Buscar

Avaliacao_Neuropsicologica (1)

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 3, do total de 31 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 6, do total de 31 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 9, do total de 31 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Prévia do material em texto

CURSO DE AVALIAÇÃO NEUROPSICOLÓGICA
SUMÁRIO
MÓDULO I
1 INTRODUÇÃO
2 PRINCÍPIOS DA AVALIAÇÃO NEUROPSICOLÓGICA
2.1 HISTÓRICO DA NEUROPSICOLOGIA
2.2 A PRÁTICA CLÍNICA DA NEUROPSICOLOGIA HOJE
2.3 OBJETIVOS DA AVALIAÇÃO NEUROPSICOLÓGICA
MÓDULO II
3 FUNÇÕES NEUROPSICOLÓGICAS
3.1 BASES ANATÔMICO-FUNCIONAIS DAS FUNÇÕES NEUROPSICOLÓGICAS
3.2 MEMÓRIA E APRENDIZAGEM
3.3 ATENÇÃO
3.4 FUNÇÕES EXECUTIVAS
3.5 RACIOCÍNIO E LINGUAGEM
3.6 PERCEPÇÃO E FUNÇÕES VISUOESPACIAIS E CONSTRUTIVAS
MÓDULO III
1 INTRODUÇÃO
2 PRINCÍPIOS DA AVALIAÇÃO NEUROPSICOLÓGICA
2.1 HISTÓRICO DA NEUROPSICOLOGIA
2.2 A PRÁTICA CLÍNICA DA NEUROPSICOLOGIA HOJE
2.3 OBJETIVOS DA AVALIAÇÃO NEUROPSICOLÓGICA
MÓDULO II
3 FUNÇÕES NEUROPSICOLÓGICAS
3.1 BASES ANATÔMICO-FUNCIONAIS DAS FUNÇÕES NEUROPSICOLÓGICAS
3.2 MEMÓRIA E APRENDIZAGEM
3.3 ATENÇÃO
3.4 FUNÇÕES EXECUTIVAS
3.5 RACIOCÍNIO E LINGUAGEM
3.6 PERCEPÇÃO E FUNÇÕES VISUOESPACIAIS E CONSTRUTIVAS
MÓDULO III
4 BATERIAS DE TESTES BÁSICOS E ESPECÍFICOS
4.1 TESTES PARA AVALIAÇÃO DO DESEMPENHO COGNITIVO GLOBAL
4.1.1 Instrumento de Avaliação Neuropsicológica Breve (NEUPSILIN)
4.1.2 Miniexame do Estado Mental (MEEM)
4.1.3 Clinical Dementia Rating (CDR)
4.2 TESTES DE INTELIGÊNCIA
4.2.1 Escala de Inteligência Wechsler para Adultos (WAIS-III)
4.2.1.1 Escala de Inteligência Wechsler Abreviada (WASI)
4.2.2 Escala de Inteligência Wechsler para Crianças Quarta Edição (WISC-IV)
4.2.3 Teste de Inteligência Geral – Não Verbal (TIG-NV)
4.3 TESTES DE MEMÓRIA E APRENDIZAGEM
4.3.1 Teste de Aprendizagem Auditivo Verbal de Rey (RAVLT)
4.3.2 Teste de Memória da Lista de Palavras do CERAD
4.3.3 Teste de Memória de Figuras
4.3.4 Teste Comportamental de Memória de Rivermead (TCMR)
4.4 TESTES DE ATENÇÃO
4.4.1 Teste de Atenção por Cancelamento
4.4.2 D-2 Teste de Atenção Concentrada
4.4.3 Teste de Trilhas
4.5 TESTES DO FUNCIONAMENTO EXECUTIVO
4.5.1 Teste do Desenho do Relógio (TDR)
4.5.2 Teste de Classificação de Cartas de Wisconsin (WCST)
4.5.3 Torre de Hanói, Torre de Londres e Torre de Toronto
4.6 TESTES DE RACIOCÍNIO E LINGUAGEM
4.6.2 Teste de Nomeação de Boston (versão reduzida)
4.6.3 Teste de Provérbios
4.6.4 Testes de Leitura e Escrita
4.7 TESTES DE PERCEPÇÃO E DO FUNCIONAMENTO VISUOCONSTRUTIVO
4.7.1 Teste de Praxia Construtiva da bateria CERAD
4.7.2 Figuras Complexas de Rey
4.7.3 Teste Gestáltico Viso-Motor de Bender – Sistema de Pontuação Gradual (B-SPG)
4.7.4 Subteste Cubos do WAIS
4.7.5 Subteste Quebra-Cabeça do WISC
5 AVALIAÇÃO DO HUMOR, COMPORTAMENTO E FUNCIONAMENTO ADAPTATIVO
5.1 ESCALAS E INVENTÁRIOS DE DEPRESSÃO
5.1.1 Inventário de Depressão de Beck (BDI)
5.1.2 International Neuropsychyatric Interview (MINI)
5.1.3 Escala de Depressão Geriátrica (EDG)
5.2 ESCALAS E INVENTÁRIOS DE ANSIEDADE
5.2.1 Inventário de Ansiedade de Beck (BAI)
5.2.2 Escala de Ansiedade de Hamilton
5.2.3 Escala Hospitalar de Ansiedade e Depressão (HAD)
5.3 ESCALAS E INVENTÁRIOS DE AVALIAÇÃO FUNCIONAL
5.3.1 Índice de Katz para Atividades Básicas da Vida Diária
5.3.2 Functional Activities Questionnaire (FAQ)
5.3.3 Inventário de Atividades Avançadas de Vida Diária
5.3.4 Informat Questionnaire of Cognitive Decline of the Elderly (IQCODE)
MÓDULO IV
6 DESORDENS COGNITIVAS
6.1 DISTÚRBIOS DA MEMÓRIA
6.1.1 Amnésia
6.1.2 Síndrome de Korsakoff
6.1.3 Comprometimento ou cognitivo leve (CCL)
6.1.4 Síndrome demencial
6.2 DISTÚRBIOS ATENCIONAIS
6.2.1 Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) ou Distu´rbio do De´ficit de Atenc¸a~o (DDA)
6.3 DISFUNÇÃO EXECUTIVA
6.3.1 Síndromes disexecutivas
6.3.2 Demências frontotemporais (DFTs)
6.4 DISTÚRBIOS DA LINGUAGEM
6.4.1 Afasias
6.5 DESORDENS VISUOESPACIAIS E CONSTRUTIVA
7 INTRODUÇÃO DA REABILITAÇÃO NEUROPSICOLÓGICA
7.1 OBJETIVO DA REABILITAÇÃO NEUROPSICOLÓGICA
7.2 ORIENTAÇÕES À FAMÍLIA DO PACIENTE E O ENCAMINHAMENTO PARA REABILITAÇÃO
8 CONCLUSÃO
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
MÓDULO 1
A avaliação neuropsicológica é conduzida por meio da aplicação de testes psicométricos que procuram descrever a habilidade cognitiva do indivíduo avaliado e compará-la com padrões pré-estabelecidos de normalidade. De forma geral, o propósito da avaliação neuropsicológica é estabelecer a relação entre atividades comportamentais e o funcionamento cerebral. Nesta avaliação são testadas funções cognitivas, tais como: memória, atenção, linguagem, funções executivas, raciocínio, habilidades motoras e visuoespaciais, bem como as alterações emocionais e de comportamento.
Contudo, para que o neuropsicólogo possa alcançar o objetivo da avaliação neuropsicológica não basta aplicar e pontuar os testes; é preciso conhecer as regiões cerebrais envolvidas nos aspectos comportamentais e nas funções cognitivas e também ter noções de neuropatologia para não incorrer em suspeitas diagnósticas incorretas e sugestões de tratamentos desnecessários.
PRINCIPIOS DA DAVALIACAO NEUROPSICOLOGICA
A neuropsicologia, enquanto uma área do conhecimento, surgiu a partir do interesse em compreender a localização anatômica das funções mentais e suas primeiras evidências enquanto ciência são oriundas de estudos conduzidos com indivíduos acometidos por danos cerebrais. Contudo, desde a Antiguidade, busca-se identificar que parte do corpo humano seria a sede de controle da mente, das emoções e do comportamento.
 
Há evidências de que técnicas de trepanação (Figura 1) eram praticadas desde a pré-história e umas das hipóteses, dentre as várias existentes, para explicar esta prática é a de que, na Antiguidade, acreditava-se que ao fazer orifícios no crânio criava-se uma saída para os maus espíritos e assim era possível curar transtornos mentais e dores de cabeça (RODRIGUES; CIASCA, 2010). O papiro egípcio chamado de Papiros de Edwin Smith (1600 a.C.) é considerado o documento mais antigo com relatos da localização das funções mentais, nele constam a descrição de 48 indivíduos com lesões cerebrais (HAMDAN et al., 2011).
O coração também já foi tido como o centro da mente ou da alma humana. Essa ideia ficou conhecida como hipótese cardíaca.
 
Ainda hoje, ouvimos popularmente expressões coerentes com esta ideia, como, por exemplo, quando dizemos “fazer o que o coração manda”.
No período grego clássico, muitos filósofos buscaram explicar a relação corpo e alma. Platão (428-348 a.C.) explicava que o corpo era a instância material, perene e mutável do homem enquanto a alma era a imaterial, a eterna, imutável.
 
Aristóteles (384-322 a.C.) explicava a atividade mental dividindo-a em diversas capacidades (pensar, julgar, imaginar, etc.), mas todas tinham o coração como sede anatômica (HAMDAN et al., 2011).
TREPANACAO: O procedimento consiste de fazer buracos na calota craniana e expor a dura-máter com o objetivo de tratar enfermidades ligadas direta ou indiretamente ao cérebro.
As ideias baseadas na hipótese cardíaca enfrentaram críticas dos adeptos da chamada hipótese cerebral, que viam o cérebro como o responsável pela atividade mental. O filósofo Alcmaeon de Crotona (500 a.C.) defendia que havia no cérebro uma localização para cada sensação humana. Um dos mais influentes defensores da hipótese cerebral foi o médico grego Hipócrates (460-377 a.C.), “o pai da medicina”, defensor da ideia de pensamento e sensações coordenadas pelo o cérebro (HAMDAN et al., 2011).
 
A hipótese cardíaca foi definitivamente abandonada a partir das confirmações da hipótese cerebral. Entre essas confirmações encontram-se os achados de Galeno (130-201 a.C.), obtidos a partir da dissecação do cérebro de animais e cadáveres que contribuíram para a teoria ventricular. Segundo esta teoria, os ventrículos cerebrais eram a sede da mente e os resultados de Galeno descreviam com precisão estas estruturas anatômico-fisiológicas.
Nesta época, os ventrículos causavam grande interesse entre os anatomistas porque se destacam na aparência gelatinosa que o cérebro não fixado apresentava. Segundo a teoria ventricular, haveria três ventrículos,o primeiro associado às sensações, o segundo associado à razão e ao pensamento e o terceiro seria o responsável pela memória. A Igreja reconhecia a explicação de Galeno de que os fluidos que circulavam nos ventrículos seriam os espíritos e que estes determinavam os comportamentos (COSENZA et al., 2008). Com apoio da Igreja, que tinha forte influência sobre as ideias da época, a teoria ventricular perdurou até boa parte da Idade Média.
O filósofo francês René Descartes (1596-1650), baseado nos princípios do dualismo cartesiano, defende, no final do século XVII, a ideia de que a mente e o corpo seriam entidades separadas e elas interagiam a partir de uma estrutura encontrada no corpo humano, a glândula pineal. Esta glândula era vista como a sede do espírito no corpo e por meio dela eram controlados os comportamentos (HAMDAN et al., 2011).
Hipotese Cerebral 
A hipotese cerebral tornou-se a ideia predominante e o debate passou a ser quanto a organizacao e o funcionamento do órgão de comando.
Entre os estudiosos que defenderam a hipótese cerebral estavam os holistas e os localizacionistas, que apesar de concordarem sobre o cérebro como a sede de funcionamento mental , discordavam sobre como a forma esse controle era possível. Para os holistas, o cérebro atuaria como um todo, comandando as funções mentais e o comportamento, enquanto os localizacionistas acreditavam em funcionamento fragmentado, de forma que cada uma das regiões cerebrais, teria uma função especifica. 
Entre os localizacionistas, teve grande influência a frenologia – teoria de Franz Joseph Gall (1757-1828), difundida por seu aluno Johann Gaspar Spurzheim (1776-1832). Estes estudiosos afirmavam que o cérebro estava organizado em aproximadamente 35 funções específicas (ver Figura 2) e acreditavam ser possível, por meio da análise do crânio, descrever a personalidade de uma pessoa. Esta técnica foi chamada de personologia anatômica.
Segundo Consenza et al. (2008), os pressupostos básicos da frenologia podem ser resumidos da seguinte forma:
 
1) cada região cerebral pode ser entendida como um “órgão” que comanda determinada atividade mental ou comportamental específica;
 
2) a superfície craniana poderia ser moldada a partir do desenvolvimento de cada região cerebral;
 
3) uma região cerebral bem desenvolvida pode crescer em volume e resultar em um crescimento visível no crânio.
A frenologia foi criticada pela comunidade científica porque seus pressupostos não foram comprovados. Um grande opositor de Gall foi Flourens (1794-1867), um fisiologista que estudava o cérebro de animais e percebeu que alguns comprometimentos em determinadas regiões cerebrais não resultavam em danos permanentes. Em seu estudo com pássaros observou que, independente do local lesionado, o animal poderia restabelecer o padrão de funcionamento, pois não era a região lesionada e sim a extensão da lesão que dificultava a recuperação. Suas conclusões o fizeram defender as ideias de que qualquer região cerebral poderia assumir as funções de outra área em caso de lesão e que, portanto, o cérebro funcionaria como um todo no qual todas as partes estariam envolvidas em todos os comportamentos (GAZZANIGA et al., 2006).
 
Outro opositor das ideias localizacionistas e defensor das propostas de Flourens foi Karl Lashley (1890-1958), que apresentou os princípios da “ação de massa” em referência a ideia de que seria a quantidade de material lesionado que determinaria os prejuízos funcionais e comportamentais e o princípio da “equipotencialidade” em referência a possibilidade de diferentes regiões cerebrais poderem exercer a mesma função. Lashey fez experimentos com ratos em labirintos e mostrou que os animais conseguiam executar a tarefa de encontrar a saída mesmo após lesão em determinadas áreas cerebrais. Sua conclusão sobre estes resultados era que para aprender a se locomover o animal utilizava funções visuais e proprioceptivas, então a lesão em somente uma destas áreas era compensada com uso da área preservada.
Mesmo diante do fracasso das ideias de Gall e de descobertas como a de Floures, o debate entre holistas e localizacionistas permanecia a favor do segundo grupo uma vez que novas e importantes descobertas foram feitas no sentido de se identificar áreas especializadas do cérebro. Assim, por longo período os neurocientistas estudaram o cérebro no intuito de descobrir novas regiões do cérebro responsáveis por uma função mental ou comportamentos específicos.
 
Entre as principais contribuições para as ideias localizacionistas estão as descobertas sobre as regiões cerebrais relacionadas à linguagem. Paul Broca (1824-1880) apresentou a descrição de pacientes acometidos por lesões nos lobos frontais do hemisfério cerebral esquerdo, que apresentavam comprometimento na produção da fala e preservação da compreensão da linguagem. Essa síndrome foi chamada de afasia de Broca e a área da lesão, conhecida atualmente como a área de Broca, passou a ser considerada como o “centro funcional da linguagem”.
O Mapa Frenológico
Gall e seus seguidores identificaram 37 faculdades mentais e morais as quais eles pensavam que eram representadas na superfície exterior do crânio. A lista inicial de Gall compreendia 27 faculdades, para as quais, seu principal colaborador, Spurzheim, adicionou mais dez. Estas faculdades foram divididas em várias esferas: intelectualidade, percepção, energia mental, faculdades morais, amor, etc. A maioria das faculdades tratavam de personalidades abstratas, tais como firmeza, aprovação, cautela, eventualidade, espiritualidade, veneração, amabilidade, etc. Outros traços frenológicos tinham contrapartidas científicas modernas as quais podiam ser avaliadas com testes psicológicos específicos, tais como construção, destruição, individualidade, auto-estima, idealismo, afeto, etc.
O principal resultado da teoria de Gall foi o tipo de gráfico do crânio, o qual mapeava as regiões onde as protusões e depressões relacionadas a 37 faculdades poderiam ser palpadas, medidas e diagnosticadas. Este era um excelente dispositivo para praticantes, e foi amplamente usado.
Posteriormente, o neurologista Carl Wernicke (1848-1904) descreveu pacientes que também apresentavam comprometimento de suas habilidades linguísticas, contudo apresentavam um tipo de lesão diferente daquela descrita por Broca. Nos pacientes de Wernicke a lesão ocorria no córtex temporal do hemisfério cerebral esquerdo e a principal dificuldade era na compreensão da linguagem.
 
Esse tipo de comprometimento ficou conhecido como afasia de Wernicke. Outra contribuição de Wernicke é a ideia de que lesões nas conexões entre estas regiões cerebrais também levaria ao comprometimento da linguagem. A chamada afasia de condução foi outro distúrbio da linguagem explicado por este estudioso. Nesta síndrome as lesões ocorrem no fascículo arqueado, região responsável pela conexão entre as áreas de Broca e de Wernicke.
 
Áreas do cerebrais associadas a linguagem
Outras evidências contribuíram de forma significativa para a neuropsicologia como a conhecemos na atualidade, como a divulgação do caso do funcionário americano Phineas Gage (1823-1860) que, em decorrência de uma explosão, teve o cérebro perfurado por uma barra de metal (ver Figura 4).
 
A barra atingiu o olho esquerdo e atravessou a parte frontal do cérebro. Apesar disto, Phineas sobreviveu, aparentemente, sem sequelas motoras e cognitivas, mas com alteração significativa em sua personalidade, comportando-se de forma oposta ao que costumava fazer antes do acidente. Essa sequela tão específica em uma lesão tão grave gerou interesse dos estudiosos em neurociências.
O curioso caso de Phineas Gage
	
	Fotografia de Phineas Gage junto com 
a barra que atravessou seu crânio
Um 13 de setembro de 1848, como quase todo dia, o jovem Phineas Gage, de 25 anos, saiu de casa para o trabalho. 
Por suas virtudes pessoais, seu senso de responsabilidade, liderança, eficiência e companheirismo, tinha sido nomeadocapataz de um grupo de trabalhadores responsáveis pela construção da via férrea. A missão do grupo, explodir grandes rochas para permitir assim a colocação dos trilhos. Como de rotina, buracos de uns 30 centímetros eram feitos na pedra e posteriormente preenchidos com pólvora. Para empurrar a pólvora, Phineas utilizava uma barra de ferro de mais de um metro de comprimento e quase 3 centímetros de diâmetro. Mas para seu azar, nesse dia ao empurrar a barra de ferro no interior do orifício uma faísca detonou a pólvora. A barra, lançada como um projétil, atravessou a cabeça de Phineas. O ponto de impacto foi na bochecha, logo abaixo do osso zigomático. A barra perfurou depois sua órbita empurrando o globo ocular para fora. Destruindo parte do cérebro, finalmente saiu pela região superior do crânio, trás provocar um orifício de quase seis centímetros de diâmetro entre os ossos parietais e frontal. A barra foi parar a uns 20 metros, junto com fragmentos de osso e massa encefálica.
Incrivelmente, Phineas não morreu. Embora desmaiasse pelo impacto, minutos depois estava em pé conversando com os colegas. Levado ao médico da pequena cidade onde vivia, este tentou recolocar os fragmentos de osso em seu lugar e suturou da melhor forma possível o couro cabeludo. Alguns dias depois, a enorme ferida infeccionou e Phineas entrou em coma. Esperando pelo pior, sua família já preparava o enterro, porém, Gage se recuperou, e para o mês de janeiro, estava levando uma vida normal.
Mas já não era Phineas Gage. A descrição do acidente e sua vida posterior constam de relatos apresentados por seus médicos. De acordo com um deles, Phineas conservou todas sua faculdades intelectuais. Salvo a perda do olho e a cicatriz, nada parecia indicar a gravidade do seu acidente. Sem problemas de memória, os cinco sentidos perfeitos, movimentos em ordem, conversa fluente, inteligência normal... Mas foi sua esposa e outra pessoas próximas que notaram alterações dramáticas em sua personalidade. Seu médico descreve, “Seus chefes, que o consideravam o trabalhador mais eficiente e capaz antes do acidente, disseram que as mudanças que tinha sofrido eram tão marcantes que não poderiam lhe devolver seu antigo emprego. Era agora instável e irreverente, capaz das condutas e blasfêmias mais grosseiras, mostrando escasso respeito pelos sus semelhantes, impaciente, incapaz de escutar qualquer conselho que se opusesse aos seus desejos. Também se mostrava insistentemente obstinado, teimoso e ao mesmo tempo vacilante, imerso em muitos planos para o futuro mas, sendo incapaz de continuar uma tarefa demasiado longa, mudava-os constantemente. Em virtude destas mudanças, seus amigos e familiares concluíram que Gage “não era mais Gage”.”
Sem emprego, esposa ou amigos, Phineas decidiu ganhar dinheiro com sua desgraça, exibindo-se com sua barra de ferro em cidades dos Estados Unidos e -provavelmente- Europa. Posteriormente trabalhou como instrutor e condutor de carruagens, mudando para o Chile e lá vivendo por sete anos. Com problemas de saúde, voltou à casa materna nos Estados Unidos, onde morreu no dia 20 de maio de 1860, treze anos após o acidente, devido a complicações provocadas por ataques epilépticos.
Em 1867, o corpo de Gage foi exumado e o crânio junto com a barra de ferro são exibidos hoje em uma sala especial no museu da Faculdade de Medicina de Harvard.
	
	Crânio e barra de ferro de Phineas, no museu da Faculdade de Medicina de Harvard
Em 1994, um grupo de pesquisadores liderados pelo português Antônio Damasio, utilizando técnicas de neuro-imagem reconstruíram o crânio e o trajeto da barra de ferro, de forma a descobrir quais áreas do cérebro tinham sido atingidas. Como já se suspeitava, o acidente provocou a destruição de parte do lobo frontal esquerdo, embora a extensão total da lesão não pudesse ser definida.
	
	À esquerda, reconstrução computacional do trajeto da barra de ferro
Mais de 150 anos após o acidente, a neurociência tem uma explicação aproximada sobre o que aconteceu com Phineas. Sabemos hoje que a região mais anterior do cérebro é responsável pela nossa capacidade de planejamento, a fundamental capacidade de prever o que vai acontecer caso façamos isto ou aquilo. Assim, nos ajuda a tomar a decisão correta, às vezes até de forma não consciente. 
Como consequência dessa capacidade de previsão, participa na inibição de respostas inadequadas, o que permite que nosso comportamento seja o mais apropriado para cada situação.Phineas Gage foi emblemático para a ciência porque com ele a velha separação “corpo e alma” tal qual descrita por Descartes começava a ruir. O que nos torna o que somos parece não flutuar no ar. Pode ser destruído junto com nossos lobos frontais.
O curioso caso de Phineas Gage pode não ser como “O curioso caso de Benjamin Button”, mas nos mostra que quando nos permitimos admirar todo o drama e o deslumbramento da vida através dos olhos perscrutadores de ciência, o panorama que se apresenta pode ser tão interessante -e certamente mais real- quanto a mais premiada história de Hollywood.
No início do século XX, o interesse em explicar as funções mais complexas foi crescente e a noção de que as diversas áreas cerebrais estavam interligas foi ganhando espaço. Em 1940, Walter Hess defendeu a ideia de que o número de estruturas cerebrais envolvidas para realização de uma atividade seria proporcional à sua complexidade. James Papez e Paul MacLean ampliavam o conhecimento sobre o sistema límbico, explicando sobre a existência de um conjunto de estruturas cerebrais interconectadas para que fossem processados os conteúdos emocionais (COSENZA et al., 2008).
 
Neste mesmo período, o médico William Scoville descreveu o caso clínico do paciente “H. M.”, que ficou amplamente conhecido na literatura como uma das primeiras evidências de que os processos de memória e aprendizagem dependiam de diversificadas áreas cerebrais e de suas conexões. Trata-se de um paciente epiléptico que, após cirurgia para remover seu hipocampo e amígdalas, tornou-se incapaz de aprender novas informações.
	
Quem foi H.M. ?
"H.M.", na verdade, são as iniciais de Henry Molaison, um cidadão norte-americano, nascido na cidade de Manchester em 1926. Durante sua infância (a partir dos 10 anos), Henry sofreu de episódios recorrentes de crises epilépticas focais. Alguns de seus parentes alegam que as crises começaram após um acidente de bicicleta sofrido por ele aos 7 ou 9 anos. Quando Henry completou 16 anos, suas crises começaram a aparecer com mais frequência e se generalizaram, manifestando-se como crises tônico-clônicas, que são o tipo mais conhecido de epilepsia, em que o indivíduo apresenta espasmos musculares generalizados, perde o controle de seus esfíncteres e perde a consciência.
Henry Molaison, o "H.M."
Sua epilepsia piorou de tal forma que Henry foi declarado incapacitado para trabalhar em 1953, com apenas 27 anos, mesmo tentando o tratamento com medicação anticonvulsivante. Por causa disso, um neurocirugião chamado William Scoville se ofereceu para fazer uma cirugia experimental em Henry com o intuito de curar sua epilepsia. Após alguns testes, Scoville deduziu que a "origem" das crises de H.M vinha dos lobos temporais mediais dos dois hemisférios cerebrais. O tratamento proposto foi, então, realizar uma cirurgia de resecção dessas regiões encefálicas. H.M. e sua família consentiram com o procedimento.
Quais foram as consequências da cirurgia de H.M. ?
Dr. Scoville retirou partes do lobo temporal conhecidas como hipocampo, amígdala e uncus dos dois hemisférios cerebrais de H.M.. A princípio, a cirurgia parecia ter sido bem sucedida, porque foi constatado que H.M. tinha melhorado muito em relação a suas crises epilépticas. Porém, logo ficou claro que o procedimento de resecção cerebral havia deixado uma sequela neurológica muito grande em H.M: o paciente desenvolveu uma amnésia anterógrada gravíssima. Isso significa que H.M. não conseguia mais consolidar nenhuma memória nova de fatosque aconteciam após a sua cirurgia.
Hipocampo: região cerebral responsável por consolidar memórias
Também houve um pequeno comprometimento de memórias passadas de H.M, principalmente de sua infância, caracterizando uma amnésia retrógada. Porém esta não era nem de perto tão grave quanto sua amnésia anterógrada. Apesar dessa incapcidade de formar novas memórias, o restante da capacidade intelectual de H.M permaneceu relativamente intacto, sendo preservada sua habilidade de raciocínio. Além disso, outros tipos de memória não foram comprometidas em H.M. como, por exemplo, a "memória de trabalho" (capacidade de reter informações por pouco tempo, apenas para elas serem utilizadas em uma tarefa em andamento) e também a habilidade de aprendizado motor (apesar de H.M. não conseguir se lembrar como havia adquirido essa nova habilidade).
O que a neurociência aprendeu com o caso H.M. ?
O caso H.M., sem dúvidas, é um dos mais estudados da história da neurociência. O artigo publicado por Dr. William Scoville e Dra. Brenda Milner (uma das maiores neurocientistas de todos os tempos, que contribuiu no estudo de Henry Molaison) em 1957 continua sendo citado extensivamente até os dias de hoje.
A contribuição mais óbvia e imediata do caso é que o lobo temporal está envolvido na consolidação de memórias episódicas. Na época não se podia ter certeza (uma vez que foram retiradas várias regiões do lobo temporal), mas depois de outros casos, hoje já se sabe que o hipocampo é a principal região envolvida nesse processo. O caso H.M. foi fundamental nessa dedução porque o paciente não possuia problema alguma antes da cirurgia e, após o procedimento de resecção bilateral do lobo temporal, começou a apresentar esse déficit.
Mais do que isso, talvez o principal ensinamento que o estudo do caso proporcionou foi o de que os diversos tipos de memória são adquiridos e processados por processos diferentes e em regiões cerebrais predominantemente distintas. O fato de Henry ter perdido a capacidade de consolidar memórias de episódios ocorridos após sua cirurgia, mas ter preservado outros tipo de memória como a memória de trabalho ou o aprendizado motor foi algo que ensinou muito aos neurocientistas. Hoje em dia, já se tem muito mais conhecimento sobre os processos que governam cada tipo de memória, mas na época essa descoberta foi totalmente fantástica e inesperada.
E o que aconteceu com H.M. ?  
Para vocês que ficaram curiosos de saber o que aconteceu com Henry Molaison: ele morreu em 2008, com 82 anos de idade! Ele gostava de fazer palavras-cruzadas, mas só conseguia completar com palavras que havia aprendido antes de sua cirurgia. Após a sua morte, a Universidade da Califórnia de Davis ficou com o seu cérebro para realizar pesquisas anátomo-patológicas e os resultados estão sendo divulgados até hoje.
A partir de estudos de casos como este e outros conduzidos – principalmente durante a guerra – com indivíduos que sofreram lesões cerebrais, os processos mentais passaram a ser explicados como dependentes da integridade de centros nervosos e suas conexões e não, simplesmente, do funcionamento de áreas cerebrais específicas. Contribuíram também para os avanços sobre a compreensão do funcionamento cerebral os estudos histológicos de Camilo Golgi e do histologista Santiago Cajal. Golgi desenvolveu o famoso método de coloração por prata, técnica que permitiu a identificação de toda estrutura da célula nervosa (corpo celular, dendritos e axônios). Cajal, utilizando este método de coloração, mostrou que estava errada a ideia de que o cérebro era uma massa contínua e demonstrou que o tecido neural era composto de um emaranhado de células (RODRIGUES; CIASCA, 2010). 
Outra importante contribuição para a forma como o funcionamento cerebral é visto hoje foi dada pelo anatomista Korbinian Brodmann (1909). A partir de seu estudo com tecido corado, o córtex cerebral foi dividido em 52 regiões diferentes (Figura 5), conhecidas como áreas citoarquitetônicas, isto é, áreas em que se diferenciam pela estrutura e disposição de suas células (neurônios). Esta divisão é conhecida como mapa das áreas corticais do cérebro humano e é uma das mais reconhecidas pelos neurocientista que ainda a estudam e buscam seu aprimoramento.
As tendências localizacionistas ainda prevaleceram no início do século XX com importantes descobertas que as validavam, como a diferenciação de funções entre os dois hemisférios cerebrais. Contudo, as controvérsias apresentadas, nesta época, sobre a localização de regiões específicas para a execução das chamadas “funções superiores”, como a memória e o pensamento, diminuíram as certezas sobre as hipóteses localizacionistas. Esse campo fértil de contradições contribuiu para ideias como a de Monakow, que defendia a diásquise – dano em uma das regiões encefálicas pode resultar em prejuízo em outras regiões – influenciasse muitos estudos com tendência holista (GAZZANIGA et al., 2006). A discussão entre localizacionistas e holistas toma novos rumos a partir das descobertas de Lev Vygotsky (1896-1934). Vygotsky argumentou que a organização cerebral ocorria a partir de uma inter-relação complexa entre suas partes e que desta forma se daria o funcionamento do todo. 
Vygotsky desenvolveu seus estudos mostrando que o funcionamento mental variava para os diferentes estágios do desenvolvimento humano e, ainda hoje, suas ideias estão entre um dos importantes expoentes da psicologia da aprendizagem. Influenciado por estas ideias, o psicólogo soviético Alexander Luria (1902-1977), a partir do estudo com pacientes acometidos por lesão cerebral, desenvolveu um novo conceito de função.
 
Assim, as premissas localizacionistas deram lugar à proposta de funcionamento interligado das áreas cerebrais que predomina na neuropsicologia atual. Luria atuou junto com Vygotsky focalizando, inicialmente, no estudo da afasia e na relação da linguagem com outros processos mentais, sendo um de seus maiores interesses o desenvolvimento de técnicas de reabilitação. Durante o período da Segunda Guerra Mundial, Luria desenvolveu pesquisas no Hospital do Exército e focou na descoberta de métodos de reabilitação de deficiências no pacientes com lesões cerebrais.
Luria atuou também na elaboração de baterias completas para avaliação neuropsicológica, que foram amplamente utilizadas em meados do século XX e ainda influenciam a forma como os testes são elaborados e utilizados na testagem neuropsicológica. A primeira versão dos testes de Luria deu origem a diversas outras baterias neuropsicológicas, como a Luria-Nebraska e o teste de Barcelona, que consistem em avaliações amplas dos diversos domínios cognitivos (HAMDAN et al., 2011). Estes testes ainda são úteis, mas dividem espaço com uma infinidade de testes neuropsicológicos que vêm sendo elaborados com intuito de se tornarem cada vez mais específicos.
 
Além disto, Luria trabalhou na elaboração do conceito de neuroplasticidade, que pode ser entendida como a capacidade adaptativa do sistema nervoso frente às agressões sofridas em sua estrutura, isto é, a possibilidade do cérebro se regenerar, de modificar sua morfologia e reassumir suas funções.
 
Este é um conceito central na área da neurociência atual, sobre o qual muitos cientistas se debruçam na busca de inovações. A grande contribuição de Luria para as técnicas utilizadas hoje na área da neuropsicologia, tanto no âmbito da avaliação quanto da reabilitação, faz com que ele seja considerado por alguns como o pai da neuropsicologia. Luria argumentava que apenas funções mais simples poderiam ser localizadas e que funções complexas são executadas a partir de “sistemas funcionais”, ou seja, grande parte dos processos mentais demandam sistemas que atuam em conjunto, independente se áreas envolvidas estão localizadas em partes diferentes ou mesmo distantes do cérebro.
 
Baseando-se nesta proposta de Luria, é possível distinguir no cérebro três grandes sistemas funcionais (ver Figura 6), conforme descrito por Cosenza e Fuentes et al. (2008):O primeiro regula a vigília e o tônus cortical e depende de estruturas como a formação reticular e áreas do sistema límbico. O segundo se encarrega de receber, processar e armazenar as informações que chegam do mundo externo e interno e está situado em áreas do córtex cerebral localizadas posteriormente ao sulco central.
 
Ele organiza-se em áreas corticais primárias, secundárias e terciárias. Já́ o terceiro sistema regula e verifica as estratégias comportamentais e a própria atividade mental, é constituído pelo córtex cerebral situado nas regiões anteriores do cérebro e organiza-se, também hierarquicamente, em áreas corticais primária, secundária e terciária.
Na abordagem neuropsicológica de Luria o funcionamento cerebral é explicado com a coparticipação dos dois sistemas funcionais do cérebro e os objetivos centrais da neuropsicologia seriam:
1) localizar as lesões cerebrais responsáveis pelos distúrbios do comportamento para um diagnóstico preciso;
 
2) explicar o funcionamento das atividades psicológicas superiores relacionadas com as partes do cérebro.
Na atualidade, a neuropsicologia superou esta necessidade de estabelecer a localização das funções mentais como sua prioridade. A discussão localizacionismo versus holismo foi superada com o surgimento das modernas técnicas de neuroimagem, que hoje são as principais ferramentas para fins de localização de regiões lesionadas. Isso não quer dizer que uma avaliação neuropsicológica não mantenha este objetivo, mas este propósito é prioritário, exclusivamente, em casos de patologias cujos sintomas manifestam-se antes, ou independente, das alterações cerebrais alcançarem um nível detectável pelos procedimentos de neuroimagem. Assim, a neuropsicologia ganhou uma nova discussão, a do funcionalismo versus o cognitivismo expressa por Hadman (2011) da seguinte forma:
 
As técnicas tradicionais de avaliação neuropsicológica advêm da tradição funcionalista que considera que a predição do desempenho do indivíduo é o objetivo primário da avaliação e o construto psicológico é secundário. Por outro lado, os testes construídos na tradição cognitivista enfatizam primariamente o construto psicológico e a predição clínica como alvo secundário da avaliação.
No que se refere à neuropsicologia enquanto uma área da psicologia, mesmo sendo reconhecido que a psicologia cognitiva e a neuropsicologia tinham objetos de interesse em comum, até a década de 70, estas áreas caminhavam em paralelo. Aos poucos, a neuropsicologia amplia seus estudos de casos clínicos e a construção de testes neuropsicológicos de forma a ir se estabelecendo como uma área de prática clínica embasada pelo arcabouço científico construído em conjunto com a psicologia cognitiva (ANDRADE; SANTOS, 2004)  profissão de neuropsicólogo ganhou o reconhecimento da American Psychological Associacion (APA) como área de atuação do psicólogo em 1980 e como especialidade da psicologia em 1996. Foram marcos importantes para este reconhecimento e para o auxílio da prática dos neuropsicólogos: a fundação da International Neuropsychological Society (INS), em 1967; e a fundação da National Academy of Neuropsychology (NAN), em 1975 (HAMDAN et al., 2011).
No Brasil, somente em 2004 o Conselho Federal de Psicologia (CFP) estabelece a especialidade da neuropsicologia e delimita o campo de formação deste profissional no país. Para conceder o título de especialista, o CFP exige do profissional psicólogo: registro profissional no conselho de no mínimo dois anos; aprovação em concurso de provas e títulos promovido pelo próprio conselho ou a realização de curso de especialização na área.
 
Atualmente, a neuropsicologia está voltada não só para os temas clássicos da psicologia cognitiva, como a aprendizagem; a percepção, a atenção, como também se utiliza da psicologia experimental e da psicometria para atuar na construção de testes. O neuropicólogo ganhou espaço em hospitais, fóruns, clínicas, consultórios privados e em atendimentos domiciliares com diferentes propósitos. Sua atuação é, em geral, multidisciplinar e voltada não só ao próprio paciente, mas também à orientação de familiares.
 
Além disto, pode atuar no meio acadêmico conduzindo pesquisas e auxiliando na formação de futuros profissionais, por meio de aulas e supervisões. O campo para novas descobertas sobre a forma de funcionamento cerebral é amplo e continuamente promove inovações que obrigam os clínicos a reverem suas práticas. A neuropsicologia consiste, portanto, em campo de conhecimento científico e prático ainda em expansão, e seus desafios são ainda maiores em países como o Brasil, onde a delimitação profissional ocorreu tão recentemente.
 
Recentes avanços das técnicas de neuroimagem possibilitaram e acrescentaram evidências sobre a correlação entre as funções cognitivas e o funcionamento cerebral. O aprimoramento da neuroimagem permitiu uma minuciosa identificação das áreas cerebrais causando uma ampliação dos objetivos da avaliação neuropsicológica, antes focada, primordialmente, na localização de áreas cerebrais acometidas por lesões. Assim, a avaliação neuropsicológica, hoje, busca não só identificar o local de uma lesão, mas também a dimensão e o impacto cognitivo e comportamental do prejuízo cerebral, possibilitando que futuras intervenções promovam a adaptação emocional e social dos pacientes acometidos por este tipo de adversidade (COSENZA et al., 2008).
Camargo et al. (2008) enumeraram diferentes objetivos para os quais uma avaliação neuropsicológica pode ser solicitada, a saber:
 
Auxílio diagnóstico;
 
Prognóstico;
 
Orientação para o tratamento;
 
Auxílio no planejamento de reabilitação;
 
Seleção de pacientes para técnicas especiais como cirurgias de risco ou medicações de alto custo;
 
Perícia.
 
No auxílio diagnóstico uma avaliação neuropsicológica estabelece o correlato neuroanatômico com o desempenho cognitivo e funcional observado a partir das alterações e manutenções dos mesmos. O objetivo neste caso é confirmar e/ou refutar as hipóteses diagnósticas que explicam os sinas e sintomas apresentados pelo paciente. Nesse sentido, a avaliação neuropsicológica é de grande relevância para o processo de diagnóstico diferencial no qual relatos subjetivos das alterações cognitivas não auxiliam para diferenciar entre as diversas possibilidades diagnósticas.
 
Por exemplo, em casos de pacientes idosos com prejuízos cognitivos cujos resultados dos exames de neuroimagem e dos testes laboratoriais são insatisfatórios para explicar as causas dos prejuízos que poderiam ser decorrentes de um quadro depressivo ou de uma síndrome demencial em fase inicial.
No que se refere à orientação ao tratamento, a partir dos resultados da avaliação neuropsicológica, é possível orientar sobre a melhor intervenção a ser oferecida em diferentes contextos, como no educacional, auxiliando no planejamento vocacional e da aprendizagem, e na saúde, fornecendo dados que facilitam na escolha e execução das intervenções cirúrgicas, medicamentosas e de reabilitação. No processo terapêutico, contribui para avaliação da eficácia de tratamento farmacológico e de técnicas de reabilitação direcionadas para pacientes acometidos por agravos neurológicos. No caso de pacientes acometidos pela doença de Alzheimer, por exemplo, a medicação parece eficaz somente até a fase intermediária da doença, de forma que reavaliação do funcionamento cognitivo do paciente é essencial para demonstrar de forma objetiva se a medicação auxilia no sentido de retardar o avanço dos prejuízos ou se, em caso de progressão para fase grave, o tratamento farmacológico tornou-se ineficaz (ABRISQUETA-GOMEZ et al., 2004). 
Um exemplo do uso da avaliação neuropsicológica como ferramenta útil no prognóstico é em caso de sua aplicação com pacientes epilépticos no pré-operatório. Segundo Camargo et al. (2008), nestes quadros, “estudos vêm mostrando que quando a avaliação neuropsicológica dá indícios de que as alterações cognitivas são bilaterais,ou quando a integridade funcional do hemisférios contralateral ao foco é baixa, a evolução será negativa”.  
 
Alguns procedimentos (cirurgias ou tratamentos com medicamentos, por exemplo) implicam em algum tipo de risco para o paciente e nestes casos é necessária uma forma objetiva de estimar os benefícios e os possíveis prejuízos decorrentes de tais procedimentos. Nestes casos, uma avaliação neuropsicológica pode auxiliar em um processo de triagem de quais pacientes seriam indicados para o procedimento de risco (CAMARGO et al., 2008).
 
Dentre os vários propósitos da avaliação neuropsicológica, o diagnóstico é o de maior demanda. Entre os acometimentos do sistema nervoso central que levam à demanda da avaliação neuropsicológica estão os traumatismos cranioencefálicos (TCE), as epilepsias, os acidentes vasculares cerebrais (AVCs), as demências, as desordens metabólicas, as deficiências de vitaminas e as desordens toxicológicas (a descrição destes agravos está no Módulo IV deste curso).
Outra demanda, em geral, para avaliação neuropsicológica infantil está associada ao diagnóstico de transtornos do desenvolvimento, em geral, associados a déficits de aprendizagem. Este tipo de demanda aparece, com frequência, quando a criança está em idade escolar, pois no contexto de aprendizagem são facilmente observadas alterações da percepção, da atenção, da memória ou mesmo de comportamento e motivação. Hamdan et al. (2011, p. 52) descreve da seguinte forma os objetivos da avaliação neuropsicológica voltada para crianças:
 
Dentro dos objetivos específicos da avaliação neuropsicológica infantil está a identificação precoce de transtornos cognitivos e desordens do desenvolvimento e, como tal, alterações no processo de aquisição das habilidades. O termo precoce deve se entendido como o mais cedo possível na história de vida da criança, portanto, dependerá do tipo de comprometimento cerebral, da idade e do próprio processo de formação da função. [...] A avaliação neuropsicológica infantil deve ser sensível ao conjunto dos sinais cognitivo-comportamentais demonstrados durante o desenvolvimento da criança, reconhecendo-o como uma desordem do processamento neuropsicológico ou não.
 
No Brasil, vem crescendo a demanda pela neuropsicologia tanto no âmbito da avaliação quanto da reabilitação. Na população adulta jovem, principalmente a masculina, este aumento é explicando pela incidência crescente de acidentes de trânsito que resultam em traumatismo cranioencefálico e na população mais velha, meia e terceira idades, a demanda vem do aumento do número de acidentes vasculares cerebrais e quadros demenciais que são reflexos do aumento da expectativa de vida observada no país.
 Em resposta a este cenário, instrumentos de avaliação neuropsicológica específicos para diagnosticar os agravos comuns nas faixas etárias mais velhas vêm sendo amplamente estudados e validados (nos Módulos III e IV estão descritos instrumentos mais utilizados e as desordens cognitivas mais comuns nesta população, respectivamente).
No que se refere aos procedimentos práticos de uma avaliação neuropsicológica, o profissional deve seguir um roteiro que, apesar das adaptações necessárias para atender a faixa etária e a demanda de solicitação da avaliação, deve contemplar: 3 etapas
Entrevista clínica (anamnese) para investigar os seguintes aspectos:
 
- Histórico clínico e do surgimento da patologia ou queixas que levaram a solicitação da avaliação;
- Medicações em uso;
- Funcionamento cognitivo prévio.
Escolha e aplicação de testes e escalas:
 
- Testes para avaliação do desempenho cognitivo global;
- Testes para avaliação de cada domínio cognitivo;
- Escalas e testes para avaliação humor; o    Escalas para avaliação da capacidade funcional.
Escolha e aplicação de outras ferramentas diagnósticas:
 
- Exames de neuroimagem (tomografia computadorizada, ressonância magnética, spect);
- Observação do comportamento em ambiente real;
- Relatos de informantes que convivam com o paciente.
Para escolha dos testes a serem utilizados em uma avaliação neuropsicológica, o avaliador deve considerar os seguintes aspectos:
 
 
- Objetivo da avaliação. Quando o objetivo é diagnóstico, por exemplo, o examinador vai selecionando os testes para confirmar e/ou descartar as hipóteses diagnósticas que são elaboradas ao longo das sessões de avaliação;
 
- Testes adequados à idade e à escolaridade do indivíduo a ser avaliado;
 
- Testes validados e adaptados para a cultura da população a ser avaliada;
 
- Normas para aplicação e pontuação. O examinador, principalmente se inexperiente, deve preferir testes de fácil acesso e nos quais possua domínio para aplicação;
 
- Formação do examinador. Alguns testes são de uso exclusivo dos profissionais de psicologia. Informações sobre teste podem ser obtidas no Sistema de Avaliação de Testes Psicológicos do Conselho Federal de Psicologia (SATEPSI, 2013).
 
Além da escolha dos testes, existem condições situacionais que podem interferir na testagem e, portanto, precisam ser controladas. São exemplos:
 
- Instruções do examinador pouco objetivas ou com incentivo desnecessário;
- Luminosidade, temperatura e conforto do ambiente de testagem;
- Interrupções e ruídos no momento da testagem;
- Condições do examinando no momento da testagem. Efeitos de medicação, alterações do sono, estado emocional ansioso e mal estar físico podem interferir na resposta e disposição do examinando, modificando o desempenho em relação ao seria expresso na ausência destas condições. Finalmente, é importante destacar que diversos fatores podem influenciar no desenvolvimento e no aprimoramento das funções cognitivas que devem ser considerados como influentes no desempenho pré-mórbido e também como fontes de reserva cognitiva. Alguns destes fatores incluem:
- O contexto socioeconômico, histórico e cultural;
 
- As oportunidades educacionais e de trabalho;
 
- Interações e atuações sociais;
 
- Interesses pessoais;
 
- Ambiente reforçador ou inibidor da capacidade individual.  
A investigação destes fatores pode ser incluída como parte do roteiro de avaliação neuropsicológica. Trata-se de informações que podem ser facilmente obtidas, por meio de entrevista semiestruturada, com o próprio paciente ou com um informante quando houver prejuízos que incapacitem o próprio paciente de fornecê-las. Estas informações adicionais podem complementar o relatório de avaliação, principalmente, quando o objetivo é o de fornecer suporte para elaboração de um programa de reabilitação neuropsicológica que visa à recuperação do desempenho cognitivo global ou específico.
MODULO II
3. FUNCOES NEUROPSICOLÓGICAS
3.1 BASE ANATOMICA- FUNCIONAIS DAS FUNCOES NEUROPSICOLOGICAS
O funcionamento cognitivo pode ser avaliado por meio da mensuração de habilidades como atenção, memória, linguagem, as habilidades viso-construtiva, as funções executivas e demais capacidades associadas à cognição como a concentração, a compreensão, o raciocínio, a aprendizagem, a velocidade de processamento de informação, essas habilidades correspondem a um sistema complexo que correspondem a um sistema complexo s que funciona a partir de rede de conexões das diversas regiões cerebrais.
 
O sistema nervoso está dividido em sistema nervoso periférico e sistema nervoso central. O sistema nervoso central é responsável pela recepção de estímulos e comanda as respostas que deverão ser dadas a partir dos estímulos recebidos. O sistema nervoso periférico é constituído por vias que conduzem os estímulos ao sistema nervoso central e, ao contrário, vias que levam até os órgãos os comandos vindos do sistema central.
 
O sistema nervoso periférico se divide em: nervos; gânglios e terminações nervosas. O sistema nervoso central divide-se em encéfalo e medula espinhal. O encéfalo, por sua vez, é formado por: telencéfalo (hemisférios cerebrais); diencéfalo (tálamo e hipotálamo); cerebelo; e tronco encefálico(mesencéfalo, ponte e bulbo). A disposição desta estrutura com suas partes e seus respectivos componentes pode ser vista na Figura 7.
 
No diencéfalo, o tálamo é responsável pela condução dos impulsos às regiões apropriadas do cérebro e o hipotálamo é o principal integrador das atividades dos órgãos viscerais, da homeostase corporal (sistema endócrino, controle de temperatura, apetite, hidratação, sono, emoção e comportamento sexual). Além disto, é área central do sistema límbico (que será detalhado mais à frente, ainda neste módulo).
Figura sistema nervoso central
 
No encéfalo são processadas as diversas funções nervosas que vão desde a interpretação dos estímulos e os movimentos musculares até complexos processos de armazenamento de informações e aspectos da personalidade. A região do cerebelo é a responsável pelos movimentos musculares e pelo equilíbrio do corpo. Por ele também passa a memória de habilidades motoras (memória de procedimento).
O tronco encefálico corresponde à sede de funções associadas a atividades involuntárias e é também a sede das emoções. A medula espinhal, com seus pares de nervos espinhais, é por onde passam os impulsos nervosos que levam os comandos do encéfalo para todo o corpo. O bulbo é responsável pelo controle da vida vegetativa (batimentos cardíacos, respiração, pressão sanguínea, salivação, tosse, espirros e o ato de engolir, etc.). A ponte transmite impulsos ao cerebelo, além de participar de algumas atividades do bulbo. O mesencéfalo auxilia em funções como a visão, audição, movimentos dos olhos e movimentos do corpo.
O encéfalo é protegido pelo crânio e a medula espinal pela coluna vertebral. Após esta proteção óssea, existe ainda uma proteção formada por tecido conjuntivo, são as meninges, organizadas em três camadas: a dura-máter, a aracnoide e a pia-máter. Entre a aracnoide e a pia-máter está o líquido cefalorraquidiano (líquor), que é produzido dentro dos ventrículos cerebrais e, na ausência de patologia, flui de um ventrículo ao outro, e então para fora do cérebro, por meio da medula espinhal. Se houver alguma obstrução das vias de drenagem do líquor, o fluido se acumula no cérebro, causando um inchaço conhecido como hidrocefalia. Em bebês, ocorre um alargamento da cabeça; nas crianças mais velhas e em adultos, não ocorre esse alargamento porque os ossos do crânio já estão unidos e impedem essa expansão do fluido.
 
A maior parte do encéfalo é composta pelo telencéfalo, que se divide em dois hemisférios: o hemisfério direito (HD) e o hemisfério esquerdo (HE). Estes hemisférios estão unidos pelo corpo caloso, uma estrutura composta de fibras nervosas separadas por uma lâmina de dura-máter, a foice cerebral.
Atualmente ocorre uma lateralizacao do hemisfério cerebral, isto é, ocorre uma dominância de um hemisfério sobre o outro.
Algumas funções são facilmente diferenciadas por hemisférios, como a linguagem, a gnnosia ( capacidade de interpretar estímulos sensoriais), e a praxia ( realização de atos motores complexos). Assim no HE fica o controle de habilidades como: linguagem, raciocinio lógico; de padrões gerais de comportamentos; destreza manual e demais mebros do lado direito do corpo. O HD é responsável pelos estimilos de responsas inespereadas do corpo, pelo processamento de informação visoespacial e não verbal, e pela habilidade de reonhecer faces.
 
 
 
As superfícies dos hemisférios cerebrais estão divididas em estruturas chamadas de giros que são delimitadas por depressões chamadas de sulcos. Além disto, os hemisférios estão dispostos em grandes regiões ou lobos (ver Figura 8). Estes lobos são: o frontal, o parietal, o temporal, o occipital e a ínsula (localizada na parte interna do cérebro). Os sulcos são: sulco central (entre o lobo frontal e o parietal), sulco lateral ou de Sylvius (entre os lobos temporal, frontal e parietal) e sulco parieto-occiptal (entre o parietal e o occiptal)
As funções gerais dos lobos cerebrais foram descritas por Machado (1988), conforme apresentado na Figura 9, e podem ser resumidas da seguinte maneira:
a. lobo frontal – funções de planejamento de ações estão associadas área pré-frontal e controle de movimentos sob responsabilidade do córtex e da área pré-motora localizada neste lobo;
 
b. lobo temporal – processamento das informações auditivas, pois nele situa-se a área auditiva primária; funções da linguagem na área de Wernicke; processamento da informação visual ocorrem em suas porções inferiores e ainda funções associadas a aprendizagem e memória ocorrem na parte mais medial deste lobo. Divide os lobos temporal e frontal, destaca-se a fissura de Sylvius, esta área é conhecida como “zona da linguagem perisylviana”;
 
2) lobo parietal – recebe as informações sensoriais vindas do meio externo (por exemplo, dor e temperatura) e interpreta estas informações;
 
3) lobo occipital – associado à visão, nele estão situadas as áreas visual primária e visual de associação;
 
4) lobo da ínsula – está envolvido no processamento de estímulos emocionais e respostas fisiológicas.
O sistema límbico é formado por diferentes estruturas cerebrais (Figura 10), que em conjunto atuam no controle das emoções. Além disto, este sistema atua de forma secundária no processo de aprendizado e no auxílio ao sistema endócrino.
 
Entre as principais funções do sistema límbico, de acordo com suas estruturas, estão (MARTIN, 1998):
1) hipotálamo – atua na regulação do sono, na libido, controle do apetite e na manutenção da temperatura do corpo. Esta estrutura, juntamente com a hipófise, auxilia nas funções do sistema endócrino;
 
2) corpos mamilares – associa-se ao hipotálamo para regular os reflexos alimentares, como a deglutição;
 
3) tálamo – as percepções táteis, visuais, auditivas e gustativas são processadas nesta estrutura, por onde também passam as sensações de dor, temperatura e a pressão do ambiente;
 
4) giro cingulado – é a região de processamento de odores e também de alguns estímulos visuais;
 
5) amígdala – é a região que percebe o perigo e, portanto, associadas as sensações de medo e ansiedade. As amígdalas também estão associadas ao processamento das memórias emocionais;
 
6) hipocampo – é a estrutura responsável pela memória recente.
 
O sistema nervoso é constituído pela substância branca e a substância cinzenta (ver Figura 11 - a seguir). A substância branca é encontrada, principalmente, na parte interna da região cerebral e nela estão localizados os axônios. A substância cinzenta corresponde à camada mais externa do cérebro e nela estão os corpos celulares dos neurônios.
Os neurônios são as células do tecido nervoso responsáveis por transmissão de impulsos elétricos. São compostos de três partes (corpo celular, dendritos e axônios), cada uma com uma função específica. A estrutura do neurônio (Figura 12 - a seguir) é composta por: corpo celular, onde ocorre a síntese proteica; dendritos, que são ramificações cuja principal função é receber estímulos; e axônios, que são prolongamentos que se originam, em geral, do corpo celular e por meio deles são transmitidos os impulsos (LEVADA, 1996).
 
A porção terminal do axônio sofre várias ramificações formando milhares de terminais onde ficam armazenados os neurotransmissores. Ao redor do axônio são encontradas as “bainhas de mielina”, responsáveis por acelerar o transporte de impulsos elétricos.
 
 
As áreas do córtex são divididas em áreas primárias, correspondem às regiões, sensitiva primária e motora primária, e em áreas de associação secundária e terciária. As áreas de associação secundária recebem informações das áreas primárias e as repassam para outras áreas do córtex, enquanto as áreas de associação terciária recebem e integram informações sensoriais que já passaram por processamento nas áreas secundárias (MACHADO, 1988).
 
As áreas de associação primária do cérebro, segundo Seeley et al. (2006), podem ser vistas na Figura 13, e suas principais funções estão resumidas na Tabela 1
O declínio ou perda das habilidadescognitivas podem ocorrer em função de determinantes genético-biológicos, ambientais ou situacionais que impliquem em prejuízos neurológicos, sensoriais e/ou psicomotores que serão caracterizados de acordo com a região cerebral afetada. Algumas vezes, as perdas cognitivas ocorrem sem resultar na incapacidade do indivíduo para realizar atividades do dia a dia, como ocorre, por exemplo, com as alterações decorrentes do processo normal de envelhecimento cerebral onde a redução do número de células neuronais implica na redução do processamento de informação e declínio da memória operacional sem que o indivíduo deixe de fazer qualquer atividade diária que já realizava (RAZ, 1999). Por outro lado, na presença de quadros patológicos (tema do Módulo IV deste curso), as perdas cognitivas acontecem em intensidade maior, provocadas por alterações significativas do sistema nervoso central, e resultam em graves prejuízos funcionais (CANÇADO; HORTA, 2002).
3.2 Memoria e Aprendizagem
 
A memória corresponde à função do sistema nervoso que permite a retenção das informações/percepções para utilização posteriormente. O processo de memorização pode ser entendido como o resultado da consolidação de um conhecimento ou comportamento, que podem ser resgatados quando necessários (IZQUIERDO, 2011).
 
Contudo, nem toda informação precisa ser armazenada por longo período de tempo. A memória de curto prazo corresponde à capacidade de manter alguma informação consciente durante um pequeno intervalo de tempo e memória de longo prazo implica no armazenamento ilimitado de informações que são armazenadas por longo período de tempo.
 
O processo de memorização ocorre a partir de três estágios (IZQUIERDO, 2011):
 
1)  codificação ou percepção – consiste em receber as informações por meio dos órgãos sensoriais e criar padrões de assimilação das mesmas;
 
2) armazenamento ou retenção – implica na manutenção das informações, isto é, registros que são produzidos a partir da modificação das redes neurais;
 
3) recuperação ou evocação – corresponde à utilização do que foi armazenado, ou seja, é o processo de lembrar aquilo que foi registrado.
 
A memória operacional engloba, além do armazenamento, a manipulação de informações. Trata-se de uma memória de curto prazo, isto é, a informação é retida por um curto período de tempo, e que envolve participação consciente no processo de escolha e manipulação das informações a serem lembradas (BERTOLUCCI, 2000). Um exemplo desse tipo de operação é a realização de cálculos feitos mentalmente (sem o uso de papel e lápis para visualizar os números). A memória operacional também é chamada de memória de trabalho, mas este é um termo mais recomendado pelos especialistas e foi empregado no português em função de uma tradução literal do termo em inglês working memory.
O termo memória imediata é, em geral, utilizado para falar do armazenamento de informações que dura apenas alguns segundos e não implica na manipulação das informações como ocorre com a memória operacional. Contudo, algumas vezes a memória imediata aparece na literatura citada como correlato da memória operacional.
O tempo de armazenamento da memória operacional é apenas o suficiente para que a informação seja utilizada para conclusão de uma tarefa. Depois de concluído o procedimento que demandava a informação armazenada, ela é descartada (BERTOLUCCI, 2000). O processo de repetição e atenção é o que garante a manutenção deste tipo de memória e pode aumentar o tempo de armazenamento da mesma, mas não a torna permanente. Quando a informação precisa ser armazenada para além do cumprimento de uma tarefa ela passa a ser uma memória de longo prazo.
A memória de longo prazo é dividida em memória explícita ou declarativa e memória implícita ou não declarativa. A memória explícita corresponde ao armazenamento e à recordação de eventos, de lembranças que podem ser declaradas verbalmente ou com a lembrança de imagens do fato ocorrido (BUENO; OLIVERIA, 2004).
A memória explícita está subdivida em memória semântica e memória episódica. A semântica envolve o conhecimento de fatos que não estão temporalmente delimitados, isto é, o indivíduo não é capaz de identificar em que momento adquiriu determinada informação. Trata-se da memória de conceitos, de conhecimentos gerais sobre o mundo adquiridos ao longo da vida. A memória episódica é relacionada ao tempo, e a memória dos acontecimentos da vida conhecida como a memória autobiográfica, embora não se restrinja aos eventos pessoais (BUENO; OLIVERIA, 2004).
A memória implícita envolve o armazenamento de habilidades motoras e condicionadas que exigem a participação consciente para que sejam emitidas, isto é, não é necessário pensar nelas ou declará-las verbalmente para emissão do conhecimento aprendido. Fazem parte da memória implícita as memórias obtidas por condicionamento, como: memórias de procedimento; memórias associativa e não associativa; e memória de representação perceptual (BUENO; OLIVERIA, 2004).
 
A memória de procedimento envolve toda habilidade e comportamentos habituais como, por exemplo, escovar os dentes e andar de bicicleta. As memórias, associativa e não associativa são àquelas obtidas por condicionamento clássico, como aprendizados obtidos a partir da exposição a estímulo associados (BUENO; OLIVERIA, 2004). Por exemplo, uma sirene pode ser um alerta para o qual nosso reflexo seria ficar atento à fonte que causou o barulho, contudo, se a sirene ocorrer, frequentemente, em seu ambiente e não exigir reação, sem que você se dê conta conseguirá ouvi-la e ignorá-la de forma automática, pois um armazenado da memória implícita indica que este barulho corresponde a algo a ser ignorado e não a um alerta que demanda resposta.
 
A memória de representação perceptual corresponde àquelas memórias para as quais podemos não ter registros padronizados, mas permitem algum tipo de reconhecimento evocado por “pistas” (priming). Por exemplo, fragmentos de imagens, odores, sons, partes de um texto podem ser armazenados mesmo sem que sejam estabelecidas conexões completas sobre esta informação, ou seja, mesmo sem saber o que é ou para que serve algo é possível armazená-lo em nossa memória de representação perceptual.
 
Vem sendo descrito na literatura que um conteúdo carregado de emoções, sejam elas positivas ou negativas, é mais facilmente evocado que os conteúdos sem emoção. A explicação para memória emocional parece estar nos componentes neuroanatômicos envolvidos no processo de memorização. A amígdala – estrutura do lobo temporal medial – parece ser a responsável por modular alguns conteúdos da memória declarativa conferindo-lhes uma espécie de alerta, um destaque (BUENO; OLIVERIA, 2004).
 
As experiências de caráter afetivo seriam processadas na fase de codificação via amígdala, que lhes confere uma facilitação na percepção. Assim, no momento da evocação estas lembranças emocionalmente armazenadas estariam mais vívidas que aquelas não processadas no sistema límbico.
3.3ATENCAO
  
Sternberg e Osório (2000) definiram a atenção como “fenômeno pelo qual o ser humano processa ativamente uma quantidade limitada de informações de enorme montante de informações disponíveis através dos órgãos dos sentidos, de memórias armazenadas e de outros processos cognitivos”.
A atenção pode ser entendida a partir de suas diversas funções:
 
- função seletiva – permite o processamento de uma fonte de informação em detrimento de outras fontes das quais o indivíduo está exposto simultaneamente;
 
- função de atenção dividida – permite o processamento simultâneo de mais de uma fonte de informação. Utilizada quando mais de uma tarefa tem que ser executada ao mesmo tempo;
 
- função interruptora da atenção – possibilita um processamento alternado entre uma fonte e outra de estimulação;
 
- função sustentadora ou concentrada da atenção – envolve focar em uma única fonte de informação por longo período de tempo.

Continue navegando