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o Princípio Regulador no Culto • • • • • Paulo Anglada fiES O PRINCÍPIO REGULADOR NO CULTO Paulo Anglada 1 Permitam-me iniciar esre escudo com algumas pergunras. O que pensariam os irmãos se durante um culro evangélico o pasror fizesse o sinal da cruz, queimasse incensos para que o ambiente ficasse perfumado, e lavasse os pés de alguns irmãos como demonstração de humildade? O que pensariam, se fossem convidados a abstere.m-se de comer carne na semana chamada "a sem:ana sanca", se apenas o pão (melhor, bósria) fosse distribuído por ocasião da Ceia do Senhor, e lhes fosse requerido que se ajoelhassem para poderem participar dela? Com razão os irmãos condenariam estas atitudes. Por quê? Porque não são bíblicas. As Ei;cricuras não nos ensinam a fazer o sinal da cruz, a queimar incenso (no culto da nova aliança), jamais instituíram a atitude humilde de Jesus como cerimônia eclesiástica, não requerem nenhuma abstenção de alimentos no Novo Testamento (muito menos na "semana 1 Escudo proferido pelo autor no congresso, Os Puritanos, cm junho de 1997, em Águas de Lind6ia. Texto básico, João 4:19-24. (Titulo original; O Prmcipio R~g11/ador do Culto Refennado) santa"; que por sinal jamais foi instituída como cerimônia r eligiosa), não requerem que fiquemos de joelhos ao participar da Ceia do Senhor, etc. Tudo isso não passa de cradicio- nalismo católico-romano, de símbolos, gestos, cerimônias, e práticas eclesiásticas invencadas pelo homem, sem real fundamentação bíblica. Mas deixem-me ir um pouco mais adiante. Eu tenho um filho de 12 anos na escola mantida po r nossa ig reja. Uma das professoras (evangélica, de outra denominação), perguntou a um dos poucos alunos. católico-romanos da sala, por que -eles (católicos) celebr avam Corpus Cristi. A criança retrucou com outra pergunta: por que vocês, evangélicos, comemoram o natal e a páscoa? (Ao relatar o episódio, o meu fi lho fez uma careta, como quem diz: e agora?) E agora, caros ouvin t es? Creio que precisamos cons iderar seria mente esta pergunta, e a questão geral q ue ela envolve, se desejarmos ser coerentes. O ASSUNTO O assun to deste escudo,cn tão, está relacionado ao cul to. Diz respe ito, mais especificamente, a questão da forma do culto público, ao modo como Deus deve ser adorado. Não se trata de um estudo exegético, e sim, de um ensaio sobre ecologia prática. Meu objetivo aqui não é interpretar e sistematizar a revelação 2 bíblica r efer ente ao assunto,2 mas s im, descrever a concepção reformado-puritana do princípio que deve regular a forma do culto público a Deus. Não ignoro a natureza controvertida do assun1Co. Também não entrarei em detalhes com relação à ap licação do princípio regulador do culto às diversas práticas eclesiásticas envolvidas. Conrudo, creio que a descaracterização litú rgica de considerável parcela do movimento evangélico moderno, inclusive no Brasil, exige que a questão seja considerada, e justifica uma exposição da posição puritana hist6rica quanto a questão. Natureza Espiritual do Culto Admito p le n a mente, de iníc io, a importância da atitude do adorador, do espírito do adorador no culto público.3 É impossível ler as Escrituras, sem perceber que não se pode dissociar o ato de culto da vida do adorador. Em um dos textos mais iluminadores do Novo Testamento sobre o assunto, Jesus afirma, 1 Jfl tive 11 oponunid3dc de f:nicr i$SO cm outro lugar: P:iulo Angl2da, O Cul10 Reformado (Estudo não publicado, BclEm, PA: Igreja Presbiteriana O:nlnl do Pani, 1996). Nos capftulos sobre O Cul10 no Velho Tes1am:en10 cO Cul10 no NO'IJO Tts1ame1110. 1 Geralmente, ao se dcmonsU"llr a importância da forma do c:ulto, não E incomum a objcçio observada por G rcg L.. Pricc, Fouru/JJ1io11/ur Reformo1io11; The Regr1loriw Principie o/ ll'fmhip (Edmonton, Can11da: Silll Watc:rs Reviva! Books, l 99S), p.10, de que isto dcmonsU'll um interesse :apenas nos aspectos externos do culto, e nno com os seus aspectos internos, relacionados com o coraçlio. 3 dirigindo-se à mulher samaritana, que "Deus é Espírito, e imporca que os que o adoram o adorem cm espírito ... " a oão 4: 19-24 ). o cermo en1 espírito, no Novo Testamento, conrrasta com o tennona carne, e denota a natureza espiritual do culto, cm conrraste com a mera aparência exterior. Aponta para o coração, para a natureza íntima do homem. O culto pressupõe, portanto, da parte do adorador, umn transformação espiritual, um coração convertido pelo Espírito de Deus. Por diversas vezes Jesus condena a a ri rude h ipócri ca dos fariseus que enfatizavam a observância de formas e ritos religiosos C:\.<:ernos, mas que únham o coração impuro, pecaminoso, mais preocupado com a aparência externa do que com a sinceridade e pureza dos seus corações e mocivaçõcs. Importância do Modo de Culto Mas Jesus não pára aí. Ele r cssa1La, igualmente, a importância da forma de culto, da maneira correta de cultuar a Deus. Ele afirma também, que aqueles que O adoram, devem fazê-lo en1 verdade: "Deus é Espírito, e importa que os que o adoram o adorem em espírito e e111 verdade". Observando o contexto, pode-se perceber que Jesus está Se referindo ao modo de culto, revelado ao Seu povo na Sua Palavra. O termo e111 verdade denota conformação à verdade revelada de .Deus. Denota submissão à Sua Palavra. AponLa 4 portarno, especialmente, para a conformação às formas externas de culto prescritas por Deus na Sua Palavra. Os judeus adoravam Aquele que conheciam, porque a eles haviam sido confiados os oráculos de Deus (Romanos 3:22). Afinal, a salvação vem dos judeus Goão 4:22)- embora à maioria deles fal casse sinceridade, e mesmo que a forma houvesse sido bastante corrompida com acréscimos e negligências. Os samaritanos, entretanto, não cinbam a forma, o modo: "vós adorais o que não conheceis". A referência é à adoração sincretista, deturpada dos samaritanos, que manifestava ignorância da vontade revelada de Deus com relação ao culto. Lendo-se com atenção as Escriruras, pode- -se observar que ranto o Velho Testamento como o Novo, atribuem grande importância à maneira de se cultuar a Deus, a forma externa de culto público. RELEVÂNCIA DO ASSUNTO A forma de culto é, sem dúvida, um assunto da maior relevância. Duas questões for am de suma importância na Reforn1a Protestante do século XVI: o culto e a doutrina ' da salvação (e nesta ordem). E nesta ordem que Calvino apresenta os dois principais males da época, como ele mesmo afirma num tratado 5 sobre a necessidade de reforma na Igreja; escrito em 1543: ... primeiro, o modo como Deus ~ cultuado devid3memc; e, segundo, a fon te da qual a salvação pode ser obtida. Quando se perde de vista estas cou:is, embora possamos DOS gtonar DO nome de cristãos, noss:i profissão de í~ ~ vazia e vã.5 Tem-se reconhecido que durante os primeiros anos da Reforma Protestante em Genebra, "o foco de atenção não foi a questão da justificação, e sim a questão da missa e das imagens, e todos os abusos relacionados a ela".4 De fato, o foco principal dos reformadores, cais como Zwinglio, Bullinger (sucesso r de Zwínglio em Zurique), Bucer(em Srrasburgo), Farel e Calvino foi a purificação do culto das superstições e idolatria medievais.7 Ilustrando a importância do c ul to n a co ncepção r~formada, Iain Murray' reconhece que: A questão do culto ~teve no centro d3 revolução esptrnual e n:icional que marcou a Reforma do século XVI. Mãn:ires escoceses foram para a escaca por se recusarem a obedecer à forma de culto imposra pela igreja católica romana. Pela mesma • TMN=11yof~farmingw Chinrh(Prote1tan1 Hcritagc Press, 1995). 1 lo!cio do primeiro C3pítulo: TlrL Evils IVJrithO!mpdkd U1 to Su/t; ~mtdw. • Carlos M. N. Ein; War Againsr '"'}dois (Citado por TCrTy John$0n, "lntroduction to Warslup", Premiu, 3:1 {1996). 'Tcrry John$0n, lbul. ' "Thc D1rcçtory (or Publk \'V°orship", fumuc, 3; 1 (1996). 6 • raziio, cerca de 288 homens e mulheres foram queimados vivos na lnglaterrncntreosanos de 1555 e 1558. Depois, quando a doutrina protesutnte cornou-sc ofici3.lmentc csaabclccid:l na Inglaterra e na Escócui cm 1560, um conflito continuou nos dois países para purificar o culto público das praticas e cerimônias pré-reformadas. Ministros cvangaicos foram silenciados, banidos e mesmo executados por protestarem contra corrupções no culto. A emigrnção dos Pais Peregrinos e dos Puritanos para a Nov3 Inglaterra esrnva csscncialmeo1c ligada à mesma questão. "O principal propósito desta nova plantação", escreveu Couon .Mather, "era eslllbelccer e desfrutar das ordcnaoças do evangelho e culrunr o Senhor Jesus Crisco de acordo com Suas próprias instiruiçõcs." Matthew Henry resumiu bem a importância do culto na fé reformado-puritana, quando escreveu: "Religião é toda a razão da nossa vida, e o culto a Deus a razão da nossa religião".9 A importância que os reformadores e puritanos atribuíam ao culto (e à sua forma) se manifesta mais claramente quando consideramos: Os Exemplos Históricos das Religiões A história das religiões demonstra que quando o próprio homem se arroga o direito de conceber formas de adoração a Deus, os maiores absurdos podem acontecer. Prostitutas 'Cirndo por lnin Murrny, "Thc Dircc1ory for Public \Vorship", Prtmist, 3: 1 (1996). 7 cultuais, l1.1xúria, sacrifícios humanos, auto- -flagelação, adoração da própria natureza, culto a demônios e a espíritos imundos, são alguns exemplos. A igreja católica romana não foge à regra. Uma infinidade de crenças e práticas litúrgicas foram incorporadas a ela no decorrer dos séculos. A Reforma Protestante ocorreu numa igreja repleta de adições espúrias ao culto: missas pelos morros (missa do sétimo dia), a própria missa (um sacrifício não cruento), confessionário, sete sacramentos, celibato, indulgências, penitências, rezar terços, sinal da cruz, uso do latim na missa, imagens, rosários, crucifixos, representações, relíquias, pere- grinações, procissões, velas, vestes sacras, músicas sacras, livros de oração, dias santos, etc. A Diversidade de Novos Elementos nos Cultos Evangélicos Modernos Esta é, sem dúvida, a principal razão, a razão imediata, que me levou a considerar o assunto: as práticas de culto do movimento evangélico moderno. Uma parafernália litúrgica tem sido introduzida no culto evangélico no últim·o século: orações em conjunto (em voz alta), grupos de oração no mesmo culto. Na área da música: rodo tipo de instrumento, ritmo e. linguagem, corais, conjuntos, bandas, solos, duetos, quartetos, cânticos responsivos (homens/mulheres; uma 8 fila/outra), dirigentes, regc.;1lles e ministros de música, palmas etc. Há também testemunhos pessoais; recitações de poemas e versos por adultos e crian ças, palmas para Jesus, cumprimentos no culto (às pessoas ao lado), apelos, danças, línguas, cântico em línguas, curas, emprego de luzes coloridas, cultos jovens, cultos apenas musicados, represen- tações teatrais, gargalhadas sagradas, quedas, urros, etc. Num artigo publicado recentemente em Os Purica11os,John MacArthur faz referência à uma igreja no sudoeste dos Estado Unidos que "instalou um sistema de efeitos especiais de um milhão de dólares que pode produzir fumaça, fogos, faíscas e feixes de raio lazer no auditório ... " Nessa igreja "o pastor terminou um culto sendo elevado ao "céu" por meio de fios invisíveis, enquanto um coral e uma orquestra faz.iam o acompanhamento à fumaça, fogo e n eve". 10 O Contraste com o Culto Simples Reformado e Puritano Os reformadores aboliram toda a parafernália do culto católico-romano, e os puritanos fizeram o mesmo com relação ao culto anglicano. Ambos instituíram uma forma de culto extremamente simples, colocando de 'º"Verdade vs. Técnica", Os Pruitanos, IV:S (1996), pp. 12-16. 9 lado toda a pompa, esplendor, vestes, adereços, procissões, cerimônias, livros de oração, representações, símbolos, gestos, etc.11 O culto refor1nado e puritano consistia simplesmente de leitura bíblica, pregação, oração, cãntico dos Salmos (sem nenhum instrumento), mini- stração das duas ordenanças e a bênção apostólica. Alem disso, a pr imazia cabia à pregação. O púlpito foi colocado no centro. O que explica a surpreend ente uniformidade e simplicidade do culto reformado-puritano? O que foi que os levou a rejeitar a parafernália litúrgica romana e anglicana? O que norteou a profunda refor ma litúrgica que empreenderam? O princípio regulador puritano. DEFINIÇÃO DO PRINCÍPIO REGULADOR PURITANO A terminologia geralmente em pregada (Princípio Regulador Puritano) não expressa be.m o assunto. Não porque os puritanos não 11 Embora sendo anglicano, J.1. P11cker reconhece que os puritanos " ... insistillm que a adoração deve ser simples e bíblicn. Pnm eles, a simplicidade fazia pare e essencial d:i belC2:1 da adoração cristfi." J. 1. Packer,E111re os Giga111a do Deus, uma Visão Puriuina da Vida Cristã (São Jos\! dos Campos, SP. Editora Fiel, 1991), p. 270. Com.relação à simplicid11dc do culco rc(ormado·puritano, ver Ull'l\b~m Leland Rykcn,Sa11tos 110 Afondo; Os Pur11anoscomo Realmente Er.im (São Jos~ dos Campos, São Paulo: Editora Fiel, 1992), pp.121-145. 10 defendessem o princípio que estamos considerando. Mas porque não indica o assunto, e porque a defesa desce princípio não se limita a eles. Do ponco de vista do assunto, é melhor chamar o principio em questão de princípio regulador do culto. O principio que estaremos considerando é a norma fundamental que norteou a reforma litúrgica que resultou na simpl icidade do culto público reformado- -puritano. Do ponto de vista daqueles que formularam e defenderam o princípio de culto cm questão, é melhor denominá-lo deprináp10 regulador rcfonnado. Este foi o princípio que norteou não apenas os puritanos na sua luta concra imposições por parte da Igreja Anglicana de liturgias, ricos, símbolos, vestes, etc. Foi também o princípio que norteou os reformadores na profunda reforma litúrgica que empreenderam, contra a idolatria, a superstição e as tradições litúrgicas da igreja católica romana. O assunto desce escudo, portanto, é O Princípio Regulador do Culto Reformado. Esre foi o princípio de culto que norteou os reformadores na reforma litúrgica que empreenderam - o princípio defendido pelas igrejas reformadas cm geral, desenvolvido especialmente pelos puritanos, e adorado pela 1 1 igreja reformada escocesa, e pela I greja Presbiteriana, em particular.12 Mas no que consiste, afinal, o princípio regulador do culto reformado? É o princípio que afirma que o culto público deve ser bíblico. Em oposição ao princípio romano e anglicano (às vezes chamado de princípio nonnativo) segundo o qual o que não for diretamente proibido nas Escrituras é permitido no culco, os reformadores e puritanos sustentavam que o que não for diretamente ensinado nas Escrituras ou necessarian1ente inferido do seu ensino, é pruihido no culto. Colocado positivamente, o princípio regulador puritano afirma que só é permitido LO culco aquilo que tiver real fundamentação bíblica. EVIDÊNCIAS IIlSTÓRICAS Que cscc se trata de um princíp io genuínamente reformado, puritano . e presbiteriano, é fato h is tórico facilmente ver ificável. Não ser ia difícil multiplicar citações de reformadores calvinistas, de puritanos e presbiterianos a favor do princípio regulador puri cano .Como o tempo não permitida, mencionarei apenas alguns dos "Umacx1cns:i babhogru'tui rdacionadaàqueslàodasccrimônias cacólicas e an~licanas pode ser cncontrndll cm Christopher Coldwell, "Bibliogr.aphical lndcx for Oispu1c Ag:iinst lhe Engllsh Popash Ccremonies", Premis~, 2:5 (1995), p. 6 . . 12 . . mais representanvos. R cforn1adorcs A posição de Calvino com relação ao culto é manifesta em muitos dos seus escritos. No tratado The Necessúy of Reforming rhe Church (A Necessidade de Reformar a Igreja), por exemplo, escrito em 1543, ele afLrma: ... a regra que distingue entre o culto puro e o culto corrompido é de aplicação universal, a fim de que não adotemos nenhum arLificjo que nos pareça apropriado, mas atentemos para ns instruções do Único que cst:I autorjZ3do a lesislor quanto ao assunto. Portanto, se quisermos que Ele (Deus) aprove o nosso culto, esta regra, que Ele impõe nas Escrituras com o máximo rigor, deve ser cuidadosamente observada. Pois há duas razões pelas quais o Senhor, ao condena.r e proibir todo culto ficúcio, requer que obedeçamos apenas à Sua voz: primeiro, porque não seguir o nosso próprio prazer, mas depender inteiramente da Sua soberania, promove grandemente a Sua autoridade. Segundo, porque a nossa corrupção é de tal ordem, que quando somos deixados em liberdade, tudo o que <$ramos habilitados a fa7..er é nos extraviar. E então, uma vez desviados do reto caminho, a nossa viagem não termina, enquanto não nos soterremos numa infinidade de superstições ... John Knox> o grande reformador escocês, lutou tenazmente para livrar o culto de todas as superstições católico-romanas. O Prinzeiro Livro de Disciplina da Igreja da Escócia, escrito por John Knox e outros reformadores escoceses, em 1560. condena, 13 como "douLrinas contrárias": •.• qualquer coisa que homens, por leis, concmos ou consciwiçiõcs têm imposto sobre :is con.'IC:iências dos homens, sem mnndiamcnto ei.')>rcsso da Palavra de Deus - rn1s como votos de cnsridadc ... imposição u homens e mulheres do uso de diversas vestes especiais, observãm:JJ1supcr5ciciosa de dias de jejuns, abstinência de alimentos por motivo deconseiênci:\i oração pelos mortos, e a guarda de dias santos instiruídos por homens, tais como rodos aqueles que os papistas têm inventado, como as festas aos apóstolos, mártires, virgens, natal, circuncisão, epifunia (reis). purificação e outrnS fcsms -coisas essas que, não tendo nem mandamento nem endossa nas Escritul"lls de Deus, julgamos devnm ser compleulmente abolidas do nosso reino; declarando ainda, que obsunodos observadores e ensinodorc.; de tais abominações não devem escapar à punição do Magistrado Civil 11 Esses exemplos são apenas ilustraúvos da posição reformada cuJvinisca quanto ao assunto. Em muitos outros escriros, Calvino, John Knox e outros reformadores, cais como Bucer e Bullinger, e mesmo os principais símbolos de fé reformados demonsuam o caráter normativo do princípio de culco que cscamos Lratando. A Confissão B elga, por exemplo, ao professar a suficiência das Escriruras, declara: Cremos que as EscritU1'3S Sagrndascontêm de modo comple10 a vontade de Deus, e que tudo o que o • 11 :John Knox's Hut<n;y of tlr1 RefonnatiDn 1n Scotland, \'OI. 2, cd. Willi2m Oickmnson (Ncw York: Philosoph1Clll L1brary, 1950), p. 281. . 14 homem está obrigado a crer para ser salvo é nelas suficiente mence ensinado. Ponanto, já que coda forma de culto que Deus requer de nós se encontra nelas amplamente descrilll, não é pcrmüido ao homem ... ensinar nenhuma outrama.ncira (de culto) C.'\:ccto aquela que agora é ensinada nas Escrituras Sagradas." Puritanos No século XVII, dezenas de teólogos e pastores puritanos escoceses e ingleses dos mais expressivos - tais como Thomas Cartwright (1535-1603), ministro não conformista inglés;1s William Ames (1576-1633), professor de t eologia não conformisra exilado paza a Holanda;16 David Calderwood ( 1575-1650?), ministro e teólogo da Igreja da Escócia,17 e 1 ' Guido De Bres,Crumosy Ca11fewmcn; Confisión de los Países Bajos. Rijswijk (Países Baixos: Asociaci6n Cultural de Esrudios de la Litcrarur.i Reformada, 1976), parágnafo 7. "VerA Confutotitm o/IM R!icmists Tro11s/a1io11, 1618 (Amstcrd:un: TheatrumOrbisTcrmrum; NewYork: Da Capo Prc$$, 1971). Obs: A Trad11çlio de Rlacms das Escrimrns, contendo uma série de noras marginais, foi publieuda (o NovoTestamcnto) cm J 582 pelos Jesuítas ingleses, com o propósito de subverter a Reforma na Inglaterra. O livro de Canwright refuta estas norns, e, cm diversos lugares, expõe também o car:\ter não bíblico d3s cerimônias do culto anglicano. Por isso mesmo, a obra só foi publicada após n sua rnonc. Ver Alan C. CHfTord, "Thomas Canwright". T/tc Bamur o/ Tru1/1 , 302 (Novcmbcr 1988), pp.12-15. 14 Ver The i\turruw o/11reawgy, 1623 (Ourham, N.C. : Labyrint h Prcss, 1983, cl 968); cA Fmla Suit Against Huma11 Cl!f<moni.s ira God's llYtmlaip (Ronctdllm: n.cd., 1633). 15 outtos18 - escreveram tratados e outros tipos de escritos defendendo e aplicando o princípio regu lador do culto, condenando a imposição de cerimônias, festividades religiosas, gestos e símbolos não fundamentados nas Escrituras. As seguintes citações, são representativas da posição puritana quanto ao assunto: George Gillespie (1613-1649), um dos ministros representantes da Escócia na Assembléia de Wcstm inster,19 escreveu, em 1637, um t ratado contra a imposição de cerimônias religiosas. Eis um pequeno trecho do livro: A igreja é proibida de acrescentar qualquer coisa aos m:iodamcntos que Deus nos deu, concemen tes ao Seu culto e serviço, De11u. 4:3; 12:32; Prov. 30:6; por conseguinte, ela não pode prescrever coisa 11 Em ·n.e PtWDra11d úrePrdau, 1628 (Edmonton, CanactJ: Sull WatcrsRcvival Books, bound photocopies); eAgai1111 Fts1rval DayJ, 161 S (Onllas: Naphtali Prtss, 1996). 11 Algumas ciutç<ies de outros puriumos (tais como \Villiam l'erkins e William Brnd&haw) e de confissões de (é reformadas, em dcícsa do principio regulador puritano podem ser c:ncont:rndoscm William Young, ThePurilanPrindp/cofrl7onhip (Viena, VA: Thc l'ublica1ions Committec oíthc Presbytcrian Ketormed Church, n.d.), pp. 30-36. "Quanto à participação deGiJlespiecdos dcmau rcprcscrnantcs esC'OCCSCS na Assc01bléia de \Vcsuninster, ver lain H. Mumay, "Thc Seots at the W1:11rnin.ster Asscmbly; With Special Refercnce to thc Dispute on Church Govcrnmcnt und its AC1crm1nhn, The Bannuo/Truth, 371 ·372 (August-Scptembcr, 1994), pp. 6-40. 16 alguma rclncionadn i\ práticn do culto divino, que ultrapasse mera circunstilncia.: tudo é incluído naquele tipo de coisas que niío são tratadas nas Escrituras ... A Igreja Cristã ntlo tem maior liberdade para acrescentar (coisas) ao mancbmento de Deus do que tiveram os judeus; pois o segundo mandamento é moral e peipéruo, e nos proíbe, bem como a eks, as adições e invenções humanas no culto a Dc\1$.io John Owen (1616-1683), um dos mais capazes, respeirados e conhecidos puritanos, cambém escreveu um tratado contra n imposição de licurgias.z1 Eis um pequeno t.recbo do livro: ... a invenção arbitrária de qualquer coisa imposta como necessária e indispens:lvcl no cuho público a Deus, como p:ine deste cuho, e o uso de qualquer coisn :issim inventada e ordennda no cuhoé ilegal e contr:lria 1l. regra da Palavra ... i: Portanto, todo o de\•tr da lgrcjn com relação ao culto a Deus, parece consis tir nn precisa obsci:vação daquilo que é prescrito e ordenado por Ele (Deus)." Jcremiah Burroughs (1599-1646), puritano independente, e membro da Assembléia de Westminster, escreveu em 1648 um tratado de 16Gcorgc Gillcs11lc,Dispu1~Agairul tlu~ E11gful1 F\!pish CmiflbilÍB Obtn1d~dun th' Ch11rrli of Scbdand (Edinburah: Robcn Oglc ond Oliver & Boyd, 1844), p.133. "John 01Vcn, º'/\ Discoursc Conc:cmmg LilurJics and Tbctr lmpos1tions'", 1n T111: Wúrlua/Yultn On.m, \"OI IS(Edinburgh Tbc B3nncr of1ruth üust, 196S). u lbid, pp. 33,34. "lbid, p . 42. 17 cerca de 400 páginas sobre o culto evangélico. Burroughs começa sua obra, argumenrando, com base no relato bíblico sobre o fogo estranho oferecido por Nadabe e Abiú, " ... que no culro a Deus não pode haver nada apresentado a Deus, que Ele não tenha ordenado; o que quer que pratiquemos no culto a Deus, deve ter fundamentação proveniente da Palavra de Deus".1' Presbiterianos Historicamente, o presbiterian ismo é um dos ramos.reformados que mais contribuíram para a reforma litúrgica. A herança reformada, calvinista, escocesa e puritana legada aos presbiterianos tornou-os parti cu la rmen re empenhados na purificação do culto. Alcxander Hodge, conhecido professor de ecologia do Seminário de Princccon, no século passado, no seu comentário sobre a Confissão de Fé de • Westminster, com relação ao capítulo XXI, parágrafo I, escreveu: Nós j:\ vimos, ao comentar o capfrulo primeiro, que Deus nos deu ns Escrituras como uma rcgrainfa!Ivel, autori1ativo, complcUI e clara de fé e pratica ... Isso implica ncccssarinmcn'te que, visto que Deus prescreveu o modo como nós devemos culruá-10 e servi-10 de modo acdtável, é uma ofcnsu 1>ara Ele e pcaado da noss:i P;irtC:. t:uuo ncdi&cncinr o modo " Jcn:m1•h Burrougbs, Gtupd Worslnp (P1115burgb, Pcnnsylvanu Soh Oco,Cloria, 1990). pp. l, 8. 18 por Ele esmbelccido, como preferir prnúcar o nosso próprio modo de cuko ... visto que a nntureza moral do homem é depravada, seus instintos religiosos pervertidos, e suas relações com Deus invertidas pelo pecado, é auto-evidente que uma revelação positiva e explicim é necessária, não apenas para dizer ao homem que Deus admiccsercultuado, mas também para prescrcveros princípios com base nos quais, e os métodos pelos qu:iis este culto e serviço de\•erão ser prestados. Como jli foi antes dcmonsrrndo a partir das Escricurns ... roda maneira de culto da vontade, de aros e formas auto-escolhidas de culto são nbominnção diante de Dcus.u Mas como presbiterianos, não precisamos buscar cesremunhos pessoais favoráveis ao princípio regulador puritano, visco que nossos próprios símbolos de fé professam claramente o princípio de culto que estamos considerando. A Con.ftssão de Fé de Wes11ni11.srer afirma no capírulo referente ao culto (XXI), que: ... o modo aceitável de ndorar o verdadeiro Deus é iosu1ujdo por Ele mesmo, e é tão limitado pela Sua próprin vontade revelada, que Ele não pode ser adorado segundo as imaginações e invenções dos homens. ou sugestões de saainás, nem sob qualquer represencaçiio visível, ou de qualquer outro modo não prescrito nas sagradas Escrituras."' ,. Alexander Hodgc:, T1u1 Co11fusio11 of Faith (13dinburgh: Thc Bnnncr ofTruLh ·n-ust, 1958), pp. 271,272. "" Capítulo XXI, p3râgrafo l. Cf. Fé para Hojt; Confiss:ilo de Ft Batismdc 1689(SãoJosédos Campos, S~ Ed11ora Ficl, 1991). 19 CONCEPÇ ÃO REFORMADO-PURITANA DO PRINCÍPIO REGULADOR DO CULTO Princípio Calvinista O princípio regulador do cu 1 to reformado está cm perfeito acordo com as doutrinas reformadas da autorid ade e da suficiência das E scri tur as. D e faro, o princípio não é nada m ais nada menos do que a aplicação dessas doutrinas ao cu l to. A fé reformada su slenla que as Escricu.ras são pleaamence suficientes cm matéria de fé e p rática - o que s ignifica que tudo o que o homem precisa conhecer, c rer e fazer para que seja salvo e viva de modo agr adável a Deus é revelad o n a Sua Palavra: "Toda Escrirura é inspirado por Deus e útil para o ensino, pnra a repreensão, paro a correção, para a educação na justiçn, a fim de que o homem de Deus seja pcrfcico e perfeitamente hnbilitado parn t<1da boaobr:i." (2 Timóteo 3: 16,17). Trata-se também de um princípio coerente com a concepção cal vinis ta a respeito da natureza p erver tida do homem, inclinada para ó êrtõ e pata o pecado, e dé u m D eus soberano que faz tod as as coisas conform e o conselho da Sua vontade p ara o louvor da Sua glória. Por cau sa da natuFeza pecam inosa do homem, sempre inclinada para o CITO e para o pecado, n ão l he compete inven tar e in stituir com o prática de cul to absolutamen te n ada que não 2 0 scia ensinado nas Escrituras. Esta é uma prerrogaciva divina, e a acirude e modo pelos quais Deus quer ser adorado é suficientemente prescrito por E le nas Escrjruras. O culto, porcanro,, na concepção reformado-puritana, não tem como p r opósito agrad ar aos adoradores, e sim, a D eus. Hugh B inn ing (1627-1653), m i nistro presbiteriano escocês conhecido por sua piedade e erudição, professor na U niver sidade de G lasgow aos dezenove a n os de idade, comen cando João 4: 24, escreveu: A moiorin dos ho111ens tem algum:• forma própria de adorar n Deus, e está cão satisfeita com cln, que pensa que Deus carn bém está. Poucos há, cncrecanco, que de futo sabem o que sisniiica adornr de modo aceilá"el à Sua M<ljestadc. M:is vocês sabem que niío - dor11r a Deus, ou não adorá-10 do modo que Ele quer ser adorado, significa o mesma coisn. Portanto, a maioria das pessoas não passa de auto- -adoradores, porque niío a.sradom a Deus com seus culcos. mas a si próprios._ Vocês dc\fcm ter como verdade .ú1cgaveln1entc eswbclccida, que Deus tem que ser adorado de acordo com a Sua própria vontade.e prazer, e não de acordo com a vontade ou invenção de vocés. Portan to, Deus aborrece concepções human as de culco (will-worship) iniag.inadas pelos homens, por zelo ignoran!e ou superstição, embora possam aparen tar muita devoção ou afeição a Deus ... O culto divino deve ser em verdade -isso é claro - masque verdade é essa? Deve ser de conformidade com a norma e padrão de culto revelado como vontade e prnzer de Deus 21 r1:1 Palâvra da verdade. Verdadeiro culto é a própria prática da Palavrada verdade."' (Ver Mateus 15:8,9). Charles Spurgeon, o conhecido pregador batista calvinista do sécul o passado, também alertou seus Leitores contra o perigo incipiente, na época, de buscar agradar os ouvintes no culto público. Em um pequeno artigo, inlCitulado Feeding Sheep or Amusing Goats (Alimentando Ovelhas ou Entretendo Bodes)/ 8 Spurgeon escreveu: O diabo tem raramcn te fcito algumn coisa mais sagaz do que sugerir à Igreja que parte da sua missão consiste em proporcionar: cn tretenimcnto ao povo, com vistas a ganhá-lo ... Em nenhum lugar nas Escrirurns é dito que prover divertimento para as pessoas é função da Igreja. Se isso fosse função da Igreja, por que Cristo não falou sobre isso? ... "ele concedeu uns para apóstolos, outros para profetas, outros para evangelistas, e outros pal'a pastores e mestres" paro a obra do minis1ério. Onde se incluem os que couetém pessoas? ... Se Cristo úvessc introdu7jdo mais elementos festivos e agrad:fvcis à Sua missão, Ele tcri:I sido mais popular, quando as !Pessoas se afastavam d.Ele por causa da natureza perscrutadora e penetrante do Seu ensino. Mas eu não O ouço dizendo: "Corre alJ'ás destas pessoas, IPcdro, e diga a elas que teremos um eswo de culto " Hugh Binning, TheCommo11 Prüidp/esofrlic Clirisrum Rcbgio11, LccLUre 11: Thc Knowlcdge 'lhnt God is, Combíned wíth 1hc: Knowlcdge th•r Hc is to bc \Vorsrupped (Edmonton, Canada. Srill \Vatcrs Rcç1-.-al Books). p. SS. ,. Em T/1c Bann" ofTmtli, 302 (November, 1988), pp.S,6. Também cm Rrfqm1011011 & ReviVtJI, 2: 1 ( 1993), pp. 109, 11 O. 22 difcrcn1c :amanhã, nlgo mais breve e atrntivo, com pouca pregnçiío ... " Jesus Se comp11dccin dos pecadores, prcocupavn-S.ee chorava por eles, mas nunca procurou diverti-los. Princípio Bíblico Embora cm perfeita harmonia com as doutrinas reformadas fundamentais a respeito das Escrituras, do homem e dos atributos de Deus, reformadores e puritanos defenderam e aplicaram o princípio regulador do culto por uma razão maior: porque cntcndian1 que Deus mesmo revela este princípio na Sua Palavra. Segundo eles, as próprias Escrituras, canto no Velho Testamento como no Novo, condenam invenções humanas relacionadas ao culto, proíbem adições ou diminuições ao culto divinamente prescrilo, e consideram vãs quaisquer formas de adoração provenientes de mera tradição humana. Um dos textos frequentemente mencio- n ados por reformadores e puritanos em defesa d o princípio regulador do culto é Deutero- n ômio 4: 1,2: "Agora pois, ó Israel, ouve os estatutos e os juízos que eu vos ensino, para os cumprirdes, para que vivais, e entreis e possuais a terra que o Senhor, Deus de vossos pais, vos deu. Nada acrescentareis à palavra que vos mando, nem diminuireis dela, para que guardeis os mandamentos do Senhor vosso Deus, que eu vos mando". Não se trata de uma referência especificamente relacionada ao culto, 23 mas, evidentemente, também inclui o culto público. O versículo bfblico c lássico na defesa reformada do princípio regulador se encontra um pouco adiante, no livro citado acima: "Tudo o que eu te ordeno, observarás; nada lhe ucrescen tarás nen1 dimh.iuirás" (Deuteronômio 12:32). Esse versículo diz respeito exatamente • ao culto. E a conclusão de um capítulo que trata especificamente do culto público. Entre os textos do Novo TesU1mento mais cicado10 em defesa do princípio regulador pur itano estão M arcos 7:6-13 e Colossenses 2: 16-23. No primeiro, o próprio Jesus considera vã (despropositada) a adoração resultante do ensino e tradições humanas: Bem proícuzou ls:u3s, a respe110 de v6s, hipócrir.as, como está escrito: este povo honru-mecom os ln'bios, mas o seu coração CSl!i longe de mim. E cm tJáo ~ udoram, tnn1111T1do do11tri1111s de liomcns. Ncgligcn· dando o 111undnmen10 de Dcus,gunrtluis a rradiçiío dos homens. E disse-lhes :unda: Je1los:uncnrc rcjeiuus o prccctto de Deus para guardard~ a ,.ossa própria tmdição (Marcos 7 :6-9). No segundo cexco, o apóstolo Paulo, após aler tar a igreja em Colossos a não se deixar julgar pela não observância de práticas licúi:gicas úpicas da antiga dispensação,so11zbras do culto neo-testamencãr io, condena, corre outras coisas, o culto de si n1e.f1no, isco é, o culto proven iente da vontade, as formas de culto • inventadas pelo homem, para agradar a sua própria vontade.29 Eis o texto: "Ninguém, pois, vos julgllle por causa de comida e bebida, ou dia de festa, ou lua nova, ou sábados, porque tudo isso tem sido sombra das coisas que haviam de vir ... Se morrestes com Cristo para os rudimentos do mundo, por que, como se vivêsseis no mundo, vos sujeitais a ordenanças: não manuseies isto, não proves aquilo, não toques aquilo outro, segundo os preceitos e doutrinas dos homens? Pois todas esras coisas, com o uso, se destroem. Tais coisas, com efeito, têm aparência de sabedoria, como c11l10 de si niesmo, e falsa humildade, e rigor ascético; todavia, não rêm valor a.lgum eoncra a sensualidade" (Colosscnses 2: 16,17,20-23). Outras importantes passagens bíblicas do Velho Testamento e do Novo, e geralmente mencionadas com relação ao princípio regulador do culto reformado, serão consideradas adiante. O Culto da Vontade Os reformadores reconheciam que as adições humanas ao culto têm aparência de sabedoria e tendem a ser mais agradáveis à "'O t<!trnO da língua grega cradu.zido como "culto dcsi mesmo" segundo Joseph Henry Thayer,A GreeJ.~E11g/ish Lexico11 of thc New Testamem (Grand Rapid:s: Zondcrvan, 1979), designa, um ºcu lto arbitrário",, um •cculco que alguém imagí.na e prescreve para si mesmo". Segundo William F. Arodt and F. \'Y'ilbur Gingrich,A Gru1"-E11gli.sla Lexi~o11 ofrhc New 1ésramettt a11d Otlier Early Cliris1ia11 Literowre, 2 ed. (Chicago and London: Thc University of Chic.1go Press, 1979), um culto ou ªreligião :iuro-fabricada". 25 natureza humana pervertida do que o culto divinamente prescrito nas Escriruras . ... Eu nüo ignoro (escreveu Calvino) o quão dificil é persuadir o mundo de que Deus rejeica e mesmo abomina toda invenção da razão humana relacionada no culto. A ilusão, com relação a esta questão tem diversas causas: "Cada um acha que está certo", como expressa o antigo provérbio. Assim, os filhos das nos.sas próprias mentes nos deleitam; e além disso, como Pnulo admite, o culto ficúcio frequcn temente aprcsen1.a alguma aparência de sabedoria (Colosscnses 2:23). Como na maioria dos casos, o culto fictício tem um esplendor externo que agrada aos olhos, ele é mais a~dável à nossa nacuru.a carnal, do que apenas aquilo que Deus requer e aprova, e que tem menos ostentação.-.M> Contudo, eles consideravam qualquer invenção humana no culto como will-worship (culto da vontade), "o culto de si mesmo», condenado em Colossenses 2:23. Eis o que escreveu Calvino: Eu sei o quão dificil é persuadir o mundo dcstue Deus desaprova todas as prãticas de culto não sancionadas cx,,rcss:u;nente na Su:i Palavra. A opinião conlrária, à qual se apegam, e que está arraigada até aos ossos e medul.a, é que, qualquer prática para a qual encontrem alguma razão em si mesma é lq;itima, desde que exiba algum tipo de aparência de zelo pela honra de Deus. Ora, visto que Deus não apen:is considera frívola, mas t:imbém clacamcnte abomina o que quer que pratiquemos por zelo ao Seu culto, se não estiver de ,. John C:ilvin. TirL.Neenmy of R~fonning the Clwreh. 26 acordo com o Seu mandlamenco, o que pode nos aproveitar tomaraticude oposta? As palavras de Deus são claras e distintas: "obedecer é melhor do que sacrificar." " Em vão me adoram, ensinando doutrinas e mandamentos de homens" ( l Samuel 15:22; M.atcus 15:9). Toda adição à Sua palavra, cspedalmen1c neste assunto, é uma mentira. Mero "culto da vontade" é ''aidade(Colossenses 2:23).J' Como exemplos bíblicos da reação divina ao culto da vontade (will-worship ), eles freqüentemente mencionam o culto de Caim, o fogo estranho de Nadabe e Abiú, o culto de Saul em Gilgal32 e o transporte da arca da aliança para Jerusalém. Por que Deus não Se agradou da ofer ta não cruenta de Caim, e agradou-Se da o ferta cr uenta de Abel (Gênesis 4:1-6; cf. H ebreus 11 :4)? Por que Nadabe e Abi ú foram mortos por co locarem fogo estranho no oferecimento de incenso (Levíúco 4:17-20)? Por que o sacrifício de Saul foi condenado por Deus? P or que deu tudo errado quando Davi tentou levar a arca para Jerusalém num carro e não pelas argolas (1 Crônicos, capírulo 13)? Por que Uzá foi m orto ao segurar a arca da aliança quando os bois tropeçaram "lbid. "" ... tem, porventura, o Senhor moto prazer cm holocaustos e sacrificios qu11nto cm que se obedeça li sua palavra? Eis que o obedecer é melhor do que o sacrificar, e o atender melhor do que a gordura de carneiros. Porque a rebclt:io é como o pecado da feitiçaria, e :i obstinação é como u idolatria e culto a ídolos do lar ... " {I Snmucl 15:22,23). 27 en1 Quidon1? Rcspos:ra reformado-puritana: porque todos concra,,.i~ram a lei do culto, o princípio bíblic., regulador do cu lto, que atribui a Deus o direito de prescrever a maneira pela qual Eie deseja ser adorado. Em resposta à alegação de boa intenção, os reformadores respondiam como John Knox:13 Desobediência à voz de Deus não ocorre apenas quando o homem age impiamente, contrariando os preceitos de Deus, mas também quando por zelo genuino ou poa intenção (como normalmente falamos), o homemfaz qunlquer coisa a útulo de honra ou serviço :a Deus não ordenado expressamente pcln Palavra de Dcus ... 1• ... nem a preeminência da pessoa que concebe ou estabelece qualquer prálica religiosa, sem mandamento expresso de Deus, nem a inccn~ão que a indu7.iu a cais práticas, é aceitável diance de Deus-pois Ele (Deus) :não :idmiúrá nada cm Sun religião, sem que se fun dnmentc n:1 Sua própria Palavra; mas tudo o que lhe for acrescentado Ele obomina, e pune os inventores e prnticantcs dcscas coisas, como aconteceu com Nadabe e Abiú (Levítico 10: 1-3).l; Idolatria e SuperStição A desobediência ao princípio regulador do culto era considerada pelos reformadores e • " No lrntado: Tru< & False ll'orthip; A Vindicauon oí the Doctrine thut lhe Sac:ra!icc: oí lhe Mass is Idolntry (Dallas: J>rcsbyLcrion Hcrlragc J>ubllcuLíons, 1994). " lbul, p. 26. • 28 • puritanos como 1dolacr1a e superstição. Eles não entendiam idolatria no sentido restrico de adoração a outros deuses (primeiro manda- mento), mas cambém no sentido de adoração ao Deus verdadeiro da forma errada (segundo mandamento). Melanchcon," por exemplo, considerava inadmissíveis as tradições católico-romanas adicionadas ao culco. Segundo ele, os que assim procedem, demonstram preferir a sua própria sabedoria à de Deus. E, pior, no seu encendi- mcnco, "Isco cem sido, e é, a fonte de culto a ídolos." Daí seu alerta: " ... nós, na igreja, deveríamos considerar estas coisas, a fim de que, rendo sido advertidos, possamos n os submeter à Palavra de Deus, e não estar d ispostos a sermos regidos pelas nossas próprias opiniões ... ". Em 1550, J ohn Knox escreveu um pequeno cracado condenando a missa católico- -r omana como idolatria. Seu principal argumento, cm forma de silogismo, cem o princípio regulador do culto como premissa: A missa ~ ídolnLrin. Todo culco, honra ou serviço invcncado pelo cêrcbro humano n o que diz rcspci10 3 religião de Deus, que não se fundamente cm Seu • Cimdo por John l'la,•cl, "Anupharmacum Salubcrr1mum; A Scrious und S~asonnblc Owcn1 1n aU thc Sn1111s 1n 1his Hour of Tcmp1a1ion". llm Th~ 117orkl o/]0/111 FIJrwl, •·oi 4, p.526 (l..ondon, Thc Banncr o( Tn11h Trus1, 1968). 29 próprio CJl.l>l'CSSO mandamento, é idolatria. A missa é invenção do cérebro humano, que não se fundamenta cm nenhum mandamento de Deus; portanto é idolacria.n John Flavel (1630?-1691), outro conhecido puritano em um dos seus escritos, definiu idolatria como: ... um culto religioso prestado a ourro que não o verdadeiro Deus, ou (prestado)ao verdadeiro Deus, mas de maneira que Ele não prescreveu em Sua Palnvra Disso vemos com clru'C7.a que um culto pode ser idólatra de duas maneiras: (1) com relação ao objc10 ... ou, (2) com relação à maneira, quando cultuamos o verdadeiro Deus, todavia de um modo e maneira que Ele não prescreveu cm Sua Palavra, mas que tenha sido invenUtdo ou concebido por nós mesmos; e isso é condenado como idolatrill no segundo mandamento; Não far6.s paro ti, isto é, da rua própria mente ou da rua própria cabeça,nDll1umo imagom de csc:11/wra; linguagem que proíbe todas ns invenções humanas, corrupções do culto puro e simples a Deus, como idólat.r:1s ... J.1 O mesmo é afirmado por alguns dos principais símbolos de fé reformados. O CateciS1no de Heidelberg, por exemplo, dá a seguinte resposta à pergunta de número 96 ("O que Deus requer no segundo mandamento?"): "que não O represenremos ou adoremos de • " John Knox, 1hu & T-.úu Ui'onl1ip; A Vindication of lhe Ooctrine that thc Sacrificc of thc Mass is ldol.atry, p.23. " John Flavcl. ' 'Antipbarmacum Slllubcrrimum; A Scrious and Scasonable C.vea1 10 all the Saints ln t.his Hour oí Tcmpiationb, vot: 4. ln 771~ Wí>rkt "f:Jo/111 Flavd, p. 522. 30 ;.tenhuma outra maneira que E le não tenha ord enado em Sua Palavra."39 Já o Catecisrno Maior, em rcsposra à pergunta 109, "Quais são os pecados proibidos n o segundo mandamento?", afirma: Os pecados proibidos oo segundo m:mdru:ncoto são: o cscabelcccr, aconstlhar, mandar, usar e aprovar de qualquer maneira cada cul co religioso nã.o insti ruído por Deus; o fazer qualquer representação de Deus ... ; todas as invenções s upersticiosas, corrompendo o culto de Deus, acrescentando ou tirando desse culto, quer sejam inventadas e adol:ldns por nós, quer recebidas porundição de outros, embora sob tirulo de antigüidade, de cosrumc:, de devoção, de boa intenção, ou de qualquer outro pre1cxto; a simonia, .. o sacrilégio, toda negligência, desprezo, impedimento e oposição ao culto e ordenanças que Deus instituiu. (Ver Apocalipse22:18,l 9). Acréscimos litúrgicos em termos de ceri mônias, ritos, gestos, etc., eram considerados superstições pelos reformadores. Toda e qualquer p rática litúrgica invencada pelo homem era vista por eles, como vemos h oje as práticas supersticiosas dos amuletos (tais como pés de coelho, ferraduras e trevos), da distinção de dias especiais (sexta-feira 13), e evitar passar ""O uuccismo de Heidclberg." Em O Lrvro do Omfissõn (São Pawo: Mi$:5ão P~í1cria.na do Brasil <:cntml, 1969), pp. 4.00 I • -4.l29. •O oom&cio dos dons de OcU$. Atitude: de Simão, o mágico, que tencionou comprar de Pedro o dom de conferir() Espírito Sanro (Atos 8: 18·20). 3 1 por baixo de escadas, perto de gatos pretos, etc. Algumas das citações mencionadas já fizeram referências a essas práticas licúrgicas como supersticiosas. Eis apenas mais uma. Comentando Jeremias 7:31, " ... o que nunca ordenei, nem me passou pela mente", Calvino argumenta: Deus, aqui, elimina qualquer oportunidade de evasivas humanas, visto que E le condena, pela Sua própria fr-.ise, "o que nunca ordenci,''o que quer que os judeus imaginassem. Não há, portanto, nenhum outro argumento necessário para condenar superstições do que o fato de não terem sido ordenadas por Deus: porque quando os homens se permitem cultuar a Deus de acordo com suas próprias fantasias, e não observam os Seus mandamentos, pervertem a verdadeira religião. E se este princípio fosse adotado pelos papistas, todos estes 1nodos fictícios de culto, nos quais eles absurdamente se exercitam, cairiam por terra." Princípio Libertador Na concepção reformado-purita'ha, o princípio regulador puritano não tolhe, não limita nem restringe a liberdade cristã. Ele a preserva da imposição do cerimonialismo do qual Cristo nos libertou e de quaisquer imposi- ções litúrgicas à nossa liberdade de consciência. Com relação ãs cerimônias (escreveu Calvino), as quais pretendem ser um sério atestado de culto a Deus, não paSsam de 7.0mbaria a Deus. Um novo judaísmo, em substituição àquele que Deus ' 1 John Calvin, Cc>m,,1emaryon:feremial1, 7:31. 32 clnramc1ue revogou, foi novamcn1e insutuido atrllv0s de nu1ncrosas e pueris cxlrnvagfincias, colcradns de diversos lugares, 1\s quais foram misturad11s com ritos ímpios, parcialmente emprestados dos pngãos, e mais adnptados nalguns slwws ceaU'llis do que à dignidadcd:t nossa religião. .e No capitulo que rrara de qucscóes de ordem e disciplina ecJesiásticas, a Confissão Belga re jeita ..... todas as invenções humanas, e todas as leis que os homens queiram introduzir no cul co a Deus, pelas quais obriguem e consuanjam a consciência humana de qualquer for m a possível".4 , No capítulo que craca da liberdade cristã e da liberdade de consciência, a Confissão de Fé de ll7esu111nsru afuma: Só Deus é! Senhor da consciência, e a deixou livre das douuinns e mundamentos humanos que, CJn qualquer coisa, sc:jom contririos ~ Sun Pal:tvra~ 011 que, cm matéria de fé 011 d~ a1úo1 estejam fora dela. Assim, crc1· cm tais doutrinas ou obedecer :i r:als mandamentos, por motivo de consciênc1a, é! crair 11vcrdad.eirn llbcrdadc dcconsc:1ênaa; e rcqucrcrparn eles íé implícita e obediência cega e absoluca, é dcsrruir a hberdllde de consciénc1a e a própna raziio ... Esta concepção reformada do princípio regulador como um princípio liber tador se funda m enta cm textos bíblicos do Novo " John CalYin, TM Ntt.asll)lo/Rt'fomrinz tlt~ C1turclt . " Parigraío 32. " Capítulo XX, Jt"nlar.tf o 2. Ver wmbémF' paN Hojl, Confissão de F~ Bacisua de 1689(São José dos Campos, SP· Ednora F1cl, 199J), 21:2. 33 Testamento, tais como Colossenses 2: 16,17: "Ningué m , pois, vos julgue por causa de comida e bebida, ou dia de festa, o u lua nova, ou sábados, porque rudo isso tem sido sombra das coisas que haviam de vir ... "; e Gálatas 4:9- -1 1, onde o apósto lo argume nta que a insistência em observar dias e festas significava uma escravidão voluntária a formas rudimentares e fracas (em comparação com a nova dispensação), e poderia até indicar coisa muito s<!ria: " ... mas agora que conheceis a Deus ... como estais voltando ourra vez aos rudimentos fracos e pobres, aos quais quereis ainda escravizar-vos? Guardais dias, e meses, e tempos, e anos. Receio de vós renha eu trabalhado cm vão para convosco" (Gálatas 4:9- -11). A seriedade do assunro é demonstrada pelo apóstolo Paulo no início do capítulo cinco (versículo primeiro) dessa mesma carta; onde ele adverte: "P ara a liberdade foi que Cristo nos libertou. Permanecei, pois, firmes e não vos submetais de novo a jugo de escravidão. Eu, Paulo, vos digo que, se vos deixardes circuncidar, Cristo de nada vos aproveitará". É por causa de passagens bíblicas como essas, que a fé reformada não admite, na nova dispensação, a observância de dias, meses, tempos e anos especiais prescritos na lei cerimonial ju<laica. Mui to menos admite a instituição humana de novos dias, fes tas e 34 cerimônias religiosas.~s Quando, portanto, reformadores e puritanos enfa cizam a necessidade de base bíblica para qualquer elemento d e cu lto, na verdade não estão enfatizando o caráter formal do culto da nova dispensação, mas a sua natureza espirirual, csseocialmencc livre das formas litúrgicas cípicas do culto na anciga dispensação ou de novas fo rmas lirúrgiicas inventadas pelo homem. Elementos e Circunstâncias de Culto Uma última mas Ílnportan te consideração que preciso fazer com relação à concepção refor mado-puritana do princípio regulador do culto, diz respeito à distinção entre elenientos (ou ordenanças) de culto e circunstâncias de culto.46 <$ Um texto intcttSsantc com relação a observância de dias e n obstinêncin de comidas é Romnnos 14 :5,6. O cc.-:to pode parecer indicar que comer ou observar dias é ulgo completamente indiferente. Mas os textos já mencionados não pcrmitc.m CS$O intcrprctaçiio. O contexto indica que se trata de concessões, por amor, aos débeis na fé. Estes (certamente judeus), ainda não haviam absorvido as carncterísticas pcculillrcs da novu dispcnsaçiio (não foi fácil nem para Pedro), e ainda julgavam relevante alguma observância de dias e absunência de alimentos (quais especificamente, n.ào sabemos). Deve-se ter cm mente, aqui, as drcunstiincias históricas especiais (de transição) entre o 1udaísmo e o crisuanismo. De qualquer modo, trarn·sc de escrúpulos pt:$sorus (o que não provém de (é é pecado), e não pnrn ser jmposto na igreja . .. Ver Jc.rcmiah Burroughs, Gospd Worsh1p, p. 9. 35 Os elementos de culto são práticas específicas, prescritas (direta ou necessaria- mente inferidas) das Escrituras e válidas para toda a dispensação do evangelho (da graça), em qualquer lugar ou circunstância. Alguns desses elementos são comuns; isto é, fazem parte regularmente do culto. A Confissão de Fé reflete perfeitamente a posição reformada, admitindo apenas os seguintesele11ze11tos coniuns de culto: a leitura bíblica, a pregação da Palavra, a reverente atenção a ela, a oração, o louvor, e a ministração e recepção das ordenanças do batismo e da Ceia do Senhor. Outros elementos ocasionais (não regulares) de culto são: os "juramentos religiosos, votos, jejuns solenes e ações de graças em ocasiões especiais". As circunstâncias de culto, são rodâs as demais coisas, de caráter não religioso, mas necessárias à realização do culto. Estas coisas não são fixas, não fazem parte do culto em si, não sendo portanto especificamente prescritas nas Escrituras. Mas devem ser ordenadas à luz da revelação geral, do bom senso cristão, de conformidade com os princípios gerais das Escrituras.A Confissão de Fé de ~sttninsrer trata do assunto no capítulo I, parágrafo IV, nos seguintes termos: ... há algwnas circunstâncias, quanto ao culto d.e Deus e o governo da Igreja, comuns às ações e sociedades humanas, as quais têm de ser ordenadas 36 • peln luz dll natureza e 1>ela p:rudênci:i cristã, segundo as regras da Palovr:i, que sempre devem ser ob$CrVlldas." Como exemplo de circunsrãncias de culto na dispensação do evangelho, pode-se mencionar o lugar (casa, templo, ao ar livre), horãrio (dias da semana, horário), duração e ordem do culco, n16veis (púlpito, bancos ou cadeiras, mesa para a Ceia do Senhor); iluminação (velas, lamparinas, candeeiros ou luz elétrica), aquecimento ou ventilação, som, etc. Estas questões sfio rodas circunstanciais na dispensação do evangelho, o que significa que não se pode atribuir a e las conotação religiosa, tornando-as obrigalórias, e devem ser decididas com a prudência cristã e à luz dos princípios gçrais das Escrituras, tais como simplicidade, ordem e decência, reverência, etc. H á alguns cuidados gerais que se deve ter com relação a estas questões circunstanciais: O primeiro é o de não acribuir a estas coisas, que em si mesmas são indiferentes, conotação religiosa, atrelando-as ao evangelho, confundindo-as com os ,elementos de culto, tornando-as obrigatórias. Não se pode sacralizar um lugar (um cemplo), um horário (sete ou oito horas da noite), um dia da semana (quarta-feira), um móvel (bancada de madeira), uma roupa (o paletó ou batina), um sisrema de "Capitulo J, parágrafo VI. 37 ventilaçilo, uma ordem de culto, erc. Tem sido grande o perigo da superstição com relação a estas coisas. Quanto a esta tendência, Hugh Binning adverte: Muito$ têm uma noção supersticiosa do lugar de culto público, como se hou\•csse mais sanudade nele do que cm outra cnsa qualquer; e assim, pensam que suas ornções na igreja são mais aceiU'ivcis do que nos seus próprios aposentos. Mas Cristo rcjcitn essa opinião supersticiosa com relação a lugares, e consequentemente, com relação a dias, comidas e coisas externas como essas.•• O segundo, é o de fazer tudo à luz da prudência cristã. É este o melhor horário, o melhor dia, o lugar mais apropriado (com relação à tranqüilidade, residência e poder aquisitivo dos membros)? Os móveis são apropriados, a roupa, a i l uminação, a ventilação, etc.? O terce: iro, é o de deixar q ue os princípios gerais das Escrituras regulem as nossas decisões con1 relação a rodas estas coisas, de modo que não venham a contrariá-la. Nós não somos naruralmente prudentes. É à luz das Escriruras que devemos determinar o que é ou não prudente, mesmo co m relação às co isas ordinárias da vida. " ... vede prudentemente • " 11,. Comnro11 Pri1wplu o/ úu ClmJtilUI Rrligiott, Lccture 11 : Thc Knowlcdgc: that God is, Combmcd with thc Knowlcdae üuu Hc is to bc Worsh1ppcd. p.S9 38 como andais, não como néscios, e, sim, como sábios, remindo o tempo, porque os dias são maus ... ". (Efésios 5: IS,16). CONCLUSÃO Reconheço que professar e praticar o princípio regulador p uritano não significa dirimir todas as questões relacionadas ao culto. Mesmo os puritanos não foramunânimes em algumas questões concernentes ao cântico de hinos no culco público e ao uso de orações Ji rúrgicas (previamente composcas).•9 A convicção da legitimidade do princípio regulador do culto reformado também não implica necessariamente cm um rompimento imediato e abrupto com toda e qualquer prática que, na nossa interpretação, não tenha fundamentação bíblica. A prudência nos recomenda que em questões cão disputadas como estas, tenhamos o cuidado de avaliar extensamente as nossas interpretações - e a teologia e a prãüca reformadas são excelentes referenciais nesta avaliaç!ío. Além disso, mesmo que plenamente convencidos da ilegicimidade de práticas litúrgicas menos relevantes ou geralmente "'Ch . . . h nstophcr J. L. Bennctt, MWorsrup amoog tbc Puntans! e e Rcgufative Principie". Em Spintual ll'ilnlúp (London: Thc Wcsll'Oinncr Confcrencc, l 98S), pp. 17·32. 39 estabelecidas, convém un1a palavra de prudência e paciência, para não virmos a comprometer questões maiores. Calvino, por exemplo, não concordava de modo algum com o dia santo do natal. Mas preferiu adiar esta reforma em Genebra, para não impcdtro curso da Rcforma.so John Knox rejeitava a imposição anglicana do ato de ajoelhar-se para receber o pão e o vinho na Ceia do Senhor, mas aconselhou sua congregação em Berwick a tolerar a prática.si E o puritano Thomas Carnvright, embora se opus'!sse ao uso de vestes clericais, considerou melhor usá-las do que ser obrigado a abandonar a sua vocação.s2 ,. Ver CRrU endereçada a John Hallcr, 1,:asrnr de Bcrno.L<f1uno/ joht1 O.lv111, voL 2 (Ncw York: Bun Fr:mldin, 1972), pp. 288 -289. Obs.: Com reJaç:iu il qucst5odas pr:'ilu:as na1ahm1s, ,,cr i'amlXm Paulo i\nglado, O Natal t a Fi Rtfonnada (estudos nAo publicados, Bc:lém: Igreja Prcsbitcrluna Ccntrnl do Par.i, 1996). " Cf Christopher J. L Bennen, MWorshipsmoog the Puritans; Lhe Regubuve Prioaple" ln Sp1ntual Worship, p. 30. Ver tGmbém excelente artigo de Manyn Lloyd-Joncs, j~ U'2duz1do pnra o português, sobre as au:acterlstic:as pe~soais de John Knox, que fizeram dele, Lta opinrno do autor, o fundJldor do purilJlnwno: MJobn Knox; O Fundador do PurilJlJÚSmo" Em ()$ Punlil11'b1: rua1 Ori~1u r itw Sucestorrs (Sào Paulo; PBS- Puhhcnçucs Evangélicas Selecionadas, 1993), pp. 268 • 288. " Cf. Christopher J. L Benneu, "Worshap among thc Puriians, the Regubuvc l'rincaple~ Em Spmrua/ Worslup, p. 30. 40 Entretanto, se re1e1tarm.os o principio regulador do culto reformado, que estabeJece as Escri curas como regra suficiente e autoritativa de cuJto, que outro princípio adotaremos? Como definiremos o que é ou não permitido no culto? Como preservaremos o culco das tradições, invenções e superstições humanas? Adotando o princípio normativo anglicano, segundo o qual tudo o que não for proibido ou não for contrário às Escrituras é permitido no· culto, devemos reconhecer que teremos dificuldade em responder às questões com as quais introduzi este estudo. AfinaJ, as Escrituras não proíbem o sinal da cruz, a queima de incenso, ou a cerimônia do lava-pés! Também não proíbem a abstinência de carne na "semana santa" e uma infinidade de práticas litúrgicas católico-anglicanas! D esejo, portanto, concluir sugerindo que, à luz da história da revelação bíblica, ênfases sobre pompa. ritos, símbolos, gestos e demais práticas litúrgicas inventadas pelo homem, não constituem um avanço, e sim, um retrocesso. Significam um retomo a formas de culto mais rudimentares, apropriadas apenas à velha dispensação. A glória e beleza do cul to na nova dispensação não está no templo., na sua decoração, nos ritos, nos símbolos, nos gestos, nas luzes, nos corais, na pompa, nas cerimônias, nos instrumentos 1nusicais, ou em quaisquer 41 coisas do gênero.SJ Está, sim, na sua simplicidade, na sua natureza espirirual, na santidade do adorador, na conformação ao culto à verdade revelada nas Escrituras, na realidade do acesso do crente à presença de Deus pela intermediação de Cristo e a ação do Espírito Santo. Encerro este pequeno estudo sobre o princípio regulador do culto reformado com as palavras do apóstolo Paulo na sua Epístola aos RomaQos: "Rogo-vos, pois, irmãos, pelas miscric6rdias deDcas, que aptt$Cn1cis os vossos corpos por '3aificio vivo santo eagrndd\"Cl a Deus, que~ o vosso culto racional (l6gico, n12o:h·cl). E não vos conformeis oom este s~ulo, m:u lt'aosformai·vos pc111 renovação das vosSllS mentes, para que cxpcrimcn1els qual seja o boo, agradável e perfeita vontade de Deus" (Romanos 12:1,2). • ., Sobre a bclCD do culto na nova dtspcnlaçiío, ver John Owen, uThc Naturc and Bcauty ofGospcl Worab1p", Em 17re 117orks of:foltn Owen, \'019.(Edinburah, 1852; Thc Baaner ofTrulh TN$t, rcpr. 1966), p. S>-84. 42 BIBLIOGRAFIA A B íblia Sagrada; Velho e Novo Tescameotos. Edição Revisca e Atualizada no Brasil.Traduzida por João Ferreira de Almeida. Brasília: Sociedade Bíblica do Brasil. 1969. A Confissão de Fé. O Catecismo Maior. O Breve Catecismo. São Paulo; Casa Editora Presbiceriana, 1991. J A M ES, William. A Fresh Suit Agai11st Human Ceremmzies in God's Worsliip. Rorcerdam: n.ed., 1633. Tlze Marrow of Tlteology. Durham: Labyrincb Press, 1983. ANGL ADA, Paulo. O Culto Reformado (estudo não publicado). 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Lopes Catecismo para meninos e merunas, Um -Carcy Publications L1d Chamado para o min1stt!rio, 0-C. II. Spurgcon Cinco pontos do calvinismo, 0.s- W.J. Scaton Com quem mc:casarci?-A. Swanson Conhc:cimeoto: falso e \•erdadciro -D. M. 1.loyd-J oncs Conver'Sóe$: psicol6gicas e espirituais - D . M. Lloyd-Jones Crescimento nn graça-]. Newton Cris10: sabedoria, 1us1iça, saotificaçiio do crente - G. Whitcficld Cruz: a justificaç:lo de Deus, A - n. M. Lloyd· Jones Doença-J. C.Rylc Dons do Espírtto Santo, Os-D. M. Lloyd-Jooe:s Eleição: incentiva para pregar o evangelho -8. "lyler Exigências de Deus, As-C. H. Spurgeon Fé sa.lvadorn-D. i\'!.. Lloyd-Joncs Figueira 1n urcha, A- C. 1"1. Spurgeon História dos poderosos feitos de Deus, A -C. lJ . Spurgcon Idolatria desmusca1·adu, A-O. Ollvctú Igreja e o Estado: suas funções difcrcn1cs, A - D. M . Lloyd-Joncs lnspinção das Es.:rituras, A- J. C. Rylc 47 Iro de Deus, A-D. M. Lloyd-Jones João Calvino e George \Vhitefield - D. M . Lloyd-Jones John Knox, o fundador de puritnnismo - D. M. Lloyd-Jones Jonathan Edwards e a crucial importância de uv1Vamento-D. M. Lloyd-Joncs Livre-arbítrio: um escravo- C. 1 I. Spurgeon Mantendo a fé evangélica boje - D. M.Lloyd-Jones Mensagem cristã parn o mundo, A - D. M. Lloyd-Jones Não é pura rir-S. Jebb Oraçiio eficaz - C. H. Spurgeon Ordenação de mulheres: que diz o N.1:? - A. Lopes Pecadores nas mãos de um Deus irado - j . Edwards Perseverança n.asanúdade, A-C. H. Spurgeon Plano de Deus, O-J. I. Packcr Podemos aprender da bisuSria? - D. M. Lloyd-Jones Precioso sangue de Cristo, O - C. II. Spurgeon Pregação, A- D. M. Lloyd-Jones Pudcanismo e suas origens, O-D. M. Lloyd-Jones Que é a Igreja?-D. M. Lloyd-Jones Que é um cristão?- \V. Mack • Que é um e\•angélico?-D. M . Lloyd-Joncs RcaviVllmentos: sua origem, progresso e reali1..açõcs -E. Evans Rememorando a Reforma- n. M Lloyd-Jones Siscemo de pelo, 0-I. H. Murray Soberana vocação da maternidade, A - W. Cbantry Sobrcnntural na medicina, O-D. M. Lloyd-Joncs Urgente necessidade de avivamcnlO, A -D. M. Lloyd-Jones Verdades clfam3das calvinistas: uma defesa -C. li. Spurgcon Vivendo a vida crisrã- D. M. Lloyd-Jones 48