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1 Avaliação Psicológica IV - Neuropsicologia Sabrina Feitosa A Neuropsicologia estuda a relação entre sistema nervoso central (SNC), funcionamento cognitivo e comportamento. Suas principais áreas de atuação abrangem o diagnóstico complementar e suas intervenções tem a ver com os diferentes quadros patológicos de alterações do SNC. É uma área que trabalha em conjuntos com outras áreas, como psicologia, pediatria, fonoaudiologia, economia, entre outras (MIOTTO, 2017). No setting clínico, os principais objetivos da neuropsicologia são: → auxiliar no diagnóstico diferencial de quadros neurológicos e neuropsiquiátricos; → investigar a natureza e o grau de alterações cognitivas e comportamentais; → monitorar a evolução de quadros neurológicos e psiquiátricos, tratamento clínicos medicamentos e cirúrgicos; → planejar e monitorar programas de reabilitação (MIOTTO, 2017). A partir da descoberta do papiro de Edwin Smith (3000 a.C.) que continha descrições de traumas cranianos dos egípcios, estudos sobre a cognição começaram a ser realizados ao longo da história. Em 1809, Gall propôs a frenologia - cada área cerebral teria uma função e traço de caráter específico (MIOTTO, 2017). Em 1861, por meio de seus estudos, Paul Broca descobriu que o hemisfério cerebral esquerdo está relacionado com a linguagem (fala e dominância manual). Distúrbios localizados nessa região foram denominados como afasia motora. Em 1874, Carl Wernicke descreveu a relação entre lesões no giro temporal dominante e afasia sensorial ou de compreensão. Fez registros também da afasia de condução (lesão no fascículo arqueado que conecta as áreas de Broca e de Wernicke no hemisfério esquerdo) com a afasia de compreensão (MIOTTO, 2017). A partir de tais publicações, novos estudos sobre áreas cerebrais e suas respectivas funções cognitivas começaram a ser publicadas, dando origem à escola localizacionista, da qual o caso de Phineas Gage é um excelente exemplo (MIOTTO, 2017). Em 1950, com base na teoria de processamento de informações, a psicologia cognitiva se pôs a estudar os processos cerebrais e cognitivos de indivíduos normais (MIOTTO, 2017). Figura 1 - Frenologia Figura 2 – Área de Broca e Wernicke Figura 3 – Phineas Gage 2 Avaliação Psicológica IV - Neuropsicologia Sabrina Feitosa No final de 1960, surgiu a neuropsicologia cognitiva, na Inglaterra, fundamentada em paradigmas de processamento de informações para analisar seus subcomponentes, em outras palavras, focada em entender como a informação recebida é transformada e processada no cérebro para determinado fim. Essa investigação dos subcomponentes das funções cognitivas é apoiada em métodos de dissociação (constatar a diferença no desempenho entre duas tarefas) e dupla dissociação (quando o desempenho dessas duas tarefas ao contrário continua sendo diferente). No caso de Wernicke, seu paciente conseguia falar (dissociação), mas não conseguia compreender o que lhe falavam. Seria preciso realizar os mesmos testes em outro sujeito que compreendesse, mas não tivesse linguagem preservada (dupla dissociação) – (MIOTTO, 2017). Com o avanço tecnológico possibilitando os exames de neuroimagens, tornou-se possível estudar a relação entre localização, dimensão de lesões cerebrais, natureza e grau de alterações cognitivas, padrão de ativação e conectividade cerebral em sujeitos saudáveis e com prejuízos cognitivos (MIOTTO, 2017). Os Lefèvres, Pires e Junior foram os profissionais que marcaram o início da neuropsicologia, no Brasil (MIOTTO, 2017). A avaliação neuropsicológica deve abranger funções cognitivas, alterações de humor e comportamentos, prejuízo nas atividades da vida diária (AVDs) por meio da anamnese ou entrevista clínica e escalas específicas (MIOTTO, 2017). A avaliação Neuropsicológica tem como objetivos: • traçar perfil cognitivo – comportamental do paciente; • estabelecer déficits vs capacidades preservadas; • manifestação do perfil neuropsicológico na vida diária; e • traçar o plano de reabilitação. Alguns instrumentos que podem ser utilizados são: • entrevista detalhada - anamnese; • testes convencionais; e • baterias ecológicas – avaliar os prejuízos da pessoa considerando o contexto em que ela está inserida, considerando as atividades reais que ela precisa fazer. Podemos saber os prejuízos que o indivíduo tem perguntando coisas também, por exemplo: para saber se um sujeito tem memória, podemos perguntar se ele sabe o que precisa para fazer uma atividade. Isso porque, quando uma pessoa tem demência, ela não consegue fazer mais suas atividades diárias de forma independente. → O que avaliamos na avaliação neuropsicológica? • Severo déficit atencional quanto à seletividade e sustentação do tônus atencional; • Desorientação temporal; • Lentidão significativa no processamento de informações; • Lentidão motora importante; • Baixa fluência verbal, hesitação motora ao iniciar a fala; • Amnésia anterógrada (não há possibilidade de se lembrar) e retrógrada (esquece as coisas, mas pode se lembrar se for temporária), especialmente: registro e evocação de material declarativo verbal (incapacidade de memorizar algo que leu ou ouviu); evocação do contexto em que a informação foi adquirida (incapacidade de se lembrar de algo por contexto); • Perda da capacidade de realizar raciocínio abstrato complexo; • Dificuldade de nomeação, acarretando em prejuízo para comunicar-se com clareza; • Baixa percepção dos déficits; • Preservação das seguintes habilidades: compreensão verbal, processar e reter informações implicitamente, raciocínio não- 3 Avaliação Psicológica IV - Neuropsicologia Sabrina Feitosa verbal, registro de relações espaciais entre elementos visuais. Entrevista Clínica É o início da avaliação. Com ela é possível obter informações sobre o quadro atual do avaliando, alterações cognitivas e comportamentais, início, frequência e intensidade dos sintomas, prejuízo nas AVDs, história clínica dos familiares e do avaliando e uso de substâncias. Todas as informações devem ser confirmadas com o familiar ou cuidador, especialmente quando o déficit cognitivo envolve memória (MIOTTO, 2017). É preciso conhecer também o grau de escolaridade, se estudou em instituições públicas ou privadas, o nível cultural e social, ocupações prévias e atuais. Tais informações são relevantes na interpretação dos resultados da avaliação, pois eles possibilitam que entendamos o funcionamento pré-mórbido (prévio à patologia). À exemplo: em déficits de memória, os sujeitos com maiores níveis de escolaridade tendem a apresentar resultados à baixo do esperado, pois o esperado para esses sujeitos é um desempenho acima da faixa média na maioria das funções cognitivas. Por outro lado, os resultados esperados de sujeito com baixa escolaridade são menores, por isso esses sujeitos tendem a não apresentar alterações cognitivas. Essas diferenças acontecem porque os testes não incluem a população de menor escolaridade em seus testes de normalidade (MIOTTO, 2017). Antes de iniciar à avaliação, é preciso saber se o paciente está sob uso de medicamentos que podem interferir nos resultados dos testes, se ele está disposto naquele dia, se há deficiências motoras ou sensoriais. A depender dos resultados, é preciso remarcar a avaliação ou escolher testes mais breves e específicos para que o paciente não se canse (MIOTTO, 2017). Humor A fim de investigar o humor do avaliando, é preciso complementar a entrevista clínica com o uso de escalas que se proponham a medir o humor (MIOTTO, 2017). Atividades da Vida Diária (AVDs) É preciso verificar se o paciente realiza suas AVDs independente, parcialmente dependente ou totalmente dependente. Em relação às atividades de vida básicas, é preciso investigar qual a capacidade do avaliando nas seguintes atividades: tomar banho,vestir-se, locomover-se, alimentar-se e controle dos esfíncteres. Em relação às atividades instrumentais ou complexas é preciso verificar qual a capacidade do avaliando para utilizar as medicações, administrar as finanças, lembrar-se de compromissos, manusear dinheiro, fazer compras, sair de casa sozinho e dirigir (MIOTTO, 2017). As AVDs podem ser avaliadas por meio de escalas preenchidas por familiares ou cuidadores (MIOTTO, 2017). A avaliação neuropsicológica tem, atualmente, cinco objetivos básicos: 1. Diagnóstico Discriminar entre sintomas neurológicos e psiquiátricos, oferecendo dados comportamentais para a localização cerebral da lesão (hoje com ajuda de neuroimagens e técnicas eletrofisiológicas). Muitas das técnicas e análises laboratoriais ainda não são capazes de diagnosticar encefalopatias tóxicas, Alzheimer e outras demências e danos traumáticos cerebrais e leves. Por isso o trabalho do neuropsicólogo é tão importante. O rastreio é outro aspecto do diagnóstico. Detecta pessoas com certo risco para alguma condição específica. 2. Cuidados ao paciente e planejamento Uma informação descritiva precisa sobre o status emocional e cognitivo é essencial para gerenciar o cuidado de muitos distúrbios neurológicos. Conhecer as capacidades e limitações do paciente. Dados de avaliações neuropsicológicas repetidas em intervalos regulares podem oferecer indicações se a 4 Avaliação Psicológica IV - Neuropsicologia Sabrina Feitosa condição neurológica está mudando e, em caso afirmativo, o quão rapidamente e de que formas. A avaliação repetida fornece documentação da cognição de distúrbios psiquiátricos, bem como efeitos de medicação na memória, na linguagem, na percepção, na atenção, etc. 3. Tratamento: Planejamento e Avaliação do Tratamento Atualmente, muitos neuropsicólogos estão envolvidos no tratamento ou em pesquisas sobre tratamento. Como os serviços são caros e dispendiosos, a avaliação ajuda a verificar a efetividade e o custo-benefício para o paciente, bem como o efeito positivo e negativo de um procedimento cirúrgico; lobotomia temporal para controle de epilepsia; cirurgia arterial coronária e outras. 4. Pesquisa Investigações de como o cérebro ou um dano cerebral pode alterar um comportamento. A pesquisa neuropsicológica tem feito contribuições cruciais no estudo do comportamento normal e em suas funções cerebrais. 5. Neuropsicologia Forense Bastante útil para considerar se um sujeito é ou não apto a ser considerado responsável por seus comportamentos, por cuidar de suas finanças, por se aposentar, etc. Outra razão é na esfera civil, em que temos pessoas que conseguem ou não se gerenciar sozinhas. O neurologista examina a força, a eficiência, a reatividade e as respostas apropriadas do paciente à comando, perguntas, estimulação discreta de um subsistema neural particular e mudanças específicas para grupos motores específicos. Examina, ainda, a estrutura corporal pela busca de evidências de disfunções cerebrais como a retina, distrofia muscular, etc. Usa de neuroimagens como a Tomografia Computadorizada e a Ressonância Magnética Funcional para investigar a anatomia intracraniana. O neuropsicólogo usa a avaliação neuropsicológica como método para examinar o cérebro, estudando seu produto comportamental. Assim como o neurologista, os achados são interpretados dentro de um contexto clínico do paciente. Danos Cerebrais tem consequências diferentes, depende da pessoa. O dano depende também da lesão, da profundidade, da intensidade, do sexo biológico, da idade, da condição física. O comportamento pode ser conceitualizado em termos de três sistemas funcionais: 1) cognição; 2) emoção e 3) funções executivas. A cognição é a manipulação da informação; a emoção é a motivação e sentimentos; e as funções executivas são a forma como o comportamento é expresso. Na neuropsicologia, as funções executivas tem recebido muito mais atenção do que os sistemas emocionais e de controle. No entanto, o dano cerebral raramente afeta um destes sistemas, envolvendo, na maioria das vezes, todos os três sistemas. Se o objetivo da avaliação é auxiliar em alguma intervenção, deve-se avaliar o comportamento, a funcionalidade, estratégias para conviver com as alterações cognitivas, incapacidades e desvantagens. Para isso, é necessário incluir uma avaliação ecológica e a análise funcional do comportamento na avaliação neuropsicológica (MIOTTO, 2017). Instrumentos Ecológicos Muitos testes cognitivos não se dedicam a avaliar as AVDs do paciente. Por isso, sempre que for possível, é preciso complementar a avaliação neuropsicológica com instrumentos ecológicos, pois possuem maior conectividade com a vida real (MIOTTO, 2017). Os principais instrumentos ecológicos utilizados são: 1. “Behavioural Assessment of the Dysexecutive Syndrome (BADS)13: avalia 5 Avaliação Psicológica IV - Neuropsicologia Sabrina Feitosa componentes das funções executivas. Os subtestes incluem: Mudança de Regras de Cartões; Teste de Programação de Ação; Procura da Chave; Julgamento Temporal; Mapa do Zoológico e Teste Modificado dos Seis Elementos. 2. Rivermead Behavioural Memory Test (RBMT)13: avalia diversos sistemas de memória. Os subtestes incluem: recordação do nome de duas faces; recordação dos pertences escondidos; evocação de perguntas relacionadas com o futuro após 25 minutos; reconhecimento de figuras; evocação de estória; reconhecimento de faces; trajeto; mensagem; orientação temporoespacial e nova tarefa. 3. Virtual Planning Test14: instrumento ecológico, no formato de um jogo de tabuleiro, com base em atividades cotidianas que necessitam ser realizadas durante a semana e em atividades vinculadas a uma viagem que será realizada no final da mesma semana. Examina a capacidade de planejamento, organização e sequenciamento, bem como a inibição de respostas irrelevantes. 4. As escalas que avaliam alterações cognitivas e comportamentais no contexto da vida real incluem o questionário DEX – da bateria BADS –, que avalia alteração de comportamento, personalidade, motivação decorrentes de disfunção executiva e o Everyday Memory Questionnaire” (MIOTTO, 2017). Análise Funcional do Comportamento A análise funcional do comportamento consiste em avaliar os antecedentes e consequentes do comportamento (ACC) em pacientes com lesões cerebrais. Com ela é possível observar os possíveis desencadeadores do comportamento que queremos evitar (MIOTTO, 2017). A escolha entre baterias fixas ou testes específicos é influenciada por vários fatores. Para avaliar pessoas com baixo nível de escolaridade ou com pouco tempo para realizar a avaliação, escolher testes específicos pode ser a melhor opção. Nesse caso, a seleção dos testes deve ser feita pensando em responder à pergunta clínica ou a atender o motivo do encaminhamento (MIOTTO, 2017). Para avaliar suspeitas de demências, as baterias fixas, instrumentos de rastreio e escalas parecem ser a melhor opção. É sempre aconselhado avaliar o maior número de funções possíveis (MIOTTO, 2017). A avaliação do funcionamento pré-mórbido permite verificar se há ou não déficits cognitivos no presente (MIOTTO, 2017). É possível fazer uma estimativa do funcionamento pré-mórbido de duas formas: 1. a partir das informações pertinentes à escolaridade, à ocupação e à profissão; e 2. o melhor resultado obtido em um dos testes administrados com base para a estimação do funcionamento prévio (MIOTTO, 2017). É possível também utilizar testes de inteligência cristalizada para verificar o funcionamento pré- mórbido, por exemplo, o subtestes Vocabulário ou Informação das Escalas Weschler de Inteligência (MIOTTO, 2017). Figura 4 – Modelo de Memória Operacional Inteligência Abrange a capacidade de pensar racionalmente e ter ações com objetivo de resolver problemas. Em 1927, Spearman propôs a análise fatorial de dimensõesque refletem o fator geral de inteligência - o fator g (MIOTTO, 2017). Em 1971, Cattel propôs o conceito de Culture- Fair Test of g, criando, então, testes que fossem mais indiferentes às divergências culturais, como os testes de inteligência fluida com 6 Avaliação Psicológica IV - Neuropsicologia Sabrina Feitosa resolução de problemas, no qual se inferem e compreendem relações entre conceitos independentemente de conhecimentos prévios acumulados. Por outro lado, a inteligência cristalizada envolve o acúmulo de conhecimentos culturais e educacionais adquiridos ao longo da vida. Atualmente, a proposta de inteligência mais recente de Cattel abrange inteligência fluida, inteligência cristalizada, memória a curto e longo prazo, processamento de informações, escrita e tempo de reação (MIOTTO, 2017). Memória A memória processa informações por três estágios: codificação, aquisição ou registro inicial da informação; armazenamento ou estocagem; evocação ou recordação (MIOTTO, 2017). Memória a Curto Prazo ou Operacional A memória de curto prazo ou operacional pode ser dividida em dois sistemas: o fonológico e o visuoespacial. Por se tratar de sistemas independentes, uma alteração na memória a curto prazo para estímulos verbais não necessariamente compromete a memória a curto prazo para estímulos visuoespaciais e vice-versa. A memória a curto prazo ou operacional é responsável pelo armazenamento de informações, na ordem de segundos ou de poucos minutos, e pela manutenção e manipulação da informação para a execução de funções cognitivas superiores, tais como linguagem, planejamento e solução de problemas, cálculo, compreensão, raciocínio etc. (MIOTTO, 2017). O registro episódico é responsável por armazenar as informações por um período maior de tempo. Esse componente permite a integração de diferentes sistemas e é acessível à consciência, o que possibilita o processo de evocação de um material com significado, formando um elo com a memória episódica e semântica (MIOTTO 2017). No contexto clínico, a memória a curto prazo pode ser avaliada por meio dos subtestes Dígitos (informações áudio-verbais) e Span Visuoespacial (informações visuoespaciais) das escalas Wechsler de inteligência (Dígitos) e de Memória (Dígitos e Span Visuoespacial). Outros testes utilizados para avaliação da memória operacional em crianças e adultos incluem Sequência Número e Letra das Escalas Wechsler, Repetição de Sentenças, Janela Digital do Wide Range Assessment of Memory and Learning (WRAML 2) – (MIOTTO, 2017). Memória de Longo Prazo A memória de longo prazo pode ser dividida em memória declarativa ou explicita e memória não declarativa ou implícita (MIOTTO, 2017). → Memória não declarativa ou implícita: é o sistema relacionado com a capacidade de adquirir, gradualmente, uma habilidade perceptomotora por meio da exposição repetida e abrange um conjunto de subsistemas que incluem pré-ativação, memória procedural, formação de hábito. Essa memória é chamada de implícita porque independe da consciência e pode ser avaliada pelo desempenho. A pré-ativação atua dentro do sistema perceptual junto com palavras, objetos e imagens. Esse subsistema pode ser avaliado, por exemplo, pela aprendizagem de novas informações mediante a apresentação de palavras ou imagens e, em seguida, fragmentos dessas palavras ou imagens, como no teste de Gollins Fragmented Pictures and Words (MIOTTO, 2017). A memória procedural é responsável pela capacidade de aprendizagem de atos motores, tais como andar de bicicleta, tocar piano, jogar golfe ou tênis, dirigir, entre outros. Esses subsistemas estão associados a estruturas como os gânglios da base e cerebelo para memória procedural, o córtex cerebral posterior para memória implícita perceptual e o lobo temporal lateral e o córtex frontal inferior para memória implícita conceptual (MIOTTO, 2017). → Memória Declarativa ou Explícita: é o sistema responsável pela capacidade de armazenar e evocar/recordar ou 7 Avaliação Psicológica IV - Neuropsicologia Sabrina Feitosa reconhecer fatos e eventos de maneira consciente. Participam desse sistema a formação hipocampal (giro denteado, o corno de Amon, o subículo e o córtex entorrinal), o córtex perirrinal e para- hipocampal e suas conexões com o neocórtex associativo posterior. 1. Memória Episódica: é responsável pelo armazenamento de informações e eventos pessoalmente vividos em um determinado tempo e espaço. É informalmente referida como memória recente. Subdivide-se em “evocação imediata” (recordação livre após a apresentação de uma lista de palavras ou estória), “evocação tardia” (recordação livre da lista ou estória após passagem de tempo, geralmente 30 minutos depois da apresentação) e reconhecimento (recordação mediante a apresentação de pistas e/ou estímulos corretos e distratores). Os correlatos neurais desse sistema abrangem a região temporomesial e, mais especificamente, o hipocampo e córtex perirrinal (especialmente para o reconhecimento) e suas conexões com o córtex pré-frontal e sistema límbico (particularmente para a evocação livre imediata e tardia) – (MIOTTO, 2017). 2. Memória Semântica: é responsável pelo processamento de informações associadas ao conhecimento geral sobre o mundo, ou seja, fatos, conceitos, vocabulário, independentemente do contexto e momento em que essas informações foram memorizadas pela primeira vez. O substrato neural desse sistema está relacionado com as áreas de associação e neocórtex. 3. Memória Prospectiva: é um sistema que permite a recordação de uma intenção em um determinado momento do futuro para que uma reposta ou pensamento possam ser realizados. Este sistema de memória é recrutado, por exemplo, quando é necessário lembrar de atender a algum compromisso. Este processo envolve a lembrança do momento correto para se realizar uma atividade, na presença, ou não, de pistas ou auxílios (componente prospectivo). Após a lembrança, é necessário recordar o que se deve fazer (componente retrospectivo). Quando se tem a demanda de interromper uma atividade em andamento para executar outra que havia sido planejada em um determinado tempo no futuro, ocorre a participação das funções executivas e atencionais, sobretudo, a mediação do SAS, ou seja, do sistema atencional supervisor (MIOTTO, 2017). Linguagem A avaliação da linguagem deve abranger a oralidade, compreensão, repetição e nomeação. A avaliação da escrita, leitura e cálculo complementam a avaliação das habilidades anteriores (MIOTTO, 2017). 1. Produção Oral: é possível aplicar testes de Descrição de Cenas. É preciso avaliar o discurso espontâneo do paciente, atentando-se para erros parafásicos, apraxia da fala, anomias, prosódia e pragmatismo (MIOTTO, 2017). 2. Compreensão: Pacientes com prejuízo grave em na compreensão oral podem não compreender o que escutam, o que impossibilita a comunicação. A área cerebral associada a esses quadros é o lobo temporal posterior dominante (MIOTTO, 2017). Figura 5 – lobos cerebrais 8 Avaliação Psicológica IV - Neuropsicologia Sabrina Feitosa 3. Repetição: alteração na capacidade de repetição está relacionada a lesões na região perissilviana, podendo atingir também a área de Broca, o córtex insular anterior, a área de Wernick posterior e o fascículo arqueado entre ambas as áreas. Quando a capacidade de repetição está preservada, a lesão pode ter ocorrido fora da área de Broca, envolvendo a região da área suplementar motora na superfície medial do hemisfério esquerdo (ATM) ou na junção parietotemporal (ATS) - (MIOTTO, 2017). 4. Nomeação: é a habilidade de nomear objetos e desenhos ao ter o contato visual ou pela descrição oral (MIOTTO, 2017). Funções Visuoperceptivas São os processos cognitivos associados à identificação e ao reconhecimento de objetos (MIOTTO, 2017). 1. Processos Visuais Primários: são osprocessos relacionados à acuidade visual, discriminação de formas, cor, textura, movimentos e posição. Suas áreas cerebrais incluem áreas de projeções primárias (BA 17) em ambos hemisférios cerebrais (MIOTTO, 2017). 2. Processos Perceptivos: esses processos integram os processos visuais primários possibilitando ao sujeito perceber a forma do objeto. As áreas cerebrais associadas a essas funções são o córtex parietal e o têmporo-occipital no hemisfério direito (ver figura 5). Alterações nesses processos cognitivos podem resultar no quadro de agnosia aperceptiva (MIOTTO, 2017). 3. Processos Associativos: são processos cognitivos que possibilitam ao sujeito compreender o significado do objeto. Estes processos estão relacionados às áreas cerebrais têmpero-occipitais nos dois hemisférios. Alterações nesses processos podem resultar no quadro de agnosia associativa (MIOTTO, 2017). Funções Visuoespaciais O processamento visuoespacial é o que possibilita o ser humano localizar objetos no espaço e em relação a nós mesmos (MIOTTO, 2017). 1. Visuoconstrução ou praxia construtiva: consiste em reproduzir ou executar desenhos, construções ou modelos de maneira apropriada e organizada utilizando, no contexto clínico, materiais como blocos, varetas ou papel e lápis. Lesões na região parietal direita ou esquerda podem gerar alterações dessas funções. No entanto, é comum verificar que lesões na região parietal esquerda ocasionam erros de simplificação no contexto de preservação espacial razoável, sugerindo alteração da organização das ações necessárias para a construção de tarefas. Em contrapartida, lesões na região parietal direita estão associadas a uma produção mais elaborada, em geral com elementos fragmentados e espacialmente desorganizados (MIOTTO, 2017). Funções Executivas e Atencionais 1. Funções Executivas São as habilidades necessárias para se formular objetivos, planejar e organizar ações pertinentes a esses objetivos, monitorar o comportamento, resolver novos problemas, inibir ou iniciar comportamentos apropriados a um contexto, tomar decisões, raciocinar e abstrair, entre outras habilidades. Essas funções estão diretamente associadas a regiões pré-frontais, e seus circuitos ou conexões a outras áreas cerebrais corticais e subcorticais (MIOTTO, 2017). Os principais circuitos frontossubcorticais relacionados com a cognição e o comportamento incluem o pré-frontal dorsolateral, o orbitofrontal e o do cíngulo anterior. O comprometimento desse circuito está relacionado com déficits cognitivos executivos e programação motora, tais como déficit de planejamento, sequenciamento motor, criação de estratégias, flexibilidade mental, formação de conceitos (MIOTTO, 2017). O comprometimento do circuito orbitofrontal lateral está associado a alterações do 9 Avaliação Psicológica IV - Neuropsicologia Sabrina Feitosa comportamento e personalidade, tais como redução da iniciativa e do interesse, irritabilidade, labilidade emocional e redução do controle inibitório (MIOTTO, 2017). O comprometimento do circuito do cíngulo anterior está associado à alteração da motivação, quadros de apatia, abulia, mutismo acinético, indiferença, ausência de autocrítica (MIOTTO, 2017). 2. Processos Atencionais 2.1 – Atenção Sustentada: estado de prontidão para identificar e responder a estímulos por período prolongado de tempo (MIOTTO, 2017). 2.2 - Atenção Alternada: a capacidade de atender a duas ou mais fontes de estimulação alternadamente (MIOTTO, 2017). 2.3 – Atenção Seletiva: habilidade de direcionar e manter a atenção em uma determinada fonte de estímulo, ignorando estímulos não relevantes (MIOTTO, 2017). Transtornos Egositônicos Transtornos em que a pessoa não sente que tem um déficit. A exemplo: o transtorno de personalidade narcisista – a pessoa não sente que há algo de errado com ela até que chegue a algum tratamento. Transtornos Egodistônicos Transtornos em que a pessoa sente que há algo diferente com ela. Por exemplo: depressão – a pessoa percebe os sentimentos de tristeza, a falta de interesse em coisas que ela gostava de fazer, ou seja, ela percebe o erro. MIOTTO, Eliane Correa. Avaliação Neuropsicológica e Funções Cognitivas. In: MIOTTO, Eliane Correa; LUCIA, Mara Cristina Souza de. Neuropsicologia Clínica. [Si.]: Grupo Gen, 2017. p. 3-31. (2ª edição). Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/book s/9788527730976/. Acesso em: 31 ago. 2021. Figura 1 – Frenologia: File:Phrenology— Numbering and Definition of the Organs.png - Wikimedia Commons. Acesso em 31 de agosto de 2021. Figura 2 – Área de Broca e de Wernicke: AREA DE BROCA Y WERNICKE PDF (kuzemkinomo.ru). Acesso em 31 de agosto de 2021. Figura 3 – Phineas Gage: phineas gage - 3:AM Magazine (3ammagazine.com). Acesso em 31 de agosto de 2021. Figura 4 – Modelo de memória operacional: retirado do capítulo 1 do livro Neuropsicologia Clínica de Miotto & Lucia (2017). Página 16. Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/book s/9788527730976/. Acesso em: 31 ago. 2021. Figura 5 – Lobos Cerebrais: https://br.pinterest.com/pin/5394468616127320 62/. Acesso em: 07 de setembro de 2021. Veja também: História da Neurociência Cognitiva https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Phrenology%E2%80%94Numbering_and_Definition_of_the_Organs.png https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Phrenology%E2%80%94Numbering_and_Definition_of_the_Organs.png https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Phrenology%E2%80%94Numbering_and_Definition_of_the_Organs.png https://kuzemkinomo.ru/area-de-broca-y-wernicke-23/ https://kuzemkinomo.ru/area-de-broca-y-wernicke-23/ https://kuzemkinomo.ru/area-de-broca-y-wernicke-23/ https://www.3ammagazine.com/3am/phineas-gage/ https://www.3ammagazine.com/3am/phineas-gage/ https://br.pinterest.com/pin/539446861612732062/ https://br.pinterest.com/pin/539446861612732062/
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