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Cálculo C 2ª edição César Augusto Costa Brazcubas Mogi das Cruzes - SP 2018 Reitor: Prof. Maurício Chermann EQUIPE PRODUÇÃO CORPORATIVA Gerência: Adriane Aparecida Carvalho Coordenação de Produção: Diego de Castro Alvim Coordenação Pedagógica: Karen de Campos Shinoda Equipe Pedagógica: Alessandra Matos, Graziela Franco, Rúbia Nogueira, Vania Ferreira Coordenação Material Didático: Michelle Carrete Revisão de Textos: Adrielly Rodrigues, Aline Gonçalves, Claudio Nascimento, Telma Santos Diagramação: Amanda Holanda, Douglas Lira, Fábio Francisco, Nilton Alves, Priscila Noberto Ilustração: Everton Arcanjo, Noel Gonçalves Impressão: Grupo VLS / Gráfica Cintra Imagens: Fotolia / Acervo próprio Os autores dos textos presentes neste material didático assumem total responsabilidade sobre os conteúdos e originalidade. Proibida a reprodução total e/ou parcial. © Copyright Brazcubas 2017 Av. Francisco Rodrigues Filho, 1233 - Mogilar CEP 08773-380 - Mogi das Cruzes - SP Sumário Sumário Apresentação 5 O Professor 7 Introdução 9 1Unidade I Funções de várias variáveis 11 1.1 Visão Geral 11 1.1.1 Curvas de Nível 14 1.1.2 Limite e continuidade 16 1.2 Funções compostas 22 Referências da unidade I 23 2Unidade II Derivadas parciais 25 2.1 Ampliando o conceito de derivada 25 2.1.1 Interpretação geométrica das derivadas parciais 30 2.2 Diferenciabilidade e derivada total 33 2.3 A regra da cadeia 36 2.3.1 Derivada implícita 38 2.4 Derivadas direcionais 39 2.5 Plano tangente e a normal à superfície 42 2.6 Uma aplicação simples à engenharia 43 Referências da unidade II 46 3Unidade III Equações diferenciais 47 3.1 O que são EDOs? 47 3.2 Equações diferenciais de 1ª ordem 48 3.2.1 Equações diferenciais homogêneas lineares 53 3.2.2 Equações diferenciais lineares 54 3.2.3 Aproximação 58 3.3 Equação homogênea de 2ª ordem 63 3.3.1 Equação linear de 2ª ordem 66 3.4 Aplicações à engenharia 69 3.4.1 Vibração de um prédio sob uma força externa 69 3.4.2 Circuitos elétricos 70 3.4.2.1 Circuitos RC 70 3.4.2.2 Circuito RLC em série 71 Referências da unidade III 72 4Unidade IV Integrais múltiplas 73 4.1 Integrando conceitos 73 4.2 Integrais duplas 76 Sumário 4.2.1 Integrais duplas em coordenadas cilíndricas 82 4.2.2 Momento e centro de massa 86 4.2.3 Área superficial 88 4.3 Integrais triplas 89 4.3.1 Integrais triplas em coordenadas cilíndricas e esféricas 92 4.4 Mudanças de coordenadas e o Jacobiano 96 Referências da unidade IV 101 5 Apresentação Apresentação Caro(a) aluno(a), Embora, por muitas vezes incompreendida, a Matemática é a principal ferra- menta por trás da construção do conhecimento lógico e da solução de problemas do nosso cotidiano. Mas, como estabelecer a ponte entre o que aprendemos na teoria matemática e em suas aplicações na ciência e na engenharia? A profissão de engenheiro tem como uma de suas principais funções a capaci- dade de solucionar problemas. Neste contexto, a Matemática lhe dará habilidade de modelar e codificar situações reais e até mesmo cotidianas permitindo, através do uso de seus conceitos e técnicas, a interpretação de resultados para a solução das mais diversas situações. O conceito inicial de derivada de funções de uma variável nos leva a compreen- são do conceito de taxas de variação. Um conceito útil quando estudamos na Física, por exemplo, grandezas como a aceleração que representa uma variação da velo- cidade no tempo. Já o estudo das integrais nos permite observar, em um domínio pré-estabelecido, o comportamento global da modelagem de um sistema. Neste livro estudaremos estas ferramentas aplicadas a funções de várias va- riáveis. Estas funções são, comumente, utilizadas em cálculos de volumes, pressão de um gás, comportamento de um circuito elétrico, balanceamento de forças em estruturas da construção civil etc. Assim, apresentaremos novos conceitos como: derivadas parciais, que repre- sentam a taxa de variação de uma função dependente de várias variáveis indepen- dentes; e o de integrais múltiplas que permite o cálculo de volumes, forças resultan- tes sobre uma superfície etc. Além disso, teremos o conceito de equações diferenciais, ou seja, equações nas quais a incógnita é uma função apresentada sob a forma de suas derivadas. As equa- ções diferenciais são aplicadas nas mais diversas áreas desde a física até outras ativida- des sociais ou humanas. Num circuito elétrico, por exemplo, elas descrevem a equação da soma das quedas de tensão em indutores e resistores. Em um estudo populacional, auxiliam na avaliação do crescimento ou decrescimento de uma população. As aplicações são diversas e as possibilidades são infinitas mas, para utilizá-las com sabedoria e coerência, é preciso compreender a teoria matemática destes con- ceitos. 6 Apresentação Aqui você aprenderá sobre os principais conceitos do cálculo de funções de várias variáveis não só do seu ponto de vista teórico, você poderá, também, observar sua aplicação através de exemplos relacionados às Engenharias Elétrica e Civil. Que tal começarmos já? Bons Estudos! Objetivos da Unidade: • Estudar as características de funções de duas ou mais variáveis; • Calcular o limite e estimar a continuidade de funções com mais de uma variável; • Conhecer superfícies quádricas e suas equações características; • Entender a relação entre as várias variáveis de uma função pelas suas derivadas parciais; • Aplicar conceitos de integrais múltiplas para o cálculo de volumes e probabilidades; • Fornecer ferramentas para modelagem matemática de problemas através de equações diferenciais ordinárias. Competências e Habilidades da Unidade: • Interpretação da representação do domínio de funções com várias variáveis; • Compreensão de gráficos de funções de duas variáveis; • Entendimento da noção de limite e continuidade de funções de vá- rias variáveis; • Capacidade de modelar matematicamente problemas do cotidiano da Engenharia. 7 O Professor O Professor Prof. César Augusto Costa Graduado em Matemática pela Universidade do Planalto Catarinense (1999), mestre (2002) e doutor (2005) em Astrofísica pelo Instituto Nacional de Pes- quisas Espaciais. Tem experiência nas áreas de Física e Matemática, com ênfase em Modelagem Matemá- tica, Análise e Aquisição de Dados, e Estatística Apli- cada. Realizou pós-doutorado (2008 - 2012) no LIGO (Laser Interferometric Gravitational Observatory) e na LSU (Louisiana State University) em Baton Rouge e par- ticipou da primeira detecção de ondas gravitacionais, pela qual recebeu vários prêmios acadêmicos. Introdução 9 Introdução Na Análise Matemática e Aplicações em Geometria, Matemática Aplicada, En- genharias, Ciências Naturais, Economia etc., uma função de várias variáveis ou fun- ção real multivariada é uma função com mais de um argumento. Até agora, nas disciplinas de Cálculo, estávamos utilizando funções com uma única variável, do tipo . A partir de agora, começaremos a introduzir funções de várias variáveis, nas quais as funções terão a forma , podendo ter duas ou mais variáveis. A ênfase neste tópico é especialmente importante para estudantes de En- genharia. Esta disciplina visa aprofundar o entendimento conceitual e a intuição geométrica para ideias chaves do Cálculo de várias variáveis. Este aprofundamento fornecerá o conhecimento que o estudante precisará para modelar e solucionar matematicamente a maior parte dos problemas que encontrará no dia a dia de sua carreira como engenheiro. Um pré-requisito para esta disciplina seria uma boa base no Cálculo de uma variável e em Geometria Analítica. Então,vale a pena dar uma boa revisada nos con- ceitos vistos nos Cálculos A e B, e sua relação com a Geometria Analítica. Para tanto, sugiro uma boa releitura do volume 1 do livro “O Cálculo com Geometria Analítica” de Louis Leithold (mais informações nas referências da Unidade I). Começaremos este livro didático introduzindo os conceitos necessários para entender e manipular funções de várias variáveis, na Unidade I. Lá aprenderemos como determinar o domínio de funções com duas ou mais variáveis. Utilizaremos normalmente funções com duas variáveis por serem mais fáceis de serem visua- lizadas, mas você verá que facilmente os conceitos podem ser extrapolados para quantas variáveis se façam necessárias. Já na Unidade II, nos ocuparemos das relações entre a função de várias variá- veis e as suas variáveis de forma independentes. Através das derivadas parciais ve- remos como é a inclinação local, com relação a cada um de seus eixos coordenados, de uma superfície gerada por uma função de várias variáveis. Mudamos um pouco a ordem costumeira encontrada na literatura, e na Uni- dade III trataremos de uma das ferramentas mais úteis na vida cotidiana de um Engenheiro, as Equações Diferenciais Ordinárias (EDOs). As EDOs são equações que envolvem derivadas ordinárias, em oposição às derivadas parciais. As EDOs mode- Introdução 10 lam sistemas físicos corriqueiros na Engenharia Elétrica e Civil, como circuitos elé- tricos e deslocamento de vigas, por exemplo. Sendo uma ferramenta fundamental para a atividade do engenheiro Finalmente na Unidade IV introduziremos o conceito de integrais múltiplas, por considerarmos que elas estão intimamente relacionadas às derivadas parciais e, portanto passam a ser uma ferramenta importante para a solução de equações diferenciais envolvendo várias variáveis. Dada à compacidade deste material tentaremos ser sucintos, e nos ateremos aos pontos que julgamos ser mais importantes para o conteúdo desta disciplina. Você deve ter em mente que este não deve ser o único material de estudo e que deve explorar a disciplina nos livros referenciados. Lá você encontra mais exemplos e casos particulares que devem ser compreendidos. Espero que você aprecie este livro que foi feito com carinho para guiar seus estudos. O Cálculo C será uma importante ferramenta de trabalho cujo domínio fará de você o excelente profissional. Aproveite e sucesso! 11 Funções de várias variáveis unidade I 1Unidade I Funções de várias variáveis Fonte: <http://www.princeton.edu/~oa/manual/images/colorfront.jpg>. Acesso em: 10/05/2017. 1.1 Visão Geral Nas disciplinas anteriores de Cálculo estávamos sempre ocupados com fun- ções que mapeavam um número real em um número real, ou seja, . Isto significa que um único número real aplicado à função nos retornaria um único número real , o que chamávamos de função real de uma variável. Agora vamos estender todos os conceitos utilizados no Cálculo para funções com várias variáveis, assim irá mapear vários números em um único número tam- bém real, ou seja, . Isto significa que n números reais serão mapeados em um único número também real através de uma função, . Vamos começar por e, à medida que formos avançando, estenderemos os conceitos para ; de forma geral, os conceitos que apresentaremos esten- dem-se a todos os valores de n. Uma função mapeia um par de valores em um único valor real , ou seja, , como mostra a Figura 1.1. Assim, uma determinada região do plano será mapeada em um dado intervalo de valores sobre a reta real. 12 Funções de várias variáveisUnidade I Figura 1.1 - Função Fonte: Elaborada pelo autor. Em geral, este mapeamento de duas variáveis em uma terceira variável tem como resultado uma superfície tridimensional. Assim, o sistema de coordenadas tri- dimensional é uma forma conveniente de visualizar tais funções, e as superfícies delas emergentes. Dica de Leitura: No decorrer do conteúdo deste livro utilizarei o Geogebra, disponível em: <www.geogebra.org>, para representar as funções, domínios, e demais gráficos. O Geogebra é um aplicativo educacional multiplata- forma livre que reúne várias ferramentas matemáticas para o Cálculo, Geometria etc., muito úteis e fáceis de programar. O código fonte (ar- quivos figura_X.X.ggb) de todas as figuras apresentadas neste material estão disponibilizados na Midiateca. Utilizando o aplicativo permitirá que você visualize e manipule as figuras e propriedades apresentadas durante a disciplina. Exemplo 1.1 Considere , apresentada na Figura 1.2. Escrevendo-a como , reconhecemos a mesma como um plan o. Podemos, então, pensar em e como variáveis independentes e em z com o a variá- vel dependente delas. 13 Funções de várias variáveis unidade I Figura 1.2 - Representação gráfica de Fonte: Elaborada pelo autor. Cada ponto no plano , ao qual estamos habituados, é mapeado em um ponto onde, é claro, . Assim, o domínio D de f é o conjunto de todos os pares e a imagem Im de f são os valores de . Algumas funções terão restrições nos pares possíveis e, portanto, a região ocupada (domínio) no plano será limitada. Exemplo 1.2 Veja a função , apresentada na Figura 1.3 . Tal função somente é definida para , já q ue não existe raiz quadrada de números negativos, ou seja, . Como apresentado na Figu ra 1.2. 14 Funções de várias variáveisUnidade I Figura 1.3 - Representação gráfica do Domínio (esquerda) e da função (direita) Fonte: Elaborada pelo autor. Algumas vezes você perceberá que será necessário examinar uma função em regiões restritas do plano , como por exemplo, linhas. Isto seria como “fatiar” a superfície tridimensional , ao longo de uma linha, representada por . Também poderá ser útil identificar pares que compartilham um valor de z co- mum. 1.1.1 Curvas de Nível Os pares que compartilhando um valor de z comum normalmente for- mam uma curva que costumamos chamar de curva de nível, uma vez que possuem a mesma cota, ou altura, . Em outras palavras uma curva de nível fatia a super- fície ao longo do plano . Um gráfico que mostra curvas de nível pode dar uma boa ideia da forma da superfície, e é muitas vezes utilizado para representar mapas topográficos, como o da figura que ilustra esta unidade. Note que, naquele mapa topográfico, as curvas de nível correspondente às alturas são igualmente espaçadas, e ficam mais e mais próximas à medida que a superfície se torna mais íngreme. 15 Funções de várias variáveis unidade I Exemplo 1.3 Veja esta função , mostrada na Figura 1. 4. Ela parece um pouco complexa, mas ilustra bem o estamos tratando. Note pela figura que as curvas de nível representam as linhas de interseção ent re os planos com a função . Figure 1.4 - Representação da função e suas respectivas curvas de nível Fonte: Elaborada pelo autor. Dica de Leitura: Após instalar o Geogebra, abra o arquivo figura_1.3.ggb disponibili- zado na midiateca. Altere os valores dos planos, deslizando as barras para os valores de k, m e l e perceba como as curvas de nível se alte- ram. A função se comportam da mesma forma que funções de duas va- riáveis. A principal dificuldade será visualizá-las, elas não cabem nas três dimensões que estamos acostumados. Para três variáveis , há várias formas de interpretar tais funções o que 16 Funções de várias variáveisUnidade I torna mais fácil entendê-las. Por exemplo, pode representar a tempera- tura em um ponto , ou ainda, a pressão ou intensidade do campo magnéti- co naquele ponto. Ainda é útil considerar aqueles pontos onde , onde algum valor constante. Se representara temperatura em um ponto , por exemplo, representará todos os pontos do espaço que pos- suem temperatura igual a . De forma geral, este conjunto de pontos é chamado de conjunto de nível. No caso de duas variáveis temos as curvas de nível, já para o caso de três ou mais variáveis temos uma superfície de nível. Exemplo 1.4 Suponha que a temperatura em um ponto seja dada por . Esta função tem seu valor máximo na ori- gem, e tende a zero a medida que se afasta da origem em todas as direções. Se tomarmos , o conjunto de pontos satisfaz a equação , a qual representa uma esfera. Assim, as superfícies de nível são esferas concêntricas centradas na origem, com raio . Funções de duas variáveis que envolvem relações quadráticas rece- bem o nome de quádricas. Sugiro que você cheque o material auxiliar quádricas.pdf, disponibilizado na midiateca, para aprender a reco- nhecer estas formas. 1.1.2 Limite e continuidade Nos passos iniciais no desenvolvimento do Cálculo para funções de uma va- riável, precisamos construir o conceito de limite, o qual foi necessário para enten- dermos a noção de continuidade de funções e a consequente definição de derivada. Limites envolvendo funções de duas variáveis podem ser consideravelmente mais difíceis de tratar do que funções de uma variável. Felizmente, a maior parte das funções que encontramos no dia a dia é relativamente simples e fácil de entender. 17 Funções de várias variáveis unidade I Se desejamos dizer que , precisamos capturar a ideia de que a medida que se aproxima de , teremos se aproximando de . A dificuldade está em como nos aproximamos do ponto . Existem mais formas de fazê-lo do que no caso de uma única variável. Se você se recorda, no caso de uma variável, você poderia se aproximar de um valor , ou pela direita ou pela esquerda na reta dos reais. Agora, para o caso de duas variáveis, podemos fazer uma analogia com um ponto desenhado em uma folha de papel. Há inúmeras formas de se aproximar de tal ponto, não só pela direita e pela esquerda, concorda? Há um número infinito de linhas, um número infinito de parábolas, um número infinito de senoides, e assim por diante, que podemos percorrer para nos aproximarmos de um ponto . Podemos ascender uma esperança de que as coisas não são tão ruins quanto parecem, e independente do caminho que eu tome, desde que passando por , o valor de se aproxima de , a medida que se aproxima de . Infeliz- mente, isto não é verdade. Exemplo 1.5 Vamos ver como isso funciona, em um exemplo clássico, considerando a função de duas variáveis . É fácil perceber que quando ou o valor da função é também zero. Assim, o limite de ao aproximar-se da origem ao longo ou do eixo ou do eixo e zero. O mesmo acontece se nos aproximarmos da origem percorrendo a reta , . À medida que se aproxima de zero, também se aproxima de zero e, portanto, o limite de será zero. Agora, vamos imaginar que nos aproximamos da origem pela parábola . Então, E o limite de será ? Observe pela Figura 1.5 que este caminho cor- responde a uma borda na parte superior da superfície definida por . Po- rém, quando esta borda se aproxima da origem ela mergulha para zero na ori- gem, contudo ao longo da borda a função tem valor constante. Lembre-se que para existir o limite em um ponto, ele deve ser único, portanto o limite em (0,0) não existe. 18 Funções de várias variáveisUnidade I Figura 1.5 - Representação da função e o plano z=1/2 Fonte: Elaborada pelo autor. Felizmente, aprendemos a definir o conceito de limite sem a necessidade de especificar como nos aproximamos de um ponto em particular. Não precisamos do conceito de “se aproximar”, e sim do conceito de proximidade. Em outras palavras, precisávamos definir quão próximo estava de a e quão próximo ficava de , ou neste caso, quão próximo está de e, então, quão próximo está de . E, podemos adaptar este conceito de limite facilmente para duas variáveis. DEFINIÇÃO 1.1 LIMITE Suponha uma função . Dizemos que: Se para todo existe um tal que Isto quer dizer que podemos encontrar um valor para ε tão pequeno quanto se queira de tal forma que , não importando quão pequeno seja o ε, fazendo a distância entre e seja “pequena o suficiente” para dizermos que é o mesmo ponto. Observe que define uma circunfe- rência centrada em com raio , como mostra a Figura 1.6. Portanto, se for interior a esta circunferência para um dado δ escolhido, e , sendo ε também escolhido, o . 19 Funções de várias variáveis unidade I Figura 1.6 - Definição de limite para uma função de duas variáveis Fonte: Elaborada pelo autor. Exemplo 1.6 Vamos mostrar que . A superfície oriunda de é apresentada na Figura 1.7. Vimos, no exemplo anterior, que o limite calcula- do para uma função pode ser diferente dependendo do caminho que toma- mos para calculá-lo. Para evitar a falta de unicidade no limite da função, vamos imaginar um , mas bem pequeno e que ainda , ou seja, Podemos desmembrar o módulo em fatores, tal que Note que para todos os valores de e que pela Definição 1.1. Então, no limite Vamos forçar o produto a ser menor que o ε que escolhemos. Se fizermos que o seja muito pequeno e menor que , digamos . Ou seja, Que é o que queríamos mostrar. 20 Funções de várias variáveisUnidade I De forma geral, esta metodologia pode ser estendida a todos os testes de limi- tes para funções de duas ou mais variáveis. Experimente usar outro valor para o limi- te, como por exemplo , e verá que chegará a uma inconsistência do tipo . Figura 1.7 - Representação de Fonte: Elaborada pelo autor. Como funções contínuas de várias variáveis são onipresentes na Matemática, é importante definir a noção de continuidade sem nenhuma referência à noções mais gerais entre mapeamento contínuo e espaços topológicos. Conheça mais: Como funções de várias variáveis envolvem superfícies, dizer que ela é contínua, de forma geral, em um ponto (x,y,z,…) demanda conceitos um pouco mais avançados de espaços topológicos como vizinhança, interior, borda etc. Aqui tentaremos abordar o assunto de uma forma mais simples, mas é sempre interessante avançar nos estudos. Sugiro o livro do Elon Lages Lima listado na bibliografia como uma aborda- gem mais profunda sobre o assunto. 21 Funções de várias variáveis unidade I Relembre-se do Cálculo Diferencial que uma função é dita contínua em . Uma forma de entender este é imaginar que não existe nenhum “buraco” ou “pulo” em . Podemos dizer exatamente a mes- ma coisa para funções de duas variáveis e estendê-la a funções com várias variáveis: DEFINIÇÃO 1.2 CONTINUIDADE Suponha uma função . Dizemos que é contínua se: Em outras palavras, para que uma função seja contínua em um determinado ponto , é necessário que o limite naquele ponto exista, e além disso ele seja único e igual a . Exemplo 1.7 Sabemos que é indefinida em (0,0), pois acabamos com . Mas sabemos pelo Exemplo 1.6 que: Então podemos estender este conceito e dizer que: Só podemos fazer isso por que o limite existe para qualquer , inclusive . O mesmo não é verdade para a superfície do Exemplo 1.5. Não importa o valor que atribuímos a , a superfície sempre terá um “pulo” lá. Felizmente, grande parte das funções que iremos examinar é, tipicamente, contínua em todos os lugares. Normalmente, isto se deve ao fato de que funções de várias variáveis relacionadas a funções contínuas de uma variável são contínuas. Como com funções de uma única variável, duas classes comuns de funções são par- ticularmente úteis e fáceis de descrever. Um polinômio de duas variáveis é uma soma de termos na forma , ondea é um número real e e são inteiros positivos. E, polinômios compõem a classe de funções polinomiais, como por exemplo, . Já funções racionais são razões entre polinômios, como por exemplo, . 22 Funções de várias variáveisUnidade I TEOREMA 1.1 Funções polinomiais são contínuas em todos os lugares. Funções racionais são contínuas em todos os lugares onde são definidas. É fácil mostrar que é contínua para todo . Porém, a função apresenta uma descontinuidade os pontos em que . Como mencionamos anteriormente, todos estes conceitos podem ser esten- didos a funções de três ou mais variáveis, simplesmente fazendo-se o dimensiona- mento adequado. Da mesma forma, podemos compor funções com números de variáveis diferentes, de forma a parametrizar funções e deixá-las mais simples. 1.2 Funções compostas Suponha uma função na forma . Isto é, w é a variável dependente e e as variáveis independentes. Agora suponha outra função , na forma , ou seja, é um vetor cujas componen- tes são funções de e . Neste caso, e são variáveis dependentes e, s e t, as variáveis independentes. Note que as componentes de correspondente ao ponto ou vetor . Tais componentes são e são chamadas de funções componentes de . Se segue que a composição de com é uma nova função , definida como: Exemplo 1.8 Suponha uma função . E que Então, Logo, 23 Funções de várias variáveis unidade I A composição de funções pode ser utilizada para simplificar funções, o que será útil mais a frente quando estivermos manuseando integrais múltiplas e equa- ções diferenciais parciais. Aprendemos que: O Cálculo para funções de várias variáveis funciona de forma muito análoga ao Cálculo com funções de uma variável. No entanto, ao invés de estarmos trabalhando sobre a reta dos reais R as funções de várias variáveis representam superfícies sobre o espaço dos números reais R^n. Isto gera diferenças na abordagem de conceitos como limite e continuidade, pois podem apresentar diferentes resultados dependen- do do caminho percorrido sobre a superfície. No entanto, esta dificul- dade pode ser contornada quando utilizamos conceitos emprestados da Topologia como vizinhança, proximidade e bordas. A Topologia é um ramo da Matemática que se ocupa da conectividade entre pontos adjacentes, em uma superfície , por exemplo. Aqui os apresentamos de forma mais geral, mas vale a pena se aprofundar e pesquisar mais sobre a Análise Matemática por trás destes conceitos. Referências da unidade I LARSON, Ron; ALLTASKS (Trad.). Cálculo aplicado. São Paulo, SP: Cengage Learning, 2011. 633 p. ISBN 978-85-221-0734-6. LEITHOLD, Louis. O cálculo com geometria analítica. vol. 1. 3. ed. São Paulo, SP: Harbra & Row, 1990. 1-908. ______. O cálculo com geometria analítica. vol. 2. 3. ed. São Paulo, SP: Harbra & Row, 1990. 909-1174. LIMA, Elon Lages (2013). Análise Real - Funções de uma variável. Col: Coleção Mate- mática Universitária. 12. ed. [S.l.]: IMPA. 198 páginas. ISBN 978-85-244-0048-3. STEWART, James; MORETTI, Antonio Carlos; MARTINS, Antonio Carlos Gilli (Trad.). Cálculo. vol 2, São Paulo, SP: Cengage Learning, 2011. Cap. 14. 536 - 1077 p. ISBN 978-85-221-0660-8. 25 Derivadas parciais unidade II 2Unidade II Derivadas parciais Fonte: Elaborada pelo autor 2.1 Ampliando o conceito de derivada Na unidade anterior, discutimos limite e continuidade para funções com mais de uma variável. Mostramos que os conceitos podiam ser estendidos a partir da no- ção de suas representações para funções de uma variável. Nesta unidade trabalha- remos de forma análoga, estendendo o conceito de derivada que já conhecemos do Cálculo Diferencial de uma variável para funções de mais de uma variável. Lembre-se de que para uma dada função de uma variável , sua derivada, ou representa a taxa com que a função muda à medida que varia. Pode- mos estimar a taxa de variação em um ponto , aplicando o conceito de dife- renciabilidade da função, ou seja, 26 Derivadas parciaisunidade II Figura 2.1- Função e sua derivada. Fonte: Elaborada pelo autor. Observe pela Figura 2.1 que a derivada se aproxima da tangente da curva no ponto à medida que o valor de muda. Isto nos diz quão inclinada é a função no ponto. Dica de Leitura: Lembre-se de que o código fonte do Geogebra de todas as figuras apresentadas neste material está disponibilizado na midiateca. No caso do arquivo figura_2.1.ggb, sugerimos que você altere os valores de a e nas barras de rolagem para verificar como a inclinação da reta que liga muda à medida que você altera os va- lores de . O mesmo é válido para as outras figuras desta unidade. Este é um conceito muito importante e não iremos perdê-lo para o caso de fun- ção de mais de uma variável. A diferença é que há mais de uma variável. Em outras palavras, temos que pensar se só uma ou outra variável está mudando enquanto a outra permanece fixa ou se ambas estão mudando. E, como vimos para o caso do limite, há infinitas formas dessa variação ocorrer, dependo do caminho que você tomar para calculá-la. Por exemplo, uma variável pode mudar mais rápido que outra (ou outras) na função. 27 Derivadas parciais unidade II Precisamos então desenvolver formas de lidar com todos esses casos, e esti- mar qual a variação de uma função com relação as suas variáveis. Vamos nos fixar em um caso especial com duas variáveis, ou seja, uma , onde uma variável é mantida fixa, enquanto deixamos a outra variar, com uma função relativamente simples. Figura 2.2 - Função Fonte: Elaborada pelo autor. Considere , apresentada na Figura 2.2. Queremos então calcu- lar a variação de em um ponto . Note que a escolha de um par determina um ponto no plano , o qual é uma projeção do ponto pertencente à superfície (uma linha vertical ao plano liga e ). Vamos primeiramente manter fixo, tal que . Neste caso, teríamos: Tal função descreve uma parábola contida no plano e pertence à . Portanto, esta é agora uma função de uma única variável e podemos deter- minar a inclinação, pois: Vamos chamar de a derivada parcial de com relação a em , que denotaremos por: 28 Derivadas parciaisunidade II De forma análoga, vamos fixar , assim teríamos: E, Neste caso, vamos chamar de a derivada parcial de com relação a em , que denotaremos por: Note que, usualmente, não utilizamos para derivadas parciais, e sim , assim, teríamos: e É fácil perceber que tomar a derivada parcial de uma função com mais de uma variável é o mesmo procedimento que utilizávamos para a derivada de uma função de uma variável. Só o que temos que fazer é considerar as demais variáveis como constantes. Ou seja, se formos calcular , será considerada constante; e se formos calcular a , será considerada constante. Assim, podemos estender o conceito de derivada às derivadas parciais e tere- mos: Como mencionamos anteriormente, os conceitos que se aplicam às funções de uma variável se estendem às funções com mais de uma variável, com a única diferen- ça que você encontrará mais variáveis para tratar. Para a notação fracionária para as derivadas parciais, note a diferença entre a derivada para uma função de uma variável e a derivada parcial para função de mais de uma variável: O símbolo nos diz que há mais de uma derivada. 29 Derivadas parciais unidade II Existem várias notações para derivadas parciais, e é importante iden- tificá-las. Dada uma função z=f(x,y), todas as notações abaixo são equivalentes: Vamos trabalhar sobre alguns exemplos mantendo em mente que as deriva- das parciais são tomadas segundo todas as variáveisindependentes da função. Isto é importante, pois para cada derivada parcial as demais variáveis serão consideradas constantes. Exemplo 2.1 Considere a função . Vamos determinar primeiramente a derivada parcial com relação à , ou seja, . Neste caso, devemos considerar qualquer dependência às outras variáveis (no caso, ), como constante, ou seja, as derivadas de e de 10 são nulas. Portanto, Da mesma forma, Logo, e são as derivadas parciais de . O mesmo procedimento se estende a funções com três ou mais variáveis. Veja o Exemplo 2.2. 30 Derivadas parciaisunidade II Exemplo 2.2 Considere a função . Teremos, Logo, Veja que como a função depende de três variáveis, temos três derivadas parciais. 2.1.1 Interpretação geométrica das derivadas parciais Considere novamente a superfície da figura 2.2, descrita pela função, . Podemos realizar um “corte” nesta superfície, digamos em . Lembre-se que isto definirá uma nova função , que é a sessão transversal da superfície naquele valor para . Assim, tal sessão transver- sal pode ser projetada no plano , e é a parábola , como apresentado na Figura 2.3. 31 Derivadas parciais unidade II Figura 2.3 - Função e sua derivada em . Fonte: Elaborada pelo autor. Veja que os valores de representam os valores de com . Portanto, a derivada parcial de com relação à , estimada em um ponto , representa a inclinação da parábola com relação ao eixo x naquele ponto. De forma similar, . Então, a reta tangente à , em , será dada por Se tomarmos, por exemplo, , como na Figura 2.3, teremos: Analogamente, a reta tangente a , será dada por: Que em 32 Derivadas parciaisunidade II Essas duas retas tangentes são perpendiculares e definem um plano, o qual é tangente à superfície no ponto , mostrado na Figura 2.3. Derivadas parciais de funções de duas variáveis desenvolvem-se a par- tir de retas tangentes e perpendiculares no espaço com três dimensões e planos tangentes. O tratamento de retas e planos exige o co- nhecimento de suas equações, que você poderá encontrar no material auxiliar vetores_retas_e_planos.pdf, disponibilizado na Midiateca, para aprender a reconhecer essas formas. Após uma rápida olhada no material auxiliar, você será capaz de perceber que a equação do plano tangente à superfície no ponto B, será dada por: Vamos ver um exemplo: Figura 2.4 - Plano tangente ao hemisfério superior da esfera em . Fonte: Elaborada pelo autor. 33 Derivadas parciais unidade II Exemplo 2.3 Encontre o plano tangente à , no ponto . Note que a equação descreve uma esfera, como mostra a Figura 2.4, (lembre-se das quádricas!) e o ponto A está no hemisfério superior, então podemos usar Então, as derivadas parciais serão: e Assim, a equação do plano tangente à esfera, no hemisfério superior, se torna: Adotando , encontramos: *Se o ponto estivesse no hemisfério inferior utilizaríamos o sinal negativo em frente ao radical. 2.2 Diferenciabilidade e derivada total À primeira vista, parece que para encontrarmos o plano tangente a uma su- perfície basta encontrar as duas derivadas parciais, e . E, isso é verdade se o plano tangente existe. Mas, infelizmente, nem sempre que e existem, o plano tangente existirá. Considere novamente a função do Exemplo 1.5. Tal função tem valor nulo se ou são iguais à zero. Contudo, lembre-se que essa função é descon- tínua em (0,0). Podemos até tentar emendar a superfície, e “tampar o furo” dizendo que . Assim, poderemos também dizer que e , uma vez que as retas tangentes naquele ponto definem os eixos e , e o plano corres- pondente . Mas, note que não há nada especial com o plano para ser chamado de “plano tangente”. 34 Derivadas parciaisunidade II O que precisamos mesmo para definir um plano tangente (da mesma forma que uma reta tangente) em um ponto é a possibilidade de conseguir uma boa apro- ximação dele próximo daquele ponto. Definição 2.1 Sejam e , onde . A função é diferenciável em , se onde e são números muito pequenos e próximos de zero, que ficam ainda menores quando se aproxima de . A Definição 2.1 pode levar um tempo para ser absorvida, então vamos discutir um pouco sobre ela. Vamos começar reescrevendo a equação usando a asserção inicial que diz que , então: Note que os três primeiros termos descrevem o plano tangente em . Então, podemos dizer que temos um plano tangente com um pequeno desvio, dado por . Enquanto se aproxima de , tanto quanto se aproximam de 0. Isto significa que se aproxima de 0 ainda mais rapi- damente, uma vez que é muito menor que e . Esta é então uma condição para existência do plano tangente. Isto que dizer que conforme nos aproximamos de , o plano descrito pela equação se aproxima continuamente do plano tangen- te. Veja a Figura 2.5: 35 Derivadas parciais unidade II Figura 2.5- Plano tangente determinado pela derivada total Fonte: Elaborada pelo autor. Por isso, não existe o plano tangente em para a função do exemplo 1.5, mesmo que forcemos um valor para , a transição dos planos tangentes aos pontos próximos a , que no caso possuem grandes derivadas, para um ponto com derivada nula, não se dá continuamente. Voltando à Definição 2.1, se imaginarmos que tanto e quanto se aproximam de 0 e, portanto, se tornam infinitesimalmente pequenos, e os produtos com e tornam-se desprezíveis. Essa situação pode ser observada na Figura 2.4. Assim, podemos reescrever a definição na forma infinitesimal Esta é o que chamamos de derivada total da função . Note que para ela existir, é necessária a continuidade das derivadas parciais no ponto onde queremos determiná-la. Teorema 2.1 - Diferenciabilidade Se uma função e suas derivadas parciais são contínuas em um pon- to , dizemos que a função é diferenciável naquele ponto. 36 Derivadas parciaisunidade II Em outras palavras, o Teorema 2.1 nos diz que os limites que definem a conti- nuidade da função em e suas derivadas parciais devem existir para garantir que a função seja diferenciável lá. 2.3 A regra da cadeia Recorde-se que quando introduzimos as funções de várias variáveis menciona- mos que as variáveis que julgamos independentes, são independentes entre si, mas podem depender de outras variáveis (veja Funções Compostas, subunidade 1.3). Considere a superfície e que , ou seja, e são variáveis independentes para , mas dependem de . Então, A qual nos diz explicitamente como depende de (a qual pode ser o tempo, por exemplo). Para os próximos passos, vale revisar as regras da diferenciação en- volvendo operações entre funções. Se você quiser calcular de forma mais direta, pode ser mais simples usar a regra da cadeia, pois: Preste atenção na segunda linha! Note que , então uma nova regra da cadeia surge naturalmente para as derivadas parciais: 37 Derivadas parciais unidade II Teorema 2.2 Suponha uma função diferenciável e que . Assu- mindo que a relevante derivada existe, O Teorema 2.2 é uma extensão da regra da cadeia para funções com duas variáveis, e sua extensão a funções com mais de duas variáveis torna-se intuitiva, bem como sua relação com a derivada total que vimos há pouco. Se e é também uma função de e , então: e E a extensão para uma funciona de forma análoga. Tente deduzir como ela seria. Exemplo 2.4 Considere a função com , para a qual deseja-se determinar a taxa de variação com relação ao tempo , ou seja, . Pela regra da cadeia: Note que os valores de e já dependem de , e a substituição de seus valo- res na expressão mostra a dependência da variação de com . Atéagora, pensamos em e como sendo independentes entre si, porém, podemos encontrar casos em que elas apresentam alguma forma de dependência implícita. 38 Derivadas parciaisunidade II 2.3.1 Derivada implícita Recorde-se que podemos utilizar a regra da cadeia para definir a derivada im- plícita, e aqui podemos fazer o mesmo. Isso será muito útil logo mais quando abor- darmos equações diferenciais. Suponha que a igualdade define implicitamente como uma fun- ção de , ou seja, . Então, . Podemos usar a regra da cadeia para derivar com relação à . Então, Note que a variação de uma variável com relação à outra depende da razão das derivadas parciais da função implícita, a qual define a relação entre elas. O que de certa forma parece intuitivo. Exemplo 2.5 Voltemos à esfera . Ela não é uma função de ou , da forma como estamos habituados. Mas, podemos pensar nela como duas funções, uma referente a cada um dos hemisférios da esfera: uma para o hemisfério superior, como vimos no exemplo anterior; e outra para o hemisfério inferior. Basta apenas trocar o sinal do radical, lembra? Assim, podemos pensar implicitamente em e como funções dos próprios e , e em . Como , mas pela regra da cadeia 39 Derivadas parciais unidade II Admitido que é independente de , então . Então, podemos encon- trar: E de forma similar, Tais quantidades (as derivadas parciais) mostram a taxa de variação do valor de à medida que se percorre a direção dos eixos ou , respectivamente, sobre a superfície de uma esfera. Mas, não respondemos ainda uma questão importante sobre uma superfície: Começando em um ponto da superfície, dada por uma f(x,y), e a percorrendo em uma direção particular, quão íngreme é a superfície? Agora, temos as ferramentas para fazê-lo. 2.4 Derivadas direcionais Embora sem perceber, já sabemos como responder à pergunta feita há pou- co . Já fizemos isso na Figura 2.2, quando estendemos uma linha vertical entre o ponto , pertencente ao plano , e o ponto pertencente à su- perfície . A Figura 2.5 mostra um detalhe da Figura 2.2, na qual podemos ver o plano tangente e os planos paralelos aos planos e . 40 Derivadas parciaisunidade II Figura 2.6 - Plano tangente e planos paralelos a e . Fonte: Elaborada pelo autor. Sabemos como determinar o plano tangente à superfície no ponto pela equação Que neste caso torna-se Na figura, vemos o plano tangente (é descrito pela equação acima) e os planos paralelos aos planos e , que contêm o segmento . Esta linha vertical é pa- ralela ao eixo . O ângulo entre ela e o plano tangente nos dá ideia de quão inclinada a superfície é com relação à direção , no ponto B. Mas, como este ângulo se com- porta quando nos deslocamos sobre a superfície através de um caminho qualquer a partir de ? Acontece que podemos fazer isso definindo um único vetor que varia ao lon- go do caminho que estamos percorrendo a partir de . Suponha um vetor unitário . A forma vetorial do caminho tomado será descrita por sendo a distância entre os pares e ao longo do caminho tomado. Isso significa que a linha tem um eixo efetivo com 41 Derivadas parciais unidade II origem em , a partir do qual podemos medir a inclinação do plano tangente. Lembre-se de que o plano tangente é definido pelas derivadas parciais e o ca- minho pelo vetor unitário , então: onde utilizamos a regra da cadeia e as derivadas . O vetor é muito importante, tanto que ele possui seu próprio símbolo, , o qual pronunciaremos como “Del f”, ou também chamado de gradiente de . O “Del” representado pelo operador nabla, , é um operador diferencial, que carrega as derivadas parciais com relação a cada um dos eixos coordenados. Por exemplo, para três dimensões definida pelos vetores direcionais . Agora, sabemos que dado um caminho e sua direção, podemos calcular a incli- nação do plano tangente em qualquer ponto da superfície (se ele existe). A inclinação de uma superfície na direção de um dado vetor unitário u é chamada de derivada direcional, e comumente simbolizada por . Exemplo 2.6 Vamos encontrar a inclinação de , no ponto (1,2) na direção do vetor . Primeiramente, calculamos o gradiente Que no ponto (1,2) nos dá O vetor unitário da direção é 42 Derivadas parciaisunidade II E a inclinação será É possível calcular o ângulo entre a tangente e a superfície, pois Portanto, Assim, o vetor tangente que é pertencente ao plano tangente e tem a direção do caminho escolhido possui coordenadas . 2.5 Plano tangente e a normal à superfície Agora temos todas as ferramentas para determinar o plano tangente e a nor- mal à superfície em um determinado ponto . Sabemos que o plano tangente será dado por Recorde-se que os coeficientes na equação de um plano, nesta forma, corres- pondem às coordenadas do vetor normal ao plano. Exemplo 2.7 Vamos encontrar vetor normal a , no ponto (1,2) na direção do vetor . Como é o vetor unitário na direção desejada, podemos facilmente encontrar o vetor tangente adicionando a terceira coordenada calculada no exemplo anterior, ou seja, . 43 Derivadas parciais unidade II Portanto, o vetor normal ao plano em é , ou seja, . Veja que , mostrando que o vetor tangente e o vetor normal são perpendiculares, como seria de se esperar. Conheça mais: É fácil perceber que as derivadas parciais são funções das variáveis independentes, assim como a função primitiva. Então, é intuitivo de- duzir que derivadas de ordem maior possam existir. Um exemplo seria a derivada parcial de segunda ordem, a qual é a derivada parcial das derivadas parciais. Seja uma , temos as derivadas parciais de primeira ordem E as derivadas parciais de segunda ordem serão Com Experimente mostrar isso com as funções que já conhecemos. 2.6 Uma aplicação simples à engenharia As derivadas parciais são úteis em uma infinidade de problemas relacionados à engenharia. Muitas das quantidades que o engenheiro trabalha em seu dia a dia são dependentes de mais de uma variável. Veja, por exemplo, a Lei de Ohm 44 Derivadas parciaisunidade II ou a Lei dos Gases Ideais , que relaciona pressão , temperatura e volume . A derivada parcial é usada para estimar erros no cálculo de quantidades que dependem de uma ou mais medidas com incertezas. Funções de energia relacio- nadas à termodinâmica são funções de duas ou mais variáveis. A maior parte das quantidades termodinâmicas (temperatura, entropia, capacidade térmica) pode ser expressa como derivadas parciais dessas funções. Muitas leis naturais são melhor expressas como relação entre derivadas par- ciais de uma ou mais quantidades. Por exemplo, a equação de Schrödinger descreve todas as leis da química e o comportamento de partículas atômicas Ou as equações de Navier-Stokes, que descrevem um fluido em movimento Onde Infelizmente, essas equações são um pouco complicadas de se resolver sem um método apropriado. Mas, vamos ver um exemplo mais simples. Figura 2.7 Cilindro submetido a forças de deformação (Exemplo 2.8). Fonte: Elaborada pelo autor. 45 Derivadas parciais unidade II Exemplo 2.8 A Figura 2.7 mostra uma barra cilíndrica de comprimento inicial e raio , sujeito a algumas forças. O volume do cilindro é uma função das duas variáveis independentes l e r Note que as forças e farão com que a barra deforme. Podemos calcular a deformação linear em cada direção a partir das propriedades elásticas da barra, mas como estão relacionadas à mudança de volume da barra? Primeiro, podemos definir a deformação em uma dada direção como a varia - ção de comprimento dividida pelo comprimento original.Assim, teremos: Deformação longitudinal: Deformação radial: Agora, voltando ao volume podemos definir Tomando a derivada total de Então, a mudança de volume, ou deformação volumétrica, é simplesmente a soma das deformações nas três direções perpendiculares (dois raios perpen- diculares mais comprimento). . 46 Derivadas parciaisunidade II Aprendemos que: No cálculo para funções de várias variáveis, a derivada funciona de forma muito similar ao cálculo com funções de uma variável. Ela con- tinua ainda representando a inclinação da função com relação a uma variável. Porém, como temos mais de uma variável teremos derivadas parciais referentes a cada uma delas. Elas se compõem para formar a derivada total , que determina a inclinação do plano com relação ao eixo . E para isso determinamos um plano tangente à superfície no ponto de interesse do qual naturalmente podemos obter o vetor normal. Aqui apresentamos essas noções de forma mais geral, mas vale a pena se aprofundar e pesquisar mais sobre o assunto, por meio de mais exemplos e outras aplicações dos mesmos. Referências da unidade II LEITHOLD, Louis. O cálculo com geometria analítica. vol. II. 3. ed. São Paulo, SP: Harbra&Row, 1990. STEWART, James; MORETTI, Antonio Carlos; MARTINS, Antonio Carlos Gilli (Trad.). Cálculo. vol II. São Paulo, SP: Cengage Learning, 2011. WREDE, Robert; SPIEGEL, Murray. Cálculo Avançado. 2. ed. Porto Alegre: Bookman, 2004. 47 Equações diferenciais unidade III 3Unidade III Equações diferenciais 3.1 O que são EDOs? No final da unidade anterior vimos um exemplo (exemplo 2.8) em que apli- cávamos o conceito de derivada total para definir como uma variável dependente mudaria com relação à taxa de variação de suas variáveis independentes. Essa é uma forma mais específica de uma equação diferencial parcial que depende de uma única variável, a qual chamamos de Equação Diferencial Ordinária (EDO). Uma equação diferencial contém um ou mais termos que envolvem derivadas de uma variável (variável dependente, digamos y) com respeito à outra variável (va- riável independente, digamos x ou t). Por exemplo, Diferentemente de equações algébricas, as soluções para equações diferen- ciais são funções e não números. Elas representam a relação de uma variável contí- nua e sua taxa de variação. Elas são essenciais em todas as investigações científicas. Na Física, Química, Biologia e outras áreas das Ciências Naturais, bem como áreas como Engenharias e Economia, utilizam as Equações Diferenciais para modelar ma- tematicamente seus fenômenos. 48 Equações diferenciaisunidade III Exemplo 3.1 Evidências observacionais sugerem que a tem- peratura de uma xícara de café (ou outr o líquido) em uma sala com temperatura constante dim inui ao lon- go do tempo com uma taxa proporciona l à diferença de temperatura entre o líquido e a sala. Em símbolos, se t é o tempo, T é a temperatura da sa la, e f(t) é a temperatura do líquido como uma funçã o do tempo, então onde k > 0 é uma constante que caracteriz a a transferência de calor do café (ou, em geral, do líquido) para a sala, e depe nde apenas do líquido em si, não da temperatura ou da sala. Essa é a Lei de Re sfriamento de Newton, e é descrita por uma equação diferencial ordinária. Normalmente, encontrar a solução geral para Lei de Resfriamento de Newton, ou seja, encontrar a função f(t) que descreve a temperatura do líquido ao longo do tempo, é praticamente impossível, e várias aproximações devem ser utilizadas. O uso e soluções de equações diferenciais são um ramo importante da Matemática. Aqui vamos ver como solucionar alguns tipos simples, mas bastante úteis de equa- ções diferenciais. Dica de Leitura: Lembre-se que quando a variável independente é o tempo podemos escre- ver a função y(t) e sua derivada será ou . Essa representação é muito comum no estudo de equações diferenciais e a utilizaremos normal- mente nesta unidade. 3.2 Equações diferenciais de 1ª ordem Vamos começar com equações diferenciais em que somente a primeira deriva- da da função aparece. 49 Equações diferenciais unidade III DEFINIÇÃO 3.1 Uma Equação Diferencial de 1ª Ordem é uma equação da forma . A solução da equação é uma função , que faz com que , para qualquer valor de t. Veja que F é uma função de três variáveis: t, f(t) e f’ (t). E, é entendido que aparece explicitamente na equação, mas t e y não precisam aparecer. A Equação de Resfriamento de Newton é um exemplo de equação diferencial de 1ª ordem, pois Outro exemplo de equação diferencial de 1ª ordem seria Pois Cujas soluções são todas as equações com a forma onde C é uma constante, a qual será definida quando atribuímos um valor inicial ao problema. DEFINIÇÃO 3.2 Um problema do valor inicial (PVI) para uma Equação Diferencial de 1ª Ordem é um sistema de equações da forma F(t,y, ) = 0, y(t0) = y0 , sendo t0 um tempo fixo e y0 o valor da função a ele associado. A solução para o PVI é uma função F(t) que também satisfaz a condição inicial f(t0) = y0. Por exemplo, o PVI envolvendo , tem solução . Parece simples neste caso, mas as equações de 1ª ordem são muito gerais e é complicado descrever um único método para solucionar todas elas, ou que mesmo 50 Equações diferenciaisunidade III funcione para grande parte delas. Imagine que , onde é uma função que depende de duas variáveis t e y. Em geral, podemos pensar em uma função que sirva de solução para um PVI, no entanto, nem sempre isso é trivial e pode ser impossível analiticamente. Exemplo 3.2 Voltando ao Exemplo 3.1, considere o s eguinte problema do valor inicial para a temperat ura da xícara de café em uma sala Note que se tomarmos , uma função constante, ela soluciona a e quação diferencial mas não soluciona a condição inicial, pois y(0)≠4 0. Como y(t)≠25, podemos reescrever a equação como então Ou seja, as duas antiderivadas devem se r iguais, exceto pelas suas cons- tantes. Calculando as antiderivadas, obte mos onde C = (C1 - C2), assim Sendo uma constante não nula , a qual podemos obter utilizan- do-se da condição inicial y(0) = 40, então Logo, a solução para o PVI é 51 Equações diferenciais unidade III Conseguimos solucionar o PVI, pois conseguimos separar as variáveis t e y em lados opostos da equação. Então, a equação diferencial pertence a uma classe espe- cial, com variáveis separáveis. DEFINIÇÃO 3.3 Uma equação diferencial é dita separável se a mesma pode ser escrita como . Como no Exemplo 3.2, resolvemos o PVI separando as dependências das variá- veis convertendo-a na forma Essa técnica é chamada de separação de variáveis. O tipo mais simples de equações separáveis é quando g (y) = 1, e a solução torna-se Bastando apenas encontrar a antiderivada de f(t), F(t). É fácil perceber que uma equação diferencial apresenta um número infinito de soluções. Porém, idealmente, mas não necessariamente a aplicação de uma condi- ção inicial conduz a uma solução única para um PVI correspondente. Uma solução que define todas as constantes desconhecidas é chamada de solução particular. De forma geral, para equações diferenciais separáveis, podemos encontrar uma solução constante desta forma: Suponha que desejamos resolver uma EDO separável da forma, , onde f e g são funções contínuas. Se g(a)=0, para algum valor a, então y(t) = a é uma solução constante para a equação, pois neste caso, . Por exemplo, , tem solução constante com . Para soluções não constantes, note que a função 1/g(y) é contínua para g≠0, então 1/g(t) tem antiderivada G(y). Seja F(t)a antiderivada de f(t), podemos escrever Ou seja, 52 Equações diferenciaisunidade III Agora, podemos encontrar a solução para y. É fácil imaginar algumas situações em que a solução pode não funcionar. Primeiro, temos que conseguir separar as dependências das variáveis. Depois temos que encontrar as antiderivadas G e F e então encontrar a solução para y. Normalmente, existe uma solução constante, mas pode existir ou não uma solução analítica baseada em G (y) = F (t) + C. Exemplo 3.3 Considere a equação diferencial Quando k > 0, este tipo de EDO des- creve o crescimento populacional simples: a taxa de crescimento é proporcional (com constante de proporcionalidade k) à população y *. A solução constante seria y (t) = 0, mas não é de interesse para o PVI. Para soluções não constantes, temos Veja que a solução permite A = 0, que é a solução constante. Em um caso particular, para o PVI em t = 0, y(0) = y0, temos que a solução particular seria y = y0 e kt. *Isto quer dizer, que cada organismo de uma população se reproduz com taxa constante. Por exemplo, cada bactéria se divide em duas, e assim por diante. Apesar de ser simples para modelar uma população é válida por um intervalo curto. Se k<0 a equação descreve o decréscimo da população, e pode ser usada para modelar o decaimento radiativo, em que cada porção do material decai à taxa constante, por exemplo. 53 Equações diferenciais unidade III 3.2.1 Equações diferenciais homogêneas lineares Equações diferenciais com características semelhantes à do Exemplo 3.3 são conhecidas como Equações diferenciais homogêneas lineares de 1ª ordem. DEFINIÇÃO 3.4 Uma equação diferencial homogênea linear é aquela da forma , ou a correspondente, . Elas apresentam solução particular, onde P(t) é a primitiva, ou antiderivada de -p(t). A palavra “linear” refere-se à relação de primeira ordem entre e y, e a palavra “homogênea” deve-se ao zero no lado direito da igualdade como primeira forma da equação diferencial. Note que a equação pode ser reescrita como e, portanto, é linear, mas não homogênea. Exemplo 3.4 Resolva o problema do valor inicial , assumindo t>0. Para t≠0, podemos reescrever a EDO como Portanto, e Aplicando-se a condição inicial Logo, a solução do PVI é 54 Equações diferenciaisunidade III 3.2.2 Equações diferenciais lineares Como você deve ter imaginado, algumas EDO são lineares, mas não homogê- neas. Elas possuem a forma . Podemos utilizar o que sabemos de EDO homogêneas lineares para solucionar esse tipo de equação. Suponha que as funções são soluções para . Seja uma terceira função . Então, Em outras palavras, é uma solução para a equação homogênea . Então, olhando sob outro ponto de vista, qualquer solução da equação linear , digamos, y1, pode ser escrita como , para alguma solução particular y2 e alguma solução para a equação homogênea . Uma vez que já sabemos resolver a equação homogênea, encontrando uma solução para , teremos todas as soluções. Mas, como encontrar uma solução particular para ? Bom, o que já sabemos irá nos ajudar. Sabemos que a solução geral para a equação homo- gênea tem a forma . Podemos facilmente imaginar que a solu- ção será então uma função com a forma , na qual substituímos a constante A por uma função arbitrária . Esse procedimento é chamado de Método da Va- riação de Parâmetros. Por conveniência vamos dizer que , onde é uma solu- ção da equação homogênea. Então, podemos dizer que Pois, , uma vez que h(t) é solução da equação homogênea. Então, o que precisamos é encontrar a solução para , ou seja, Juntando as peças, encontramos a solução geral para , a qual é 55 Equações diferenciais unidade III Nada melhor do que um exemplo para clarificar as coisas. Veja o Exemplo 3.5. Exemplo 3.5 Resolva o problema do valor inicial , assumindo t > 0. Podemos começar resolvendo a equação homogênea como no Exemplo 3.4, assim Portanto, e Vamos chamar a solução de , logo . Então, como na discussão, e , portanto . Sabemos que toda solução da equação parece com Finalmente, podemos aplicar a condição inicial para encontrar A E a solução é Há um método alternativo para encontrar uma solução particular para a EDO, e ela utiliza-se de um Fator Integrador. Em uma equação diferencial da forma , se multiplicar toda a equação por uma função , obtém-se É fácil notar que o lado esquerdo da equação torna-se semelhante a uma deri- vada obtida pela regra do produto 56 Equações diferenciaisunidade III Se escolhermos de forma inteligente , de tal forma que , isto será exatamente o lado esquerdo da EDO. Mas, o lado esquerdo corresponde somente à equação homogênea linear, da qual sabemos a solução, e ela tem a forma , onde . Note que , onde é a mesma que vimos no método da variação de parâmetros e Assim, a EDO modificada toma a forma Integrando ambos os lados, chegamos a Se você olhar com atenção, verá que esta é a mesma solução obtida pelo mé- todo da variação de parâmetros, uma vez que . Vamos resolver novamente o Exemplo 3.5, mas agora utilizando esse método. Exemplo 3.6 Considere novamente o problema do valor inicial , , assumindo t >0. Note que o fator integrador é Multiplicando a equação pelo fator integrador, teremos 57 Equações diferenciais unidade III E, a solução é exatamente igual à obtida pelo outro Finalmente, basta aplicar a condição inicial para encontrar A, e a solução particular será Dicas: Algumas pessoas acham mais fácil lembrar como utilizar o método do fa- tor integrador do que o da variação de parâmetros. Sendo que ambos re- querem a mesma quantidade de cálculo para resolver uma EDO, e ambos chegam ao mesmo resultado, qual método aplicar é uma questão de esco- lha pessoal. Portanto, escolha sempre o que lhe faz se sentir mais confor- tável. Existem outros métodos e livros inteiros dedicados a cada um deles, então sempre vale pesquisar mais sobre o assunto. 58 Equações diferenciaisunidade III 3.2.3 Aproximação Vimos como resolver uma coleção bem restrita de EDOs. Para ser mais pre- ciso, vimos como tentar resolvê-las, pois pode acontecer de sermos incapazes de encontrar a antiderivada (ou primitiva) necessária para tal. Então, não seria surpresa se equações não-lineares fossem ainda mais difíceis. Mesmo assim, sabemos como resolver algumas equações mais gerais. Suponha uma função de duas variáveis . Uma forma mais geral de equa- ções diferenciais de 1ª ordem tem a forma . Note que isso não implica em uma equação linear, uma vez que relação entre e y pode ser mais complicada. Contudo, a relação com é simples. Por exemplo, a equação é uma equação de primeira ordem não-li- near, porque y aparece na segunda potência e como ela é não separável, não pode- remos resolvê-la analiticamente. Já a equação também é não-linear, mas é separável e pode ser resolvida pela separação de variáveis. Sob certas circunstâncias, dependendo de , é possível mostrar que toda EDO tem solução, e mais, que para cada PVI existe uma solução exata, o que é muito dese- jável em aplicações práticas. Porém, essas soluções nem sempre podem ser obtidas analiticamente, então temos que recorrer aos métodos numéricos. Tais métodos são técnicas desenvolvidas para se obter soluções aproximadas às EDOs. Vamos des- crever uma dessas técnicas, o Método de Euler, que apesar de não ser muito útil comparado com outras técnicas, nos dá uma boa ideia de como os métodos numéri- cos de aproximação funcionam. Suponha que queremos uma solução aproximada para o problema de valor inicial , para . Recorde-se quesob certas condições em , sabemos que a solução existe, e que ela é representada por uma curva no plano ty, pois a solução é uma função . O ponto , é claro, pertence a tal curva descrita por . Também conhece- mos a inclinação da curva no ponto, ou seja, . Se nos movermos um pouqui- nho ao longo da linha tangente à curva, digamos para um ponto , chegamos a um ponto muito próximo a um ponto pertencente à curva, o qual cha- maremos de . Podemos também imaginar que nos movemos tão pouco, que este ponto ainda pertence ao gráfico de , para o qual também conhecemos a in- clinação em , que é . Seguindo esse procedimento podemos calcular um novo ponto , que está um pouco adiante, mas obviamente não tão próximo do gráfico de quanto . E, podemos prosse- 59 Equações diferenciais unidade III guir usando essas aproximações até o para um tempo tn que desejamos. Para cada passo, i + 1, realizamos essencialmente o mesmo cálculo Há de se esperar quão menor o ∆t melhor será a aproximação, mas claramente isso exigirá mais trabalho para computar até um tempo específico. É possível estimar um limite superior para a precisão que nossa aproximação precisa ter, ou seja, quão longe yn se encontra de (tn). Exemplo 3.7 Vamos calcular uma aproximação para a solução da EDO , em t =1. Utilizaremos ∆t = 0.2, que é fácil de fazer ma- nualmente apesar de não esperarmos uma boa aproximação. Fazendo, Onde , obtemos Então, y(1) ≈ 0.3856. O que não é correto nem na primeira casa decimal. O Gráfico 3.1 mostra tais pontos conectados por linhas (curva inferior com pontos) e a solução obtida por outro método mais preciso. Note que a forma das cur- vas é aproximadamente a mesma apesar dos pontos estarem um pouco afastados. 60 Equações diferenciaisunidade III Gráfico 3.1- Aproximação da solução para (Exemplo 3.7). Fonte: Elaborado pelo autor. Se você precisar executar o Método de Euler manualmente, é muito útil colocar os valores calculados em uma tabela, como a apresentada na Tabela 3.1. Cada linha da tabela representa uma iteração do método: o ponto inicial , a inclinação calculada no ponto , a variação em e o novo ponto . O início de cada linha é o ponto calculado no fim da linha anterior. Tabela 3.1 Cálculo numérico da solução para (Método de Euler). ti yi ф(ti, yi) Δy = ф (ti, yi) Δt ti + Δt yi + Δy 0 0 0 0 0.2 0 0.2 0 0.2 0.04 0.4 0.04 0.4 0.04 0.3984 0.07968 0.6 0.11968 0.6 0.11968 0.585676... 0.117135... 0.8 0.236815... 0.8 0.236815... 0.743918... 0.148783... 1.0 0.385599... Fonte: Elaborada pelo autor. 61 Equações diferenciais unidade III O Método de Euler está relacionado à outra técnica que pode ajudar melhor a entender uma equação diferencial de forma qualitativa. É baseada na habilidade de se calcular a inclinação da função solução em cada ponto do plano ty, ou seja, de calcular o valor de . Se calcularmos o valor de para vários pontos, diga- mos usando uma grade de valores para t e y, e desenharmos uma pequena linha, ou seta, em cada ponto, podemos ter um ideia de como a curva solução deve parecer. Tal gráfico é chamado de campo de direções, que é o tipo de gráfico que ilustra esta unidade. O campo de direções para é apresentado no Gráfico 3.2. Observe pelo gráfico que a solução exata segue a direção do campo a partir do valor inicial. Dependendo do valor inicial do PVI a solução seguirá diferentes caminhos através do campo, mas sempre seguindo as linhas de direção. Gráfico 3.2 - Campo de direções da solução para . Fonte: Elaborado pelo autor. Com um pouco de prática você será capaz de rabiscar a curva solução para a EDO, e em essência estará aplicando o método de Euler visualmente. 62 Equações diferenciaisunidade III Dicas: O código fonte Geogebra para a Figura 3.1 encontra-se disponível na Mi- diateca (figura_3.1.ggb). Experimente alterar o valor inicial (arrastando–o para outros pontos) e perceberá como a função solução f(t) varia, mas sempre seguindo as linhas de direção do campo. Em um próximo passo, altere a forma de ф(t,y) para ver como o campo se altera. Até mesmo quando uma equação diferencial pode ser resolvida de maneira explícita, o campo de direções pode ajudar a entender como as soluções se parecem para diversos valores iniciais. Lembre-se da equação logística, : onde y é a população em um dado tempo t, M é a medida de quão grande a população pode ser para que o ambiente a suporte, e k mede a taxa de reprodução da população. Note pela Figura 3.2 que o campo de direções é bastante informativo. É aparente que se o valor inicial é menor que M a população cresce até o valor M ao longo do tempo, enquanto se a população inicial é maior que M a população decresce até o valor M ao longo do tempo. Por sua vez, k rege a inclinação do campo. Gráfico 3.3 - Campo de direções da solução para . Fonte: Elaborado pelo autor. 63 Equações diferenciais unidade III Conheça mais: Existe uma infinidade de métodos numéricos para resolução de EDO. Cada um deles com seus prós e contras, uns mais eficientes para um tipo de equação diferencial do que outros. Sugiro uma pesquisa sobre esses mé- todos na internet e em livros de cálculo numérico. Existem também outros tipos de equações diferenciais não lineares que apresentam solução ana- lítica, como a equação de Bernoulli e a equação de Ricatti. Então, uma vez identificada a forma da equação diferencial do problema que tenha que resolver, uma pesquisa sobre a melhor forma de solucioná-la poupará você de se frustrar aplicando o método inadequado. 3.3 Equação homogênea de 2ª ordem Uma equação diferencial de 2ª ordem contém um termo com uma derivada segunda. Elas são, em geral, bastante complicadas para se resolver, mas existe um tipo bastante simples e útil: a equação linear homogênea de 2ª ordem com coefi- cientes constantes. Vejamos um exemplo simples. Exemplo 3.8 Considere o . Podemos imaginar que a solução seja parecida com uma função . O que parece plausí- vel, pois , e devem possuir um fator comum que envolve . Se uma função desse tipo é uma solução, então: Então, r é 2 ou -1. E as soluções são . Não somente as funções são soluções para a EDO, como também todo , ou seja, a combinação linear das duas soluções também é uma solução. 64 Equações diferenciaisunidade III Para determinar A e B, precisamos aplicar as condições iniciais, assim Resolvendo o sistema, encontramos a solução particular Logo, a solução desejada é . A esta altura você deve estar pensando se existem outras soluções. A respos- ta é “não”. Não vamos provar isso aqui, mas veremos um teorema que precisamos conhecer. TEOREMA 3.1 Dada uma equação diferencial , considere o polinô- mio quadrático , chamado polinômio característico. Tal polinômio possui duas raízes, r e s. A solução geral para a equação diferencial é: a) , se as raízes r e s são reais e r ≠ s. b) , se r = s é real. c) , se as raízes r e s são números complexos . Esse tipo de equação diferencial é de especial importância para a Física e, con- sequentemente, para as Engenharias. Elas modelam sistemas ressonantes como massa-molas, barras, pêndulos, circuitos elétricos etc. Exemplo 3.9 Suponha uma massa m pendurada por uma mola de constante elástica k. Se comprimirmos ou esticarmos a mola, a massa irá oscilar para cima e para baixo. Devido ao atrito, a oscilação irá decair, e finalmente irá cessar. Usando um livro de Física Básica será fácil encontrar que a equação para a posição da massa pendurada por uma mola é descrita por uma equação diferencial seme- lhante à . Usando (com as devidas unidades), podemos encontrar o movimento da massa. 65 Equaçõesdiferenciais unidade III O polinômio característico é , com raízes . Então, a so- lução geral é Suponha que sabemos que . Então, teremos e Logo, . Reescrevendo E, usando a propriedade trigonométrica ,chegamos a Isto quer dizer que a função cosseno é deslocada para a direita por um ângulo β, ângulo de fase e tem a função de diminuir a amplitude à medida que o tempo avança. Exemplo 3.10 Encontrar a solução para o e . O polinômio característico é . Então, há duas raí- zes iguais r = s = 2 e a solução geral é Substituindo t=0, obtemos E, aplicando a segunda condição Logo, A = -3 e B = 7. E a solução particular é 66 Equações diferenciaisunidade III Agora, vamos considerar a forma não homogênea das equações diferenciais lineares de 2ª ordem. 3.3.1 Equação linear de 2ª ordem As equações diferenciais lineares de 2ª ordem possuem a forma , com a, b e c constantes. Note que se a = 0, recai-se sobre uma equação linear de 1ª ordem. E, que se c = 0, podemos resolvê-la novamente como uma equação linear de 1ª ordem, fazendo , encontrando h, e então resolver para y. Vamos examinar alguns exemplos com c ≠ 0. Suponha que e são soluções para a EDO , e con- sidere a função . Se substituirmos essa expressão no lado esquerdo da equação diferencial e a simplificarmos, teremos Então, h é a solução para a equação homogênea . Como já sabemos como encontrar h, com somente uma solução particular y2, podemos en- contrar todas as soluções possíveis y1, ou seja, , onde h é agora a solução da equação homogênea. Claro, como você já deve ter percebido, é o mesmo proce- dimento que adotamos para solucionar equações lineares de 1ª ordem. Para tanto, é necessário que saibamos um método para encontrar a solução y2. Isto acaba sendo um pouco mais difícil que o caso de 1ª ordem, mas, se a função f(t) tem certas características, podemos utilizar o método dos coeficientes a determinar, também conhecido como método dos coeficientes indeterminados. A ideia do método é obter uma solução particular yp (t) que possa ser escrita como uma combinação linear de um conjunto linearmente independente de fun- ções. O problema fica bem mais simples quando esta função f(t) tem alguma das formas abaixo: 1. Polinômio de grau n na variável independente A solução procurada deverá ter a forma: 67 Equações diferenciais unidade III 2. Múltiplo de uma função exponencial A solução procurada deverá ter a forma: 3. Combinação linear das funções cos (kt) e sin (kt) A solução procurada deverá ter a forma: 4. Soma das formas anteriores A solução procurada deverá ter a forma: ) 5. Produto das formas anteriores A solução procurada deverá ter a forma: Se as funções sugeridas já apareceram na solução geral da equação homo- gênea associada, então a sugestão para a nova função deverá ser a mesma função sugerida, multiplicada por t. Caso a função não sirva, multiplique por t2 e se não fun- cionar, vá aumentando o expoente de t. Veja alguns exemplos: Exemplo 3.11 Resolva a equação diferencial . A solução geral para a equação homogênea é . Pode- mos assumir que a solução para a equação não homogênea se parece com , que é um polinômio quadrático . Substituindo este “chute consciente” na equação, obtemos Portanto, 68 Equações diferenciaisunidade III Este sistema de equações não é difícil de ser resolvido e nos dá a solução a = -3, b = 1 e c = -2. Portanto, a solução particular será . Logo, a solução geral para a equação diferencial, , é Então, o “chute consciente” é sempre uma função com a mesma forma de f(t), mas com coeficientes indeterminados. Isso funciona sempre que f(t) é um polinômio. E, funciona quase sempre que f(t) tem uma forma conhecida. Exemplo 3.12 Encontre a solução da equação diferencial . O polinômio característico é , por- tanto, as raízes são -5 e -2, e solução geral para a equação homogênea é . Vamos adivinhar que a solução não homogênea é Ce3t. Subs- tituindo nosso palpite na equação, obtemos Quando C = 1/40 isto é igual a f(t) = e3t, logo a solução geral será Exemplo 3.13 Encontre a solução da equação diferencial . Do exemplo anterior, sabemos que solução geral para a equação homo- gênea é . Como no exemplo anterior, tentemos a solução não homogênea é . Porém, já possuímos uma parcela semelhante na solução homogênea , e, portanto não acrescenta informação. Então, um palpite melhor será , assim Quando C = -1/3, temos a solução geral 69 Equações diferenciais unidade III Existem outros métodos para a resolução de equações diferenciais lineares de segunda ordem, como o método de variação de parâmetros, por exemplo, o qual é uma ferramenta mais poderosa para a resolução de EDOs. Porém, tal método pode tornar a busca pela solução bastante complicada, dado que nem sempre as antideri- vadas são intuitivas, ou existem em tabelas . A ideia foge um pouco do escopo deste livro didático, mas fica como sugestão para aprofundamento no assunto. Como mencionado anteriormente, o mais importante é identificar a forma da EDO, e a partir daí, pesquisar sobre o melhor método para solucioná-la. As EDOs são uma ferramenta importantíssima para as engenharias, e a maior parte dos proble- mas modelados por elas possui uma solução disponível na literatura. 3.4 Aplicações à engenharia Vamos ver algumas aplicações corriqueiras de EDOs na Engenharia. 3.4.1 Vibração de um prédio sob uma força externa Suponha uma viga de massa m sustentada por colunas de constante elástica k, e que apresenta constante de amortecimento c (dissipações em calor, som etc). Ago- ra, imagine que uma força externa atue sobre a viga, digamos vento, com uma força variável no tempo F(t), como mostra a Figura 3.1. Figura 3.1- Viga sustentada por colunas oscilando sob ação de uma força externa . Fonte: XIE, 2010, p.189. 70 Equações diferenciaisunidade III O movimento do sistema é governado pela segunda Lei de Newton e, portanto Ou ainda, para uma forma mais familiar, Que é uma equação diferencial não homogênea linear, a qual aprendeu a so- lucionar há pouco. 3.4.2 Circuitos elétricos Circuitos elétricos são sistemas dinâmicos que apresentam grandezas que va- riam com o tempo, como corrente e/ou tensão. Então, nada mais natural que os mesmos sejam modelados por EDOs. 3.4.2.1 Circuitos RC Em série: a Lei de Kirchhoff para voltagem nos diz que a soma das tensões nos componentes do circuito é nula, então A qual, derivando-se com relação a t, nos dá ou 71 Equações diferenciais unidade III Sendo τ = RC, a constante de tempo do circuito e . Em paralelo: a Lei de Kirchhoff para corrente nos diz que a soma das correntes que entram e saem dos nós é nula, então ou Em resumo, os circuitos RC são modelados por EDOs de 1ª ordem. 3.4.2.2 Circuito RLC em série Um circuito elétrico contendo um resistor R, um indutor L e um capacitor C em série no qual é aplicada uma voltagem V, está sujeito também à Lei de Kirchhoff para Voltagem, que diz que Diferenciando com relação a t Ou, em sua forma mais usual, Sendo . Portanto, os circuitos RLC em série são equivalentes aos sistemas massa-amor- tecedor-mola e também modelados por uma EDO de 2ª ordem. 72 Equações diferenciaisunidade III Outros exemplos podem ser encontrados no livro do Xei referenciado no final da unidade. Você vai perceber que uma infinidade de proble- mas cotidianos da Engenharia são modelados por EDOs. Consulte os livros sempre que precisar descrever um problema, com certeza irá encontrar algum exemplo similar ao que deseja resolver. Aprendemos que: As equações diferenciais são a principal ferramenta matemática no dia a dia de um
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