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Justiça e Virtudes segundo Aristóteles

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III. JUSNATURALISMO: A BALANÇA DE ARISTÓTELES E A JUSTIÇA COMO IGUALDADE
Prof. Mateus Salvadori
 1. Justiça como disposição da alma
A justiça é uma disposição da alma graças à qual as pessoas se dispõem a fazer o que é justo, a agir justamente e a desejar o que é justo. O mesmo deve ser dito da injustiça, que nos faz cometer e querer atos injustos. A justiça é considerada a maior das virtudes. Ela é perfeita porque as pessoas que possuem o sentimento de justiça podem praticá-la não somente em relação a si mesmas como também em relação ao próximo. Somente a justiça é o bem do outro. A única diferença entre a excelência moral e a justiça está em suas essências: a justiça, praticada em relação ao próximo, quando é irrestrita é a excelência moral. Porém, quando a justiça é uma parte da excelência moral, denomina-se justiça no sentido restrito.
2. Justiça Universal e Particular
A justiça pode ser tomada no sentido universal e no sentido particular. Na sua perspectiva universal, ela é tanto uma manifestação de vontade geral da virtude quanto uma apropriação do justo à lei que, no geral, é tida por justa. Para Aristóteles, a lei, produzida na pólis a partir de um princípio ético, é diretamente relacionada ao justo. Uma má lei não e lei.
Na sua perspectiva particular, a regra de ouro é dar a cada um o que é seu. Aristóteles divide a justiça particular em: distributiva, corretiva e, como um caso especial, a reciprocidade.
A justiça distributiva trata da distribuição de riquezas, benefícios e honrarias. A distribuição compreende sempre dois sujeitos em relação aos quais se avalia a justa distribuição dos bens. A distribuição compreende uma espécie de função matemática tal qual uma regra de três, uma proporção geométrica. O critério é o mérito: dar a cada um de acordo com seu mérito. Por exemplo, um professor, quando aplica uma prova será considerado justo em sua correção quando distribuir notas de acordo com uma proporção, tendo em vista o mérito. De uma prova com cinco questões valendo cada qual dois pontos, o aluno que acerta quatro merece nota oito e o aluno que acerta duas, merece nota quatro.
A justiça corretiva é uma proporção aritmética. Ela visa a correção das transações entre os indivíduos. Nesta forma de justiça surge a necessidade da intervenção de uma terceira pessoa: o juiz. Ela se divide em: i) comutativa (voluntária): preside os contratos em geral: compra e venda, locação, empréstimo etc. Esse tipo de justiça é essencialmente preventiva, uma vez que a justiça prévia iguala as prestações recíprocas antes mesmo de uma eventual transação; ii) reparativa (involuntária): visa reprimir a injustiça, a reparar ou indenizar o dano, estabelecendo, se for o caso, a punição.
Por fim, Aristóteles trata da reciprocidade. A sua aplicação mais importante se dá no caso da produção. As trocas entre um sapateiro, um pedreiro, um médico e um fazendeiro, para serem consideradas justas, devem alcançar uma certa reciprocidade. Não se pode imaginar, por exemplo, que a produção de um sapato valha o mesmo que a construção de uma casa. Aristóteles aponta, para isso, que o dinheiro faz o papel de uma equivalência universal entre produtos e serviços.  Ele possibilita a reciprocidade entre tais elementos. Aristóteles, que assumia o caráter dinâmico da natureza, reconhecia que o direito natural também podia mudar.
3. Justiça natural e legal: direito natural e direito positivo
A justiça divide-se em natural e legal. A natural tem a mesma força em qualquer parte, independentemente de a aceitarmos ou não ou desta ou daquela opinião. A legal (positiva) é aquela que passa a viger depois de ser estabelecida a lei, ou seja, é legal aquilo que o princípio pode ser determinado indiferentemente de uma maneira ou de outra, mas depois de determinado já não é indiferente, mas obrigatório. É aquela que se pratica neste ou naquele país.
4. Justiça como meio-termo
A justiça é um meio-termo e a injustiça relaciona-se com os extremos – o excesso ou a falta. A ação justa deve evitar os extremos, tanto o excesso quanto a falta, caracterizando-se assim pelo equilíbrio. A sabedoria prática (frónesis) consiste na capacidade de discernir essa medida. Quais traços de caráter fazem de alguém uma pessoa boa? Eis, abaixo, uma tabela de virtudes. Na coluna do meio, temos as virtudes; nas colunas da esquerda e direita, temos os vícios.
 
Vício por deficiência - Virtude - Vício por excesso
Covardia – Coragem – Temeridade                                                 
 Indiferença – Gentileza – Irascibilidade
Insensibilidade – Temperança – Libertinagem                                  
Avareza – Liberalidade – Esbanjamento
Vileza – Magnificência – Vulgaridade                                             
Modéstia – Respeito Próprio – Vaidade
Moleza – Prudência – Ambição                                                      
Descrédito Próprio – Veracidade – Orgulho
Rusticidade – Agudeza de Espírito – Zombaria                                 
Enfado – Amizade – Condescendência
Desavergonhado – Modéstia – Timidez                                           
Malevolência – Justa Indignação – Inveja
 
5. Justiça como ação
Para Aristóteles, a justiça é ama ação. Não se trata de uma virtude contemplativa. A justiça não se revela um mero conhecimento sobre o justo. Acima de tudo, o justo é agir, tal qual todas as demais virtudes. Considera-se justo o ato que é feito deliberadamente com tal finalidade. A justiça, assim sendo, é uma virtude que se revela não apenas pela sua potencialidade, mas sim pela sua concretude, pela sua ação. Um juiz que conhece o justo e não o aplica ao caso concreto não é justo. Justo é o seu julgamento que determina que seja dado ao credor o que lhe é devido. A coação e a ignorância não configuram a intenção de agir com justiça e injustiça. O desconhecimento ou as forças externas ao sujeito que pratica o ato, ainda que levem a resultados que possam ser apreciáveis objetivamente como justos ou não, por razão acidental, não constituem atos de justiça.
6. Justiça teleológica e honorífica
Compreender o télos (finalidade) de uma prática significa, pelo menos em parte, compreender ou discutir as virtudes que ela deve honrar e recompensar. As teorias modernas de justiça tentam separar as questões de equidade e direitos das discussões sobre honra, virtude e mérito moral. Elas buscam princípios de justiça que sejam neutros, para que as pessoas possam escolher e buscar seus objetivos por conta própria. Aristóteles não acha que a justiça possa ser neutra, pois as discussões sobre justiça são, inevitavelmente, debates sobre a honra, a virtude (cumprir bem o télos) e o caráter. Justiça é dar às pessoas o que elas merecem, dando a cada um o que lhe é devido. Mas como saber qual é o mérito de cada um? Isso depende das “coisas” e das “pessoas” em que as coisas são destinadas. Qual é o télos da política? É formar um bom cidadão; é cultivar as virtudes dos cidadãos; é viver bem. Mas isso somente é possível na pólis, na política. O homem é um animal político(teoria naturalista, do Estado orgânico, do impulso associativo).
7. Justiça e equidade
Segundo Aristóteles, a justiça e a equidade são a mesma coisa, embora a equidade seja melhor. O que cria este problema é o fato de o equitativo ser justo, mas não o justo segundo a lei, e sim um corretivo da justiça legal. A equidade corrige a lei. A razão é que toda lei é de ordem geral, mas não é possível fazer uma afirmação universal que seja correta em relação a certos casos particulares. Por isso, o equitativo é justo e melhor que uma simples espécie de justiça, pois o equitativo é por natureza uma correção da lei onde esta é omissa devido à sua generalidade. Quem escolhe e pratica atos equitativos e não se atém aos seus direitos, mas se contenta com receber menos do que lhe caberia, embora a lei esteja ao seu lado, é uma pessoa equitativa.
A norma jurídica é uma regra dotada de rigidez, que abstrai das circunstâncias a que ela considera irrelevante. A equidade é flexível, umavez que considera determinadas circunstâncias que a norma jurídica despreza, ou não contempla, como, por exemplo, a força e a fraqueza das partes, as incidências sobre o seu estado de fortuna, etc., para chegar a uma solução que se adapta melhor ao caso concreto – mesmo que se afaste da solução normal, estabelecida pela lei. É pela equidade que o caso concreto se resolve; ademais, ela é um modo de revelação do direito, muito embora se refira a casos singulares. Assim, ela é um ato de decisão. Sob o prisma da legalidade constitucional, não se pode supor uma equidade desvencilhada do ordenamento jurídico; há que se tomar a equidade dentro da ordem jurídica, não podendo nunca contrastar com a mesma. Os critérios de decisão podem ser divididos em formais e materiais. A equidade é um dos critérios formais de decisão; não é normativa – a equidade não é formada por regras –, mas dita soluções aos casos que contenham determinadas peculiaridades; não implica elaboração de regras, pois não tem intuito generalizador; portanto não se projeta noutros casos, semelhantes embora. Assim, se a fonte é um modo de formação e de revelação de regras jurídicas, a equidade, que é um critério formal de decisão, não é fonte. Entretanto, pode ser revista a ideia de fonte, incluindo tudo aquilo que revele o direito; porém, em sentido técnico, sabe-se que o estudo das fontes não se ocupa, por si, de critérios de decisão, mas de critérios de revelação do direito. A equidade se apresenta em tríplice função, quais sejam: i) método de integração de lacunas; ii) correção da lei (ex.: art. 16 do decreto 24. 150/1934: “O juiz apreciará, para proferir a sentença, além das regras do direito, os princípios de equidade, tendo, sobretudo, em vista, as circunstâncias especiais de cada caso concreto, para o que poderá converter o julgamento em diligência, a fim de melhor se elucidar”); iii) substituição de lei: ser um critério de decisão por afastar os discernimentos legais. A decisão com equidade será aquela de acordo com o direito, ou seja, num ideal supremo de justiça; decisão por equidade será aquela embasada na percepção de justiça do julgador, algumas vezes liberto das regras do direito positivo; decisão por equidade é aquela que busca equilibrar norma e realidade nas ocasiões em que há lacuna. Por consistir na justiça do caso concreto, a aplicação da equidade teve maior desenvolvimento no common law, que é essencialmente direito casuístico. Hoje, a equidade pode ser parâmetro interpretativo da legislação, contudo, a lei somente poderá ser afastada do caso concreto, mediante o controle difuso de constitucionalidade, vale dizer, somente é lícito ao Judiciário decidir contra a lei, quando esta lei apresentar inconstitucionalidade no caso concreto, sempre precedida de larga e extensa motivação, nos termos do inc. IX, do art. 93 da CF/88.
8. Jusnaturalismo Romano e Medieval
O direito romano empregou a mesma distinção de Aristóteles acerca de Direito Natural e Direito Positivo, reconhecendo a existência de uma razão da natureza que vincularia todos os animais. Além dos critérios (efeito e validade) empregados por Aristóteles para distinguir direito natural do positivo, o pensamento jurídico romano acresceu um terceiro critério: a imutabilidade. Com o avanço do cristianismo na Europa Medieval, ganha força o jusnaturalismo teológico. Afirma-se a existência de uma justiça imanente revelada por Deus e pelo Evangelho e que seria o princípio ordenador de todo o universo.
9. Jusnaturalismo Moderno
Nos sécs. XVII e XVIII, com figuras como Hobbes, Locke, Pufendorf, Grócio, Kant etc., o jusnaturalismo caracteriza-se da seguinte forma:
            1. A lei é cada vez menos medida objetiva e racional da ação e cada vez mais comando;
            2. O direito (ius) é cada vez menos o justo, aquilo que é objetivamente imposto a todos em uma mesma relação pelo bem comum e cada vez mais as faculdades e liberdades que configuram o que hoje denominamos direitos subjetivos;
            3. Um espaço maior é conferido ao poder do soberano de legislar;
            4. Contudo, o pensamento jurídico continua a derivar a existência de alguns direitos de suposições sobre a natureza do homem e a tecer considerações axiológicas sobre como deve ser o direito para realizar o ideal de justiça.

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