Buscar

Olavo de Carvalho - 29 - Genealogia das Ciências

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 3, do total de 28 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 6, do total de 28 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 9, do total de 28 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Prévia do material em texto

Genealogia das Ciências
Aúa29
por Olavo de Carvalho
coleçáo
História
Essencial da
Filosofia
Coleção Históía Essencial da Filosofâ
Ácmpanha esta publicaçáo un DVD,
qu e .áo pode ser vêndidô sêpdad aftnre
ImpE§o.o Brâsil oütubo 2003
Copyüght O 200a bJ Olavo de Caryalho
Edsón Mmóêl dê Oliv€iü Filho
Mo.ique schenkels e Dagmar Rizzôlo
EsLúdiôÉ ÂndÉ cavalcanie Cimenez
O. diÉito3 âu torai s desa ediçào pe encen à
É Reálizaçóes Ednora, LiEüia s Dis*ibuidora Ltda
Vila Márida CEP 0401G002
I-mail: e@erealiz es.ón br
tusomdos iodos os direilos desta obra. Pmibida toda ê qúalquer Épmduçâo deía edição por
qualquer meio ou lorma, seiâ êlâ Elêaôsi.a ou nócânica, lotocópia. EBvaqáo ou qüalquer néiô.
Genealogia das Ciências
Ar:I,a29
por Olavo de Carvalho
coleçáo
História
Essenciat da
Filosofia
ôiffi
2008
Côlesão HiíiLóüd Essêníiàl dà filosêIiil
.Iâs. etências - Aulâ 29
por Olavo do Carvalho.
'IUdu€s6e sielo rnoderôo, â p{lJtu de.ReEé.De§tart4s,,é Ína$adoppr
um deseio muito grãnde de enrcntrar um ripo novo de conhecimento
que'se legrttqe Êor si lllesmo e qlle sêiâ maÍcado por úmà düe}snça
f8dical çm rclseêq 4 túdq Q que sç tiúa..co:no cqnhgriments desde â
Altigüidade qt! o Sn dqldqdê Média,
 idéia dqurna noya ciên-cia,.d.e ulll& nol.?.çollstitqiéêô do.mu.]rdo
dp cúheci&entq jii q9 deôlata.rorn liiâeon'ío 11Nov9 o(gênof' elom
Desgartes nqs 'lFrinqlpios. da lilosqliqo, qês 
t'Meditaçô$ Filolqílica6
da Pximciya FilosoÍia" e no i'Dis.curso d.a Mêtqdor': é.eonttluamerrle
reaÍirmqda, quardo Gâlilelr púlica suâs obseryaçõeE, elb iá publica
como rovêi cl!Àcis§, e assiiÍr.por dignte. Á ii1éia de uüa no\ts ciêiciâ,
ontão, §e irrlrggÍla em tod4 a átÍnosfêra eúropéia desde o sécdlo X14
até o seculo XIX, Depol§ váô considerü que úo §éq{o XIX e'ita idéia
e8tâ oficializadâ e.ele poale.sêr coisiddads fuiunfants nlúr fiêíô uni-
I'el.itário qtrq âli&, foi criado iurltameh'íe pâra islo: §dtiâ iíexâio tocê
diz€I quà a idéíâ'dâ nova aiên(,iâ hiüifâ no,lilê;o univelsltáilú pciquê
ela em páÍe €riâ:t§té fteio.üíiveͧitárioj e§§éé rm ptÓces§o,ondêrüiüÍ
coisa faíÍlênlã a oútm e a oütÍá lórneíta a uríe, Iàúbéú íeda ii,iÉÍatâ
a idéia Aeqle llmá idéia tdunla sot}Iê a outÍa poxqüê §ubâíteúi1éiia
que gêiâçiies qiê li!éi:}rll âte§§d an liililetuo tipir de eonlÉciÍrieítõ
pudêiam ôitnfúNá-lo tlrm o segwidd e a ssaolheÍam, isso nii verdado
jaüais scontêCdu.
Desdê {b pioirci.ôs da Âova ctêÀCia, co.llllr ô Éópíio Re,§áDescar.
te§, tirdaii a§ gerÍiçôeê süb§eqüdtêê já §âo Ínrifcâa1ê§. defdé td iíírlo
por uma ãdesao jnjcial ao no\o modelo que é o únjco que colhecem:
quando. ten1 a.lgurEa relel€úcú ao.antigo lFÍ6hiÊnte é ümà rlte!êilçjâ
I
rruncada, lnuiio ncbulosa, c o conhecim€nto que tem da lilosofia anti-
gâ c mcdicvâl vai se dillrindo com o tenpo. Náo só vai se diluindo. mâs
ele já vai sendLr re enquadraclo den!Ío de uÍr conjunto dc modclos dc
certo nrodo iá calculâdo para assinâlar a cssc conhccimcnto ântigo um
ccrto lugar nuna pretensa evoluqáo hislórica já concebidâ pârâ ter a
novâ ciência como o pirláculo, o cume. dâ €voluçáo. Dc mancira que é
,lu, \e ir rr\i.r \el :r gclre \. r rndn c.r. pcfl oJo no\o cunro -mJ L\Í,(!iL
dc jogo dc calta marcada.
Desde o início a nola ciência se auto-clecretâ como supcrior a uma
ciênc;a que ela desconhece € el1l scguida invcnta um modelo hisiórico
no qual a hunanidade passa de um estágio mílico (pelo rnodelo do
[,,\ugusto] Comle) para unr estágio etalísico, e enfim passa para unl
eslágio cienlílico ou posiiivo no qual o distinto crnissor dateoia se en
conira. E após ter fcilo cstâ opção iniciâl e ter construiclo esle modelo
legitinlador, o que se trata é de Íecortar os dâdos da ciência antiga para
que eles se adapiem a este modelo. Tudo isto quândo visto no conjunto
é assim, pensando bem, dc unl ridículo aúoz, e é um processo de auto
ocultâçáo no quíl as pesso.rs escondem âqrilo que elas náo qucren
ver. E cu.josênente esie processo v€m iunto com um grânde orgulho
cientííico, umâ idéia dc quc nós tcmos o conhccimento obietivo e os
antigos só iinham mitos, erlos nretaisicos, eic., etc., qüândo iusta-
nente o que eles estão lazelldo é construir um univcrso mítico que os
coloca no topo da evoluçáo, no topo dc urnâ suposta evoluçio, e em
seg idâ, suprimir os dados quc podedan ser conlroDtados com este
nodelo. Pensando bem. tudo isso é umâ historinha pâra crianças, e o
nú rero de pessoas que ainda acrcdita nisto no mundo. nmilo telrpo
depois dc cntrc os histori.rdores isto já ter sjdo complela enie estou-
rado. ajnda é Inuinr irnpressionântê. Nós podeúros dizcr que â cultura
bmsileirâ inieira, a clâsse supcrior intcira do Brâsil aindà vive dentro
destc mito dos trôs cstágios do Àugusto Conrle, acredila nisso piamen-
ó
1r e lica mcsmo chocada se alguén cofiestâ isso, eles âcreditam quc
isio ó uma âtiiucle muito polêmica. É polôrnica para eJes porquc sáo
( ripiras, nunca ouviran fâlâr dis1o.
I)esde o comcço do século XX não exisie nênhum historiador pro'
llssional qlre acredite nesta seqüência de acontecimentos tal como
rLt)ârcccm na lendâ comteâna. Eu digo comteâna porque o Conte foi
i, suieito que fcz a lbnnulaçáo expressa nlâis simples dcssa niiologiâ,
iras não podemos dizet quc o Comte a inventou, é Lrn1â coisâ que foi se
l,)ü ando ao longo dos séculos, e quando Comte enuncia a lci dos três
(s1ágios ele náo faz outra coisâ senáo dizer algo no qual todo nundo iá
rslava âcrcditando laz;â dois séculos. Um âspecio curioso dessa lendâ
I quc ttlo logo ela alcança uma expressão simples e declarâda como na
l.i dos três esiágios do Conle, imediatamente ela iá comcça a ser des-
rrr)ralizada. Dcsmorâlizada, não no plano da discussáo, nlr piano das
trscs filosóficas, ffas dcsmoralizacla pelâ mâneirâ nlais sinrplcs que é a
docu,nentaçáo. Porque também estâ efusâo de enlusiâsmo pcla ciência
pn)duz de fato âlgun eteito positivo; e un1 dos efeitos posili\'os é que
isso lonenta mujto a investiga(iio histórica. Quer dizeÍ qúe as pcssoâs
{tuc ouve aquela propâganda ioda da idéia de cjênciâ, aquela ideali
zrçáo da idéiâ de ciência, algumas se cntusiasmam pclâ coisa com toda
r slnc€ridacle e levam o negócio â sério e âcrcditam que é parâ fâzer
riôncia n1esno, e acabam âlé làzendo. Essa é uma das caracteristicas
dâ linglragem dcmoniacâ, é que quando ele püece falar a vcrdade, eslá
rrrcniindo. c quando paÍece quc está nlentindo, €stá lãlando a verdadc,
c você se aiÍapalha justanente por causâ disso Se fossc a mcntira
simples. a mentirâ simples é simplesmenie huffanai agorâ, â menti_
ra dlrptâ c concordante, dupla e comple entar, já é umâ aÍlimanha
do Dcmônio. A gente pode dar unr eÍemplo: no "FáLUsto", de llohânn
wollgang vonl Goethe, o Demônio - lquândol se conffonta com  Irase
biblic.r, a frâs€ dc Sâo Joáo: "No princípilr era o Logos" ou "No pÍincí.
v
pio era oVerbo" '- diz: "Não, náo é nâdâ disso, no princípio era aaçáo
Iam Anfang war die Aktion]". O que quer dizcr isso? por um lâdo se é
â açáo, entáo, a açáo como efetividade se opôe ao que é mera potência.
cstá dizendo que o ato precedê a potência. Isso é exâtâmente como
está enÀristóteles, enião, não tcm novidade, isso é perfeitâmente ver
dâde, e isto nâo é de maneira âlguma o contnírio do "No princípio erâ
o Logos". Então, no princípio erâ o ato divino e em Deus não existe
nadâ potencial. tudo é perieitam€ntc cm ato porque Deus é cterno.
Deus náo tenl a passâgem da potência ao ato. Nesse sentido está certo,
mâs qlrando Mefistólêles diz isso, ele sabe que as pessoas nào sabem,
náo conhecem a "Metafísica" de Aristóteles c que vão enrender esta
"açào' no sentido de tbrça física, un1â espécic de foÍça no sentido ga-
lilcano [de] lorqâ lisica. Ele diz a verdàde porque ele sabe que eles vào
inicrprctar efoneàmentc c cair na rnentira.
Tambóm deniÍo do desen\.olvimento histórico vocô vê que nuitas
vezes uma óbviâ mentira é interprciada no sentido da verdade e assu-
nida positivamenle, quer dizcf a mentim acâba funcionando con1o
veÍdade, não no sentido de que as pcssoas acreditam. mâs nosentido
de que dào unl outro sentido. e este scntido por suâ vez ó vcrdadeiro.
Então, o enornc cstimulo que â idealizaÇão da ciência dcLr à pesqui,
sa hisróiica no século XIX acabâ por jusiamenle mostrar a falsidade
dcsta mesna concepÇáo evolutiva que coloca os cientistas do século
XIX no topo da evoiuçâo. E isso acontece principalmente porquc co-
mcçam a aparecer todos os texlos de todas âs civilizações e este mate-
rial imenso colocado à nossa disposição, pela sua simples presenqê, já
mostra quc a idéia de un1â evoluÇão ern três estágios, a evoluçáo que
passa do cstágio mitico, vai do estágio mítico até o cstágio cientifico é
idal ente furada. A idéia de unâ infânciâ da humanidadc, quer dizer
üll1a épocâ eú que a§ pessoas peúsavam só por imagens míticas c acre_
ditavam em histórias da carochinha ou quando tinham uma lógica pri_
nriliva como a idéia do Lucien LóqI-Brühl, antropólogo que escrevelt
,, livro 'A Mentalidadc Primitiva"'? tentando mostrdr que â lógica dos
)rimitivos náo em a nossa lógica. Estas nresmas idéiâs, à medida que
apnrec€m os textos e documcnios. sáo denolidas automâticanente e
Lr gente vê que não existe nada disso c que é absolutamentc impossível
você lalar de uma cvoluçáo linear nestc sentido. Mesmo porquc você
câha vendo que até mesmo a idéia da evoluçáo enl três eslágios iá
tinha sido enunciâdâ na eiapa que Comte diria meiafisica, pelos três
cstágios do Joaquim de Flora, â era do Pâi, a erâ do Filho, e a cra do
Espírito Sanlo. Enião, quando Comte acredita que esiá enunciando
unrâ lei cicntíficâ e supetando os nitos metalísicos, ele está apenas re-
pctindo um outro mito que já foi €nunciâdo seiscentos ânos antcs dele
E esta idéia também da evoluçáo em três ctapâs aparece muilâs vczcs,
âparecc no Hegel, aparêce no Mârx, etc.i etc. E quando vocé vai ver
aquilo é apenas a repetiçáo de um csquenê nítico iá muito antigo. De
rnaneira que esra difcrcnça que o século XIX fâz entre ciência e miio é
cla própià un mito.
Essa difer€nçâ a dgor náo cxiste, existe unra ouüa diferençâ que
nós podercmos até explicar brevemente. Existen duas noções muito
antigas arespeito da inteligência humana. das vias de acesso qüe o scr
h,rÍr"no rer'r .ru co4hecinc.lro oc\ rcdlidaJe.'n"iôreç: urno e a que
se chama propriamente [de] a inteligência, o Àrisióteles a chamava
de ,.roús (,,oiç), e, por out.o lado. aquilo se chamaiâ [de] espírito ou
pneúma (Ívipl). Entif,, a lamosa distinçáo iá clássiú entre a via no-
éiicâ € a via pneumática de acesso ao conhecimento transcendente A
noéticâ é aquela que apêrece no nível das intelecçóes. no nível do co
nhecimento dos primeiros princípios, e o acesso pneumático ó aquele
l1'ro I r: .ü,rpil i i iólc k(ii)ár(r]lÍpà!:à,&i, rei&\iróún0!
Vcrbúin e( \?Íhum.ni apud Deun er DcusoraiVcrLnn)
8
,!éw.BriilrL l,uci rn El rlna PÍimiriva, ndicn,ncr 62
que aparece sob a forma de experiência exisiencial como, por exenrplo,
quando São Paulo Apóstolo, no caminho de Dâmâsco perseguindo os
cristáos, de repente ó fulminado pela compreensáo de que ele cstavâ
perseguindo â coisa erÍada e de que o Deus dâq!eles camaradas erâ o
verdadeiro Dcus e no fundo o mesmo Deus dele.r Ele nâo compreen-
de isto como intuiqáo no scntklo inteleotual da coisa, é algo que ihe
âconiece, ele é existcncia|nente Iulminado pelâvisáo daquilo. Vocô vai
ver que a diferençâ que existe entr€ a tradiçáo lilosótica e as tradiçÕes
religiosas ó cssâ, quer dizet da apreensáo jniuitivâ ou noética ou da
aprccnsáo exisiencial ou pneümá1ica. Mas acontece que essâs duas
não sáo historicamcnte sucessivâs, a êprcensáo pneumática, naiural-
mente, como ela nâo é intelectualmcnte diferenciada. elas dc €xpres
sân em simbolos narrâtivos, símbolos poéticos, toda narrativa no lim
das conias é poética; e a apreensão noética ao contrário se exprcssa
cm símbolos e numa linguâgem ânâlítica. Mas acontece que essas nâo
sáo historicâmcnte sLrcessivas. elas são simuliâne:rs. Qucr dizer, âlguns
dos antigos filósofos gregos cstavâm tendo as suas inielecçires noé,
ticas âo mesmo tempo em que os profetas hcbrâicos tinhanr as suas
virênci.ts pneumáticas. Então. colno é quc você vai aí lalâr dc uma
vivência, dc um conhecimento mítico que aniecede o conhecimento
racional, inielectuâl'l Eles viemm âo mesmo tempo, só que aí depende
das circunslâncias, nâo háevolução histórica, há âpenas umâ diiercnie
nlodalidade de compreensáo das coisas. Passêdos. êÍ, cntâo, seiam
2404 anos desse negócio. ainda continua havendo a possibiiidade de
conhccimento pelas duas \.ias, âindâ acontece é igualzinho.
O queAugusto Comte está fâzendo, ou todo o século XIX faz. coln
e,sa.dei- u( e\uu.ao hi.rori(r'rr\crdade elegqr po \-r \1,, uÍr
símbolo mí1ico e sem tcr a compreensào de qual é a experiência rcal,
qual éa realidade que aquilo está tcntando expressa! ele pcga o próprio
r0
! nrbr)lo como se fosse rcalidade e o transforma numa tese Íilosófica
iLLrc afirma a veracidadc do sínbolo, qlre ó a lãmos;r divisáo tripaftite.
( ) Itai, o l,ilho e o Espírito Santo nào são entidades sucessivas; quem
,rLcrpretou assim ibi o Ioaquim clc Florê: o pâi, o Filho e o EspíÍito
Srrto sáo clr exisientcs. ele apenas achou que no plano dâ hisióia
n traduziÍian em três etapas. Náo há nenhum motivo para acreditar
rtuc isso seja verdade. Sobretudo porque a Tlindade nâo é uma teoria
risiórica; se o loaquim de Flora viu como umâ teoda lrisiórica, cle viu
n)rque quis. A pariir daí. então, esta divisáo tripârtiie translbrmada
rnr teoriâ hislódca, que é senr dúvida um simbolo mitico amputado da
cxpcriôncia qlre ele €xprcssa se tornâ enião um fetiche, e esse fetiche
ro século XIX se tornâ uma crença cicntíÍicâ inabalável
il claro quc é um processo dc cstupiditicação, um processo de im_
bccilizaçáo nuiiissimo gravc. E evideúte rentc nâo há nenhum his_
toriâdor profissional no mundo quc hoje deiênderia a idéia de uma
cvoluçáo tal como o século XIX a entendiê. Não, obstante. esia jdéia
dâ evoluçào hisiórica ainda continua impregnada na cultura geral ao
nlcsnlo tempo em que essa culiurâ gcral se exp.tnd€ lormidavelmenle
através do ensino público, das universidades, do movimento editoriâI,
do rádio, cinema, televisão e internet, agoÍa não dá mais paratiraressa
idéia dâ câbeçâ dâs pcssoas. OLr seja. iustamente na época em qucvocê
sabe qüe ela ó furâda, ela já alcançolr Lrma dilusáo táo grande que eu
lalo: há possibilidade de vocô irânsmitir um conhecimento hislórico
efctivo a esta muliidáo qlre já lbi alimentada de besteira conr o rclbrço
de acreditar que esta besieira ó o pináculo do conhecimenio? Agora,
cono é quc você vâi lazcr? Prineiro. quem prova que tantos bilhócs
de pessoas tênr capacidade para iÍaiar desses âs§un1os? Normalmenle
nâo 1êm; a idóia de que iodos possam tratar dlsso, isso é muiio dili
cil. Mas a 1ãmosa democratizâçáo do conh€cimcnio, no lundo €la só
dcmocrâtiza mentirinha boba, você invcnta un1 pseudo_conh€cimenlo
ll
de quintê calegoÍia parâ você espalhar para a multidáo. você espalha
aquilo e ela fica contcntinha, é como o índio que recebia um espelhi-
nho €m iroca da terrâ dele, nttis â mulher, mais os filhos, tudo o que
iinha, e saíâ contente nrosirando o esp€lho. O pessoal que estudâ hoje,
â classe leirada hoie é isso, está levando espelhinho de índio e acredi-
tando que esrá âgradando.
Sc você pegar um programa de lestibular hoje, você vê que é um
negócio terlível. são milhões de coisas, o quânto complica Pela com-
plicaçáo e pcla dificuldade da sua aquisição, dá a iÍnpressáo dc que é
um r cgociu 'eíir'\:rnú: quJrdo\u(ê\ar \e,.'rdôc Lcompli.rduru
pelo aspecto quantiiaiivo. no fundo náo tem nâdâ de complicado, é
nruito si ples. Mâs como aquele pouquinho de conheciinento quasc
insübstantivo que está sendo transnitido é subdividido em milhões
dc capÍtulos, cadâ um de aquisiçáo Íelaiivamentc dificultosa, eniáo, o
sujeiio gradua, pela dificuldade da aquisiçáo, â qualidade do conheci-
mento. Náo é isso?
!l disso qlle sealimentaaío sistcma cducacional e culiural da mídiâ.
Quer você pegue um progranâde ginásio, um programa de qualqüer
disciplina do ginásio. quer você pegue a Íevista Supetíntercssante,
quer locê Iigue no canal Futura, é esla bobâgem que você vai adquirir,
quer dize! houve ümâ época mítica e hojc nós temos o conheclmen-
to científico, nós escapanos disso; isto é âbsolutamcnte indelênsáveI
em iennos de ciência, qualquer estudioso labe que as coisas náo sâo
âssim. Agorá, para lnventâr uma outra culiura popular baseada nos
conhecimentos que nós temos agora lcvâ mais quinhentos anos; se
for possívcl. porque enquânto isso este sistemâ baseado no reino dâ
babaqülce já s€ expandiu quantitativamente mais airda. O fato é quc a
expânsáLr da edücâçao criou uma espécie de reprodlrçáo endêmicâ da
ignorância. É como é qlre vai corrigir isso? Eu digo que nào dá, porque
o númcro dc pcssoas que tên1 acesso aos conhecimentos cfctivos é ne-
tz
.cssariamente pequeno porque depende de vocaçâo pessoal. depende
dc o süjeito ir buscar. O sistema nunca vai lhe oferecer isso ai. E mes-
nro quc os materiais estejamà disposiçâo e o professor acrediie em làse
rnítica. fase metafísica e làse científica, basta você ler o livro do Mirceâ
liliâde, 'A História das Crenças e das Idéias Religiosas"a, você já vai
vcr que nào bate, não é possível. Embora o livro estejâ aí à disposiÇão
.lcsde o comeÇo do século xx, vâi ser muito ditícil que ele sc integre
n0 sistema da cultura popular
Quando você pcga a cronologia dos acontccimentos mítico_religio_
sos ao longo da história, você já vê que isso não bate com a cronologia
(lo Comtc, a cronologia do Comte l'oi inventada; a do Eliade, náo, fo;
rlarca.lâ em documentos: púneiro veio isto, deplris veio aqüilo. dcpois
vcio aquilo... não funciona, quer dizer, náo coresponde aos lãtos; e enl
scgundo luga! a própda auto-interpretaqáo que a sociedade moderna
laz do scu lugdr na pretensa evolução histórica, iambém é fundadâ
num modelo mítico. E esse modelo mitico, por sua vez, além de ser
unr modelo mítico é um modelo mÍtico já diÍninuído; qucr dizer, trans-
lormado numa inteÍpretâÇão material do curso da históriât é um erro
parecido ao que Sáo Paulo Apóstolo cometeu quando ele acreditou
que o fim do mündo e avoltâdo Cdsto eram para o diâ seguinie. Como
Iâlou cm fim dos ienpos, como está ânunciando o fim dos tempos, ele
acÍeditoü que o fim dos tempos era um âcontecimenio mâterial que
cra pâra o dia seguinte. Mas ele pelo menos não tinha as lontes his_
tóricas suficientes para podcr fazer âs comparaçÕes, entáo, n idéia de
una mcta-hisiória, de uma coisa que está pêra além dc toda a história,
essa idéia €le náo pegou na épocâ, foi Santo Agostinho no século IV
que consertolr o negócioi conserlou e di7 [que] não, nâo é assin;quer
dizer a história náo vai acabar amanhá, náo se podem interpretâr as
^ 
llisiória dâs Crenças c das Idélas RelignÉds do Mircea Diadc Exhre úadu.ãD biasileira
l:l
coisâs nesse seniido iáo maledal. Mas o que Augusto Comte (e todo
o século XIX) 1ãz é exatamente um crro parccido conl o de Sâo Paulo
Apóstolo: você pega símbolos que estáo se referindo à meta-hisiória e
você âcredita que são etapas históricas por exemplo, como este erro
de percepçáo do tempo histórico se impregnou na nossa consciência?
Você vê a idéia de julgâmento dâ história que é umâ idóia que todo
mundo tem na cabeça e que é considerada umâ coisâ importantíssima.
Náo tem o livro do Fidel Castro, 'A História Me Absolverá"? E o ou-
tro vê, pega e diz: a história te condenará? Como se o julgamento da
históíia fosse 1rm negócio definitivo. Unl;ulgâmento lêito pela história
é só mâis um acontecimento histórico qüe por sua vez será iulgâdo e
depois vai ter outro julgênenio, e outro e outro e outro; â cstruturâ do
tenpo é essa. Não é? Qualquer opiniáo histórica de uma certa época,
quâlquer interpretaçáo que uma certa época faz para as épocas ante
riores se tornará pârâ â época seguinte uma época anterior que tam-
bém terá de ser interpreiada. Náo é assim? Entâo, é fácil você perceber
imediatamente qu€ nâo existe ju lgamenlo da história, náo existe e não
pode hêver Náo, nào é um tribunal, é um tribunal por semânal Mas
as pessoâs acreditâm que o julgâmento da história é umâ coisa que
pode condená-las ou resgatá-las. Hoje, por exemplo, a gente acredita
oue Hirlcr c Sralin cs,ào condi nados. DaqLr. pouco já ana.e,e u n
sujeito dizendo: "Náo, náo ibi bem assim, vocês é que estáo engana-
dos. etc., etc." Esta conversa nunca lermina, por definiçáo, por mais
provada que esteja uma coisa. vai âparccer um cara qüe náo acredita
naquilo e que acha o contrário. O julganento dâ história é ainda rnais
vnlu\cl doquea i_i.to1" nrerma l\\oqLerJi/erques(u no§\r noqdo
dc vcrdadc vai ser referidâ à história, €ntão, ela foi para as clrcuiasl
evidentemente. Àgora, na hora em que você transforma a história num
iÍibunâl cono Hegel, ele diz: 'A hisiória do mlrndo é o julgamento do
mundol" EIc acredita mcsrno nisso, que vai chegar unr dia em que a
1,1
hisióda se reúne e condena, absolve, etc., etc. Se ela fizer isso, no dia
seguintc alguém vai ter que contar â história desse julgamenio e assim
por diânte. Entáo, a falia de compreensão da históÍia como processo
linear que náo volia é claro que é um erro de percepçáo de t€mpo. E
este erro de onde vem? Vem da idéia de uma estrutura da evoluçáo
histórica. É claro que a evoluçao histórica náo tem estflrtuÍa nenhuma.
São simplesnlente coisas que váo âcontecendo e que depois podem
âconteccr de outra maneira. O que pode ter estrlrtura é o conjunto da
realidade, e que é a estrutura que detemina os liúites do possível e do
impossível qLre a própÍia história jarnais transgredirá, e pode também
hâver uma cstruturados elcmentos constantes, isto é, dos elementos â
históricos ou suprâ-históricos, que a hisiória também náo pode alterar.
por exemplo, aquela simples observaçáo do René Descartes: "Olha,
todos nós antes de ser adultos fomos crianças". A hisiória náo pode
mudar isto. Quer dizer que a vida pessoal hunana tem uma estru-
tura tenporal determinâdâ porque ela tem um fim determinado, ela
segue úma curvar nascimento, crescimento. dcsenvolvimento, declínio
e morte. A nossa históriâ individual, â biografia, tem umâ estrutura
porque ela ten1 um começo e um [im, tenr uma duração média fixa.
Mas a história, quâl é a duração média fixada história? Ninguém sabc,
entáo ela náo tem estruturâ nenhuma. Ela, por definiçâo, náo pode ter
estrutura, você sempre pode dizer: "Olha as coisas estáo indo para tal
direção, mas podem ir para outra". Aliás, elâs estáo indo pâra tal dire-
çáo onde? Aquil Enquanto clas estão indo nesta direção aqui, no outro
lugar estáo indo para outro lado. Entáo, nao há esirutura da história, o
que há são eiementos estruiurais meia-hisióricos ou supra-hisióricos
que â história nâo muda. E também dentro da própria hisrórjâ exis-
tem clcmentos individuais que tên uma estrutura marcada como, por
exemplo. as biogralias individuais. No entanio. desde o séc lo XVIII
até hoje, todo mündo râciocina em iermos dc uma cstruturâ da histó-
15
T
I
l
ria, como se houvesse um trâieto detenninado a scr seguido! e quando
o trajeto dá errado ou n'tuda de direçáo âs pessoas ficam chocadas:
"meu mundo caiu", ou, entáo, explicam em ternos de involuçáo: 'Foi
para trásl" Mas onde está o à liente ou âtrás na história? Você pode
lalar em à frente ou atrás na suâ vida individual precisamente poÍque
tem umâ duraaáo determinada. Se você tivesse uma vida scm fim, você
nunca poderia dizer se está indo para frentc ou para irás. Pâra frente
ou para trás é um trajeto finito.
Àgora, quando você vê como essas cstruturâs estáo impregnadas
na mente das pessoas, que elas servem como premissa dc iulgâmentos
que as pessoas iazem sobre os faios concretos, vocô vê o dano profun_
do que esta concepçào do século XIx fez para a mente humana. Vocé
veja que o camponês medieval. que acreditâva no fim dos tempos e no
retorno dc Cristo, sabia que isto nâo era um acontecinento histórico,
náo era um acontecimento no tempo. Ele€ntendiaâ noçáo de "firn dos
tempos" como uma coisa que náo podia ser medida na escala dos tem
pos, ele sabia que náo estava ao alcance da mente delc apreender isto
aqui; entâo, na medida em que ele aceitava isso como um mistério (o
negócio está acima da história, náo tem cono você inseriÍ na história),
eslava tendo uma visáo da estrutura dos tempos mais corretâ do que
a dos hisloriâdores do século XlX, que acreditavam nun1a estrutura
idcntil]cável da história. E embora os historiadores já náo acreditem,
todas as outras pcssoas acreditam; e acreditam pjor, que isso é um
conhecimenio históico.
lsso quer dizer que o nascinento das tais ciênciâs humanas no
século XIX já vem viciado por essâ tara congêniia, que é a idéia de
uma evoluÇáo identiÍicável. Suponhamos que nós aceitássemos. por
eÍemplo, a idéia evolscionista darwiniana, náo havedâ nenhüm moti
vo plausível para nós aceitamlos que a etapa evolutiva a que nós che-
gamos é o limiie da evolução. Vamos supo! ell acredito em evoluçáo
l6
clarwinianâ. nós nascclnos airavés de mutaçóes soiridas pelas espécies,
dc acordo com â prcssão do ambicnte lbrân se adaptandír, adaptando,
adaptândo, e cheguei neste ponio aqui a que cu cheguei Esta ó a vis,ro
qu€ eü tenho h.rje. Muito bem, mas se foi assin. erltão, náo há nenhum
motivo para a evolução ter pârado, deve haver nova§ pressões do arn-
bicnte. Se nós éramos lagartixas e assu1rlimos estalomraaqui no curso
cle uns poucos bilhoes dc anos, nadâ impcde que nós amanhá assuma_
nros un1a loÍma ainda nlais difcrcnte. e quero vcr se nesta época aindâ
úrrinuâre no' Jired râr'do c.n (\úlu\"ô dal1liniJnr
Como é quevocê vai acreditar queesta descobeÍta evoluiivâ perma_
ncccrá fixa nos iempos e âquela visâo que Dârwin âlcançou será por
sua vez o topo da evoluçáo humana? Basta isso para você vcr que essa
icléia é idiota. a idéia é idiota enl si, o sujcito ter a corâgcm de enlrnciâr
isto aqui já é uma bobagem. E piot se ele coletar um monião de fatos
para provâr aquilo. aí mosira que é mais bobo ainda, porque ele teria
que pmvarcomo é possÍvcl ele. num ccrto n1omenlo da cvoluçAo. deter
esta evolução criando uDú ieoria que antecipadamcnte já colnpromcte
os conhecim€ntos a sercm adquiridos nâs etapa§ §eguinics da mesDra
evoluÇáo. Deu parâ cntender? Você imagina unr trâjcto de algnrs bi-
lhócs de aúos e icn aqui Lr biólogo explicando a evolução ânimal.
ou a explicação terá se ioÍnado totâlmente diltrente ou será a mesmur
erplicaçáo dar\üiniânâ. Se é a mesma explicaçáo dâni/iniana. enlão,
houve esle nilagrc de que um conhecinrenlo adq iido nunlâ ccÍa
ctapâ da evoluçáo já abrângia todos os conhccimentos seguintcs â se
rem adquiridos peLa mesma espécic cm evolução da qual esla nesma
tcoria está ialândo. Qualquer pcssoa corrr um pouco de intuição lógica
percebe quc a estrutura de uma teo a da cvoluçáo é exatamcnte isto;
se eidste uma coisâ que nâo podê havcr é nenhumâ teoria da evolu-
çáoi se existe evoluçáo, ela nâo é i€orizável; se cxiste evoluçáo ela só
puulc -er urrr'alu.tue vn,( con.r-luu âre..íu pu,rrô (qu' \o\'' nxu
1t-
lcm a menor idéiâ de para onde está indo, portanto, não é evoluçáo,
são apenas translomraÇóes Selocê ienta dcpois consertar isso e dizer
colno lRichârd] Dawl.insr "Nào. náo lbi assim. nâo loi pela pressáo
do ambicnte, ioram apenas combinações lortlrilâsL" Entáo, num cerro
nomenio uma combinaÇão tortuita produziu a tcoria do lüchârd Da
r{,[ins. E daqui pam diantc, váo se produzir outras conbinaçóes lorlui-
tas totâlmente dilêrentcs dâ teoria do Richard Dawldns ou esta pârou
o prccesso evolutivo e será a palavra final? Dá paravocês entenderem
que â mcnte das pcssoâs que enuncian essas teoias ienl unra grave
dcficiência de percepçào do tenpo.
(ALu o) - Eu te ho a it pressào de qúe as ciefitistas atuais tlAa
lazefi tnais assocíaçáo efitre co ceito de eüoluçao e de pbgresso. eles
fiegaü a parle do prcgrcssa e alitmam a eztolução apenas como adap
taÇão.
P'úrri rdJ'O.ujEir. U:,,1 -Ollra r.. nêo con.<guim^. provaÍque
existe un1a evolllÇão no sentido de progresso. então, tira o progresso
e lica só â cvoluçãol" Eu digo: como é que tu explicas o progÍesso?
Porque alguDr progresso do conhecimenlo há. tlr mesmo acreditâs que
it tu.r ieoria é melhoÍ do qüe a anterior. Náo é? Nâo é isio?
S€ a€volüÇão não tem nâda avcr conl o progresso. entâo, por làvor,
mc erlplica a possibilidade do progresso.
tAtunol . I tp' dt o qur p applai adaptaràu L a man.'tra nai'
eficiefile qúe ós lemos alúalfiefile paru...
Perfeitamentcl Isso qrcr dizcr que você conseguiu. atrâvés do prll
ccsso de adaptaçáo, todas âs trânslbnnaçÕes das vidas a!é âgora. En-
ião, haverá ceriamente ouiras trânsformaÇõcs adaptativâs daqui para
diante. Essas tmnsformâçócs adaptativâs modilicarâo totalmente a sua
t8
loo a ou elâ permanecerá iniacta? Sc modificaráo a sua teoria, meu
l'ilho, então, você não pode gârantir que ela é veÍtladeira Eseelallcará
inlâcta, você consegüiu com a suâ mente criâr uma estruiura que per_
nrârece imlrne âo prcccsso adâplâtivo.
(Alutlo) Mas eles não dizefi que ela é úeúade, eles dizetn tqe'
tltls {!ue ela é lalseáüel.
Muito ben, ela é lalseáve1, quer dizer, você prctende que é uma
icoria cieniílica, agora cxisten milhares dc mcntiras falseáveis. Qucr
dizc! ser Ialseável signilicà apenas quc ó Lrma ieoria cientifica, náo
s;gnilicâ que é verdadeirâ. Náo é isto? Aparecerão rnilhares de ourrâs
teoriês. Entáo, por que prcstar mais atençáo a cssâ do que a quâlqrcr
(.4lu o) Potque nàô foi lalseada ainda E lalseáael. n14s nãoloi
lalseada, entio, eLa petfianece.
Veja, "ela náo loi lalseada ainda" signilica apenâs quc nós temos o
dirciio de continuar acrcditando nela. Náo é isso?
Mas você perccbe lãcilmenle que isto aí é uüa lugâ do problena,
poÍque se você está enunciando algo que preterlde tcr explicaqão de
nm processo reÀ1, e você diz apenas que isto é uma teoria lalseável
que não ioi fâlseada aindâ, então, a gcnte pode levartar o problcma:
durante quaúo tempo ela pode pellnanecer não falseadâ'? Quâl é a
possibilidade? Um dia, dois dias, três dias... qucr dizer urna teoria
que permaneqa mil e quinhentos anos náo ialseada s€rá melhor do
que aquela que peimaneceu só dois dias? Isto i plica a idéia de qlre
o tempo em que uma teoria permanece sem ser impugnada rcpÍesenta
um valor para elâ. Isto é inteirêmente absurdo. porque uma teoria ser
Ialseâda dcpende, em primeiro lugâr do acaso. Náo ó isso? Náo iem
meio dc você prever que as pessoas encontrarâo amanha ou depois, ou
l!
náo, uma prova contra a te.rria. Se você já tem isso, se eu iátenho uma
teoria a respeito das possibiiidades futuras de làlseânento da minha
teoria: "Olha, estâ teoria náo será lãlseada pelos próximos mil qui-
nhentos ou doG mil e quinhentos ânos e esta outra não será tãlseâda
durante duas senrânas". Entáo, você naturalmenle você já tem toda a
estrutum do conhecimento futuro sob o seu domínio nesie momento.
É verdade que é através de unr cálculo probabilistico, mas tem. E isto
é iútrinsecamente absurdo. Vcjaln. a teoria ser falseadâ, ou náo, de-
pende em primciro lugar [de]:qual é o número de pessoas que €stào
cmpcnhadas nisto? Segundo: elas tiverâm sorte ou náo tiveram sorte?
Então, isso aí é claro quc vira Lün jogo de dados.
(Aluno) Mas as ciêficias fiodemas todas sào assim!
Mâs é este exataaente o problcmâ. Quando o sujeito chega nisio,
o que ele lrstá dizendo é o seguintei "Eu não sei nâda a rcspcito deste
trcco. isto nâo tem nâda a ver com o conhecimcnto c tan1bén1 náo tem
nada a ver com a reâlidade, isto tem que ver com a legitimidade dâs
nossas pretensôes sociâis, eu pretendo ocüpar este emprcgo aqui e o
meu direito a este enprego é assegurâdo por isto, isto, isio e isto".
Ele está talando de legitimaÇáo dc um prestígio social e só, e dê mais
nada. Quer dizer, nós chanamos de ciênciâ â âtividâde que produz
cslas coisas âssiln, assirn, assim; nós não sâbcmos se elâs são verda
deirâs oü sáo ialsas, então, a minha pennanência no posto depende
de algrém falseara minha teoria ou não: eu aposto que elâ não será
falseâda pelos próximos clnqúenia anos, cntáo, a minha cátedra está
gârantida. Quem é que pode levar a sério uma coisa dessa? Por quê?
Por outro Iado, cmborâ o sujeito diga: "e1r náo estolr dizendo que
é verdadeira, eu nâo estou dizendo quc tem alguma reiaçáo círn a
realidade..." você sabe pcrfcitamenie que elâ socialmente funciona
como se fosse a cxpressâo dâ reâlidade e da verdade. Quer dizcr, você
2t)
(lcscmpenha um papel de deteüior de unl conhecimento verídico no
i[stante mesmo em que você afirmâ que náo iem a pretensáo de scr
vcridico. Por quê? Porque vocô impugna a possibilidade de qualquer
ronhecincnto verídico. Náo é preciso dizcr que isio é uma estrutura
Llc pensaúenio inteirânenie psicótica e que se fosse realmente ado_
tacla para todos os setores nos quàis a ciência ererce ulnâ âutorida
Llc. isso seria a mesma coisâ que um suieito dizer o seguinte: "Olha,
rós eslamos aqui olêrecendo um plano econômico. por eremplo, parâ
cste pais, bascâdo em pdncipios da ciência €conôln;ca. da agrono-
ria. disso, dâquilo, os quâis náo têm â ninimâ pretensáo de ser ver_
dâdciros, nras apenas náo implrgnáveis, potanto se elr clisser quc
csle plano vâi ter tal ou quâl eleito, não quer dizer que eie vai ter 1al
()u qual eleiio, quer dizer aPenas quc vocês ainda náo conseguiram
provar que ele náo vâi ter este cfcito." Você entcnde que o princípio
do [IGrl] Popper, do falseânlenlo, se cle fosse adorado a sério, ele
leria que ser esiendido às aplicâçoes práticas da ciência?
(ALutlo) Ltas ele é estendida. Se utna expeiê cia quc úacê laz
desptuüa a teatia, úacê tern que conigir a Leotio pata dat conla do...
Só se for desprovada, agora se náo lor desprovadâ, também nào
qüer dizer que é verdadeira.
(,4lut1o) - llas aí e ta no canceita de canobonçào, úocê a tesíou, deu
ce o, testou de oüa, ela dá cetta, até que aLluma aez t1âa dê. aí üacê. -
Entáo, náo icm jeito. O quc você esiá quer€ndo dizer no fundo é
o seglrinte: o princípio d€ falseabilidêde gamnte âlguúa vemcidade.
náo âpcnas â legitimidade lógica. Porquc, por exenplo. sc você está
com uma inleceáo e vai num médico e cle the dá unr aniibiótico, você
não se contcntaria, quer dizcf 'olha, você vai continuar coÍn csta do
ença, mas nós não vamos podeÍ provâr que você está com a doença,
porianto, você dcvc ticâr sâtislêito" Você âceitâ isto'l Ninguén aceltâ
isto. Vocô pode estar conr a doença igrâlzinha, só que niüglrém poderá
provar que você está com a doença, porianto. você deve se considcrâr
curado. Ninglróm âccita isso. -Nós êqlri vamos lhe vender unl autonrar
vel bascado nas ieis d.r lísica clássica. as quais nâo podeÍn ser prcva_
das, olr seja, nós náo sâbenos se cssc cârro vaj andar, apenas ninguóm
poderá provar que ele não anda' Você aceila isso? Nlnguém aceita
isso. Quer dizer que o princípjo da lalscabilidade é uma fraude total.
Quando âs pessoês aceiiam uffa tcorja não é simplesnrenie poquc cla
nâo lbi Ialleada, eles achâm que ó vcrdade mesmo, senáo não poderia
haver aplicaçáo dc nâdâ. OLr o principio dc Ialscabilidadc é àpenas 0m
discurso legitinâdor colocado €m cima dc prctensóes elelivas à verda-
de ou ele teü de ser estendido à ciôncia práticâ tambúr, às âplicaçócs
práticas iâinbónl, e à iecnologia.
(Aluna) Mas t queslào d.llísiLa clássic.lé ü.fi eknlplo, sc isso
Í ncia a, potque se z)oci tentat aplicat...
Mas cspcra ai. as pal.rvr.rs 'is1o lunciona" nâo poden ser usadâs
mâis, é isso que eu esLoú diTcndo pâra você ÍuncionaL ' Você náo
puuL di/(,.1 \ l'rncinna \ôc...ou(h.l/(, ri.SUL,r.,i'cg'upru
vaÍ que náo funcionâ"...
(Alü tt) Á leeitimaçiio..-
E dâi csta mcslna fiase por s!a ve7 ';ninguóm conscguiu prrrvar que
náo fLLnciona", elr digo: você está dizendo quc isto ó verda.le ou apenas
que ninguénr impugnoü esia nrcsna lrasc? E âssilü por !liante.
Quân.lo você diz: "ninslrón1 conseguiu pro!àr qLrc isto náo IuncjG
na'. portarlto nào loi lalseâdo ainda, isto ó ullla alirnaç,Lo cle [úo Nao
é? u prircÍrilr de krlseâhllklâdc sc âplica a cl.L târnbénr, ou nao?
lALutto) Naa!
Nâo? Eniáo, o principio de lalscabili.lade não esiá scndo âplicâdo
ffr parte algumâ. porque em âlgum momenlo você âpcla a um ouiro
|rincípio dc legitimâçáo quc náo é o prnrcípio dc làlseabil ade. l1lâs é
o )rincÍpio de veracidade. Você esiá se bâseando nele ainda. só que ele
rstá encoberto por um floreio chamado principio de falseâbilidade que
ó Lrmâ inudc em toda a linhâ.
(,\lLfito) - Na e ta to,|1ii detetmi adas aplicações que se üocê ten-
ln alllicar ã íísiat do Neaíatt não z)ão clat ceto, por e):eúplo, conü'oLe
la ptodüçao de satélit?, e tao paru estes casos a física de Neaúott tlo
sr aplica, eu t)ou let (lue adalat as mais completas de Einsteh.
Nlas o que isso tenl a ver com o que eu estou dizcndo?
Sc o principio dc tâlscabilidêde ó o único princípio de legitimidad€
cicntílica, e vocô náo pode apelar a unl princípio de veracidade. enião.
isto é regÉ univcrs.Ll enl lodos os níveis do conh€cimcnto cientilico.
ifcllrsive as aplicêçóes práticas. Mas chega um monlento em quc o
suicito qlre esiava aió âquele moírênto usando o principio dc tãlseêbi
lidâde, ele jústifica a coisadizendo, porexenrplo.'istofuncionlt' Você
cslá eniendcn.lo? Ncste rnomcnio ele apelou a um outro prlncípio quc
não ó o dâ lãlseabilidâdc. E toda e qualqucr disclrssáo ci€niÍfica termi
na assimt alglrém apela a um pÍincipio, diz que vai indo pclâ lalseabi-
lidade, mas chcga um certo momcnto ele apelâ a outro p ncípio qu€ ó
o principio da veÍâcidade. e diz, por excmplo. "isto funciona". Quando
\.ocô di7 "is!o lunciona". você qrer clizer que isto lirnciona ou quer
dizer apenâs q[c ninguaüi âindâ provou que nãô firn.innr?
Isso qucr clizer qu€ o principio cle verâcidaclc conlirua lá. só quc
clc csrá cnc!,trêdo sob urn dislaice, cssc djíãrce chanra-sc princípio da
lalscabilldrdc dc l(arl l']oppcr. quc cr.r rrn chârlatão
(Alutlt)) lsso efiho é semelhante à situaçào que ocorria no sé'
culo XIX em qúe íado tnnuto que Íazh ciência, apewr de não estar
mudatldo una LíÍg,ula iLo qúe o Bacon h.tuia diÍo, dízia que. .
Alcgava-se Bacon, mesnol Hoie enl dia ninguém usa o negócio do
Poppe! todo niundo só usa pârê dislarçarr "Ollü, isso aqüi cu acho
que é vedâde, mas náo posso dizer isso senào váo falar mal de mi ,
en1ão, eu digo êpenas que náo foi falseado". Mâs ó clâro que isto tem
um limile, oLr seia. o princípio cte falseabilidade náo pode ser âplicado.
e de lato não é aplicado nunca, clc é apenâs um prcicxto, você conti-
nuâ usando o mesmo princípio de veracidade quc tinhâ ântes, só quc
você inventou um floreio lógico mais elcganre que lhe perlnitc escapar
da discussáo, porque senpre quc você vài inrpugnar a tcoria do caÍa,
el€ dizr "Nào. náo, não, rnâs cu nâo disse que é vcrdadeir.r. eu só dissc
quc ná0loj lalseadâ".
A t€oria do Popper só selvc para isso! só seÍvc pârâ lugir da dis_
cussáo. O Popper erâ unr creiino elelivanrente: agora, cono ele é um
câra que se iornou simpático poÍque ele crâ antilascista, anticonu
nisia, Iibcral, etc.. etc., então, todo mundo gostâ dcle. Ele não pregou
ncnhuna coisa indecentc, mas ê teoria delc é indeceDie. Qüândo você
cxanina. está Iá
(Aluno) O senhat haaia diÍo üfia üez que a teatia de Poppet é
un caso especial da dialélíca...
Istol É um câso especial da dialóticâ transfomrada em regra geral. E
translbImada na única rcgra, na verdade. ou scja, na progressiva pcrda
do domínio dâ técrica lilosótica que a gcntc vai obseÍvando a partir de
uüra certâ ópoca conreça â câir, cairi e náo é umâ coisa do mufdo mo'
dcmo, isso conreqa na Idade Média nresnlo Nessa progressiva queda
chega um ponto crn que o indivíduo náotem nlitis a idéia dc que aquilo
que €le está enunciàndo já foi cnunciâdo dois mil c qualrocertos anos
z+
atrás dentro de uma outra estrutura maior que dá lodâ a legitimidade
c os limites daquilo. En1Ao, elc pega aquela coisinha que ele êcabou de
descobrir que Àristóteles já sabia; uma das dez mil coisas que Arisió-
rcles snbia. clcpegâ âquela, que é a única quc ele sabe, transfonnê na
regra ale tudo e acha que fez um grande negócio. Mas está fazendo um
pâpel ridículo, quando você confuonta isso com a histódâ inteirâ, eu
tãlo: mâs ó ridículol
Quer dizer, o problema de iodo cste mrlndo modemo é a to
tal lâ]ta cle humildade; eles achan que eles têm que ser melhor do
que Platáo e Aristóicles. É rnuito diiícll ser nelhor do que Platáo e
Aristóteles Elcs começâram nluiio alto, entáo. o scgredo é aquele
ncsócio que o Heidegger falou c ele n1esino talvez náo tenha cum_
prido: "olha, você quer discutir esse negócio? ]]ntão, quatorze anos
de Aristóteles, primeiro '. Você tem quc voltar a isso. náo tem outro
icito Na biologia é o que eles estáo |azendo agora, falando: "Tudo
o que nós descobrirnos, Arisióteles já tinha laladol Entáo, vamos
voltâr lá:" Mâs cles Ídzem isso é porquc eles acrcditarâm na idéia de
cvolução c ale progrcsso, eútão, por acrediiar que se en na§ci depois'
eu iá nasci sabendo algo mâis que os outros náo sabiam. então' eu
náo preciso estudü aquela coisa É a nelhor maneirâ de você ir tân'
to mais para trás quanto nlais você âcredita estar indo parâ irentc.
É o suicito [qu€] porque elc aprendeu a anctaÍ de biciclela, elc náo
sabe mais andar a pé, depois aprendcu a andâr de automóvel, náo
sabe nlais andar de bicicleta Qucr dizer, é uDrâ Perda de câpacida-
de. uma perda dc inteligência. Se você pegar o csquemâ do lReu
venl Feuerstein e âpllcâr aos Iilósofos. àos cicniist.ts, vocô vê que a
dcgrâdação, isso que cu estou falando, é um 1ã1o empírico compro_
vável. os carâs rêm deliciência de intelisênciâ. PDr quê2 Eu âcredi
rô q.rc poJc \a\.- ('ôluciu p ôg-c"ú .larn qu< \'Je: t m L n
crnpirico. constatávc]. em úruitas coisas a genle sabc rnais do que
II
outros câras sabiam. Porén tLrdo o pÍogresso é aliamente problemá_
tico e elc dcpende dâ conservaçáo do estado anterior. QueÍ diz€r, o
progresso é un1a noçáo quaniitâtiva, quer dizer, você sabia x, âgora
sabe x+1;âgorâ. sabc x. agora sabe o x+ 1. joga o x c fica com o 1,
acr€ditando qLre náo precisa.. Qrer dizer, é nmê espécie do progrcs-
so por transnrissão dos câractcrcs adquiridos; enião, eles âcreditan
mesmo Ique] como nós nâscemos num cerro tempo, aqllel€s conhe-
cimentos ântigos já esláo tão imprcgnados na nossa atmosfera que
nós náo precisa ros dominá-los pessoal enle, a nossa cultura os
clolniúa. Isro nunca âcontece. Náo existe conhecirncnto irnpregnado
nâ cultura. só exisle conhecimenio na cabeça cle seres humanos.
Se num cerlo momento ninguéll1 souber aquilo, náo adiantâ você
dizer que a cultura sabe Entiro, vamos pensar o seguiniei quenr
hoje sabe tudo o que Àrisióteles sabiâ? Náo digo ilrclo, mas x, cu
vou châmar de r isso âíi x+ 1, eu dÀse só o r. Por cxcnlplo. se você
pegar o Giovânni llcaie. o Ciovânni Realc sabc quase tudo o que
Plâtáo sabia, c ele siLbe mais duas ou trôs coisinhas que Platáo não
sabia: eu l4lo: então. é claro que houve ptogrcsso, só que houve en-
quanlo ele conservar aqLrele conhecimento, sc elc perder, náo houv.
progresso ncnhun: Quer dizeÍ quc etistc unl limiie à possibilidadc
do progresso, que é o limite da possibiiidàde do portador hlrnano
do conhecimento hurnano. E os caras êscapam disso acteditando
que existe uma impregnação no ambienie cultural. Estê é a fonte de
todos os enganos. Você acrcdita: "âh, eu náo sei, mas alguém sabel"
'lbdos estáo pcnsando a mesmâ coisa, quando \rocê vaj ver ninguórn
sâbc. Esprcnc um por urn: "E você, sâbe'i" 'Ah, eu náo. mas alguérn
sâbeL" "tj você?" "Eü náo sci. nlas alg!érr sâbel Qtrando você v.ri
ver, ningüóu1 sabe nadêl
luslamcnte na h(»a em quc vocô conflâ mais nâ In)ssibiLidadc do
progresso, locê csrá acabafdo conr eh. csiá a.abardo com es§â pos
sibilidade, porque ela existe. mas ela cusia alguma coisa. E às pcssoas
lambónl acrediiam nisio, por quê? Elas só lazem a cLrnia dos conheci
irr 'Iu. q-e elas rclqu:r' ar I . náo doi quc c J' D( Je an. L u negncrÔ
do Jeân lourastié dâ história da ignorânci.r, o progrcsso cta ignorâr-
cia O lean Fourastié tinha um livro, '1As CondiÇões do Espirito Cien-
tífico", que é umâ verdadeirâ maravilha, c ele disse [que] se a gentc
lor Iôzer as contas do conhecimento que lbi perdido. é muito maior
do quc o que loi ganho. Então, nâo houve progresso, houvc prejuí7o.
Mâis ajndâ. q[ando as pcssoas confundem o pÍogrcsso alo conheci_
mento com o progresso cla iécnicâ. A gente sêbe que ê quantldadc de
conhecimento pâra lãzer üm progresso iécnico Iormidável ó muito
pequena. Você com üma únicâ descoberta ciertificâ, você faz milhócs
c üilhÕes c milhóes e rnilhóes e miihôes cle aplicaçôes técnicas que
nrrdâm a làce do mundo. Sevocê pegar. por excmplo. esse ncgócio de
Linguâgem dc compüiâdot isso aí loi invcntêdo por Lcibniz no século
XVIII com base nulna ciência chincsa de clnco n1il ânos antes, isto
é. â linguâgenr bhária; eu digo: é isto, os chineses já iinham feito,
Leibniz pegou de novo sabendo que era antigo, §abcodo qu€ ele ráo
eÍava inveDtando nada, delr uma forlnulação mais moderninha, de
pois os c.Lr.ts p€gâram. junlararn essa idéia do Leibniz com a idéia de
Pascal da máquinâ de pensq que era uma sinples adapiação do ába_
co que ó muito mais antigo, juntarâm as duas idéias e falaram: "Se
você botar esta máquina para pensar binariâmente íica muito mâls
fácil de construi-]â". Qual é a quantidade de ciência cletivanrenie
qüe €xiste âi. de ciência natemática? Quase nadaL Enláo, â história
dâ tccnologia náo é dependente dâ hisióriâ da ciência, elâ é urnà his'
tória Àutônoma. Por eremplo. tem âqucla :\ [Assustadora] Hisiória
dn Medicina' que saiu outro dia ldcl unr suieito [{ichardl Gorclorr.
clc n1oslra que só houve dozc dcscobertâs r]a histór;a da mcdicina só
que essas doze mulriplicaran enr milhócs dc aplicâçôcs iécnicasi qrLc
)i
sáo obtidas por pessoâs que estáo envolvidas na ailvidade cientíiica,
mas que náo têm substância científica por si mesmo. Então, quândo
a pessoa lquestiona]: "Náo, n1âs como é que você expiica os compu-
têdorcs e mais isso, mâis aquilo ê nràis aqüilo?" ÊD digo: tecnologia,
isso é outro processo. Alérn disso, a naior partc das hvençôes quc
você tem, as pessoas fizeram a invenqáo ântes de sab€r o princípio
cicntífico que explicava âquilol PoÍque as pessoas quando ialam de
ciência e tecnologià nao sâbem o que é tecnologia, elas náo tôm idéia
do que é tecnologiâ. A adiculaçáo lógica de um conhecimento técni-
co é exatamcntc o contrário do conhecimenlo cieniíÍico.
A genie chama [de] uma lécnicâ. o conjunto dos meios articula-
dos para a produçáo de üm deteÍmlnado llm; esses meius pírdem ser
os nais heierogêncos possiveis e náo hâverá entre eles nenhuma co'
nexáo leórica concebivel. Portanto. nenhuma técnicâ dc fazcr o quc
aurr quc \cia lcm . \pl..oçdo cienrii(á { c.encir e trcci5, m( leo
contrário, quer dizer, urna ciência só lida com os conheciÍrentos que
podem ser articulâdos logicamenie outros. Porquc cla
nâo visa produzir um fim, mas visâ produzir uma expiicaçáo Se você
pegar por exen1plo. o processâmento do pctrólco, dcsde que você faz
o b1rraco e iira o pelróleo de lá até ele virar algumâ coisa, a Drultidâo
dc conhccünento que está envolvidâ nisso, você tem corhecinren
los geológicos, econôn cos. mercadológicos, quimicos, ctc.. ctc.; cu
digo: articlrle iudo isto nulna teoria geral. lnpossívellÁ a iculaEâo
é práticâ. Todos esses conhecimentos que sáo heterogêneos, obtidLrs
por nleios diferentes e senl conexâo lógica intcrna sâo articulâdos na
prática pâÍa produzir esle lim Por exenplo, cono é que você ârticlrla
o cfcito mcdicamcntoso de üma sübs1ância injetada nâ sua bunda
com a produEão de seringa? Teln umâ teoria que possa explicar aD
rnesnlo iempo com base nas rnesmas cL,isas o e[eiio do medicanento
c a prodLrçáo da seringa? Clârô qu€ nãol Agorâ, se ialtâr o0 o medi-
,r8
rânlcnto ou a scringa. náo haverá injeÇáo, porÍanto, você não ficârá
rurado daquilo. Então, técnica é isso, técnica é uma aÍticulaçáo ra_
cional em vista de um fin1, querdizer, o principio raclonal da técnica
a a finalidade e náo a câusa, portân1o e1â é o conirário da ciência. Isso
quef dizer que você pode ter um progresso imcnso da tecnologiaIrum
lugar onde tem relâtivamente pouca pesquisa cientifica. Por exempio.
o quc os chineses descobdrâm enr matéria de ciência nos ftltimos
cluzenios anos? Absolutâment€ nada, e, no entanio, a tccnologia iun_
ciona. Quer dizer, a râcionalidade técnicâ é o inverso da racionali-
.ladc cientílicai uma coisâ pode aiudar a oulra; pode, n1âs nâo ajuda
necessarianente. Você ier umâ explicaçáo causâi melhor para ün1
proccsso náo faciliiâ enl nâda a aplicaçáo tccnológica desse processo;
porque à aplicaEáo 1ecno1ógica vai depender da articulâqáo dclc com
outros processos qüe náo têm nada â ver com aquela causa.
Então, iodo mundo está acosiumâdo na cültura modernâ, iodo
mundo lem opinióes sobrc tudo e reccbe esse bolo de intormaçâo e âí
lbrna síntcses imaginárias, essâs sínteses imaginárias exprcssam pro_
cessos que as pessoa! acreditanque sáo reâis. mas quandovocê vai de_
compor aquilo e dizeÍ 'o que vocês estáo quercndo dizer mesmo'. você
\"i \Lr qu. n',dd coÍc.por(le no rnurrJo,Fal.3quel.s idcid.. naJá L
o lamoso negócio, você iem âqui o símbolo, â palavrâ, o conceito que
você usa, depois você tem o significado dela, depois do significado ten
que ter o preenchimento do significado pelâ realidadel qucr dizer, se
você cntendeu uma idéia, por exemplo, eu digo para você: o dmgâo
vcrde com bolinhas brancasl Entendcu. náo é? Entào, você eniendeu o
signilicado. Agora, cu digo: muito bem, agora me àrrume un1 exenplar
Quer dize! você cntendet o signilicado é umâ coisa, e você eniendcr a
realidade da coisa ó oütra compleiâmcnte diierentc.
Como a comunicâçáo em gcral, a cültura inlelÍa, funcionava da
trocâ de signlficado como se iosse Lrm baralho, eü passo Lrm signifi_
l_
cado parê !ocê. você me devolve outro; entâo, eu digor a coitada da
rcalidâde jamais ó convocâda a participar disso, ela só aparcce quando
bâseado nessa parâfernália toda você tomâ algurna decisão prática e se
esborrâchÍ bd{r. nresmo êssim você ainda pode inventar um subtedú-
gio poppcriano ou mafxista, qualqueÍ coisa. para escâpâr-disso âí.
Entáo, o retorno dos signil'icâdos à reâlidade só se laz por análise
lllosólica dos conceitost isso aí é o que Arisiótclcs e Platão sabiam
lãzer, nlas depois o pcssoâl não sabe mais, e cada vez sabe lnenos,
menos, menos, ao ponto dc acrcditar em teoriâ dâ talseabllidade.
Quer diier o sujeib que âlega isso, no Iundo elc sabc quc em algum
momento ele val apclar a um oulro princípio, rnas este princípio nâo
pode ser nomeado
(Aluno) - Esse outto ptincípio é o tecfiológico?
Náo. o princípio da veracidadel No fundo ele está querendo dizer
qoe a teotia dele é verdadeirâ, quâlquer sujeito quc apclc à teoria da
1ãlscabilidade. ele diz: "Eu náo posso dizer que diretâmente que é ver,
dadeira, por quê? Porque eu não posso provât mâs eu âcredito que
él Então, conlo é que eu làço parâ delênder esta teoria? ELr alcgo o
princípio dâ falseabilidâdel" Mês ele só seÍve para isso, o princípio da
ialseabilidade só scrre para dcsconversar. Ele não é o princípio eletivo
no qual a coisa se baseia, ele é uln princípio retórico, náo é clc quc lc-
gitima a teoriâ na câbeçâ do sujeito que a enunciou. Éle selve só parâ
exorcizar as incomodidadcs.
(ALLLno) Nesse setlliclo ÍnuiLo po ctis ciências sãa ptuDadas!
Muitissimo poucas coisas, ou seja. o princípio da veracidade conti-
nuâ vigorando perfeitanlcntc, c é e]ê que interessa. só que tudo o que
as pessoas dizem que saben, elas só saben um pouquinho. E issD elas
nâo qucrem confcssar. Por exernplo, pegâ o núflero imeüso de pessoas
que vivem de pesquisa cientifica cm todos os setores, se o público em
30
geral soubesse disto âí, ia denritir novcnta e nove por cento c dizer:
''Nós náo precisamos de lanto cientista, náo precisamos mesn1o. isto é
I ra cr'rpu.hr!ao Ír.,qucrcnlidcl ("'lro po\ pdr0 cu|rilr(aní"'L:
Mas e a classe, col1lo ó que vâi Iicâr? A iniclcctualidade é a lerdadcira
classe ociosa. é paga para náo fâzcr nada. e muitíssimo bcm pâgâ. Se
vocô pegâr tudo o que se gasta com ciência, conl universidade, eic.,
ctc.. e comparaÍ com as granales fortunâs. as grandes Í'ortunas sáo in_
leriores a isso aí, o Bill Gates náo tcm tania gÍana assim. Agora, como
esse é um pessoal mlrito ambicioso que nunca êstá satisfeito com o
que tem, eles senpre achâm que es1áo gânhando pouco e que precisa
de nais verbas para pesquisa, e mais e mais e lnâis. . Pesquisa do qlrê,
üeu lilho? Do nâdal
Sc você vé, por €xemplo, o que âcontece na liieratura; nâ literatuÍa
existe uma prolusáo imensa de textos que sáo âpenas a tepetiçáo de
esquemas verbais já iüveniêdos duzentos ou qülnhentos anos ânies
por dois ou três poetas verdadciranenle criativos. Sc você Íizer aquela
peryunta do lEzra] Pound: "Olhê, o que acont€cclr de lãto na históriâ
dâ liteÍatura?" Você vai ver que diminui nuito. sobÍa uns doze ou
quinze caras. Por exemplo, entre os árâbes... existe na cultura árabe
essa consciência disso: "Náo, só existenr oito poctasl" O resto está só
lloreando em volta, fingindo que é. entáo. por isto lnes o, na cultura
ifuabe os poctas em geral não teráo un nilésimo do prestigio que têm
no Ocidente. Os grandes poetas têm. sem dúvldal Mas aconiece que
é o nercado das leiras? E a classe ociosal Vai lãzer o quê? Etltáo, é
êssim, o suieito sabe, conhece aquelas coisas, coisas centrâis da§ quais
todas sâiram, ele teú de fato o domínio do panorama, entáo. ele náo
vai se interessar por essa bobaiada toda. Eu nâo vou comer a falsili_
cdçao da lol.iticacào dJ li lr',ic"çan da ral'il'iLrido \e eu ta corsJmi o
produio originário, eu náo vou pcrder temPo com essâ bobagem.
:ll
Ulna vez um pcssoal convidou o português parâ jogar sinuca. "Já
jogou isso?" Êle lalou: 'Náol" Dâí, entáo, levâran o poÍuguês, lá o
poriuguês embocou tudol "Ué, mas vocé não sabiê jogar?" "Náo, n1as
é que cu josava bilh l " Então, fazia aquele jogo com irês bolâs e sâhia
mlrito mais enbocâr as boias do que os outros. Quer dizer, qual é a di-
fercnça do bilhâÍ paÍaa sinuca? Os caras botararr nais bola, com mêis
colorido. mas o ncgócio ó a mesma coisa, é embocar a bola no burâcoi
esiâ é a1écnica, o resio está lloreândo. náo mudou subsiantivamente o
jogo. Entáo, o qüe os caras íazem é isso, eles poem mais bola no jogo,
n1ais colorido. 
'nâs 
o joso ó o mcsrilo.
É por isso mesrro que a quaniidade de pseudociência que se pro
duz ó uma coisâ âbsoluiamente aterradora. E as pessoas lêen hoje o
[l chdrdl D"uLir 5. . r. . . I u 'alo a.a.l, um" c\p. ric r.ia. p"ô.. "c1r
no século XIX os equivalentes do Dawkins. Quer dizer era o sujeito
quc falava em nome da ciênciâ e tinha uma audiência enorme. OÍa,
nâ vida cicntilica cm gcral, ó dificil o sujcito duranie a vidâ cons€güir
lazer uma descoberta cientilica sériâ e âinda ter tempo de conquistâr
I nr dudicn.ra r ic r r .a. ger"lr rH ,re r"o Jâ l: rlc .e p.eue' q. e u , ara
que tenha audiência náo é o sujcito quc cstá trabalhândo a coisa mais
subslanliva Enláo, pegâ os equivâlentes e você vai ver que se iornâ-
rarn absolulam€ntê inlrâgáveis, não dá paÍaler os caras po.que é tania
bestcirâ que tenl. Por excmplo, Ernst Hacckcl ó um. Lud$'ig Buchner
é outÍo: lodo mundo lia os câràs e o pessoal da culturâ média. os for-
mâdores de opi iáo. citavam esses caras como se lbssem a ciência O
Dawldns, daqui a tinta ânos âs pcssoas vão rir dclc, corno hojc â gcntc
ri do Büchner ou clo Flâeckel. Por quê? Sao pessoas que làzem de con
tâ quc sabcn nrüito mâis coisa do qüe saben realnrente.
O progrcsso da ciôncia ó muito difícil, isso acontece dc potlquillho,
entáo, náo ien ianu coisa para vlrcê sLrltàr lbguele. O que tem é a ne
ccssidade de você manter â atividade social de pÍodLrqáo de idéias em
circulaqão porque ten que alimentar institutos de pcsquisa, jornalislno
cieniíIico, a mídiê, suplenentos culturais, etc., eles têm que ter algum
rssunio do qual falar, então tem quedar a impressáo de que cstá acon_
teccndo alguma co;sê.
Quando você Íai ver no século seguinie, o que sobÍou? O que eles
rlescobriran mesmo? É müito menos do que parecla. Mas isso sempre
loi assinl Mas quen foi que meleu na cabeça das pessoas a idéia de
que todo mundo pode ser cientisia? De que todo mundo pode §er "si_
nhô dotó"? Pode ser, nós lhe dâmos o direito de ser, você tem todo o
clireito. mas o direill, de scr algo náo vai transformar você nessc algo.
Só quen podc transformá lo nesse algo é você mes'no
Por exelnplo. você náo tem o direito de ser campeáo mundial de
boxe? Todos nós aqui ternos o dircito. Existe um impedinento legal?
Náol Agorâ, você sobc Iá no ringue, nâ prim€ira porrada do Mike'I\,'
son sai à sua câbeça, só tem csse problema. Acaboul Entào, essa coisa
clo direito também é uma engânaçáo. De que adiantâ em ier o direito
de uma coisa que eu na realidade não posso ser? Todos nós náo temos
o alireito de ser presidente da repúblicâ? Você quer scr presidenle dos
Estados Unidos? Eu digor podel Agora, até vao mudar â legistâçào O
imigrantc pode ser, eles fizeram a lei 1á pÂra o [Arnold Aloisl Schwar'
zenegger. Você baseado nê lei Schwarzenegger se candidata. Só âs lr1u_
lheres náo podem ser papâ;nada é perfeito.
É llusáo, queÍ dizcr olêrece para todo mundo, você pode ser tudo.
você pode ser isso, você pode scr lwilliâml Shâkespeare. Quer dizer'
é viver. mas é viver na irealidade, mas â base da cultura Ínoderna é
a irrealidade. Agorâ, é possí\,el que âs massas todas iomem conheci
mento disso? É quase impossívell Eu posso âté chegar e explicar d€
um por um, nào vai âdiântar nâdâ. Na ciência luncionam as pessoas
que gostam de uúr negócio chamado realidadc, mâs sáo muito poucas,
a maior pafle dâs pessoâs fica tdste petânte a realidade. Elês tênr quc
ll
ter rma ilusão, uma coisa que Uaça com que etasl liquem aninradas.
Vamos fazcr o diagnósilco real, nesmo, como a coisa cstál Olha, você
precisa ter muita força, você precisa coniiêr em Deus, porquc sc você
náo conliar em Deus, se você for confiar só ncsse mundo. esse Ínundo
o dcccpciona. A genie paÍa agüentar ver aquelâ porcada precisa ier
esperança nun] ircco mclhor. não nesse mundo. Eniâo, o número dc
pessoas que querem sâbercomo as coisas sáo nresno é muito pequeno,
e só esscs quc dcscobrem alguma coisa na ciência. 
^s 
pessoas em geral
precisàm de crcnÇas quc âs anime . náo é uln problema de realidadc,
é uÍn prlrblenâ de auto-imâgcm. Náo está vendo o governor precisa
rnelhorar a auto-imagerlr do brasileiro riu digo: oÍa, prccisa melhomr
a auro'inagcn justament€ porqüe a realidade está muito depdmentc,
se lor dizer a reâlidade para clcs. eles váo todos estourar os miolos.
Por âssim diz€r o seguinter você é o povo ignorante. inepto, você tenl
umâ dose de incapacidade maior do mundo. qualquer cdra da Zârnbia
the dá de dez â zero. vocô ó o povo nrâls assassino do mundo, mais
mentiroso do nurdo. esla é a redlidâde, mas você náo pode dizer pôÍa
as pessoâs senáo clas ficam iristesl Náo é isso? Aquela estâtística: Es-
tados Uniclosr nil € quinhcntos homicí.lios por âno; Brasil: cinqüenta
nrill E nós dizemos: a sociedâde anericana é violcntís sim a I QueÍ dizeÍ,
nós qucrcmos acrcditar nisso para â gente se seniir melhor
Se você está muito idcntificâdo coff â sua condiçáo de brasileiro.
qüer dizer, parâ você estar animado na vida você prccisa âcÍeditar no
Brasil. cntão, você não vai poder estudâr â reâlidadc do Brasil. Agora.
se você náo depende disso, cntáo: queí saber? Se o Brasil é bom ou
ruim para min náo [é relevante], cu cstou cm outml Então, você pode
quercr sâber a realldade daqlrilo.
Existe uln lado sociológico nessâ história das ciências, sobretudo
nâs ciências huúanas, que as pessoas ainda náo levam em conta, que
é o scguinte: quem está fazendo esla ciência? De onde vêm essas pes-
v)ârl Para que elas entrararD lá? E o que elas qucrem? Se vocô pegar,
rssinl. dcz milneguinhos quc entraram numa escolad€ ciências sociai§
e você perguntâr: escuta. você quer dcscobrir mesmo coino funciona
r socie{tadc humana? Você está dlsposio a pagar o preço? Vô que é
un1. ou d.ris. A maior padc quet outra coisa cornpletâmentc diterente'
Íluêr dizer que váo fa1âr sobrc o assunto. mas com total dcsprezo; eles
rão quercln conhecer aqlrele negócio, eles só querem lãlar a respeito'
li é assim mcsrno, ó quasc conscieniemenie as§uÚrido' Hoic lnesl1lo eu
«rmprei um livro do Henrique Dussel. quc é üm suj€iio da filosofiâ
ila libertaçao, todo mundo cstlrcLa Ílenrique Dussel tal; e cu li três
I'r"ina...,r ra'ei rriu e po..rtel. ("p '- Liln ( r!h_Pinacirru L: Lle
lalâ dÀ oniologia grega e diz: 'i{ ontologia ó a exPressáo da dominaçâo
ocialental e clesprezo pelo outro". Eu digo: mas e§sa ortologia é iguâl a
dos hindusl Como é qu€ vai lâzcr âgora? Quer dizct ele nâo sabc qÜe
cliste urnâ ontologia I ndu que é iguàl âquela, cle não sabe e nâo quis
sabef. c se você [oÍ contar para ele, ele vai ficar muito bravo' Entâo por
'1.e\ucequrrraldralgrrnJ 
Ôi\Jsnbr(' ÔrrulÔerr 'e \ori nao ''eÍ
saber nada clo assllnto? [le vai clizer: "Eu estou pouco irrtcressado
na ontologia, eu quero é pâreccr o gostosáol A ontologiâ cntrou âqui
como Pilatos no C/edo1" Ii assim mcsmol
(Alü11o) De aez em qltando eu cruzo cam alluns aÍunos de ciâl1'
cias saciais que eshaÍazenàa mestrado ou ttlgo do Eênero, eLes se co
locafi1 o trabalho cle fa.et untt:l pesqüisa sobrc aLeutn assunta' então'
p:?parafi Lá tlfi questionátio e saem peryunta da pttn as Pessoas'
Aí, semprc que elt pelo o queslionátio, o í1fipressão qLE eu tetlho ao
í)er aquelas petSuntas é que eLds foún feilas de prcpósilo para niio se
chegar à co clusâo fienhüfiu1. Aí eu coneça a Íalat pata o d'ito cuio
daqttelns falhas d(ls peryuntas por qüe nãa é possí el titat netthuma
i Íotmação daquila ali, e a pessaa co eça a licat llusüaLl't' começa
l5
Pois é, você vê quc sào intcligências muito pcquenininhâs que nlal
poderiâm assunir a responsabilidade de trabâlhar num poslo de gâso-
lina e que estáo lálra condição de cientistas sociais. Esta é â reâlidadel
Agorâ, pode acontccer lqucl no meio de milhócs você cncontrc um
sujeito e lale: esse cara aqui é de verdade, ele quer saber mesmo! En-
iáo, essa pessoâ vai seÍ tao diferente dos outros que os outros nâo váo
nem perceber a diferença Quer dizer, clc tcm uma difcrcnça conlo de
uma dimensão para outra, mas ela náo é perceptivel Esta idéia de que
para você falâr de um âssünto, você tem qúe ter estudâdo o assunto,
cssa idóia ó rnuito dificil dc cntrar na cabcÇa das pcssoâs, elas nâo en-
tendem por que. Porque elas acrediiam que já eÍiste uma impregnâção
do meio. "Eu não preciso sâber aquilo porque esse conhecinrcnto dcve
estar aí cm algum lugar, eniâo, cu já falo a partir dessc patanar para
cima. Sem eu ter que ir Iá âdquirir pessLralmente aquilo."
Agorâ, acont€ce que às vezes pelo slrjeito acrcditar que clc iem o
conhccimento, elc acaba tcndo mesmo, isso às vczes âcontece pêra
celtos domínios: por exen1pllr, línguas; pdrâ você aprenderunla língua,
â melhor raneirâ de você aprender é vocô botâr na cabeça qrlc você
iá sabe. e você sai falando tudo errâdo, e você sem perceber vai corri
gindo. corrigindo, dâqui a pouco vocé está falando. Mas acontece que
para as ciências ;sso simplesnrenie não funcionâ.
Agom, toda a história da constituição das ciênciâs sociais n1oder-
nas é todâ uma históriâ de charlâtanismo. desde o início. Nenhlrm
daqueles caras, neln [Émile] Durkheim, nem IHerbed] Spencer, nem
lAugusto Comte, nem Karl Marx, nenhum deles tinha a n1enor idéia
do que estava lalândo. porque eles acrealitavan que a cultura já ti'
nha cllegado a um palanrâr a e que paÍtindo daqüele pâtâmar eles po-
diam construir cn1áo urna ciência dc unl novo domÍrio que niio iinha
sido erploracto âindâ que é a sociedade. Se eles tivesse ljdo Platáo
e Aristóteles eles veriêm a diliculdade de lazer isso que eles estavam
r ucrcndo fazcr, lras eles náo tinham a nlenor idéia da dificuldade. O
rrurdo cle um Durhhcim,eniao, é um mundo de Lrma simplicidadc
rslinr pueril mesmo, é um ioguinho de criânça. Quando você pega o
livrc, do anrropóloso anlcricano que se chama [Edward] Sâpir sobre
a rcligiáo, cle diz: 'A reliSiáo é o coniunto dos neios de âlcançar a paz
(lc cspírito". Eu cligo: paz de espírito, [vocô] ton1â um LSDI Você acha
(tue cra realnentc isso que os caras estavân buscando? Vocô dorme,
tcm paz dc espíiio. Nâo pensa cnl nada, não se preocupa con1 nâda.
Nao pensa em lcoisa] nenhumâ, você iem paz de espírito. Quer dizcr.
a ma concepçáo assim iáo bobinha, iáo classe média. que conlunde a
rcligialr con uma aspirina. E ele acredita e aiunta uma sóric de conhe-
rimento baseado naquilo. É fantástico como é que o estudioso pode
estâÍ infinilanentc abâixo do seu assu to
Quer dizer, paz de espÍrito? E aqucles camaradas na arena lá sendo
comidos pelos leóes? Jesus Cristo pregado na crüz? É paz de e§piri
lo? Quc droga é essâ? Coino é possível urna coisa dessa? Quer dizer'
a pura imaginaçáol E essc livro coniinua sendo estudado. o que não
qrer clizcr que às vezes no nreio dcssa patacoada todâ o suieito não
diga uma coisa ou outrâ que scrve. Esses antropólogos que sâíâm pclo
nrunalo anotando costuües esquisiLos c tir.tndo conclusóe§; quando
você vai ver eles até têm un1a ceÍta coletânea cle lãios, mâs a posiçrio
dos caras é táo ingênua peÍantc âquilo, c ingênua em grande pârtc
pelo scguinte: o su;eito sai de uma §ociedade que iá cstá funcionando,
o sujcito americano, entáo. ele esiá lá, ele iá iem um sâlário' está na
universidade, quer dize( toda a vida del€ é montada em cima de uma
estrutura social preexistente que ele náo precisa sabcr como funciona
para que elâ funcione Ele com bâse nisso vai investigaÍ uma ouira
sociedade que üào o conprometc enl absolutamente nada. Quei di'
7eL o salário dele na universidâde continua chegando: você está lá
na ilha náo sei quê conv€rsando com índio, mas o seu salário cstá Iá.
37
Você vâi ver aquela outra sociedade como se fosse üm brinquedinho,
aquela vocé domina, você es1á por cima, você sâbe de tüdo, você é um
observador divino. Você pode âté consentir em panicipâr um pouqui-
nho da vida deles para dizer que você é um obseftador participante e
tal Mas observador pariicipantel Tem uma dilerença entre você e os
outros nembros da comunidâde, eles náo têm satário da universidade;
quer dizer, o índio foi lá pescar porque prccisa disso para comer você
lbi lá pescar porque é bonito bdncar de tudio. Essa dilerença é iltedu-
tível. Entáo, eu digo: ou você sabe onde você eslá nâ sociedad€ em que
você está e aí muito trabalhosamenie vocô podc eniendcr umâ outra
olr então é melhor nem comcçar Àgora, Áristóteles sâbia que desde a
primeira, cle sabia que a sociedade que vocé 1em que estudar é aquela
em que você e§tá. nâo a outra. Â sociedade nlrnca vai ser um objeto, sc
ela é um objeto é porque ela náo é a socicdadei porque ela é um ob;et.r
paía você que náo pertence a clei agora para quem está lá dentro nao
é um objeto, cia é ao contrário, ela é o próprio conjuülo de condições
quc permitem a vida daquele indivíduo.
o nodo de conhecer a sociedade nunca ó conhecê-la como objeto,
se você fez dela ür obieto, já csiá errado. Ela se constitui como obieto
na sua frenie na medida em quevocê pârtindo do que ela iá sabe sobre
ela mesma, se você sâbe o conjunto do que a sociedâde sabe sobre ela
mesma, você é capaz de lôzer um aprofündamento crítico disso, âí sim,
aíela se transforma num objeto paravocô, mas náo antes disso. Agora,
você pegar uma cultura como objeto p.Jrque você chegou lá como ob-
selvâdor, en1áo, tudo aquilo que você colheu como observador é tudo
aquilo que não funciona para você como regrâ ou mandamento social
\ igenrc cmbo a tuncione para ourrü' pe§\oai a\ quài\ pur \erem ÍÍem-
bros desta sociedade náo poderiam ter acesso a esta visão de fora que
vocé está tendo; entáo. você já começoü fazendo tudo errâdo.
l8
A única socicdade que você pode compreendcr reâlmenle é aquelâ
cm que você está; porque dcssâ você tem o material diÍetamcntc em
você mesmo, náo lodo, mas uma boa parle. PaÍindo do quc você iem
você pode coletar mais em volta c você vai entendcr a sociedade iüs-
tamente náo como um objeto, mas como um processo vivente no quâl
vu(e esra, c el3 e i.5ô eÍc,\r_nenle: queÍ dilcr njo e q,rF voce nro a
pode vcr como objeto, náo, ela náo é objcto. Então, quândo você está
vcndo â sociedadc colno um processo humano que o inclui, você cstá
vendo a coisa dentro da realidade. Agora, por exemplo, como ó o ân
lropólogo dentro da tribo de indio? O que cle teria que fazcr, como é
quc ele teria que começâr? Ele teria que começar por cntender a sua
posição denúo daquela sociedadc. 'Quem sou êu dentro destâ socic-
dade?" A prirneirâ coisa quc ele tinha que perguntar parâ os Índio§
é: "Qucm sou'l O que eu estou fazendo aqui? Qual é o meu lugar
âqui?" 4í sim, mas isso será a última coisa que ele vai lãzer, nresmo
porque tem â possibilidade de os Índios não saberem, quer dizetr "Você
é umâ coisa esquisita que está aÍ me iàzendo pergunta e eü náo tenho
a menor idéia do que você está qüerendo". O LrbseÍvâdor da sociedâ-
de pdmitiva já começâ por falsear os dâdos. Agora, se €le iiver umâ
compreensáo prolundâ da sua sociedâde pode ser que ele até chegue â
compreender uma outra, mas os caras fizeram o contrário, váo Iá en
tender a sociedade de índio, fazeÍr um monie de obseNaçáo fictícia e
depois tenta entender a sua sociedade a padir daqrelas obse açóes
liciícias. o negócio da Margãreth Mead, os dados erâm todos furados,
nas nre\mú que ndo lnscm ú nretodo cslá crÍrdo F rncrrvcl: ( úmu
é que puderam chamar isto de ciência? Chamavam de ciôncia porqüe
adminislrativamente aconiecia num departâmento chamado científico
e a pessoa tinha salário de cientista, só por isto. Mâs nao tem estrutura
noética de umâ ciência.
39
As ciências sociais modernâs, todas elas nasceram viciadas, noven
ta e nove por cento do que produzem sáo besteirâ mesmo. náovalem a
âlençâo: e começan a adquirir um sentido quando você fâz o que làzia
o [Piiirim A.] Sorohin, por cxcmplo, você pega tudo o que se sabiâ
sobrc a socicdade desde a Antigüidade, desde Laorlsó, Confúcio, etc.,
etc., e vâi contar aquilo até chegar no estado presente, e você vai pe-
gando âs vádas afticulaçóes, aÍvocê eniende mals ou menos do que se
trata, mas se você parie do principio de que não havia conhecimentos
de ciência social ant€s, você acredita que a ciência social ê urna coisa
nova que você está inventando, entáo, já começou erladlr.
Eiem genle qlre acredita piarnente que a ciência sociâl começa conl
Maquiavel. Você encontra obras hindus e chinesâs de trôs mil anos ân-
tes que já tinham tudo âquilo, mas tudo assim, com todos os detâlhcs.
Como é que você explicâ esse milagrc do Sun-TzLl,'A Àrte da Gue[â"?
Quem meteu'AAr1e da Cüerrâ" para circular l'oi Stálin, porqueele Ie!
aquele negócio e fâloü: "Isto aqui é a grande novidadc em matéia d€
arte da guerral" Tem cinco mil anos. Quer dizer que todos os princí-
pios que Sun-Tzü colocou náo mudaran nada- lsso aqui é umâ ciência.
O progcsso da ciência consiste no seguinte: Sun-Izu sabia tudo isto,
dâí nós esqucccmos tudo durante cinco mil anos, e agora acreditamos
que nós inventamos alguma coisa. Pronio. isto é o que você chama de
ciência, já conreça por falsear a sua própda posiçáo dentro da história
Entâo, o quc tcm que fâzer? O corretivo que Àristóteles já dâva, você
iem que começar por conhecer o conjunto das opiniôes existentes a
rc\De'rô Jo ac\unro. u !oniJnru dd. úpiriócs das ,ãbioc l- "\.in q-e
se 1ã2. pcga tudo, tüdo o que eles disseram. Dai começa a iratar diale-
ticamente aquilo ató depurar e chegar a alguna coisâ, é só assim que
â coisâ anda, isto dá trabalho e leva tempo e náo é gâmntido que vai
luncionar Agora, tenr outrojeilo, vocé inventa alguma coisa no âr e dá
uma entrevista parâ a yeld e as pessoês váo âcreditêr
40
O panorama das ciências humanas é âssim, ele depôe contra a in-
teligênciâhunana; embora. sempre no meio desta besteimda. você
tenha de vez em quando assim ilhas de lucidez âbsolutamente tan-
tásticas. Mas onde você encontra alguma coisa que presta, está base'
ada ainda no método de Aristóteles. São Pessoâs que entenderam que
antes de você fazer um negócio novo, vocé precisa conhecer o velho,
senão vocêvai rcinventar aroda. e pior elavêi sair quadrada. Náo iem
outro jeito. Você quer lalar em progresso? Entáo. está bom, progrcsso
é un1a coisê nova que foi acrescentada cm algo que iá tinha antes. O
que tinha antes? Pouquíssimos cicntistas sociais Íizeram isso, [Max]
weber fez isso, os dois weber, Ma"{ Weber e Aifred Weber; Sorokin fez
isso, o loswa]dl Spengler lez isso, com todos os erros que cle possa
ter corretido. fez isso tâmbém; o lArnoldl Toynbee 1êz isso, o Voegelin
fez issoi mesmo com isso você ainda pode erlar muito, n1as âquela
coisâ em que o Voegelin insiste tanto que é aexigência do conhecimen-
to enciclopédico paÍa o cieniista social. desta náo tern como escapar.
Agora, você p€nsa qüe em ciências natumis isso é diferente? Parece
que é por quê? Porque a linha de jrvesiigaçáo das ciências naturais
já está mais estabelecida, qüer dizet você tem uma seqüência recente
de inveíigações que parecern resumir o que se sabe daquilo, mas isso
l'unr ,onê .o ali Lm ccrro ponro. Por Lr(mplo. um qurm;cu rào pr\ r-§o
saber toda a história da química para ele lazer â investigação que elê
quer fazer. Muito bem. acontece q e de repentc você se vô Iidando
com um problêma qu€ iranscendc inlinitâmente ao que âquelâ ciência
pode abarcar no momento. entáo, você vai ier que veÍ o que já sabiam
antes. E isto acontece quando a sua ciênciâ dentro daqueles limitcs
que ela se colocou esgotâ as possibilidades dela. quer dizer, elâ avança
até o ponto en1 que dá, ela acabê desembocando em problemas que
trarscendem aquela sua própia evoluçáo interna e váo desembocar
enr outros problemas infinitamcnte mâiorcs que as pessoas já tratêram
41
cinco milanos âtrás. Daí você\,âiter quc làzer de novo a mcsrna coisà,
quer dizcr em ciências nâiurais, a meslna coisa, você vai tcr que paÍir
dâs opiniões dos sábios, cmbora esse desalio ráo scja colocado tão fre'
qüentenrentc qLLânto nâs ciências hunlanas. PLrr qüêa O envolvinenlo
do individuo, do cieniistâ. coln o obieto de estudo, é um pouco mais
indircto na ciênciâ naturâ1, cn1bora lráo iotâlmentc indireto. Por qüô?
Porq!e ele está dentro da mesna natureza quc ele csiá eíudando. Nlas
até chcgar a esic coDlronio, prccisa percorrer mais etapasi quer dizer a
possibilidade de um ci.ntista natural ctiar uma tcoria por meios mâic-
riais que a süâ própria teoriâ desnrenle seria muito dificil, lnâs emciôn-
cias sociais isso aclrnlece toda hora. Por quê? Porqu€ o cnvolvinento
é mais direto, qlrer.liz€t a convivêncja do ser hunrano com â natürczâ
nâo é direla, com â naturcza lísica . ão é direta;cla se dá aira!és da mc-
diaçaro da socicdade hunrana, qüase todos os elementos naturais qlre
chcgan âo seu conhecimcnto já vêm irabalhados ou fisicânente ou
pclo nenos lingüisticamcnie pela cultuÍa ern qLLc você está A cultura ó
o primeiro escâláo, a natureza é o segundo. Quer dizer que o confronto
meslno do holnem conl â naturcza venl depois do confronlo dele com a
culiura. Por ca!sâ disto o cientista naturâl está mais protegido do scu
objeio do qu€ está o cientista social, isto .tá ulna irnpressáo dc mâior
obietividadc, mas é só ;Írprcssão. E taDrbém por.iuc o rccorte cienlíii'
co dos objetos naturais iá cstá mais bem teitinho c tarnbém constitui
umâ cânrada proi€tiva. Você já sabe quc. por cxcmplo, como biólogo,
eslá pÍoibido dc lcvar em contâ as pcrcepçrles sensíveis dir€tas que
vocô tcm do seu obieto. você só vai peÍcebeí nclc o que está dentro da
grade de inl€resscs já dclirida pela ciência. PoÍanto o qu€ vocô cstá
estudando náo é ulll objeio real, ó uln objeio científico. c você §ó vai
falar dâquele aspecto. Pcnsando bem. jslo e muito absurdo na verdadc.
Porque você acrcdita que a ctelimiiâçáo dos interesses daq!elâ ciênciâ
tem u â âÍtoridêde maior do quc a sua própria percepçâo sensivel,
12
você âceitâ isso só porque lhe pâgam para aceitar isso, na realidade é
uma operâçáo menlal mLriio €squisita.
Quândo na lamosa divisâo de DescaÍtes sc divide o objeto pcn-
sante, o §er pcnsant€ e o ser extenso, c diz que o str extenso dcve s.'r
separâdo dc todâs as imprcssÕcs sensíveis qlle ele nos dá, você peÍcebe
tacilmcnte que o objeto, o ser exlenso qüe scria a natureTa não podc
scr percebiclo Eo ser pensantel Tâmbém náo pode ser peÍcebido. Note
bem qre €stc preceitlr aindâ está nas ciências até hoje. o fÀllied Nor-
thl whitchead diziâ que só existeD dois objetos. dois âssunios, tcm
o sonho e tem â conicturâ, é só isso qre a gcnie 1ã2. É1, pior, a clâsse
cieniílica sabc que é isso que elcs cstâo fazendo, mas sc você conies
sâr isso todê horâ, você vai pcrder a sua autoridadc, você vai diTer:
"olha, o nundo qu€ nós estudanos não é o mundo real, é unr mundo
inveftado pela nossa ciência e qre selecionâ os calacteÍ€s para que
eles obcdcçam âo cilério rla nossa ciência e eles por isso mesn1o assim
recortados luncionâÍr cxatamente conro â nossa ciênciâ diz qüe fun_
cionanf'. Se você dissff: 'O]ha. nas isso é un1 jogo de cartâ marcadal
Se tudo aquilo que não ilrnciona colno a sua ciênciâ diz cstá alàstado
do iúeresse da sua ciência, scnpre o que elâ disscrvâi ser válido den-
iro das regras do jogo dclâ, e isto nunca podc ser coniiontado com â
realidâde da c)rpcriéncia eletlvâ, sor cnte da exped ência científica, isto
é, da cxpcriência reco$ada para dâI eriaiamente isto".
EÍe elenento dc prcdeterninaçáo do resultado é inerenle à estru-
turà da ciência moderna. só quândo clc passa de ceÍios limitcs da de'
cência é que ele chanâ a atcnçáo, mas que ele cstruturalmente está
presentc lá, está prescntc. Ademais ainda tcnl um outro pÍoblellla:
senpre que você operâ Lrm recorte. você ItLz um reco{e dc alguma
coisa, dcntro de algumâ coisa Qlral é essa coisâ? Dc onde vLrcê tira?
Por exenplo, você delimira aqlri os objetos dâ ciência biológica ou da
ciência química, você recortou âqrilo. Dc onde você retiÍou isto? Qual
,ll
é esse fundo do qual veio esse recortc? E o que você sâbe a respeito
deste fundo? Você sabe apenâs que ele se constitui dc coisa extensa
no sentido caIiesiairo. o qual já é um recorie inteiramente arbitrádo
e nâ verdade absurdo. Quer dizer enião que faz um recorte absurdo
dentro de outro recorte absurdo. E dentro desse recorte como elc lbi
feito meiodicamente tudo vai luncionar do jeito que vocé disse; e todo
mundo vai acrcditar que isso tem um valo, cientíIico exLraordinário.
É aliamente duvidoso que tenha. Você podc ier certeza lde quel um
dia todâ essa época vai ser tida como uma época de ignorância, cr€-
dulidade, superstiÇáo e loücura. na qual tudo o que funcionâva ou era
porque se baseava em conhecimentos aniiqúíssimos como o SunrTzu,
ou funcionava po. engano. ou iuncionâvâ por motivos desconhecidos
como a aspirina, poÍ exenplo; ou lambénr luncionavâ pela habiiidade
técnica que é absolutamentc inegável
Você vê qüe em todê essa etâpa ten uma ccrta profissão qu€ ad-
quire uma importância extraordináriâ que são os engenheiros, clcs
sáo a sâlvaçào dâ humânidade. Por quê? Porqlre o negócio deles não
pode tuncionâr só teorjcanente, tem quc funcionar na práticâ, então,
tem umâ organização lécnica parâ obter determinados fins, c eles
rr lr auc obcdr ccr a es.e l"olo(olô e rem q-s lr lciúnâ. me,lro. j a
únicâ prol]ssão na qual se cxige isso. Porque se o sujeiio Íor um físico
teórico. náo precisa luncionar âbsolutamcnic, nâo precisâ nem ter
nada a ver com a realidade. Se for un1 biólogo (Richard Dawkins?)
iambém não prccisa.
A grande glória do mundo moderno nâo é a ciôncia, ó a engenharia.
ai sim, cssâ existe, essa é de iirar o châpéu. Quer dizer que toda vcz
que você vâi falar com um público qualquer e tem uns engenheiros.
todo cnra diz: 'Nâo, €spera ai, eu sou cngcnhciro

Outros materiais