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ENSAIO sobre absolutismo de Perry Anderson, nebulosa cristã e causas da reforma de Jean Delumeau e ritos de violência de Natalie Davis

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UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA – UNEB
 CAMPUS IV – DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS HUMANAS
 CURSO: LICENCIATURA EM HISTÓRIA
DISCIPLINA: HISTÓRIA DA EUROPA: DO OCIDENTE 
MEDIEVAL AOS NOVOS TEMPOS
 SEMESTRE: 2019.1 DATA: 27/08/19
 DOSCENTE: Elisangela Oliveira
 DISCENTE: Suziane Veras
 ENSAIO ACADÊMICO
Introdução
	Este ensaio busca clarificar as visões e perspectivas de autores como Anderson Perry acerca da formação do Estado Absolutista, apontando características que indicam a tese de Perry sobre a estrutura do Absolutismo. Em seguida, o estudo é direcionado para a obra de Jean Delumeau, “A civilização do Renascimento”, onde o viés da História Cultural segundo o autor, é a base para retratar o desenvolvimento do Renascimento e a nuvem nebulosa cresceste do cristianismo na época. Seguindo na Idade Média, Delumeau dessa vez vem abordado as causas da Reforma Protestante na obra “Nascimento e Afirmação da Reforma”, onde é destacado em dois capítulos específicos, as causas religiosas do Protestantismo, defendendo sua tese em torno da ocorrência de uma revolução religiosa e não apenas uma artimanha política ou econômica. Por fim, o ensaio discorre sobre as percepções de Natale Davis acerca do papel das multidões dentro dos movimentos religiosos na época da Reforma na França, sugerindo que as multidões estavam para além do caos, eram levantes religiosos organizados e cheios de informações sobre os coletivos da época, grupos representantes de cada movimento, católicos e protestantes. 
ANDERSON, Perry. “O Estado absolutista no Ocidente”. In ________ Linhagens do Estado Absolutista. São Paulo: Brasiliense, 2004, p.15-41. 
Na perspectiva de Perry Anderson, vai ser uma historiografia muito ligada ao materialismo histórico, ou seja, uma historiografia marxista. Então do ponto de vista dele, é intencionado fazer um panorama europeu de alguma maneira ao longo da obra que se chama “Linhagens do Estado Absolutista”, um trabalho concebido como um estudo marxista do absolutismo. Perry Anderson procura discutir como vão se formar os Estados Modernos, sobretudo no século XV, XVI e XVII na Europa de um modo geral, após a crise do feudalismo, e como isso se dará de maneira diferenciada em determinadas regiões da Europa. No capítulo estudado, é pensando basicamente a Europa Ocidental, o próprio título do capítulo sugere isso, denominado “Estado Absolutista do Ocidente” que vai pensar justamente em torno da região onde se formou o feudalismo mais tradicional, regiões como França, Alemanha, Espanha e um pouco da Inglaterra, Portugal e Itália. É percebido que o autor percorre por um caminho diferente daquele relacionado aos primeiros debates dentro da perspectiva da Europa no campo da história cultural, ele se direciona para uma parte da Idade Média e da Idade Moderna de um ponto de vista da história das mentalidades, de como as pessoas se relacionavam e das crises da Idade Média do ponto de vista religioso. 
Nessa obra, Anderson caminha pelo a história política dentro do cenário marxista, que pensa na formação do Estado e o que ajudou na formação desse Estado Moderno. Uma questão chave que Anderson Perry vai discutir no texto é justamente qual a classe social que estava no poder durante esse período? Quando está nascendo o capitalismo na Europa e a Idade Média está sendo finalizada, dando início ao surgimento dos tempos modernos. O Autor usa desse questionamento para dizer quais são as características do Estado Absolutista, esse que já foi assunto de debate desde os anos cinquenta por historiadores marxistas. Perry vai se engajar nesse debate de forma mais ampla para compreender essa historiografia absolutista, o texto busca entender quais são as características do Estado Feudal e qual a relação que o Estado Feudal tem com o período anterior. No centro do debate de qualquer análise marxista, vai entrar a questão das classes, quais classes estão no poder, quais são as classes que estão participando dessa organização política nova na Europa e qual o papel de cada classe? É por isso que logo nas primeiras partes da leitura é feita uma revisão do que o Marxismo falava sobre a transição do feudalismo para o capitalismo. Essas discussões em torno das classes são para problematizar todos esses posicionamentos da época, é uma historiografia marxista que está sendo repensada e problematizada, mesmo que esteja fincada ao materialismo histórico, essa narrativa acaba recebendo críticas. Diante disso, fica entendido que o Absolutismo que Anderson Perry estuda, é um absolutismo com raízes feudais, como se fosse uma nova roupagem para uma velha dominação. 
	Na página quinze e dezesseis é apontado definições de Anderson e Marx sobre essa transição.
No curso do século XVI, o Estado absolutista emergiu no Ocidente. As monarquias centralizadas da França, Inglaterra e Espanha representavam uma ruptura decisiva com a soberania piramidal e parcelada das formações sociais medievais, com seus sistemas de propriedade e de vassalagem. (PERRY, 1984 p.15)
	Para Engels o Absolutismo seria o produto do equilíbrio de classe, entre a antiga nobreza feudal que era a aristocracia que estava no poder da Idade Média e a nova burguesia mercantil que estava nascendo. Voltando aquele estudo sobre o mercador, personagem abordado por Jacques Le Goff, essa nova burguesia se trata desse mercador que está surgindo na Idade Média e depois se torna uma figura de poder financeiro. 
Para se pensar a natureza histórica das monarquias que vão surgir na Europa Moderna é preciso entender quem é a classe dominante desse novo período. Quando Engels diz que o Estado Absolutista é como se fosse um equilíbrio, isso tem a ver com o equilíbrio entre a nobreza que está perdendo territórios, além do poder crescente da burguesia, que seria a classe mercantil que está ascendendo cada vez mais. No entanto, Perry desconsidera isso e revisa as teses marxistas dizendo que na verdade não houve uma perda de poder da aristocracia, ele afirma que há uma classe ascendente nova que conquista poder econômico, mas do ponto de vista de quem está a frente do Estado Absolutista, é a mesma aristocracia feudal com uma nova roupagem, portanto não há equilíbrio segundo ele. 
Diante disso, essa é uma discussão que passa pelo marxismo, mas que nem todos os marxistas concordam. Existem debates sobre essa época, mas a denominação desse período não é totalmente definida, é um período novo, que não é capitalista ainda, mas também deixou de ser feudal. E assim permanece um jogo de possíveis definições sobre essa época. Das características desse período, temos o mercantilismo que se torna a nova linha econômica, a classe mercantil que está surgindo e veio trazendo novas relações de trabalho para as cidades e o campo, a questão da nova relação cotidiana entre os senhores feudais e os camponeses, além da entrada do dinheiro como moeda de troca dentro das relações de vassalagem. É nessa perspectiva que se tem a questão sobre qual período é esse de fato? Onde o feudalismo está enfraquecendo, mas ainda resiste à tantas mudanças, e o capitalismo comercial encontra espaço para se estabelecer. É um debate extenso que não encontra uma resposta especifica. 
A partir da obra de Anderson, “Linhagens do Absolutismo”, o modo de produção como é chamado pelo marxismo não muda e continua sendo o modo de produção feudal, mas com uma nova configuração e novas características. E como a classe dominante ainda é feudal, o próprio feudalismo continua enraizado e atuando nesse período discutido. Outras linhas de pesquisa vão dizer que o feudalismo inicia seu fim dentro do cenário da Revolução Industrial e só finaliza efetivamente com a Revolução Francesa já no século XVII. Para clarificar ainda mais o entendimento sobre essa época, o autor fala de algumas modificações que vão caracterizar esse novo período, apontando o porquê de alguns pesquisadores do marxismo acharem que se tratava de uma época completamente renovada, com domínio de uma outra classe social.Ele cita por exemplo, a introdução cada vez mais forte e efetiva de exércitos, cita também a formação de uma burocracia da economia, ou seja, começa a se formar em torno da realeza um corpo administrativo, uma burocracia que vai gerenciar a governança. É esse mecanismo de governo que não existia no feudalismo. Além disse, houveram também as primeiras tentativas de configuração de um sistema tributário e a cobrança de impostos que vai se desenvolver cada vez mais nesse novo sistema de Estado. Também é abordado acerca da importância dada a um novo Código de Direito, um direito romano que havia sido esquecido na Idade Média e vai ser reutilizado. Outro abortamento, é a questão do início dos mercados unificados, seria uma certa preocupação com o comércio. 
Politicamente, o reflorescimento do direito romano respondia às exigências constitucionais dos Estados feudais reorganizados da época. Com efeito, não restam dúvidas de que, na escala europeia, a determinante primordial da adoção da jurisprudência romana reside na tendência dos governos monárquicos à crescente centralização dos pores. (PERRY, 1984 p.26)
Portanto, é justamente quando Perry traz essas novas modificações, que ele afirma ter uma confusão entre os marxistas, pois a historiografia vai encontrar nessa formação uma nova forma de Estado, não conseguindo ver mais o feudalismo nesse cenário, essas inovações vão coincidir com outro fator que também foi importante para se pensar em uma mudança no modo de produção que seria a questão do fim da servidão na Europa Ocidental. Enquanto na Europa Oriental a servidão continuou por mais séculos, na Europa Ocidental onde nasce o capitalismo comercial, pouco a pouco as relações de comércio no campo vão determinar o fim da servidão, ou seja, isso não significa que havia deixado de existir exploração, mas aos poucos o camponês que depende das trocas e do uso das terras de seu senhor vai ter outras possibilidades de se manter economicamente. 
A partir disso, a visão de Anderson Perry está embasada em não concordar com os marxistas, que apontavam para todas essas transformações econômicas, culturais e sociais que foram citadas anteriormente como um conjunto de fatores que coincidiram com o fim da servidão, levando de alguma forma em direção a um regime novo, resultando no fim do Feudalismo para essa historiografia. É justamente nesse momento que Perry ao discordar dessa tese, traz a questão que move sua pesquisa, segundo ele, mesmo a partir de todas essas inovações e a servidão entrando em declínio, a pergunta crucial seria: Qual a classe está no poder nesse momento? Quem continua mandando nesse Estado Absolutista que está nascendo? Logo, ele responde sua própria indagação dizendo que a classe continua a mesma, a nobreza tenta se modificar, tenta de readequar para perder os anéis e nãos os dedos, mas continua sendo a classe de centro do Estado Absolutista, resultado de forças duais e não de um equilíbrio político. 
As forças duais que produziram as novas monarquias da Europa renascentista encontraram uma condensação jurídica única. O reflorescimento do direito romano, um dos grandes movimentos culturais da época, correspondeu ambiguamente às necessidades de ambas as classes sociais, cuja posição e poder desiguais moldaram as estruturas do Estado absolutista no Ocidente. (PERRY, 1984 p.23)
É citado pelo autor um conceito denominado de pressões duais que vão fazer com que nasça esse Absolutismo. Essa pressão dual representa em primeiro lugar as ameaças de rebeliões rurais que colocam em risco a ordem social e o poder da classe feudal. Por outro lado, existe a ascensão da burguesia, que não era uma classe de poder, não representava ainda um poder político, mas já detinha capacidade de desenvolver uma ameaça social. Com isso, Anderson diz que o Absolutismo nasce dessas forças duais, de um lado o próprio campesinato, do outro lado a burguesia que está surgindo. 
No entanto, o Absolutismo surgiu também como uma reação da classe aristocrata, segundo Perry:
Essencialmente, o absolutismo era apenas isto: um aparelho de dominação feudal recolocado e reforçado, destinado a sujeitar as massas camponesas à sua posição social tradicional — não obstante e contra os benefícios que elas tinham conquistado com a comutação generalizada de suas obrigações. Em outras palavras, o Estado absolutista nunca foi um árbitro entre a aristocracia e a burguesia, e menos ainda um instrumento da burguesia nascente contra a aristocracia: ele era a nova carapaça política de uma nobreza atemorizada. (PERRY, 1984 p.18)
Ou seja, existe a ameaça de rebeliões camponesas nesse período, as cidades representam um novo espaço de acolhimento para o camponês que estava preso a terra no cenário rural, mas essas mudanças sociais não conseguem tirar a aristocracia do poder. Os aristocratas vão se sentir ameaçados, mas isso não é suficiente para desprovê-los do poder, esse centralismo político é justamente uma forma de recoloca-los no poder central. Sendo assim, essa seria uma nova forma de dominação sendo desenvolvida. Porém, esse foi um processo que trouxe arranhões para a aristocracia, havendo uma disputa política dentro da classe aristocrata, ocasionando uma nova organização da participação dessa nobreza no Estado Absolutista. Quando se fala em classe aristocrata, é sugerido também que se fale em uma Cavalaria medieval, que participa das guerras e das conquistas territoriais, e que nessa nova configuração de Estado centralizado e propriedade fundiária que agora já não pode ser comercializada, essa cavalaria acaba perdendo sua principal função. Outro ponto trazido por Perry, é o que ele chama de venda de cargos, a nobreza vai participar permanentemente da democracia do Estado, em cargos que são ocupados por aristocratas, essa foi uma forma de remanejar a nobreza. Em um segundo momento do século XVII, a classe mercantil que conquista seu poder econômico também vai participar do Estado Absolutista, com a posse de cargos através da venda dessas posições políticas e títulos de nobreza. Por fim, é observado que todas essas características indicam um processo com conflitos dentro da aristocracia, um cenário de disputas de lugar social.
DELUMEAU, Jean. “A explosão da nebulosa cristã”. In ________ A civilização do Renascimento. Volume I. Lisboa: Editorial Estampa, 1994, p. 27-48.
Jean Delumeau percorre por caminhos diferentes de Anderson Perry, pois certamente estavam falando de uma outra perspectiva de fazer história. Não é objetivo desse ensaio analisar qual autor está certo ou errado, nosso viés fundamental é expor as percepções de cada pesquisa, indicando as características de cada conceito. Delumeau fornece uma explicação sobre o Renascimento, movimento histórico que ocorreu na mesma época estudada por Perry na obra anterior entre os séculos XIV e XVI, porém, Anderson Perry praticamente não toca no conceito de Renascimento. É percebido que Jean se direciona mais para uma perspectiva da história cultural, traçando nessa obra um panorama da Europa, mostrando que o Renascimento foi uma espécie de promoção da Europa de si mesma. Ele chama o Renascimento de “promoção do ocidente”. O próprio conceito de Renascimento vira questionamento, o autor sugere que a denominação de Renascimento foi inventada no século XVI por aqueles que viviam nesse período. Nesse mesmo século, a renascença inaugurava uma nova época na Europa, uma época mais iluminada, mais voltada para as artes e deixava para traz os longos tempos sombrios, aquela ideia de idade das trevas que tanto se ouviu falar. Os renascentistas queriam justamente se distanciar da Idade Média, que para eles foi um período de atraso, de regresso e dominação da Igreja Católica, sobretudo depois da Reforma, e se voltam cada vez mais para a Antiguidade Clássica. 
No entanto, é visto efetivamente que essa Idade Média não larga o Renascimento. Esse conceito de renascer foi muito voltado para o pessimismo, foi um período de espera no apocalipse, marcado por uma religiosidade que vai colocara culpa em algumas figuras principais da época, período onde embora seja chamado de renascimento, foi também a época onde mais se queimou mulheres nas fogueiras acusadas de bruxaria. Então, há uma série de fatores que foram herdados da época medieval e que o Renascimento tenta renegar, mas está marcado no século XVI, essa é resumidamente a concepção de Jean Delumeau na obra “A civilização do Renascimento”. 
No capítulo “A explosão da nebulosa cristã”, Delumeau descreve um quadro do que era a Europa no período onde se discorreu o Renascimento. O autor se preocupa em mostrar o que foi a afirmação nas nações europeias, esse é o objetivo fundamental do capítulo. É traçado uma perspectiva de como as diversas regiões da Europa vão se formando de maneira territorial, se configurando com suas fronteias e como o mapa da Europa vai se desenhando nessa época, por isso ele faz comparações.
Vale ainda a pena fazer notar que, no princípio do século XVI, as mais importantes cidades do mundo estavam fora da esfera cia civilização ocidental. Assim, Constantinopla> e México, duas capitais que se ignoravam mutuamente, teriam, a primeira, 250 000 habitantes e a segunda 300000, mais, portanto, que Paris (talvez 200 000 almas) e Nápoles> (cerca de 150000). Mas era na Europa, e mais especialmente no Oeste do continente, que estavam o dinamismo e as chaves do futuro. (DELUMEAU, 1994 p.27)
	 É indicado que a maior parte das cidades europeias eram pequenas do ponto de vista demográfico. Cidades como Constantinopla que atualmente é território turco, tinham população muito maiores do que outras cidades da Europa, e cita também que outras cidades fora do eixo europeu eram bem mais populosas que outras capitais da Europa no período. Porém, ao mesmo tempo é desenvolvida uma ideia de que se a Europa não tinha um progresso demográfico, por outro lado era uma Europa do progresso humano, que detinha a chave do futuro. É exatamente nesses tempos que o contato dos europeus com outras civilizações deflagrou a mundialização, através das grandes navegações e descobertas de territórios no século XVI. Segundo Delumeau, esse é o dinamismo que pariu o mundo moderno, o mercantilismo. A fome a partir do descobrimento do ouro, as inovações tecnológicas no século VX, as riquezas geradas através das embarcações ultramarinas e o próprio capitalismo que vai nascer nesse período vai mostrar que na Europa está a porta de entrada para esse mundo moderno que está surgindo, positiva e negativamente, a partir da visão do autor. É a partir da Europa que vai surgir o território da África e fora da África, se referindo a diáspora africana, uma vez que é essa Europa Moderna e dinâmica que vai obrigar os africanos a saírem de seu território e se transformarem em escravos no novo mundo. 
	De início, o autor faz uma série de menções à dados, nomes de dinastias, territórios e estatísticas populacionais que fica complicado de acompanhar. Mas, toda essa enxurrada de dados serve para se pensar justamente o que ele chama de nebulosa cristã. A ideia de que a cristandade era uma neblina que cobria e alcançava diversos territórios, se formando e se aprimorando nessa época. Seria uma cristandade que tem a religião cristã como centro unificador, mas é uma cristandade muito diferenciada, devido a língua, os costumes, do ponto de vista da própria formação territorial que ainda não está definida, as fronteiras e os países que não estavam determinados e estavam em processo de formação nessa época. Delumeau chama atenção para duas situações diferentes, uma no século XIV onde acontecia uma séria de conturbações no mapa Europeu mostrando uma Europa completamente fragmentada, em período de constantes mudanças devido as conquistas e combates que acorriam a todo momento. E a segunda, no início do século XVII por volta de 1620, onde já é notado uma Europa com muitos contornos semelhante com a Europa que conhecemos hoje. Foi nesse período que muitos países conseguiram suas fronteiras. 
Outro aspecto abordado é a finalização de muitos laços feudais, do ponto de vista do que são as nações da época, como por exemplo a França e Inglaterra, com a existência de conflitos de aliança entre os dois territórios, indicando a queda do feudalismo. Cada vez mais as relações são mercantilizadas, as disputas territoriais e de poder vão envolver mais e mais essas monarquias, e os antigos laços de respeito, proteção e ajuda mútua também vão entrar em decadência. Com tantas transformações sócias, políticas, econômicas e geográficas, vai surgir além disso o princípio de um orgulho nacional que começa a marcar o surgimento das nações, manifestando um sentimento de pertença à um lugar especifico, um certo individualismo, ou seja, uma forma de se compreender enquanto nacionalidade, enquanto cultura, língua e território. 
O que temos de compreender que está por trás das injúrias, das gabarolices e das hipérboles é a consciência de si e dos outros que, na época do Renascimento, surge na maioria dos povos europeus. Sabem já que são diferentes. Os franceses têm reputação de levianos, ferventes, inconstantes. (DELUMEAU, 1994 p.44)
Delumeau percebe o despertar da noção coletiva de nação, sugerindo um sentimento que ele já chama de nacionalismo, claro, diferentemente do nacionalismo do século XIX. Continuando com a visão do autor, na própria época da Reforma Protestante com Lutero no início do século XVI, umas das grandes das revoluções do período que vai estremecer as bases da Igreja é justamente a tradução da Bíblia, do latim para as línguas vulgares, mostrando o surgimento de um sentimento, apontando que o povo tem interesse por essa leitura na sua língua de origem. E depois, ocorre o surgimento das universidades dentro das próprias nações que estão se formando, denominadas de Universidades Nacionais, reforçando ainda mais essa noção de orgulho nacional que o autor cita. 
DELUMEAU, Jean. “A Reforma: Por quê? ”, e “As causas da Reforma”. In ________ Nascimento e afirmação da Reforma. São Paulo: Pioneira, 1989, p. 59-83 e 251-271
Essa é uma obra para se pensar não a Reforma Protestante que ficou mais conhecida e sim para pensar as reformas religiosas diversas da época, porque houve a Reforma Protestante e logo em seguida a reforma da Igreja Católica, que ficou conhecida como Santa Reforma. Delumeau vai apresentar a ideia de que a contra -reforma é uma denominação incerta para caracterizar a Reforma Católica, porque fica sugerindo ser uma reação a Reforma Protestante, dando a impressão de que a Igreja só se reformou com uma reação, como uma forma de se posicionar contra o protestantismo. A denominação para o autor está errada porque na verdade, no seio da própria Igreja e do próprio cristianismo, antes de haver essa ruptura entre católicos e protestantes, já existia escritos entre os religiosos de reformar a estrutura da Igreja. Há pelo menos dois séculos antes do aparecimento de Lutero, havia uma insatisfação de uma parte do corpo eclesiástico da Igreja Católica de se fazer reformulações em aspectos que eles não estavam de acordo. 
O próprio Matinho Lutero era um monge, ele sai da Igreja chamada Católica e depois faz críticas fundamentais ao modelo de Igreja que estava presente no século XVI, e acaba rompendo com a Igreja. Alguns historiadores, inclusive Jean Delumeau, vai caracterizar a noção de que Martinho Lutero não queria esse rompimento inicialmente com o Cristianismo da Igreja Católica, não havia essa intenção de ruptura imediata. Mas, Lutero fez críticas tão consistentes e se afastou de tal forma dos dogmas da Igreja que isso acabou resultando em sua saída obrigatória, sendo esse o ponto de partida para um novo termo cristão, que vai ser chamado de Protestantismo.
No primeiro capítulo chamado de “A Reforma: Por quê? ”, é transmitido o questionamento primordial que nutri esse estudo. Entre os historiadores de modo geral, havia um debate sobre quais seriam as causas da Reforma, pesquisadores de diferentes campos, ligados ao catolicismo, ao protestantismo, e até os que não tinhamnenhum segmento religioso, compartilhavam da mesma questão: Quais seriam de fato as causas da Reforma? Essa é a centralidade do questionamento desse capítulo, a partir disso Delumeau indica uma tese informando que a Reforma Protestante foi ocasionada pelo abuso e desequilíbrios do Clero, deixando a Igreja marcada por uma corrupção, e foi por conta dessa depravação, de um mercado da fé que Martinho Lutero se opõe a essa Igreja. A partir disso, Jean Delumeau vai debater essa narrativa, na visão dele o abuso do Clero não foi o suficiente para ocasionar uma rachadura no centro da cristandade, o autor acha que esse é um argumento sem força. Sobre o conceito de abuso do Clero, ele vai trazer uma explicação fundamental que vai dizer:
As causas da Reforma foram então mais profundas “que o desregramento de cônegos epicuristas ou os excessos de temperamento das freirinhas de Poissy”³ Na Confissão de Augshurgo, quando se debaterem os abusos não se tratará dos costumes dos monges, mas da “comunhão sob uma única espécie, da missa instituída como sacrifício, do celibato eclesiástico, dos votos de religião, dos jejuns e abstinências impostos aos fiéis.”. Os Placards afixados em 1534 mesmo à porta dos aposentos de Francisco I causarão um escândalo enorme, mas porque eles atacaram a concepção católica da missa. Certamente os desvios disciplinares haviam tomado proporções escandalosas. (DELUMEAU, 1989. P.59-60)
O que os protestantes chamavam de abuso do Clero são na verdade questões de dogmas que eles não concordavam, como por exemplo a ideia da comunhão sob duas espécies, com o fato de que só o padre poderia comungar através do vinho e da hóstia, como acontece até hoje. E os protestantes rebatiam, alegando que todos tinham direito a comungar sob ambas as espécies, direito ao sangue de cristo e não somente ao corpo. 
A partir disso ele vai apontar que há pelo menos dois séculos, a Igreja já vivia nessa depravação, já vivia em uma devassidão entre os próprios membros da Igreja. Nesse mesmo período que Martinho Lutero vai fazer suas críticas, segundo o autor, já havia um movimento de reforma da Igreja. A principal questão trazida por Delumeau é a busca pelas causas religiosas da Reforma, essa busca acontece porque em diferentes estudos, outros historiadores tiram o foco dessas questões de abuso do Clero e enfatizam que a Reforma Protestante foi na verdade uma reação econômica, uma reação a riqueza da Igreja, uma reação da classe popular que seguia cada vez mais insatisfeita com o contexto em que viviam. Devido a isso, alguns historiadores sobretudo marxistas, vão afirmar que alguns reformadores protestantes eram antes de tudo, rebeldes sociais que estavam se rebelando, inferindo a Igreja como alvo principal. Nesse capitulo especificamente, Jean ressalta que as causas religiosas da Reforma iam além dos muros da Igreja, apontando uma necessidade da população cristã, que se sentia a deriva com relação aquilo que o catolicismo pregava.
 É citado os princípios básicos oferecidos por Lutero, que vão justificar o sucesso do protestantismo. 
A questão das causas da reforma é complexa¹. Para tentar resouvê-la, é preciso ir direto ao essencial. O protestantismo dá ênfase a três doutrinas principais: a justificação pela fé, o sacerdócio universal, a infalibilidade apenas na Bíblia. Essa teologia respondia certamente às necessidades religiosas do tempo, sem o que ela não teria conhecido o sucesso que foi o seu. (DELUMEAU, 1989 p.59)
A cerca da justificação pela fé:
Às pessoas que receavam o inferno, Lutero declarou em resumo: parai de atormentar-vos! Deus não é um juiz severo, mas um pai compadecido. Seja o que for que fizerdes, sois e continuareis sendo pecadores a vida inteira. Porém, se crerdes no Redentor, vós estais salvos. Tende confiança! (DELUMEAU, 1989 p.67)
	Isto é, se o cristão acredita em Deus e tem essa comunhão direta com ele, buscando seguir os preceitos de Deus, cedo ou tarde ele seria salvo, mesmo continuando a ser um pecador. Ele não precisaria viver sob a pressão que vivia, a partir da pregação que o catolicismo utilizava. Agora, a respeito da infalibilidade na Bíblia, significa que a escritura sagrada não precisa de um intermediário que interprete ela para o fiel, o próprio fiel pode buscar pessoalmente a verdade de Deus na Bíblia. Então a partir desses três conceitos que são chaves do protestantismo, ele vai dizer que daí se tem a explicação para o resultado buscado e obtido da Reforma, o sucesso das pregações de Lutero, do que ele trazia de novo e que oferece um alento para a população cristã que se sentia a mercê. 
Mais um aspecto observado por Delumeau nessa época seria a ideia de um individualismo, as pessoas passam a inserir nas suas vidas um pensamento a partir de si mesmo. A noção de uma consciência coletiva vai ficando um pouco de lado e que começa a surgir um cenário onde a população fica entre uma ideia de uma salvação coletiva, que seria o discurso da Igreja onde se salvaria o rebanho inteiro e a ideia de que você mesmo poderia buscar sua salvação pessoal, podendo através da confissão, da penitência e outros atos, salvar sua alma. A Igreja Católica oferecia em termos de salvação pessoal a confissão que se torna obrigatória desde o século XII, havia também a obrigatoriedade de se confessar pelo menos uma vez no ano na ocasião da páscoa, e também a devoção aos santos, as relíquias. Porém, Delumeau cita que os cristãos começam a questionar se era mesmo possível alcançar o paraíso através dessas maneiras que a Igreja oferecia. É citado também sobre um mundo que estaria em crise, notando duas crises no mundo medieval, apontando duas quedas de hierarquias que vão ser fundamentais para essa quebra de pensamento. De um lado, a queda da hierarquia feudal e do outro, a queda da hierarquia do ponto de vista da relação do homem, o sujeito comum do dia a dia com aquelas pessoas ligadas a Igreja, percebendo de fato um declínio da classe sacerdotal. 
Trazendo uma narrativa diferenciada, Delumeau alimenta sua visão de que o protestantismo tinha essencialmente raízes fortes do ponto de vista religioso, e não somente a ideia de que seria um cálculo político que levou a Reforma a ganhar consistência, como uma parte da historiografia quis desenhar. Ele defende que para a gente pensar em uma questão que é extremamente religiosa, deve-se pensar também em uma mudança religiosa, uma atitude religiosa dos soberanos que estavam a frente de seus povos na época e tinham influência para orientar as classes cristãs. 
A respeito da impressa:
A imitação por exemplo, foi impressa em diversas línguas, umas sessenta vezes entes de 1500. Graças à imprensa, a Bíblia se difundiu mais amplamente no público letrado desde antes da revolução luterana. Enumeraram-se pelo menos dezesseis edições Vulgata em Paris, entre 1475 e 1517. Na Espanha, a célebre Bíblia poliglota de Alcalá (texto latino, grego e hebraico) estava pronta para publicação em 1514. (DELUMEAU, 1989 p.77)
	Esse trecho mostra a importância no século XVI com a invenção da imprensa, para que as pessoas tivessem acesso direto a Bíblia, sendo a impressa um fator fundamental para difundir as traduções das escrituras sagradas e assim, disseminasse mais e mais os escritos de Deus, com seu devido letramento e tradução nas mais diversas línguas, sem a necessidade de um intermediário. Vai trazer também, que por muito tempo uma parte da historiografia vai achar que o movimento humanista contribuiu com a Reforma, que eles teriam rompido com a Igreja Católica, mas na verdade, Delumeau vai dizer que não, que muitos humanistas vão fazer críticas fundamentais, mas não passaram para o lado dos protestantes. Sobre a contribuição do humanismo, segundo o autor, vai ser a questão do discurso humanista sobre a religião interior, voltada para a defesa da volta de uma religião da Igreja primitiva, uma missa mais humilde, mais simples, com menos hierarquias, o acesso a Bíblia e a ideia de uma religião mais interiorizada, que é a ascensão do individualismo,essa seria a contribuição do humanismo.
	Já o capítulo “As causas da Reforma”, é basicamente um complemento do anterior estudado acima. Ele vai trazer alguns debates da historiografia e algumas explicações das causas da Reforma. Primeiramente, ele vai fornecer um esclarecimento que ele chama de explicação marxista, onde vai justamente se comunicar com os pais do marxismo, Marx e Engels, o materialismo histórico ficou conhecido logo depois. Fornece também debates sobre estudos econômicos e volta ao conceito de abuso do Clero, já mencionado anteriormente. Sobre a explicação marxista, ele diz que a religião é filha da economia capitalista, a Reforma é filha da economia que está nascendo, porque ela coincidiu mais ou menos com o desenvolvimento do capitalismo comercial. Isso ocorre porque algumas teses alegam que os protestantes vieram principalmente da classe de mercadores que queriam se livrar das barreiras criadas pela Igreja para sua profissão, como foi discutido com o estudo de Le Goff na obra: “Na Idade Média: tempo da Igreja e tempo do mercador” e “O tempo do trabalho na “crise” do século XIV”. Por isso, essa narrativa vê no protestantismo uma saída para esse mercador que estava perdido entre o ofício e a religião. É como se a economia fosse vista como a mãe das sociedades, e a Reforma como fruto desse novo mecanismo econômico. Marx defende essa ligação entre a Reforma e o capitalismo, e que as guerras religiosas que vão haver na Europa no século XVI seriam na verdade, lutas de classe. 
	Por outro lado, Engels e outras figuras que vieram depois, veriam também na figura de Lutero um reformador burguês que se amedrontou com a revolução popular que ganhou força com a Reforma e acabou se acovardando quando percebeu a dimensão do movimento, que vai partir para uma violência e uma revolução social, onde as pessoas começam a contestar não somente a Igreja, mas a organização da sociedade como um todo. Houve segundo os marxistas, um passo para trás de Lutero, uma atitude conservadora e isso ocasionou em uma sabotagem de outros possíveis resultados da Reforma. Já Delumeau, defende categoricamente que tanto Marx quanto Engels e muitos historiadores que seguiram os dois, vão fazer uma leitura do século XVI como se estivesse no XIX, cometendo um anacronismo. O próprio termo burguesia não é usado no século XVI como vai ser usado no XVIII e XIX. Portanto, Jean Delumeau vai dizer que não houve reforma social no período, não houve revolução social, o que houve foi uma revolução religiosa. 
DAVIS, Natalie Zemon. “Ritos de violência”. In ________ Culturas do povo: sociedade e cultura no início da França moderna. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2001, p. 129-156
Natale Davis nessa obra, tenta entender o que é a sociedade da França no início da Época Moderna. Então, ela se preocupa essencialmente com a questão cultural e não somente religiosa, por isso ela pensa em uma série de questões que envolve a cultura na França, tentando se aproximar de um conceito que ela chama de cultura popular, e no capítulo “Ritos de violência” especificamente, ela vai partir da análise do que foi a violência do século XVI após a Reforma Protestante, sendo uma violência caracterizada entre dois grupos sociais, tanto entre grupos católicos contra protestantes e vice-versa. O grande ponto chave que Davis vai buscar para construir esse estudo é uma situação especifica de 1572 que ficou conhecida como a noite de São Bartolomeu. É um episódio famoso na história francesa, que fala sobre um grande massacre de protestantes que aconteceu na França no século XVI, milhares de pessoas mortas por questões religiosas justamente no dia de São Bartolomeu. 
A ideia de Natale Davis era ressaltar que muitos historiadores que leram os massacres na França e sobretudo o massacre de São Bartolomeu, virão nesse massacre especificamente lutas de classe. Muitas vezes o combustível principal era esse, muitos que escreveram sobre o período tentaram fazer uma ligação entre a subida do preço dos alimentos, aumento da fome, o contexto social e econômico com o contexto religioso. E então, Natale faz uma visita a esse quadro de rebeliões e lutas de religião na França para analisar se essa tese de fato se sustenta. 
Diante disso, ela traz um debate sobre o conceito de multidão, citando alguns historiadores que ajudam a estudar esse conceito, como por exemplo E. P. Thompson, que vai escrever sobre a classe trabalhadora na Inglaterra no século XVIII. Uma situação que a autora traz é uma ideia de que a multidão precisa ser encarada como um fator político, afirmando que as multidões são inspiradas por tradições políticas, porque uma historiografia anterior via na ação da multidão apenas o caos. Já a historiografia mais renovada vai apontar as multidões como um sujeito histórico que vai além do caos, muito além disso. Por sinal, eram movimentos organizados segundo Davis.
Outra noção que vai ser debatida é a respeito de outro viés da historiografia que viu os levantes religiosos do século XVI como se fossem momentos de perturbação coletiva, sugerindo que a religião levou as pessoas a ficarem loucas, ocasionando um desequilíbrio em massa, sendo esse o motivo que levou as pessoas a ficarem tão violentas. Seria inexplicável que uma população que se diz cristã católica pudesse agir com tamanha violência contra o próximo. Natale percebe que os católicos pregam o tempo todo nas suas ações violentas a defesa da verdadeira religião, fosse católico ou protestante, cada ato agressivo usava desse discurso para se defenderem e acusarem o outro de heresia. Em segundo ponto, é uma ideia que vai marcar muito a época, que seria a ideia de purificação, tanto um lado como o outro viam o mundo como um território sujo que necessitava de purificação, para trazer de volta a profanação e pureza. Em terceiro ponto, existe a noção de que cada grupo tinha o que a autora chama de aspecto político, a ideia de que cada grupo se via com legitimidade. Ou seja, na França, onde ela estava estudando, parecia haver por parte das autoridades uma certa aceitação do protestantismo. Não que o Estado Francês tenha se tornado protestante como ocorreu com a Alemanha ou Inglaterra, mas é como se houvesse um período de aceitação para que as pessoas pudessem vivenciar o protestantismo. E então a população católica nesses casos, tomava o lugar do governante se esse governo não tomasse para si o papel de exterminar a heresia. Caso não fizessem, os católicos o fariam. 
Mais uma vez, essas multidões vão tomar para si o papel de juiz, julgando os erros dos outros e mais do que isso, através do julgamento, decidiam até mesmo punir. Punição essa que muitas vezes significava matar, como por exemplo as matanças generalizadas que houveram na época. E quando população seja do ponto de vista católico ou protestante, vai usar de atos violentos como queimar ou crucificar seu oponente religioso, eles estão usando do mesmo princípio de fazer o corpo pagar pelo pecado cometido contra Deus. Para complementar, só vai haver uma mudança na mentalidade dessas pessoas somente a partir do século XVIII, quando vai começar a existir as prisões por condenação, sofrendo com a privação da liberdade. 
Bibliografia
ANDERSON, Perry. “O Estado absolutista no Ocidente”. In ________ Linhagens do Estado Absolutista. São Paulo: Brasiliense, 2004, p.15-41. 
DELUMEAU, Jean. “A explosão da nebulosa cristã”. In ________ A civilização do Renascimento. Volume I. Lisboa: Editorial Estampa, 1994, p. 27-48.
DELUMEAU, Jean. “A Reforma: Por quê? ”, e “As causas da Reforma”. In ________ Nascimento e afirmação da Reforma. São Paulo: Pioneira, 1989, p. 59-83 e 251-271
LE GOFF, Jacques. “Na Idade Média: tempo da Igreja e tempo do mercador” e “O tempo do trabalho na “crise” do século XIV”. p. 43-73
DAVIS, Natalie Zemon. “Ritos de violência”. In ________ Culturas do povo: sociedade e cultura no início da França moderna. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2001, p. 129-156

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