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SAÚDE COLETIVA Professora Dra. Marcela Demitto Furtado Professora Me. Raquel Gusmão Oliveira GRADUAÇÃO Unicesumar C397 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE MARINGÁ. Núcleo de Educação a Distância; FURTADO, Marcela Demitto; OLIVEIRA, Raquel Gusmão. Saúde Coletiva. Marcela Demitto Furtado; Raquel Gusmão Oliveira. Maringá-Pr.: UniCesumar, 2017. Reimpresso em 2019. 176 p. “Graduação - EaD”. 1. Saúde. 2. Coletiva. 3. EaD. I. Título. ISBN 978-85-459-0851-7 CDD - 22 ed. 610 CIP - NBR 12899 - AACR/2 Ficha catalográfica elaborada pelo bibliotecário João Vivaldo de Souza - CRB-8 - 6828 Impresso por: Reitor Wilson de Matos Silva Vice-Reitor Wilson de Matos Silva Filho Pró-Reitor Executivo de EAD William Victor Kendrick de Matos Silva Pró-Reitor de Ensino de EAD Janes Fidélis Tomelin Presidente da Mantenedora Cláudio Ferdinandi NEAD - Núcleo de Educação a Distância Diretoria Executiva Chrystiano Minco� James Prestes Tiago Stachon Diretoria de Graduação e Pós-graduação Kátia Coelho Diretoria de Permanência Leonardo Spaine Diretoria de Design Educacional Débora Leite Head de Produção de Conteúdos Celso Luiz Braga de Souza Filho Head de Curadoria e Inovação Jorge Luiz Vargas Prudencio de Barros Pires Gerência de Produção de Conteúdo Diogo Ribeiro Garcia Gerência de Projetos Especiais Daniel Fuverki Hey Gerência de Processos Acadêmicos Taessa Penha Shiraishi Vieira Gerência de Curadoria Giovana Costa Alfredo Supervisão do Núcleo de Produção de Materiais Nádila Toledo Supervisão Operacional de Ensino Luiz Arthur Sanglard Coordenador de Conteúdo Silvio Cesar de Castro Designer Educacional Amanda Peçanha dos Santos Projeto Gráfico Jaime de Marchi Junior José Jhonny Coelho Arte Capa Arthur Cantareli Silva Ilustração Capa Bruno Pardinho Editoração Fernando Henrique Mendes Qualidade Textual Hellyery Agda Cíntia Prezoto Ferreira Ilustração Bruno Cesar Pardinho Marta Kakitani Em um mundo global e dinâmico, nós trabalhamos com princípios éticos e profissionalismo, não so- mente para oferecer uma educação de qualidade, mas, acima de tudo, para gerar uma conversão in- tegral das pessoas ao conhecimento. Baseamo-nos em 4 pilares: intelectual, profissional, emocional e espiritual. Iniciamos a Unicesumar em 1990, com dois cursos de graduação e 180 alunos. Hoje, temos mais de 100 mil estudantes espalhados em todo o Brasil: nos quatro campi presenciais (Maringá, Curitiba, Ponta Grossa e Londrina) e em mais de 300 polos EAD no país, com dezenas de cursos de graduação e pós-graduação. Produzimos e revisamos 500 livros e distribuímos mais de 500 mil exemplares por ano. Somos reconhecidos pelo MEC como uma instituição de excelência, com IGC 4 em 7 anos consecutivos. Estamos entre os 10 maiores grupos educacionais do Brasil. A rapidez do mundo moderno exige dos educa- dores soluções inteligentes para as necessidades de todos. Para continuar relevante, a instituição de educação precisa ter pelo menos três virtudes: inovação, coragem e compromisso com a quali- dade. Por isso, desenvolvemos, para os cursos de Engenharia, metodologias ativas, as quais visam reunir o melhor do ensino presencial e a distância. Tudo isso para honrarmos a nossa missão que é promover a educação de qualidade nas diferentes áreas do conhecimento, formando profissionais cidadãos que contribuam para o desenvolvimento de uma sociedade justa e solidária. Vamos juntos! Pró-Reitor de Ensino de EAD Diretoria de Graduação e Pós-graduação Seja bem-vindo(a), caro(a) acadêmico(a)! Você está iniciando um processo de transformação, pois quando investimos em nossa formação, seja ela pessoal ou profissional, nos transformamos e, consequentemente, transformamos também a sociedade na qual estamos inseridos. De que forma o fazemos? Criando oportu- nidades e/ou estabelecendo mudanças capazes de alcançar um nível de desenvolvimento compatível com os desafios que surgem no mundo contemporâneo. O Centro Universitário Cesumar mediante o Núcleo de Educação a Distância, o(a) acompanhará durante todo este processo, pois conforme Freire (1996): “Os homens se educam juntos, na transformação do mundo”. Os materiais produzidos oferecem linguagem dialógica e encontram-se integrados à proposta pedagógica, con- tribuindo no processo educacional, complementando sua formação profissional, desenvolvendo competên- cias e habilidades, e aplicando conceitos teóricos em situação de realidade, de maneira a inseri-lo no mercado de trabalho. Ou seja, estes materiais têm como principal objetivo “provocar uma aproximação entre você e o conteúdo”, desta forma possibilita o desenvolvimento da autonomia em busca dos conhecimentos necessá- rios para a sua formação pessoal e profissional. Portanto, nossa distância nesse processo de cresci- mento e construção do conhecimento deve ser apenas geográfica. Utilize os diversos recursos pedagógicos que o Centro Universitário Cesumar lhe possibilita. Ou seja, acesse regularmente o Studeo, que é o seu Ambiente Virtual de Aprendizagem, interaja nos fóruns e enquetes, assista às aulas ao vivo e participe das dis- cussões. Além disso, lembre-se que existe uma equipe de professores e tutores que se encontra disponível para sanar suas dúvidas e auxiliá-lo(a) em seu processo de aprendizagem, possibilitando-lhe trilhar com tranqui- lidade e segurança sua trajetória acadêmica. A U TO R A S Professora Dra. Marcela Demitto Furtado Doutora pelo Programa de Pós-Graduação do Departamento de Enfermagem da UEM. Título da tese: Gestantes de risco atendidas na Rede Mãe Paranaense: Prematuridade e óbito Neonatal. Mestre pelo Programa de Pós-Graduação em Enfermagem da UEM. Título da dissertação: Aleitamento materno entre usuárias da rede pública de saúde em município da região sul do Brasil. Pós- graduada em Enfermagem Pediátrica pelo Departamento de Enfermagem da Universidade Estadual de Londrina - UEL (modalidade: Residência em Enfermagem em Saúde da Criança). Enfermeira graduada pela Universidade Estadual de Maringá - UEM (2007). Atualmente é docente no Unicesumar no curso de Medicina. Endereço para acessar este CV: <http://lattes.cnpq.br/8007832036059597> Professora Me. Raquel Gusmão Oliveira Doutoranda pela Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto- EERP- Universidade de São Paulo, mestre em Ciências da Saúde pela Universidade Estadual de Maringá (2005), graduada em Enfermagem pela Universidade Estadual de Maringá (2000). Docente do Curso de Medicina do Unicesumar - Maringá. Tem exercido docência no ensino superior nos últimos 8 anos com ênfase em Saúde Coletiva, Saúde da Família e Gestão de Serviços de Saúde. Endereço para acessar este CV: <http://buscatextual.cnpq.br/buscatextual/ visualizacv.do?id=K4769011J1> SEJA BEM-VINDO(A)! Caro(a) aluno(a), seja bem-vindo(a)! Este material foi cuidadosamente preparado para você! Tendo como objetivo introduzir alguns temas da Saúde Coletiva em uma perspectiva atualizada, buscando ajudá-lo(a) na compreensão acerca da temática e subsidiar sua prática como profissional da área da saúde. Este material está dividido em cinco unidades: A Unidade I busca discutir o binômio saúde-doença em uma perspectiva atualizada, discutindo as mudanças e a evolução do conceito de saúde ao longo dos tempos e os modelos de saúde preventivista e de promoção à saúde, também discute os fatores condicionantes e determinantes no processo saúde-doença e seu impacto na realidade brasileira e, ainda, nesse sentido, apresenta os modelos de Atenção à saúde no Brasil. A Unidade II trata da História da Saúde Pública no Brasil, tendo como marco o Sistema Único de Saúde (SUS), descrevendo seu período antecedente, seus processos de cons- trução, destacando interesses, conflitos e necessidades sociais que deram origem ao SUS, seus princípios e diretrizes, bem como as diretrizes do pacto pela Saúde e as Redes de Atenção à saúde. A Unidade III discute Vigilância em saúde, os sistemas de informação em saúde, indica- doresde saúde e os desafios atuais diante do trabalho no contexto da vigilância. A Unidade IV sintetiza as principais políticas de saúde no Brasil, relacionadas à Saúde da mulher, da criança, do adulto e idoso, bem como políticas voltadas às populações vulneráveis e à saúde mental. E, finalmente, a Unidade V destaca os objetivos e princípios da Política Nacional de Hu- manização (PNH), bem como suas diretrizes e os dispositivos, relacionando-os aos direi- tos e a segurança do paciente, à saúde do trabalhador e aos desafios de sua operaciona- lização no contexto hospitalar. Nossa intenção não é esgotar o assunto, mas abrir as portas para a ampliação do seu co- nhecimento, estimulando novas buscas para que possa enriquecer sua área de atuação e torná-lo(a) um profissional mais crítico e reflexivo, capaz de atuar de forma eficiente em seu contexto de trabalho. Um grande abraço e uma ótima leitura! Professora Marcela Demitto Furtado Professora Raquel Gusmão Oliveira APRESENTAÇÃO SAÚDE COLETIVA SUMÁRIO 09 UNIDADE I SAÚDE E DOENÇA - UMA PERSPECTIVA ATUALIZADA 15 Introdução 16 Conceito de Saúde e Doença 20 O Modelo Preventivista e o Modelo de Promoção à Saúde 24 Fatores Condicionantes e Determinantes do Processo Saúde-Doença 28 Os Principais Determinantes Sociais de Saúde no Brasil 34 Organização dos Serviços de Saúde no Brasil 38 Considerações Finais 43 Referências 44 Gabarito UNIDADE II HISTÓRIA DA SAÚDE PÚBLICA NO BRASIL 47 Introdução 48 Antecedentes do SUS 51 O Processo de Construção do SUS 54 Entendendo o SUS 58 Pactos Pela Saúde 60 Redes de Atenção à Saúde 64 Considerações Finais SUMÁRIO 10 69 Referências 72 Gabarito UNIDADE III VIGILÂNCIA EM SAÚDE 75 Introdução 76 Vigilância em Saúde 79 Vigilância Epidemiológica 83 Sistema de Informação em Saúde 89 Indicadores de Saúde 95 Alguns Desafios da Vigilância em Saúde 99 Considerações Finais 105 Referências 106 Gabarito UNIDADE IV POLÍTICAS PÚBLICAS DE SAÚDE NO BRASIL 109 Introdução 110 Atenção à Saúde da Mulher 114 Políticas de Atenção à Saúde da Criança 118 Políticas Públicas de Saúde do Adulto/Idoso SUMÁRIO 11 122 Políticas de Saúde e Populações Vulneráveis 128 Políticas Públicas de Saúde Mental 133 Considerações Finais 140 Referências 143 Gabarito UNIDADE V POLÍTICA NACIONAL DE HUMANIZAÇÃO (PNH) 147 Introdução 148 Conhecendo a PNH 151 Diretrizes e Dispositivos da PNH 154 Segurança e Direito do Paciente 159 Atenção à Saúde do Trabalhador 163 Desafios Para a Humanização nos Serviços da Saúde 166 Considerações Finais 171 Referências 174 Gabarito 175 CONCLUSÃO U N ID A D E I Professora Me. Raquel Gusmão Oliveira SAÚDE E DOENÇA - UMA PERSPECTIVA ATUALIZADA Objetivos de Aprendizagem ■ Discutir as mudanças e a evolução do conceito de saúde e doença. ■ Conhecer os modelos de saúde preventivista e de promoção à saúde. ■ Compreender o conceito da determinação social na saúde. ■ Apresentar os principais determinantes sociais da saúde e seu impacto na realidade brasileira. ■ Conhecer os modelos de Atenção à saúde no Brasil. Plano de Estudo A seguir, apresentam-se os tópicos que você estudará nesta unidade: ■ O Conceito de saúde e doença ■ O modelo preventivista e o modelo de promoção à saúde ■ Fatores condicionantes e determinantes no processo saúde-doença ■ Os principais determinantes sociais de saúde no Brasil ■ Organização dos serviços de Saúde no Brasil INTRODUÇÃO Quando decidimos ser profissionais da área da saúde, muitas preocupações vem à nossa mente, nos preocupamos com as ações de saúde que podemos realizar, que recursos temos disponíveis, como melhorar a vida das pessoas e como con- tribuir para um mundo melhor e com saúde. Isso é muito importante! Mas, muito além de nos preocuparmos com tudo isso, precisamos estar cien- tes e compreender, antes de realizar ou propor qualquer ação, que por trás de toda ação existe um conceito ou um modo de entender a realidade, e precisamos bus- car compreender tal realidade, tendo como pressuposto básico que ela é dinâmica, sujeita a modificações, influenciadas pela cultura, política e momento histórico. Vamos observar, nesta unidade, que ao longo da história humana, a saúde das pessoas sempre foi alvo de preocupação, por isso convidamos você para dar uma volta na história, tanto antiga quanto atual e reconhecer pensamentos e ações acerca da saúde. O conceito de saúde sofreu mudanças no decorrer dos tempos, várias expli- cações foram dadas e, ainda hoje, vários entendimentos coexistem quando buscamos entender o processo saúde-doença. Mas queremos destacar no texto dois modelos explicativos acerca do pro- cesso saúde-doença: um com características biologicistas e outro buscando compreender o ser humano de forma integral, considerando sua história, cul- tura, contexto e estilos de vida. Buscamos, também, ampliar o entendimento do conceito de saúde e os seus determinantes sociais (estilos de vida, rede sociais e comunitárias e as condi- ções de vida e de trabalho), visando uma compreensão da evolução do cenário da saúde da população brasileira e da estruturação e organização dos serviços de saúde ao longo dos anos. Vamos juntos, então, nos aproximar desse universo de conhecimento tão fundamental para o trabalho de um profissional da área da saúde. Bom estudo! Vamos lá ... Introdução Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 15 SAÚDE E DOENÇA - UMA PERSPECTIVA ATUALIZADA Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. IU N I D A D E16 CONCEITO DE SAÚDE E DOENÇA Antes de iniciarmos a unidade, gostaria de fazer uma pergunta: - O que significa ter saúde para você? Pense nisso por alguns minutos… Pergunte para algumas pessoas próximas a você: o que é ter saúde? Agora, compare as respostas. Você certamente vai perceber que a ideia de saúde entre as pessoas é diferente. Cada pessoa possui um entendimento acerca do que é ter saúde. Ao longo da história, muitas explicações foram dadas acerca do que é ter saúde ou estar doente: as explicações mágico-religiosas, a explicação natura- lística, o olhar bacteriológico, a explicação multicausal e a produção social da saúde e da doença. Vejamos um pouco dessas explicações. AS EXPLICAÇÕES MÁGICO - RELIGIOSAS Na Antiguidade, acreditava-se que as doenças poderiam ser causadas por ele- mentos naturais ou sobrenaturais. Nesse período, a compreensão das doenças era por meio da filosofia religiosa. Partiam do princípio de que doença era resul- tado de ação de forças alheias ao organismo, eram consequência de pecado ou de maldição, um sinal de desobediência ao mandamento divino. Tal ideia per- durou por muito tempo e teve seu ápice na Idade Média (SCLIAR, 2007). Na Idade Média europeia, a influência da religião cristã manteve a concep- ção da doença como resultado do pecado e a cura como questão de fé; o cuidado de doentes estava, em boa parte, entregue a ordens religiosas, que administra- vam, inclusive, o hospital, o qual era visto não como um lugar de cura, mas de abrigo e de conforto para os doentes (SCLIAR, 2007). Conceito de Saúde e Doença Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 17 A UNICAUSALIDADE No início da modernidade, a concepção religiosa foi superada devido ao desenvol- vimento do conhecimento na época. O desenvolvimento da mecânica influenciou as ideias de René Descartes (1596-1650), no século XVII, que postulava um dua- lismo mente-corpo e o funcionamento do corpo como uma máquina. Com o desenvolvimento da anatomia, identificou-se que a doença era localizada nos órgãos (SCLIAR, 2007). No final do século XIX, os estudos de Louis Pasteur (1822-1895), a descoberta do microscópio,revelou a existência de micro-or- ganismos causadores de doença e possibilitou a introdução de soros e vacinas. Foi uma revolução pois, pela primeira vez, fatores causais, até então desco- nhecidos, estavam sendo identificados; as doenças agora poderiam ser prevenidas e curadas. Para cada doença, um agente etiológico deverá ser identificado e com- batido por meio de vacinas ou produtos químicos (SCLIAR, 2007). A MULTICAUSALIDADE A insuficiência da formulação unicausal só ficou evidente no início do séc. XX, devido ao processo de mudanças ocorridas na sociedade e na insuficiência de dar explicações sobre a saúde e a doença das pessoas e das comunidades, bem como o efeito da transição epidemiológica - fenômeno no qual evidencia a diminuição de doenças infecciosas e o aumento de doenças crônicas degenerativas, em que o homem passa a ser considerado como um ser biopsicossocial. Nesse sentido, a saúde e a doença são reconhecidas como o equilíbrio e/ou desequilíbrio entre o ambiente, o agente e o hospedeiro, envolvendo dimensões subjetivas e não apenas biologicamente científicas e objetivas. No entanto, a crí- tica a tal explicação se dá ao fato de não considerar as variações das doenças verificadas historicamente, em relação ao seu aparecimento e desaparecimento, aumento ou diminuição de sua frequência, da menor ou maior importância, que adquirem nas variadas formas de organização social (BACKES et al., 2009). Uma nova proposta de consenso sobre saúde ocorreu em 7 de abril de 1948 (desde então, o Dia Mundial da Saúde), implicando o reconhecimento do direito SAÚDE E DOENÇA - UMA PERSPECTIVA ATUALIZADA Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. IU N I D A D E18 à saúde e da obrigação do Estado na promoção e proteção da saúde. “Saúde é o estado do mais completo bem-estar físico, mental e social e não apenas a ausên- cia de enfermidade” (SCLIAR, 2007). O conceito da Organização Mundial da Saúde (OMS) reflete, de um lado, uma aspiração nascida dos movimentos sociais do pós-guerra: o fim do colo- nialismo, a ascensão do socialismo. Saúde deveria expressar o direito a uma vida plena, sem privações, um conceito amplamente difundido, mas que carrega em si um estado inatingível de equilíbrio em um cenário de neutralidade, que o torna pouco operacional e prático (BACKES, et al., 2009). A PRODUÇÃO SOCIAL DA SAÚDE E DA DOENÇA Um novo paradigma surge diante da crise de desenvolvimento das sociedades modernas - o reconhecimento de que tudo o que existe é produto da ação humana. A saúde de um indivíduo, de um grupo de indivíduos ou de uma comuni- dade, depende, também, de coisas que o homem criou e faz, das interações dos grupos sociais, das políticas adotadas pelo governo, inclusive os próprios meca- nismos de atenção à doença, do ensino dos cursos da área da saúde, da educação e das intervenções sobre o meio ambiente (SANTOS; WESTPHAL, 1999). Nesse sentido, Santos e Westphal (1999) ressaltam que ter saúde não pode ser apenas não estar doente, significa, também, a possibilidade de atuar, de pro- duzir a sua própria saúde, quer mediante cuidados tradicionalmente conhecidos, quer por ações que influenciam o seu meio – ações políticas para a redução de O livro de Moacyr Scliar, intitulado Do Mágico ao Social: trajetória da saúde pública, apresenta, de uma forma mais detalhada, os caminhos percorridos pela condição humana no contexto da saúde e da doença, em uma pers- pectiva histórica, apontando olhares e características das matrizes do pen- samento sobre o paradoxo saúde-doença. Fonte: Scliar (2005). Conceito de Saúde e Doença Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 19 desigualdades, educação, cooperação intersetorial, participação da sociedade civil nas decisões que afetam sua existência – para, usando uma expressão bem conhecida, o exercício da cidadania. Para que uma população possa ser saudável, no paradigma da história social da saúde, é necessário: paz (contrário de violência); habitação adequada em tamanho por habitante, em condições adequadas de conforto térmico; educa- ção, pelo menos, fundamental; alimentação imprescindível para o crescimento e desenvolvimento das crianças e necessária para a reposição da força de traba- lho; renda decorrente da inserção no mercado de trabalho, adequada para cobrir as necessidades básicas de alimentação, vestuário e lazer; ecossistema saudável preservado e não poluído; justiça social e equidade, garantindo os direitos fun- damentais dos cidadãos (DE OTAWA, 1986). No Brasil, o movimento de Reforma Sanitária, articulado nos anos 80, for- mulou um “conceito ampliado de saúde” e passou a entendê-la como um estado resultante das condições de alimentação, habitação, educação, renda, meio ambiente, trabalho, transporte, emprego, lazer, liberdade, acesso à terra e aos serviços de saúde, apontando, assim, para a determinação social e cultural da saúde e da doença. Para operar com o conceito ampliado de saúde, precisamos pensar na saúde como um processo em detrimento da concepção de saúde como um atribu- to (tenho/não tenho). (Stela Nazareth Meneghel) SAÚDE E DOENÇA - UMA PERSPECTIVA ATUALIZADA Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. IU N I D A D E20 O MODELO PREVENTIVISTA E O MODELO DE PROMOÇÃO À SAÚDE É possível verificar que o conceito de saúde foi influenciado, no decorrer dos tem- pos, por questões sociais, culturais e econômicas. Vale destacar que as ações de saúde e a forma de organização da assistência também acompanham as mudan- ças do conceito de saúde. Na tentativa de explicar essas mudanças, diversos autores propuseram mode- los explicativos do processo saúde-doença. Vejamos dois deles - o modelo de Atenção à Saúde Preventivista e o Modelo da Promoção à Saúde. O MODELO PREVENTIVISTA O modelo preventivista surge devido à crise do capitalismo e à incapacidade dos governos de arcarem com os custos da saúde no contexto médico hospita- lar, com base na proposta de Leavell e Clarck do modelo da história natural da doença (evolução natural da doença) . O Modelo Preventivista e o Modelo de Promoção à Saúde Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 21 Quadro 1 - Modelo da História Natural Da Doença PERÍODO PRÉ PATOGÊNESE PATOGÊNESE PRECOCE PATOGÊNESE AVANÇADA RECUPERAÇÃO, INCAPACIDADE OU MORTE Interação entre agente e hospedei- ro Doença sub- clínica Horizonte clínico Alterações celulares Doença com manifestação clínica Ultrapassagem do horizonte clínico PREVENÇÃO PRIMÁRIA PREVENÇÃO SECUNDÁRIA PREVENÇÃO TERCIÁRIA Promoção à saúde Proteção específica Diagnóstico Precoce Limitação do dano Reabilitação Fonte: Meneghel (2015). O modelo pressupõe que toda doença tem um percurso natural de pré patogê- nese, patogênese e de recuperação, e que, para cada momento da história natural da doença, preconiza ações sanitárias que correspondem aos três níveis de pre- venção - primário, secundário e terciário (MENEGHEL, 2015). No período pré patogênico, os agentes causadores de doenças e o indivíduo vivem em equilíbrio com o ambiente. No período patogênico, inicialmente, não há sinais e sintomas da doença, também chamado de período de incubação, só então aparecem as manifestações clínicas da doença que pode evoluir para recu- peração, incapacidade ou morte. As intervenções nos diferentes estágios da doença são chamadas de preven- ção primária, secundária e terciária e têm como objetivo prevenir doenças ou seu agravamento. As ações de prevenção primária podem ser medidas gerais e educativas de resistência e bem-estar geral dos indivíduos, as de prevenção secun- dária buscam a redução de fatores de risco e as de prevenção terciária reduzem e intervêm nas sequelasde doenças. A crítica a esse modelo se dá pelo fato dele não considerar os efeitos positivos e negativos das condições de vida e de trabalho e a inserção social dos indiví- duos nos níveis de saúde da população, o que reduz o conceito de saúde como estritamente biológico, ignorando a dimensão social que envolve o processo saú- de-doença (MENEGHEL, 2015). SAÚDE E DOENÇA - UMA PERSPECTIVA ATUALIZADA Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. IU N I D A D E22 O MODELO DE PROMOÇÃO À SAÚDE Com as mudanças ocorridas na sociedade pós-guerra, os estudiosos descreve- ram um fenômeno denominado de transição demográfica e epidemiológica no mundo todo. Tal fenômeno apontou para incapacidade do Modelo da história natural da doença dar explicações para várias doenças e agravos, como as doenças crônicas, os aci- dentes, a crescente violência, entre outros. Diante disso, diversas propostas foram elaboradas no sentido de buscar uma visão e atenção mais integral da saúde. Discussões acerca do tema “saúde integral” foram realizadas no cenário Internacional. A Conferência realizada em Alma-Ata, em 1978, é considerada um marco para a discussão de uma visão de saúde integral, pois reconhece, em seu relatório, que a saúde é um direito; também vale destacar a I Conferência A teoria da transição epidemiológica, proposta por Omran (1971) foca nas complexas mudanças dos padrões saúde-doença e nas interações entre eles, determinantes demográficos, econômicos e sociais, e suas consequên- cias. As ideias abaixo destacam em sua teoria: (i) o processo de mudanças nos padrões de mortalidade e adoecimento são longos, as pandemias por doenças infecciosas são gradativamente substitu- ídas pelas doenças degenerativas e agravos; (ii) as mais profundas mudanças nos padrões de saúde-doença ocorrem nas crianças e nas mulheres jovens; (iii) as mudanças são fortemente associadas às transições demográfica e so- cioeconômica que constituem o complexo da modernização; (iv) as variações peculiares no padrão, no ritmo, nos determinantes e nas consequências das mudanças na população diferenciam três modelos bási- cos de transição epidemiológica, o modelo clássico ou ocidental, o modelo acelerado e o modelo contemporâneo ou prolongado. Fonte: Duarte; Barreto (2012). O Modelo Preventivista e o Modelo de Promoção à Saúde Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 23 Internacional de Promoção à Saúde, realizada no Canadá, em 1986, que redigiu a Carta de Otawa, a qual propõe um conceito amplo de saúde, relacionando-a ao bem-estar dos indivíduos e na ampla causalidade do processo saúde doença, em que a saúde é considerada um recurso para a vida e não objetivo de vida (WESTPHAL, 2012). Em uma visão ampliada da saúde, considera-se os fatores socioambientais na produção e determinação da saúde e da doença, sendo que a promoção à saúde prevê uma visão holística e socioambiental do mesmo processo, colocando-se como uma prática emancipatória e um imperativo ético, com foco no cidadão, família, coletividade, condições de vida, iniquidades e potencialidades do terri- tório em que vivem e trabalham (WESTPHAL, 2012). Quadro 2 - Visão socioambiental da saúde, determinantes e estratégias e programas de saúde Conceitos de saúde Bem estar biopsicossocial Necessidades de saúde. Determinantes de saúde Condições de riscos diversas. Estratégias Ação política, espaços saudáveis, empoderamento da população, desenvolvimento de habilidades, reorientação de serviços. Desenvolvimento de pro- gramas Comunidade em diálogo crítico com profissionais e agências. Fonte: Westphal (2012). A agenda 2030 da ONU prevê 17 medidas para a transformação do mundo, a terceira trata da saúde - Assegurar uma vida saudável e promover o bem-estar para todos, em todas as idades. A Promoção de saúde é considerada uma estratégia fundamental para en- frentar as iniquidades sociais e de saúde. Juntamente com outras 16 medi- das, dando a ideia de um conceito ampliado de saúde. (Organização das Nações Unidas) SAÚDE E DOENÇA - UMA PERSPECTIVA ATUALIZADA Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. IU N I D A D E24 FATORES CONDICIONANTES E DETERMINANTES DO PROCESSO SAÚDE-DOENÇA Figura 1 - Os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio - ODMBrasil Fonte: ONU ([2017], on-line)1. Porque as pessoas adoecem? Desde as primeiras investigações acerca da saúde de grupos e populações, foi possível identificar as diferenças sociais existentes das condições de vida e da situação de trabalho, dentre estas destacam-se Engels, que investigou os traba- lhadores ingleses; Snow, que descobriu a cólera em Londres; Louis, trabalhadores na França; e Virchow, o Tifo na Silésia, ressaltando o excesso de risco de adoecer e morrer entre as camadas mais pobres da população (BARATA, 2012). Na América Latina, estudos sobre desigualdades sociais e saúde são recen- tes, datam da segunda metade do século XX e surgiram devido às consequências da globalização sobre as condições de vida e a situação de saúde dos povos sob a ótica da exclusão social. O Processo Saúde Doença está diretamente atrelado à forma como o ser humano, no decorrer de sua existência, se apropria da natureza para trans- formá-la, buscando o atendimento às suas necessidades, representando um conjunto de relações e variáveis que produz e condiciona o estado de saúde e doença de uma população, que se modifica nos diversos momentos históricos Fatores Condicionantes e Determinantes do Processo Saúde-Doença Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 25 e do desenvolvimento científico da humanidade, não sendo um conceito abs- trato, ele varia segundo a época em que vivemos, assim como os interesses dos diversos grupos sociais (GUALDA; BERGAMASCO, 2004). Diante disso, é necessário conhecer os determinantes mais complexos do comportamento humano, além das condições materiais de vida – para que seja possível a efetivação das práticas de promoção e prevenção da saúde e a dimi- nuição das desigualdades, visto que o Brasil ocupa o 11º lugar entre os lugares mais desiguais do mundo (COMISSÃO NACIONAL, 2008, on-line)2. Há uma vasta literatura sobre aspectos conceituais e modelos de referência rela- cionados aos determinantes sociais e iniquidades em saúde. A Comissão Nacional de Determinantes Sociais de Saúde os define como “fatores sociais, econômicos, culturais, étnicos/raciais, psicológicos e compor- tamentais que influenciam a ocorrência de problemas de saúde e seus fatores de risco na população” (BUSS; PELLEGRINI FILHO, 2007). E adotou o modelo de determinação social da saúde proposto por Dahlgren e Whitehead (WESTPHAL, 2012). Desigualdades sociais em saúde Diferença na inserção social dos indivíduos, repartição do poder e proprie- dade. Positiva = valores de cooperação e solidariedade. Negativa = exploração, dominação e produção de doença. (Rita Barradas Barata) SAÚDE E DOENÇA - UMA PERSPECTIVA ATUALIZADA Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. IU N I D A D E26 Figura 02 - Modelo de determinação social da saúde proposto por Dahlgren e Whitehead Fonte: Comissão Nacional (2008, on-line)2. O modelo entende que a saúde compreende três dimensões: a biológica, a social e cultural (BARATA, 2012). A dimensão biológica compreende as características biológicas marcadas pela interação genótipo-fenótipo, ou seja, a genética e a modulação das poten- cialidades são herdadas pelas condições concretas da existência que irão resultar nas manifestações fenotípicas, como a idade/sexo e fatores hereditários X estilo de vida. Na dimensão social, inclui os grupos sociais e as formas de consciên- cia e condutas resultantes de suas interações,bem como a forma de constituição dessas comunidades. A dimensão cultural inclui as condições de vida e de trabalho e suas for- mas de organização que compreende as condições socioeconômicas, culturais e ambientais gerais. O relatório da Comissão Nacional de determinantes sociais de saúde (COMISSÃO NACIONAL, 2008, on-line)2, ao analisar a situação de saúde de uma população relacionando os Determinantes sociais de saúde, considera os seguintes itens: Fatores Condicionantes e Determinantes do Processo Saúde-Doença Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 27 1) Situação e tendências da evolução demográfica, social e econômica do país: traça um panorama geral de referência para a análise da situação de saúde, descrevendo a evolução desses macrodeterminantes, particularmente nas últi- mas quatro décadas. Inclui dados sobre crescimento populacional, fecundidade, mortalidade, migrações, urbanização, estrutura do mercado de trabalho, distri- buição de renda e educação. 2) A estratificação socioeconômica e a saúde: apresenta a situação atual e tendências da situação de saúde no país, destacando as desigualdades de saúde segundo variáveis de estratificação socioeconômica, como renda, escolaridade, gênero e local de moradia. 3) Condições de vida, ambiente e trabalho: apresenta as relações entre situ- ação de saúde e condições de vida, ambiente e trabalho, com ênfase nas relações entre saneamento, alimentação, habitação, ambiente de poluição, acesso à infor- mação e serviços de saúde e seu impacto nas condições de saúde dos diversos grupos da população. 4) Redes sociais, comunitárias e saúde: inclui evidências sobre a organiza- ção comunitária e redes de solidariedade e apoio para a melhoria da situação de saúde, destacando, particularmente, o grau de desenvolvimento dessas redes nos grupos sociais mais desfavorecidos. 5) Comportamentos, estilos de vida e saúde: inclui evidências existentes no Brasil sobre condutas de risco, como hábito de fumar, alcoolismo, sedentarismo, dieta inadequada, entre outros, segundo os diferentes estratos socioeconômi- cos da população. 6) Saúde materno-infantil e saúde indígena: por sua importância social e por apresentarem necessidades específicas de políticas públicas, são dedicadas seções especiais sobre saúde materno-infantil e saúde indígena. Além disso podem ser incluídos: Saúde e ambiente nas grandes cidades; Seguridade social e saúde; Cultura e promoção da saúde; Distribuição, acesso e utilização de serviços de saúde em áreas urbanas; Violência e saúde; Iniciativas comunitárias de promoção e proteção da saúde, Desemprego e saúde, entre outros. SAÚDE E DOENÇA - UMA PERSPECTIVA ATUALIZADA Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. IU N I D A D E28 OS PRINCIPAIS DETERMINANTES SOCIAIS DE SAÚDE NO BRASIL E a saúde do Brasil como vai? A situação de saúde, vida e trabalho da população brasileira vem passando por grandes transformações nas quatro últimas décadas, influenciadas pelas mudanças econômicas, sociais e demográficas ocorridas no país, é o que mostra o Relatório elaborado pela Comissão Nacional sobre os Determinantes Sociais da Saúde. A seguir, elaboramos uma síntese com base no Relatório, destacando os A COMISSÃO NACIONAL SOBRE OS DETERMINANTES SOCIAIS DA SAÚDE foi criada, em 2006, para produção de conhecimentos e informações sobre os determinantes sociais e de saúde (DSS), bem como revisão e análise de políticas e programas de intervenção sobre os DSS e comunicação sobre a importância e possibilidades de atuação sobre eles. Fonte: Comissão Nacional (2008, on-line)2. Os Principais Determinantes Sociais de Saúde no Brasil Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 29 principais aspectos que marcam a evolução demográfica, social e econômica relacionadas à saúde, questões de vida, ambiente e trabalho, as redes sociais e o comportamento e estilo de vida dos brasileiros, agrupados em três grandes itens: 1) Tendências demográfica, social e econômica, 2) Redes socias e 3) Condições de vida e de saúde (COMISSÃO NACIONAL, 2008, on-line)2. 1) Tendências demográficas, social e econômica A urbanização foi apontada como um fator importante de mudanças, em que, a partir da década de 70, influenciada pela industrialização, promoveu mudanças no setor econômico e na forma de viver das pessoas que, saindo do campo para viver na cidade, buscavam trabalho e melhores condições de vida; no entanto, a oferta de infraestrutura e serviços urbanos não acompanhou a grande demanda, a tal ponto que, em 1980, havia 38,2 milhões de moradores em domicílios urbanos inadequados. O PIB per capita passou de 2.060 dólares, em 1960, para 5.250 em 2000 e 5.720 em 2006. Entretanto, esse extraordinário aumento da riqueza produzida e a modernização da economia não significaram melhoria na distribuição e urbanização, o crescimento do transporte e das indústrias, assim como a expan- são da fronteira agrícola, criaram as condições propícias para uma permanente exposição de contingentes populacionais, progressivamente maiores, à poluição atmosférica e dos corpos hídricos. Alterações na fecundidade - a taxa média geométrica de crescimento anual da população passou de 2,89%, no período 1960/70, para 1,64%, no período 1991/2000. A taxa de fecundidade, que se mantinha estável desde 1940, passou a cair de maneira acelerada a partir de 1960. Envelhecimento da população e aumento da expectativa de vida. A propor- ção de jovens de 0 a 14 anos que era de 42,6%, em 1960, passou para 30%, em 2000, e deverá atingir 18% em 2050, enquanto que a de idosos maiores de 65 anos, que era de 2,7%, em 1960, passou para 5,4%, em 2000, e no ano de 2050 deverá superar a de jovens, alcançando 19%. Quanto à esperança de vida ao nascer, houve um ganho de mais de 20 anos, entre 1960 e 2006, para o Brasil como um todo. O valor de 72,4 anos em 2006 é 9 anos inferior ao do Japão, país com a maior expectativa de vida ao nascer em todo o mundo. SAÚDE E DOENÇA - UMA PERSPECTIVA ATUALIZADA Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. IU N I D A D E30 O crescimento rápido do peso relativo dos idosos tem um impacto impor- tante na economia e na sociedade, obrigando a definição de políticas públicas que possam fazer frente a esse fenômeno sem paralelo na experiência mundial. O Brasil gasta 7% do Produto Interno Bruto (PIB) em saúde, cerca de 530 dólares per capita, abaixo de Argentina (US$1.045), Chile (US$827) e Uruguai (US$ 781), para citar alguns países do Cone Sul. 2) Redes sociais Diversos estudos mostram que não são as sociedades mais ricas as que possuem melhores níveis de saúde, mas as que são mais igualitárias e com alta coesão social. Nessas sociedades, as pessoas são mais envolvidas com a vida pública, vivem mais, são menos violentas e avaliam melhor sua própria saúde. Um importante indicador da riqueza do capital social é relação de confiança entre as pessoas. Segundo dados da Pesquisa Social Brasileira (PSB), que realizou 2.363 entrevistas entre julho e outubro de 2002, as relações de confiança, no Brasil, são extremamente débeis, praticamente limitando-se à confiança em familiares; enquanto 84% das pessoas confiam na família, apenas 15% confiam na maioria das pessoas. 3) Condições de vida e de saúde Os índices de cobertura dos serviços de água e esgoto, no período de 1999 a 2004, têm aumentado. Entretanto, enquanto nas regiões Sul e Sudeste, respectivamente, 83% e 91% da população estavam cobertos pela rede geral de abastecimento de água, na região Norte a cobertura desses serviços alcançava apenas 54,8% da população e no Nordeste 72%. Estudos apontam para o fato que 53% da popu- lação brasileira ainda não teriam acesso aum saneamento adequado, e no atual ritmo de ampliação do acesso a universalização só se daria em 115 anos. Quanto à educação, em 1940, 56% da população brasileira era analfabeta, percentual que cai para 40% em 1960 e 13,6% no ano 2000. No nível fundamen- tal, a cobertura é quase universal, entre 7 a 14 anos em todas as regiões, tanto na área urbana como rural; já no ensino médio, a taxa de frequência entre 15 a 17 anos ainda é bastante baixa para o Brasil como um todo; no ensino superior, é possível observar que quanto maior a renda maior é o acesso ao ensino supe- rior público em todas as regiões. Os Principais Determinantes Sociais de Saúde no Brasil Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 31 Os efeitos do nível de instrução se manifestam das mais diferentes formas: na percepção dos problemas de saúde; na capacidade de entendimento das informações sobre saúde; na adoção de estilos de vida saudáveis; no consumo e utilização dos serviços de saúde; e na adesão aos procedimentos terapêuticos. O acesso equitativo aos serviços de saúde é de grande importância para a quali- dade de vida e de saúde de um país; os números do SUS impressionam pela magnitude. No ano de 2005, foram realizadas cerca de 450 milhões de consultas médicas; 11,8 milhões de internações; 2,6 milhões de partos; 250 milhões de exames laboratoriais; 40 milhões de vacinações; 80 mil cirurgias cardíacas e 20 mil transplantes de órgãos. O Programa de saúde da família, iniciado em 1994, conta, em 2008, com cerca de 27,5 mil equipes (mais de 150 mil profissionais) atuando em 5.131 municípios (92% do total de municípios brasileiros, com cobertura de 44% da população). O Programa Nacional de Imunização (PNI) alcançou uma cobertura praticamente universal em menores de um ano de idade, a partir de 1999, quando chegou a 94,7%, enquanto que em 1978 atingia somente 40% das crianças. No entanto, o relatório aponta que, apesar desses inegáveis avanços na pro- dução de serviços e dos princípios de universalidade e equidade que regem o SUS, ainda se observam importantes desigualdades na oferta de recursos e servi- ços, assim como uma forte influência da posição social dos indivíduos no acesso, utilização e qualidade dos serviços de saúde. Quanto à situação de saúde, a taxa de mortalidade infantil (TMI), que era de 124 óbitos no primeiro ano de vida para cada mil nascidos vivos em 1960, caiu para 48,3 em 1990; 35,26 em 2000; e 25,1 em 2006. A proporção de mortes de menores de um ano de idade, sobre o total de óbitos, reduziu-se de 24%, em 1980, para 5%, em 2005, variando de 11,3%, na Região Norte, a 3,4%, na Região Sul. Em 2003, 58% dos óbitos informados ocor- reram na faixa de 60 ou mais anos de idade, com variações de 43%, na Região Norte, a 62%, na Região Sul. Quanto à mortalidade masculina e a feminina, entre 1960 e 2006, a sobre- mortalidade masculina cresceu acentuadamente, principalmente na faixa dos 20 aos 24 anos de idade: em 1960, a chance de um homem com 20 anos de idade morrer antes de passar para o grupo etário seguinte (25 a 29 anos) era 1,1 vez maior que a de uma mulher do mesmo grupo etário. SAÚDE E DOENÇA - UMA PERSPECTIVA ATUALIZADA Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. IU N I D A D E32 Já em 2006, a chance masculina, na mesma comparação com a chance femi- nina, no mesmo grupo etário (20 a 24 anos), aumentou para 4,1 vezes. A principal causa do aumento da sobremortalidade masculina são os óbitos por causas exter- nas (ou violentos). Nas regiões Sudeste e Sul, pela primeira vez, a mortalidade por doenças cardiovasculares superou a mortalidade por doenças infecciosas, o que viria a ocorrer nas Regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste duas décadas depois, durante os anos 80. Observa-se um processo de transição nutricional, que consiste na substituição de um padrão alimentar, baseado no consumo de cereais, feijões, raízes e tubér- culos, por uma alimentação mais rica em gorduras (especialmente hidrogenadas) e açúcares, além da crescente ingestão de ingredientes químicos, aumentando o risco de sobrepeso e obesidade, aparecimento de doenças crônicas e incapacidades. Os fatores relacionados a comportamentos e estilos de vida, como tabagismo, baixo consumo de frutas, de legumes e de verduras e o consumo de álcool são os principais fatores de risco para morte por câncer em países de baixa e média renda, o que é o caso brasileiro. Estima-se que o tabagismo seja responsável por 18% das mortes por câncer; o baixo consumo de frutas, legumes e verduras por 6%; o consumo de álcool por 5%. A saúde do trabalhador também é uma preocupação, pois os problemas de saúde dos trabalhadores estão intimamente relacionados com o grau de desen- volvimento alcançado por um país ou uma região. A esses problemas se associam o deterioramento das condições de trabalho e crescentes danos ambientais. Os acidentes de trabalho são um dos subprodutos dessas tendências, juntamente com uma grande carga de doenças profissionais e doenças relacionadas ao trabalho, cujas consequências contribuem para o agra- vamento dos problemas sociais que o país enfrenta. No Brasil, verifica-se a presença de algumas doenças já controladas em paí- ses desenvolvidos, como a silicose e outras pneumoconioses, envenenamento por chumbo, asbestose, síndrome do túnel do carpo, doenças dermatológicas causadas por compostos químicos, além dos sintomas e desordens mentais rela- cionadas ao stress, como a síndrome do Burnout. Os Principais Determinantes Sociais de Saúde no Brasil Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 33 A poluição também é uma preocupação, devido aos efeitos adversos sobre a saúde das populações expostas. Estima-se que o número de mortes causadas por problemas decorrentes da poluição atmosférica no mundo é de cerca de 3 milhões por ano, o que representa 5% do total de 55 milhões de mortes que ocor- rem anualmente no mundo. Em algumas populações, cerca de 30% a 40% dos casos de asma e 20% a 30% de todas as doenças respiratórias podem ser relacionadas à poluição atmosfé- rica. Outros efeitos referem-se a perdas econômicas, aumento no absenteísmo escolar, dias de trabalho perdidos e nebulizações. Busque saber sobre os membros da Comissão Nacional de Determinantes Sociais de Saúde (CNDSS) e reflita sobre a importância da diversidade de olhares sobre os determinantes de saúde. Para saber mais e se inteirar, acesse na íntegra o relatório da comissão nacio- nal sobre os determinantes sociais da saúde, intitulado As causas sociais das iniquidades em saúde no Brasil. Fonte: Comissão Nacional Sobre Determinantes Sociais da Saúde (2008, on- -line)2. SAÚDE E DOENÇA - UMA PERSPECTIVA ATUALIZADA Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. IU N I D A D E34 ORGANIZAÇÃO DOS SERVIÇOS DE SAÚDE NO BRASIL É possível observar as mudanças ocorridas nas condições de vida e de saúde da população brasileira, condicionadas aos fatores econômicos, socioculturais e políticos, ao longo dos anos. Agora, quando tomamos como foco os serviços de saúde no Brasil, é pos- sível observar mudanças significativas no decorrer dos anos, do mesmo modo, influenciados por fatores econômicos, socioculturais e políticos. Diversos autores fazem análises e escrevem sobre o sistema de saúde brasi- leiro, mas tomamos por referência a análise de Carvalho, Martin e Cordoni Jr (2001), os quais identificaram quatro tendências - Sanitarismo Campanhista, período de Transição, Modelo médico assistencial privatista e o Modelo plural. Vejamos um pouco de cada uma dessas tendências. 1) Sanitarismo Campanhista Tal tendência vigorou no país do início do século XX até 1945 e recebeu esse nome porque tinha, nas campanhas sanitárias,sua principal estratégia de saneamento. O Brasil tinha sua economia baseada na agricultura e na exportação do café; o comércio e o espaço nos portos era prioridade, devendo ser livre de doenças e saneados. Devido a isso, o sistema de saúde adotado foi o modelo das campanhas sanitárias, com foco no combate das endemias urbanas e rurais. A assistência Organização dos Serviços de Saúde no Brasil Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 35 individual era privada, a hospitalar com caráter de assistência social e as Santa Casas de Misericórdia atendiam quem não podia pagar. Em 1923, com a Lei Elói Chaves, surge a assistência previdenciária no país e a criação das Caixas de Aposentadoria e Pensão nas empresas de estradas de ferro para os empregados, que oferecia benefícios de aposentadorias e pensões, assistência médica e farmacêutica; logo em seguida, os portuários e marítimos criaram seus Institutos de Previdência, nascendo uma nova estrutura de pre- vidência social por categoria de trabalhadores, denominadas de Institutos de Aposentadorias e Pensão (IAP). Em 1930, o ministério da Educação e Saúde passa a coordenar as ações de saúde coletiva. 2) Período de Transição Esse período é compreendido entre 1945 a 1960, marcado pelo pós-guerra e a crise previdenciária. Nesse período, a previdência social passa a ter grande impor- tância e a ser utilizada como instrumento político; também foi nesse período que o Ministério da Saúde foi criado (1953). Ocorre, também, a unificação dos Institutos (IAPs), em 1967, e a criação do Instituto Nacional de Previdência Social (INPS), marcada pela exclusão de trabalhadores e empregados da gestão pela crescente influência da indústria far- macêutica, médico hospitalares e os proprietários de hospitais. 3) Modelo médico assistencial privatista O modelo médico assistencial privatista marca o período entre 1960 a 1980, caracterizado pela prática médica curativa, individual, assistencialista e especia- lizada em detrimento da saúde pública e a criação com intervenção estatal de um complexo médico privado, organizando o estado como financiador, o setor privado nacional como prestador de serviços e o setor privado internacional como produtor de insumos. O Brasil vivia o período da ditadura militar, marcado por atos institucionais e decretos presidenciais de cunho arbitrário e que alteravam direitos de cidada- nia, informação, organização social e política. SAÚDE E DOENÇA - UMA PERSPECTIVA ATUALIZADA Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. IU N I D A D E36 A saúde, que estava ligada à assistência social, tem sua ampliação na década de 70, com a cobertura para os trabalhadores rurais, as empregadas domésticas e os trabalhadores autônomos domésticos. Em 1974, cria-se o Ministério da Previdência e Assistência Social, que atua no atendimento médico assistencial individualizado e o Ministério da Saúde se volta ao atendimento coletivo e vigilância sanitária. Com a crise econômica no final da década de 70, foi impulsionado o Movimento da Reforma Sanitária que discutia reformas nas políticas de saúde, surgindo as ideias de medicina comunitária e o conceito de Atenção Primária à Saúde (OMS). O Movimento da Reforma Sanitária ajuda a fortalecer o processo de Transição democrática, ocorrido em 1984 com a 8° conferência Nacional de Saúde, em 1986, em que se discutiu a criação do Sistema Único de Saúde (SUS) e culmi- nou com sua promulgação na Constituição em 1988. 4) Modelo plural A partir de 1988, o Sistema Único de Saúde (SUS) foi incluído ao sistema de saúde brasileiro privado, garantindo acesso universal e igualitário às ações e ser- viços de saúde a todos os brasileiros, colocando a saúde como direito de todos e dever do estado. O setor lucrativo privado de atenção médica supletiva, que iniciou-se em 1954, se fortalece na década de 80 pela precariedade dos serviços públicos, criando, assim, a medicina de grupo, as cooperativas médicas, os seguro saúde. Regulamentados e fiscalizados pelo Estado, aliado ao setor não lucrativo, as insti- tuições filantrópicas (Santas Casas) configuram o sistema de saúde atual brasileiro. Reflita sobre as características do SISTEMA DE SAÚDE BRASILEIRO discutidas por Amélia Cohn e pense no quanto você tem participado para a sua cons- trução. Organização dos Serviços de Saúde no Brasil Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 37 Em síntese, gostaria de trazer o pensamento de Cohn (2012) acerca da política de saúde brasileira, o qual considera que tanto sua configuração e implementa- ção são processos complexos de jogos de interesses e valores múltiplos existentes na sociedade e que, em nossa sociedade desigual, as políticas sociais e de saúde devem priorizar os segmentos socialmente mais vulneráveis, com a lógica da universalização, integralidade e da equidade da atenção à saúde, o que depende tanto da vontade política dos governantes quanto da sociedade, para que os direi- tos sociais se constituam como uma realidade marcada com maior justiça social. Para saber mais da história do sistema brasileiro de saúde, leia o texto de Paim (2011), O sistema de saúde brasileiro: história, avanços e desafios, dis- ponível em: <http://download.thelancet.com/flatcontentassets/pdfs/brazil/ brazilpor1.pdf>. Acesso em: 12 fev. 2017. O artigo, publicado em 2011 pelo periódico The Lancet, faz parte de uma série de publicações que analisam as melhorias nas condições de saúde e na expectativa de vida da população brasileira. Nesse artigo, é apresentado um panorama das principais conquistas e desafios relativos às políticas públicas de saúde no Brasil, com especial destaque ao Sistema Único de Saúde (SUS). Fonte: a autora. SAÚDE E DOENÇA - UMA PERSPECTIVA ATUALIZADA Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. IU N I D A D E38 CONSIDERAÇÕES FINAIS Ao prestar a assistência ao indivíduo, à família ou à comunidade, deve ser con- siderado quem é ou quem são os usuários, como se apresentam na situação de necessidade de saúde, seus direitos, deveres, valores e prerrogativas. O ser humano é complexo e não há como abranger sua totalidade por uma única definição. Mesmo que a pessoa seja considerada um ser biopsicossocial e espiritual, não consegue expressar toda sua individualidade e singularidade. Os profissionais da área da saúde aprendem sobre estrutura e função humana por meio do estudo da anatomia, da fisiologia, da psicologia, da sociologia e da patologia, além das várias maneiras de assistir, de abordar e se relacionar profissionalmente com o indivíduo, a família ou a comunidade. Não podemos nos esquecer de que o ambiente é o local onde a pessoa se encontra com as coisas ao seu redor e que exercem nela influências, afetando-a de várias maneiras. É necessário compreender as condições impostas como passíveis de interferência e atentar para não culpar os indivíduos quando tais condições forem insalubres e interferirem em seu estilo de vida. Trabalhar com as condições de vida impostas requer um trabalho interdisciplinar e intersetorial. A área da saúde, sozinha, não consegue assegurar qualidade de vida e, consequentemente, de saúde. É na esfera da ética que compreenderemos a necessidade do empenho de parte significativa da sociedade para assegurar a dignidade da vida humana. Cabe aos profissionais da área da saúde rever em sua prática, buscando entender que não basta trabalhar com as doenças, é necessário compreender o indivíduo no todo como alguém que vive a experiência da necessidade, do adoecimento, carregada de valores e significados subjetivos, únicos, capazes de interferir na qualidade do cuidado prestado. Assim, resta-nos, como profissio- nais da saúde, enfrentaro desafio de construir estratégias para conceber a saúde no âmbito da atenção básica de forma mais solidária e menos punitiva na con- vivência com os estilos de vida individuais. 39 Fragmento do texto - A Operacionalização de um Conceito Amplo (Carlos Batistella) Uma vez analisado o conceito ampliado de saúde, outro dilema aflige os trabalhadores da saúde, em especial aqueles que lidam diretamente com a população: como opera- cionalizá-lo? Como fazer com que suas premissas ganhem concretude e expressão nas práticas cotidianas dos serviços? Pensar saúde como acesso à educação, trabalho, transporte, lazer e alimentação, implica a superação do modelo biomédico e a adoção de outros princípios norteadores capazes de auxiliar na necessária reorganização do modelo de atenção à saúde, ainda voltado às ações curativas e assistenciais. O conceito e as práticas de promoção da saúde têm representado uma possibilidade concreta de ruptura desse paradigma ao proporem uma nova forma de conceber e in- tervir no campo da saúde. A ‘criação de ambientes favoráveis à saúde’ diz respeito não apenas à conservação dos recursos naturais, mas também daqueles ambientes construídos pelo homem. Im- plica, sobretudo, “o reconhecimento da complexidade das nossas sociedades e das rela- ções de interdependência entre os diversos setores” (BUSS, 2003, p. 27). O ‘reforço da ação comunitária’, também chamado de empowerment comunitário, refere-se ao incremento do poder das comunidades na fixação de prioridades, na tomada de decisões e na definição e implementação de estratégias para alcançar um melhor nível de saúde (...), ou seja, à aquisição de poder técnico e consciência política para atuar em prol de sua saúde (BUSS, 2003, p. 27). Esse processo, entre outras ações, depende substancialmente da garantia de acesso da população à informação, às oportunidades de aprendizagem e ao planejamento das ações. Já o ‘desenvolvimento de habilidades pessoais’ tem sido um dos campos de ação mais polêmicos dessa proposta. Boa parte das críticas à promoção da saúde incidem sobre esse aspecto. Se, por um lado, é imprescindível a divulgação de informações sobre diferentes aspectos relativos à saúde – de modo que a população tenha como orientar suas condutas –; por outro, quando essa perspectiva é adotada como o próprio concei- to de promoção, opera-se um reducionismo que empobrece a potencialidade de seu alcance. Dessa forma, em uma outra perspectiva de modelo de atenção, o ‘objeto das práticas de saúde’ se expande para além da doença, dos doentes, dos modos de transmissão e dos fatores de risco, passando a englobar as necessidades e os determinantes (condições de vida e de trabalho); os sujeitos da atenção já não podem ser considerados apenas os médicos, os sanitaristas e seus auxiliares, mas as equipes de saúde (de todos os níveis), trabalhadores de outros setores e a própria população; os ‘meios de trabalho’ incorpo- 40 ram, para além das consagradas tecnologias médicas e sanitárias, a contribuição de ou- tros conhecimentos e instrumentos fundamentais para uma ação mais ampla, capaz de produzir impactos na esfera dos determinantes e condicionantes. A mudança paradigmática envolve mais atores na operacionalização da promoção da saúde. Mais do que médicos, enfermeiros, técnicos, agentes e demais trabalhadores da saúde, serão incorporados ambientalistas, engenheiros, advogados, antropólogos, artis- tas, jornalistas, garis e a própria população envolvida direta ou indiretamente na produ- ção e/ou na solução do problema. As práticas, por sua vez, passam a contar com uma dimensão comunicativa mais forte, buscando estabelecer vínculos sociais com a comunidade e suas formas culturais – vi- sando a troca de saberes populares e científicos, o fortalecimento técnico e o amadure- cimento político a partir do reconhecimento da história, dos problemas e das próprias potencialidades do território. O planejamento participativo é ferramenta fundamental para a viabilidade do encontro de saberes, interesses e visões sobre a realidade. Desde a identificação e definição de prioridades até a construção de propostas de intervenção são necessárias várias etapas e uma significativa capacidade de mobilização. A formação dessa capacidade normativa (CANGUILHEM, 2006) põe em evidência outra importante dimensão de uma nova prá- tica: a ação educativa. A análise da viabilidade pode interpor a necessidade de estabelecer objetivos estraté- gicos, soluções parciais e incremento de recursos. As operações podem ser atingidas somente a médio e longo prazo, porém, terão seguramente um impacto mais amplo e formativo na sociedade do que a persistência única e exclusiva nas reformas da atenção setorial. A implementação e a avaliação contínua dos processos e dos resultados serão sempre consequência da capacidade mobilizadora dos atores sociais envolvidos, sejam profis- sionais de saúde, de outros setores ou a própria comunidade. Fonte: adaptado de Batistella (2007). 41 1. O grande desafio do conceito ampliado de saúde é a operacionalização de suas particularidades pelos trabalhadores da saúde, em especial aqueles que lidam diretamente com a população. Diante disso, em relação às premissas abaixo, as- sinale a alternativa que possibilita a concretude e expressão do conceito nas práticas cotidianas dos serviços. a. Criando ambientes favoráveis à saúde, reforçando a ação comunitária, au- mentando o número de serviços de saúde. b. Reforçando a ação comunitária, desenvolvendo habilidades pessoais e for- mando um maior número de profissionais de saúde. c. Criando ambientes favoráveis à saúde, reforçando a ação comunitária, desen- volvendo habilidades pessoais. d. Reforçando a ação comunitária, educando a população e formando um maior número de profissionais de saúde. e. Aumentando o número de serviços de saúde, formando mais profissionais de saúde e criando ambientes favoráveis à saúde. 2. Procure uma música ou um filme que traga uma percepção da situação de saú- de ou noção de saúde, ou que retrate a “cara” da sociedade em que vivemos, registre em seu caderno e justifique a escolha com base nos determinantes sociais de saúde. 3. De acordo com a Visão Socioambiental da saúde, descreva o conceito de saú- de, seus determinantes, as estratégias e os programas de saúde. 4. Explique o modelo de determinação social da saúde proposto por Dahlgren e Whitehead. 5. Qual a crítica ao Modelo Plural de saúde brasileiro? MATERIAL COMPLEMENTAR Tratado de Saúde Coletiva Gastão Wagner de Sousa Campos Editora: Hucitec Sinopse: o livro apresenta um panorama dos principais assuntos de que se ocupa a saúde coletiva, estabelecendo um diálogo com docentes e discentes de graduação e pós-graduação das pro� ssões de saúde. História da saúde pública no Brasil - Um século de luta pelo direito à saúde o documentário “POLÍTICAS DE SAÚDE NO BRASIL: Um século de luta pelo direito à saúde” conta a história das políticas de saúde em nosso país, mostrando como ela se articulou com a história política brasileira, destacando os mecanismos que foram criados para sua implementação, desde as Caixas de Aposentadorias e Pensões até a implantação do SUS. Sua narrativa central mostra como a saúde era considerada, no início do século XX, um dever da população, com as práticas sanitárias implantadas autoritariamente pelo Estado, de modo articulado aos interesses do capital, e como, no decorrer do século, por meio da luta popular, essa relação se inverteu, passando a ser considerada, a partir da Constituição de 1988, um direito do cidadão e um dever do Estado. Toda essa trajetória é contada por meio de uma narrativa fi ccional, vivida por atores, com reconstrução de época, apoiada por material de arquivo. Para tornar a narrativa mais leve e atraente, o fi lme se vale da linguagem dos meios de comunicação dominantes em cada época, como o jornal, o rádio, a TV Preto e branco, a TV colorida e, por fi m, a internet. O fi lme foi realizadopor iniciativa da Secretaria de Gestão Estratégica e Participativa, do Ministério da Saúde, em parceria com a Organização Pan-Americana da Saúde - OPAS e a Universidade Federal Fluminense/UFF. A obra, de caráter formativo, terá distribuição gratuita em todo o país, dirigida especialmente aos Conselhos de Saúde, instituições de ensino e movimentos sociais ligados à saúde. Estimula-se que o fi lme seja utilizado nas etapas municipais e estaduais da 13ª Conferência Nacional de Saúde. Uma versão legendada em espanhol e inglês está sendo discutida com a OPAS, para divulgação junto a países da América Latina, Caribe e África, que buscam no SUS uma referência. O documentário é composto por 5 capítulos, que podem ser assistidos em sequência, com 60 minutos de duração, ou separadamente; cobrindo os seguintes períodos: 1900 a 1930; 1930 a 1945; 1945 a 1964; 1964 a 1988; e 1988 a 2006. Visite o portal da saúde do Ministério da Saúde. Você encontrará: Blog da saúde, Web rádio saúde e Canal saúde, que contribuem com informações e notícias sobre a saúde, aberto a todos os cidadãos, trabalhadores e gestores de saúde e Ministério da Saúde. E muito mais! Acesso disponível em: <http://portalsaude.saude.gov.br/> REFERÊNCIAS 43 BACKES, M. T. S. et al. Conceitos de saúde e doença ao longo da história sob o olhar epidemiológico e antropológico. Rev. enferm. UERJ, v. 17, n. 1, 2009. BARATA, R. B. Desigualdades sociais e saúde. In: CAMPOS, G. W. S. et al. Tratado de saúde coletiva. São Paulo: Hucitec, 2012, p. 457-486. BATISTELLA, C. et al. O território e o processo saúde-doença. Rio de Janeiro: Fio- cruz, 2007. BUSS, P. M.; PELLEGRINI FILHO, A. 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GABARITO QUESTÃO 1) C. 2) O aluno é livre na escolha, mas deve justificá-la relacionando os determinantes sociais de saúde (biológico, social e cultural). 3) Conceitos de saúde Bem-estar biopsicossocial Necessidades de saúde Determinantes de saúde Condições de riscos diversas Estratégias Ação política, espaços saudáveis, empoderamento da população, desenvolvimento de habilidades, reorienta- ção de serviços Desenvolvimento de programas Comunidade em diálogo crítico com profissionais e agências 4) O modelo entende que a saúde compreende três dimensões - a biológica, a social e cultural. A dimensão biológica compreende as características biológicas marcadas pela interação genótipo-fenótipo, ou seja, a genética e a modulação das potencia- lidades são herdada pelas condições concretas da existência que irão resultar nas manifestações fenotípicas, como exemplo, a idade/sexo e fatores hereditá- rios X, estilo de vida. Na dimensão social, inclui os grupos sociais e as formas de consciência e condutas resultantes de suas interações, bem como a forma de constituição dessas comunidades. A dimensão cultural inclui as condições de vida e de trabalho, suas formas de organização que compreende as condições socioeconômicas, culturais e ambientais gerais. 5) “E um sistema público de saúde dual, políticas de saúde centralizadas e verti- calizadas, tradição histórica da saúde vinculada ao mercado de trabalho, o sis- tema privado prestador com origem na década de 20 como fruto da política previdenciária, distribuição de equipamentos de saúde altamente desigual, modelo de atenção comandado pela lógica médica e hospitalocêntrico, duplo comando da previdência social que prestava serviços de assistência à saúde e o Ministério da Saúde relativos a ações coletivas, dualidade na assistência dos trabalhadores por categorias (década de 30), e na diferenciação do acesso se- gundo a posição no mercado de trabalho (década de 70), herança de um setor privado de produção de assistência médica que se constituiu sob as sombras e financiamento do Estado”. U N ID A D E II Professora Dra. Marcela Demitto Furtado HISTÓRIA DA SAÚDE PÚBLICA NO BRASIL Objetivos de Aprendizagem ■ Conhecer brevemente a história que antecedeu o SUS. ■ Identificar os interesses, conflitos e necessidades sociais que deram origem ao SUS. ■ Conhecer os objetivos e princípios do SUS. ■ Descrever as diretrizes contidas nos pactos intergestores: Pacto pela vida, Pacto em defesa do SUS e Pacto de gestão. ■ Compreender o conceito de rede de atenção e seus componentes. Plano de Estudo A seguir, apresentam-se os tópicos que você estudará nesta unidade: ■ Antecedentes do SUS ■ O processo de construção do SUS ■ Entendendo o SUS ■ Pactos pela saúde ■ Redes de atenção à saúde INTRODUÇÃO Olá, caro (a) aluno(a). Já demos o primeiro passo na compreensão do processo saúde-doença quando estudamos, na unidade anterior, um pouco sobre alguns conceitos, os fatores determinantes e condicionantes do processo saúde-doença e a realidade brasileira, bem como os modelos de Atenção à Saúde. Para compreendermos um pouco mais como esse processo se dá na atualidade, é fundamental resgatarmos um pouco de história, afinal, todos nós somos frutos de um passado e de uma história, sofremos influências ao longo da vida, faze- mos escolhas, e tudo isso contribuiu para a formação da pessoa que somos hoje. Da mesma forma, o setor saúde também foi construído com base na história. O contexto político-social, a economia, o desenvolvimento da ciência e pesquisa e a situação geral do Brasil, bem como acontecimentos a nível mundial, ao longo dos anos, refletiram diretamente na saúde e construção das políticas públicas. Nesta unidade, estudaremos a história e a evolução da saúde pública no Brasil, destacando a criação do Sistema Único de Saúde (SUS) que é um dos maiores sistemas públicos de saúde do mundo. Abordaremos seus objetivos e suas diretrizes filosóficas e organizativas, bem como as reformas institucionais que deram origem aos Pactos pela Saúde, além de discutirmos sobre as mudan- ças no modelo de atenção com a implantação das Redes de Atenção à Saúde. O conhecimento adquirido aqui será fundamental para a compreensão das demais Unidades, além de permitir uma visão mais ampliada e crítica sobre a organização dos serviços de saúde no Brasil, contexto no qual o profissional da área da saúde irá atuar. Vamos, então, mergulhar nessa linha do tempo, buscando entender um pouco mais desse universo tão vasto de informações no contexto da Saúde Pública. Junte-se a nós e bons estudos! Introdução Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt. 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 47 HISTÓRIA DA SAÚDE PÚBLICA NO BRASIL Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. IIU N I D A D E48 ANTECEDENTES DO SUS Para conhecer a história da saúde no Brasil precisamos entender um pouco da história do nosso país, já que os acontecimentos sociais, políticos e econômicos refletiram diretamente na construção da saúde pública. Como é de conhecimento de todos, em meados de 1500, a saúde retratava a brutalidade imposta pela colonização portuguesa: abandono social do homem livre, extermínio de bandeirantes e civilizações indígenas, escravidão dos negros africanos, os quais viviam em senzalas, sob tortura e sem condições mínimas de higiene. As doenças, nesse período, eram vistas, muitas vezes, como castigos divinos pelo pecado do homem. Para o tratamento, as pessoas procuravam por feiticei- ros, curandeiros, boticários e, também, pelas Casas de Saúde filantrópicas ligadas à Igreja Católica ou aos militares. Tudo isso custava dinheiro, logo, quem não podia pagar ficava sem assistência. A estratégia de controle adotada nessa época para as doenças pestilenciais, como lepra e varíola, era o confinamento, tratan- do-se, portanto, de uma medicina de exclusão. Antecedentes do SUS Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 49 A partir do século XIX, com a vinda da família real ao Brasil, é que se começou a pensar em políticas públicas de saúde; afinal, era preciso uma estrutura sani- tária mínima que pudesse dar suporte ao poder que se instalava na cidade do Rio de Janeiro (POLIGNANO, 2001). Até meados de 1850, a saúde pública estava limitada às juntas municipais e ao controle de navios e saúde dos portos (BERTOLOZZI; GRECO, 1996). Com a Proclamação da República, em 1889, o país adotou uma forma de orga- nização capitalista. O período compreendido entre 1889 e 1930, denominando de Primeira República, foi marcado pelo surgimento das primeiras indústrias e investimento estrangeiro (BERTOLOZZI; GRECO, 1996). Com a falta de um modelo sanitário, a saúde tornou-se caótica, caracterizada pelo predomínio de diversas doenças graves, como tuberculose, sífilis, varíola, febre amarela, entre outras. Tal situação gerou sérias consequências, tanto para a saúde coletiva quanto para o setor do comércio exterior, já que os navios estran- geiros não queriam mais atracar no porto do Rio de Janeiro (POLIGNANO, 2001). Nesse período, Rodrigues Alves, o atual presidente do Brasil, nomeou Oswaldo Cruz como Diretor do Departamento Federal de Saúde Pública, com a finalidade de erradicar a epidemia da febre amarela. Assim, várias condutas arbitrárias e que não haviam sido esclarecidas à população foram tomadas para Você sabia que a lepra é uma das doenças mais antigas do mundo, mas que hoje tem tratamento e cura? A lepra, também conhecida como hanseníase, é uma doença infecciosa, contagiosa, causada por uma bacilo chamado Mycobacterium leprae, o qual afeta nervos e pele. A transmissão se dá pelas vias aéreas, como secreções nasais, gotículas da fala, tosse e espirro de pacientes considerados bacilífe- ros, ou seja, sem tratamento. Antigamente, as pessoas doentes ficavam nos leprosários, isoladas da sociedade. Hoje, todos os casos têm tratamento e cura. Os pacientes podem ser tratados gratuitamente no Sistema Único de Saúde. Fonte: Brasil (2008). HISTÓRIA DA SAÚDE PÚBLICA NO BRASIL Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. IIU N I D A D E50 combater o mosquito que transmite a doença, o que gerou insatisfação e revolta da população. Esse modelo de intervenção ficou conhecido como campanhista (SINGER; CAMPO, 1978). Somado a isso, em 1904, a Lei federal n° 1.261 instituiu a vacinação obrigatória anti-varíola para todo o território nacional, o que culminou com vários conflitos entre a população e as forças do governo (policiais e militares). Essa manifesta- ção popular ficou conhecida como Revolta da Vacina (SINGER; CAMPO, 1978). Mesmo permeado por abusos, o modelo campanhista obteve conquistas no controle das epidemias, conseguindo, por exemplo, erradicar a febre amarela do Rio de Janeiro. Ainda nesse período, foi incorporado o registro demográfico que permitiu conhecer a população e suas necessidades, o laboratório para auxiliar no diagnósticos das doenças e a fabricação de produtos profiláticos (BERTOLLI FILHO, 1996). Com a 1° Guerra Mundial (1914-1918), envolvendo as grandes potências do mundo, o Brasil sofreu consequências na sua economia, o que gerou desemprego, redução de salários e elevação do custo de vida. Atrelado a isso, as péssimas con- dições de trabalho e a falta de direitos trabalhistas deram origem às greves gerais (BERTOLLI FILHO, 1996). A partir de então, os trabalhadores passam a conquistar alguns direitos sociais que, a princípio, se relacionam apenas ao trabalho e depois abrangem a questão da saúde. Discutiremos esse assunto no próximo tópico! O Processo de Construção do SUS Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 51 O PROCESSO DE CONSTRUÇÃO DO SUS Uma série de eventos, cujas datas serão apresentadas abaixo, contribuíram para a construção do SUS como a principal política pública de saúde do Brasil. Em 1923, foi criada a lei Eloy Chaves - que estabelece as Caixas de Aposentadoria e Pensões (CAPs) -, marco inicial da Previdência Social no Brasil. Tal lei visava garantir pensão aos trabalhadores em caso de algum acidente ou afastamento do trabalho por doença, e uma futura aposentadoria. Com as CAPs inicia-se o debate sobre a importância de atender às necessidades dos trabalha- dores (ANDRADE; SOARES; JUNIOR, 2001). Na Era Vargas, foram criados o Ministério da Educação e da Saúde Pública e o Ministério do Trabalho; esse último com o intuito de atender os direitos dos trabalhadores, o que, até o momento, era inexistente (BERTOLLI FILHO, 1996). Em 1932, buscando ampliar o papel das CAPs, foram criados os Institutos de Aposentadoria e Pensões (IAPs), os quais eram organizados por categoria profi ssional. Assim, foram criados o Instituto de Aposentadoria e Pensões dos Marítimos (IAPM), dos Bancários (IAPB), dos Comerciários (IAPC), dentre outros; e o Estado passou a participar da sua administração, controle e fi nan- ciamento (ANDRADE; PONTES; JUNIOR, 2000). Nesse período, ainda se mantinha o formato do vínculo contributivo formal do trabalhador para a garantia do benefício, ou seja, aquele que não contribuísse estava excluído do sistema de proteção, o que se confi gurava como uma injus- tiça social, já que não havia o mesmo direito para todos. HISTÓRIA DA SAÚDE PÚBLICA NO BRASIL Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. IIU N I D A D E52 Em 1966, com a unificação dos IAPs, foi criado o Instituto Nacional de Previdência Social (INPS), que permitia que todo trabalhador urbano com carteira assinada se tornasse, automaticamente, contribuinte e beneficiário do sistema. Tal órgão gerou uma certa insatisfação nos contribuintes dos institutos com mais benefícios, pois, com a unificação, os mais pobres iriam receber mais benefícios (ANDRADE; SOARES; JUNIOR, 2001). Em 1977, foi criado o Instituto Nacional de Assistência Médica e Previdência Social (INAMPS), grande órgão governamental que prestava assistência médica apenas aos trabalhadores da economia formal, com carteira assinada, e seus depen- dentes. Tal assistência à saúde estava atrelada basicamente à custa de compra de serviços médico hospitalares e especializados do setor privado (BAPTISTA, 2003). A década de 80 foi marcada por movimentos de contestação ao sistema de saúde. Um evento que marcou a história foia realização da VIII Conferência de Saúde, que aconteceu em março de 1986, presidida pelo médico Sérgio Arouca e, pela primeira vez, contou com a participação da comunidade (ANDRADE; PONTES; JUNIOR, 2000). A VIII Conferência Nacional de Saúde difundiu a proposta da reforma sanitária, consagrando um conceito ampliado de saúde e reconhecendo a mesma como direito universal e dever do Estado. Sérgio Arouca é considerado um dos principais teóricos e líderes do movi- mento da reforma sanitária. Falecido em agosto de 2003, aos 61 anos, de- vido a um câncer no intestino, Arouca é reconhecido por sua importante participação na construção do Sistema Único de Saúde (SUS). Internacional- mente, foi consultor da Organização Pan-Americana de Saúde (Opas), atu- ando em vários países da América Latina. Fonte: adaptado do site da Fiocruz ([2017], on-line)1. O Processo de Construção do SUS Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 53 Em 1987, ocorreu a implantação do Sistema Unificado e Descentralizado de Saúde (SUDS), um convênio entre o INAMPS e os governos estaduais. O SUDS avançou na política de descentralização da saúde, bem como na descentraliza- ção orçamentária, ocorrendo o que chamamos de “estadualização”, ou seja, todo o poder conferido ao INAMPS, agora, era repassado às secretarias estaduais de saúde (ANDRADE; SOARES; JUNIOR, 2001). O SUDS possuía como principais diretrizes a universalização e equidade no acesso aos serviços de saúde; a descentralização das ações de saúde, como citado anteriormente; a integralidade do cuidado; e a implementação de distritos sani- tários (ANDRADE; SOARES; JUNIOR, 2001). Em 1988, é promulgada a Constituição da República, denominada Constituição Cidadã, a qual foi fundamental na definição de ações prioritárias na área de saúde pública (BRASIL, 2000a). Vamos relembrar que foi nessa Constituição que ficou estabelecido que “a saúde é direito de todos e dever do Estado”. A criação do Sistema Único de Saúde (SUS) se deu em 19 de setembro de 1990, por meio da lei 8.080, que “dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos servi- ços correspondentes” (BRASIL, 1990a). De forma geral, essa primeira lei do SUS detalha sobre os objetivos e diretrizes do SUS, os quais serão discutidos no pró- ximo tópico. Logo em seguida, em dezembro de 1990, foi criada a lei 8.142, que “dispõe sobre a participação da comunidade na gestão do Sistema Único de Saúde (SUS) e sobre as transferências intergovernamentais de recursos financeiros na área da saúde e dá outras providências” (BRASIL, 1990b). Essas duas leis (8.080 e 8.142), denominadas “Leis Orgânicas de Saúde”, foram objeto de muita disputa política. A Reforma Sanitária diz respeito a “…um processo de transformação da nor- ma legal e do aparelho institucional que regulamenta e se responsabiliza pela proteção à saúde dos cidadãos” (Sonia Fleury Teixeira ) HISTÓRIA DA SAÚDE PÚBLICA NO BRASIL Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. IIU N I D A D E54 Assim, finalmente estava construído o arcabouço jurídico do Sistema Único de Saúde. Porém, novas lutas ainda estavam por vir e, claro, inúmeras conquis- tas também! ENTENDENDO O SUS Nesse tópico, vamos abordar, especialmente, os objetivos e princípios do SUS, bem como alguns marcos importantes que irão facilitar a sua compreensão acerca dessa política pública de saúde. De acordo com a lei 8.080, já abordada anteriormente, os objetivos do SUS são: a identificação e divulgação dos fatores condicionantes e determinantes da saúde; a formulação de políticas de saúde; a assistência às pessoas por intermé- dio de ações de promoção, proteção e recuperação da saúde, com realização integrada das ações assistenciais e das atividades preventivas (BRASIL, 1990a). Em relação aos princípios do SUS, os que compõem a sua base, referindo-se aos objetivos finalísticos do sistema de saúde, são denominados de doutrinários (ou éticos), sendo eles: universalidade, equidade e integralidade (PAIM; SILVA, 2010). O princípio de universalidade reafirma o que já foi previsto na Constituição de 1988, que a saúde é um direito de todos e dever do Poder Público; é a garan- tia de atenção à saúde de todos os cidadãos. “No SUS, universalidade supõe que todos os brasileiros tenham acesso igualitário aos serviços de saúde e respecti- vas ações, sem qualquer barreira de natureza legal, econômica, física ou cultural” (PAIM; SILVA, 2010, p. 114). Entendendo o SUS Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 55 A integralidade diz respeito a atender as necessidades específi cas de cada indivíduo ou grupo de pessoas, de modo a garantir e promover ações de prevenção, promoção, assistência e reabilitação. De certa for- ma, é, também, compreender o homem como um ser integral, biopsi- cossocial, o que irá proporcionar um atendimento holístico (MACHA- DO et al., 2007). A Integralidade é o próprio caminho que vai transformando as pessoas e cons- truindo algo melhor. Busca uma assistência ampliada, transformadora, centrada no indivíduo e não aceita a redução do mesmo nem à doença nem ao aspecto biológico. Além do atendimento integral, envolve a valorização do cuidado e o acolhimento (FONTOURA; MAYER, 2006, p. 532-533). O princípio de equidade está atrelado à necessidade de diminuir as desi- gualdades, sejam elas sociais e/ou econômicas, muito presentes em nosso país quando, por exemplo, comparamos diferentes regiões. Porém, a equidade não é o mesmo que igualdade, visto que as pessoas, por serem diferentes, possuem necessidades diferentes. Logo, esse princípio busca suprir a necessidade de assis- tência de saúde de acordo com a igualdade de condições (PAIM; SILVA, 2010). Figura 1 - Igualdade e Equidade Fonte: Marta - O meu canto (2017, on-line)2. HISTÓRIA DA SAÚDE PÚBLICA NO BRASIL Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. IIU N I D A D E56 Os princípios que regem a organização do SUS são chamados de Organizacionais ou Operativos, são eles: Regionalização, Hierarquização, Resolubilidade, Descentralização e Participação comunitária (BRASIL, 2001a). O entendimento dos princípios de regionalização e hierarquização diz respeito à forma de organização dos serviços entre si e com a população. A regionalização vai além da delimitação rígida de uma base territorial, usuários e serviços; leva-se em conta, também, a divisão político-administrativa do país (OLIVEIRA, 2009). A hierarquização significa que a organização do sistema de saúde deve acon- tecer em níveis crescentes de complexidade, considerando as características específicas de cada área geográfica e de cada cliente (OLIVEIRA, 2009). Sabendo que o usuário do serviço de saúde pode percorrer por vários níveis de atenção durante seu atendimento é que se faz necessário incorporar o sistema de referência e contrarreferência, a fim de integrar as redes de saúde e, assim, obter maior eficiência no cuidado ao usuário (SERRA & RODRIGUES, 2010). A resolubilidade diz respeito à necessidade do serviço de saúde apresentar-se resolutivo até o nível de sua competência para aquilo que é proposto (BRASIL, 1990c). O princípio de descentralização pode ser entendido como uma forma de redistribuir as responsabilidades sobre a saúde da população entre as três esferas do governo, acreditando que quanto mais perto, a solução estiver do problema maior serão as chances de acerto. De acordo com Palha e Villa (2003) a descentralização dos serviços de saúde tem sido o eixo norteador para a operacionalização dos princípios organizativos e diretivos do SUS. Nesse sentido, a descentralização tem ênfase na municipalização, ou seja, os municípios assumindo um papel cadavez mais importante na prestação e gerenciamento dos serviços de saúde (BARATA, TANAKA, MENDES, 2004). E, por fim, a participação da comunidade refere-se à valorização da popu- lação nos processos decisórios do país, o que refletiu no chamado “movimento sanitário”,o qual contou com a participação de intelectuais, usuários e trabalha- dores de saúde na luta pela reforma do sistema de saúde. Com o objetivo de colocar em prática a participação social na saúde é que a lei 8.142 (Lei Complementar da Saúde), propôs a formação dos Conselhos de Saúde, os quais devem acontecer nas três esferas do governo e contar com a Entendendo o SUS Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 57 presença de representantes do governo, prestadores de serviços, profissionais de saúde e usuários (BRASIL, 1990b). A organização operacional do SUS se deu pela criação das Normas Operacionais Básicas (NOB), as quais possuem três edições (1991, 1993 e 1996), devido à necessidade de aperfeiçoamento ao longo dos anos (BRASIL, 2000b). Para atender ao princípio de descentralização, as negociações e pactua- ções acerca da saúde se dão nos três níveis de governo (nacional, estadual e municipal). Nesse sentido, em 1991, foram criadas a Comissão de Intergestores Tripartite (CIT), com representação do Ministério da Saúde (MS), do Conselho Nacional de Secretários Estaduais de Saúde (CONASS) e do Conselho Nacional de Secretários Municipais de Saúde (CONASEMS); e a Comissão Intergestores Bipartite (CIB), representada por integrantes da Secretaria Estadual de Saúde (SES) e do Conselho Estadual de Secretários Municipais de Saúde (COSEMS) ou órgão equivalente (BRASIL, 2000). Buscando colocar em prática os princípios do SUS, várias estratégias foram formuladas, como a criação dos distritos sanitários, dos sistemas locais de saúde e do Programa de Agentes Comunitários de Saúde (PACS) (ESPÍNOLA; COSTA, 2006). O agente comunitário de saúde é aquele profissional que faz o acompanha- mento das famílias que vivem no seu território de abrangência; ele faz uma ponte entre o serviço de saúde e a população, auxiliando nas ações de prevenção e pro- moção da saúde (BRASIL, 2001b). Outro marco muito importante que buscou reorganizar o SUS no âmbito da atenção básica de saúde foi a criação, em 1994, do Programa de Saúde da Família (PSF), posteriormente intitulado Estratégia de Saúde da Família (ESF) (SOUZA, 2000). O SUS depende da atuação concreta dos trabalhadores para que as ações de saúde em defesa da vida tornem-se realidade para a sociedade. O que está ao seu alcance para a concretização dos princípios do SUS? HISTÓRIA DA SAÚDE PÚBLICA NO BRASIL Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. IIU N I D A D E58 A operacionalização dos objetivos e princípios do SUS, bem como das diversas políticas criadas no decorrer da sua história, não é uma tarefa fácil e encontra inúmeros obstáculos, como: dificuldade de financiamento, burocracia no geren- ciamento público, perfil profissional incompatível com o exigido pelo sistema, dentre muitos outros. Porém, o SUS também é motivo de muitas conquistas que repercutiram em melhores condições de vida para o brasileiro. O SUS ainda está em processo de construção e isso se dá a cada dia. De acordo com Cunha e Cunha (1998, p. 11), o SUS “se constrói no cotidiano de todos aqueles interessados na mudança da saúde no Brasil. Entendê-lo é uma boa forma de fortalecer a luta pela sua construção”. PACTOS PELA SAÚDE Como já discutimos anteriormente, a gestão do SUS é de responsabilidade dos três níveis de governo (União, Estados e Municípios), e as Normas Operacionais Básicas (NOB), é que vinham regulamentando as relações entre eles até 2006. Neste ano, foi instituído o Pacto pela Saúde como um conjunto de normas ins- titucionais, com o objetivo de fortalecer a gestão do SUS (BRASIL, 2006). Pactos Pela Saúde Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 59 O Pacto pela Saúde se dá num cenário em que se busca a operacionalização do SUS, especialmente no que tange à consolidação da equidade social. Nesse sentido, os profissionais assumiram compromissos em três dimensões: Pacto pela Vida; em Defesa do SUS; e de Gestão, os quais serão abordados brevemente neste tópico (FADEL et al., 2009). No Pacto pela Vida, as metas são firmadas em torno das necessidades priori- tárias que geram impacto na saúde da população brasileira. São seis as prioridades pactuadas: Saúde do Idoso; Controle do câncer do colo do útero e da mama; Redução da mortalidade infantil e materna; Fortalecimento da capacidade de resposta às doenças emergentes e endemias, com ênfase na dengue, hansení- ase, tuberculose, malária e influenza; Promoção da Saúde; e Fortalecimento da Atenção Básica (BRASIL, 2006). A Política Nacional de Promoção da Saúde (PNPS) foi aprovada, em 2006, como estratégia que visa a organização da gestão e das práticas de saúde. Em 2015, a PNPS foi revisada, visando destacar a necessidade de articulação com outras políticas públicas, incluindo a participação social e movimentos populares, no sentido de se fortalecer para o enfrentamento dos determi- nantes sociais de saúde. Dentro da PNPS, foram elencados temas transversais, que auxiliam na for- mulação de agendas de promoção da saúde e adoção de estratégias, os quais são: Determinantes Sociais da Saúde (DSS), Equidade e respeito à diversidade; Desenvolvimento sustentável; Produção de saúde e cuidado; Ambientes e territórios saudáveis; Vida no trabalho; e Cultura da paz e direi- tos humanos. Para concretizar as ações de promoção da saúde, foram estabelecidos eixos operacionais: Territorialização; Articulação e cooperação intrassetorial e in- tersetorial; Rede de Atenção à Saúde; Participação e controle social; Gestão; Educação e formação; Vigilância, monitoramento e avaliação; Produção e disseminação de conhecimentos e saberes; e Comunicação social e mídia. Fonte: Brasil (2015). HISTÓRIA DA SAÚDE PÚBLICA NO BRASIL Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. IIU N I D A D E60 O Pacto em Defesa do SUS busca discutir o sistema a partir dos seus princípios fundamentais, além de ampliar o diálogo com a sociedade, fazendo com que a população se aproxime mais do SUS (CEAP, 2009). As diretrizes desse Pacto, segundo o Ministério da Saúde foram: 1. Repolitização da saúde, como um movimento que retoma a Refor- ma Sanitária Brasileira aproximando-a dos desafios atuais do SUS; 2. Promoção da Cidadania como estratégia de mobilização social tendo a questão da saúde como um direito; 3.Garantia de financiamento de acordo com as necessidades do Sistema (BRASIL, 2006). Na dimensão do Pacto de Gestão são abordadas as seguintes diretrizes: Descentralização; Regionalização; Financiamento; Planejamento; Programação Pactuada e Integrada – PPI; Regulação; Participação e Controle Social; Gestão do Trabalho e Educação na Saúde (BRASIL, 2006). Cabe destacar que no Pacto de Gestão do SUS é reafirmada a importância da participação da comunidade na maneira de gerir o sistema. As decisões sobre a saúde não devem mais estar centralizadas na “mão” dos gestores. Para que a participação da comunidade tenha melhores condições de atuação, o Pacto propõe um conjunto de ações e reconhece o dever dos gestores de destinar orçamento, cooperando técnica e financeiramente para sua qualificação (CEAP, 2009, p. 14). Assim, acredita-se que o Pacto pela Saúde, considerando as suas três dimensões, representa mais uma luta no sentido de reafirmar a saúde como um direito de todos e dever do Estado; buscando garantir as conquistas do SUS até o momento. REDES DE ATENÇÃO À SAÚDE Com base em tudo que já foi explanado até aqui, ainda observa-se na gestão desaúde a presença de sistemas hierarquizados, fragmentados e medicalizados, o que não atende adequadamente às demandas de saúde da população. Nesse Redes de Atenção à Saúde Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 61 sentido, o SUS propõe a estratégia de Redes de Atenção em Saúde (RAS), a fim de operacionalizar todos os seus princípios, especialmente o da integralidade no cuidado à saúde. De acordo com Eugênio Vilaça Mendes, as RAS significam: [...] uma nova forma de organizar o sistema de atenção à saúde em sis- temas integrados que permitam responder, com efetividade, eficiência, segurança, qualidade e equidade, às condições de saúde da população brasileira (MENDES, 2011, p.18). A discussão sobre as RAS já é de longa data em países como Estados Unidos e Canadá. No Brasil, o tema vem sendo abordado a partir do final dos anos 90 e, mesmo recente, já é possível vislumbrar avanços decorrentes desse modelo de atenção, como é o caso do Programa Mãe Paranaense, Rede Cegonha, Rede de Atenção à Urgência e Emergência, entre outras (BRASIL, 2012). Nesse momento, você pode estar se perguntando: afinal como se organiza uma RAS? De acordo com a World Health Organization, os serviços que dependem de menor aporte tecnológico, a exemplo da atenção primária à saúde, devem apresentar-se dispersos; ao contrário, os serviços mais complexos, como hospi- tais e unidades diagnósticas, tendem a estar mais concentrados (WHO, 2000). A organização das RASs, para ser feita de forma efetiva, eficiente e com qualidade, tem de estruturar-se com base nos seguintes fundamentos: economia de escala, disponibilidade de recursos, qualidade e acesso; integração horizontal e vertical; processos de substituição; territórios sanitários; e níveis de atenção (MENDES, 2011, p. 71). Curitiba implantou o Programa Mãe Curitibana em 1999, sendo um exem- plo de rede de atenção voltada à saúde materno-infantil que apresenta re- sultados positivos na assistência à saúde com queda nas taxas de mortalida- de infantil e aumento dos índices de aleitamento materno Fonte: Mendes (2011). HISTÓRIA DA SAÚDE PÚBLICA NO BRASIL Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. IIU N I D A D E62 Cabe aqui discutir brevemente sobre os níveis de complexidade. Erroneamente, a população, bem como gestores e profissionais da saúde, muitas vezes, pos- suem uma visão distorcida sobre o assunto, supervalorizando os níveis terciário e secundário em detrimento do nível primário. A atenção primária não é menos complexa que os outros níveis. Na verdade, é ela que pode resolver em torno de 85% dos problemas de saúde da população, ofertando serviços de alta complexidade, como, por exemplo, as atividades gru- pais, as quais buscam a promoção e reabilitação da saúde e prevenção de doenças. Os níveis secundário e terciário constituem-se pela necessidade de tecnologia, mas não são mais complexos (MENDES, 2011). Assim, a noção hierárquica e piramidal deve ser substituída pelas redes, as quais permitem relações horizontais, possuindo como centro de comuni- cação a atenção primária à saúde, como pode ser ilustrado pela figura a seguir (MENDES, 2011). Figura 2 - Dos sistemas Fragmentados para as Redes de Atenção à Saúde Fonte: Mendes (2011). Redes de Atenção à Saúde Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 63 São três os elementos que constituem as RAS: uma população, uma estrutura operacional e um modelo de atenção à saúde. A presença de uma população é a razão de ser da RAS. Esta precisa ser devidamente conhecida (condições de saúde, fatores de riscos), registrada e cadastrada em sistemas de informação. O segundo elemento é a estrutura operacional, a qual é constituída pela atenção primária à saúde; os pontos de atenção à saúde secundários e terciários; os siste- mas de apoio; os sistemas logísticos; e o sistema de governança (MENDES, 2011). Em relação ao terceiro elemento, que é o modelo de atenção, este pode ser definido como: [...] um sistema lógico que organiza o funcionamento das RASs, ar- ticulando, de forma singular, as relações entre a população e suas subpopulações estratificadas por riscos, os focos das intervenções do sistema de atenção à saúde e os diferentes tipos de intervenções sanitárias, definido em função da visão prevalecente da saúde, das si- tuações demográfica e epidemiológica e dos determinantes sociais da saúde, vigentes em determinado tempo e em determinada sociedade (MENDES, 2011, p. 209). São muitos os desafios a serem superados para a implementação das RAS, os quais vão desde o financiamento, orientação dos serviços com base nas neces- sidades sanitárias da população, bem como a valorização da atenção primária à saúde por parte de todos (BRASIL, 2012). De acordo com o Ministério da Saúde, outros entraves ainda podem ser elencados: falha na cultura e na prática de trabalho em rede; pactos com foco maior na captação de recurso do que em intervenções nas práticas assistenciais; ineficiente capacitação e qualificação profissional; restrito monitoramento e avaliação dos resultados por meio de sistema de informações de alta qualidade (BRASIL, 2014). Diante do exposto, percebe-se que, para a efetiva implementação das RAS, faz-se necessário o esforço de todos: gestores (em todas as esferas do governo), profissionais da saúde e população em geral. HISTÓRIA DA SAÚDE PÚBLICA NO BRASIL Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. IIU N I D A D E64 CONSIDERAÇÕES FINAIS Nesta unidade, conseguimos relembrar alguns marcos importantes da história do Brasil, além de rever alguns elementos marcantes da economia, da política e da sociedade de forma geral ao longo de cada época. Entendemos que a história das políticas públicas de saúde no nosso país sem- pre esteve atrelada ao contexto histórico e social do momento em que ocorreu e, por isso, foi necessário voltarmos no tempo e vermos tudo o que aconteceu no decorrer dos anos. Compreendemos o cenário em que se deu a criação de um dos maiores siste- mas públicos de saúde do mundo, o Sistema Único de Saúde (SUS), um momento marcante em nosso país, de despertar democrático, de lutas e de muitas con- quistas. Conhecemos seu processo de construção, seus principais objetivos e princípios doutrinários e organizativos. Observamos que, para a operacionalização do SUS, foram necessárias algu- mas pactuações entre os gestores das esferas governamentais. Assim, estudamos o Pacto pela Saúde e as três dimensões que ele englobou: Pacto pela Vida; em Defesa do SUS; e de Gestão. Discutimos sobre a necessidade de mudança de um modelo de assistência à saúde hierarquizado e fragmentado para uma assistência em rede. Nesse sentido, abordamos sobre as Redes de Atenção à Saúde (RAS), seus conceitos, elemen- tos que a compõem e sua forma de organização, acreditando que as RAS, por permitirem relações horizontais, tendo como centro a atenção primária, podem contribuir para a integralidade no cuidado à saúde - um dos princípios do SUS. Assim, terminamos a nossa viagem no tempo! Espero que você possa ter compreendido, melhor e um pouco mais, sobre o nosso sistema público de saúde, seus avanços e desafios. Muitos desafios ainda temos pela frente, quando trabalhamos no contexto do SUS, e você fará parte dele como profissional da área da saúde, ajudando a construir um pouco mais na história do SUS. Bons estudos! E continue... 65 Leia um trecho do artigo de Eugênio Vilaça Mendes, publicado em 2013, cujo título é “25 anos do Sistema Único de Saúde: resultados e desafios” e reflita sobre “a mudança nas condições de saúde da população brasileira ao longo da história, bem como nos desa- fios a serem encarados pelo Sistema Único de Saúde nos dias atuais”.O SUS constituiu a maior política de inclusão social da história de nosso país. Antes do SUS, vigia um Tratado das Tordesilhas da saúde, o qual separava quem portava a cartei- rinha do Inamps e que tinha acesso a uma assistência curativa razoável - das grandes maiorias que eram atendidas por uma medicina simplificada na atenção primária à saú- de e como indigentes na atenção hospitalar. O SUS rompeu essa divisão iníqua e fez da saúde um direito de todos e um dever do Estado. A instituição da cidadania sanitária pelo SUS incorporou, imediatamente, mais de cinquenta milhões de brasileiros como portadores de direitos à saúde e fez desaparecer, definitivamente, a figura odiosa do indigente sanitário. O SUS apresenta números impressionantes: quase seis mil hospitais e mais de sessenta mil ambulatórios contratados, os quais somam, por ano, mais de dois bilhões de pro- cedimentos ambulatoriais, mais de onze milhões de internações hospitalares, aproxi- madamente dez milhões de procedimentos de quimioterapia e radioterapia, mais de duzentas mil cirurgias cardíacas e mais de 150 mil vacinas. O SUS pratica programas que são referência internacional, mesmo considerando os países desenvolvidos, como o Sistema Nacional de Imunizações, o Programa de Controle de HIV/Aids e o Sistema Nacional de Transplantes de Órgãos que tem a maior produção mundial de transplantes realizados em sistemas públicos de saúde do mundo, 24 mil em 2012. O programa bra- sileiro de atenção primária à saúde tem sido considerado, por sua extensão e cobertura, um paradigma a ser seguido por outros países. Com esses processos, o SUS tem contri- buído significativamente para a melhoria dos níveis sanitários dos brasileiros. Entre 2000 e 2010, a taxa de mortalidade infantil caiu 40%, tendo baixado de 26,6 para 16,2 óbitos em menores de um ano por mil nascidos vivos. Não obstante a exuberância dos números, o nosso sistema público de saúde permanece com muitos problemas a solucionar. No meu entendimento, há três grandes desafios para o SUS: a organização macroeconômica do sistema de saúde no Brasil, a organização microeconômica expressa no modelo de atenção à saúde que prática e o financiamento. Fonte: adaptado de Mendes (2013, p. 27-34). 66 1. No início do século XX, o Rio de Janeiro se deparou com a epidemia da febre amarela e varíola, doenças que fizeram milhares de vítimas. Nesse período, a obrigatoriedade da vacina contra a varíola e a remodelação da região portuária e do centro da cidade geraram descontentamento na população. Considerando esse contexto histórico, assinale a alternativa correta. a. O alargamento das ruas da área central contribuiu para um ambiente mais arejado, com vistas a reduzir os casos de febre amarela, que é uma doença transmitida pelo ar. b. A população pobre se revoltou, pois tinha consciência da necessidade da va- cina para a erradicação da varíola. c. A reforma não aconteceu apenas nas regiões dos portos e área central, mas também nas moradias populares e cortiços, a fim de eliminar os focos de transmissão das doenças. d. A Revolta da vacina ocorreu no governo de Rodrigues Alves em um contexto de reurbanização do centro do Rio de Janeiro e da necessidade de saneamen- to básico. e. A insatisfação da população não estava relacionada com a modernização ur- bana autoritária, e sim com as péssimas condições sanitárias. 2. Sobre os princípios doutrinários e organizacionais do Sistema Único de Saúde (SUS), analise as afirmativas abaixo. I. O princípio da equidade no SUS tem seu maior foco na atenção primária à saúde, por ser esse um serviço de menor complexidade e baixo custo. II. A integralidade da assistência à saúde refere-se a um conjunto de ações e ser- viços voltados para a promoção, prevenção e reabilitação, individuais e coleti- vos, em todos os níveis de complexidade. III. São princípios organizacionais: Regionalização, Hierarquização, Resolubilida- de, Descentralização e Participação comunitária. IV. A valorização da população em questões decisórias sobre a saúde e a forma- ção dos Conselhos de Saúde dizem respeito ao princípio de Participação co- munitária. Assinale a alternativa correta. a. Apenas I e II estão corretas. b. Apenas II e III estão corretas. c. Apenas I está correta. d. Apenas II, III e IV estão corretas. e. Nenhuma das alternativas está correta. 67 3. Sobre os principais objetivos do Sistema Único de Saúde, assinale a alternativa correta. a. Formulação de políticas de saúde destinadas à ações curativas, especialmen- te nas áreas de endemia. b. Assistência às pessoas por intermédio de ações de promoção, proteção e re- cuperação da saúde, com realização integrada das ações assistenciais e das atividades preventivas. c. Promover ações de alta complexidade nas regiões de maior vulnerabilidade social. d. Assistência às pessoas, com base nas diretrizes do sistema privado. e. Identificar, em cada região, os fatores determinantes das doenças, conside- rando o processo patológico o foco para a prestação da assistência à saúde. 5. O Pacto pela Saúde, firmado em 2006, refere-se ao compromisso assumido en- tre as três esferas de gestão (União, Estados e Municípios), com o objetivo de estabelecer ajustes e promover inovações no processo de gestão, para, assim, atender com maior qualidade às demandas do SUS. Explique o que foi o Pacto pela Vida. 6. Um sistema de saúde hierarquizado, “estilo piramidal”, não consegue suprir as demandas de saúde da população. É nesse sentido que surgem discussões sobre as Redes de Atenção à Saúde (RAS). Explique o que são as RAS e como elas se organizam. MATERIAL COMPLEMENTAR Caminhos da Saúde Pública no Brasil Jacobo Finkelman Editora: FIOCRUZ Sinopse: o livro traz a evolução das políticas públicas de saúde, contextualizando com a história do Brasil. Destaca os principais acontecimentos que contribuíram para o desenvolvimento de ações e programas voltados para a melhoria da saúde do povo brasileiro. História da saúde pública no Brasil Cláudio Bertolli Filho Editora: Ática Sinopse: o livro apresenta a história da saúde pública no Brasil, suscitando que o leitor faça uma re� exão sobre a relação da saúde com as políticas sociais de cada período. SICKO - SOS Saúde. o documentário descreve o sistema de saúde americano e o compara com o de outros países, como Cuba, Canadá, França e Inglaterra. Apesar de não mostrar o sistema de saúde do Brasil - o SUS - é possível compará-lo com relação ao que é apresentado no fi lme. REFERÊNCIAS 69 ANDRADE, L. O. M.; PONTES, R. J. S.; JUNIOR, T. M. A descentralização no marco da reforma sanitária no Brasil. Rev. Panam. Salud. Publica, Washington, v. 8 n. 1-2, jul./ aug. 2000. ANDRADE, S. M.; SOARES, D. A.; JUNIOR, L. C. Bases da saúde coletiva. Londrina: Ed. UEL, 2001. BAPTISTA, T. W. F. Políticas de Saúde no Pós-Constituinte: um estudo da política implementada a partir da produção normativa dos poderes executivo e legislativo no Brasil. 2003. Tese de Doutorado. Rio de Janeiro: IMS/Uerj, 2003. BARATA, L. R. B.; TANAKA, O. Y.; MENDES, J. D. V. Por um processo de descentralização que consolide os princípios do Sistema Único de Saúde. Epidemiol. Serv. 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GABARITOGABARITO 1. D. 2. D. 3. B. 4. O Pacto pela Vida refere-se a um dos pactos que compõe o Pacto pela Saúde, sendo os outros dois: em Defesa do SUS e de Gestão do SUS. O Pacto pela Vida foi constituído a partir da análise da situação de saúde do país e das necessi- dades prioritárias que geram impacto na saúde da população brasileira. São seis as prioridades pactuadas: Saúde do Idoso; Controle do câncer do colo do útero e da mama; Redução da mortalidade infantil e materna; Fortalecimento da capacidade de resposta às doenças emergentes e endemias, com ênfase na dengue, hanseníase, tuberculose, malária e influenza; Promoção da Saúde; e Fortalecimento da Atenção Básica. 5. As RAS são sistemas organizativos de ações e serviços de saúde que se articu- lam, atendendo diferentes níveis de complexidade e necessidades tecnológicas que, de forma integrada, permitem atender, com qualidade, a saúde da popula- ção brasileira. A noção hierárquica e piramidal deve ser substituída pelas redes, as quais permitem relações horizontais e de interdependência entre os pontos da rede, possuindo como centro de comunicação a atenção primária à saúde. A organização das RASs estrutura-se com base nos seguintes fundamentos: eco- nomia de escala, disponibilidade de recursos, qualidade e acesso; integração horizontal e vertical; processos de substituição; territórios sanitários; e níveis de atenção. U N ID A D E III Professora Me. Raquel Gusmão Oliveira VIGILÂNCIA EM SAÚDE Objetivos de Aprendizagem ■ Compreender o conceito de vigilância em saúde e os principais sistemas de vigilância em saúde. ■ Conhecer o Sistema de Vigilância Epidemiológica. ■ Conhecer os sistemas de informação de interesse na saúde. ■ Apresentar os principais indicadores de saúde. ■ Discutir os desafios atuais da Vigilância em Saúde. Plano de Estudo A seguir, apresentam-se os tópicos que você estudará nesta unidade: ■ Vigilância em Saúde ■ Vigilância Epidemiológica ■ Sistema de Informação em Saúde ■ Indicadores de Saúde ■ Alguns desafios da Vigilância em Saúde INTRODUÇÃO Temos visto que a saúde e o cuidado à saúde têm sido uma grande preocupação de toda a humanidade ao longo da história e dos tempos, a busca da compreen- são do fenômeno saúde e doença tem desafiado estudiosos no sentido de superar os desafios de ter uma sociedade mais saudável. No Brasil, a criação do Sistema Único de Saúde (SUS) é considerada um marco positivo no contexto da saúde em nosso país, buscando, por meio de prin- cípios e diretrizes, a organização de ações e serviços que efetivamente atendam às necessidades de saúde de todos os brasileiros. Recentemente, a criação das Redes de Atenção à Saúde contextualiza que a Vigilância em saúde deve ser organizada em forma de rede, como uma estraté- gia na organização dos serviços, na atenção e promoção à saúde, estabelecendo, assim, diretrizes e orientações aos profissionais de saúde, na busca de auxiliar na organização e operacionalização da rede de Vigilância. Nesse sentido, acreditamos que é fundamental aos profissionais de saúde compreenderem os principais conceitos e os diferentes sistemas que abrangem o Sistema de Vigilância brasileiro. Dentre os diversos Sistemas de Vigilância, destacamos, nesta unidade, o Sistema de Vigilância Epidemiológica, pois acreditamos que ele tem um amplo impacto nas ações dos profissionais de saúde. Também apresentaremos os principais sistemas de informações de interesse na saúde e os indicadores de saúde mais utilizados, considerando que, tanto um quanto outro são fundamentais para subsidiar a tomada de decisão no contexto dos serviços de saúde. Finalmente, buscamos discutir alguns desafios atuais da Vigilância em saúde, acreditando que tais desafios constituem espaços de crescimento e desenvolvi- mento para os profissionais da área da saúde. Então, vamos começar...Introdução Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 75 VIGILÂNCIA EM SAÚDE Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. IIIU N I D A D E76 VIGILÂNCIA EM SAÚDE A doença sempre esteve presente na história da humanidade, como, por exemplo, a peste, a varíola, a cólera e muitas outras que foram registradas ao longo dos tempos em diferen- tes contextos. Você já ouviu falar delas? E na atualidade? De Quais doenças você pode se lembrar? Dengue, zika, H1N1, etc. Essas doenças causam um grande impacto na saúde e na vida da população, sem falar em outros agravos que parecem atingir a socie- dade e prejudicar a vida das pessoas, como é o caso da violência. O que fazer para evitar que essas doen- ças se espalhem ou afetem negativamente a vida das pessoas? Como reconhecê-las ou, até mesmo, barrá-las? Que ações devem ser feitas? Nesse contexto, surge o termo “vigilância em saúde” que tem por objetivo a observação e análise permanente da situação de saúde da população, articu- lando-se em um conjunto de ações destinadas a controlar determinantes, riscos e danos à saúde de populações que vivem em determinados territórios, garan- tindo a integralidade da atenção - o que inclui tanto a abordagem individual como coletiva dos problemas de saúde (BRASIL, 2010). Vamos entender um pouco mais desse conceito. Quando falamos de Vigilância em saúde, três ações estão implícitas (BOCCATTO, 2012): - a observação da situação de saúde; - a análise dessa situação; - e o conjunto de ações destinadas a controlar os determinantes das doen- ças e dos agravos. A vigilância em saúde deve estar cotidianamente inserida em todos os níveis de Vigilância em Saúde Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 77 atenção da saúde. A partir de suas específicas ferramentas, as equipes de saúde da atenção primária podem desenvolver habilidades de programação e planeja- mento, de maneira a organizar os serviços com ações programadas de atenção à saúde das pessoas, aumentando o acesso da população a diferentes atividades e ações de saúde (BRASIL, 2010). Nesse sentido, o conceito de vigilância em saúde inclui: a vigilância e o controle das doenças transmissíveis; a vigilância das doenças e agravos não transmissíveis; a vigilância da situação de saúde, vigilância ambiental em saúde, vigilância da saúde do trabalhador e a vigilância sanitária (BRASIL, 2010). O quadro 1, a seguir, explica um pouco das particularidades de cada uma delas; mas, apesar das diferenças, Boccatto (2012) indica alguns princípios nor- teadores comuns, tais como: ■ A manutenção da qualidade na coleta de dados; ■ A consolidação desses dados em informações fidedignas; ■ A ampla disseminação dessas referidas informações a todos aqueles que as geraram e que delas necessitam tomar conhecimento, servindo de fer- ramenta para: → A elaboração de programas, a identificação de fatores de risco e a aplicação de medidas de controle. ■ A capacitação e o aprimoramento de pessoal; ■ A aquisição de equipamentos e tecnologias; ■ O desenvolvimento de produções científicas. Nesse sentido, vale destacar que, para a operacionalização da Vigilância em Saúde, é necessária a colaboração e a coparticipação de todos os gestores, técnicos, tra balhadores de todos os níveis e atores sociais, e a adaptação aos inovado- res modelos de gestão dos serviços públicos e privados, principalmente aqueles de cunho social, sem perder suas características inerentes (BOCATTO, 2012). Atualmente, o Decreto 7508 (2011) estabelece que a Vigilância em Saúde faz parte da rede regionalizada e hierarquizada de serviços junto com a Aten- ção Primária; urgência e emergência; atenção psicossocial; atenção ambula- torial especializada e hospitalar. A Portaria n° 104, de 25 de janeiro de 2011, do Ministério da Saúde, define as terminologias adotadas em legislação nacional, conforme o disposto no Regulamento Sanitário Internacional de 2005, a relação de doenças, agravos e eventos em saúde pública de notificação compulsória em todo o territó- rio nacional e estabelece fluxo, critérios, responsabilidades e atribuições aos profissionais e serviços de saúde. Fonte: adaptado de Brasil (2011). VIGILÂNCIA EM SAÚDE Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. IIIU N I D A D E78 Quadro 1 - Áreas de atuação da Vigilância em Saúde Vigilância Epidemiológica Realiza um conjunto de ações que proporcionam o conheci- mento, a detecção ou a prevenção de qualquer mudança nos fatores determinantes e condicionantes de saúde individual ou coletiva, com a finalidade de recomendar e adotar medi- das de prevenção e controle de doenças ou agravos. Trabalha com doenças sexualmente transmissíveis agudas e crônicas; doenças transmissíveis agudas; doenças transmissíveis crô- nicas; doenças imunopreveníveis; investigações e respostas a casos e surtos e epidemias; doenças emergentes; agravos inusitados; inclui, também, o Programa Nacional de Imuniza- ção (PNI), descentralizado aos municípios. Vigilância Am- biental Desencadeia um conjunto de atividades relativas às zoonoses e questões sanitárias ligadas ao meio ambiente e riscos à saú- de (água, ar e solo), com ações integradas com as subprefei- turas e outras secretarias, devendo participar na formulação da política e na execução de ações de saneamento básico. Vigilância da Saúde do traba- lhador Desencadeia um conjunto de atividades que, por meio das ações de vigilância epidemiológica e vigilância sanitária, se destinam à promoção e à proteção à saúde dos trabalhado- res, assim como visa recuperação e reabilitação da saúde dos trabalhadores submetidos aos riscos e agravos advindos das condições de trabalho. “Doenças reemergentes” são doenças já conhecidas que haviam sido con- troladas, mas que voltaram a representar ameaça à saúde humana, registra- -se no Brasil a dengue, a cólera e a leishmaniose visceral. (Francisco Antônio Zancan Paz e Marilina Assunta Bercini) Vigilância Epidemiológica Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 79 Vigilância Sani- tária Realiza um conjunto de ações capaz de eliminar, diminuir ou prevenir riscos à saúde e de intervir nos problemas sanitários decorrentes do meio ambiente, da produção e circulação de bens e da prestação de serviços de interesse da saúde. Vigilância da Situação de Saúde Desenvolve ações de monitoramento contínuo do país/es- tado/região/município/território, por meio de estudos e análi- ses que revelem o comportamento dos principais indicadores de saúde, priorizando questões relevantes e contribuindo para um planejamento de saúde mais abrangente. Fonte: Boccatto (2012). VIGILÂNCIA EPIDEMIOLÓGICA Quando falamos em Vigilância epidemiológica, adotamos o conceito: [...] um conjunto de ações que proporcionam o conhecimento, a de- tecção ou a prevenção de qualquer mudança nos fatores determinantes e condicionantes de saúde individual ou coletiva, com a finalidade de recomendar e adotar medidas de prevenção e controle de doenças ou agravos (BOCCATTO, 2012). Vamos conhecer um pouco mais sobre a VIGILÂNCIA EPIDEMIOLÓGICA. O Sistema Nacional de Vigilância Epidemiológica (SNVE) foi criado no Brasil em 1975, junto ao Ministério da Saúde, abrangendo, exclusi- vamente, doenças infecciosas de notificação compulsória e agravos inusitados à saúde. Em 1990, implantou-se o sistema de vigilância de even- tos adversos pós vacinação e, a partir daí, outros sistemas de vigilância foram sendo incorporados, tais como a farmacovigilância, sistema VIGILÂNCIA EM SAÚDE Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. IIIUN I D A D E80 de informação de agravos de notificação, vigilância ambiental, vigilância de trau- mas e lesões, vigilância das doenças crônicas e vigilância global para respostas rápidas a doenças emergentes (WALDMAN, 2012). Vejamos um pouco a respeito delas: - Vigilância de doenças infecciosas: analisa o comportamento das doen- ças (imprevisível e impacto global), influenciada pelo comportamento humano. - Farmacovigilância: se aplica à identificação, análise, compreensão de even- tos adversos associados ao uso de medicamentos, com a finalidade de estabelecer as bases técnicas para a sua prevenção (medicamentos, vacinas, hemoderivados, produtos biológicos, plantas medicinais, medicina tradicional e complementar e equipamentos médicos). - Vigilância ambiental: coleta, analisa e dissemina informações sobre expo- sições ambientais potencialmente de risco e desfechos, estabelece associação entre os desfechos e especificas exposições ambientais potencialmente de risco. - Vigilância de traumas e lesões: monitora a incidência, causas e circuns- tâncias em que ocorrem casos fatais e não fatais, intencionais e não intencionais - classificação internacional de doenças por causas externas (um dos maiores e relevantes problemas de saúde pública - 10ª causa de morte no mundo). - Vigilância de doenças crônicas: o sistema de vigilância de fatores de risco e proteção para doenças crônicas por inquérito telefônico (VIGITEL) faz parte das ações do Ministério da Saúde para estruturar a vigilância de doenças crôni- cas não transmissíveis (DCNT) no país. - Vigilância global para respostas rápidas às doenças emergentes: em resposta à rápida urbanização, consumo de alimentos industrializados, novas técnicas de criação intensiva de animais, uso inadequado de antibióticos, alte- rações ambientais, correntes migratórias e intercâmbio mundial e transportes de massa intercontinental, elaborou-se o Regulamento Sanitário Internacional com respostas a possíveis epidemias com rápida disseminação. Os diferentes sistemas de vigilância têm suas especificidades, no entanto, têm em comum os seguintes objetivos (WALDMAN, 2012): - Identificar novas doenças ou eventos adversos à saúde; - Detectar epidemias e documentar a disseminação de doenças; Vigilância Epidemiológica Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 81 - Estimar a magnitude da morbidade e da mortalidade causadas por deter- minados agravos; - Identificar grupos e fatores de risco envolvendo a ocorrência de doenças, assim como resíduos de fonte de infecção e de suscetíveis; - Recomendar, com base objetivas e científicas, as medidas necessárias para prevenir ou controlar a ocorrência de específicos agravos à saúde; - Avaliar o impacto de medidas de intervenção e a adequação das táticas e estratégias aplicadas; - Revisar práticas antigas e atuais de sistema de vigilância, com o objetivo de propor novos instrumentos metodológicos. A Vigilância Epidemiológica atualizou, em 2016, a lista nacional de notifica- ção compulsória referente a doenças, agravos e eventos de impor tância para a saúde pública, por meio da Portaria 204/2016. Essa lista tem abrangência nacional em toda a rede de saúde, pública e privada e, obrigatoriamente, as doen- ças devem ser regis tradas e notificadas no Sistema de Informação de Agravos de Notificação (SINAN), obedecendo às normas e rotinas estabelecidas pela Os termos doença, agravo e evento são muito utilizados no contexto da saú- de, você conhece o significado deles? • Doença: significa enfermidade ou estado clínico, independentemente de origem ou fonte, que repre sente ou possa representar um dano significativo para os seres humanos. • Agravo: significa qualquer dano à integridade física, mental e social dos indivíduos, provocado por cir cunstâncias nocivas, como acidentes, intoxica- ções, abuso de drogas e lesões auto ou heteroinfligidas. • Evento: significa manifestação de doença ou uma ocorrência que apresen- te potencial para causar do ença. Fonte: Brasil (2011). VIGILÂNCIA EM SAÚDE Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. IIIU N I D A D E82 Secretaria de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde (BOCCATTO, 2012). Quadro 2 - Lista Nacional de Notificação Compulsória NOTIFICAÇÃO IMEDIATA (< 24 HORAS) - Acidente de trabalho: Grave, fatal e em crianças e adolescentes - Acidente por animal peçonhento - Acidente por animal potencialmente transmissor da raiva - Botulismo - Cólera - Coqueluche - Dengue - óbitos - Difteria - Doença aguda pelo vírus Zika em gestantes - Doença de chagas aguda - Doença invasiva por: “haemophilus influenzae” - Doença meningocócica e outras meningites - Doenças com suspeita de dissemina- ção intencional: a. Antraz pneumônico b. Tularemia c. Varíola - Doenças Exantemáticas: a. Arenavírus b. Ebola c. Marburg - Eventos adversos graves ou óbitos pós-vacinação - Evento de saúde pública (ESP) que se constitua ameaça à saúde pública (ver definição no artigo 2º desta portaria) - Febre amarela - Febre de Chikungunya em áreas sem transmissão - Óbito com suspeita de febre de Chikungunya - Febre no Nilo ocidental e outras Arboviroses de importância em saúde pública - Febre Maculose e outras Riquetisioses - Febre Tifóide - Hantavírus - Influenza humana produzida por novo subtivo viral - Leptospirose - Malária na região Extra Amazônica - Poliomielite por poliovírus selvagem - Peste - Raiva humana - Síndrome da Rubéola Congênita - Síndrome da paralisia flácida aguda - Síndrome respiratória aguda grave associada a coronavírus a. Sars- Cov b. Mers- Cov - Tétano: a. Acidental b. Neonatal - Varicela - caso grave internado ou óbito - Violência sexual e tentativa de suicídio NOTIFICAÇÃO SEMANAL - Acidente de trabalho com exposição a material biológico - Dengue - Casos - Doença aguda causadas pelo vírus Zika - Doença de Creutzfeldt-jacob (DCJ) - Esquistossomose - Febre de Chikungunya - Hanseníase - Hepatites Virais - HIV/Aids - Infecção pelo vírus da imu- nodeficiência adquirida - Infecção pelo HIV em gestante, partu- riente ou puérpera e criança exposta ao risco de transmissão vertical do HIV - Infecção pelo vírus da imunodeficiên- cia humana (HIV) - Intoxicação exógena (por substâncias químicas, incluindo agrotóxicos, gases tóxicos e metais pesados - Leishmaniose Tegumentar Americana - Leishmaniose Visceral - Malária na região Amazônica - Óbito a. Infantil b. Materno - Sífilis a. Adquirida b. Congênita c. Em gestantes - Toxoplasmose gestacional e congênita - Tuberculose - Violência: Doméstica e/ou outras violências Fonte: Prefeitura do Rio - PORTARIA GM/MS 204/2016 (2016, on-line)1. A notificação compulsória, como o nome diz, é obrigatória a todos os profis- sionais de saúde: enfermeiros, médicos, odontólogos, mé dicos veterinários, biólogos, biomédicos, farmacêuticos e outros no exercício da profissão, bem como os responsáveis por organizações e estabelecimentos públicos e particu- lares de saúde e ensino. Sistema de Informação em Saúde Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 83 SISTEMA DE INFORMAÇÃO EM SAÚDE O aperfeiçoamento do Sistema de Vigilância em Saúde, na década de 90, acompanhou o desenvolvimento das tecnologias de informática em nosso país, tornando possível o acesso ágil a bases de dados com informações variadas e desagregadas sobre diversos registros, sendo esses dados utilizados em pesquisas científicas, avaliação e planejamento dos serviços de saúde e no ensino. A informação na saúde é impres- cindível para que se tomem as decisões corretas para melhorar o nível de saúde de uma determinada população. Nesse sentido, surgem os sistemas de informação em saúde, definidos, por Medronho (2008), como um conjuntode componentes que atuam integrada e articulada- mente e que tem como propósito obter e selecionar dados e transformá-los em informação, esta, entendida como necessária para o processo de decisão, próprio das organizações e indivíduos que planejam, financiam, administram, provém, medem e avaliam os serviços de saúde. GUIA DE VIGILÂNCIA EM SAÚDE O Guia de Vigilância em Saúde dissemina procedimentos de fluxos, prazos, instrumentos, definições de casos suspeitos e confirmados, funcionamen- to dos sistemas de informação em saúde, condutas, medidas de controle e demais diretrizes técnicas para operacionalização do Sistema Nacional de Vigilância em Saúde. Fonte: Brasil (2016). VIGILÂNCIA EM SAÚDE Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. IIIU N I D A D E84 Tais sistemas devem ter como característica: serem articulados nos três níveis de gestão - sistemas municipais, estadu- ais e federais; ■ serem utilizados por todos os envolvidos no planejamento, gestão e ava- liação dos serviços de saúde; ■ utilizar a informação como meio para melhorar o nível de saúde das populações, e ■ disponibilizar aos usuários dos serviços, as informações obtidas. A operacionalização dos sistemas de saúde deve ser sistematizadas e organi- zadas; os procedimentos de coleta devem estar normatizados; os manuais de operação devem prever todas as situações; as pessoas responsáveis devem conhe- cer a importância do que fazem e deve haver supervisão e assessoria adequada. Nesse sentido, o processo dos sistemas de informação em saúde são orga- nizados nas seguintes etapas: Figura 1 - Etapas de organização do processo dos sistemas de informação em saúde Fonte: o autor. Os dados coletados são armazenados em um banco de dados, em que ocorre o registro e onde é possível fazer a sua recuperação para que possam ser pro- cessados, analisados e, assim, gerar informações para a tomada de decisão e o controle de ações. Sistema de Informação em Saúde Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 85 Existem inúmeros sistemas de informações, mas queremos destacar os sistemas de informação de interesse à saúde e os Sistemas Nacionais de Informação em Saúde. Dentre os sistemas de interesse à saúde, podemos relacionar, entre outros: - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), que tem atri- buições ligadas às geociências e estatísticas sociais, demográficas e econômicas, o que inclui realizar censos e organizar as informa- ções obtidas nesses censos para suprir órgãos das esferas governa- mentais federal, estadual e municipal, e para outras instituições e o público em geral (BRASIL - IBGE, 2017, on-line)2. - Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (PNAD) que obtém informações anuais sobre características demográficas e socioe- conômicas da população, como sexo, idade, educação, trabalho e rendimento, características dos domicílios e, com periodicidade variável, informações sobre migração, fecundidade, nupcialidade, entre outras, tendo como unidade de coleta os domicílios. Temas específicos abrangendo aspectos demográficos, sociais e econômi- cos também são investigados (BRASIL - IBGE, 2017, on-line)2. - Ao Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), que é uma fundação pública federal, vinculada ao Ministério do Planejamen- to, Desenvolvimento e Gestão, o qual realiza pesquisas que forne- cem suporte técnico e institucional às ações governamentais para a formulação e reformulação de políticas públicas e programas de desenvolvimento brasileiros (BRASIL - IPEA, [2017], on-line)3. Dados - é a matéria prima da informação, ou seja, são valores ainda não trabalhados. Indicadores - quantificação da realidade, permitem comparar níveis de saú- de entre diferentes populações, ao longo do tempo, derivam dos dados e geram informações. Informações - tradução dos dados após eles serem trabalhados, de forma a permitir alterar o conhecimento de outras pessoas, descreve uma situação real associada a um referencial explicativo. Fonte: Cordoni Jr (2001). VIGILÂNCIA EM SAÚDE Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. IIIU N I D A D E86 O departamento de Informática do Sistema Único de Saúde (DATASUS), criado em 1991, organiza o Sistema Nacional de Informação, dando suporte aos órgãos do SUS no processo de planejamento, operação e controle. O quadro a seguir sintetiza os principais Sistemas de Informação: Sistema de informação de mortalidade (SIM), Sistema Nacional de nascidos vivos (SINASC), Sistema Nacional de notificação (SINAN), Sistema de Informação hospitalar (SIH) e Sistema de informação ambulatorial (SIA), bem como os dados referen- ciais, forma de coleta, sua origem e algumas observações. Quadro 3 - Características dos principais sistemas de informação em saúde SISTEMA REFERENCIA FORMA DE DADOS ORIGEM OBS. SIM Óbitos Declaração de óbito (DO) Hospi- tais Médicos IML (1975)- DO- causa básica base- ado no Código Internacional de Doenças CID 10 (2007). 1990- implantou DO na Secreta- ria de estado de saúde em 3 vias (1 Serviço de saúde- 1 cartório- 1 unidade notificadora). Indicadores: mortalidade pro- porcional por causa, faixa etária, taxa geral, causas específicas, mortalidade infantil, mortalidade materna. SINASC Nascidos vivos Declaração de nasci- dos vivos (DNV) Hospi- tais Cartó- rios 3 vias DNV (branca, serviço de saúde; amarela, cartório; e rosa, unidade de saúde. Indicadores: taxa bruta de fe- cundidade e natalidade, taxa de mortalidade infantil e materna, proporção de mães adolescentes e partos cesáreos. Sistema de Informação em Saúde Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 87 SISTEMA REFERENCIA FORMA DE DADOS ORIGEM OBS. SINAN Agravos notificáveis Fichas de notificação e investiga- ção UBS, hos- pitais, clínicas, ambula- tórios e consul- tórios (1990-1993) Doenças de noti- ficação obrigatória, incidência, prevalência e letalidade, áreas de risco, tendência dos agravos. Per- fil epidemiológico dos agravos. Lista de doenças de notificação obrigatória, estados e municípios podem acrescentar na lista. Doenças crônicas transmissíveis (AIDS, esquistossomose, hansení- ase e tuberculose) e não trans- missíveis (desnutrição grave), agudas transmissíveis (cólera, dengue e imunoprevenível) e não transmissíveis (acidentes com animais peçonhentos e into- xicações por agrotóxico). Ficha individual de notificação (suspeita clínica) e de investiga- ção (serviço de VE). SIH Informação hospitalar Autori- zação de internação hospitalar (AIH) Hos- pitais conve- niados ao SUS (1990) AIH preenchida para toda internação do SUS - 90% das internações, reembolso realizado pelo mecanismo de pagamento fixo por procedimento realizado. Indicadores - tempo médio de permanência geral ou específica, valor médio da internação, pro- porção de internação por causa ou procedimento, mortalidade hospitalar geral ou causa ou procedimento. SIA Informação ambulatorial Boletim de produção de serviços ambulato- riais (BPA) Serviços ambu- latoriais cadas- trados pelo SUS Não verifica morbidade e sim procedimentos, auxiliando no controle, auditoria, avaliação e planejamento. Fonte: adaptado de Cordoni JR (2001). VIGILÂNCIA EM SAÚDE Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. IIIU N I D A D E88 Além desses bancos de dados, podemos destacar: ■ SISVAN - Sistema de Vigilância Alimentar e Nutricional de crianças e gestantes; ■ SIAB - Sistema de Informação da Atenção Básica -, consolida dados da população adscrita nos Programa de Saúde da Família; ■ SISCAT - Sistema de Informação Sobre Acidentes de Trabalho -, acidente no local ou no trajeto ou adoecem devido ao trabalho(CAT); ■ SI-PNI- Sistema de Informação do Programa Nacional de Imunização - avalia a cobertura das diferentes vacinas em todos os municípios brasileiros. Existe uma grande necessidade de ampliar a utilização de dados produzidos pelos sistemas de informação, no sentido de subsidiar a tomada de decisão de gestores e ações dos profissionais de saúde, acreditando que as informações, se adequadamente utilizadas, podem contribuir para a redução de desigualdades e melhoria das ações de saúde em nosso país. É de responsabilidade de todo profissional zelar pela qualidade da informação prestada em seus atendimentos, orientar a equipe na coleta, no processamento, na tomada de decisão e no controle dos dados produzidos. A publicação de documentos com os indicadores brasileiros tem como ob- jetivo subsidiar, com informações relevantes, os processos de formulação, estruturação e avaliação de políticas e ações públicas de importantes estra- tégias para o sistema de saúde. (Ministério da Saúde) Indicadores de Saúde Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 89 INDICADORES DE SAÚDE Como você já viu no Tópico 3, os Indicadores são a quantificação da realidade, permitem comparar níveis de saúde entre diferentes populações ao longo do tempo, os quais derivam dos dados e geram informações de saúde. Em uma linguagem mais técnica, eles são descritos como medidas de razões (frequências relativas) em forma de proporções (fatia do total de casos ou morte), coeficientes/taxas (risco do evento ocorrer) ou índice (não expressa risco), sintetizando o efeito de determinantes de natureza variada sobre o estado de saúde de uma população. Os indicadores têm como objetivo prover dados necessários ao planeja- mento e avaliação dos serviços; identificar os fatores determinantes das doenças e permitir sua prevenção; avaliar os métodos usados no controle das doenças; descrever as histórias das doenças e classificá-las; colocar à disposição do homem conhecimento e tecnologia que possam promover a saúde individual por meio de medidas de alcance coletivo (CORDONI JR, 2001). Para que sejam considerados um bom indicador, algumas características são necessárias, tais como: ■ o dado tem que estar disponível; ■ a técnica de manejo e entendimento deve ser simples; ■ deve ser uniforme; ■ ter a capacidade de ser sintético; ■ ter poder discriminatório. VIGILÂNCIA EM SAÚDE Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. IIIU N I D A D E90 Quanto à natureza dos indicadores, eles podem ser positivos ou negativos. Os indicadores positivos de saúde são os índices de vida, ou seja, as condi- ções demográficas, alimentação e nutrição, educação, alfabetização, condições de trabalho, situação de emprego, transporte, consumo e economias gerais, habi- tações e condições de moradia com inclusão de saneamento básico, vestuário, lazer, segurança social e liberdade humana. No entanto, esses dados são mais difíceis de mensurar. Os indicadores positivos mais utilizados na saúde são a taxa de natalidade, a taxa de fecundidade e a esperança de vida ao nascer. Já os indicadores negativos quantificam e descrevem a ocorrência de determinados agravos à saúde, doença e morte, para conhecer quantos adoecem e quantos morrem. Quando queremos saber quantos adoecem (morbidade), ou seja, como se dá a manifestação de doença nas populações, a epidemiologia utiliza duas medi- das principais - a prevalência e a incidência. A incidência considera os casos novos das doenças ou ocorridos recente- mente em determinada região, já a prevalência refere-se ao total de casos de uma região (novos e antigos), contados em um tempo limitado. Ambas são calculadas em termos de coeficientes, que determina o risco do evento ocorrer e auxilia na comparação entre regiões, seguindo a fórmula: Vale ressaltar que existem outros fatores que podem aumentar a prevalência dos casos, tais como a melhora na detecção de novos casos (aprimoramento diagnós- tico), a maior duração da doença e aumento da sobrevida (melhora no tratamento, como o caso da AIDs), a imigração dos casos e emigração dos sadios; mas, por outro lado, alguns fatores podem diminuir a prevalência, como o aumento da letalidade, diminuição de incidência e o impacto das políticas públicas e emi- gração de casos e imigração de sadios (MENEGUEL, 2015). Coeficiente de Prevalência C.I = nº casos conhecidos de uma doença X 1000 Coeficiente de Incidência C.I = nº casos novos da doença X 1000________________________________ ________________________________________ população sob risco população Indicadores de Saúde Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 91 Outro coefi ciente que se calcula a partir do número de casos de uma doença é a letalidade (CL), expressa pela fórmula a seguir, que mede o risco de uma pessoa morrer quando acometida por uma doença, ou seja, a gravidade de uma doença ou agravo. Quando queremos saber quantas pessoas morreram por determinada causa, utilizamos indicadores de mortalidade proporcional (MP) e coefi cientes de mor- talidade (geral, mortalidade infantil, mortalidade segundo causas, mortalidade materna, mortalidade por grupo etário). O coefi ciente geral de mortalidade (CGM) calcula o risco de óbito em uma comunidade, podendo ser possível relacionar o nível de saúde de diferentes áreas, no tempo. O CGM, em uma população, fi ca em torno de 6-12 óbitos/1000 hab, se o cálculo fi ca abaixo disso indica pouca fi dedignidade dos dados. A fórmula para o cálculo é: Também é possível fazer o cálculo de mortalidade proporcional dentro de um grupo determinado, tal como por grupos etários, sexo ou por causa de morte. Vejamos a seguir. MORTALIDADE PROPORCIONAL SEGUNDO GRUPO ETÁRIO Quando se calcula a mortalidade segundo os grupos etários, é possível obser- var a distribuição percentual dos óbitos por faixa etária na população residente VIGILÂNCIA EM SAÚDE Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. IIIU N I D A D E92 em determinado território no ano considerado. Ela é calculada com a seguinte expressão: Na análise da mortalidade do conjunto dos grupos etários, utiliza-se a CURVA DE NELSON DE MORAES, construída a partir da distribuição proporcional dos óbitos por grupos etários: menor de 1 ano; 1 a 4 anos; 5 a 19; 20 a 49 anos; e 50 anos ou mais, em que é possível observar 4 tipos de curvas. Figura 2 - Curva de Nelson de Moraes - mortalidade proporcional por idade em diferentes situações de saúde Fonte: Medronho (2008). Curva 1 - nível de saúde muito baixo: óbitos de adultos, jovens e meno- res de 1 ano. Curva 2 - nível de saúde baixo: óbito na faixa infantil e pré-escolar. Indicadores de Saúde Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 93 Curva 3 - nível de saúde regular: aumento da mortalidade de 50 anos e diminuição de óbitos infantis. Curva 4 - nível de saúde elevado: predomínio quase absoluto de óbitos de pessoas mais velhas. Outro índice de referência para análise da proporção de óbitos acima de 50 anos é o ÍNDICE DE SWAROOP E UEMURA, em que os altos valores estão relacionados a regiões mais desenvolvidas: maior de 75% - típico de países desen- volvidos; 50-74% - certo desenvolvimento e regular organização dos serviços de saúde; 25-49% - estágio atrasado de desenvolvimento; abaixo de 25% - alto grau de subdesenvolvimento. Calculado por meio da fórmula: Número de óbitos em 50 anos de idade ISU = x 100 Total de óbitos Outro coefi ciente muito utilizado é o de mortalidade infantil (CMI), que estima o risco de crianças nascidas vivas morrerem antes de 1 ano, em uma certa área e período,sendo sensível às condições de vida e de saúde, em que as altas taxas refl etem condições de vida e de saúde precárias. Considerado um dos melhores indicadores de saúde de uma população, sua fórmula é: Valores abaixo de 20 por mil nascidos vivos são considerados baixos e acima de 60 por mil são considerados altos. No Brasil, em 2014, o coefi ciente de mortalidade infantil foi calculado 14 para cada mil nascidos vivos, sendo que a queda foi de 77%, uma das mais sig- nifi cativas do mundo nesse período (MENEGUEL, 2015). VIGILÂNCIA EM SAÚDE Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. IIIU N I D A D E94 A mortalidade proporcional por causas de morte específicas auxilia a iden- tificação das principais causas de morte em uma certa localidade, é baseada na causa básica do óbito, registrado no atestado de óbito, sendo que pode ser uti- lizada no delineamento de prioridades na área de saúde. Seu cálculo é feito da seguinte forma: MPCM = N óbitos por grupo de causa x 100 N total de óbitos residentes Outro cálculo importante, possível de realizar, é o de Mortalidade por causas evitáveis, que são classificadas segundo a possibilidade de intervenção e existên- cia de tecnologia, independentemente dos procedimentos estarem disponíveis ou não: os redutíveis por imunoprevenção, o adequado controle da gravidez, a atenção ao parto, o diagnóstico e tratamento médico precoce. Dentre as causas evitáveis, se destaca o coeficiente de mortalidade materna As taxas de mortalidade infantil (TMI) podem ser subdivididas em neonatal ou precoce e pós neonatal ou tardio. • A mortalidade neonatal verifica óbitos de 0-27 dias, podendo ser, ain- da: • precoce: 0-6 dias - em que as causas estão relacionadas a proble- mas na gestação e ao parto. • tardia: 7-27 dias - causas relacionadas a anomalias e afecções. • A mortalidade pós neonatal ou infantil tardia acontece entre o 28- 364 dias e tem suas causas relacionadas ao meio ambiente, condições de vida e acesso aos serviços de saúde, nutrição, agentes infecciosos, gastroenterites, infecções respiratórias e desnutrição, em que a melho- ria no indicador está relacionada ao aumento de saneamento, do nível educacional materno e aumento da atenção à saúde da criança. • A mortalidade perinatal ou óbito fetal (CID 10) acontece entre 22a semana de gestação e a 1a semana de vida. Fonte: adaptado de Medronho et al. (2008). Alguns Desafios da Vigilância em Saúde Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 95 (CMM), que calcula o risco de óbito por causas ligadas à gestação, parto ou puer- pério (período de 42 dias após o parto). O CMM é um importante indicador da qualidade de assistência à gestação e ao parto. Quanto à mortalidade materna, considera-se morte obstétrica direta aquela que provém de complicações obstétricas, devido a intervenções, omissões e trata- mento incorreto. Já a morte obstétrica indireta ocorre quando resulta de doenças antes, desenvolvidas durante, ou agravadas pelo efeito da gravidez. Vale ressaltar que a validade das medidas de mortalidade segundo a causa depende da qualidade de informações registradas nas declarações de óbito e da cobertura do registro de óbitos; a proporção de óbitos por causa mal definidas é um indicador da qualidade de informações sobre a mortalidade. ALGUNS DESAFIOS DA VIGILÂNCIA EM SAÚDE As transformações ocorridas no campo da Saúde Pública, nos últimos anos, impulsionaram mudanças estru turais e a proposição de modelos inovadores de ges- tão, objetivando a melhoria da qualidade dos serviços e da assistência destinados à população, em sintonia com os princí- pios do Sistema Único de Saúde (SUS) (BOCCATTO, 2012). Mudanças ainda podem ser vistas; em 2011, o Decreto nº 7508 estabeleceu que Vigilância em Saúde é parte de uma rede regionalizada e hierarquizada de serviços, trabalhando junto com a Atenção Primária; urgência e emergência; atenção psicossocial; atenção ambulatorial especializada e hospitalar. VIGILÂNCIA EM SAÚDE Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. IIIU N I D A D E96 Contudo, nem tudo se resolve com um decreto, ainda mais quando se trata de seu campo de atuação, o qual é complexo, atuando em: 1. Ações diretas (coleta, consolidação, planejamento de programas de acordo com a prioridade e ações de controle e disseminação); 2. Capacitação de recursos humanos e suporte de recursos tecnológicos; 3. Divulgação para a sociedade. Vejamos três desafios que permeiam as vigilâncias e que precisam ser enfrenta- dos, considerando que existem muitos outros, destacamos os que seguem: 1. A tomada de decisão com base na informação Apesar dos avanços da tecnologia de informação e o imenso benefício dos siste- mas nacionais de informação na vigilância epidemiológica, ainda se faz necessário o aperfeiçoamento desses sistemas, bem como o relacionamento e compatibili- dade entre as bases de dados e o desenvolvimento de alguns sistemas específicos. Quando se desenvolve um sistema de vigilância implica-se o acesso à elevada gama de informações, especialmente as relativas à morbidade, à mortalidade, à estrutura demográfica, ao estado imunitário e nutricional da população, à situa- ção socioeconômica e ao saneamento ambiental, sendo que a saúde, atualmente, tem sido a porta de entrada para vários sistemas, tendo íntima relação com a situação social regional. Dessa forma, é necessário integrar todas as Unidades de Atendimento à Saúde – tam bém intersetorialmente e intersecretarialmente (SETA; REIS; DELAMARQUE, 2010). A utilização das informações para tomada da decisão requer que todo o processo de Vigilância, da coleta, consolidação, planejamento, controle e disse- minação de informações seja monitorado e conte com um sistema de informação consistente e integrado. Ainda existe uma grande necessidade de ampliar a utilização de dados produ- zidos pelos sistemas de informação, no sentido de subsidiar a tomada de decisão de gestores e ações dos profissionais de saúde, acreditando que as informações, se adequadamente utilizadas, podem contribuir para a redução de desigualda- des e melhoria das ações de saúde em nosso país. Alguns Desafios da Vigilância em Saúde Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 97 É de responsabilidade de todo profissional zelar pela qualidade da informação prestada em seus atendimentos, orientar a equipe na coleta, no processamento, na tomada de decisão e no controle dos dados produzidos. 2. Estruturação e qualificação das equipes A colaboração e a coparticipação de gestores, técnicos, tra balhadores de todos os níveis e atores sociais é essencial para o desenvolvimento do trabalho na Vigilância em saúde, bem como ter pessoal suficiente e com qualificação para o desenvolvi- mento das ações. Tal necessidade se dá devido à dinâmica do processo de trabalho da Vigilância, exigindo, também, educação permanente dos profissionais envol- vidos, que deve ser planejada de forma estratégica e integral, visando à melhoria da promoção da saúde, à prevenção das doenças, ao diagnóstico, ao tratamento e a medidas de controle, debelando surtos e epidemias e melhorando a qualidade de vida e de saúde da comunidade (BOCATTO, 2012). Nesse sentido, o profissional da saúde deve desenvolver uma dinâmica de aprendizagem e inovação, cujo primeiro passo deve ser a capacidade crescente de adaptação às mudanças, comprometimento, busca de trabalho integrado, saber propor e desenvolver projetos, bem como competência técnica e disciplina. 3. A pesquisa e a produção do conhecimento A cooperação entre serviços, universidades e institutos de pesquisa no desen- volvimento de pesquisas e na formação de recursos humanos para a vigilância em saúde constituium desafio. A pesquisa em saúde mobiliza muitos atores de origens diversas, com visões, interesses e linguagens distintas; nesse sentido, construir uma agenda de priorida- des para pesquisa na área de saúde é uma tarefa árdua, que pressupõe estabelecer consensos e compartilhar recursos; mas, por outro lado, um campo rico de pos- sibilidades, em que o profissional pode articular saberes, pessoas e instituições, buscando a melhoria do serviço e da qualidade de vida das pessoas. Ao pontuar esses desafios, queremos que estes sejam encarados de forma estratégica pelo gestor, no sentido de que estes possam ser encarados como novas VIGILÂNCIA EM SAÚDE Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. IIIU N I D A D E98 oportunidades, e que os momentos de crise podem e devem ser vistos como espa- ços de crescimento e desenvolvimento dos serviços e das pessoas. Você conhece o modelo atual das práticas em Vigilância adotado em seu município? Que desafios eles enfrentam? Quais as fragilidades dos sistemas de Vigilância de seu município? Faça um registro de suas reflexões! Considerações Finais Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 99 CONSIDERAÇÕES FINAIS A Vigilância em Saúde, como parte da Rede de Atenção à Saúde, está incluída no campo de ação do SUS, desenvolvendo uma série de ações e programas rele- vantes para a prevenção e controle de doenças e agravos, contribuindo para o trabalho do gestor no estabelecimento de prioridades, na alocação de recursos, nas orientações programá ticas, entre outras, em várias áreas do trabalho na saúde. Quando consideramos o contexto da atuação do profissional da saúde, é fundamental destacar, entre os diversos sistemas de vigilância, o contexto da Vigilância epidemiológica, pois ela sistematiza inúmeras ações com a finali- dade de subsidiar e proporcionar conhecimento, detectar ou a prevenir qualquer mudança nos fatores determinantes e condicionantes de saúde individual ou coletiva e, ainda, com a finalidade de recomendar e adotar medidas de preven- ção e controle de doenças ou agravos. Para que as ações propostas pela Vigilância sejam concretizadas, é necessário acesso a um elevado e complexo conjunto de informações: relativas à morbi- dade, mortalidade, situação socioeconômica e demográfica das pessoas, entre muitas outras. Dessa forma, o Ministério da Saúde conta com o Departamento de Informática do SUS (DATASUS). O DATASUS reúne diversos sistemas de informações, como diferentes infor- mações de saúde, com a finalidade fornecer dados aos gestores para que estes possam subsidiar a tomada de decisão. Entretanto, não basta apenas ter acesso aos dados, o profissional deve ser capaz de transformar os dados em informa- ções, bem como desenvolver uma dinâmica de aprendizagem e inovação, cujo primeiro passo deve ser a capacidade crescente de adaptação às mudanças, com- prometimento, busca de trabalho integrado, saber propor e desenvolver projetos. Essa tarefa é um grande desafio para todos os profissionais envolvidos no trabalho da Vigilância em Saúde! 100 Em 2006, os gestores do SUS assumiram o compromisso público da construção do Pacto pela Saúde 2006, com base nos princípios constitucionais do SUS e ênfase nas necessi- dades de saúde da população. O Pacto pela Saúde define prioridades articuladas e integradas em três componentes: Pacto pela Vida, Pacto em Defesa do SUS e Pacto de Gestão do SUS. O Pacto de Gestão estabelece as responsabilidades de cada ente federado, de forma a tornar mais claro quem deve fazer o quê, contribuindo, assim, para o fortalecimento da gestão compartilhada e solidária do SUS. Propõe, ainda, avançar na regionalização e descentralização do SUS, respeitando as especificidades regionais. O Pacto de Gestão pressupõe: • Assumir de maneira efetiva as responsabilidades sanitárias a inerente a cada es- fera de gestão; • Reforçar a territorialização da saúde como base para a organização dos sistemas, estruturando as regiões sanitárias; • Instituir colegiados de gestão regional; • Buscar critérios de alocação equitativa dos recursos financeiros; • Reforçar os mecanismos de transferência fundo a fundo entre gestores. Os gestores estaduais e municipais, ao definirem a aplicação dos recursos, devem consi- derar as ações relacionadas à Vigilância em Saúde que estão destacadas como priorida- des no Pacto pela Saúde. A Portaria n° 399/GM/MS, de 22 de fevereiro de 2006, e os termos de compromisso de gestão estabelecem que os municípios assumam a responsabilidade pela gestão e exe- cução das ações básicas “não compartilhadas” de vigilância em saúde e que as ativida- des compartilhadas devem ser pactuadas entre os municípios e o Estado na Comissão Intergestores Bipartite, considerando o desenho de regionalização, a rede de serviços e as tecnologias disponíveis e o desenvolvimento racionalizado de ações mais complexas. Também estabelece a caracterização de uma região de saúde, delimitada espacialmente de acordo com critérios previamente pactuados, inclui a análise das necessidades da população por ações de saúde, recursos existentes e capacidade instalada de serviços responsáveis por elas. As características ligadas ao grau e à forma de urbanização; dife- renciais socioeconômicos e culturais, bem como ambientais, entre outras, interferem no risco de ocorrência de várias doenças ou agravos. Exemplo disso é a relação observada entre a ocorrência de dengue e o grau de urbaniza- ção: áreas com alta densidade demográfica, regiões conurbadas, costumam apresentar maior incidência da doença. Em consequência, as ações a serem desenvolvidas com vis- tas a seu controle, necessariamente, ultrapassam os limites dos municípios, devendo ser planejadas regionalmente e executadas de maneira articulada. 101 Define os serviços que devem ser disponibilizados em escala regional: laboratórios de saúde pública, câmaras frias para armazenamento de imunobiológicos, centros de re- ferência para imunobiológicos especiais, centrais de armazenamento e distribuição de equipamentos, centrais de armazenamento de inseticidas, serviços de verificação de óbitos, serviços de saúde com capacidade de realização de procedimentos de alta e mé- dia complexidade e outros que vierem a ser definidos. Estabelece o levantamento de profissionais e da infraestrutura existentes, considerando a complexidade das ações a serem desenvolvidas na região. Tal levantamento é funda- mental para o planejamento e análise da situação existente e da necessidade de profis- sionais, por tipo e grau de formação, bem como da infraestrutura (espaço físico, equipa- mentos etc.). Cada sistema local/regional de saúde deverá, por intermédio do colegiado de gestão, discutir estratégias integradas com as diversas áreas para o enfrentamento de situações que exijam o compartilhamento da gestão. Fonte: adaptado de Brasil (2010). 102 1. Conjunto de ações que proporcionam o conhecimento, a detecção ou preven- ção de qualquer mudança nos fatores determinantes e condicionantes de saúde individual e coletiva. Tem como finalidade recomendar e adotar as medidas de prevenção e controle das doenças ou agravos. Assinale a alternativa correta. a. Vigilância Epidemiológica. b. Vigilância Sanitária. c. Vigilância da Saúde. d. Vigilância Ambiental. e. Vigilância Cultural. 1. Quanto às afirmações abaixo, assinale a alternativa correta. I. As ações da vigilância epidemiológica são desenvolvidas nos sistemas locais de saúde para agilizar a identificação e o controle dos eventos adversos à saú- de. II. A vigilância epidemiológica constitui importante instrumento para planejar, organizar e operacionalizar serviços de saúde. III. Informações oriundas da imprensa sobre possíveis surtos de doenças não devem ser consideradas para investigação, pois a mídia, constantemente, faz sensacionalismo sobre o caso, alarmandoa comunidade. IV. Durante o período de investigação de caso de doença, independentemente do tipo da doença, devem-se adotar medidas rigorosas de isolamento. Estão corretas: a. Apenas I e II estão corretas. b. Apenas II e III estão corretas. c. Apenas I está correta. d. Apenas II, III e IV estão corretas. e. Nenhuma das alternativas está correta. 3. Analise os indicadores de saúde, a seguir, que têm como base de divisão o nú- mero de habitantes do local. I. Mortalidade geral. II. Coeficiente de incidência acumulada. III. Mortalidade infantil. IV. Mortalidade materna. Assinale a alternativa correta. 103 a. I, II, III e IV estão corretas. b. Apenas I e II estão corretas. c. Apenas I e III estão corretas. d. Apenas I, III e IV estão corretas. e. Nenhuma das alternativas está correta. 4. No conjunto dos sistemas de notificação e vigilância epidemiológica e sanitária no Brasil, o responsável por coletar e processar dados sobre agravos de no- tificação em todo o território nacional é o: a. Sistema de Informação sobre Mortalidade (SIM). b. Sistema Nacional de Vigilância Epidemiológica (SNVE). c. Sistema Nacional de Agravos de Notificação (Sinan). d. Sistema de Informação da Atenção Básica (SIAB). e. Sistema de Informação em Vigilância Sanitária (SIVISA). 5. Observe a curva de mortalidade por idades e, de acordo com seu formato, indi- que em que nível de saúde está população. a. Tipo I: nível de saúde muito baixo. b. Tipo II: nível de saúde baixo. c. Tipo III: nível de saúde regular. d. Tipo IV: nível de saúde elevado. e. Tipo V: nível de saúde muito elevado. MATERIAL COMPLEMENTAR Epidemiologia: exercícios indisciplinados Stela Nazareth Meneghel Editora: Tomo Sinopse: o livro “Epidemiologia: exercícios indisciplinados” é uma obra que objetiva discutir alguns dos principais temas da epidemiologia no contexto da saúde coletiva e das políticas públicas de saúde. Destina-se a estudantes da graduação dos diferentes cursos do campo da saúde e a trabalhadores de serviços e instituições, motivados pelo estudo da epidemiologia e pela aplicação de seus métodos. O texto traz o cinema, a arte e a literatura como coadjuvantes do conhecimento epidemiológico e mistura textos teóricos com exercícios (indisciplinados) pautados em dados reais, nos sistemas de informação de saúde do país; mas, também, em notícias de jornal e da Internet. Espera que se possa auxiliar os leitores a problematizar algumas das questões epidemiológicas do cotidiano dos cursos e serviços, assim como ajudar a organização de indicadores de saúde e elaboração de per� s de saúde/doença e de estudos epidemiológicos. Em suma, contribuir para a análise da situação de saúde da população (Rede Unida). o livro “Epidemiologia: exercícios indisciplinados” é uma obra que objetiva discutir alguns Yesterday fi lme sul africano, nos quais as questões de gênero, raça e classe acompanham a jornada de uma mulher afetada pelo HIV, em busca de um tratamento digno para sua enfermidade. Livro - Epidemiologia - Exercícios indisciplinados. Trata-se de um livro que aborda alguns dos principais temas da epidemiologia no contexto da saúde coletiva e das políticas públicas de saúde. Disponivel em: <http://www.redeunida.org.br/editora/biblioteca-digital/ epidemiologia-exercicios-indisciplinados-pdf/view> REFERÊNCIAS 105 BOCCATTO, M. Vigilância em saúde. São Paulo: Unifesp, 2012. BRASIL. Decreto N° 7.508, de 28 de junho de 2011. Regulamenta a Lei no 8.080, de 19 de setembro de 1990, para dispor sobre a organização do Sistema Único de Saúde - SUS, o planejamento da saúde, a assistência à saúde e a articulação interfe- derativa, e dá outras providências. Presidência da República Casa Civil, 2011. ______. Diretrizes Nacionais da Vigilância em Saúde. Brasília: Ministério da Saú- de, Secretaria de Vigilância à Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, 2010. ______. Guia de Vigilância em Saúde. Brasília: Ministério da Saúde, Secretaria de Vigilância em Saúde, Coordenação-Geral de Desenvolvimento da Epidemiologia em Serviços, 2016. 773 p. ______. Indicadores e dados básicos para saúde. Ministério da Saúde. Secretaria Técnica da Ripsa, 2001. ______. Portaria nº 104, de 25 de janeiro de 2011. Define as terminologias adota- das em legislação nacional, conforme o disposto no Regulamento Sanitário Interna- cional 2005 (RSI 2005), a relação de doenças, agravos e eventos em saúde pública de notificação compulsória em todo o território nacional e estabelece fluxo, critérios, responsabilidades e atribuições aos profissionais e serviços de saúde. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, 2011. CORDONI JR, L. Bases da Saúde Coletiva. Londrina: Uel, 2001. MEDRONHO, R. et al. Epidemiologia. São Paulo: Atheneu, 2008. MENEGHEL, S. N. Epidemiologia: exercícios indisciplinados. Porto Alegre: Tomo, 2015. SETA, M. H.; REIS, L. G. C.; DELAMARQUE, E. Gestão da Vigilância à Saúde. Especia- lização em Gestão em Saúde. Florianópolis: Departamento de Ciências da Adminis- tração/UFSC, 2010. WALDMAN, E. A. CAMPOS, G. W. S. et al. (orgs). Vigilância como prática de saúde pública. Tratado de saúde coletiva. Rio de Janeiro: Fiocruz, 2012. p. 487-528. REFERÊNCIAS ON-LINE 1 Em: <http://www.rio.rj.gov.br/dlstatic/10112/4364979/4155726/SVS_NotifCom- pulsoria.pdf>. Acesso em: 12 mai. 2017. 2 Em: <http://www.ibge.gov.br/home/default.php>. Acesso em: 12 mai. 2017. 3 Em: <http://www.ipea.gov.br/portal/>. Acesso em: 12 mai. 2017. GABARITO 1) A. 2) A. 3) C. 4) C. 5) C. U N ID A D E IV Professora Dra. Marcela Demitto Furtado POLÍTICAS PÚBLICAS DE SAÚDE NO BRASIL Objetivos de Aprendizagem ■ Compreender as principais políticas públicas de saúde voltadas à saúde da mulher. ■ Entender as políticas públicas de atenção à saúde da criança. ■ Estudar as políticas públicas com foco na saúde do adulto e da pessoa idosa. ■ Compreender a organização do sistema de saúde na atenção à populações vulneráveis. ■ Debater sobre as políticas públicas voltadas à saúde mental. Plano de Estudo A seguir, apresentam-se os tópicos que você estudará nesta unidade: ■ Atenção à saúde da mulher ■ Políticas de atenção à saúde da criança ■ Políticas públicas de saúde do adulto/idoso ■ Políticas de saúde e populações vulneráveis ■ Políticas públicas de saúde mental INTRODUÇÃO Olá, caro aluno(a), estudamos, até aqui, aspectos fundamentais para a compre- ensão da saúde pública brasileira, abordando desde conceitos de saúde e doença, marcos históricos que antecederam o Sistema Único de Saúde e que levaram a sua criação, assistência à saúde no modelo de Redes de Atenção, até a operacio- nalização da vigilância em saúde. Entendemos que é a partir do levantamento das reais necessidades da popu- lação que se criam as políticas públicas, as quais devem elaborar planos de ação com o objetivo de minimizar e/ou resolver os problemas da sociedade. Nesta unidade, discutiremos as políticas públicas de saúde, separando-as de acordo com o seu público alvo, como: mulher, criança, adulto e idoso, populações vulneráveis e saúde mental. Assim, em cada tópico você irá se deparar com uma área da saúde, as quais compõem eixos importantes da saúde pública brasileira. O conhecimento das políticas públicas de saúde específicas para cada público a ser assistido é extremamente relevante quando se deseja analisar a situação da saúde atual, além de permitir uma visão mais ampliada sobre as conquistas alcançadas, desafios e rumos a serem trilhados. Iremos perceber que as políticas públicas de saúde buscam atender as deman- das de cuidado da população, levando em consideração o contexto do momento e indicadores de resultado, além de buscar o cumprimento dos objetivos e prin- cípios do SUS em suas ações. Enquanto futuro profissional da área da saúde, você poderá se deparar com situações que envolvam clientelas diversas, por isso a importância de debater sobre as políticas públicas de saúde separadamente para cada área. Nota-seque abordaremos assuntos bem diversos em cada tópico, assim, abas- teça-se de muito ânimo, determinação e vontade de seguir em frente. Vamos lá e bons estudos! Introdução Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 109 POLÍTICAS PÚBLICAS DE SAÚDE NO BRASIL Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. IVU N I D A D E110 ATENÇÃO À SAÚDE DA MULHER Para iniciar esse tópico, precisamos recordar que, ao longo da história da huma- nidade, a mulher exerceu, por muito tempo, o papel social de mãe e cuidadora dos afazeres domésticos. A visão restrita sobre a mulher, considerando-a apenas como reprodutora, acabava por gerar uma imagem frágil, delicada. A subordi- nação da mulher ao homem, o qual era o provedor do lar e possuía a sua figura associada à autoridade, também foi outra característica bastante presente na his- tória e que deu origem às sociedades patriarcais. Com relação à saúde, apenas nas primeiras décadas do século XX é que a saúde da mulher recebeu um olhar diferenciado dos gestores e, então, passou a fazer parte das políticas nacionais de saúde. No entanto, até a década de 70, os programas ainda possuíam como embasamento esse conhecimento limitado e fragmentado da mulher e sua saúde. O enfoque central dos programas era a saúde da criança e da gestante (materno-infantis), por considerá-las grupos com maior vulnerabilidade (BRASIL, 2004a). Com o movimento feminista brasileiro, em meados da década de 60, o qual propunha, entre outras coisas, a igualdade de gênero, foi possível ampliar o conceito de saúde da mulher, entendendo a saúde sexual e reprodutiva como um direito (GIFFIN, 2002). Outros assuntos também relaciona- dos à mulher, e não apenas àqueles ligados à vida reprodutiva, começaram a ser discutidos, como prevenção das doenças sexualmente transmissíveis, méto- dos contraceptivos, sexualidade, excesso de trabalho e desigualdades (BRASIL, 2004a). Foi nesse cenário que, em 1983, o Ministério da Saúde lançou o Programa de Assistência Integral à Saúde da Mulher (PAISM), buscando integralizar a assistência à essa clien- tela com ações educativas, de promoção, prevenção, diagnóstico e tratamento. Atenção à Saúde da Mulher Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 111 O PAISM incorporou como princípios e diretrizes as propostas de des- centralização, hierarquização e regionalização dos serviços, bem como a integralidade e a equidade da atenção, num período em que, parale- lamente, no âmbito do Movimento Sanitário, se concebia o arcabou- ço conceitual que embasaria a formulação do Sistema Único de Saúde (SUS) (BRASIL, 2004a, p. 16). Em 2004, foi elaborada a Política Nacional de Atenção Integral à Saúde da Mulher (PNAISM), a fim de atender às reais necessidades das mulheres brasileiras e, nesse sentido, reduzir índices de morbidade e mortalidade por causas evitáveis. Esta nova política foi formulada tendo por base a avaliação das políti- cas anteriores e, a partir de então, buscou preencher as lacunas deixa- das, como: climatério/menopausa; queixas ginecológicas; infertilidade e reprodução assistida; saúde da mulher na adolescência; doenças crô- nico-degenerativas; saúde ocupacional; saúde mental; doenças infecto- -contagiosas, bem como a atenção às mulheres rurais, com deficiência, negras, indígenas, presidiárias e lésbicas (FREITAS et al., 2009, p. 427). As mudanças no papel social da mulher, sua inserção no mercado de traba- lho atrelada a novos hábitos e estilo de vida, sobrecarga de responsabilidades e estresse da vida moderna, acabou por provocar mudanças no perfil epidemio- lógico das mulheres (BRASIL, 2004a). Doenças antes com pouco significado passam a chamar a atenção devido à sua elevada prevalência, como é o caso das doenças crônicas não-transmissíveis (DCNT), como Diabetes Mellitus, Hipertensão Arterial e o Câncer. A epidemiologia do câncer em mulheres no Brasil, especialmente o câncer de mama e colo uterino, e sua magnitude social também são focos importan- tes quando se discute sobre a saúde da mulher. Por isso, muitas estratégias são pensadas e implementadas no sentido de controlar essas doenças. É sabido que quando diagnosticadas precocemente possuem grandes chances de cura, o que destaca a importância do rastreamento e adoção de condutas terapêuticas em tempo oportuno (BRASIL, 2013a). POLÍTICAS PÚBLICAS DE SAÚDE NO BRASIL Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. IVU N I D A D E112 A operacionalização da PNAISM se deu na prática por meio da elaboração de diversas ações consideradas prioritárias no atendimento à saúde dessa clientela. Nesse sentido, foram estabelecidos Pactos, Programas e Políticas. Algumas delas serão apresentadas em seguida. Primeiramente, podemos citar o Pacto Nacional pela Redução da Mortalidade Materna e Neonatal, realizado em 2004, cuja meta estabelecida foi a redução anual de 5% da mortalidade materna e neonatal. Para tanto, foram estabeleci- das uma série de ações estratégicas, como (BRASIL, 2004b): ■ Efetivação de pactos municipais e estaduais; ■ Qualificação e humanização da atenção à saúde da mulher e da criança; ■ Acolhimento ao parto; ■ Garantia do direito ao acompanhante e ao alojamento conjunto; ■ Resolutividade à atenção ao parto e ao nascimento; ■ Garantia de atenção humanizada ao aborto; ■ Organização de acesso e adequação da oferta de serviços; ■ Qualificação do atendimento às urgências/emergências; ■ Melhoria da rede hospitalar e ampliação dos centros de parto normal; ■ Expansão da atenção à saúde da mulher e da criança; De acordo com o Ministério da Saúde, o rastreamento refere-se a realização de um exame em um indivíduo saudável, não-doente, cujo objetivo é iden- tificar sinais indicativos/sugestivos de câncer e, quando necessário, enca- minhá-lo para uma investigação mais aprofundada e/ou tratamento. Para o câncer de mama, a principal forma de rastreamento é a mamografia, e para o câncer de colo de útero o exame citopatológico/Preventivo/Papanicolau. Fonte: Brasil (2013a). Atenção à Saúde da Mulher Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 113 ■ Ampliação das ações de planejamento familiar; ■ Redução da transmissão vertical do HIV/aids; ■ Proteção à saúde da mulher trabalhadora; ■ Atenção às mulheres e recém-nascidos negros e indígenas, respeitando as suas particularidades étnicas e culturais; ■ Acompanhamento de planos e seguros privados de saúde; ■ Promoção à educação permanente dos profissionais envolvidos com a atenção obstétrica e neonatal; ■ Garantia à vigilância ao óbito materno e infantil; ■ Fortalecimento dos projetos de premiação de serviços exemplares. Em 2005, foi lançada a Política Nacional de Atenção Obstétrica e Neonatal com o objetivo de desenvolver ações voltadas à atenção pré-natal, parto, recém- -nascido, acompanhamento no pós-parto imediato, atendimentos às principais intercorrências obstétricas e neonatais e atenção no puerpério no âmbito do SUS (BRASIL, 2005). Em 2013, o Ministério da Saúde instituiu a Política Nacional para a Prevenção e Controle do Câncer na Rede de Atenção à Saúde das Pessoas com Doenças Crônicas no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS), buscando reduzir os índi- ces de mortalidade e incapacidades provocadas pelo câncer, além de melhorar a qualidade de vida dos usuários com a doença (BRASIL, 2014a). Pense na importância de um modelo de atenção à saúde que possua uma efetiva comunicação e articulação nos diferentes níveis de atenção. A ga- rantia de acesso aos serviços e assistência integral à mulher é fundamental. POLÍTICAS PÚBLICAS DE SAÚDE NO BRASILReprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. IVU N I D A D E114 Atualmente, é possível verificar que a população de mulheres é superior a dos homens, com maior expectativa de vida e que adoecem com maior frequên- cia, o que justifica a saúde da mulher ser entendida como prioridade no Brasil (BRASIL, 2004a). Nesse sentido, é fundamental pensarmos em ações de saúde, no âmbito da promoção, prevenção e tratamento, que compreendam a mulher como um todo, entendendo-a como um ser biopsicossocial inserido num contexto e não mais de forma fragmentada como no início do século passado. POLÍTICAS DE ATENÇÃO À SAÚDE DA CRIANÇA Para iniciarmos este tópico, faço a seguinte pergunta: quem já ouviu dizer ou mesmo já disse que a criança é um adulto em miniatura? Na área da saúde, por muito tempo, as crianças foram tratadas como adul- tos ou, conforme colocado na pergunta acima, como “adultos em miniatura”, ignorando aspectos específicos da infância, tais como seu crescimento e desen- volvimento, além de características individuais presentes nessa fase. Isso se deve ao fato de que, ao longo da história, a criança ocupou diferen- tes posições na sociedade. No período colonial, muitas crianças eram vistas, pela própria família, como mão de obra barata; submetidas a castigos/torturas ou, ainda, abandonadas em casas de caridade ou hospitais (RIBEIRO, 2006). As condições sanitárias da época eram péssimas, atreladas à má alimenta- ção e a falta de assistência qualificada no parto faziam as taxas de mortalidade infantil crescerem cada vez mais. No século XVII, a criança passou a ter representatividade nas famílias, as quais começaram a demonstrar afeto por elas. No entanto, no século XVIII, muitas crianças continuam sendo abandonadas, uma situação ainda aceita pela sociedade (ARIÈS, 2011). A separação das crianças de seus pais ainda acontecia no século XIX, quando Políticas de Atenção à Saúde da Criança Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 115 elas eram enviadas para os colégios internos ou internatos e lá eram cuidadas e educadas (RIBEIRO, 2006). A família não entendia qual o seu papel na vida da criança. Apenas quando ela começou a compreender a sua importância para a formação e desenvolvi- mento de um indivíduo e os serviços públicos assumiram a sua responsabilidade assistencial é que a criança começou a ser respeitada e valorizada. Foi então que começaram a ser criadas as políticas públicas de atenção à saúde da criança (ARAÚJO et al., 2014). Na década de 1920, surgem os primeiros debates sobre o aleitamento materno, na busca de estratégias para a sua promoção, já que bebês não amamentados adoecem mais frequentemente e isso representava maior absenteísmo de mulhe- res no trabalho. Nos próximos anos, foram criados programas cujo foco era a maternidade, infância e adolescência; no entanto, todos ainda com um olhar fragmentado e curativo acerca da criança (SILVA, 2006). Mesmo com a implantação, em 1970, do Programa Nacional de Saúde POLÍTICAS PÚBLICAS DE SAÚDE NO BRASIL Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. IVU N I D A D E116 Materno-Infantil, que possuía como objetivo principal reduzir a morbimorta- lidade de mães e bebês, o panorama geral de saúde das crianças mantinha-se crítico (SILVA, 2006). Pensando em uma assistência integral à saúde da criança, ou seja, que con- siderasse suas diversas dimensões, valorizando-a como um ser único e que não pode ser dissociado de sua família, é que, em 1984, foi criado o Programa de Assistência Integral à Saúde da Criança (PAISC). O PAISC possuía como objetivo promover ações de saúde, de modo a prio- rizar as crianças com maior risco de adoecer. As ações de saúde englobavam: acompanhamento do crescimento e desenvolvimento; incentivo ao aleitamento materno; controle das doenças diarreicas e das Infecções Respiratórias Agudas (IRAs) e a imunização (BRASIL, 1984). Em 1990, foi aprovada a lei 8.069, que dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), o qual garante amplos direitos de proteção à vida e à saúde dos mesmos. No ano de 1991, foi instituído o Programa de Assistência à Saúde Perinatal (PROASP), com vistas a uma assistência de maior qualidade voltada ao binômio mãe-feto e recém-nascido. Nesse período, muito se discutiu sobre a importância do alojamento conjunto e do aleitamento materno (COSTA et al., 2010). Na busca por uma assistência humanizada à criança no âmbito hospitalar e que valorizasse a amamentação é que, em 1995, o Ministério da Saúde implan- tou a Iniciativa Hospital Amigo da Criança (IHAC). Já em 1996, foi adotada a Atenção Integrada às Doenças Prevalentes na Infância (AIDPI), uma estratégia que buscou fortalecer e organizar a atenção primária à saúde, capacitando os profissionais para o cuidado e tratamento das doenças mais frequentes em crianças menores de cinco anos. Considerando o número significativo de nascimentos prematuros e com baixo peso, o Ministério da Saúde lançou, em 2000, o Método Mãe Canguru - Atenção Humanizada ao recém-nascido de baixo peso. O método propicia o contato pele a pele entre a mãe ou outro membro da família e o recém-nascido, contribuindo para o estabelecimento e fortalecimento do vínculo afetivo, além de outros inúmeros benefícios já comprovados na lite- ratura (PINHEIRO et al., 2014). Políticas de Atenção à Saúde da Criança Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 117 Ainda em 2000, foi criado o Programa Nacional de Humanização do pré- -natal e nascimento, buscando assegurar a integralidade da assistência desde o pré-natal, incluindo gestantes de baixo e alto risco, parto, transcorrendo pelo puerpério até o período neonatal. Em 2004, foi lançada a Agenda de compromissos para a saúde integral e redução da mortalidade infantil, a qual destacou a importância de ações que fortaleçam o nascimento saudável, contribuam para o crescimento e desenvol- vimento e combatam os principais agravos nutricionais e doenças mais comuns na infância (SILVA et al., 2009). Seguindo a proposta das Redes de Atenção em Saúde (RAS), tema já abor- dado na Unidade II, deste livro, é que em 2011 foi implantada a Rede Cegonha e em 2012 a Rede Mãe Paranaense. Essas RAS têm como proposta a organiza- ção da atenção materno-infantil, à medida que permitem a integração de ações e serviços de saúde. Em agosto de 2015, o Ministério da Saúde instituiu a Política Nacional de Atenção Integral à Saúde da Criança (PNAISC) no âmbito do SUS, a qual apresenta sete eixos estratégicos (BRASIL, 2015): ■ Atenção humanizada e qualificada à gestação, parto, nascimento e recém-nascido. ■ Aleitamento materno e alimentação complementar saudável. ■ Promoção e acompanhamento do crescimento e desenvolvimento integral. As políticas públicas de saúde da criança estão em constante construção. Buscam uma assistência integral que inclua a família, migrando do modelo centrado na doença para o modelo de construção de redes. (Juliane Pagliari Araújo) POLÍTICAS PÚBLICAS DE SAÚDE NO BRASIL Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. IVU N I D A D E118 ■ Atenção a crianças com agravos prevalentes na infância e com doenças crônicas. ■ Atenção à criança em situação de violências, prevenção de acidentes e promoção da cultura de paz. ■ Atenção à saúde de crianças com deficiência ou em situações específicas e de vulnerabilidade. ■ Vigilância e prevenção do óbito infantil, fetal e materno. Percebe-se que, ao longo da história, as políticas públicas de saúde voltadas à criança foram se transformando, se adequando tanto ao papel social exercido pela criança como ao perfil epidemiológico e às demandas de saúde de cada época. POLÍTICASPÚBLICAS DE SAÚDE DO ADULTO/IDOSO Neste tópico, iremos abordar alguns aspectos das políticas públicas de saúde voltadas ao adulto e ao idoso. Mas quem é o adulto? Podemos considerar o adulto aquele que encontra-se na faixa etária entre 18 e 60 anos de idade, já que de acordo com o Estatuto do Idoso, consi- dera-se pessoa idosa aquela com idade igual ou superior a 60 anos (BRASIL, 2003) e para o Estatuto da Criança e do Adolescente, a adolescência se encerra aos 18 anos (BRASIL, 1990). Já é conhecido que na atualidade ocorre uma queda das taxas de fecundi- dade e de mortalidade infantil, bem como um aumento da expectativa de vida. Os homens adoecem menos que as mulheres? Os homens não se importam com a própria saúde? Por quê eles não procuram com frequência os serviços de saúde? (Joseane da Rocha Dantas Cavalcanti, Jocelly de Araújo Ferreira, Amanda Haissa Barros Henriques, Gilvânia Smith da Nóbrega Morais, Janaína Von Sohsten Trigueiro e Isolda Maria Barros Torquato) Políticas Públicas de Saúde do Adulto/Idoso Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 119 Assim, os adultos representam uma porção significativa da população e, por- tanto, merecem atenção por parte das políticas públicas de saúde. Para o planejamento de ações de saúde, tanto individuais como coletivas, voltadas ao adulto, é fundamental conhecer o perfil epidemiológico dessa popu- lação. Nesse sentido, podem ser destacadas algumas condições específicas, como: hipertensão arterial, diabetes mellitus, tuberculose, hanseníase e a saúde do homem (PERALBA, 2012). Em 2008, foi criada a Política Nacional de Atenção Integral à Saúde do Homem (PNAISH), a fim de reconhecer os determinantes sociais que expõem essa parcela da população a riscos de adoecer, evidenciando os principais fato- res que contribuem para a morbimortalidade (BRASIL, 2008). Um dos principais objetivos desta Política é promover ações de saúde que contribuam significativamente para a compreensão da realidade singular masculina nos seus diversos contextos socioculturais e políti- co-econômicos; outro, é o respeito aos diferentes níveis de desenvolvi- mento e organização dos sistemas locais de saúde e tipos de gestão. Este conjunto possibilita o aumento da expectativa de vida e a redução dos índices de morbimortalidade por causas preveníveis e evitáveis nessa população (BRASIL, 2008, p. 3). No cenário atual referente à saúde do adulto, nota-se que as políticas públicas estão alinhadas a uma busca pela assistência integral do indivíduo. Para isso, muito se discute sobre a reorganização das Redes de Atenção em Saúde (RAS), de forma que elas se articulem/se comuniquem para atender as demandas dessa POLÍTICAS PÚBLICAS DE SAÚDE NO BRASIL Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. IVU N I D A D E120 população. Aliado à isso, o Ministério da Saúde tem investido na linha do cui- dado voltado às doenças crônicas (UNA-SUS/UFMA, 2014). As doenças crônicas não-transmissíveis (DCNT) configuram-se como sério problema de saúde pública. Considerando sua magnitude em todo o território brasileiro, foi elaborado o Plano de Ações Estratégicas para o Enfrentamento das Doenças Crônicas Não Transmissíveis (DCNT), 2011-2022. Fazem parte do Plano os quatro principais grupos de DCNT, os quais são: circulatórias, câncer, respiratórias crônicas e diabetes. Os fatores de risco em comum modificáveis para essas doenças são: tabagismo, álcool, inatividade física, alimentação não saudável e obesidade; sobre os quais busca-se ações integradas visando a melhoria das DCNT em geral (BRASIL, 2011). Melhorar as condições de vida do adulto é pensar em idosos mais saudáveis, com maior qualidade de vida. O envelhecimento pode ser considerado como um processo natural da vida que, em condições normais, não acarreta nenhum tipo de problema (senescên- cia). Já a senilidade refere-se à exposição do indivíduo a doenças, por exemplo, o que exige assistência de saúde (BRASIL, 2007). Todos nós estamos envelhecendo a cada dia, logo, hoje somos mais velhos do que ontem. E pensar no envelhecimento suscita uma série de ações de pro- moção da saúde - grande foco das políticas públicas. O termo “envelhecimento ativo” passou a ser utilizado no final dos anos 90, com o intuito de expandir os fatores que afetam o envelhecimento para além da saúde. As políticas públicas passaram, então, a pensar em ações que abordassem a alimentação saudável, prática de atividade física, combate às situações de violên- cia familiar e urbana, redução do consumo do tabaco e álcool etc (BRASIL, 2007). Em 1994, é criada a Política Nacional do Idoso, a qual propõe ações em diversas áreas, como trabalho, lazer, habitação e saúde. Nesta última, a política busca garan- tir ao idoso a assistência nos diferentes níveis de atenção à saúde (BRASIL, 1994). No ano de 2003, por meio da lei n° 10.741, foi instituído o Estatuto do Idoso, o qual dispõe sobre o papel da família, da comunidade, bem como dos gesto- res públicos, em garantir os direitos da pessoa idosa. O Estatuto do Idoso vem somar com a Política Nacional do Idoso e vai além no sentido de oferecer puni- ções quando os direitos não são assegurados (BRASIL, 2003). A discussão sobre a saúde do idoso dentro do contexto do Sistema Único de Saúde é ampla e se insere em outras políticas públicas de saúde, como as Políticas Nacionais de: • Atenção Básica; • Promoção da Saúde; • Humanização no SUS. Fonte: a autora. Políticas Públicas de Saúde do Adulto/Idoso Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 121 Em outubro de 2006, é aprovada a Política Nacional de Saúde da Pessoa Idosa (PNSPI), cuja finalidade principal é: [...] recuperar, manter e promover a autonomia e a independência dos indivíduos idosos, direcionando medidas coletivas e individuais de saúde para esse fim, em consonância com os princípios e diretrizes do Sistema Único de Saúde (BRASIL, 2006, p. 3). Como já foi abordado em outra unidade, a saúde do idoso foi uma das seis prio- ridades pactuadas em 2006 entre as três esferas do governo - Pacto pela Vida. Percebe-se que as políticas públicas de saúde voltadas ao adulto e ao idoso res- pondem ao panorama epidemiológico de cada período, buscando atender as necessidades de saúde da população alvo e, assim, permitir um envelhecimento cada vez mais saudável. POLÍTICAS PÚBLICAS DE SAÚDE NO BRASIL Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. IVU N I D A D E122 POLÍTICAS DE SAÚDE E POPULAÇÕES VULNERÁVEIS Para começar esse tópico, pergunte-se: o que signifi ca estar vulnerável? Vulnerável em relação a que? Qual a relação entre vulnerabilidade e saúde? Quais são as populações vulneráveis? Mas o que é vulnerabilidade? Para Bertolozzi et al., (2009, p. 1327) “o termo vulnerabilidade é comumente empregado para designar suscetibilidades das pessoas a problemas e danos de saúde”. Na saúde, a utilização do termo “vulnerabilidade” se deu no contexto da epi- demia da AIDS/HIV, quando percebeu-se que a utilização de “grupos de risco” possuía um caráter restritivo e, por vezes, preconceituoso. Logo, o conceito de vulnerabilidade parecia ser mais amplo e, no caso da AIDS, demonstrava que todos os indivíduos sociais estavam vulneráveis à doença. De forma geral, uma pessoa vulnerável é aquela que está exposta a riscos. Nesse contexto, é possível destacar condições que favorecem maior ou menor risco para o indivíduo, como, por exemplo: aspectos comportamentais do indi- víduo e/ou do coletivo, além da possibilidade e formas para o seu enfrentamento. Assim, conhecer as vulnerabilidades de uma determinada população per- mite a realização de diagnósticos, com vistas à elaboração de ações específi cas voltadas às necessidadesdo grupo. Atualmente, inserem-se nos grupos de populações vulneráveis: pessoas com defi ciência, pessoas em situação de rua, pessoas negras, pessoas idosas e grupo LGBT (lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais). Iremos abordar, de forma pontual, alguns aspectos importantes das políticas Políticas de Saúde e Populações Vulneráveis Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 123 públicas de saúde para cada grupo, exceto para as pessoas idosas, visto que o tema já foi discutido em outro tópico. PESSOAS COM DEFICIÊNCIA Diante da necessidade de incluir as pessoas com deficiência na rede de serviços do SUS, de forma a atender integralmente suas complexas demandas de saúde, é que, em 2002, foi criada a Política Nacional de Saúde da Pessoa com Deficiência. Em 2012, é instituído no âmbito do SUS a Rede de Cuidados à Saúde da Pessoa com Deficiência (Portaria 793, de 24/04/12), estabelecendo diretrizes para o cuidado às pessoas com deficiência temporária ou permanente; progres- siva; regressiva ou estável; intermitente ou contínua. A organização e funcionamento dos serviços de saúde, com comunicação entre as redes de atenção, articulando prevenção, promoção e reabilitação, é fun- damental para uma assistência de qualidade a esse grupo vulnerável. Em julho de 2015, foi criada a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Estatuto da Pessoa com Deficiência), a qual prevê uma série de direitos, entre eles o direito à saúde. PESSOAS EM SITUAÇÃO DE RUA O número de Pessoas em Situação de Rua (PSR) cresce, a cada ano no Brasil e isso é reflexo das condições sociais da população, como: desemprego, pobreza, formação de grandes centros urbanos, rápida urbanização de algumas localida- des, entre outras (BRASIL, 2014b). “O Bicho Vi ontem um bicho Na imundície do pátio Catando comida entre os detritos. Quando achava alguma coisa, Não examinava nem cheirava: Engolia com voracidade. O bicho não era um cão, Não era um gato, Não era um rato. O bicho, meu Deus, era um homem”. O poema de Manuel Bandeira retrata a triste realidade das PSR, grupo esse que ganhou visibilidade nos últimos anos, o que permitiu uma série de avanços na área. Fonte: Bandeira (1993). POLÍTICAS PÚBLICAS DE SAÚDE NO BRASIL Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. IVU N I D A D E124 A invisibilidade desse grupo é um problema que impede que seus direitos enquanto cidadãos sejam reconhecidos e garantidos. Nesse sentido, em 2009, instituiu-se a Política Nacional para População em Situação de Rua, a partir da qual: considera-se população em situação de rua o grupo populacional he- terogêneo que possui em comum a pobreza extrema, os vínculos fa- miliares interrompidos ou fragilizados e a inexistência de moradia convencional regular, e que utiliza os logradouros públicos e as áreas degradadas como espaço de moradia e de sustento, de forma tempo- rária ou permanente, bem como as unidades de acolhimento para per- noite temporário ou como moradia provisória (BRASIL, 2014b, p. 11). São vários os objetivos dessa política, entre eles (BRASIL, 2014b): Políticas de Saúde e Populações Vulneráveis Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 125 ■ Assegurar o acesso amplo, simplificado e seguro aos serviços e programas que integram as políticas públicas de saúde, educação, previdência, assis- tência social, moradia, segurança, cultura, esporte, lazer, trabalho e renda; ■ Garantir a formação e a capacitação permanente de profissionais para atuação no desenvolvimento de políticas públicas intersetoriais, trans- versais e intergovernamentais direcionadas às pessoas em situação de rua; ■ Desenvolver ações educativas permanentes que contribuam para a for- mação de cultura de respeito, ética e solidariedade entre a População em Situação de Rua e os demais grupos sociais; ■ Implantar centros de defesa dos direitos humanos para a População em Situação de Rua; ■ Criar meios de articulação entre o Sistema Único de Assistência Social (SUAS) e o Sistema Único de Saúde (SUS) para qualificar a oferta de serviços; ■ Implementar ações de segurança alimentar e nutricional suficientes para proporcionar acesso permanente à alimentação pela População em Situação de Rua, com qualidade; ■ Disponibilizar programas de qualificação profissional para as pessoas em situação de rua, com o objetivo de propiciar o seu acesso ao mercado de trabalho. Na área da saúde, um grande avanço aconteceu também em 2009, com a cria- ção do Comitê Técnico de Saúde para a população em situação de rua, por meio da Portaria MS/GM n° 3.305. Em 2013, foi publicado o Plano Operativo para Implementação de Ações em Saúde da População em Situação de Rua. Nesse plano, as ações de promoção da saúde voltadas a essa população foram agrupadas em cinco eixos, os quais são (BRASIL, 2014b): 1. Inclusão da PSR no escopo das redes de atenção à saúde. 2. Promoção e Vigilância em Saúde. 3. Educação Permanente em Saúde na abordagem da Saúde da PSR. POLÍTICAS PÚBLICAS DE SAÚDE NO BRASIL Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. IVU N I D A D E126 4. Fortalecimento da Participação e do Controle Social. 5. Monitoramento e avaliação das ações de saúde para a PSR. PESSOAS NEGRAS Em 2009, o Ministério da Saúde instituiu a Política Nacional de Saúde Integral da População Negra, em resposta às desigualdades em saúde que acometem essa população, que grande parte se deve ao contexto histórico desse grupo no Brasil. Seu propósito é garantir maior grau de equidade no que tange a efeti- vação do direito humano à saúde, em seus aspectos de promoção, pre- venção, atenção, tratamento e recuperação de doenças e agravos trans- missíveis e não transmissíveis, incluindo aqueles de maior prevalência nesse segmento populacional (BRASIL, 2013b, p. 7). Essa política tem um caráter transversal das ações de saúde da população negra, à medida que realiza articulações entre as secretarias do Ministério da Saúde, cuja intencionalidade é a promoção de equidade - um dos princípios do SUS. GRUPO LGBT Na 13º Conferência Nacional de Saúde, realizada em 2013, muito se discutiu O consultório na rua (CnaR) é uma estratégia voltada ao atendimento dessa população, que vive “sem endereço, e nem moradia fixa”. As equipes que atuam nos CnaR são formadas por profissionais de diversas áreas, que atuam de forma itinerante buscando garantir o acesso dessa po- pulação à saúde. Destaca-se que essa não é a única “porta de entrada” da PSR no SUS. Sua entrada pode se dar, também, por meio das Unidade Básica de Saúde e Unidades de Pronto Atendimento. Fonte: Brasil (2014b). Políticas de Saúde e Populações Vulneráveis Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 127 sobre orientação sexual e identidade de gênero como determinantes sociais de saúde. Nesse sentido, foram elencadas algumas estratégias: ■ O desenvolvimento de ações intersetoriais de educação em direitos huma- nos e respeito à diversidade, efetivando campanhas e currículos escolares que abordem os direitos sociais. ■ A sensibilização dos profissionais a respeito dos direitos de LGBT, com inclusão do tema da livre expressão sexual na política de educação per- manente no SUS. ■ A inclusão dos quesitos de identidade de gênero e de orientação sexual nos formulários, prontuários e sistemas de informação em saúde. ■ A ampliação da participação dos movimentos sociais LGBT nos conse- lhos de saúde. ■ O incentivo à produção de pesquisas científicas, inovações tecnológicas e compartilhamento dos avanços terapêuticos. ■ A garantia dos direitos sexuais e reprodutivose o respeito ao direito à intimidade e à individualidade. ■ O estabelecimento de normas e protocolos de atendimento específicos para as lésbicas e travestis. ■ A manutenção e o fortalecimento de ações da prevenção das DST/aids, com especial foco nas populações LGBT. ■ O aprimoramento do Processo Transexualizador. ■ A implementação do protocolo de atenção contra a violência, conside- rando a identidade de gênero e a orientação sexual (BRASIL, 2013c, p. 12). Em 2011, foi definida A Política Nacional de Saúde Integral dos LGBT, visando a inclusão social desse grupo vulnerável. De acordo com o Ministério da Saúde, a Política tem como principal objetivo: [...] promover a saúde integral de lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais, eliminando a discriminação e o preconceito institucional, bem como contribuindo para a redução das desigualdades e a consoli- dação do SUS como sistema universal, integral e equitativo (BRASIL, 2013c, p. 18). POLÍTICAS PÚBLICAS DE SAÚDE NO BRASIL Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. IVU N I D A D E128 A garantia de atendimento à saúde é um direito de todo cidadão, devendo-se respeitar as suas especificidades, sejam elas quais forem. Para tanto, foram cria- das as políticas públicas de saúde para as populações vulneráveis. POLÍTICAS PÚBLICAS DE SAÚDE MENTAL Antes de iniciar esse tópico, é importante nos perguntarmos: o que é saúde mental? Quem são os doentes mentais? Por que a criação de políticas públicas direcionadas à saúde mental? Mais uma vez, precisamos retomar a histó- ria para compreendermos todas essas questões. Vamos lá! Considerando que a loucura existe desde o princípio da humanidade, vários eram os locais destinados para se tratar os loucos: igrejas ou templos, domicílio e asilos. As instituições psi- quiátricas, propriamente ditas, surgiram em meados do século VXIII (FOUCAULT, 1978). A abordagem ao indivíduo com doença mental era autoritária, agressiva, violenta e totalmente excludente. O indivíduo era mantido em hospícios ou manicômios, longe dos familiares. Muito se falava em choques como método de tratamento e as famosas “camisas de força” para contenção nos momentos de crise, quando não eram acorrentados e trancados em salas escuras. O descontentamento da comunidade psiquiátrica, indivíduos com transtorno mental, familiares e a sociedade de forma geral com o modelo de assistência na área de saúde mental é que fomentou o processo de Reforma. Políticas Públicas de Saúde Mental Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 129 A Reforma Psiquiátrica, propriamente dita, iniciou-se internacionalmente. O médico italiano Franco Basaglia foi seu precursor na década de 60, lutando por melhores condições das instalações que atendiam as pessoas com transtornos mentais, melhor tratamento clínico e, mais para frente, criticando o modelo hospitalocêntrico. Em 1978, aconteceu, no Rio de Janeiro, o I Simpósio Internacional de Psicanálise, Grupos e Instituições, o qual contou com a presença do Dr. Basaglia. A Partir desse Simpósio, a luta antimanicomial e a reforma psiquiátrica no Brasil se fortaleceu. Na década de 70, inicia-se o processo de Reforma Psiquiátrica no Brasil. A partir desse período, vários acontecimentos marcam a história da saúde mental. Em 1978, o Movimento dos Trabalhadores de Saúde Mental (MTSM) mos- tra seu descontentamento com a assistência prestada ao paciente com transtorno mental, criticando o modelo centrado nos hospitais, além de destacar as péssi- mas condições de trabalho e a privatização da atenção psiquiátrica. Esse movimento social foi um dos responsáveis pela criação, em 1986, do primeiro Centro de Atenção Psicossocial (CAPS), localizado no município de São Paulo. O objetivo do CAPS é: Quem já ouviu a expressão “ficou pinel”? Ela significa “ficou louco” e faz refe- rência ao sobrenome de um médico que marcou a história da saúde mental. No contexto da Revolução Francesa, Philippe Pinel, médico psiquiatra, foi considerado o primeiro reformador da assistência psiquiátrica. Por muitos é considerado o pai da psiquiatria. Em 1798, indignado com as péssimas con- dições de tratamento, ele liberou asilados presos há mais de 30 anos. Seus pensamentos e atitudes influenciaram a revolução psiquiátrica em diversos países. Fonte: Foucault (1995). POLÍTICAS PÚBLICAS DE SAÚDE NO BRASIL Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. IVU N I D A D E130 [...] oferecer atendimento à população de sua área de abrangência, re- alizando o acompanhamento clínico e a reinserção social dos usuários pelo acesso ao trabalho, lazer, exercício dos direitos civis e fortaleci- mento dos laços familiares e comunitários. É um serviço de atendi- mento de saúde mental criado para ser substitutivo às internações em hospitais psiquiátricos (BRASIL, 2004c, p. 13). Em 1987, acontece a I Conferência Nacional de Saúde Mental, a qual contou com membros de diversos segmentos da sociedade. A realização da I Conferência Nacional de Saúde Mental, em desdo- bramento à 8ª Conferência Nacional de Saúde, representa um marco histórico na psiquiatria brasileira, posto que reflete a aspiração de toda a comunidade científica da área, que entende que a política nacional de saúde mental necessita estar integrada à política nacional de desenvol- vimento social do Governo Federal (BRASIL, 1988, p. 9). No mesmo ano, na cidade de Bauru-SP, ocorre o I Encontro Nacional do Movimento de Trabalhadores de Saúde Mental. O lema criado nesse período - “Por uma sociedade sem manicômios” - sugere a necessidade de discutir sobre a saúde mental e uma nova assistência psiquiátrica por parte da sociedade. Um fato importante foi a intervenção na Casa de Saúde Anchieta, localizada em Santos-SP. A intervenção foi o fechamento do hospício, pela prefeitura, e a criação de centros de atenção psicossocial. Em 1990, foi divulgado pela Organização Pan-Americana de Saúde e a Organização Mundial da Saúde um documento intitulado: “a reestruturação da atenção psiquiátrica na América Latina: uma nova política para os serviços de Saúde Mental”, mais conhecido como Declaração de Caracas, cuja proposta cen- tral é a reestruturação da assistência psiquiátrica. Nesse contexto, acreditava-se que o modelo de assistência vigente não con- seguiria atender o indivíduo com transtorno mental em sua integralidade. O modelo hospitalocêntrico, como única alternativa de cuidado, acaba por pro- vocar isolamento social e da própria família. Em 2001, a Lei nº 10.216, conhecida como a Lei da Reforma Psiquiátrica, apresenta uma nova direção para o modelo assistencial em saúde mental, garan- tindo proteção e direitos às pessoas portadoras de transtornos mentais. De acordo com a lei, são direitos da pessoa portadora de transtorno mental: Políticas Públicas de Saúde Mental Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 131 “I - ter acesso ao melhor tratamento do sistema de saúde, consentâneo às suas necessidades; II - ser tratada com humanidade e respeito e no interesse exclusivo de beneficiar sua saúde, visando alcançar sua recuperação pela inserção na família, no trabalho e na comunidade; III - ser protegida contra qualquer forma de abuso e exploração; IV - ter garantia de sigilo nas informações prestadas; V - ter direito à presença médica, em qualquer tempo, para esclarecer a necessidade ou não de sua hospitalização involuntária; VI - ter livre acesso aos meios de comunicação disponíveis; VII - receber o maior número de informações a respeito de sua doença e de seu tratamento; VIII - ser tratada em ambiente terapêutico pelos meios menos invasi- vos possíveis; IX - ser tratada, preferencialmente, em serviços comunitários de saúdemental (BRASIL, 2001, p. 1). Com base na Lei 10.216 é se que se deu a criação da Política Nacional de Saúde Mental. De acordo com a Portaria do Ministério da Saúde nº399/GM, de 22 de feve- reiro de 2006, destaca-se que a saúde mental foi incluída como prioridade no Pacto pela Vida em 2007. É claro que ainda há um longo caminho a ser percorrido na área de saúde mental, de modo que as políticas públicas de saúde realmente consigam aten- der esse público de forma integral em todas as demandas. No entanto, é notório as conquistas alcançadas ao longo da história. Com a desinstitucionalização, busca-se inserir a pessoa com transtorno mental na sociedade, permitindo sua (re)inserção no mercado de trabalho, nos estudos, nas práticas de lazer, além de permitir seu convívio com a família e a sua desestigmatização. Nesse novo modelo de assistência em saúde mental, a família é considerada coparticipante no processo de reabilitação do indivíduo com transtorno mental, precisando ser amparada e capacitada pelos profissionais de saúde. POLÍTICAS PÚBLICAS DE SAÚDE NO BRASIL Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. IVU N I D A D E132 Em 2011, foi instituída a Rede de Atenção Psicossocial para pessoas com sofrimento ou transtorno mental e com necessidades decorrentes do uso de crack, álcool e outras drogas, no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). A articulação dessa Rede, com valorização para os CAPS como serviço estra- tégico em saúde mental, é um dos pontos importante para a garantia de acesso, integralidade do cuidado, além de resolutividade e qualidade no serviço prestado. Assim, faz-se necessário um olhar avaliativo para as políticas de saúde vigen- tes. Elas correspondem aos motivos pelos quais foram criadas? Considerações Finais Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 133 CONSIDERAÇÕES FINAIS O Brasil apresenta inúmeras políticas públicas de saúde. Nesta unidade, aborda- mos alguns marcos importantes e características de algumas políticas voltadas a grupos específicos, como: mulher, criança, adulto e idoso, saúde do idoso e populações vulneráveis. É importante destacar que as políticas públicas de saúde buscam atender às necessidades da comunidade em determinado momento, por isso elas não são estáticas, pelo contrário, são dinâmicas, estão em constante transforma- ção. Afinal, a sociedade, de forma geral, vive em constante transformação, seja ela econômica, cultural ou política. Assim, o estudo sobre a temática tem um começo, mas não um ponto final! Além disso, as políticas públicas de saúde vão se adequando às discussões que emergem em cada época, tanto pela sociedade como pelos profissionais envolvidos. Os modelos de assistência à saúde, por exemplo, apresentaram gran- des mudanças ao longo da história. Atualmente, é enfatizada a busca por uma assistência que preze pela integralidade do indivíduo, considerando-o um ser biopsicossocial e, nesse sentido, as políticas foram sendo re(construídas). É um grande desafio para os profissionais da saúde, em todas as esferas de governo, cumprirem com as propostas pactuadas por meio das políticas públi- cas. É necessário que as mesmas assegurem na prática os direitos constitucionais do cidadão. Por isso, é importantíssimo um bom preparo do aluno na academia para o exercício da profissão. As bases teóricas, no caso dessa Unidade, embasadas pela política e marcadas pela história, são relevantes para a compreensão da atualidade. Logo, a capacitação profissional de qualidade é fundamental na área da saúde, a fim de formar profissionais que implementem políticas públicas de saúde de acordo com as reais demandas da população, além de garantir na prática a ope- racionalização dos princípios do SUS. 134 O texto selecionado faz parte do manual do Ministério da Saúde sobre a Política Nacio- nal de Saúde Integral da População Negra. A leitura permite a compreensão dos movi- mentos sociais e das políticas gerais que antecederam a criação dessa política pública de saúde. “O desenvolvimento da sociedade colonial e o processo de objetificação dos milhões de negros escravizados, trazidos do continente africano nos porões dos navios negreiros, marcaram um período longo da história brasileira. A despeito das péssimas condições de vida e trabalho e das diversas formas de violência às quais foram submetidos, episó- dios de resistência e luta foram as bases para a formação de quilombos. Os quilombos, a princípio comunidades autônomas de escravos fugitivos, converteram- -se em importante opção de organização social da população negra e espaço de resgate de sua humanidade, cultura e fortalecimento da solidariedade e da democracia, onde negros se constituíam e se constituem até hoje como sujeitos de sua própria história. Após a abolição oficial da escravatura, foram muitos os anos de luta envolvendo denún- cias sobre a fragilidade do modelo brasileiro de democracia racial, até a fundação da Frente Negra Brasileira, em 1931. A partir de então, as questões e demandas de classe e de raça ganharam projeção na arena política brasileira, fortalecidas, posteriormente, pelo Movimento Social Negro, que atua organizadamente desde a década de 1970. Entre as décadas de 1930 e 1980, eclodiram no mundo inúmeros movimentos sociais que manifestaram aos chefes de Estado a insatisfação dos negros em relação à sua qua- lidade de vida. Assumiram proeminência a luta dos negros dos Estados Unidos contra as regras de segregação racial vigentes naquele país e a dos negros sul-africanos contra o sistema do apartheid. No Brasil, a 8ª Conferência Nacional de Saúde, realizada em 1986, constituiu um marco na luta por condições dignas de saúde para a população brasileira, uma vez que fechou questão em torno da saúde como direito universal de cidadania e dever do Estado. Na conferência, o Movimento Social Negro participou ativamente, ao lado de outros movi- mentos, em especial o Movimento pela Reforma Sanitária, do processo de elaboração e aprovação das propostas. Como principal desdobramento da conferência e conquista fundamental dos movimen- tos sociais, a Assembleia Nacional Constituinte introduziu o sistema de seguridade so- cial na Constituição Federal de 1988, do qual a saúde passou a fazer parte como direito universal, independentemente de cor, raça, religião, local de moradia e orientação sexu- al, a ser provido pelo SUS (BRASIL, 1988). Ainda nesse período, o movimento de mulheres negras conferiu maior visibilidade às questões específicas de saúde da mulher negra, sobretudo aquelas relacionadas à saúde sexual e reprodutiva. O racismo e o sexismo imprimem marcas segregadoras diferen- ciadas, que implicam restrições específicas dos direitos desse segmento, vitimando-o, portanto, com um duplo preconceito. 135 As primeiras inserções do tema Saúde da População Negra nas ações governamentais, no âmbito estadual e municipal, ocorreram na década de 1980 e foram formuladas por ativistas do Movimento Social Negro e pesquisadores. Na década de 1990, o governo federal passou a se ocupar do tema, em atenção às rei- vindicações da Marcha Zumbi dos Palmares, realizada em 20 de novembro de 1995, o que resultou na criação do Grupo de Trabalho Interministerial para Valorização da Po- pulação Negra (GTI) e do Subgrupo Saúde. Em abril do ano seguinte, o GTI organizou a Mesa-Redonda sobre Saúde da População Negra, cujos principais resultados foram: a) a introdução do quesito cor nos sistemas de informação de mortalidade e de nascidos vivos; b) a elaboração da Resolução CNS nº 196/96, que introduziu, entre outros, o recor- te racial em toda e qualquer pesquisa envolvendo seres humanos; e c) a recomendação de implantação de uma política nacional de atenção às pessoas com anemia falciforme. [...] A atuação do Movimento Social Negro brasileiro na 11ª e na 12ª ConferênciasNacionais de Saúde, realizadas respectivamente em 2000 e 2003, fortaleceu e ampliou sua parti- cipação social nas instâncias do SUS. Como resultado dessa atuação articulada, foram aprovadas propostas para o estabelecimento de padrões de equidade étnico-racial e de gênero na política de saúde do País. [...] Nos anos de 2005 e 2006 ocorreram diversos seminários, encontros, reuniões técnicas e políticas, que culminaram com a aprovação desta Política pelo CNS, em 10 de novembro de 2006. Merece destaque ainda a realização do II Seminário Nacional de Saúde da Po- pulação Negra, marcado pelo reconhecimento oficial por parte do MS da existência do racismo institucional nas instâncias do SUS”. Foram muitas as conquistas, até aqui, direcionadas a esse grupo considerado vulnerá- vel. No entanto, ainda há um longo caminho a ser percorrido no sentido de garantir a equidade à população negra nas diversas esferas da vida, especialmente no que tange à saúde. Fonte: Brasil (2013b). 136 1. Sobre as políticas públicas de saúde, no Brasil, voltadas à mulher, analise as ques- tões abaixo. I. As políticas públicas de saúde direcionadas a esse público iniciaram nas pri- meiras décadas do século XIX. II. Por um longo período, os programas de saúde materno-infantis refletiram a visão limitada da sociedade em relação à mulher, destacando o biológico e seu papel social de mãe e doméstica. III. O Programa de Assistência Integral à Saúde da Mulher (PAISM), foi lançado pelo Ministério da Saúde em 1983 e incorporou os princípios que nortearam a reforma sanitária. IV. A humanização e a qualificação da atenção em saúde são princípios nortea- dores da Política Nacional de Atenção Integral à Saúde da Mulher, criada em 2004. Assinale a alternativa correta. a. Somente as afirmativas I, II e III são verdadeiras. b. Somente as afirmativas I e IV são verdadeiras. c. Somente as afirmativas II, III e IV são verdadeiras. d. Todas as afirmativas são verdadeiras. 2. As políticas públicas voltadas à saúde da criança avançaram ao longo da história. Buscam uma assistência à saúde por meio da construção de redes e que garanta a integralidade do cuidado. Sobre o assunto, Assinale a alternativa correta. a. Desde os primórdios da humanidade, a figura da criança sempre foi permea- da de afeto, especialmente dentro do contexto familiar. b. O Programa de Assistência Integral à Saúde da Criança (PAISC), criado em 1984, possuía como objetivo promover ações de saúde, priorizando crianças com maior risco de adoecer. c. A Atenção Integrada às Doenças Prevalentes na Infância (AIDPI), buscou for- talecer e organizar a atenção primária à saúde, tendo como foco o cuidado e tratamento das doenças mais frequentes em crianças até 10 anos. d. As Redes de Atenção em Saúde é uma realidade em diversas áreas da saúde, exceto na saúde materno-infantil. e. Os eixos estratégicos da Política Nacional de Atenção Integral à saúde da Criança (PNAISC), desconsidera os determinantes sociais e condicionantes da saúde da criança. 137 3. O envelhecimento da população é uma realidade mundial. Nesse sentido, é ne- cessário criar estratégias de promoção da saúde e prevenção de doenças ao lon- go da vida, a fim de possibilitar uma velhice com maior qualidade de vida. Sobre as políticas públicas de saúde voltadas ao adulto e idoso, analise as questões abaixo. I. Um dos objetivos da Política Nacional de Atenção Integral à Saúde do Homem (PNAISH) é aproximar a população masculina do serviço de saúde, tendo a atenção primária como porta de entrada, já que muitos adentram o sistema de saúde pela atenção especializada. II. O Estatuto do idoso representou uma grande conquista da população idosa brasileira, garantindo a eles direitos em diversas áreas, inclusive o direito à saúde por meio do SUS. III. O processo de transição epidemiológica que acontece no Brasil é marcado pelo aumento das mortes por doenças infectocontagiosas e queda progressi- va das mortes por doenças crônicas, a exemplo das neoplasias e hipertensão arterial. IV. A Política Nacional de Saúde da Pessoa Idosa (PNSPI), criada pelo Ministério da Saúde em 2006, destaca a necessidade de se considerar essa população igual às demais, sem distinção de grupos ou estratos, a fim de não gerar dis- criminação. Assinale a alternativa correta. a. Apenas I e II estão corretas. b. Apenas II e III estão corretas. c. Apenas I está correta. d. Apenas II, III e IV estão corretas. e. Nenhuma das alternativas está correta. 138 4. Sobre as políticas públicas de saúde mental, assinale a alternativa correta: a. A Reforma Psiquiátrica no Brasil ainda está em processo de consolidação, vis- to que muitos hospitais psiquiátricos ainda não aumentaram o número de leitos. b. São objetivos dos Centros de Atenção Psicossocial (CAPS): acolher os pacien- tes com transtornos mentais, auxiliá-los na sua integração familiar e na socie- dade, além de encorajá-los na busca pela autonomia. c. A Política Nacional de Saúde Mental propõe uma série de mudanças direcio- nadas à saúde das pessoas com transtorno mental; no entanto, mantém o mesmo modelo assistencial praticado no século XVIII. d. A Declaração de Caracas, divulgada em 1990, fortaleceu a ideia de que pesso- as com transtorno mental eram perigosas e precisavam ser tratadas em insti- tuições psiquiátricas. e. A Rede de Atenção Psicossocial para pessoas com sofrimento ou transtorno mental possui como ponto estratégico os hospitais psiquiátricos. 5. Conhecer a vulnerabilidade de determinada população faz-se necessário para a elaboração de estratégias assertivas de promoção da saúde e prevenção de doenças. Sobre as políticas públicas de saúde direcionadas às populações vul- neráveis (pessoas com deficiência, pessoas em situação de rua, pessoas negras, pessoas idosas e grupo LGBT), assinale a alternativa correta. a. O Estatuto da Pessoa com Deficiência garante, entre outros fatores, o direito à saúde, sem, contudo, abordar sobre o acesso aos serviços de habilitação e de reabilitação. b. Uma estratégia encontrada para a assistência à saúde das pessoas em situa- ção de rua foi a criação do Consultório na Rua, o qual está vinculado a uma assistência exclusivamente curativa. c. A Política Nacional de Saúde Integral dos LGBT tem muitos objetivos, entre eles destacam-se: a eliminação da discriminação e preconceito, bem como contribuição para a redução das desigualdades e a consolidação do SUS como sistema universal, integral e equitativo. d. As desigualdades sociais observadas na população negra em nada se relacio- nam com o acesso desse grupo às questões relativas à saúde. e. O termo vulnerabilidade pode ser entendido como sinônimo de incapacida- de quando se aborda o processo de envelhecimento da pessoa idosa. Material Complementar MATERIAL COMPLEMENTAR Política Nacional de Atenção Integral à Saúde da Mulher. Princípios e Diretrizes Ministério da Saúde Editora: Ministério da Saúde Sinopse: o manual do Ministério da Saúde apresenta a Política Nacional de Atenção Integral à Saúde da Mulher, com destaque para seus objetivos e princípios. Ilha do Medo trata-se de um suspense que acontece em uma prisão psiquiátrica para detentos de alta periculosidade, a qual fi ca localizada em uma ilha. Leonardo DiCaprio representa um agente federal que é encaminhado a essa ilha para investigar a morte de uma interna. O personagem faz críticas à instituição, dado a forma como os pacientes psiquiátricos eram tratados. Nise, o coração da loucura fi lme nacional que conta a história da psiquiatra Nise da Silveira, interpretada pela atriz Glória Pires. A médica propõe uma nova forma de tratamento aos pacientes que sofrem da esquizofrenia, eliminando o eletrochoque e lobotomia. Seus colegas de trabalho discordam do seu meio de tratamento e a isolam, restando a ela assumir o abandonado Setor de Terapia Ocupacional, em que dá início a uma nova forma de lidar com os pacientes, por meio do amor e da arte. REFERÊNCIAS ARAÚJO,J. P. et al. História da saúde da criança: conquistas, políticas e perspectivas. Rev Bras Enferm. v. 67, n. 6, p. 1000-7, 2014. ARIÈS, P. História social da criança e da família. 2. ed. Rio de Janeiro: Livros Técni- cos e Científicos, 2011. BANDEIRA, M. O bicho. In: BANDEIRA, M. Estrela da vida inteira. 20. ed. Rio de Ja- neiro: Nova Fronteira, 1993. BERTOLOZZI, M. R. et al. Os conceitos de vulnerabilidade e adesão na Saúde Coleti- va. Rev. esc. enferm. USP. v. 43, n. 2, p. 1326-1330, 2009. BRASIL. Conferência Nacional de Saúde, 8, Brasília, 1987. I Conferência Nacional de Saúde Mental: relatório final. Brasília: Centro de Documentação do Ministério da Saúde, 1988. ______. Controle dos cânceres do colo do útero e da mama. 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Plano de Estudo A seguir, apresentam-se os tópicos que você estudará nesta unidade: ■ Conhecendo a PNH ■ Diretrizes e dispositivos da PNH ■ Segurança e direito do paciente ■ Atenção à saúde do trabalhador ■ Desafios para a humanização nos serviços da saúde INTRODUÇÃO Olá, Caro(a) aluno(a), estamos quase chegando na reta final. Percorremos um longo caminho até aqui. Nesse percurso, acredito que você conseguiu compre- ender os diversos aspectos que tornam a saúde pública tão ampla e complexa e, ao mesmo tempo, tão fascinante. Conseguimos preparar uma bagagem bastante vasta de conhecimento, a qual será de grande relevância para o melhor entendimento do temaque abordaremos. Nesta unidade, iremos discutir sobre a humanização, um termo bastante uti- lizado na área da saúde atualmente, mas que ainda gera dúvidas quanto ao seu significado e operacionalização. Talvez porque o assunto ultrapasse as questões técnicas e instrumentais, alçando dimensões político-filosóficas. A humanização é um aspecto fundamental nas políticas de saúde, por isso foi criada a Política Nacional de Humanização (PNH), que surgiu para reconstruir o modelo de assistência à saúde, bem como a gestão dos processos de trabalho. Assim, uma das propostas de estudo para esse momento é conhecer a PNH, seus objetivos, princípios, diretrizes e dispositivos. Iremos abordar, também, aspec- tos relativos à segurança e direitos do paciente; saúde do trabalhador, bem como os principais desafios para que a humanização aconteça de fato nas instituições de saúde. A reflexão sobre a humanização na prática assistencial em saúde, desde a ela- boração de políticas públicas, gestão e co-gestão, nos processos de trabalho, até a realização do cuidado ao usuário, extrapolando as relações e afetando também as estruturas, sejam elas físicas ou não. É um exercício muito importante para todos os profissionais da área da saúde (Médicos, Dentistas, Tecnólogos em Estética e Cosmética, Biomédicos, Enfermeiros, Podólogos, Fisioterapeutas, Terapeutas Integrativos e Complementares, Psicólogos, Nutricionistas, Fonoaudiólogos, Terapeutas Ocupacionais e outros). Então, sugiro que você aproveite esse momento não só para se apropriar da temática, mas também para repensar sobre o profissional que você deseja ser. Precisamos ser a mudança que queremos ver nos serviços de saúde. Dessa forma, desejo, a você força de vontade, dedicação e organização para aproveitar ao máximo essa oportunidade. Bons estudos! Introdução Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 147 POLÍTICA NACIONAL DE HUMANIZAÇÃO (PNH) Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. VU N I D A D E148 CONHECENDO A PNH Antes de conhecermos a Política Nacional de Humanização (PNH), é impor- tante refletirmos sobre o significado da palavra humanização. Pare um instante e tente responder às seguintes questões: o que é humanização? Como humani- zar o humano? O que eu entendo sobre humanização na saúde? Em 2000, o Ministério da Saúde instituiu o Programa Nacional de Humanização da Atenção Hospitalar (PNHAH), cujo objetivo principal é aprimorar as relações entre usuários e profissionais; entre os próprios profissionais e entre o serviço De acordo com o Dicionário da Língua Portuguesa, humanização significa o “ato ou efeito de humanizar”. E humanizar é “tornar humano, tornar tratável, civilizar” (MINIDICIONÁRIO DA LÍNGUA PORTUGUESA, 2007). Na área da saúde, o termo “humanização” começou a ser utilizado a partir do século XXI, partindo de discussões e recomendações realizadas pelo Minis- tério da Saúde. Humanizar a saúde é bastante complexo, pois envolve uma série de questões, como: respeito à unicidade de cada indivíduo; políticas públicas, no sentido de garantir igualdade de acesso aos serviços; envol- ve processo de trabalho; competência profissional; cuidado voltado àquele que cuida, como uma das formas de valorizar o trabalhador etc (BERMEO, 2008). Fonte: adaptado de Minidicionário da Língua Portuguesa (2007) e Bermeo (2008). Conhecendo a PNH Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 149 hospitalar e a comunidade. A intenção do Programa é promover uma nova forma de “fazer” saúde, que impacte na qualidade da assistência prestada pelas insti- tuições vinculadas ao SUS. Em 2003, a humanização, antes considerada programa, passa a ser uma polí- tica - A Política Nacional de Humanização da atenção e gestão do SUS (PNH), também conhecida como HumanizaSUS. A humanização, enquanto política do SUS, não se relaciona apenas a pes- soas (usuários - trabalhadores - gestores) e suas ações, mas também envolve a relação existente entre elas e ambiente em que atuam. A PNH suscita modos de ser e fazer saúde. De acordo com o Ministério da Saúde, a humanização pode ser compreen- dida como: [...] valorização dos diferentes sujeitos implicados no processo de pro- dução de saúde: usuários, trabalhadores e gestores; Fomento da auto- nomia e do protagonismo desses sujeitos; Aumento do grau de corres- ponsabilidade na produção de saúde e de sujeitos; Estabelecimento de vínculos solidários e de participação coletiva no processo de gestão; Identificação das necessidades sociais de saúde; Mudança nos mode- los de atenção e gestão dos processos de trabalho, tendo como foco as necessidades dos cidadãos e a produção de saúde; Compromisso com a ambiência, melhoria das condições de trabalho e de atendimento (BRASIL, 2004, p.15). A PNH propõe uma nova forma de gerir e cuidar a partir de três princípios básicos: ■ Transversalidade. O caráter transversal da PNH refere-se ao fato de que ela deve estar inserida em todas as políticas e programas do SUS, ampliando a comunicação dentro dos grupos e entre os mesmos; ■ Indissociabilidade entre atenção e gestão. A gestão e a forma de gerir saúde está intimamente ligada à atenção prestada. Tanto os usuários como os trabalhadores, além de conhecer a forma de gestão dos serviços de saúde, precisam ser ativos no processo de tomada de decisão. ■ Protagonismo, corresponsabilidade e autonomia dos sujeitos e coletivos. No SUS humanizado, cada um (usuário, trabalhador e gestor) tem o seu papel bem definido, seus direitos e suas responsabilidades na constru- ção da saúde. POLÍTICA NACIONAL DE HUMANIZAÇÃO (PNH) Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. VU N I D A D E150 A PNH pode ser implantada em qualquer serviço de saúde, desde uma Unidade Básica de Saúde, Unidade de Pronto Atendimento, hospitais e secretarias de saúde, ou seja, em toda a rede pública, desde que seja firmado um compromisso entre gestores, trabalhadores e usuários para a reorganização das práticas de saúde, aceitando as propostas da PNH. Dentro desta reorganização das práticas de saúde, podemos observar a inser- ção pelo Ministério da Saúde, de novas propostas de tratamentos, com a criação da Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares (PNPIC) no SUS, com a aprovação da Portaria Nº 971, de 03 de maio de 2006, que visava garantir a população condições de bem-estar físico, mental e social, ofertando cinco procedimentos na área de tratamentos holísticos (Medicina Tradicional Chinesa/Acupuntura, Homeopatia, Plantas Medicinais e Fitoterapia, Medicina Antroposófica e Termalismo Social/Crenoterapia). Em 2017, foram incluídos ao SUS mais 14 terapias, somando 19 práticas dis- poníveis à população, sendo estas: ayurveda, arteterapia, biodança, dança circular, meditação, musicoterapia, naturopatia, osteopatia, quiropraxia, reflexoterapia, reiki, shantala, terapia comunitária integrativa e yoga. Com o aumento da procura destas técnicas de tratamento, devido a evidências científicas dos benefícios do tratamento integrado entre medicina convencional e práticas integrativas e complementares, em 21 de março de 2018, foram acres- centadas mais dez novas práticas na Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares – PNPIC, através da Portaria N° 702, alterando a Portaria de Consolidação nº 2/GM/MS, de 28 de setembro de 2017. Estas dez técnicas introduzidas (aromaterapia, apiterapia, bioenergética, constelação familiar, cromoterapia, geoterapia, hipnoterapia, imposição de mãos, ozonioterapia, terapia de florais), fez do Brasil o país líder na oferta dessa modali- dade na atenção básica, pois passa a contar com 29 práticas integrativas pelo SUS. Mas qual é o caminho/método a ser percorrido paraa operacionalização da PNH? O Ministério da Saúde propõe que a PNH deva caminhar no sentido da inclusão de diferentes agentes nos processos de produção da saúde, denomi- nado “método de tríplice inclusão” (BRASIL, 2008). Diretrizes e Dispositivos da PNH Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 151 Quadro 1 - Método de tríplice inclusão Inclusão dos gestores, usuários e trabalhadores na produção de auto- nomia protagonismo e corresponsabilidade. Inclusão de fenômenos que promovam o pensa- mento crítico e analítico sobre os modelos de atenção e gestão, no sen- tido de gerar mudanças. Inclusão do coletivo, seja dos trabalhadores de saúde, quando em trabalho grupal, seja do movimento social orga- nizado. Fonte: Brasil (2008). A valorização do sujeito pela PNH implica em incluí-lo no processo de traba- lho como um agente capaz de identificar lacunas e construir estratégias para saná-las. Cuidar do cuidador/trabalhador de saúde é possibilitar a construção conjunta de estratégias para “aliviar as dores”/sofrimentos, muitas vezes oca- sionados pela forma de gestão e organização do trabalho (PASCHE; PASSOS; HENNINGTON, 2011). DIRETRIZES E DISPOSITIVOS DA PNH As diretrizes da PNH referem-se às orientações gerais acerca dessa política pública de saúde. As diretrizes serão apresentadas brevemente no quadro abaixo (BRASIL, 2008): Quadro 2 - Diretrizes da PNH Clínica ampliada Envolve uma abordagem clínica da doença e do sofrimento que vai além do patológico. Isso permite uma visão am- pliada do sujeito, pois considera suas outras dimensões dentro do processo saúde-doença. Considera o indivíduo como único, busca pela integralidade, combate o modelo fragmentado de assistência em saúde. Por meio do diálogo entre os sujeitos é possível a construção de decisões com- partilhadas e comprometidas com a autonomia. POLÍTICA NACIONAL DE HUMANIZAÇÃO (PNH) Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. VU N I D A D E152 Co-gestão Refere-se à inclusão de novos sujeitos no modo de gerir, bem como a ampliação de tarefas da gestão. Envolve a interação de pessoas e recursos para se alcançar os objetivos e metas. Acolhimento Remete ao reconhecimento da legitimidade da necessidade do outro, o que envolve escuta ativa e qualificada, criação de vínculo. O acolhimento realizado a partir da necessidade do sujeito, permite o acesso àquilo que ele realmente preci- sa, além de permitir que situações de maior vulnerabilidade sejam atendidas com prioridade. Valorização do trabalho e do trabalhador Destaca a importância do trabalhador na tomada de decisão; considerando sua capacidade de análise crítica, reflexiva e de geração de mudanças. Defesa dos Direi- tos do Usuário Os usuários possuem uma série de direitos e cabe aos pro- fissionais e serviços de saúde divulgar esse conhecimento, bem como contribuir para que eles sejam cumpridos. Fomento das grupalidades, coletivos e redes Considera o grupo não apenas como um conjunto de indi- víduos, é muito mais do que isso. O grupo é de um coletivo que está em constante transformação, compondo uma rede na qual o processo de produção de saúde se realiza. A reorganização da gestão e assistência à saúde só faz senti- do se partir do coletivo, ou seja, dos atores do processo; é o que o torna democrático. A construção das redes foi uma das estratégias para ampliar a comunicação entre os serviços, de modo a melhorar a qualidade da assistência prestada. Construção da memória do SUS que dá certo A história do SUS revela inúmeros desafios, porém muitas conquistas foram alcançadas e devem ser divulgadas. Bus- car a memória do SUS, os pontos-chaves e marcos impor- tantes podem auxiliar a repensar o presente e planejar o futuro. Fonte: adaptado de Brasil (2008). Os dispositivos da PNH são meios de colocar em prática as diretrizes apresen- tadas anteriormente. São eles (BRASIL, 2008): ■ Acolhimento e Classificação de Risco (ACR); ■ Colegiado Gestor; ■ Contrato de Gestão; Diretrizes e Dispositivos da PNH Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 153 ■ Equipe Transdisciplinar de Referência e de Apoio Matricial; ■ Grupo de Trabalho de Humanização (GTH) e Câmara Técnica de Humanização (CTH); ■ Programa de Formação em Saúde e Trabalho (PFST) e Comunidade Ampliada de Pesquisa (CAP); ■ Projeto memória do SUS que dá certo; ■ Projeto Terapêutico Singular (PTS) e Projeto de Saúde Coletiva; ■ Projetos cogeridos de ambiência; ■ Sistemas de escuta qualificada para usuários e trabalhadores da saúde: gerência de porta aberta, ouvidorias, grupos focais e pesquisas de satisfação. ■ Visita aberta e direito a acompanhante. A Ambiência na saúde é um termo bastante usado no contexto da humani- zação dos serviços, pois refere-se ao tratamento do espaço/território físico de modo que ele seja acolhedor, confortável. Nesse sentido, é fundamental valorizar os componentes do ambiente, como cor, cheiro, luz, texturas e sons, por acreditar que um bom espaço físico pos- sa otimizar o encontro entre pessoas e ser um facilitador do processo de trabalho. Vale destacar que a ambiência extrapola a ideia de uma estruturação físico- -funcional. Envolve aspectos culturais e de modo de vida, como, por exem- plo, a privacidade do indivíduo; acessibilidade e acesso sem discriminação; aspectos relativos à ergonomia, conforto térmico e acústico. Fonte: Brasil (2010). POLÍTICA NACIONAL DE HUMANIZAÇÃO (PNH) Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. VU N I D A D E154 SEGURANÇA E DIREITO DO PACIENTE A preocupação em discutir sobre a segurança do paciente nas institui- ções de saúde acontece em a nível global. Trata-se de um componente importantíssimo para a qualidade da assistência; logo, é um indicador de saúde que deve ser analisado criterio- samente pelos profissionais de saúde e gestores nesta área. Quando um erro acontece, infrin- gindo a segurança do paciente, os prejuízos podem ser diversos para o mesmo, podendo se estender para sua família; na maioria das vezes, prolonga-se o tempo de internação, o que também pode gerar novos riscos, além de elevar os custos hospitalares; a morte, infe- lizmente, pode ser também uma consequência. Diante de um erro praticado, destacam-se, ainda, os efeitos psicológicos traumáticos na vida dos profissionais de saúde que prestam o cuidado (DE CARVALHO; VIEIRA, 2002). Foi nos Estados Unidos, a partir do relatório do Institute of Medicine, no final do século XX, que se iniciou um movimento sobre a segurança do paciente. O relatório mostrou dados sobre a assistência à saúde no país, identificando taxas alarmantes de eventos adversos que culminaram em mortes após a internação de pacientes (KOHN; CORRIGNAN; DONALDSON, 2001). A partir do ano 2000, o mundo todo passa a reconhecer a segurança do paciente como uma dimensão da qualidade da assistência em saúde. Nesse sen- tido, surgem muitas pesquisas, bem como a criação de institutos e associações voltadas à segurança do paciente (CASSIANI, 2005). Frente à magnitude do problema, a Organização Mundial de Saúde estabeleceu, em 2004, a Aliança Mundial para a Segurança do Paciente (World Alliance for Patient Safety). Trata-se de um compromisso firmado entre diversos países, com o intuito de definir e identificar prioridades acerca da segurança do paciente (WHO, 2008). Segurança e Direito do Paciente Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 155 Em 2013, o Ministério da Saúde, por meio da portaria GM/MS nº 529, ins- tituiu o Programa Nacional de Segurança do Paciente (PNSP), cujo objetivo principal é melhorar a qualidade do cuidadoem saúde nos estabelecimentos nacionais. Ainda em 2013, foram aprovados seis protocolos básicos de segurança do paciente: 1. Identificação do Paciente; 2. Prevenção de úlcera por pressão; 3. Segurança na prescrição, uso e administração de medicamentos; 4. Cirurgia segura; 5. Prática de higiene das mãos em serviços de saúde; 6. Prevenção de quedas. Mesmo com tantas ações mundiais em prol da segurança do paciente, ainda há muito o que fazer. Uma pesquisa realizada em cinco países da américa latina entre 2007 e 2009 mostrou que 10,5% dos pacientes hospitalizados sofreram algum tipo de evento adverso, sendo que 58,9% poderiam ter sido evitados (ANVISA, 2013). Em relatório realizado em mais de 30 mil hospitais da Europa, em 2013, foi evidenciado que um em cada 18 pacientes apresenta infecção associada à assis- tência em saúde, o que alerta para a necessidade urgente de estratégias que tentem sanar esse sério problema de saúde pública (FARIA; MOREIRA; PINTO, 2013). De acordo com Silva (2010), o grande desafio dessa temática está na com- preensão de que as causas dos eventos adversos são multifatoriais e que todos os profissionais de saúde são suscetíveis a cometer erros, especialmente quando o processo de trabalho é complexo e/ou encontra-se mal organizado. Quantas vezes já ouvimos na mídia sobre casos de pacientes que foram lesados devido a erros provocados por profissionais de saúde? Erros na administração de medicação, troca de pacientes submetidos a um procedimento cirúrgico, falhas na prescrição médica, entre muitos outros. James Reason, professor de psicologia da Universidade de Manchester, Reino Unido, tentou explicar o caráter multifatorial das falhas de segurança por meio da POLÍTICA NACIONAL DE HUMANIZAÇÃO (PNH) Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. VU N I D A D E156 teoria sobre o erro humano, também conhecida como “queijo suíço”. Ele compara as fragilidades do sistema de saúde aos buracos do queijo. O alinhamento entre vários furos do queijo suíço é que irá culminar em perdas ou danos (REASON; CARTHEY; DE LEVAL, 2001). Modelo de causa de acidente - Queijo Suiço Sucessivas camadas de defesas, barreiras e proteções Perdas Perigos Outros buracos devido às condições latentes (falha de equipamento, falta de treinamento ou experiên- cia da equipe) Alguns buracos devido a falha ativa (erro, violações de procedi- mento) Figura 1 - Modelo do Queijo Suíço Fonte: Reason (2006). Pensando no Modelo do Queijo Suíço aplicado à área da saúde, que estra- tégias poderiam ser implementadas para evitar o desencadeamento de um evento adverso? Segurança e Direito do Paciente Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 157 Donabedian (1980) tenta explicar a ocorrência dos eventos adversos por meio da tríade – estrutura - processo - resultado. A estrutura relaciona-se a aspec- tos mais estáveis, como os profissionais, os instrumentos de trabalho, os locais e modelos de organização dos serviços. O processo envolve as ações realizadas pelos profissionais em direção ao paciente, bem como as respostas destes àquilo que foi realizado. O resultado pode ser representado pela efetividade e eficiên- cia das atividades praticadas, bem como pelo grau de satisfação do paciente. Existem muitos estudos de campo que buscam investigar as causas dos even- tos adversos na área da saúde. Muitos deles relacionados a erros de medicação. Estudo de revisão sobre erros de medicação entre profissionais de enfer- magem mostrou que entre as principais causas estão a sobrecarga de trabalho, cansaço e estresse do profissional (DOS SANTOS et al., 2014). Independentemente de qualquer situação, é sabido que o paciente tem o direito de receber uma assistência em saúde segura, o que consiste em um des- dobramento do direito à vida, já que a falta de segurança pode ocasionar a morte. Em 2009, o Conselho Nacional de Saúde aprovou a Carta dos Direitos dos Usuários da Saúde, a qual apresenta seis princípios básicos (BRASIL, 2011): ■ Todo cidadão tem direito ao acesso ordenado e organizado aos sistemas de saúde. ■ Todo cidadão tem direito a tratamento adequado e efetivo para seu problema. ■ Todo cidadão tem direito ao atendimento humanizado, acolhedor e livre de qualquer discriminação. ■ Todo cidadão tem direito a atendimento que respeite a sua pessoa, seus valores e seus direitos. ■ Todo cidadão também tem responsabilidades para que seu tratamento aconteça da forma adequada. ■ Todo cidadão tem direito ao comprometimento dos gestores da saúde para que os princípios anteriores sejam cumpridos. É importante destacar que a Carta dos Direitos dos Usuários da Saúde é um dos dispositivos da Política Nacional de Humanização, tema discutido nos tópicos POLÍTICA NACIONAL DE HUMANIZAÇÃO (PNH) Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. VU N I D A D E158 anteriores. Acredita-se que promover uma assistência de qualidade a todos os cidadãos, com alta resolutividade, em ambiente acolhedor, faça parte de um atendimento humanizado. Embora exista a constituição que garanta os direitos do paciente, é notório o distanciamento entre o que está em lei e a prática dos serviços de saúde. Muitos pacientes desconhecem seus direitos, e outros, por medo de represália das insti- tuições e/ou profissionais de saúde, se negam a exigi-los, se omitem (VELOSO; SPINDOLA, 2005). Nesse sentido, a criação de espaços democráticos criados pela sociedade são importantes para exigir dos gestores políticas públicas e uma administração que busque por medidas de proteção aos direitos do paciente (CHAUÍ, 2006). De acordo com Gomes et al. (2008, p. 774) “a educação mostra-se como uma possibilidade de acesso à informação e consciência política em direção a uma mudança nas práticas de saúde que ferem a dignidade humana”. É relevante, também, que os profissionais de saúde se sintam responsabi- lizados em fornecer informações aos pacientes sobre os seus direitos. A partir da apropriação desse conhecimento, é possível maior controle social e partici- pação coletiva nas ações e processos de gerir a saúde. Lembrando que aspectos relativos à autonomia e corresponsabilidade fazem parte da PNH, proposta pelo Ministério da Saúde. Atenção à Saúde do Trabalhador Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 159 ATENÇÃO À SAÚDE DO TRABALHADOR Sabemos que, na nossa sociedade, o trabalho não diz respeito apenas a uma fonte de renda que permite que as pessoas possuam coisas, mas relaciona-se, ainda, com reconhecimento, honra e realizações. Além disso, é preciso considerar que o trabalho também pode gerar proble- mas que afetam a saúde, ocasionados pelo estresse ou pela exposição a condições perigosas, entre muitas outras situações. Este esgotamento causado pelo estresse em um grande número na população é que incentivou o aumento da oferta das Práticas Integrativas e Complementares (PICS), pelo SUS. Nesse tópico, iremos tratar sobre a saúde do trabalhador; mas, o que signi- fica esse termo? E por quê discutir esse assunto na saúde pública? De acordo com o Ministério da Saúde, o termo Saúde do Trabalhador refe- re-se “a um campo do saber que visa compreender as relações entre o trabalho e o processo saúde/doença” (BRASIL, 2001, p. 7). “A gente não quer só comer A gente quer prazer pra aliviar a dor A gente não quer só dinheiro, A gente quer dinheiro e felicidade A gente não quer só dinheiro, A gente quer inteiro e não pela metade” (Arnaldo Antunes) POLÍTICA NACIONAL DE HUMANIZAÇÃO (PNH) Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. VU N I D A D E160 O trecho da música “Comida”, de Arnaldo Antunes, interpretada pela banda Titãs, é quase que uma reivindicaçãopara um olhar mais atento ao trabalhador, que possui múltiplas dimensões e, consequentemente, necessidades distintas, as quais precisam ser valorizadas. Os trabalhadores estão expostos a uma série de riscos ambientais e organi- zacionais em função de sua inserção nos processos de trabalho. Logo, o setor da saúde necessita incorporar esses indivíduos em estratégias de promoção, pre- venção e recuperação da saúde. Foi apenas a partir da década de 80 que a visão em relação ao trabalhador começou a se modificar; ele passa a ser reconhecido como sujeito e não apenas como consumidor dos serviços de saúde. A própria Constituição Brasileira de 1988, na seção de Direitos à Saúde, artigo 200, destaca como competência do SUS, entre outras atribuições, “exe- cutar as ações de vigilância sanitária e epidemiológica, bem como as de saúde do trabalhador”. Em 1990, a Lei Orgânica de Saúde (Lei n° 8080), regulamentou o SUS e suas competências no campo da Saúde do Trabalhador, reconhecendo o traba- lho como um importante determinante de saúde. Nesta mesma década, muitas iniciativas foram registradas no sentido de con- solidar a área de saúde do trabalhador, como: ■ 1994 - 2ª Conferência Nacional de Saúde do Trabalhador. ■ 1998 - Elaboração da Norma Operacional de Saúde do Trabalhador (NOST). ■ 1998 - Instrução Normativa de Vigilância em Saúde do Trabalhador. ■ 1999 - Listagem de Doenças Relacionadas ao Trabalho. Dada a dispersão das ações voltadas à saúde do trabalhador é que, em 2002, foi criada a Rede Nacional de Atenção Integral à Saúde do Trabalhador (RENAST), cujo objetivo principal é realizar a articulação das ações em saúde do trabalha- dor no contexto do SUS. Para tanto, existem os Centros de Referência em Saúde do Trabalhador (CEREST). Atenção à Saúde do Trabalhador Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 161 Um modelo de atenção integral à saúde dos trabalhadores impli- ca em qualificar as práticas de saúde, envolvendo o atendimento dos acidentados do trabalho, dos trabalhadores doentes, das urgências e emergências às ações de promoção e proteção da saúde e de vigilância, orientadas por critério epidemiológico. Para que isso ocorra de modo efetivo, faz-se necessária abordagem interdisciplinar e a utilização de instrumentos, saberes, tecnologias originadas de diferentes áreas do conhecimento, colocados a serviço das necessidades dos trabalhadores (BRASIL, 2006, p. 17). Em 2011, a partir do Decreto 7.602, foi criada a Política Nacional de Segurança e Saúde no Trabalho (PNSST), na busca de articular ações de diferentes setores, como Trabalho, Previdência Social, Saúde e Meio Ambiente. As diretrizes que regem a PNSST são: [...] inclusão de todos trabalhadores brasileiros no sistema nacional de promoção e proteção da saúde; harmonização da legislação e a articula- ção das ações de promoção, proteção, prevenção, assistência, reabilita- ção e reparação da saúde do trabalhador; adoção de medidas especiais para atividades laborais de alto risco; estruturação de rede integrada de informações em saúde do trabalhador; promoção da implantação de sistemas e programas de gestão da segurança e saúde nos locais de trabalho; reestruturação da formação em saúde do trabalhador e em segurança no trabalho e o estímulo à capacitação e à educação conti- nuada de trabalhadores; e promoção de agenda integrada de estudos e pesquisas em segurança e saúde no trabalho (BRASIL, 2011, p. 1). O Ministério da Saúde, em 2012, instituiu a Política Nacional de Saúde do Trabalhador e da Trabalhadora (PNST), por meio da Portaria GM/MS n° 1.823. Esta se alinha a todas as outras políticas de saúde do SUS, o que confere a ela o caráter de transversalidade. POLÍTICA NACIONAL DE HUMANIZAÇÃO (PNH) Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. VU N I D A D E162 A saúde do trabalhador, enquanto área do conhecimento, encontra-se em cons- trução. Muitas conquistas foram alcançadas, mas ainda há um longo caminho pela frente. A integralidade da assistência à saúde do trabalhador precisa ser colocada em prática e, para isso, entre outras coisas, é preciso extrapolar a esfera bioló- gica e individual, interferindo nas questões relativas ao processo de trabalho. Com a globalização; aumento da competitividade; crise financeira em diversos setores, que acaba por culminar em elevadas taxas de desemprego; crescimento dos trabalhadores informais e temporários; ocorre uma série de transformações na vida do trabalhador que, com certeza, impactam em sua saúde (SILVEIRA, 2009). As reais condições de trabalho precisam ser identificadas e analisadas profun- damente, a fim de “reverter a cultura de que o trabalho é bom independentemente das condições em que é realizado” (LOURENÇO; BERTANI, 2007, p. 125). A Previdência Social garante uma série de benefícios a trabalhadores com carteira assinada vítimas de acidentes e doenças relacionadas ao trabalho, desde que comprovada a incapacidade para o trabalho por parte da perícia médica. São exemplos de benefícios previstos pela legislação previdenciária: auxílio- -doença, aposentadoria por invalidez, auxílio-acidente, pensão por morte e reabilitação profissional. Em casos de acidentes ou doenças relacionadas ao trabalho, mesmo que esses eventos não tenham gerado incapacidades, faz-se necessário o pre- enchimento de uma ficha denominada “Comunicação de Acidente de Tra- balho” (CAT), a qual é utilizada para fins estatísticos e epidemiológicos, bem como para assegurar alguns direitos previstos em lei. Fonte: adaptado de Silveira (2009). Desafios Para a Humanização nos Serviços da Saúde Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 163 DESAFIOS PARA A HUMANIZAÇÃO NOS SERVIÇOS DA SAÚDE Como já foi abordado anterior- mente, o tema humanização tem conquistado um espaço signifi- cativo na área da saúde e tem sido considerado como um dos caminhos para transformações no SUS, com vistas à melhora na qualidade assistencial e nos pro- cessos de trabalho e gestão. A humanização visa romper com a fragmentação do cuidado, do trabalho e da rede de assis- tência à saúde. Não refere-se a uma maquiagem nos serviços de saúde, como utilizar cores e desenhos nas paredes; ser gentil e educado com o usuário; ou, ainda, bonificar o profissional por bom desempenho. Vai além. Por tudo isso, percebe-se que a operacionalização da humanização no SUS possui uma série de desafios. Um deles, segundo Martins (2010), refere-se a desconstruir os processos hierárquicos para, então, se trabalhar em redes. As redes de atenção à saúde são formadas por diversos pontos (serviços), que se conectam/se comunicam na construção da intersetorialidade e da integralidade. No entanto, as redes tam- bém podem ser compostas de afetos, vivências, políticas, um emaranhado de aspectos de grande relevância para a produção de saúde. Considerando que a humanização envolve também o relacionamento entre usuários e profissionais de saúde, faz-se necessário romper com o mecanicismo, muito vezes inerente às relações de trabalho. Nesse sentido, é preciso repensar em novas formas de interação entre os atores (gestores, usuários e profissionais), de forma que os mesmos atuem como sujeitos ativos de um processo e não sendo submissos a ele (BRASIL, 2010). POLÍTICA NACIONAL DE HUMANIZAÇÃO (PNH) Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. VU N I D A D E164 A literatura destaca como desafio o exercício de não colocar a PNH como ver- dade absoluta, imutável, mas que ela possa ser uma forma de pensar e fazer saúde, que ela sirva para fazermos uma reflexão crítica e, a partir dela, tornar o pro- cesso dinâmico e inovador (HECKERT; PASSOS; BARROS, 2009). Estudo aponta como dificuldades parase colocar em prática a proposta da humanização aspectos como: influência direta do modelo organizacional, dos desenhos da missão institucional, do envolvimento e aderência dos gerentes à proposta, da capacitação e sensibilidade dos profissionais (DIAS; DOMINGUES, 2005). Uma pesquisa qualitativa, realizada em uma enfermaria de Pediatria de um instituto de referência no cuidado da Saúde da Mulher, Criança e Adoles- cente, tendo como sujeitos a equipe de enfermagem, usuários e acompa- nhantes, identificou que os princípios fundamentais da humanização não ocorrem de forma efetiva na relação entre os sujeitos. Destacou-se como princípios da humanização: acolhimento, autonomia, protagonismo e corresponsabilidade. O estudo apontou, ainda, a presença de lacunas na compreensão da proposta de um projeto de humanização para o serviço. Para a equipe de saúde, a humanização está atrelada a prestar uma assistên- cia de qualidade, no entanto sem refletir sobre como ela pode ser prestada, nem tão pouco se indagar sobre quais as possibilidades de mudanças na prática. O estudo destaca como estratégia para essa situação, a criação de um projeto de Educação Continuada, de modo a preparar profissionais e usuários a construir coletivamente o cenário de práticas. Fonte: Alves; Deslandes; Mitre (2009). Desafios Para a Humanização nos Serviços da Saúde Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 165 Os desafios da humanização podem ser superados, desde que os problemas e soluções sejam construídos de forma coletiva entre usuários, profissionais e gestores. O trabalho multidisciplinar, a participação efetiva do usuário, a demo- cratização da gestão, as ações de educação permanente, as reflexões sobre os processos de trabalho, dentre várias outras ofertas da PNH, demonstram que há estratégias para melhorar as relações de trabalho, aumentar o diálogo entre seus atores e criar novos modos de produção do cuidado (MARTINS, 2010, p. 92). Continuamente, faz-se necessária a realização de cursos, oficinas de formação, a fim de discutir os processos de trabalho, as diretrizes e dispositivos da PNH. A partir da vivência no dia a dia de trabalho, é preciso se reinventar, criando espaços coletivos que valorizem a autonomia e a corresponsabilidade dos pro- fissionais de saúde no trabalho e dos usuários no cuidado de si, extinguindo atitudes e práticas desumanizadoras (BRASIL, 2013). Nós somos os construtores das novas realidade em saúde! POLÍTICA NACIONAL DE HUMANIZAÇÃO (PNH) Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. VU N I D A D E166 CONSIDERAÇÕES FINAIS Nesta unidade, foi possível abordar sobre a humanização e como esse termo vem sendo empregado na área da saúde. Discutir sobre a Política Nacional de Humanização (PNH), seus objetivos, diretrizes e dispositivos é fundamental para a compreensão do tema. A proposta da PNH é bastante ousada por propor uma nova forma de fazer saúde, rompendo com o modelo de assistência fragmentado, centrado na doença e hierarquizado. Busca fomentar a autonomia e protagonismo dos usuários, tra- balhadores e gestores, de modo que os mesmos construam, coletivamente, modos de assistir e gerir em saúde. Essa discussão permite a reflexão sobre onde estamos e aonde desejamos chegar! Assim como nas outras unidades; nesta, também foi necessário, em alguns momentos, fazer um resgate histórico acerca das políticas públicas, a fim de nos situarmos no tempo e entendermos que muitos obstáculos foram ultrapassados para chegarmos até aqui. Discutimos, ainda, sobre a segurança e direitos do paciente, aspectos esses de grande relevância para a saúde pública. A segurança do paciente é um importante indicador de saúde, que reflete a qualidade da assistência prestada. Quanto aos direitos do paciente, estes devem ser assegurados em toda e qualquer situação. A saúde do trabalhador também foi discutida nesta unidade e mostra-se uma área em construção. O trabalho pode ser uma fonte de desgaste da saúde, acar- retando inúmeros problemas que devem ser valorizados pelos serviços públicos. A partir da discussão de todos esses assuntos, conseguimos visualizar um aspecto muito importante da PNH, que é a transversalidade, caracterizada pela inserção dessa política em todas as outras existentes no âmbito do SUS. A implantação de um novo modelo de assistência, o qual exige uma nova perspectiva de cuidado, sem dúvida é um grande desafio. Para tanto, é preciso continuar caminhando, vislumbrando alternativas para que a humanização real- mente aconteça na prática assistencial e nos processos de gestão. 167 O texto a seguir refere-se a trechos do artigo intitulado “O trabalho em saúde e o desafio da humanização: algumas estratégias de análise-intervenção”. De forma geral, a leitura permite uma reflexão sobre os desafios da PNH, nos fazendo pensar em estratégias para superá-los. “Ao problematizar a gestão dos serviços e dos processos de trabalho, o desafio colocado pela PNH é o de superar os obstáculos enfrentados no próprio processo de construção do SUS. Como “obra aberta”, essa política constrói-se a partir da inclusão de experiên- cias no SUS e das inovações da Saúde Coletiva. Portanto, é um permanente processo de invenção das práticas e de nós mesmos e do mundo que se vai criando no e com o trabalho. No âmbito das estratégias de intervenção da PNH, ressalta-se a potência de transforma- ção das realidades instituídas, o que torna os seres sempre inacabados e em permanen- te processo de constituição de outros contornos. Vislumbram-se sempre novas configu- rações, que surgem a partir de novos estados críticos gerados na comunicação entre as duas dimensões. É no concreto de práticas e de relações cotidianas de trabalho que essa possibilidade se efetiva. Tem-se aqui não mais o olhar analítico voltado exclusivamente ao plano das realidades constituídas, pois essa direção de análise revela sua insuficiên- cia ao considerar apenas parte da organização do trabalho. Acessar, atiçar a dimensão movente da realidade dos serviços de saúde é provocar a ampliação do olhar, tirar os antolhos com os quais habitualmente olhamos o mundo, ampliando o grau de trans- versalidade, fazendo uma aposta radical na possibilidade de transformação do que está dado. Esse plano das forças com sua dimensão movente pode interferir nas condições de gênese das realidades instituídas e, então, fazer derivar outras formas de trabalhar ainda não atualizadas. Trata-se da afirmação na capacidade dos viventes de hesitar, de recusar automatismos, variar respostas antevistas pelas prescrições. Esse padrão de comunicação transversalizado deixa vazar outros processos de invenção no trabalho, deslocando os trabalhadores para o lugar de analistas de sua atividade, o que, certamente, produzirá uma desestabilização nas formas autoritárias de organiza- ção nas unidades de saúde. O desafio constante do processo de apoio é o de criar estratégias para a reafirmação e ampliação do exercício da descentralização e da autonomia nos estabelecimentos de saúde, fomentando condições para a construção e sustentação de um modo de funcio- namento pautado no dialogismo, visando à transformação radical nas práticas. Partimos da compreensão de que uma política de humanização é feita como ação transversal, em meio às diferentes políticas de gestão e de produção do cuidado, uma transformação que ative a produção de coletivos. Desse modo, é vital procurar produzir coletivamen- te uma especial atenção aos modos como cuidamos e ao que pretendemos cuidar e, principalmente, que tipo de vida potencializamos ao cuidar. Interessa-nos uma transfor- mação das práticas do cuidado que seja capaz de avaliar as alianças ético-políticas que temos feito”. Fonte: Santos Filho; Barros (2012). 168 1. De acordo com os princípios do HumanizaSUS, definidos pelo Ministérioda Saú- de, a transversalidade trata-se de: a. Corresponsabilidade entre gestores, usuários e a participação coletiva nos processos e na gestão. b. Concepções e práticas que atravessam as diferentes ações e instâncias que aumentam o grau de abertura de comunicação intra e intergrupos. c. Práticas interdependentes e complementares que precisam ser entendidas para que ocorra a humanização. d. Participação do Município e do Estado, em conjunto com a União, buscando um SUS melhor. e. Práticas interdependentes e complementares, corresponsabilidade entre ges- tores, usuários. 2. Sobre a cultura de segurança, descrita na Política Nacional de Segurança do Pa- ciente, assinale a alternativa correta. a. Cultura que prioriza as metas financeiras e operacionais acima de segurança. b. Comprometimento da estrutura ou função do corpo e/ou qualquer efeito dele oriundo, incluindo doenças, lesão, sofrimento, morte, incapacidade ou disfunção, podendo, assim, ser físico, social ou psicológico. c. Cultura na qual todos os trabalhadores, incluindo profissionais envolvidos no cuidado e gestores, assumem responsabilidade pela sua própria segurança, pela segurança de seus colegas, pacientes e familiares. d. Evento ou circunstância que poderia ter resultado, ou resultou, em dano des- necessário ao paciente. e. Promoção de processos de capacitação de gerentes, profissionais e equipes de saúde em segurança do paciente. 3. De acordo com o Ministério da Saúde, “a Política Nacional de Humanização (PNH) busca pôr em prática os princípios do SUS no cotidiano dos serviços de saúde, produzindo mudanças nos modos de gerir e cuidar”. Sobre o tema, assinale a alternativa incorreta. a. A “Transversalidade” é um dos princípios da PNH que significa ampliar a co- municação entre os sujeitos envolvidos nos processos de produção de saúde, quebrando paradigmas do poder e do saber. b. Uma das diretrizes da PNH é a “Clínica Ampliada”, seu conceito está relaciona- do à ampliação e garantia de acesso ao usuário a todos os níveis de atenção. c. O termo “ambiência” não refere-se apenas à criação de espaços saudáveis, acolhedores e confortáveis, mas também de um ambiente social e de rela- ções interpessoais. 169 d. O “Acolhimento”, diretriz da PNH, sustenta a relação entre equipes/serviços e usuários/populações, devendo ser construída de forma coletiva. e. A PNH possui, como um dos eixos de ação, a integração de seus princípios aos processos de Educação Permanente nos serviços de Saúde. 4. O credenciamento dos serviços, como Sentinela de Notificação Compulsória de Acidentes e Doenças Relacionados ao Trabalho, será feito de acordo com as dire- trizes e orientações referentes à(ao): a. Rede Nacional de Atenção Integral à Saúde do Trabalhador (RENAST). b. Lei Orgânica da Saúde (LOS). c. Norma Operacional de Saúde do Trabalhador (NOST). d. Constituição Federal Brasileira (CFB). e. Centro de Referência em Saúde do Trabalhador (CEREST). 5. Quanto a Política de Saúde do trabalhador, é correto afirmar: a. Fazem parte da melhoria do ambiente de trabalho e controle das condições de risco para a saúde: identificação no trabalho das condições de risco para a saúde; caracterização da exposição e quantificação das condições de risco; discussão e definição das alternativas de eliminação ou controle das condi- ções de risco; implementação e avaliação das medidas adotadas. b. Produtos vendidos sob nomes comerciais, sem informação detalhada quanto à composição química. Geralmente, criam problemas para o reconhecimento de riscos. Essas informações não cabem ser exigidas dos fabricantes e forne- cedores, devendo-se solicitar a análise das amostras, que garante maior con- fiabilidade e menor custo. c. O profissional encontra, com facilidade, os dados para o estabelecimento do nexo ou da relação trabalho-doença, principalmente, pela precisão na identi- ficação de fatores de risco e(ou) situações a que o trabalhador está ou esteve exposto a condições potencialmente lesivas para sua saúde. d. O médico e a equipe de saúde, responsáveis pelo atendimento do trabalha- dor, devem buscar um relacionamento de cooperação com os colegas do pa- ciente. Considerando a natureza harmoniosa dessas relações, torna-se desne- cessário que os procedimentos sejam registrados e documentados. e. Estabelecida a relação causal ou o nexo entre a doença e o trabalho desempe- nhado pelo doente, o profissional ou a equipe responsável pelo atendimento deve passar a responsabilidade ao profissional adequado, isentando-se de demais responsabilidades. MATERIAL COMPLEMENTAR Humanização na saúde Fernanda Reis Editora: DOC Sinopse: o livro aborda a humanização, em todas as suas vertentes, nas instituições voltadas aos cuidados da saúde, como questão prioritária para o tratamento do doente. Portaria nº 1.820, de 13 de agosto de 2009. Dispõe sobre os direitos e deveres dos usuários da saúde. Disponível em: <http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2009/prt1820_13_08_2009. html>. Acesso em: 16 maio 2017. 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Política Nacional de Humanização - PNH. Brasília, 2013. ______. Portaria n° 1.823, de 23 de agosto de 2012. Institui a Política Nacional de Saúde do Trabalhador e da Trabalhadora. Ministério da Saúde, 2012. Disponível em: < http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2012/prt1823_23_08_2012. html>. Acesso em: 16 maio 2017. ______. Rede Nacional de Atenção Integral à Saúde do Trabalhador – Manual de Gestão e Gerenciamento, São Paulo: 2006. REFERÊNCIAS BUENO, S. Minidicionário da língua portuguesa. 2. ed. São Paulo: FTD, 2007. CASSIANI, S. H. B. A segurança do paciente e o paradoxo no uso de medicamentos. Rev Bras Enferm. [on-line], v. 58, n. 1, p. 95-99, 2005. CHAUÍ, M. Marilena Chauí diz que Brasil convive com violência estrutural e ataca a “oligarquia”. In: FÓRUM DE ENTIDADES NACIONAIS DE DIREITOS HUMANOS, 2006. Anais... [S.l.], 2006. DE CARVALHO, M.; VIEIRA, A. A. Erro médico em pacientes hospitalizados. J Pediatr. Porto Alegre, v. 78, n. 4, p. 261-8, 2002. DIAS,M. A. 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Forward Pro- gramme 2008 – 2009. Geneva: WHO, 2008. GABARITOGABARITO 1) A. 2) C. 3) B. 4) A. 5) A. CONCLUSÃO 175 Prezado(a) aluno(a)! Esperamos que este livro tenha contribuído para uma boa com- preensão do cenário da Saúde Coletiva no contexto brasileiro. O destaque aos pontos principais dessa trajetória passa pela evolução do concei- to de saúde ao longo dos tempos e a influência histórica cultural nos modelos de atenção à saúde, culminando na determinação social e cultural da saúde e doença. Enfatizamos a importância do profissional da área da saúde conhecer o Sistema Úni- co de Saúde (SUS), a rede de saúde e os serviços oferecidos, no intuito de ajudar na orientação e intervenção contextualizada, bem como dar subsídios e ferramentas para atuar no contexto da Vigilância em Saúde. Igualmente, destaca os principais aspectos das políticas de saúde voltadas ao ciclo de vida e as orientações aos profissionais de saúde no sentido da necessidade de humanização nos serviços de saúde. Conforme enfatizamos, no decorrer do livro, a definição do processo saúde doença e da organização de serviços e políticas públicas da população brasileira é influen- ciado pela compreensão do momento histórico, político e social do tempo em que ocorre. Dessa forma, o indivíduo deve estar atento aos condicionantes e determinantes de saúde que, no caso do Brasil, apesar de muitos avanços na qualidade de vida e da saúde da população, o país ainda enfrenta grandes desafios na área de distribuição de renda, recursos e estrutura. São muitos os desafios do trabalho no contexto da Saúde Pública: a construção his- tórica e coletiva, as mudanças sociais e tecnológicas, a administração de recursos e, principalmente, a compreensão da importância de humanizar os serviços e acolher as necessidades da população. Muitas mudanças ocorreram e, ainda, estão por vir. Esperamos que o estudo pro- posto neste livro tenha ajudado na compreensão e na melhoria da qualidade do seu trabalho e que você possa abrir novos horizontes e fazer a diferença na sua trajetória profissional. Sucesso! CONCLUSÃO ANOTAÇÕES