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Capítulo 12 – Princípios da gestão da qualidade 531 Jurandir Peinado e Alexandre Reis Graeml QUALIDADE NÃO É DIFERENCIAL. É OBRIGAÇÃO! Ao adentrar uma empresa não raro encontra-se um cartaz ou banner ex- posto em alguma parede de forma bem visível com a declaração da missão da organização e de princípios e menções de profundo respeito à qualidade do produto fabricado. Cuidar da qualidade há muito tempo deixou de ser fator di- ferenciador e passou a ser um requisito indispensável para se participar do mercado. A Carta de princípios da qualidade, apresentada a seguir, norteou uma grande empresa do ramo alimentício em seu esforço de institucionalizar a preocupação com o assunto. Mas, de certa forma, ela poderia ser aplicada a qualquer organização. CARTA DE PRINCÍPIOS DA QUALIDADE A Empresa ABCBRÁS entende ser a Qualidade Total fundamental para seu desenvolvimento e manutenção no mercado. Também entende que a Qualidade Total deve ser parte integrante de seu negócio e, portanto, fazer parte das atividades desenvolvidas por todos os seus fun- cionários. A Qualidade implica na busca contínua da satisfação das expectativas de todos os clientes, sejam eles internos ou externos à organização. Para tal, é necessário conhecer e antecipar as necessidades desses clientes, atendendo-os de forma que prefiram sempre fazer negócio co- nosco. Para se alcançar este objetivo é preciso que a ABCBRÁS desenvolva uma cultura voltada pa- ra a Qualidade Total, a ser seguida por todos os seus funcionários. A Qualidade Total se tra- duz na crença de que somente a partir do processo contínuo de melhoria da Qualidade será obtido sucesso. Para isto a ABCBRÁS coloca em prática a utilização plena de todas as Ferramentas e Princí- pios da Qualidade suportados por um sistema adequado de educação e treinamento para o atingir a Qualidade Total, por meio de projetos estruturados e iniciativas individuais. “A Qualidade Total é a nossa principal forma de condução nos negócios e é de responsabili- dade de todos os nossos funcionários”. Gurus da qualidade As modernas técnicas na área da qualidade foram introduzidas por vá- rios especialistas que de maneira revolucionária e visionária desafiaram o lugar comum, criando uma nova ordem na administração da qualidade nas or- ganizações. Estes especialistas, por distinção, ficaram conhecidos como os gu- rus da qualidade. Entre os mais famosos, freqüentemente citados na literatura estão: Shewhart, Deming, Juran, Feigenbaum, Ishikawa, Taguchi e Crosby. Walter A. Shewhart Shewhart fez duas importantes contribuições para a gestão da qualidade. Como estatístico, desenvolveu o Controle Estatístico de Processo (CEP), que permite determinar se existem causas não naturais de variação no processo. O assunto é tão importante, que o próximo capítulo é dedicado exclusivamente à explicação desta importante metodologia. Outra grande contribuição de She- whart à qualidade foi o ciclo PDCA. Este procedimento foi tão disseminado que passou a ser utilizado como um padrão de referência para programas de mel- 532 Administração da Produção (Operações industriais e de serviços) Jurandir Peinado e Alexandre Reis Graeml horia contínua da qualidade. O processo PDCA passou a nortear o direciona- mento dos esforços em prol da qualidade, em quase todas as organizações que realizam melhoria contínua. O ciclo PDCA será descrito em detalhes, mais adi- ante. W. Edwards Deming É considerado o pai do controle da qualidade ou o guru mestre. Na dé- cada de 1940, depois da segunda guerra mundial, foi trabalhar no Japão, pres- tando consultoria sobre teorias e assuntos da qualidade e produtividade. Muito do sucesso das empresas japonesas na qualidade, neste período, se deveu às palestras e conferências apresentadas por Deming naquele país. Os japoneses deram tanta importância ao seu trabalho que, já no ano de 1951, instituíram o famoso “Prêmio Deming”, anualmente concedido às empresas que se destacam de alguma forma em programas de gestão da qualidade. Este sistema de premiação às ações da qualidade desenvolvidas por empresas foi instituído, mais tarde, também em outros países. Deming trabalhou por quase 30 anos antes de obter o reconhecimento de seu trabalho nos Estados Unidos. Segundo Deming, a variabilidade do processo é a principal causa da não qualidade. Assim, seu princípio chave consiste na redução desta variabilidade, prevenindo defeitos, em vez de detectá-los, com forte aplicação e entendimento do controle estatístico de processo. Deming enfatizou que a qualidade era re- sponsabilidade da alta gerência e a não-qualidade não acontecia simplesmente por culpa dos empregados. Ele criou uma famosa lista de 14 pontos para a me- lhoria da qualidade em uma organização conforme apresentado no destaque abaixo. Talvez uma das maiores contribuições de Deming tenha sido a quebra do dogma de que só é possível obter mais qualidade com aumento do custo do produto. Afinal, quando os produtos são feitos certos da primeira vez, as economias de custo decorrentes da eliminação dos retrabalhos e refugos aca- bam por torná-lo mais barato que um produto de menor qualidade. Deming in- troduziu a técnica do ciclo PDCA, desenvolvida por Shewhart, no Japão. OS 14 PONTOS DE DEMING 1. Criar uma constância de propósito em relação ao aperfeiçoamento do produto e servi- ço, por meio de um plano para se tornar competitivo e permanecer no negócio. Definir a quem deve responder a alta direção. 2. Adotar a nova filosofia. Estamos em uma nova era econômica. Não podemos mais con- viver com níveis comumente aceitos de atrasos, erros, defeitos em materiais e deficiência de mão-de-obra. 3. Não depender mais da inspeção em massa. Em vez disso, passar a exigir evidências es- tatísticas de que a qualidade esteja integrada. 4. Acabar com a prática de fazer negócios com base exclusiva no preço. Em vez disso, passar a utilizar mensurações significativas da qualidade, juntamente com o preço. Eli- minar fornecedores incapazes de se qualificar através de evidências estatísticas da qua- lidade. 5. Identificar os problemas. Constitui uma função da gerência trabalhar continuamente para melhorar o sistema. 6. Instituir métodos modernos de treinamento on the job. 7. A responsabilidade dos supervisores deve ser alterada. Eles não devem ser responsá- veis apenas pela obtenção de números, de volume de produção. É importante que pas- Capítulo 12 – Princípios da gestão da qualidade 533 Jurandir Peinado e Alexandre Reis Graeml sem a ser responsáveis pela qualidade (...). A administração deve se preparar para tomar ação imediata, assim que for informada pelos supervisores de barreiras a um trabalho bem feito, como defeitos intrínsecos, máquinas sem manutenção, ferramentas deficien- tes e definições operacionais imprecisas. 8. Afastar o medo para que todos possam trabalhar eficazmente para a empresa. 9. Eliminar as barreiras entre os departamentos. Os funcionários nas áreas de pesquisa, projetos, vendas e produção devem trabalhar em equipe, de modo a antecipar os pro- blemas de produção que podem surgir com vários materiais e especificações. 10. Eliminar as metas numéricas, os pôsteres e slogans destinados à força de trabalho, so- licitando novos níveis de produtividade sem fornecer os métodos. 11. Eliminar os padrões de trabalho que prescrevem quotas numéricas. 12. Remover as barreiras entre o trabalhador de chão-de-fábrica e seu direito ao orgulho por seu trabalho. 13. Instituir um vigoroso programa de educação e treinamento. 14. Criar na alta administração uma estrutura que enfatize, diariamente, os 13 pontos an- teriores. Fonte: DEMINIG, W. E. Quality, productivity and competitive position. MIT. Center for ad- vanced engineering study. 1982. pp.16-17. Joseph M. Juran Juran tornou-semundialmente famoso com a publicação de seu livro “Quality control handbook”, em 1951. Da mesma forma que Deming, Juran também esteve no Japão após o final da segunda guerra (1954), onde prestou consultoria aos japoneses para melhorar a qualidade de seus produtos. Juran pregava que a qualidade está na adequação ao uso, utilizando uma abordagem mais voltada para o cliente. Juran, tal como Deming, enfocou o aspecto dos custos da não-qualidade, os custos de não se fazer certo da primeira vez, e seu impacto no preço do produto final. Dividia os custos da não-qualidade em cus- tos de prevenção, custos de inspeção ou detecção e custos de falhas. Custos de prevenção São os custos necessários para evitar que a organização fabrique pro- dutos ou serviços defeituosos. Estão incluídos nesta categoria os custos asso- ciados aos investimentos em treinamento, maquinaria, tecnologia, desenvolvimento de fornecedores etc. Todos os gurus da qualidade defendem com veemência estes custos, classificando-os como investimento facilmente compensado pela redução dos outros custos da não-qualidade, como retrabal- hos e geração de refugos. Custos de inspeção ou detecção São os custos necessários para a avaliação da qualidade do produto, por meio de inspeções de recebimento, testes em processo, manutenção de equi- pamentos de teste e ensaios, auditorias da qualidade etc. Custos de falha São os custos incorridos quando se fabrica um produto defeituoso. Estes custos podem ser: internos (o defeito é encontrado e sanado antes do produto deixar a fábrica), representados pela necessidade de retrabalhos ou refugos, ou externos (quando o produto defeituoso deixou a fábrica sem ser detectado), 534 Administração da Produção (Operações industriais e de serviços) Jurandir Peinado e Alexandre Reis Graeml representados pelo retorno, substituição, reparo em serviços autorizados, de- preciação da marca etc. Os custos de falha externa são, normalmente, muito superiores aos custos de falha interna. Segundo Juran, é necessário que haja um planejamento da qualidade da mesma forma que existem planejamentos de custos, de projetos ou de finanças. Ele orienta este planejamento por meio de um processo que ficou conhecido como a trilogia da qualidade que consiste em planejamento, controle e melhoria da qualidade. Armand Feigenbaum Feigenbaum estabeleceu o conceito do controle da qualidade total em seu livro Total quality control, publicado em 1961. Foi vice-diretor de operações e controle da qualidade da General Electric Company. Pregava que a qualidade é responsabilidade de cada indivíduo dentro da empresa. Também difundiu a abordagem dos custos da não-qualidade como justificativa para obter o com- prometimento da alta administração. Phillip B. Crosby Crosby rejeitou a idéia de que sempre haveria um percentual incon- trolável de peças defeituosas. Desenvolveu o conceito de defeito zero durante a década de 1960. Foi ele quem popularizou a célebre frase sobre "fazer certo da primeira vez". Em 1979, publicou o livro Quality is free, em que segue a linha de pensamento dos demais gurus da época, comprovando mais uma vez que os custos da não-qualidade são tão altos que os investimentos necessários para melhoria da qualidade são mais do que compensados pela sua redução. Kaoru Ishikawa Dentre inúmeras contribuições significativas para a administração da qualidade, Ishikawa ficou conhecido pelo desenvolvimento do diagrama de causa e efeito, também conhecido como diagrama espinha de peixe ou, sim- plesmente, diagrama de Ishikawa. Também foi o mentor dos círculos de con- trole da qualidade (CCQ), em que os funcionários da organização são envolvidos para discutir problemas e propor soluções de melhoria da qualidade. Ishikawa criou ainda o conceito de cliente interno na organização, por meio do qual o processo posterior, ao ocupar o status de cliente, reforça um dos princípios básicos da qualidade: o processo seguinte não deve receber peças defeituosas do processo anterior. Ishikawa chegou a definir qualidade como "fazer as coisas óbvias", argu- mentando que 95% dos problemas inerentes à qualidade podem ser resolvidos apenas com o uso das sete ferramentas básicas da qualidade, que serão apre- sentadas mais adiante neste capítulo.
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