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Terapia NuTricioNal No Trauma Sociedade Brasileira de Nutrição Parenteral Enteral - SBNPE Introdução O trauma é responsável por um percentual significante de in- ternações, cirurgias e ocupações de leitos nas UTIs, sendo que, nos primeiros quarenta anos de vida, aponta em primeiro lugar nas causas de mortalidade. Outro agravante a ser analisado é o alto índice de jovens envolvidos em acidentes, o que torna o trauma, além de um problema de saúde, um transtorno socioeco- nômico para o país. Em casos de trauma, a desnutrição se instala de forma rápida e progressiva. As conse quências dessas alterações são retrata- das constantemente em diversos estudos clínicos. Dentre essas conse quências, é possível destacar a maior morbidade, o tempo de hospitalização e a mortalidade em pacientes com associação de desnutrição e trauma. Nas últimas décadas, o conhecimento sobre a resposta or- gânica ao trauma evoluiu, porém, a terapia nutricional (TN) no paciente ainda possui um papel coadjuvante no tratamento, sendo que, por muitas vezes, é implementada com atraso ou de maneira inapropriada. Portanto, o objetivo desse fascículo é evidenciar a importân- cia da TN e preencher as possíveis lacunas em relação aos pro- cedimentos clínicos necessários para prevenção e tratamento das consequências supracitadas da associação do trauma com a desnutrição. SBNPE – Sociedade Brasileira de Nutrição Parenteral e Enteral DirEtoria SBNPE 2012/2013 DirEtoria EXECUtiVa Presidente: Odery Ramos Junior Vice-Presidente: Robson Freitas de Moura Primeiro Secretário: Jorge Carlos Machado Cury Segunda Secretária: Valéria Girard F. Alves Primeira tesoureira: Cristina Martins Segundo tesoureiro: Silvio Jose de Lucena Dantas Secretária Executiva: Angela Costa Comitê DE NUtriÇÃo Presidente: Maria Carolina Gonçalves Dias Comitê DE FarmáCia Presidente: Ana Maria da Silveira Seratiuk Comitê DE ENFErmaGEm Presidente: Cláudia Satiko Takemura Comitê DE FoNoaUDioLoGia Presidente: Fátima Lago Comitê Da CriaNÇa E Do aDoLESCENtE Presidente: Eneida Quadrio de Oliveira Veiga Comitê EDUCaCioNaL Presidente: Izaura Merola Faria Comitê DE DEFESa ProFiSSioNaL Presidente: José Aguilar Nascimento ProVa DE tÍtULo DE ESPECiaLiSta Presidente: Maria de Lourdes Teixeira de Freitas CoNSELHo CoNSULtiVo Presidente: Eduardo Eiras Moreira da Rocha CoNSELHo FiSCaL Presidente: Ricardo Onofre ComiSSÃo DE NormaS E PoNtUaÇÃo DE CUrSoS Presidente: Luciana Coppini ComiSSÃo DE iNFormátiCa Presidente: Flávio Alvin rEViSta BraSiLEira DE NUtriÇÃo CLÍNiCa Editor chefe: Joel Faintuch DEPartamENto JUrÍDiCo Peppe Bonavita Advogados Programa oficial de Educação médica Continuada da Sociedade Brasileira de Nutrição Parenteral Enteral (SBNPE) Evento científico à distância. Pontuado para o Certificado de Atualização Profissional (CAP) – exclusivo para médicos. Resolução CFM no 1.984/2012 institui o Certificado de Atualização Profis- sional (CAP) para os portadores dos títulos de especialista e certificados de áreas de atuação e cria a Comissão Nacional de Acreditação (CNA). Os profissionais que acertarem 70% da avaliação final deste fascículo acumularão crédito de 0,5 ponto para o CAP, já validado pela CNA. Pontuação para Concurso para obtenção do certificado de atuação na área de nutrição parenteral e enteral para: • Médicos • Nutricionistas • Enfermeiros • Farmacêuticos Web Avaliação na versão online no site da www.sbnpe.com.br. 2.0 pontos 2 Educação Continuada Multiprofissional - SBNPE Os objetivos da TN O principal objetivo da TN é evitar que o paciente com trauma perca massa magra e que se institua a provisão de calorias e nutrientes necessários ao funcionamento do organismo. Caso a desnutrição já exista, o objetivo da TN passa a ser de impedir que a desnutrição se agrave. Em outras palavras, tentar minimizar o catabolismo. Além deste principal objetivo, a TN também está en- carregada da imunomodulação, cujo papel no trauma pode ser dividido em duas etapas: • Minimizar a resposta pró-inflamatória – SIRS (syste- mic inflammatory response syndrome) e a resposta anti-inflamatória compensatória – CARS (compensa- tory anti-inflammatory response syndrome) • Permitir ao paciente um equilíbrio do ponto de vis- ta imunoinflamatório, ou seja, atingir o MARS (mixed anti-inflammatory-inflammatory response syndrome) com a menor repercussão sistêmica possível Esses objetivos buscam atenuar as consequências da associação do trauma com a desnutrição e acelerar a recuperação do paciente. A evolução do quadro clínico A fase inicial dura de um a três dias, dependendo do trauma, sendo que na maioria dos casos esta duração é de apenas um dia. Nessa fase, chamada ebb, o pacien- te mantém um gasto metabólico basal pouco alterado e, às vezes, até diminuído. Em seguida, na fase flow, o gasto eleva-se diretamente proporcional à intensidade do trauma. A evolução para desnutrição aguda por consequência de trauma grave é devida a: • Aumento de perda nitrogenada, o paciente perde massa magra rapidamente • Grande liberação de citocinas inflamatórias (TNF-alfa, IL-1, IL-6) • Queda da albumina e pré-albumina • Elevação das proteínas de fase aguda • Desenvolvimento de síndrome da resposta inflamató- ria sistêmica (SIRS) • Produção e liberação de citocinas anti-inflamatórias (IL-4, IL-8, IL-10) e imunodepressão • Além do possível aparecimento de infecções, distúr- bios respiratórios e dificuldade de cicatrização A desnutrição aguda A desnutrição aguda é uma consequência recorrente a pacientes saudáveis vítimas de trauma grave, pois o organismo tem pouco tempo para adaptar-se nesse novo quadro (na maioria dos casos os pacientes vítimas de trauma são pessoas saudáveis antes do ocorrido). Após o trauma grave, ocorrem adaptações metabó- licas dos constituintes neuroendócrino, inflamatório e celular como resposta orgânica do paciente. Essas adap- tações provocam profundas alterações no metabolismo glicídico e lipídico, aumentam o catabolismo e reduzem a quantidade de nitrogênio no organismo. O aumento da excreção urinária de nitrogênio em alguns pacientes pode atingir cifras entre 15 a 40g de nitrogênio ao dia (quatro a cinco vezes os valores basais). Caso esse hiper- catabolismo associe-se a uma infecção, a perda nitroge- nada pode chegar a 20-40g ao dia. O tratamento precoce As repercussões nutricionais no trauma estão direta- mente relacionadas à sua intensidade. O nível de gra- vidade global das lesões deve ser aferido já na triagem das vítimas, bem como a prioridade no atendimento. Esta classificação pode ser feita por muitos escores de avalia- ção, sendo que os mais utilizados são: • Glasgow (para trauma crânio-encefálico) • ISS (injury severity score) Terapia Nutricional no Trauma 3 Quadro 1. Comparativo entre estudos Estudos Dados Resultados Trabalhos randomizados que compararam, exclusivamente em pacientes com trauma, os efeitos e benefícios da administração precoce de nutrientes 40 horas após a internação Não foi observada vantagem metabólica e clínica na oferta precoce por via pós-pilórica em pacientes com escores de trauma grave (ISS > 25) Trabalhos randomizados que compararam, exclusivamente em pacientes com trauma, os efeitos e benefícios da administração precoce de nutrientes 6 ou 24 horas após o trauma ou recuperação do choque Os pacientes do grupo precoce com escores de trauma similares (ISS > 25) toleraram mais volume de TNE e apresentaram menor número de órgãos com falência Quadro 2. Especificidades da TN precoce em pacientes com trauma moderado e grave Pacientes Dados e características ResultadosPolitraumatizados 52 pacientes politraumatizados em ventilação mecânica foram estudados para receber nutrição por via gástrica imediata ou após 24 horas. Os pacientes com nutrição precoce apresentaram melhor tolerância, receberam volume maior da dieta e apresentaram menor ocorrência de pneumonia. Queimados Revisão sistemática avaliando cinco trabalhos. Pode-se dizer que a TNE precoce oferece mais benefícios ao reduzir complicações sépticas e risco de falência de múltiplos órgãos. Entretanto, a TNE precoce ou tardia não encontrou diferença em pacientes queimados quanto a tempo de internação, morbidade e mortalidade. Grandes queimados O paciente grande queimado apresenta um elevado aumento do gasto energético e perda nitrogenada. O retardo na oferta de nutrientes nesse grupo de pacientes relaciona-se com maior intolerância (gastroparesia) e piores resultados clínicos e metabólicos. Vários estudos comprovam que a TNE precoce em queimados é bem tolerada, reduz riscos de complicações e atenua o hipercatabolismo. TCE No paciente com trauma cranioencefálico (TCE), em que o gasto energético é alto, existe evidência sugerindo que a oferta de nutrientes após uma semana do trauma aumenta a mortalidade. Uma recente metanálise mostrou que há tendência a menor mortalidade com a oferta precoce de nutrientes no TCE. Politraumatizado, queimado e TCE Comparativo TN precoce assegura menor número de complicações infecciosas. • RTS (revised trauma score) • PATI (penetrating abdominal trauma index) • AIS (abbreviated injury score), entre outros. Nos casos de trauma moderado (ISS > 16 e ≤ 20) e grave (ISS > 20), a TN especializada, terapia nutricional parenteral (TNP) ou terapia nutricional enteral (TNE), está indicada precocemente (até 48 horas e de preferência nas primeiras 24 horas) desde que o paciente esteja hemodinamicamente estável. A manutenção da estabili- dade hemodinâmica por meio de drogas vasoativas não contraindica o início da TN, porém a dose deve ser menor e o paciente deve estar estável. Nos casos em que o paciente encontre-se hemodi- namicamente estável a TNE pode proteger a mucosa e evitar maior dano, pois aumenta o fluxo sanguíneo local (hiperemia pós-prandial). Entretanto, a TNE deve ser res- trita e conservadora (10-15 mL/hora) até que se atinja a estabilidade hemodinâmica. 4 Educação Continuada Multiprofissional - SBNPE Quadro 4. Relação entre as características gerais e as necessidades calóricas e proteicas Quantidade de calorias Entre 20 e 25 kcal/kg de peso corporal/dia atende as necessidades nutricionais da maioria dos pacientes críticos com trauma moderado a grave, nos primeiros dias, quando a SIRS é sobrepujante. Pacientes mais estáveis devem receber 25-30 kcal/kg/dia. Quantidade de proteínas Em torno de 1,2 a 2,0 g/kg de peso corporal por dia é considerada ideal para o paciente com trauma. Esse cálculo deve ser individualizado, considerando-se o peso corporal atual. Quanto maior o catabolismo proteico, marcado pela perda de nitrogênio ureico, maior será a necessidade proteica diária. Durante a fase anabólica Quando o paciente estiver mais estável do ponto de vista imuno-inflamatório, a quantidade de calorias pode atingir 25-30 kcal/kg de peso corporal/dia. Quadro 3. Cálculo das necessidades de calorias no atendimento inicial de acordo com a situação clínica Situação clínica Necessidades calóricas estimadas kcal/kg/dia Necessidade proteica estimada g/kg/dia Trauma moderado (ISS > 16 < 20) 25 1,2-1,5 Trauma grave (ISS > 20) 20-25 1,5-2,0 Trauma cranioencefálico grave (Glasgow < 8): Sem paralisia Com paralisia 30 25 1,2- 2,0 1,2- 2,0 Trauma raquimedular com paraplegia 20 a 22 1,2-1,5 Grande queimado 25 2,0 Necessidades calóricas e proteicas A triagem nutricional e avaliação nutricional são de suma importância para a boa evolução do quadro clíni- co, pois estas evidenciam os pacientes que estão des- nutridos ou em risco de desnutrição que necessitam de um fornecimento adequado de nutrientes e calorias (Quadro 3). O fornecimento de nutrientes e calorias pode ser es- timado pela equação de Harris-Benedict e a calorime- tria indireta, entretanto, a equação de Harris-Benedict possui algumas ressalvas. Esta equação foi publicada há aproximadamente 87 anos e foi desenvolvida para indivíduos saudáveis e, portanto, quando adicionada aos fatores de atividade e agressão, superestima peri- gosamente as necessidades do paciente catabólico. Pa- cientes catabólicos com glicemia maior que 110 mg/dL apresentam maior taxa de morbimortalidade. Nos Es- tados Unidos, a fórmula de Curreri, apesar das críticas, ainda é a mais usada para o cálculo das necessidades dos queimados. É importante destacar que a dieta só deve ser iniciada após a estabilização hemodinâmica, e os objetivos caló- ricos devem ser atingidos em torno de dois a três dias após o início da dieta para evitar piora do estado geral (Quadro 4). O objetivo da TN para o paciente de trauma deve ser a manutenção e não a repleção, para evitar a hiperalimen- tação (Quadros 5 e 6). Terapia Nutricional no Trauma 5 Quadro 5. Cuidados necessários na TN Pontos para observar Resultados Cuidado com o fornecimento excessivo de calorias (overfeeding) Resulta em aumento da taxa metabólica, aumento do consumo de oxigênio, hiperglicemia, excesso na produção de CO2, anormalidades hidroeletrolíticas, desidratação secundária à diurese osmótica, dependência de ventilação mecânica, imunossupressão, lipogênese e esteatose hepática. TNP sem lipídeos em pacientes críticos Estudo reportou melhores resultados clínico (taxa de infecção e dias de internação) em pacientes críticos que receberam TNP sem lipídeos. Novas soluções de lipídios com óleo de peixe (ômega-3) podem modular melhor o estado imunológico e modificar essa conduta. Dietas hipocalóricas Evitar o fornecimento de dietas hipocalóricas. A hipoalimentação contribui para maior deterioração das reservas proteicas e lipídicas, piorando o estado nutricional. Perda excessiva de proteínas como na sepse, no grande queimado e no TCE A medida do nitrogênio urinário em 24 horas para cálculo das perdas nitrogenadas é um parâmetro muito importante para avaliar o grau de catabolismo presente. Quantidade de carboidratos A quantidade de carboidratos não deve ultrapassar 3 a 4 g/kg/dia (40 a 55% do valor energético total). A infusão de glicose acima de 5 mg/kg/minuto (VIG: velocidade de incorporação da glicose) é prejudicial, com aumento do CO2, dificultando o desmame da ventilação mecânica. Os lipídios variam na quantidade de 25 a 30% das calorias calculadas ou não mais que 1,0 g/kg de peso corporal/dia. Fase aguda pós-trauma No primeiro ou segundo dia, recomenda-se não utilizar lipídios na TNP, para não aumentar a suscetibilidade à infecção. A maioria das soluções lipídicas em uso na TNP usa triglicérides de cadeia longa (ômega-6), que tem metabolismo via ácido araquidônico, com formação de mediadores inflamatórios. Quadro 6. Características específicas Trauma Características específicas TCE O paciente apresenta aumento do gasto energético, chegando às vezes até a dobrá-lo. Trauma medular O paciente apresenta tipicamente queda do gasto energético. Pacientes com tetraplegia apresentam gasto energético 20-40% abaixo do basal e devem receber entre 20-22 kcal/ dia. Acima disto, pode se incorrer em “hiperalimentação”. Pacientes queimados Por apresentar gasto energético elevado, são beneficiados com TNE precoce Os pacientes obesos críticos A quantidade de calorias deve ser entre 20 a 22 kcal/kg de peso ajustado/dia. [Peso corporal ajustado = (peso atual – peso ideal) x 0,25 + peso ideal] Pacientes com insuficiência respiratória aguda (síndrome da angústia respiratóriado adulto) O excesso na administração de carboidratos (> 5,0 mg/kg/minuto ou > 4,0 g/kg/dia) aumenta a produção de CO2, contribuindo para maior tempo de dependência de ventilação mecânica (D). Para esses pacientes, a prescrição de dieta contendo ácidos graxos ômega-3 e ácido gama-linolênico traz benefícios, diminuindo tempo de ventilação mecânica e de internação, além da incidência de falência de múltiplos órgãos 6 Educação Continuada Multiprofissional - SBNPE Quadro 7. Estudos Características do estudo Resultados Pacientes submetidos a laparotomia por trauma abdominal Verificou-se incidência menor de complicações sépticas naqueles que receberam TNE (3%) em relação aos que foram tratados com TNP (20%) Pacientes com trauma abdominal aberto ou fechado Verificou-se que os pacientes que receberam TNE apresentaram menos pneumonia, sepse intra-abdominal e infecção em cateteres venosos Em estudo prospectivo e randomizado, comparando TNE e TNP em metanálises Confirmaram-se melhores resultados em pacientes que receberam nutrientes por via enteral que por parenteral. Esses resultados foram mais evidentes no subgrupo de pacientes com trauma abdominal grave Pacientes queimados ou com TCE Nestes casos a TNE é preferencialmente indicada Apesar dos resultados mais contundentes, quando a TNE não pode ser indicada ou o quadro clínico não evolui adequadamente, a TNP isolada ou associada está indicada. Pacientes impedidos de receber TNE ou que por volta do terceiro ou quarto dia não tenham atingido 50% das necessidades calculadas devem re- ceber TNP associada. A TNE não deve ser administrada no paciente trauma- tizado com instabilidade hemodinâmica devido ao risco de necrose intestinal não oclusiva. O acesso ao tubo digestivo para fins nutricionais pela inserção de sonda nasoentérica, por jejunostomia ou gastrostomia, deve ser considerado durante a laparotomia por trauma ab- dominal grave. Durante a laparotomia é o momento ideal para a inserção de sonda enteral duodenal ou jejunal e, em muitas ocasiões, realizar jejunostomia visando facili- tar a oferta precoce de nutrientes. Isso pode ser decisivo no prognóstico. TNE no trauma A melhor via de acesso para infusão de dietas en- terais, em pacientes traumatizados, permanece contro- versa, porém, pela facilidade de colocação da sonda na posição gástrica, esta deve ser escolhida preferencial- mente, pois a precocidade da TNE é mais importante. Entretanto, em metanálise envolvendo pacientes críti- cos, incluindo traumatizados, não foram encontradas di- ferenças entre posicionamento gástrico ou pós-pilórico em relação a dias de hospitalização, incidência de pneu- monia e mortalidade (Quadro 8). Via nutricional para o paciente com trauma grave A TN pode ser implementada com o uso de TNP, TNE ou pela associação de TNP e TNE. Em casos seleciona- dos, a TN oral pode ser indicada. Dentro do paradigma da evidência, estudos randomizados controlados de- monstram que a oferta de nutrientes no tubo digestivo associa-se a menor morbidade infecciosa e tempo de internação (Quadro 7). Terapia Nutricional no Trauma 7 Quadro 8. Vias de acesso na TNE Gástrica Pós-pilórica Proporciona uma via mais fisiológica, possibilita a ação das enzimas gástricas e pancreáticas necessárias para a digestão de macronutrientes e, principalmente, apresenta maior facilidade de instalação e tolerância. Em casos de gastroparesia, pacientes com refluxo gastroesofagico com grande risco de aspiração e em uso de catecolaminas para manter níveis pressóricos (diminuem o esvaziamento gástrico) são os mais beneficiados com a via pós-pilórica. Além do fornecimento de calorias e proteínas no estômago ser mais rápido, o estômago acondiciona volume maior e pode tolerar dietas mais complexas e hiperosmolares. A inserção pós-pilórica, entretanto, não é fácil e, às vezes, necessita-se de endoscopia ou da fluoroscopia para conseguir êxito. Em queimados com estabilidade hemodinâmica, o acesso gástrico e TNE precoce diminuem a probabilidade de gastroparesia. No caso do paciente precisar de laparotomia, a colocação intraoperatória da sonda nasoentérica no jejuno permite nutrição mais precoce, pois o intestino delgado tem período de íleo menor que o estômago. No posicionamento gástrico, a saída acidental da sonda é mais frequente e há maior probabilidade de refluxo gastroesofágico e talvez, risco de broncoaspiração. Indicação de imunonutrientes, probió ticos e simbióticos A adição de nutrientes específicos na nutrição enteral ou parenteral com propriedades para melhorar a respos- ta imunológica do paciente é chamada de Imunonutrição. Quadro 9. Imunonutrição – Avaliação de estudos Imunonutrientes beneficiam o paciente vítima de trauma moderado e grave, e devem ser prescritos precocemente na TN. Estudo randomizado observou menor número de infecções (6% vs. 41%, p = 0,02) em grupo bastante homogêneo de pacientes com trauma grave (ISS > 21) que receberam precocemente dieta isocalórica e isonitrogenada com a adição de arginina, glutamina, nucleotídeos e ácidos graxos ômega-3. Estudos randomizados relatam melhores resultados com imunonutrientes no trauma. Em consonância, várias metanálises também têm demonstrado vantagens do uso de imunonutrientes. A análise de 12 trabalhos e 1.557 pacientes verificou menor taxa de infecção (risco relativo = 0,67, IC 95% = 0,50-0,89; p = 0,006), menor tempo de ventilação mecânica (2,6 dias, IC 95% = 0,1-5,1; p = 0,04), e tempo de internação (2,9 dias, IC 95% = 1,4-4,4; p = 0,002) com uso de imunonutrientes. A análise de 22 trabalhos randomizados, envolvendo uma população de 2.419 pacientes com diferentes diagnósticos, não observou modificação da mortalidade, porém houve diminuição de complicações infecciosas (066; IC 95%, 0,54-0,80). Apesar de resultados positivos, os estudos sobre imuno- nutrição possuem algumas ressalvas: heterogeneidade entre pacientes, composição e quantidade dos imunonu- trientes, início da terapia e via (enteral e parenteral) (Qua- dros 9 e 10). 8 Educação Continuada Multiprofissional - SBNPE Quadro 10. Imunonutrientes mais utilizados isoladamente ou em associação são glutamina, arginina, ácidos graxos ômega-3 e os nucleotídeos Imunonutrientes Paciente TN Glutamina A glutamina é o principal nutriente para o enterócito e células do sistema imunológico. A glutamina deve ser considerada em queimados e pacientes com politrauma. Foi demonstrado em sete estudos randomizados que a glutamina intravenosa diminuiu em 31% o risco de mortalidade (p < 0,01). A associação de glutamina e probióticos pode reduzir o número de infecções, tempo de ventilação mecânica e internação em pacientes com TCE. O uso precoce de glutamina enteral (0,5 g/kg/dia) durante a ressuscitação de pacientes com trauma grave diminuiu a distensão abdominal e intolerância à TNE. O uso de glutamina por via parenteral esteve associado a melhores resultados, incluindo mortalidade e morbidade infecciosa quando comparada à via enteral. Sua adição à TN visa melhorar a imunidade e a barreira mucosa do intestino para evitar translocação bacteriana. Em estudo multicêntrico envolvendo população heterogênea de pacientes críticos (maioria com politraumatismo) verificou-se que a L-alanil-L-glutamina (na NPT) reduziu a morbidade infecciosa. Arginina A arginina é substrato para síntese proteica e produz, quando metabolizada, diversos componentes bioativos, como o óxido nítrico, poliaminas e ornitina. O óxido nítrico é importante modulador do tônus vascular, da inflamação, da função imunológica e da neurotransmissão. Sua ação durante a sepse tem sido interpretada por alguns como danosa e, por outros,como benéfica ao organismo. Entretanto, a evidência mostra que a arginina melhora a cicatrização em pacientes cirúrgicos. Estudos realizados demonstraram que, no trauma, o metabolismo da arginina é preferencialmente para a formação de poliaminas via arginase. As fórmulas suplementadas com arginina, com ou sem glutamina ou ômega-3, não parecem oferecer vantagens sobre as fórmulas entéricas padrão, no paciente crítico com trauma ou queimado. Estudos randomizados apontam que o uso isolado de arginina ou de dietas imunomoduladoras contendo arginina beneficiam o paciente traumatizado. Ácidos graxos ômega-3 Os ácidos graxos ômega-3 têm marcante ação anti-inflamatória, notadamente por diminuir a formação de mediadores da inflamação derivados do ácido araquidônico. Esse efeito é importante em pacientes com trauma, pois pode diminuir a incidência de SARA e de falência de múltiplos órgãos. As fórmulas enriquecidas com ácido graxo ômega-3 produzem boa resposta em pacientes críticos, especialmente com SIRS e sepse. O uso em TNP mostrou diminuição no tempo de internação e tendência a diminuir a mortalidade em estudo em pacientes críticos (15% com trauma), multicêntrico, prospectivo e não randomizado. Terapia Nutricional no Trauma 9 Quadro 11. Utilização de prébióticos, probióticos e simbióticos em três estudos randomizados realizados em traumatizados Estudo Resultado Bactérias como Lactobacillus e Bifidumbacterium na forma de probióticos, ou em combinação com prebióticos (simbióticos). Bactérias como Lactobacillus e Bifidumbacterium na forma de probióticos, ou em combinação com prebióticos (simbióticos), podem ajudar na manutenção da barreira mucosa e da modulação da resposta imunológica sistêmica. Foi relacionado com diminuição significativa em infecções, sepse, dias em ventilação mecânica invasiva e dias na UTI. Estudo prospectivo randomizado com 113 pacientes em ventilação mecânica e TN enteral comparando o uso de simbióticos com glutamina, fibra fermentável e peptídeos em pacientes com trauma múltiplo. Pacientes que receberam simbióticos apresentaram menor taxa de infecção e significativa diminuição da permeabilidade intestinal. Estudo utilizando combinação de probiótico e glutamina em TCE. Verificou-se diminuição das taxas de infecção, da necessidade de ventilação mecânica e do tempo de internação na UTI. Probióticos, prebióticos e simbióticos Apesar de existirem evidências de que o uso de pro- bióticos ou de simbióticos podem beneficiar pacientes com trauma, os estudos existentes utilizaram cepas diferentes, quantidade variada e dose não padroniza- da. Portanto, a recomendação do uso de probióticos no trauma necessita de melhor sistematização terapêutica (Quadro 11). Há evidências de que o uso de probióticos ou de sim- bióticos beneficia pacientes com trauma, porém há ne- cessidade de uma sistematização terapêutica. Referência Nascimento JEA, Campos AC, Borges A, Correia MITD, Tavares GM. Terapia Nutricional no Trauma. In: Sociedade Brasileira de Nutrição Parenteral e Enteral; Associação Brasileira de Nutrologia. Projeto diretrizes. Associação Médica Brasileira; Conselho Federal de Medicina Volume IX. Brasília: 2011. p. 375-391. Realização e Copyright© 2012 SCIO Conteúdo Colaborativo Ltda. E-mail para contato: marcia@sciocolab.com.br; renato@sciocolab.com.br A SCIO Conteúdo Colaborativo Ltda. não assume nenhuma responsabilidade por qualquer injúria e/ou danos a pessoas ou bens como questões de responsabilidade civil do fabricante do produto, de negligência ou de outros motivos, ou por qualquer uso ou exploração de métodos, produtos, instruções ou ideias contidas no material incluso. Devido ao rápido avanço no campo das ciências médicas, em especial, uma verificação independente dos diagnósticos e dosagens de drogas deve ser realizada. matEriaL DE DiStriBUiÇÃo EXCLUSiVa aoS ProFiSSioNaiS Da SaúDE VoLtaDoS à NUtriÇÃo ParENtEraL E ENtEraL. Esta publicação conta com apoio da Support Advanced Medical Nutrition, empresa do grupo Danone para editoração e distribuição. revisão Científica: Dra. Izaura Merola Faria 10 Educação Continuada Multiprofissional - SBNPE Questionário para avaliação no site: www.sbnpe.com.br. Cadastre-se! Questão 1. Avalie as afirmações abaixo. Qual TN inicial é indicada no trauma? 1. A TNP é a mais indicada para todos os tipos de trauma. 2. A TN não é indicada nos casos de TCE. 3. Nos casos de trauma moderado (ISS > 16 e ≤ 20) e grave (ISS > 20), a TN especializada, terapia nutricional parenteral (TNP) ou terapia nutricional enteral (TNE), está indicada precocemente (até 48 horas e de pre- ferência nas primeiras 24 horas) desde que o paciente esteja hemodinamicamente estável. a) Todas as afirmações são verdadeiras. b) Apenas a terceira afirmação é verdadeira. c) Apenas a segunda e a terceira afirmações são verdadeiras. d) Apenas a primeira e a terceira afirmações são verdadeiras. e) Nenhuma afirmação é verdadeira. Questão 2. O objetivo da TN para o paciente crítico é: a) Uma associação de Manutenção e Repleção. b) Apenas manter a estabilidade hemodinâmica do paciente. c) Manutenção, pois a repleção pode causar hiperali- mentação. d) Nenhuma afirmação é verdadeira. e) Repleção para evitar a hiperalimentação. Questão 3. Em relação a escolha entre a TNP e TNE é possível afirmar: 1. A TNE não deve ser administrada no paciente trauma- tizado com instabilidade hemodinâmica. 2. A melhor escolha de tratamento é sempre uma asso- ciação entre TNE e TNP. 3. A TNE só deve ser administrada após o terceiro ou quarto dia de tratamento caso a TNP não evidencie melhoras no quadro clínico. a) Todas as afirmações são verdadeiras. b) Apenas as afirmações 2 e 3 são verdadeiras. c) Apenas a afirmação 3 é verdadeira. d) Apenas as afirmações 1 e 2 são verdadeiras. e) Apenas a afirmação 1 é verdadeira. Questão 4. Avalie as afirmações abaixo: 1. A triagem nutricional e avaliação nutricional são de suma importância para a adequada evolução do quadro clínico. 2. A fórmula de Curreri, apesar das críticas, ainda é a mais usada para o cálculo das necessidades calóricas nos casos de TCE. 3. É importante destacar que a dieta só deve ser iniciada em torno de dois a três dias após o trauma. 4. Entre 20 e 25 kcal/kg de peso corporal/dia preenche as necessidades nutricionais da maioria dos pacientes críticos com trauma moderado a grave. a) Todas as afirmações são verdadeiras. b) Apenas as afirmações 1 e 3 são verdadeiras. c) Nenhuma afirmação é verdadeira. d) Apenas as afirmações 1 e 4 são verdadeiras. e) Apenas as afirmações 2 e 4 são verdadeiras. Questão 5. Avalie as questões abaixo: 1. Nos casos de TNE a via pós-pilórica é sempre a mais indicada. 2. A prescrição de imunonutrientes nunca está indicada na TN. 3. A utilização de probióticos, prebióticos e simbióticos é indicada, pois, apesar do aumento da taxa de infec- ções, diminui consideravelmente as taxas de morbi- dade, hospitalização e mortalidade nos pacientes com desnutrição aguda. a) Todas as afirmações são verdadeiras. b) Apenas as afirmações 2 e 3 são verdadeiras. c) Nenhuma afirmação é verdadeira. d) Apenas a terceira afirmação é verdadeira. e) Apenas a primeira afirmação é verdadeira. Terapia Nutricional no Trauma 11 injúria Trauma moderado (ISS > 16 e 20) e Trauma grave (ISS > 20) Associação de TNP e TNE Desnutrição (rápida e progressiva): maior morbidade, tempo de hospitalização e mortalidade. Objetivo: evitar perda de massa magra (diminuindo o catabolismo) e continuidade no fornecimento de calorias necessárias para o organismo. Escolha da via: gástrica e pós-pilórica Objetivo da TN na desnutrição avançadaé impedir que a desnutrição se agrave. Imunomodulação: minimizar a resposta pró-inflamatória (SIRS) e a resposta anti-inflamatória compensatória (CARS). Permitir ao paciente um equilíbrio do ponto de vista imunoinflamatório (MARS). Resposta orgânica: alterações metabólicas (constituintes neuroendócrino, inflamatório e celular, aumenta o catabolismo e depletam o organismo de nitrogênio. TN precoce Apesar dos resultados mais contundentes, quando a TNE não pode ser indicada ou o quadro clínico não evolui adequadamente, a TNP isolada ou associada está indicada. Pacientes impedidos de receber TNE ou que por volta do 3o ou 4o dia não tenham atingido 50% das necessidades calculadas devem receber TNP associada. Avaliar a prescrição de imunonutrientes, probióticos e simbióticos. Avaliação nutricional para determinar as calorias necessárias no tratamento de acordo com o paciente e tipo de trauma. TNETNP Protison advanced Dieta hiperproteica para pacientes críticos em UTI Alto estresse metabólico SIRS Sepse Trauma Grave a Moderado Insufi ciência Renal Aguda em diálise Oncologia (estresse grave) Indicações: Dieta polimérica com alto aporte proteico e baixa osmolaridade www.supportnet.com.br Esta publicação conta com o apoio da Support Advanced Medical Nutrition, empresa do grupo Danone para editoração e distribuição. Material de distribuição exclusiva aos profi ssionais da saúde voltados à nutrição parenteral e enteral. NUTRISON ADVANCED PROTISON NÃO CONTÉM GLÚTEN
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