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(IM) POSSIBILIDADE DE PRISÃO CIVIL À MENOR EMANCIPADO POR NÃO CUMPRIMENTO DE OBRIGAÇÃO ALIMENTÍCIA Suelen Bandeira Dornelles1 Janaína Machado Sturza2 RESUMO A emancipação antecipa os efeitos da capacidade civil. De outro lado, a única hipótese de prisão civil em nosso ordenamento jurídico ocorre nos casos de inadimplemento alimentício. Em cima desta ocorrência surge o embate existente acerca da (im) possibilidade de prisão civil à menor emancipado por não cumprimento de obrigação alimentícia. Antes de ingressar no tema é feita uma abordagem do instituto da emancipação e do conceito de alimentos na esfera civil. Através do estudo da doutrina e fazendo um comparativo da legislação oportuna ao caso, cabível seria a prisão civil do menor emancipado, prevalecendo nestes casos o princípio fundamental aos alimentos, sobre o princípio da proteção integral da criança e do adolescente. Palavras-chave: Emancipação, alimentos, prisão civil. ABSTRACT Emancipation anticipates the effects of civil capacity. On the other hand, the only civilian prison assumption in our legal system occurs in cases of food default. Upon this occurrence appears the existing clash about the (im) possibility of civil imprisonment to emancipated minor for noncompliance with alimony obligation. Before joining the theme is made one institute's approach to emancipation and the concept of food in the civil sphere. Through the study of doctrine and making a comparative timely legislation to the case, it would be appropriate civil prison of emancipated minor, prevailing in these cases the fundamental principle to food, on the principle of integral protection of children and adolescents. Key-words: Emancipation, food, civil prison. 1. INTRODUÇÃO Esse trabalho tem como objetivo geral tratar de um tema atual em nosso ordenamento jurídico. Assim, abre-se a discussão sobre a existência ou não de possibilidade de prisão civil de menor já emancipado, quando este for devedor de alimentos. 1Graduanda em Direito - Faculdade Dom Alberto. 2Professora orientadora. Nesse ínterim, é abordado de forma mais específica, ao longo dos capítulos o instituto civilista referente ao pagamento de alimentos, bem como sobre o descumprimento desta obrigação e a possibilidade de prisão civil. Ademais, é feita a análise do instituto civilista da emancipação e seus efeitos nos atos da vida civil. Após a realização destas abordagens, necessário se faz o estudo de caso a partir da análise dos dispositivos legais, tais como Constituição Federal, Código Civil e Estatuto da Criança e do Adolescente. Como já se sabe, nos dias atuais, grande parcela dos adolescentes passaram a formar família de forma mais precoce, passando o genitor que ainda é adolescente a ter responsabilidades com o sustento e manutenção daquele lar, bem como de sua prole. Para habilitar este menor a prática dos atos da vida civil há a possibilidade da emancipação. Ocorrendo o inadimplemento da obrigação alimentícia pode a genitora, representando o filho, ingressar com ação de execução de alimentos pelo rito do artigo 733 do Código de Processo Civil. Ainda assim, caso não haja o pagamento da obrigação alimentícia o juiz poderá, como forma de coerção, decretar a prisão civil do devedor. Entretanto, a prisão civil é cumprida, via de regra, em regime fechado, e em estabelecimento prisional penal, ante a falta de lugares próprios para o cumprimento desta pena. Assim, o presente trabalho busca agregar conhecimentos e procurar uma solução para o embate que se trava quando dois direitos estão em conflito: o direito fundamental a alimentos e o princípio da proteção integral da criança e do adolescente. 2. REVISÃO TEÓRICA 2.1. DOS ALIMENTOS Segundo Dias (2013, p. 533) a expressão alimentos “engloba tudo que é necessário para alguém viver com dignidade, dispondo o juiz de poder discricionário para quantificar o seu valor”. Cahali (2013, p. 36) discorre sobre o grau de alcance dos alimentos: Na sua função ou finalidade, os alimentos visam assegurar ao necessitado aquilo que é preciso para a sua manutenção, entendida esta em sentido amplo, proporcionado-lhe os meios de subsistência, se o mesmo não tem de onde tirá-los ou se encontra impossibilitado de produzi-los. De acordo com o artigo 1.696 do Código Civil há entre os pais e os filhos direito à prestação de alimentos reciprocamente, o qual se estende aos ascendentes, obrigação esta que recairá, uns em falta dos outros, sempre nos mais próximos em grau. Venosa (2014, p. 398) discorre que “o dever de os pais proverem a subsistência e educação dos filhos é fundamental. Esse dever transmuta-se na obrigação legal de prestar alimentos”. Há também na Constituição Federal, em seu artigo 229, hipótese que justifica a reciprocidade dos alimentos entre pais e filhos, discorrendo que “os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, e os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade.” O artigo 1.703 do Código Civil assinala que “para a manutenção dos filhos, os cônjuges separados judicialmente contribuirão na proporção de seus recursos”. A estipulação do montante a ser pago relativo à obrigação alimentícia levará em conta a necessidade do alimentado e a possibilidade do alimentante, de acordo com o artigo 1.694, §1º do Código Civil que estipula que “os alimentos devem ser fixados na proporção das necessidades do reclamante e dos recursos da pessoa obrigada”. Quando do não pagamento da obrigação alimentícia há duas formas de execução, quais são pelo rito do artigo 732 ou pelo rito do artigo 733 do Código de Processo Civil. Com relação à execução pelo rito do artigo 733 do Código de Processo Civil, não sendo paga a dívida ou não sendo aceita a justificativa apresentada pelo devedor será expedido mandado de prisão e sobre o valor do débito será acrescida multa (DIAS, 2013). A prisão civil é permita em nosso ordenamento jurídico somente nesses casos de inadimplemento de obrigação alimentícia conforme preceitua o artigo 5º, LXVII, da Constituição Federal. Assim, “decreta-se a prisão civil não como pena, não com o fim de punir o executado pelo fato de não ter pagado a prestação alimentícia, mas sim com o fim, muito diverso, de coagi-lo a pagar” (CAHALI, 2013, p. 736). Quanto ao tipo de regime estabelecido nos casos de prisão civil por alimentos importante mencionar a observação de Pinto (2013, p. 78) que destaca o seguinte: Segundo grande parte da doutrina (Marinoni e Arenhart, Cahali e Araken de Assis, por exemplo), não se admite a prisão civil em regime aberto (domiciliar ou em casa de albergado), uma vez que a prisão civil (pela sua natureza coercitiva) não se sujeita às regras relacionadas à execução da pena de prisão criminal (tendo a Lei de Execuções penais como fonte principal. O devedor de alimentos não deve ficar junto com os outros presos em cela comum, como forma de se evitar o desvirtuamento do caráter da prisão (PARIZATTO, 2006). Segundo dispõe Pinto (2013, p. 80), Há decisões do egrégio Superior Tribunal de Justiça que, apesar de advertirem que a prisão civil (em regra) não segue a Lei de Execuções Penais, tem admitido (excepcionalmente) a prisão domiciliar do devedor de alimentos: quando idoso acometido de moléstias graves ou portador de necessidades especiais, ou ante a inexistência de casa de albergado. Há várias divergências existentes entre os doutrinadores e a jurisprudência, entretanto, via de regra, a prisão do devedor de alimentos deverá ser cumprida emregime fechado, abrindo a possibilidade do cumprimento em regime aberto nos casos em que o devedor possuir características peculiares, tendo em vista ser o mais adequado nessas condições (PINTO, 2013). Por fim, verifica-se que quando do não cumprimento da obrigação alimentícia, a prisão civil do devedor é forma de coerção para que haja efetivamente o pagamento, além do que há mais peso a necessidade de manutenção do alimentando do que o cerceamento da liberdade do alimentante. Com relação ao regime de prisão a ser executado deve ser levada em conta a necessidade do devedor em manter seu vínculo trabalhista, bem como suas condições pessoais que podem levar a prisão domiciliar. 2.2. DA EMANCIPAÇÃO De acordo com o artigo 5º do Código Civil “a menoridade cessa aos 18 (dezoito) anos completos, quando a pessoa fica habilitada à prática de todos os atos da vida civil”. Nesse diapasão o doutrinador Coelho (2010, p. 181) traz o seguinte entendimento: O menor, como definido, é o homem ou mulher com menos de 18 anos de idade completos. Ele é incapaz e, por isso, só pode praticar atos e negócios jurídicos por meio de representante (até os 16 anos) ou com o auxílio de assistente. A incapacidade em razão da idade, porém, pode ser extinta antes da maioridade, com a emancipação. O menor emancipado tem a mesma capacidade do maior. O artigo 5º do Código Civil, em seu inciso I, dispõe que cessará para os menores a incapacidade pela concessão dos pais, ou de um deles na falta do outro, mediante instrumento público, independentemente de homologação judicial, ou por sentença do juiz, ouvido o tutor, se o menor tiver 16 anos completos. Ademais, de acordo com o citado artigo em seus incisos, II, III, IV e V, há mais quatro possibilidades de cessação da incapacidade civil, quais são: pelo casamento, pelo exercício de emprego público efetivo, pela colação de grau em curso de ensino superior e pelo estabelecimento civil ou comercial, ou pela existência de relação de emprego desde que, em função deles, o menor com 16 anos completos tenha economia própria. Nesse ínterim, Gonçalves (2010, p. 135) assinala que “conforme a causa ou origem, a emancipação pode ser de três espécies: voluntária, judicial e legal.” O inciso I, do artigo 5º do Código Civil, parte inicial, trata do instituto da emancipação voluntária que, conforme disserta o doutrinador CENEVIVA (2010, p. 198) “chama-se emancipação o ato concessivo da plena responsabilidade civil, pelos pais ou por um deles, na falta do outro, manifestado por instrumento público, fazendo cessar os efeitos da menoridade do filho ou da filha”. A parte final do inciso I, do artigo 5º do Código Civil, traz a definição da emancipação judicial, dada por sentença do juiz nos casos em que o adolescente encontra-se sobre a guarda de um tutor. Nesse diapasão Gonçalves (2010, p. 137) discorre que: É a única hipótese de emancipação judicial, que depende de sentença do juiz, é a do menor sob tutela que já completou 16 anos de idade Entende o legislador que tal espécie deve ser submetida ao crivo do magistrado, para evitar emancipações destinadas apenas a livrar o tutor do ônus da tutela e prejudiciais ao menor, que se encontra sob a influência daquele, nem sempre satisfeito com o encargo que lhe foi imposto. O tutor, desse modo, não pode emancipar o tutelado. Quanto à emancipação legal sua ocorrência é devida pelo casamento, pelo emprego público efetivo, pela colação de grau em curso de ensino superior, pelo estabelecimento civil ou comercial, ou pela existência de relação de emprego, desde que, em função desta, o menor com 16 anos completos tenha economia própria (PEREIRA, 2010). Com relação à emancipação dada pelo casamento, o artigo 1.517 do Código Civil traz que homem e mulher maiores com 16 anos podem casar-se desde que haja autorização dos pais ou de seus representantes legais. Sobre a emancipação pelo exercício em emprego público efetivo “o fato de ter sido admitido no serviço público já denota maturidade e discernimento, máxime quando a simples existência de relação de emprego, com estabelecimento de economia própria é hoje suficiente para a emancipação” (GONÇALVES, 2010, p. 139). Ademais, quanto às outras formas de emancipação legal, Gonçalves (2010, p. 141) informa que: A colação de grau em curso de ensino superior, e o estabelecimento civil ou comercial, ou a existência de relação de emprego, desde que, em função deles, o menor com 16 anos completos tenha economia própria, justificam a emancipação, por demonstrar maturidade própria do menor, afastando, nas duas últimas hipóteses, as dificuldades que a subordinação aos pais acarretaria, na gestão dos negócios, ou no exercício do emprego particular, ao mesmo tempo em que tutela o interesse de terceiros, que de boa-fé com eles estabeleceram relações comerciais. Estabelecidas as espécies de emancipação existentes em nosso ordenamento jurídico, importante se faz elencar os seus efeitos na esfera civil. A emancipação é irrevogável, tornando o beneficiado habilitado para todos os atos da vida civil, como se tivesse atingido a maioridade. Em nosso ordenamento jurídico o referido instituto se equipara a declaração de maioridade do direito alemão e suíço (PEREIRA, 2010). A emancipação torna a pessoa capaz para somente os atos da vida civil, sendo que o menor emancipado ainda figura no Código Penal como inimputável, de acordo com o artigo 27 do referido diploma legal, não cometendo crime ou contravenção, mas sim ato infracional como previsto no Estatuto da Criança e do Adolescente, bem como ainda se encontra sob a proteção relativa à sua idade. Ademais, pelo fato do menor emancipado não preencher o requisito de ser penalmente imputável, o qual é exigido no artigo 140, I, do Código Brasileiro de Trânsito, não está autorizado pela legislação brasileira a se habilitar para a condução de veículos automotores (PINTO, 2013). Finalmente, percebe-se que a emancipação torna o menor apto para todos os atos da vida civil, sendo que na esfera penal continua sendo este considerado inimputável e seus direitos encontram-se ainda protegidos pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, relevâncias que devem ser levadas em consideração quando de decisão judicial sobre a prisão civil de adolescente emancipado devedor de alimentos. 3. METODOLOGIA O presente trabalho visa elaborar um estudo sobre a possibilidade (ou não) da prisão civil nos casos em que o devedor de alimentos for menor emancipado. Essa pesquisa é realizada através de estudo de caso, especificamente a partir de uma análise dos dispositivos legais pertinentes ao tema. Quanto ao método de abordagem, é o dedutivo, ou seja, realiza-se um estudo geral sobre a temática para após, então, construir a abordagem específica. Já no que se refere ao procedimento, utiliza-se o analítico, no intuito de construir e aprofundar argumentações críticas acerca do tema. Finalmente, é utilizado como técnica de pesquisa a documentação indireta, através de pesquisa documental e bibliográfica. 4. ESTUDO DE CASO: DEBATE EXISTENTE SOBRE A POSSIBILIDADE OU NÃO DE PRISÃO CIVIL DO MENOR EMANCIPADO DEVEDOR DE ALIMENTOS Trata-se da análise do embate existente entre o direito a alimentos e o princípio da integral proteção da criança e do adolescente. De acordo com o artigo 5º, I, do Código Civil Brasileiro: Cessará, para os menores, a incapacidade: I - pela concessão dos pais, ou de um deles na falta do outro, mediante instrumento público, independentemente de homologação judicial, oupor sentença do juiz, ouvido o tutor, se o menor tiver 16 (dezesseis) anos completos; II – pelo casamento; III – pelo exercício de emprego público efetivo; IV – pela colação de grau em curso de ensino superior; V – pelo estabelecimento civil ou comercial, ou pela existência de relação de emprego, desde que, em função deles, o menor com 16 (dezesseis) anos completos tenha economia própria. Pinto (2013) ressalta que “números do Ministério da Saúde informam que, de 1998 a 2005, mulheres até dezoito anos de idade foram responsáveis por 15,9% dos nascidos com vida no Brasil”. O artigo 1.696 do mesmo diploma legal estabelece que “o direito à prestação de alimentos é recíproco entre pais e filhos, e extensivo a todos os ascendentes, recaindo a obrigação nos mais próximos em grau, uns em falta dos outros”. Por outro lado, há em nosso ordenamento jurídico uma possibilidade de prisão na esfera civil, a qual ocorre quando há o descumprimento do pagamento de obrigação por alimentos, consoante disposto no artigo 5º, LXVII da Constituição Federal. A emancipação gera efeitos apenas na esfera civil. O não pagamento de obrigação alimentícia pode levar a prisão civil do devedor, entretanto sendo esta cumprida em estabelecimento penal. Nesse diapasão surge um embate relativo a (im)possibilidade de prisão civil à menor emancipado por não cumprimento de obrigação alimentícia. A primeira hipótese trazida pelo artigo 5º do Código Civil diz respeito a emancipação concedida pelos pais ou na falta de um deles pelo outro. É a chamada emancipação voluntária que é realizada mediante instrumento público. GONÇALVES (2010, p. 135) disserta que “a emancipação voluntária decorre de ato unilateral dos pais, reconhecendo ter seu filho maturidade necessária para reger sua pessoa e seus bens e não necessitar mais da proteção que o Estado oferece ao incapaz”. Breve observação deve ser feita quanto ao fato trazido pelo doutrinador de que, com a emancipação, o incapaz não mais necessitaria da proteção do Estado. De acordo com o que estabelece o Estatuto da Criança e do Adolescente em seu artigo 15 “a criança e o adolescente têm direito à liberdade, ao respeito e à dignidade como pessoas humanas em processo de desenvolvimento e como sujeitos de direitos civis, humanos e sociais garantidos na Constituição e nas leis”. Ademais, o artigo 3º do mesmo diploma legal preceitua que: A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se-lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade. Por proteção integral o doutrinador CARMELLO JUNIOR (2013 p. 14) assinala que “a doutrina da proteção integral se revela por uma positivação de direitos para estes sujeitos especiais, crianças e adolescentes, procurando abordar todos os contornos desta parcela da população”. PINTO (2013 p. 55) disserta que: A emancipação torna o menor capaz apenas para o exercício dos atos da vida civil. Dessa maneira, o menor emancipado não deixa de figurar no rol dos inimputáveis do Código Penal (art. 27), por isso, o menor não comete crime ou contravenção e sim, ato infracional previsto no ECA, em seus artigos 103 e 104. Adverte-se que o menor emancipado continua sob as regras protetivas referentes à sua idade. Assim, evidente é que mesmo emancipado o menor ainda encontra-se amparado pelo princípio da proteção integral, trazido pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, eis que pessoa em desenvolvimento físico, psicológico, moral e social. O Código Civil Brasileiro, no mesmo inciso I, do artigo 5º traz outra hipótese de emancipação que é a denominada emancipação judicial em que o menor encontra-se sob tutela e já possui 16 anos completos. A segunda hipótese de emancipação permitida em nosso ordenamento jurídico se dá pelo casamento. O casamento válido põe fim a incapacidade civil do adolescente, em decorrência da constituição de uma família. Se ocorrer a separação ou viuvez logo após o casamento, o menor não retornará a situação de incapaz, somente ocorrendo isto caso o casamento seja considerado nulo, eis que não produz nenhum efeito, retornando o emancipado a situação de incapaz, desde que não tenha contraído de boa-fé (GONÇALVES, 2010). A terceira possibilidade de emancipação trazida pelo nosso ordenamento jurídico é pelo exercício de emprego público efetivo. A referida hipótese encontrava-se no antigo Código Civil de 1916 em que a maioridade civil se dava com 21 anos de idade e foi mantido quando da alteração para o Código Civil de 2002, quando houve a redução da maioridade para 18 anos. Nos dias de hoje todos os concursos públicos exigem para a posse do cargo que o candidato tenha 18 anos completos, deixando defasado este dispositivo de lei. A quarta possibilidade de emancipação ocorre no caso de colação de grau em curso de ensino superior. A colação de grau em nível superior antes dos 18 anos de idade, dificilmente ocorrerá, com exceção dos denominados gênios que são submetidos a um procedimento especial perante o Ministério da Educação para avaliação dessa circunstância especial (GONÇALVES, 2010). A quinta e última hipótese de emancipação trazida pelo artigo 5º do Código Civil se dá pelo estabelecimento civil ou comercial, ou pela existência de relação de emprego, desde que, em função deles, o menor com 16 (dezesseis) anos completos tenha economia própria. Trata-se de uma inovação do Código Civil de 2002 no sentido de que admite a relação de emprego formal, não exigindo que o menor seja registrado como empregado, causa esta que poderia aumentar o número de pessoas emancipadas de maneira considerável (GONÇALVES, 2010). Apresentadas todas as formas de emancipação possível no ordenamento jurídico brasileiro, cabível é a análise destes dispositivos como forma de identificar seus efeitos na esfera civil. O enunciado 530, aprovado na VI Jornada de Direito Civil, do Conselho da Justiça Federal, estabelece que: A emancipação, em que pese assegurar a possibilidade de realizar pessoalmente os atos da vida civil por aqueles que não alcançaram a maioridade civil, não tem condão, isoladamente considerada, de afastar as normas especiais de caráter protetivo, notadamente o Estatuto da Criança e do Adolescente. O Estatuto da Criança e do Adolescente insere-se em um contexto personalista, garantindo tutela jurídica diferenciada em razão da vulnerabilidade decorrente do grau de discernimento incompleto. Assim, a antecipação da aquisição da capacidade de fato pelo adolescente não significa que ele tenha alcançado necessariamente o desenvolvimento para afastar as regras especiais. Nesse ínterim, percebe-se claramente que a emancipação traz efeitos limitados, eis que a cada legislação especial haverá regras diferenciadas, prevalecendo sempre o Estatuto da Criança e do Adolescente como forma protetiva, mesmo após a antecipação da capacidade civil plena. Exemplo disso se encontra no Código Brasileiro de Trânsito, tendo em vista que, mesmo emancipado, o menor não pode se habilitar para conduzir veículo automotor. Isso se dá pela aplicação do artigo 140, I, do Código Brasileiro de Trânsito, o qual disserta que o condutor deve ser penalmente imputável. Nos casos da emancipação só serão atingidos os efeitos civis, mantendo o menor ainda na condição de inimputável. De outrolado, a legislação previdenciária, conforme disserta PINTO (2013, p. 56) “traz expressamente como beneficiários do Regime Geral de Previdência Social (na figura de dependentes), os filhos e irmãos do segurado (entre outros) menores de vinte e um anos não emancipados”. Assim, “a emancipação os exclui do rol de beneficiários, mesmo tendo idade legal para tanto de acordo com o Código Reale”. No direito eleitoral o menor “mesmo emancipado, apenas possível a candidatura ao cargo de vereador ao se atingir a idade mínima de dezoito anos, mesma idade em que o voto torna-se obrigatório, de acordo com a Constituição Federal” (PINTO, 2013, p. 56). Já no direito militar, conforme estipula o artigo 73, da Lei 4.375/1964, a incapacidade para efeito do serviço militar cessa quando completados 17 anos de idade. Na dívida de alimentos, o alimentado é um ser altamente vulnerável e que se não houver um meio coercitivo como forma de obrigar um menor emancipado a pagar os alimentos, a injustiça ocorrida será suportada por um outro menor que tem mais necessidade de proteção social do que o próprio emancipado (GOULART, 2012). Assim, percebe-se que a pretensão alimentícia tem um peso maior do que a manutenção da liberdade do menor emancipado, eis que o primeiro encontra-se em situação mais vulnerável do que o segundo, dependendo aquele da exclusiva manutenção dada por este, como forma primordial de sobrevivência. Vencido tal ponto, necessária se faz a discussão da forma de cumprimento da prisão civil pelo menor emancipado. O Estatuto da Criança e do Adolescente veda, expressamente, em seu artigo 185, o cumprimento de medida imposto ao menor em estabelecimento prisional. Ainda nesse sentido, no mesmo diploma legal, o artigo 123, caput, estipula que “a internação deverá ser cumprida em entidade exclusiva para adolescentes, em local distinto daquele destinado ao abrigo, obedecida rigorosa separação por critérios de idade, compleição física e gravidade da infração”. Logo, presume-se que, caso haja a possibilidade de prisão civil ao menor emancipado devedor de alimentos, esta deverá ser feita em local específico para tal cumprimento, eis que o mesmo ainda encontra-se sobre a proteção das regras do Estatuto da Criança e do Adolescente. Nesse diapasão PINTO (2013, p. 114) traz uma possível solução para estes casos, constatando que: Em razão do incompleto desenvolvimento físico e psicológico dos menores e a improvável implantação pelo poder público de casas de albergado específicos (com as acomodações e acompanhamentos necessários para crianças e adolescentes) para menores emancipados devedores de alimentos, resta a prisão domiciliar (autorizada na jurisprudência para idosos e portadores de necessidades especiais, e quando da não existência de casas de albergado) como a mais adequada; deve o juiz autorizar a frequência à escola pelo emancipado, além de outras medidas que entender cabíveis, sempre levando em consideração o melhor interesse do menor. O adolescente não pode ser privado de seus direitos prioritários, colocando- os em lugares degradantes, juntamente com outros adultos, mesmo que por curto período. O adolescente deve ser colocado em unidade diferenciada, construída especialmente para adolescentes, conforme os critérios necessários ao processo sócio-educativo individual, como forma dos direitos dos adolescentes emancipados não ficarem sem a devida proteção legal (PASSOS, 2003). Caso seja colocado um adolescente devedor de alimentos em estabelecimento prisional, mesmo a prisão sendo por curto período, não haverá convergência entre o Estatuto da Criança e do Adolescente, o Código Civil e a Constituição Federal. O estabelecimento em que o menor emancipado for recolhido deve ter as garantias previstas no Estatuto da Criança e do Adolescente, conforme ocorre quando há a internação por medida sócio-educativa (GOULART, 2012). Deveria haver por parte do Estado um lugar adequado para receber estes menores. Entretanto, não há no Brasil estabelecimentos adequados para o recebimento de menores infratores, quem dirá serão construídas casas de albergados para receber os emancipados devedores de alimentos (PINTO, 2013). Nesse sentido, reitera PINTO (2013) que tendo em vista a condição peculiar do emancipado, eis que possui desenvolvimento físico e psicológico incompleto e os princípios que protegem os adolescentes, não deve ser aplicado o regime fechado, havendo somente a possibilidade de prisão domiciliar nestes casos como a mais apropriada. Ademais, prossegue o doutrinador afirmando que em caso de prisão civil “o juiz deve autorizar o emancipado a freqüentar escolas ou outros cursos (respeitando o seu direito à educação), além de outras medidas que entender cabíveis, sempre levando em consideração o melhor interesse do menor”. Em suma constata-se, a partir da análise dos dispositivos legais, entre eles a Constituição Federal, Estatuto da Criança e do Adolescente e Código Civil, assim como da doutrina, que é possível a prisão civil do menor emancipado por não cumprimento de obrigação alimentícia, como forma de coerção e de responsabilização pelos atos civis do adolescente, que teve sua capacidade civil antecipada pelos efeitos da emancipação. Outrossim, verifica-se que, para haver uma consonância entre o Estatuto da Criança e do Adolescente e o Código Civil, o regime prisional mais adequado ao presente caso deve ser a prisão domiciliar, a qual respeita os princípios protetivos do Estatuto da Criança e do Adolescente e não fere o direito a alimentos trazido pelo Código Civil e disposto até mesmo na Constituição Federal. Assim, tendo em vista a importância da prestação de alimentos para a manutenção e sobrevivência da criança torna-se possível a prisão civil do genitor menor de idade, nos casos em que este for emancipado, como forma de coerção para o cumprimento da obrigação alimentícia. Entretanto, deve ser adotado o regime prisional domiciliar como forma de garantir o respeito aos princípios do Estatuto da Criança e do Adolescente, que protege o menor mesmo após a emancipação. 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS No nosso ordenamento jurídico há apenas uma possibilidade de prisão civil, trazida pelo artigo 5º, inciso LXVII, da Constituição Federal, qual seja a do responsável pelo inadimplemento voluntário e inescusável de obrigação alimentícia. De outro lado, a emancipação torna o menor habilitado à prática de todos os atos da vida civil. Assim, foi aberta a discussão sobre a possibilidade ou não de prisão civil à menor emancipado por não cumprimento de obrigação alimentícia. Para a realização deste estudo foi feita a análise dos dispositivos legais pertinentes ao tema, tais como a Constituição Federal, Código Civil e Estatuto da Criança e do Adolescente, bem como de doutrinas, tendo em vista que a jurisprudência não possui ainda decisão sobre o assunto. Através do estudo da Constituição Federal e do Código Civil verificou-se que os pais têm o dever de sustento dos filhos, os quais contribuirão de acordo com a necessidade do alimentado e a proporcionalidade dos recursos do alimentante. Ademais, nos casos em que não há o pagamento da obrigação alimentícia e nem sua escusa, a medida da prisão civil não tem natureza punitiva, mas sim coercitiva, para que quando da decretação da prisão o genitor se sinta pressionado a fazer o devido pagamento. O cumprimento da pena de prisão civil é realizado em estabelecimento prisional penal, tendo em vista a falta de locais adequados. De outro lado, pela análise do Estatuto da Criança e do Adolescentepercebe- se o caráter protecionista deste, em razão de estarem em processo de desenvolvimento físico e psicológico e que mesmo sendo emancipados não perdem a condição de adolescentes perante a referida legislação. Com relação ao estudo da doutrina percebe-se que há uma posição majoritária por parte dos doutrinadores no que condiz a prevalência do direito da prole aos alimentos em cima da proteção integral a criança e do adolescente, tendo em vista a existência de um ser ainda mais vulnerável que o adolescente emancipado e que depende da exclusiva ajuda deste para sua sobrevivência. Assim, conclui-se com o presente trabalho, através da análise da legislação vigente e da doutrina, que há a possibilidade de prisão civil à menor emancipado por não cumprimento de obrigação alimentícia, tendo em vista a prevalência do direito a alimentos constantes na Constituição Federal e no Código Civil, sobre a liberdade do adolescente genitor. Entretanto, devem ser respeitados os princípios que constituem o Estatuto da Criança e do Adolescente, garantindo ao menor emancipado o adequado cumprimento da pena, tendo em vista sua peculiar condição de pessoa em desenvolvimento físico, psicológico e moral, sendo, assim, sugerido pelos doutrinadores o cumprimento da pena em caráter domiciliar. REFERENCIAS BRASIL. Código Brasileiro de Trânsito. 9. ed. Porto Alegre: Editora Verbo Jurídico, 2013. BRASIL. Código Civil Brasileiro. 9. ed. Porto Alegre: Editora Verbo Jurídico, 2013. BRASIL. Código de Processo Civil Brasileiro. 9. ed. Porto Alegre: Editora Verbo Jurídico, 2013. 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