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Língua Portuguesa: Linguística Textual Se apropriando dos gêneros textuais: Usos e características Material Teórico Responsável pelo Conteúdo: Profa. Ms. Elaine A. Souto Antunes Revisão Textual: Profa. Ms. Fátima Furlan 5 • Introdução • Tipo textual e gênero textual, um só conceito? • Os gêneros textuais e sua aplicação no ensino e aprendizagem da leitura e da escrita · Apropriar-se do conceito de gênero textual, tipo textual e domínio discursivo; · Entender a relação entre os gêneros textuais e a escola; · Perceber a importância dos gêneros textuais na organização da sociedade. Nesta unidade, vamos conversar sobre os gêneros textuais, suas características e os seus usos. Traçaremos também um panorama histórico a respeito do desenvolvimento do processo de ensino- aprendizagem de língua portuguesa, com o intuito de mostrar como os gêneros textuais entram nesse universo e quais são suas contribuições. Para obter um bom desempenho, você deve começar pela leitura do Conteúdo Teórico. Aqui, você encontrará o material principal de estudo na forma de texto escrito. Depois, assista à Apresentação Narrada e à Vídeoaula, que sintetizam questões importantes. Consulte as indicações sugeridas e leia os textos na íntegra. É importante ir aos textos indicados, pois eles trazem pormenores e curiosidades a respeito do assunto abordado nesta unidade. Se apropriando dos gêneros textuais: Usos e características 6 Unidade: Se apropriando dos gêneros textuais: Usos e características Contextualização Fábula – conto – romance – conta de luz – receita – bilhete e-mail – memorando – artigo de jornal – carta ao leitor – fatura do cartão de crédito manual do computador – poema – videoconferência – telejornal – novela Gostaria que você pensasse a respeito das seguintes perguntas: • O que os textos citados acima têm em comum? • Existe algum ponto de intersecção que possa ligá-los? Será justamente sobre as resposta dessas perguntas que vamos tratar nesta unidade. O elo de intersecção entre esses textos é que eles se constituem como gêneros textuais que circulam na sociedade para disseminar conhecimentos. E será exatamente sobre os gêneros que conversaremos. Os gêneros textuais são os modelos de textos que temos a nossa disposição. Eles exercem uma função comunicativa e possibilitam aos membros da sociedade se organizarem. Todo gênero se materializa por meio de um texto. – Vamos, então, aprender um pouco mais sobre as características deles? Esse é o convite feito nesta unidade. 7 Inrodução Nesta unidade, trataremos dos gêneros textuais, esses, que hoje, são considerados elementos essenciais no processo de ensino e de aprendizagem das crianças (da leitura e da escrita em todos os níveis de ensino). Os Parâmetros Nacionais Curriculares (PCNs) abordam a questão dos gêneros como, sendo eles, o instrumento que deve ser utilizado pelos professores para mediar o ensino de línguas. Então, faremos aqui um passeio no universo dos gêneros textuais para nos apropriarmos melhor dos conceitos e ideias que os envolvem. Para o estudo que vamos empreender, utilizaremos o livro Gêneros Textuais e Ensino, organizado pelas professoras Angela Paiva Dionísio, Anna Rachel Machado e Maria Auxiliadora Bezerra. Vamos nos deter em dois capítulos em especial. O primeiro chama-se “Gêneros textuais: Definição e Funcionalidade”, do Professor Luiz Antônio Marcuschi; e o segundo, “Ensino de língua portuguesa e contextos teóricos metodológicos”, da Professora Maria Auxiliadora Bezerra. O primeiro texto, que embasa nosso estudo, começa com um interessante levantamento das questões sócio-históricas que envolvem os gêneros. Nele, o Prof. Marcuschi salienta que o ser humano é um sujeito histórico e que vive em sociedade. Portanto, seus valores e conhecimentos partem do coletivo que se dá por meio de uma cultura e de uma vida social. Para que os conhecimentos, constituídos nessa vida em sociedade, circulem e se difundam serão utilizados os textos nas suas mais variadas possibilidades de gêneros. Logo, o gênero textual está relacionado às atividades comunicativas do dia a dia, organizando- as e estabilizando padrões de comportamentos que se formam por meio das relações eu com o outro, uma vez que ninguém vive sozinho. Também é preciso lembrar que os gêneros não são frutos de um trabalho cognitivo individual de um sujeito único que deseja comunicar-se. Os gêneros textuais carregam em si uma função sóciodiscursiva com alto poder de difusão de modelos comportamentais, de conhecimentos culturais e tecnológicos da sociedade. Os gêneros são, portanto, entidades altamente “maleáveis, dinâmicos e plásticos”. Isso significa dizer que eles têm alto poder de mutação ao longo do tempo, transformando-se e alterando-se à medida que a sociedade vai evoluindo. Alguns gêneros desaparecem, outros servem como base para novos gêneros e outros são criados de acordo com as necessidades impostas pela evolução humana, como, por exemplo, aqueles que surgem graças aos desenvolvimentos tecnológicos. O Professor Marcuschi comenta algo interessante sobre o exposto acima. Ele esclarece que os povos, cuja passagem do conhecimento se dava pela oralidade, possuíam um número limitado de gêneros; e que no século VII A.C. surge a escrita alfabética, fato que possibilitou o aparecimento dos gêneros da escrita. A partir do século XV, surgem os registros impressos o que acarreta em uma grande expansão dos gêneros. No século XVIII, com o processo de industrialização ocorre outro salto na criação de gêneros com o surgimento dos gêneros relacionados à imprensa, como os jornais, os folhetins, os romances etc. Hoje, se vive a era da cultura eletrônica com o telefone, o gravador, o rádio, a tv, o computador e principalmente o celular e a internet que chamam para si uma necessidade de novos gêneros, orais e escritos, para que possam ser utilizados. 8 Unidade: Se apropriando dos gêneros textuais: Usos e características Esse percurso histórico demarca para além da evolução dos gêneros, a percepção de que eles são criados por uma necessidade funcional de transmissão do conhecimento e de propagação de formas comunicativas, caracterizando-se, portanto, por “suas funções comunicativas, cognitivas e institucionais” em contra ponto com as suas características linguísticas e estruturais. Isso significa dizer que devemos abordar as questões relativas aos gêneros a partir de uma perspectiva “sóciopragmática” de seus usos e de suas “práticas sociodiscursivas”. Ocorreu uma multiplicação rápida dos gêneros nos últimos dois séculos, o que está diretamente correlacionado aos avanços dos meios de comunicação, pois esses por suas características extremamente dialógicas fizeram surgir novos gêneros como, por exemplo:- telefonema, telemensagens, notícias, artigos, reportagens, teleconferências, videoconferências, e-mails, salas de bate papo, vídeo aulas etc. Esses são alguns exemplos de gêneros que se difundem cada dia mais. No entanto, Marcuschi lembra-nos que os novos gêneros não são inovações. Ao contrário, eles são adaptações de gêneros existentes, que se transformam de acordo com as exigências que os novos suportes impõem. Suporte é o meio utilizado para veicular ou transmitir cada gênero, por exemplo, o jornal, o livro, a revista, o computador, o celular etc. Marcuschi ainda cita o conceito de “transmutação”, desenvolvido por Bakhtin (1997). A ‘transmutação’ dos gêneros é a mudança que acontece com um gênero já existente e a partir do qual aparece um gênero novo tanto na forma como na função que exercerá na sociedade. Outro aspecto importante a ressaltar é que os novos gêneros da contemporaneidade estabeleceram um estreitamento das fronteiras entre oralidade e escrita. Cada vez mais, esses dois aspectos, escrita e fala se intercambiamdentro dos novos gêneros, como é o caso das mensagens escritas passadas pelos celulares ou por e-mails, que têm uma estreita ligação com práticas da fala, pois ocorriam por meio do telefonema, por exemplo. O Professor Marcuschi salienta que Esses gêneros, que emergiram no último século no contexto das mais diversas mídias, criam formas comunicativas próprias com certo hibridismo que desafia as relações entre oralidade e escrita e inviabiliza de forma definitiva a velha visão dicotômica ainda presente em muitos manuais de ensino de língua. Esses gêneros também permitem observar a maior integração entre os vários tipos de semioses: signos verbais, sons, imagens e formas em movimento. A linguagem dos novos gêneros torna-se cada vez mais plástica, assemelhando-se a uma coreografia e, no caso das publicidades, por exemplo, nota-se uma tendência a servirem- se de maneira sistemática dos formatos de gêneros prévios para objetivos novos.” ( 2010, p. 21) 9 Exemplo: Propaganda Sazon Fonte: Agência Abracadabra Nesse exemplo, a propaganda foi criada utilizando usando o poema Quadrilha de Carlos Drummond de Andrade, veja que ocorre uma apropriação do gênero poema para formar a propaganda da Sazon. E o que estabelece a ligação entre o produto Sazon e o poema é o tema do amor. Os gêneros se definem em grande parte pela sua função e seus aspectos sociocomunicativos, no entanto, cabe ressaltar que aspectos formais (linguísticos e estruturais) bem como os suportes e os locais onde determinados gêneros aparecem, também servem como elementos para classificá-los. Portanto, é bom ser precavido e observar todos os elementos que colaboram para nomear um texto como pertencente a determinado gênero. 10 Unidade: Se apropriando dos gêneros textuais: Usos e características Tipo textual e gênero textual, um só conceito? Existe uma confusão entre os conceitos de gênero textual e tipo textual. É comum as pessoas tratarem os gêneros como tipos de textos, mas isso não está correto. Os gêneros textuais são modelos de textos que se organizam de acordo com as necessidades de transmissão do conhecimento de um povo. Ao tratar dos gêneros textuais, o Prof. Marcuschi fala das práticas sociocomunicativas que circundam toda e qualquer sociedade. Pois, é inegável que o ser humano se comunica por meio dos textos, sejam eles orais ou escritos. Por isso, existe um pressuposto básico de que “é impossível se comunicar verbalmente a não ser por algum gênero, assim como é impossível se comunicar verbalmente a não ser por algum texto. Em outros termos, partimos da ideia de que a comunicação verbal só é possível por algum gênero textual.” (Marcuschi, 2010, p. 22). O posicionamento apresentado acima parte de uma concepção da língua como “atividade social, histórica e cognitiva” que observa sua “natureza funcional e interativa e não o aspecto formal e estrutural da língua”. (Marcuschi, 2010, p. 23) A abordagem, que considera o caráter social da língua, os desenvolvimentos históricos e os fatores cognitivos, é importante porque nos permite consolidar uma primeira posição, que consiste em perceber que “a língua não é vista como um espelho da realidade, nem como um instrumento de representação dos fatos” (Marcuschi, 2010, p. 23). Isso equivale à consideração de que a língua não serve como decalque ou reflexo da realidade tal como ela é no mundo real. Ao contrário, não é possível apreender o mundo real, porque ele é recriado sobre diversos aspectos pela língua. Pois, “a língua é tida como uma forma de ação social e histórica que, ao dizer, também constitui a realidade, sem, contudo, cair num subjetivismo ou idealismo ingênuo. (Marcuschi, 2010, p. 23)” Em outras palavras, a língua nos permite recriar o mundo de acordo com nossos pensamentos. E esses estão respaldados por valores sociais e históricos. Assim, os gêneros serão os representantes desse movimento de recriação e organização do mundo. Ao observar os gêneros, como exposto anteriormente, de uma perspectiva funcional com relação ao meio de criação e circulação no qual eles se apresentam, surge uma pergunta: - A estrutura interna de cada gênero deixa de ter importância e necessidade de apreensão? A resposta é: - Não. Para apreender os elementos estruturais e composicionais relativos ao gênero criou-se o conceito de tipologia textual. A tipologia textual abarca as características linguísticas e composicionais dos textos. Essas características são definidas pelos estudiosos como alguns poucos tipos de estruturas textuais. Para compreender a diferença entre gênero textual e tipo textual, vamos citar duas definições, que está no trabalho do Professor Marcuschi: 11 Tipo textual Usamos a expressão tipo textual para designar uma espécie de sequência teoricamente definida pela natureza linguística de sua composição (aspectos lexicais, sintáticos, tempos verbais, relações lógicas). Em geral os tipos textuais abrangem cerca de meia dúzia de categorias conhecidas como: narração, argumentação, exposição, descrição, injunção. (Marcuschi, 2010, p. 23) Gênero textual Usamos a expressão gênero textual como uma noção propositalmente vaga para referir os textos materializados que encontramos em nossa vida diária e que apresentam características sociocomunicativas definidas por conteúdos, propriedades funcionais, estilo e composição característica. Se os tipos textuais são apenas meia dúzia, os gêneros são inúmeros. Alguns exemplos de gêneros textuais seriam: telefonema, sermão, carta comercial, carta pessoal, romance, bilhete, reportagem jornalística, aula expositiva, reunião de condomínio, notícia jornalística, horóscopo, receita culinária, bula de remédio, lista de compras, cardápio de restaurante, instruções de uso, outdoor, inquérito policial, resenha, edital de concurso, piada, conversação espontânea, conferência, carta eletrônica, bate-papo por computador, aulas virtuais e assim por diante. (Marcuschi, 2010, p. 23 – 24) Observe que cada definição baseia-se em critérios diferentes. Para tipo textual considerou-se a estruturação interna dos elementos que compõem o texto. Enquanto, para gênero textual foi elencado como fator preponderante sua função sociocomunicativa no dia a dia. Com o objetivo de melhor visualizar e internalizar as diferenças entre gênero textual e tipo textual, observe o quadro proposto por Marcuschi (2010, p. 24) e que reproduzimos a seguir: Tipos Textuais Gêneros Textuais 1 Constructos teóricos definidos por propriedades linguísticas intrínsecas; Realizações linguísticas concretas definidas por propriedades sociocomunicativas; 2 Constituem sequências linguísticas ou sequências de enunciados e não são textos empíricos; Constituem textos empiricamente realizados, cumprindo funções em situações comunicativas; 3 Sua nomeação abrange um conjunto limitado de características teóricas determinadas por aspectos lexicais, sintáticos, relações lógicas, tempo verbal; Sua nomeação abrange um conjunto aberto e praticamente ilimitado de designações concretas determinadas pelo canal, estilo, conteúdo, composição e função; 4 Designações teóricas dos tipos: narração, argumentação, descrição, injunção e exposição. Exemplo de gêneros: telefonema, sermão, carta comercial, carta pessoal, romance, bilhete, reportagem jornalística, aula expositiva, reunião de condomínio, notícia jornalística, horóscopo, receita culinária, bula de remédio, lista de compras, cardápio de restaurante, instruções de uso, outdoor, inquérito policial, resenha, edital de concurso, piada, conversação espontânea, conferência, carta eletrônica, bate-papo por computador, aulas virtuais etc. Fonte: Marcuschi, 2010, 24) 12 Unidade: Se apropriando dos gêneros textuais: Usos e características Outro conceito importante, tratado no trabalho do professor Marcuschi,diz respeito à expressão “domínio discursivo”. E encontra-se assim definido: Usamos a expressão domínio discursivo para designar uma esfera ou uma instância de produção discursiva ou de atividade humana. Esses domínios não são textos nem discursos, mas propiciam o surgimento de discursos bastante específicos. Do ponto de vista dos domínios, falamos em discurso jurídico, discurso jornalístico, discurso religioso etc., já que as atividades jurídica, jornalística ou religiosa não abrangem um gênero em particular, mas dão origem a vários deles. Constituem práticas discursivas dentro das quais podemos identificar um conjunto de gêneros textuais que, às vezes, lhe são próprios (em certos casos exclusivos) como práticas ou rotinas comunicativas institucionalizadas. Ou seja, o domínio discursivo é uma esfera que comporta diversos gêneros textuais que dizem respeito a um mesmo tema ou a uma mesma área. (Marcuschi, 2010, p. 24- 25) Além dos conceitos apresentados, ainda se faz necessário lembrar a diferença entre texto e discurso, pois não representam a mesma coisa. O Professor Marcuschi coloca: ... texto é uma entidade concreta realizada materialmente e corporificada em algum gênero textual. Discurso é aquilo que um texto produz ao se manifestar em alguma instância discursiva. Assim, o discurso se realiza nos textos. Em outros termos, os textos realizam discursos em situações institucionais, históricas, sociais e ideológicas. Os textos são acontecimentos discursivos para os quais convergem ações linguísticas, sociais e cognitivas, segundo Robert de Beaugrande (1997). (Marcuschi, 2010, p.25) Veja que existe uma diferença entre texto e discurso. Texto é visto como a estrutura linguística que organiza o gênero textual, enquanto o discurso é a projeção de valores instaurados dentro dos textos de acordo com uma intenção comunicativa. O exposto, até o presente momento, busca deixar claro que não se deve confundir tipos textuais com gêneros textuais. Os tipos textuais configuram-se por sua ordem linguisticamente estrutural. Isso é importante porque observamos que ocorre uma confusão ao citar determinados gêneros como se eles fossem tipos de textos. Por exemplo, quando alguém diz: - O romance é um tipo de texto muito longo. Nesse caso, o romance não é um tipo de texto, mas um gênero textual. Também é importante salientar que muitos gêneros comportam na sua formação diversos tipos textuais que se entrelaçam para formar o texto. Mas, sempre ocorre o predomínio de um ou dois tipos em relação aos demais. Como os tipos textuais são limitados, é possível enumerá-los e identificar suas principais características. Para tanto, tomemos uma formulação feita por Werlich (1973) que se encontra em Marcuschi: 13 Bases Temáticas Exemplos Traços Linguísticos 1. Descritiva “Sobre a mesa havia milhares de vidros.” Esse tipo de enunciado textual tem uma estrutura simples com um verbo estático no presente ou imperfeito, um complemento e uma indicação circunstancial de lugar. 2. Narrativa “Os passageiros aterrissaram em Nova York no meio da noite.” Esse tipo de enunciado textual tem um verbo de mudança no passado, um circunstancial de tempo e lugar. Por sua referência temporal e local, este enunciado é designado como enunciado indicativo de ação. 3. Expositiva (a) “Uma parte do cérebro é o córtex.” (b) “O cérebro tem 10 milhões de neurônios.” Em (a), temos uma base textual denominada exposição sintética pelo processo da composição. Aparece um sujeito, um predicado (no presente) e um complemento com um grupo nominal. Trata-se de um enunciado de identificação de fenômenos. Em (b), temos uma base textual denominada de exposição analítica pelo processo de decomposição. Também é uma estrutura com um sujeito, um verbo da família do verbo ter (ou verbos como: “contém”, “consiste”, “compreende”) e um complemento que estabelece com o sujeito uma relação parte-todo. Trata-se de um enunciado de ligação de fenômenos. 4. Argumentativa “A obsessão com a durabilidade nas artes não é permanente.” Tem-se aqui uma forma verbal com o verbo ser no presente e um complemento (que no caso é um adjetivo). Trata-se de um enunciado de atribuição de qualidade. 5. Injuntiva “Pare!” “Seja razoável.” Vem representada por um verbo no imperativo. Estes são os enunciados incitadores à ação. Estes textos podem sofrer certas modificações significativas na forma e assumir, por exemplo, a configuração mais longa onde o imperativo é substituído por um “deve”. Por exemplo: “Todos os brasileiros na idade de 18 anos de sexo masculino devem comparecer ao exército para alistarem-se”. Fonte: Marcuschi, 2010, 29 14 Unidade: Se apropriando dos gêneros textuais: Usos e características Exemplo: Fábula – A formiga e a cigarra Num dia quente de verão, uma alegre cigarra estava a cantar e a tocar o seu violão, com todo o entusiasmo. Ela viu uma formiga a passar, concentrada na sua grande labuta diária que consistia em guardar comida para o inverno. “D. Formiga, venha e cante comigo, em vez de trabalhar tão arduamente.”, desafiou a cigarra “Vamos-nos divertir.” “Tenho de guardar comida para o Inverno”, respondeu a formiga, sem parar, “e aconselho-a a fazer o mesmo.” “Não se preocupe com o inverno, está ainda muito longe.”, disse a outra, despreocupada. “Como vê, comida não falta.” Mas a formiga não quis ouvir e continuou a sua labuta. Os meses passaram e o tempo arrefeceu cada vez mais, até que toda a Natureza em redor ficou coberta com um espesso manto branco de neve. Chegou o inverno. A cigarra, esfomeada e enregelada, foi à casa da formiga e implorou humildemente por algo para comer. “Se você tivesse ouvido o meu conselho no Verão, não estaria agora tão desesperada.”, ralhou a formiga. “Preferiu cantar e tocar violão! Pois agora dance!” E dizendo isto, fechou a porta, deixando a cigarra entregue à sua sorte. Moral da história: Não pense só em divertir-te. Trabalha e pensa no futuro. É melhor estarmos preparados para os dias de necessidade. Fonte: http://www.escolovar.org/fabula_1pagina_cigarra.formiga.htm - acesso em 11/12/2014 A fábula é um gênero textual, e essa fábula que escolhemos como exemplo é um tipo de texto predominantemente narrativo que conta que a cigarra cantava enquanto a formiga trabalhava e o resultado disso com o passar do tempo. No entanto, encontramos em sua estrutura outros tipos textuais como, por exemplo: a descrição que inicia a história “Num dia quente de verão, uma alegre cigarra estava a cantar e a tocar o seu violão, com todo o entusiasmo” ou a injuntiva nos seguintes trechos: “D. Formiga, venha e cante comigo, em vez de trabalhar tão arduamente.” “Vamo-nos divertir.” Ao contrário dos tipos textuais, que são definidos por suas formas e possuem um número limitado, não é possível fazer uma relação dos gêneros que circulam nas sociedades. Alguns linguistas alemães ao tentar empreender esse trabalho nomearam mais de 4.000 gêneros. Segundo Bakhtin, os gêneros são ( “eram” dá a ideia de que não são mais) “tipos relativamente estáveis de enunciados”, vamos então considerar que os gêneros “São muito mais famílias de textos com uma série de semelhanças. Eles são eventos linguísticos, mas não se definem por características linguísticas: caracterizam-se, como já dissemos, enquanto atividades sociodiscursivas. Sendo os gêneros fenômenos sociohistóricos e culturalmente sensíveis,...” (Marcuschi, 2010, p. 31) 15 Os gêneros textuais e sua aplicação no ensino e aprendizagem da leitura e da escrita Hoje, o ensino de Língua Portuguesa é regulamentado pelos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs), documento elaborado entre 1997 e 1998 e que traça as diretrizes para o ensino de um modo geral, no Brasil. No casoda Língua Portuguesa, a proposta apresentada volta-se para o tratamento da Língua não mais de forma mecânica e engessada dentro da tradição de estudos normativos. Ao contrário, propõe-se uma abordagem comunicativa que terá o texto, nos seus mais diversos gêneros, como instrumento primordial de trabalho. Para compreender a nova abordagem no ensino de língua portuguesa, convido você para conhecer a história do ensino de Língua Portuguesa no Brasil. A Professora Maria Auxiliadora Bezerra trata justamente dessa questão em seu texto “Ensino de língua portuguesa e contextos teóricos metodológicos”. Vamos, então, nos reportar a esse trabalho, para traçar um panorama de como o ensino de português era e como ele deve ser na atualidade. Sabemos que o ensino de nosso idioma se dava a partir de estudos dagramática normativa, em sua perspectiva prescritiva (quando se impõe um conjunto de regras a ser seguido, do tipo concordância verbal e nominal) e também analítica (quando se identificam as partes que compõe um todo, com suas respectivas funções, do tipo funções sintáticas dos termos da oração, elementos mórficos das palavras). (Bezerra, 2010. p. 39) O ensino de português voltado para o estudo das regras gramaticais, segundo um padrão linguístico tido como “culto” e que não correspondia aos usos efetivos apresentados pelos falantes do português, foi a maneira como se deu, durante anos, o ensino dentro das escolas. O modelo de ensino totalmente mecanizado e baseado na utilização de regras da língua “culta” estava respaldado por dois fatores: um externo ao sistema da língua e outro baseado em fatores internos de aprendizagem da língua. Como fator externo nos é apresentado o fato da língua portuguesa só integrar os currículos escolares brasileiros no final do século XIX, até então, ela só era utilizada para alfabetização e quem tinha o direito de continuar os estudos eram aqueles que pertenciam às classes mais elevadas da sociedade. Quando o estudo da língua passa a ser ofertado a todos, ocorre uma tendência de querer ensinar o padrão daqueles que já conviviam com a língua culta, ou seja, o objetivo era ensinar a língua “culta” a quem ainda não a dominava. O fator interno está relacionado ao fato de que o latim, a retórica e a poética formavam o conjunto de elementos a serem estudados por quem prosseguia seus estudos após a alfabetização e, sendo o latim abordado numa perspectiva gramatical, usou-se o mesmo modelo para o ensino do português. 16 Unidade: Se apropriando dos gêneros textuais: Usos e características As rápidas mudanças na sociedade, nas relações sociais, as novas tecnologias e formas de produção, além do desenvolvimento de novos estudos sobre língua e linguagem e o surgimento de novas teorias influenciaram e mudaram o ensino de línguas. A ciência linguística, por exemplo, propiciou uma reflexão a respeito da língua em uso. Isso mostrou que é necessário muito mais do que memorizar regras gramaticais para se apropriar da forma tida como “culta”. Os estudos linguísticos contribuíram para a introdução de uma nova perspectiva para o ensino de línguas, considerando a relação do eu com o outro, dentro de um contexto histórico e social em constante transformação. Passou a ser considerado o caráter dialógico dos textos e suas funções na sociedade. Também, cabe lembrar, por exemplo, ... a teoria sociointeracionista vygotskyana de aprendizagem, as de letramento e as de texto/discurso, que possibilitam considerar aspectos cognitivos, sociopolíticos, enunciativos e linguísticos envolvidos no processo de ensino/aprendizagem de uma língua. (Bezerra, 2010, p. 40) Veja, então, que vários fatores começaram a ser considerados importantes no processo de ensino/ aprendizagem da língua. As questões linguísticas continuaram sendo consideradas, mas entraram em cena, também, elementos de outra ordem. As questões relacionadas ao processo cognitivo passaram a ser pensadas. A questão de o homem ser um sujeito social e histórico que produz conhecimento entrou na pauta como responsável pelo processo de apropriação e desenvolvimento da língua. Os fatores funcionais que estão presentes na base dos textos também foram privilegiados. Nesse novo contexto, passa a se pensar no importante papel que a escola exerce para a difusão do conhecimento. Conhecimento produzido e acumulado pela humanidade e que deve ser repassado de maneira natural e prazerosa de geração em geração por meio da língua. Para que esse processo de transmissão do conhecimento ocorra devemos nos apropriar dos textos que circulam na sociedade em forma de gêneros. Outro fator importante que precisa estar na pauta é o fato de que os alunos já têm um contato com a língua e já utilizam essa língua de maneira natural. Claro que a maioria usa uma variante não padrão do português, no entanto, isso não pode e não deve causar nenhum tipo de problema. Ao contrário, a escola precisa acolher as variantes que os alunos trazem. Não se nega aqui a importância da língua “padrão”, apenas se busca chamar atenção para uma emergente necessidade de mediar a relação entre a língua vista como culta e os conhecimentos que os alunos já possuem sobre a língua que usam no seu cotidiano. Deve-se tomar como base o que o aluno já sabe da língua e que usa para se comunicar e a partir desse ponto, transformá-los em sujeitos letrados. Em outras palavras, a proposta é trabalhar as questões que envolvem a língua a partir de uma abordagem que propicie ao aluno tornar-se um sujeito letrado. Isso significa ser um sujeito que reflita sobre sua língua e a linguagem. Para saber usá-las, língua e linguagem, nas mais diversas situações da vida. A formação desse sujeito não é possível apenas propondo uma apreensão mecanizada das regras da língua portuguesa. 17 Atenção Existe uma diferença entre alfabetização e letramento. Alfabetização é o processo de ensino dos símbolos da escrita (grafemas) que organizam uma língua e que permitem aos sujeitos escreverem. Letramento é o processo de transmissão e apropriação pelos sujeitos dos conhecimentos históricos, sociais e tecnológicos produzidos pela humanidade que lhes permite compreender, interpretar, atuar e interagir em sociedade por meio de textos. Todo o processo de práticas de leitura e escrita, a partir de textos, desenvolve o letramento nos sujeitos, em maior ou menor grau. Todas as atividades humanas decorrem da tratativa com os textos nos seus mais variados gêneros. No entanto, cabe lembrar que Sendo culturalmente determinados, os gêneros textuais não são aprendidos e usados igualmente por todos: aqueles que são rotinizados por grupos sociais influentes não chegam à população em geral, pois, subjacentes a essas práticas, há os mecanismos sociopolíticos e ideológicos de controle dos recursos materiais e simbólicos (Signorini, op.cit.p.10). É o que Street (1984) denominava letramento ideológico, para explicar o fato de que os eventos de letramento não são apenas aspectos da cultura, mas também das estruturas de poder numa sociedade. (Bezerra, 2010. p. 42) Perceba que trabalhar com textos a partir das funções que os diversos gêneros exercem na organização e manutenção dos discursos, que se entrelaçam no seio da sociedade, é preparar o aluno para uma reflexão sobre seu papel no mundo. Os gêneros textuais são meios de comunicação que também exercem o papel de difusor ideológico e mecanismo de manutenção ou mudança dentro de uma sociedade. Enfim, o trabalho com os gêneros em sala de aula é algo inevitável. Cabe ao professor, portanto, alterar uma postura arraigada durante anos. Postura essa, de tratar os gêneros considerando apenas os seus elementos estruturais e formais. É necessária uma abordagem dos gêneros, como dito anteriormente, focando seus aspectos comunicativos e interacionais. Isso propiciaráaos alunos entenderem que cada gênero encontra-se inserido na sociedade com um papel e uma função específica. Nessa nova perspectiva, cabe ao professor também trabalhar com o maior número de gêneros possíveis. Deve circular nas salas de aula tanto os gêneros literários como os não literários, assim como, os gêneros que surgem graças às inovações tecnológicas e da comunicação. É imprescindível que o profissional da educação se atualize, reconheça o novo contingente de textos que surgem a cada dia para satisfazer exigências dos suportes de comunicação moderna, como internet, celular, tablete, computador, mesmo TV e rádio, e passe então a trabalhar com eles no seu cotidiano. 18 Unidade: Se apropriando dos gêneros textuais: Usos e características Material Complementar Para aprender mais sobre os conteúdos trabalhados nesta unidade, indicamos os links a seguir: Vídeos: Vídeo aula do Prof. Pasquale Cipro Neto, com o título - REDAÇÃO - “Tipos E Gêneros Textuais” Neste vídeo, o Prof. Pasquale trata das diferenças entre tipos textuais e gêneros textuais. Último acesso em: 10/11/2014. https://www.youtube.com/watch?v=w9oR0TncVSM. Vídeo aula da Professora Rafaela Lobo – Título: Interpretação Texto - Tipologia Textual e Gênero Textual - Neste vídeo, a Prof.ª Rafaela explica os usos dos gêneros e suas funções dentro da sociedade. Último acesso em: 14/11/2014 https://www.youtube.com/watch?v=EW3pR4SVeeA. Este vídeo, chamado “Gêneros Textuais”, mostra uma série de exemplos de gêneros textuais da mídia impressa. Último acesso: 14/11/2014. https://www.youtube.com/watch?v=a9seQ4ZjNSI. Livro: KAWOSKI, Acir Mario, GAYDECZKA, Beatriz, BRITO, Karin S. (Org.). Gêneros Textuais: reflexões e ensino. 4ed. São Paulo: Parábola Editoria, 2011. Neste livro, você encontra uma série de trabalhos, produzidos por vários autores, a respeito de diversas questões que envolvem os gêneros textuais e o ensino de uma forma geral. Esses trabalhos contribuem tanto para consolidar o conceito de gênero como para compreender como os gêneros se articulam. Não deixe de acessar os links e ler o livro indicado, pois é muito importante sua ação como protagonista na construção dos seus conhecimentos. 19 Referências BEZERRA, Maria Auxiliadora. Ensino de Língua Portugua e Contextos Teóricos- metodológicos. In: DIONÍSIO, Angela P.; MACHADO, Anna R.; BEZERRA, Maria A. (Org.) Gêneros textuais e ensino. São Paulo: Parábola Editorial, 2010. MARCUSCHI, Luiz Antonio. Gêneros Textuais: Definição e Funcionalidade. In: DIONÍSIO, Angela P.; MACHADO, Anna R.; BEZERRA, Maria A. (Org.) Gêneros textuais e ensino. São Paulo: Parábola Editorial, 2010. Referências Bibliográficas: (disponível para consulta) DIONÍSIO, Angela P.; MACHADO, Anna R.; BEZERRA, Maria A. (Org.) Gêneros textuais e ensino. São Paulo: Parábola Editorial, 2010. 20 Unidade: Se apropriando dos gêneros textuais: Usos e características Anotações