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Doença arterial coronariana Luiz Pedro Duarte Farias – lpdfarias.med@gmail.com Universidade Salvador – Laureate International Universities Medicina – Clínica Integrada Turma IV INTRODUÇÃO A aterosclerose é responsável pela maior parte dos casos de infarto do miocárdio, acidente vascular cerebral isquêmico e doença arterial periférica. Ela é também uma das principais causas da insuficiência cardíaca crônica e demência vascular. A aterosclerose, que é uma resposta inflamatória crônica para o acúmulo de lipídeos na parede arterial, no início é tipicamente caracterizada por placas íntimas clinicamente silenciosas nas artérias durante anos e até mesmo décadas. A fissura ou erosão das placas ateroscleróticas desencadeia a formação de um trombo que se acumula de segundos a minutos para produzir isquemia aguda do órgão acometido. Esta isquemia, por sua vez, resulta em manifestações clínicas dramáticas. Estima-se que aproximadamente 90% dos casos de IAM, 60% de AVE, a maioria dos casos de ICC e até um terço de todos os casos de demência ocorrem devido a aterosclerose. PACIENTE ASSINTOMÁTICO O paciente que possui a doença arterial coronariana (DAC) menos grave, sem manifestação clínica, é aquele que a placa de ateroma é bastante pequena, com o fluxo de O₂ normal, mesmo em esforço relativamente alto. Esse paciente pode ser qualquer indivíduo, pois, de acordo com estudos mais recentes, as placas de ateroma começam a se formar desde a infância, devido aos maus hábitos de vida e alimentação. É típico de um paciente que chega ao consultório e quer realizar exames de rotina (“check-up”) com o objetivo de evitar complicações maiores, visto que conhece alguém que teve um IAM ou viu na televisão que é necessário sempre visitar um médico. Verifica- se que, caso a situação não se controle, manifestações clínicas podem aparecer dentro de 10 anos. Como o médico pode ter uma noção dos riscos de compicações cardiovasculares? O Escore de Risco de Framingham é uma ferramenta matemática, desenvolvida a partir de estudos, na qual se utiliza de variáveis relacionadas com o risco cardiovascular: Escore de Risco de Framingham para Homens pressão arterial sistólica, tabagismo, colesterol total, HDL-C, LDL-C, intolerância à glicose, IMC e idade. Na maioria ou em combinação elas são combinadas formando os escores preditivos globais. Ou seja, quanto mais variáveis forem encontradas na anamnese, exame físico e exames complementares, maior a chance de ocorrer um desenvolvimento de riscos cardiovasculares. O Escore de Framingham é um escore antigo, usa-se mais na atualidade outros escores como o TIMI-risk; contudo, as variáveis são bastantes semelhantes. O escore de Framingham calculava o risco de infarto, os mais novos calculam os riscos de mortalidade por IAM e AVE. PACIENTE COM DOR PRECORDIAL E DISPNEIAS AOS ESFORÇOS De repente, o nosso paciente com 45 anos começa a sentir dores no peito [em aperto, constritiva, podendo irradiar para o braço ou mandíbula] ao subir alguns degraus da escada do seu prédio, ao mesmo tempo sente uma falta de ar. Só que, quando esse paciente para, ocorre uma melhora. A placa de ateroma, que estava pequena, começa a crescer e impedir o fluxo sanguíneo, comprometendo a chegada fluxo de O₂ quando ocorre esforços e o coração começa a sofrer [o músculo cardíaco começa a realizar produção de energia através de uma respiração anaeróbia e produção de ácido lático]; o paciente sente a dor. Esse caso se caracteriza pela angina estável. Esses esforços que desencadeiam a dor podem ser os mais variáveis possíveis; sendo que, quanto menor o esforço acompanhado de dor, mais grave é a angina. O diagnóstico nesse caso é completamente clínico – podem ocorrer dores referidas, pode ser um mal-estar... Mas a dor mais típica nessas situações é a: retroesternal, em aperto, com sudorese, irradiada, melhorando quando o paciente repousa. Isso pode ser documentado com um teste de esforço – o ECG vai detectar se a dor é proveniente de uma isquemia ou não [inversão de onda T, supra ou infra de ST]. Se o paciente for incapaz de realizar o teste ergométrico, faz-se cintilografia miocárdica a partir do tecnécio captado pelas células cardíacas, usando um estresse farmacológico (fármaco que promove a cronotropia – geralmente dobutamina), induzindo a isquemia. Infra de ST Supra de ST A doença cardíaca isquêmica é mais comumente causada por obstrução ou estenose de uma ou mais das artérias coronárias por placas ateromatosas. A obstrução pode resultar em isquemia e infarto do miocárdio com sintomas associados de angina, isquemia, remodelação miocárdica, insuficiência cardíaca, complicações arrítmicas e, por fim, morte. A angina pectoris geralmente é uma consequência de um desbalanço oferta/ consumo entre uma atividade que aumenta a carga de trabalho ou “consumo”, o que resulta em um aumento na frequência cardíaca, pressão arterial ou ambos e na incapacidade de as artérias coronárias epicárdicas estreitadas aumentarem o fluxo anterógrado ou “oferta” em resposta a este aumento no consumo. Tal desequilíbrio classicamente resulta em desconforto torácico de intensidade e duração variáveis. A angina pectoris é geralmente definida como um desconforto no tórax ou áreas adjacentes causadas por isquemia miocárdica. Muitas vezes, a angina é descrita incorretamente como “dor torácica”. PACIENTE COM DOR PRECORDIAL EM REPOUSO COM MENOS DE 3 MINUTOS Nosso paciente, em um certo dia, ao acordar, começa a sentir uma dor precordial, sendo caracterizada como uma dor “muito mais forte que as anteriores”, acompanhada de sudorese, em aperto, mal-estar e irradiada [podendo ter vômitos associados]. Esse quadro é caracterizado por uma Síndrome Coronariana Aguda. Ou seja, esse paciente deve ir para o hospital imediatamente, pois pode ser uma angina instável ou IAM. O termo síndrome coronariana aguda (SCA) é usado para descrever o conjunto de isquemia miocárdica que engloba angina instável ou IAM (com ou sem elevação concomitante do segmento ST). O paciente com angina instável apresenta dor torácica de origem cardíaca que é nova, com padrão de piora (mais grave, mais prolongada ou mais frequente do que episódios anteriores da angina), ou ocorre em repouso, sem evidência bioquímica da necrose de miócitos (sem elevação sérica de troponina ou da isoenzima MB da creatina-quinase [CK-MB]). O paciente que apresenta dor torácica cardíaca com evidência bioquímica de necrose miocárdica e sem elevação do segmento ST tem um infarto agudo do miocárdio sem elevação do segmento ST (IAMSEST). Como a angina instável e o IAM sem elevação do segmento ST são caracterizados pela ausência de elevação do segmento ST, eles são denominados coletivamente de SCA sem elevação do segmento ST ou SCA- SSST. O paciente que apresenta dor torácica cardíaca, de início agudo, com evidências bioquímicas de necrose miocárdica e elevação do segmento ST persistente (>20 minutos) tem um IAM com elevação do segmento ST. Os primeiros profissionais que irão receber esse tipo de paciente serão os enfermeiros; estes realizarão a triagem por classificação de risco – protocolo de Manchester. Dor precordial é cor vermelha; ou seja, deve ser atendido e realizar ECG imediatamente (fazer no máximo em 10 minutos desde a chegada). O que se procura no ECG é se o paciente tem supra de ST. Supra de ST significa que uma coronária foi obstruída de forma que afete boa parte do músculo e aconteça um infarto transmural [situação grave]. Se o paciente estiver com IAMCSST, não precisa nem esperar pelo exame das enzimas cardíacas, deve-se iniciar imediatamente aterapia indicada. Ou seja, deve ser feita alguma estratégia de reperfusão muscular/ trombolisar o trombo que está obstruindo a coronária, fazendo com que o sangue volte a circular e o coração sofra menos e o IAM cause menos consequências – “tempo é músculo”. Um infarto sem supra de ST ou com infra de ST, geralmente é um infarto subepicárdico. Numa situação com IAMCSST, existem dois tipos de estratégias terapêuticas, uma delas é a trombólise (mais simples e mais comum). Na trombólise utiliza-se uma droga que dissolva o trombo da artéria coronariana (tenecteplase, alteplase e estreptoquinase) por via EV. Se, em meio ao alvoroço do atendimento ao paciente, for possível passar o balão na coronária (angioplastia primária) ao invés de realizar a trombólise [e o lapso de tempo do atendimento até a situação atual for menor que 90 minutos – tempo porta balão], é preferível passar o balão, pois o risco de trombólise é o paciente sangrar posteriormente e com o balão o paciente não sangra. Se o tempo for maior que 90 minutos, o ideal é realizar trombólise. [Tempo porta agulha é de 30 minutos – tempo máximo desde que chegou ao hospital para realizar o procedimento – é menor que o tempo porta balão porque é mais fácil e mais disponível]. Geralmente, a estratégia melhor no SUS é a trombólise. Dor precordial que dura menos que 3 minutos = angina; Dor precordial que dura mais que 30 minutos = IAM. PACIENTE COM DOR PRECORDIAL EM REPOUSO COM MAIS DE 30 MINUTOS Se o paciente não possui supra de ST, mas sim um infra ou inversão de onda T, ou nada, pode mandar para casa? Não! Deve-se pedir logos nos primeiros minutos do atendimento os marcadores de necrose miocárdica – CPK, CK-MB, creatina fosfoquinase e troponina [a dosagem pode ser quantitativa ou qualitativa]. Se a pessoa está em repouso com dor, enzimas normais e sem aparecimento de alterações no ECG, provavelmente se refere a uma angina instável. Geralmente, a literatura afirma que se a dor durar menos de 30 minutos e melhorar, é mais sugestivo de angina instável; e se durar mais de 30 minutos e não melhorar, é mais sugestivo de infarto. Se o paciente chega no PA hipotenso com suspeita de infarto de VD, não se pode usar nitrato pois a tensão pode diminuir bastante, causando a morte do paciente. Um dos grandes riscos do paciente que já infartou é reinfartar – podendo ser mais grave. Contudo, existem mecanismos de circulação colateral que podem promover melhoras ou infartos subsequentes menos graves. PACIENTE COM DOR PRECORDIAL + DISPNEIA DE REPOUSO, EDEMA AGUDO DE PULMÃO E CHOQUE CARDIOGÊNICO Podem ocorrer casos que o paciente chegue ao PA com uma intensa dispneia de origem cardíaca devido a uma síndrome coronariana aguda. Esse estado é muito grave; tendo que, se possível, trombolisar logo, utilizar drogas vasoativas, usar diuréticos [objetivando melhorar o edema agudo de pulmão], encaminhar para UTI – realizar todos os procedimentos necessários do IAM, fora os procedimentos de monitorização hemodinâmica intensiva. Ou seja, um paciente pode chegar no PA com um IAM mais grave ou menos grave. Se o paciente chega infartando com associação de uma crise hipertensiva, deve-se tratar a crise hipertensiva logo (dá nitroglicerina ao paciente, pois vai dilatar a coronária e melhorar a pressão arterial – “dá um tiro e mata dois coelhos”). Isso porque a crise pode ser a causa desencadeadora do IAM – quando o infarto está acontecendo, o miocárdio está consumindo muito O₂, então a estratégia é que ele consuma menos O₂, diminuindo a cronotropia [beta bloqueador – em torno de 60 bpm] e deixar a pressão arterial mais baixa possível, claro que sem chocar o paciente. Se o paciente que está assintomático apresentar síncope e não tiver pulso, tendo o ECG indicando fibrilação ventricular, a morte é quase certa dentro de alguns minutos. Paciente idoso pode chegar no PA sem dor precordial – apresentando apenas dispneia e HAS. Deve-se realizar o ECG, pois pode ser um IAM. Quando o paciente chega, se for preferido realizar a angioplastia primária, faz-se, então, o cateterismo. A angioplastia – joga-se o contraste iodado nas artérias coronárias e será observado onde está acontecendo a obstrução, após isso, leva o balão até a área obstruída e o abre, reperfundindo a região. A cinecoronariografia ou angiografia coronária (CATE) é um exame que vai estudar, através de imagem, como está a irrigação coronária do paciente e então tomar as decisões necessárias. Se o paciente estiver sentindo dor, manter a dispneia e está instável, segura o paciente no hospital; mas se ele estiver muito melhor, calcula-se as medidas que devem ser tomadas. DIAGNÓSTICOS DIFERENCIAIS DE IAM Principais DF de IAM: TEP, aneurisma disseccante de aorta, pericardite. Mas as causas de dor torácica são enormes, como: doença do refluxo, costocondrite, herpes zoster. Todo paciente acima de 40 anos com dor torácica precordial, a preocupação do médico instantemente deve ser afastar IAM, pois é o que mais mata. Várias doenças cardíacas e não cardíacas, algumas das quais potencialmente fatais, podem mimetizar a SCA-SSST. O paciente com embolia pulmonar frequentemente se queixa de dispneia e dor torácica e pode apresentar anormalidades no ECG e elevações séricas de troponina e CK-MB. A dissecção da aorta deve ser considerada e excluída porque as terapias para a SCA-SSST são contraindicadas para pacientes com este diagnóstico. O acidente vascular encefálico e a hemorragia subaracnóidea podem ser acompanhados por anormalidades no ECG, anormalidades de contratilidade segmentar da parede miocárdica e elevações de biomarcadores séricos. Outras doenças cardíacas crônicas subjacentes, tais como doença cardíaca vascular (p.ex: estenose aórtica, insuficiência aórtica) e miocardiopatia hipertrófica, podem estar associadas a sintomas semelhantes aos da SCA-SSST, com elevações de biomarcadores séricos e anormalidades no ECG. A miocardite, a pericardite e a miopericardite frequentemente causam dor torácica que se assemelha à angina, com anormalidades no ECG e elevações de biomarcadores séricos. Uma infecção semelhante a uma gripe ou do trato respiratório superior costuma preceder ou acompanhar essas condições. Pacientes com “cardiomiopatia do estresse” (síndrome de takotsubo) tipicamente apresentam dor torácica, anormalidades no segmento ST e ondas T profundamente invertidas e elevações discretas de biomarcadores séricos. Embora o IAM com elevação do segmento ST seja frequentemente um diagnóstico fácil de fazer com base na apresentação e nos resultados dos testes, outros diagnósticos diferenciais incluem pericardite aguda, miocardite aguda, síndrome de takatsubo induzida por estresse e repolarização precoce. Todas, menos a repolarização precoce podem estar associadas a biomarcadores anormais, mas nenhuma está associada a uma oclusão coronariana. A angiografia coronária precoce é aconselhada quando qualquer uma dessas condições é sugerida ou quando o IAM pode estar relacionado a uma causa diferente de aterosclerose. TRATAMENTO A cirurgia de anastomose aortocoronariana – revascularização miocárdica cirúrgica – (a “ponte de safena”) é indicada em pacientes que possuem diversas placas de ateroma espalhadas nas coronárias, tipicamente caso de paciente diabético. Ou seja, um paciente diabético com coronárias sendo obstruídas (digamos que sejam 3 artérias – triarterial) com lesão difusa, deve-se pegar a veia safena na perna para que se desvie sangue para aorta, realizando uma ponte entre a coronária e a aorta. São também utilizadas as artérias radial e mamária. A tendência da medicina atualé que se faça menos pontes de safena, pois é um procedimento caro, complexo e pode causar diversas consequências. Muito dos pacientes que se revascularizavam por meio de cirurgia, podem ser “segurados” e serem tratados através de medicamentos ou com angioplastia. Os objetivos do tratamento do paciente com SCA são prevenir a recorrência da isquemia corrigindo o desbalanço entre a oferta e o consumo de oxigênio no miocárdio; prevenir a propagação do trombo; estabilizar a placa vulnerável. Antes de tudo, deve-se buscar uma readaptação do estilo de vida do paciente: o paciente deve mudar a sua dieta – cardioproterora –, diminuindo a ingesta de carboidratos refinados, diminuir a ingesta de sal, diminuir a ingesta de gordura trans (“cremoso e crocante”). Existem alimentos que são cardioproterores como: uva, morango, vinho tinto, castanha, azeite de oliva (ricos em ácidos graxos mono e polinssaturados, protegendo o coração). A mudança do estilo de vida também é muito imporante; realizar atividades físicas e procurar uma vida cotidiana menos estressante. A terapia farmacológica envolve estabilização da placa, prevenção contra futuros ataques, estabilização plaquetária e colesterol. As drogas que todos os pacientes cardiopatas devem usar, independente da fase (devido a diminuição da mortalidade), são os beta-bloqueadores (metoprolol, atenolol e carvedilol), IECAs/ BRAs (captopril, inalapril, losartana, valsartana – não se deve usar IECAs em conjunto com os BRAs, ou um ou outro); se o paciente possuir ICC, prefere-se um BCC (amlodipina ou nifedipina) e um diurético associado + hidralazina com nitrato (isordil). Isso vai melhorar diminuindo o tropismo cardíaco, diminuindo o fluxo de oxigênio, melhora a pós-carga cardíaca e a hipertrofia miocárdica. As estatinas (sinvastatina, atorvastatina e rosuvastatina) também devem ser usadas em todos os pacientes – sua função é diminuir o LDL-colesterol, estabiliza e desinflama as placas de ateroma. Outra droga que também deve ser usada em todos os pacientes é o AAS (ácido acetilsalicílico) – sua função é impedir que as plaquetas se agreguem e formem o trombo, impedindo a sua progressão (paciente com dor típica de angina instável é necessário que se mastigue dois, três ou quatro comprimidos de AAS o mais rápido possível, isso diminui bastante o risco de mortalidade). O paciente com angina instável deve ser usado, além dessas drogas supracitadas, clopidogrel (antiagregante plaquetária), nitrato (isordil ou monocordil/ tridil – potentes vasodilatadores coronarianos, respondendo melhor na angina do que no infarto) e heparinas (anticoagulantes em dose plena – enoxaparina, heparina não fracionada [HNF]). Se for paciente com janela de trombólise, trombolisa. É necessário também realizar a analgesia, isso porque a dor faz com que aumente a cronotropia, piorando a situação. Se o paciente chega com um supra de ST e faz a desobstrução, a dor melhora e o supra regrite, melhorando a situação do paciente.
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