teria revogado a exigência de edital prévio à própria obra,
bastando que o edital seja anterior à cobrança. Como na época as “normas
gerais de Direito Tributário” ainda não tinham o status de lei complementar, nada
obstaria que o referido Decreto-Lei modificasse aquele dispositivo
115
.
Desta forma, tem-se hoje que a lei deve ser prévia à obra; a cobrança deve
ser precedida de edital, mas não se exige que este anteceda a própria obra.
4.10 Síntese da contribuição de melhoria
Em síntese: contribuições de melhoria são espécies de tributo, justificadas
pelo princípio da equivalência, exigida dos proprietários de imóveis benefi-
ciados por uma obra pública (nova), cujo limite individual, nos termos da le-
gislação complementar em vigor, é a valorização do imóvel e cujo limite total
é o custo da obra.
5 Impostos
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