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Julio Almeida CONTESTAÇÃO COGNITIVA Um gula para estudantes de Terapia Cognitiva Julio Almeida CONTESTAÇÃO COGNITIVA Um guia para estudantes de Terapia Cognitiva 2 3 SUMÁRIO INTRODUÇÃO 5 SEÇÃO I: TERAPIA COGNITIVA 7 1. Teoria do construto pessoal 7 2. Modelo cognitivo 8 3. Crenças disfuncionais 10 SEÇÃO II: CONTESTAÇÕES 20 4. Conceito 20 5. Técnicas 23 6. Exemplos de Contestações 39 SEÇÃO III: RELAÇÃO TERAPÊUTICA 49 7. Recomendações 49 8. Evitações 52 9. Empirismo colaborativo 55 10. Confrontação 59 Considerações finais 64 Referências 66 4 INTRODUÇÃO Este trabalho apresenta uma pesquisa bibliográfica sobre a prática das contestações na terapia cognitiva, cuja função é desconstruir as crenças disfuncionais manifestas pelo paciente, ajudando-lhe a alcançar uma avaliação dos acontecimentos mais adaptada à realidade. A produção deste livro foi toda embasada no meu Trabalho de Conclusão de Curso para graduação em Psicologia, apresentado à banca em dezembro de 2011. O título original foi Contesta- ção das Crenças Disfuncionais na Terapia Cognitiva. Obviamente, aqui o texto foi adaptado para um formato mais adequado de livro. A expressão Contestação Cognitiva me pareceu ser a mais apropriada síntese para designar com exatidão o conteúdo deste livro, por isso a escolha deste título. Este volume poderia muito bem ser denominado de A Ciência da Contestação ou ainda Contestação Assertiva. Até os dias de hoje ainda recebo frequentemente solicitações de colegas profissionais e estudantes para fornecer uma cópia do TCC por sua utilidade prática, sendo este também um dos principais motivos que motivaram esta publicação. O tema deste trabalho foi escolhido devido ao interesse pessoal de obter maior conhecimento sobre as técnicas de intervenção na terapia cognitiva, especialmente aquelas destinadas a contestar os pensamentos e crenças disfuncionais expressas pelo paciente. Pessoalmente, sempre tive o hábito de questionar meus pensamentos e opor mentalmente tudo aquilo que eu identificasse como sendo irracional em minhas interpretações sobre os acontecimentos da vida e percebidos no mundo ao meu redor. Mais tarde, soube que ajudar a criar e aperfeiçoar esta habilidade psíquica nos pacientes é um dos principais objetivos na terapia cognitiva. Do ponto de vista interpessoal, penso que a capacidade de contestar assertivamente é uma habilidade importante não somente dentro da clínica – durante a psicoterapia –, mas exigida a cada dia mais nas relações humanas, num mundo onde as diferenças crescem e as posturas de inconformidade precisam de pacificação. Concernente ao aspecto metodológico, o problema de pesquisa foi descrito na seguinte ques- tão: Quais as habilidades e conhecimentos necessários para o terapeuta contestar de maneira assertiva as crenças disfuncionais do paciente na terapia cognitiva? A partir desta questão estabele- cemos como objetivo geral exatamente a identificação destas habilidades e conhecimentos fundamen- tais para a realização das contestações. Deste objetivo geral derivaram os seguintes objetivos específicos: • Entender o conceito de contestação e sua função terapêutica na terapia cognitiva; • Conhecer as principais técnicas de como realizar as contestações; • Entender a melhor forma de aplicar as técnicas de contestação, incluindo posturas a serem evitadas e os momentos mais apropriados para aplicá-las; • Identificar, na forma de listagem, quais os principais tipos de crenças disfuncionais, exemplos das mesmas e respectivos argumentos possíveis para contestá-las. 5 O trabalho está dividido em três partes que relacionam as contestações com os principais aspectos envolvidos em sua prática. Inicialmente, são abordados os princípios da terapia cognitiva convergentes com o tema deste livro, incluindo a teoria do construto pessoal, o modelo cognitivo e as concepções sobre as crenças disfuncionais. O segundo capítulo apresenta as implicações terapêuticas da contestação propriamente dita, iniciando pelo aprofundamento do conceito, percorrendo as principais técnicas de intervenção e finalizando com diferentes exemplos referidos pela bibliografia consultada. Por fim, o terceiro capítulo versa sobre os elementos necessários para o estabelecimento de uma relação terapêutica adequada durante a realização das contestações na terapia cognitiva. 6 SEÇÃO I: TERAPIA COGNITIVA 1. TEORIA DO CONSTRUTO PESSOAL Para entendermos o papel das contestações na terapia cognitiva, precisamos antes recorrer a alguns princípios teóricos que antecederam e embasaram a formulação da terapia cognitiva, especialmente a teoria do construto pessoal, de George Kelly. A teoria do construto pessoal considera cada pessoa um cientista amador de si mesmo ou teórico da personalidade, condição também denominada pelo autor como o Homem (pessoa)- Cientista. De maneira análoga a um cientista, desenvolvemos teorias para explicar o mundo, formando um sistema de construtos usados para compreender e predizer comportamentos pessoais e alheios. Nesse sentido, as experiências pessoais servem para validar ou não estas teorias, reorganizando as próprias versões da realidade (Friedman e Schustack, 2007). Essa metáfora vê as pessoas agindo como cientistas no sentido de que elas formulam hipóteses sobre o mundo na forma de construções pessoais e depois põem-se a testar essas ideias de maneira muito semelhante ao que um cientista faria para obter certeza preditiva e algum controle sobre os eventos. (Fadiman e Frager, 2004, p. 327) O aspecto central da teoria de Kelly refere-se à permanente capacidade que as pessoas possuem de modificarem a si mesmas, reinventando-se dentro da realidade flexível e criativa do mundo em constante mutação. Segundo o autor, “os homens mudam as coisas primeiro mudando a si mesmos e só atingem seus objetivos se pagarem o preço de mudarem a si mesmos – como descobriram alguns para sua tristeza e outros para sua salvação” (Kelly apud Fadiman e Frager, 2004, p. 330). A posição filosófica básica da teoria do construto pessoal de Kelly é conhecida como alternativismo construtivo, isto é, a ideia de que são possíveis diferentes alternativas de interpretações para os fatos do mundo real, com os quais cada indivíduo mantém um relacionamento (através das próprias percepções) dando-lhes significados. Os fatos que hoje enfrentamos estão sujeitos a uma variedade de construções tão grande quanto nossas faculdades mentais nos permitem conceber [...] Todas as nossas atuais percepções estão sujeitas a questionamento e reconsideração e sugere, de modo geral, que mesmo as ocorrências mais óbvias da vida cotidiana podem parecer totalmente transformadas se formos inventivos o suficiente para interpretá-las de modo diferente. (Kelly apud Fadiman e Frager, 2004, p. 330) Segundo Kelly, as pessoas podem reperspectivar o sentido de suas existências a qualquer momento, inclusive o sentido construído no início da vida, pois sempre podem reinterpretar a realidade. 7 2. MODELO COGNITIVO O modelo da terapia cognitiva segue as bases da teoria do construto pessoal, como nos explica Leahy (2006, p. 24): O modelo cognitivo de terapia baseia-se no modelo de George Kelly (1955) do “homem (ou mulher) como cientista” – isto é, que os humanos podem identificar “constructos” ou crenças pessoais e testá- los. O atual modelo cognitivo, proposto por Beck e colaboradores, enfatiza o aspecto do pensamento científico que busca a “desconfirmação” ou “falsificação” da crença – isto é, examinar como podemos provar que a crença é errada ou inadequada. O modelo cognitivo daterapia desenvolvida por Aaron Beck propõe que o modo disfuncional de interpretar as situações – por meio dos pensamentos e crenças – determina os sentimentos e comportamentos das pessoas nos transtornos psicológicos. Judith Beck (1997, p. 17) diz: O modelo cognitivo propõe que o pensamento distorcido ou disfuncional (que influencia o humor e o comportamento do paciente) seja comum a todos os distúrbios psicológicos. A avaliação realista e a modificação no pensamento produzem uma melhora no humor e no comportamento. A melhora dura- doura resulta da modificação das crenças disfuncionais básicas dos pacientes. Albert Ellis, em seus métodos também fundamentadores da terapia cognitiva, parte do pensamento de antigos filósofos, a exemplo de Epicteto, para ilustrar esta abordagem psicoterápica: “Perturbam aos homens não as coisas, senão a opinião que delas tem” (Rangé, 2001, p. 34). No momento de explicar para o paciente o funcionamento do modelo cognitivo, da terapia e da relação entre pensamentos e emoções, Leahy (2006) sugere que os terapeutas usem linguagem simples, dizendo, por exemplo: Antes de você contestar e mudar pensamentos, precisa compreender como os pensamentos afetam os seus sentimentos […] Quando você se sente triste ou ansioso na sua vida cotidiana, diferentes pensamentos passam por sua mente. (p. 25) A fim de distinguir pensamentos, sentimentos e fatos, os terapeutas podem utilizar a técnica A-B-C, em que os pacientes têm a oportunidade de reconhecer como o mesmo evento Ativador pode levar a diferentes crenças (Belifs) (pensamentos) e Consequências (sentimentos e comportamentos). Se eu acreditar que nunca poderei me sair bem no exame (pensamento), talvez me sinta desesperançado e me comporte de acordo com isso – por exemplo, não me dando o trabalho de estudar. Por outro lado, se acreditar que tenho uma boa chance de me sair bem no exame, talvez me sinta esperançoso e, conse- quentemente, estude bastante. (p. 27) O objetivo da terapia cognitiva, portanto, é ajudar o paciente a desfazer as interpretações distorcidas da realidade por meio dos pensamentos e crenças, aliviando assim seus sintomas. Os clientes raramente estão conscientes das premissas de seus pensamentos. Mais frequentemente, focalizam apenas as conclusões que, se distorcidas, tentem a gerar problemas emocionais. O pensamento racional envolve raciocínio lógico baseado em afirmações empiricamente verificáveis. Se pensarmos Racionalmente, é improvável chegarmos a conclusões que levem a sentimentos extremamente perturbadores. (Rangé, 2001, p. 35) 8 As intervenções na terapia cognitiva podem ser descritas em três etapas gerais (Shinohara, 2003, p. 63), existindo diferentes técnicas para a realização de cada uma: 1. Identificação: “No primeiro momento, o terapeuta ajuda o cliente a identificar os pensamentos e as crenças que estão relacionados com as emoções e os comportamentos trazidos como queixas”. 2. Avaliação: “No segundo momento, o cliente é ajudado a analisar os pensamentos para testar a validade ou utilidade deles, segundo a lógica própria do cliente”. 3. Reestruturação: “No terceiro momento, o terapeuta acompanha o cliente na identificação e reformulação das crenças consideradas por ele como disfuncionais ou irrealistas”. A necessidade das contestações pode surgir em qualquer uma destas três etapas. Porém, em geral, iniciam após a etapa 1 através da conceituação cognitiva, pois é necessário primeiro identificar o que será contestado. Leahy (2006, p. 53) recomenda a prática das contestações após o paciente e o terapeuta terem identificado, categorizado e examinado os pensamentos negativos em relação às perturbações emocionais. 3. CRENÇAS DISFUNCIONAIS No universo das interpretações da realidade, foram identificados pelo menos três níveis de pensamento: os pensamentos automáticos, as crenças intermediárias e as crenças centrais. Os pensamentos automáticos são espontâneos e fluem em nossa mente a partir dos acontecimentos do dia-a-dia [...] As crenças intermediárias correspondem ao segundo nível de pensamento e não são diretamente relacionadas às situações, ocorrendo sob a forma de suposições ou de regras [...] As crenças centrais constituem o nível mais profundo da estrutura cognitiva e são compostas por ideias absolutistas, rígidas e globais. (Rangé, 2001, p. 50) Sobre tais convicções rígidas, Kelly (apud Fadiman e Frager, 2004, p. 333) nos diz Em última instância, o homem define a medida de sua própria liberdade e de sua própria servidão pelo nível em que opta firmar suas convicções. O homem que organiza sua vida em termos de muitas convicções especiais e inflexíveis sobre questões temporárias faz de si uma vítima das circunstâncias. Descoberta Orientada O terapeuta precisará saber que nem todos os pensamentos manifestos pelo paciente são irracionais ou distorcidos, e que por meio da descoberta orientada é realizada uma contínua revisão dos dados obtidos. A descoberta orientada também tem por objetivo transformar a relação terapêutica numa experiência humana educativa, por meio do bom humor e de uma diversificação nas estratégias de comunicação, por exemplo, variando o modo de apresentar hipóteses e ilustrar pontos importantes. 9 De acordo com Beck, Freeman e Davis (2005, p. 77) Parte da arte da terapia cognitiva consiste em transmitir um senso de aventura – ao desemaranhar e pôr às claras as origens das crenças do paciente, ao explorar os significados de eventos traumáticos e ao aproveitar a riqueza da imaginação. De outra forma, a terapia pode se transformar em um processo repetitivo que se torna cada vez mais tedioso com o passar do tempo. As crenças disfuncionais são estudadas a partir de uma variedade de tipos e níveis de pensamentos errôneos, conforme veremos agora de acordo com os principais autores. Distorções Cognitivas Conforme Beck, Rush, Shaw e Emery (1997, p. 12), as distorções cognitivas são falhas no processamento de informações, ou seja, erros sistemáticos que mantém a validade de determinada crença disfuncional, mesmo com evidências contrárias a ela. Geralmente envolvem juízos amplos dos acontecimentos de maneira extrema, negativa, categórica, absoluta e sentenciosa; ao contrário de um pensamento presumivelmente mais maduro, com padrões relativos e não absolutos. Neste estudo, Leahy (2006) lista 17 distorções cognitivas: 1. Leitura mental: achar que sabe o que os outros pensam, sem ter evidências. 2. Previsão do futuro: fazer previsões negativas para o futuro. 3. Catastrofização: acreditar que determinado acontecimento é terrível e insuportável. 4. Rotulação: atribuir traços negativos que englobam a pessoa completamente. 5. Desqualificação dos aspectos positivos: menosprezar aspectos positivos de si ou dos outros. 6. Filtro negativo: enxergar somente a faceta negativa da pessoa ou situação. 7. Hipergeneralização: padrão global negativo baseado em um único evento. 8. Pensamento dicotômico: avaliar fatos e pessoas em termos de tudo-ou-nada. 9. Afirmações do tipo “Deveria”: enfatizar como as coisas deveriam ser em vez de focar o que são. 10. Personalização: atribuir somente a si a culpa por fatos negativos. 11. Culpa: focar somente outra pessoa como fonte de seus sentimentos negativos. 12. Comparações injustas: interpretar os fatos segundo padrões irrealistas, comparando-se a outros superiores. 13. Tendência à lamentação: enfatizar exageradamente que poderia ter feito melhor ao invés de focar no que pode fazer agora. 14. “E se?”: fazer mil e uma conjecturas do tipo “e se isso ou aquilo acontecer” e nunca se dá por satisfeito e seguro. 15. Raciocínio emocional: a pessoa se guia pelas emoções e sentimentos para interpretar a realidade. 16. Incapacidade de refutar: negar as evidências e argumentos que contradizem os pensamentos negativos. 17. Foco no julgamento: ver tudo como avaliações do tipo bom-mau ou superior-inferior, 10 focando em julgamentos.Crenças Irracionais Ellis (apud Rangé, 2001, p. 39) aponta 11 crenças irracionais que são consideradas aspectos centrais no desencadeamento das perturbações emocionais e do comportamento humano: 1. Existe uma extrema necessidade de ser amado e aprovado por outra pessoa significativa. 2. Se deva ser inteiramente competente, adequado e realizador em todos os aspectos possíveis para se ter valor. 3. É catastrófico quando as coisas não são do jeito que gostaríamos. 4. Certas pessoas são más e perversas, e que por isso deveriam ser punidas severamente. 5. A infelicidade é externamente causada. 6. Devemos ficar imensamente preocupados e ruminando as coisas que podem ser perigosas ou assustadoras. 7. É mais fácil evitar do que enfrentar dificuldades e responsabilidades. 8. Precisamos nos apoiar em alguém ou coisa vista como sendo mais forte do que nós. 9. A história/passado de alguém é determinante do seu comportamento hoje e sempre. 10. Os problemas e preocupações dos outros devem nos preocupar muito. 11. Há uma solução certa (perfeita) para os problemas e é terrível não encontrá-la. Crenças Centrais Judith Beck (1997, p. 177) explica que as crenças centrais são desenvolvidas a partir da infância, e envolvem ideias sobre si, outras pessoas e o mundo. São “ideias consideradas pela pessoa como verdades absolutas, exatamente o modo como as coisas ‘são’”. Diz também que as crenças centrais são “entendimentos que são tão fundamentais e profundos que as pessoas frequentemente não os articulam, sequer para si mesmas.” A autora distingue dois tipos de crenças centrais disfuncionais e nos apresenta alguns exemplos: 1. Crenças centrais de desamparo: eu sou desamparado; eu sou impotente; eu sou fora de controle; eu sou fraco; eu sou vulnerável; eu sou carente; eu estou sem saída; eu sou inadequado; eu sou ineficiente; eu sou incompetente; eu sou um fracasso; eu sou desrespeitado; eu sou defeituoso (ou seja, eu não chego à altura dos outros); eu não sou bom o suficiente (em termos de conquistas). 2. Crenças centrais de não ser querido (falta de amor): eu não sou capaz de ser amado; eu não sou capaz de ser querido; eu sou indesejável; eu não sou atraente; ninguém me quer; ninguém liga para mim; eu sou mau; eu não tenho valor; eu sou diferente; eu sou imperfeito (ou seja, então os outros não irão me amar); eu não sou bom o suficiente (para ser amado pelos outros); eu estou a ponto de ser rejeitado; eu estou condenado a ser abandonado; eu estou a ponto de ficar sozinho. Crenças Intermediárias A autora ainda aborda as crenças intermediárias considerando três aspectos: atitude, suposição e regras. As obras que tratam de terapia cognitiva geralmente abordam diferentes crenças 11 intermediárias. Judith Beck (1997, p. 31) apresenta alguns exemplos: • Atitude: Por exemplo, “é horrível ser incompetente” ou “é terrivel ser inadequada”. • Regras / expectativas: Por exemplo, “eu devo trabalhar o mais arduamente que puder o tempo todo”, “eu deveria sempre me esforçar ao máximo” ou “eu deveria ser excelente em tudo o que tento fazer”. • Suposição: Por exemplo, “se eu trabalhar o mais arduamente que puder, posso ser capaz de fazer algumas coisas que as outras pessoas fazem facilmente” ou “se eu trabalhar muito duro, eu posso fazer bem as coisas”. Leahy (2006, p. 105) propõe um formulário com exemplos de pressupostos, regras e padrões típicos, ou seja, crenças intermediárias do tipo “deveria”, “se isso acontecer, então tal coisa é verdadeira” e imperativas. Eis alguns: • “Devo ser perfeito em tudo que faço.” • “Se falhar em alguma coisa, então sou um fracasso.” • “Preciso receber a aprovação de todos para gostar de mim mesmo.” • “Se alguém pensa mal de mim, então devo também pensar mal de mim.” • “Temos de impressionar as pessoas com nossa personalidade.” • “Se eu não for perfeito, as pessoas não gostarão de mim.” • “Algumas pessoas são melhores do que outras.” • “Se eu não tiver certeza das coisas, elas provavelmente não darão certo.” • “É importante ter todas as informações antes de tomar uma decisão.” • “Eu não deveria ficar deprimido (zangado, ansioso).” • “Os outros deveriam fazer as coisas à minha maneira.” • “Se eu cometer um erro, devo criticar a mim mesmo.” • “Se as pessoas me ofenderem, devo dar o troco.” Judith Beck (1997, p. 157) lembra que a dificuldade em modificar as crenças dos pacientes varia para cada indivíduo, e que a modificação das crenças centrais, normalmente mais rígidas, ocorre em geral após as crenças intermediárias. Crenças nos Transtornos da Personalidade Nas pesquisas de Beck, Freeman e Davis (2005, p. 54), os transtornos de personalidade apresentam crenças bem específicas: • Transtorno da Personalidade Esquiva: “é terrível ser rejeitado, desprezado”; “se as pessoas conhecessem o meu verdadeiro eu, elas me rejeitariam”; “não posso tolerar sentimentos desagradáveis”. • Transtorno da Personalidade Dependente: “eu preciso das pessoas para sobreviver, ser feliz”; “eu preciso ter uma fonte constante de apoio, de encorajamento”. • Transtorno da Personalidade Passivo-Agressiva: “os outros interferem na minha 12 liberdade de ação”; “ser controlado pelos outros é intolerável”; “eu tenho de fazer as coisas à minha maneira”. • Transtorno da Personalidade Obsessivo-Compulsiva: “eu sei o que é melhor”; “os detalhes são cruciais”; “as pessoas deveriam fazer melhor, se esforçar mais”. • Transtorno da Personalidade Paranóide: “os motivos dos outros são suspeitos”; “preciso estar sempre em guarda”; “eu não posso confiar nas pessoas”. • Transtorno da Personalidade Anti-Social: “eu tenho direito de quebrar regras”; “os outros são otários, covardes”; “eu sou melhor do que os outros”. • Transtorno da Personalidade Borderline: “não consigo enfrentar as coisas sozinho”; “preciso de alguém em quem confiar”; “não tolero sentimentos desagradáveis”; “se confiar em alguém, serei maltratado, considerado insignificante e me abandonarão”; “a pior coisa possível seria o abandono”; “é impossível me controlar”; “eu mereço ser punido”. • Transtorno da Personalidade Narcisista: “já que sou especial, eu mereço regras especiais”; “eu estou acima das regras”; “eu sou melhor do que os outros”. • Transtorno da Personalidade Histriônica: “as pessoas estão aqui para me servir ou admirar”; “as pessoas não tem direito de me negar o que eu mereço.”; “devo seguir meus sentimentos”. • Transtorno da Personalidade Esquizóide: “os outros são frustrantes”; “os relacionamentos são complicados, indesejáveis”. • Transtorno da Personalidade Esquizotípica: “se eu tentar ser amigo das pessoas, elas vão me rejeitar e me magoar”; “é melhor ficar isolado dos outros.” Falácias Lógicas Para McMullin (2005, p. 141), as falácias lógicas – premissas irracionais aparentemente verdadeiras, são muitas vezes expressas pelo paciente na tentativa de manipular o exame das evidências das crenças disfuncionais. Segundo o autor, que faz um levantamento exaustivo dos tipos de falácias, diz que elas [...] derivam de distorções na percepção dos pacientes (por exemplo, generalizações), outras vêm de distorções psicológicas (catastrofização), enquanto outras, ainda, são distorções lógicas (pensamento a priori). Algumas vezes originam-se da confusão que as pessoas fazem entre correlações e casualidades. As falácias lógicas usadas para comprovar pressupostos devem ser identificadas e evitadas (McMullin, 2005, p. 142): A melhor maneira de educar nossos pacientes a respeito das falácias lógicas é identificá-las no exato momento em que são expressas, observando como elas não trazem nenhuma contribuição para a avaliação acerca da falsidade ou da veracidade de uma crença. Muito frequentemente, elas são apenas derivações que contribuem para que nossos pacientes evitem de lidar com as percepções distorcidas quevêm somando ao longo da vida. Segundo McMullin, o terapeuta deve exemplificar as falácias e encorajar o paciente a se opor (contestação) a elas. Eis, resumidamente, os primeiros 15 tipos de falácias lógicas, dentre 37 13 apontadas pelo autor: 01. Sensacionalismo: Tornar simples emoções em emergências psiquiátricas. Exemplo: “é muito perigoso ficar ansioso”. 02. Generalização: Escolher características específicas para representar o todo. Exemplo: “quem não sabe gramática é burro”. 03. Personalização: Ver eventos casuais como ataques contra si. Exemplo: “Deus me fez quebrar a perna como castigo por meus pecados”. 04. Antropomorfismo: Atribuir a objetos características humanas. Exemplo: “o carro recusou-se a funcionar”. 05. Perenizar: Tornar permanente uma condição temporária. Exemplo: “nunca serei feliz”. 06. Culpabilizar: Colocar a culpa em alguém. Exemplo: “todos os criminosos são produzidos por maus pais”. 07. Patologização: Transformar reações em doenças. Exemplo: “agressividade é uma doença”. 08. Perfeccionismo: Usar padrões inalcançáveis. Exemplo: “devo ser melhor do que todo o mundo, em tudo”. 09. Pensamento dicotômico: Tudo ou nada, oito ou oitenta. Exemplo: “neste mundo, ou se é um vencedor ou se é um perdedor”. 10. Pessimizar: Esperar sempre o pior de tudo. Exemplo: “esta dor na minha perna deve ser um sinal que estou com câncer”. 11. Obrigatoriedade: Tornar obrigatórios certos desejos. Exemplo: “tenho que conquistá- la de volta”. 12. Auto-intitulação: Esperar privilégios especiais inexistentes. Exemplo: “é absurdo mostrar a carteira de identidade para descontar cheque”. 13. Psicologizar: Atribuir sempre causas psicológicas. Exemplo: “esbarrei na mesa porque estava tentando me punir”. 14. Raciocínio complexo: Explicar complicadamente. Exemplo: “você está transferindo sua hostilidade infantil reprimida para mim”. 15. Reificação: Pressupor que abstrações sejam entidades reais. Exemplo: “justiça, beleza e virtude são perfeitas manifestações da realidade”. Esquemas Representando um avanço na maneira de compreender as crenças, Young, Klosko e Weishaar (2008, p. 22), na terapia do esquema – sistema psicoterápico que mescla elementos de diferentes abordagens para tratar pacientes com transtornos da personalidade e transtornos do Eixo 1, focado nos esquemas desadaptativos dos pacientes, ou seja, “padrões emocionais e cognitivos autoderrotistas iniciados em nosso desenvolvimento desde cedo e repetidos ao longo da vida” – propõem cinco categorias ou domínios para classificar dezoito esquemas desadaptativos. Eis a listagens dos domínios e esquemas (p. 27-31): I. Desconexão e Rejeição. Expectativa de que as necessidades de segurança e afeto não 14 serão satisfeitas: • Abandono/Instabilidade: Percepção que os outros são instáveis, indignos e não continuarão proporcionando apoio. • Desconfiança/Abuso: Expectativa de que será machucada de alguma forma pelos outros, de maneira intencional e injustificada. • Privação Emocional: Expectativa que não receberá apoio emocional adequado e ficará privada de cuidados, empatia e proteção. • Defectividade/Vergonha: Sentimento de que é defeituoso, indesejado e não merece amor das pessoas, ficando sensível a diferentes oposições do convívio social. • Isolamento Social/Alienação: Sentimento de isolamento e diferenças significativas em relação aos outros indivíduos e grupos. II. Autonomia e Desempenho Prejudicados. Expectativas sobre si e o meio que afetam a percepção sobre a capacidade pessoal de ser independente: • Dependência/Incompetência: Crença que necessita da ajuda alheia para ser responsável e competente, apresentando-se como desamparo. • Vulnerabilidade a Danos ou Doenças: Medo exagerado de que não terá como impedir uma catástrofe iminente em termos de saúde, emoções ou acidentes externos. • Emaranhamento/Self Subdesenvolvido: envolvimento em excesso com uma ou mais pessoas, afetando a própria individuação e desenvolvimento social. • Fracasso: Crença no fracasso pessoal permanente e generalizado, sentindo-se menos exitoso em comparação aos outros. III. Limites Prejudicados. Deficiência com limites, respeito, cooperação e responsabilidade: • Arrogo/Grandiosidade: Crença na superioridade pessoal em relação aos outros, merecendo direitos e privilégios que o eximem da reciprocidade social normal. • Autocontrole/Autodisciplina Insuficientes: Dificuldade em lidar com a frustração em relação aos objetivos pessoais e com os limites de sua expressão. IV. Direcionamento para o outro. Foco excessivo nos sentimentos e vontades das outras pessoas em detrimento de si próprio, a fim de ser aprovado e não rejeitado: • Subjugação: Submissão para evitar raiva, retaliação e abandono, gerando a subjugação das necessidades e/ou emoções pessoais. • Auto-sacrifício: Foco excessivo no atendimento aos outros à custa da própria gratificação, embasado numa sensibilidade intensa aos sentimentos alheios. • Busca de Aprovação/Busca de Reconhecimento: Ênfase na busca pela aprovação social, com as reações alheias determinando a própria autoestima. V. Supervigilância e Inibição. Ênfase excessiva na supressão das próprias manifestações e no 15 comportamento ético à custa da felicidade, saúde e de relacionamentos íntimos: • Negativismo/Pessimismo: Foco nos aspectos negativos e desprezo aos aspectos positivos ou otimistas, esperando sempre o pior. • Inibição Emocional: Excesso de inibição ao agir para não ser desaprovado, envolvendo inibição da raiva/agressão, de impulsos positivos e da comunicação livre. • Padrões Inflexíveis/Postura Crítica Exagerada: Crença de que é necessário muito esforço para atingir padrões internalizados de desempenho, gerando sentimentos de pressão e posturas exageradamente críticas. • Postura Punitiva: Crença de que as pessoas, quando erram, devem ser punidas, gerando em si raiva, intolerância e incapacidade de perdoar. O procedimento de contestar as crenças disfuncionais é passo imprescindível para alcançar- se a reestruturação cognitiva, pois como ajudar o paciente a incorporar novos pensamentos mais adaptativos se ele ainda mantiver arraigadas visões distorcidas da realidade? Daí a importância das contestações, como veremos a seguir. 16 SEÇÃO II: CONTESTAÇÕES 4. CONCEITO De acordo com o Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa (2001), o termo contestar apresenta 6 acepções que vem ao encontro a proposta desta pesquisa: 1. Não aceitar como válido; impugnar, refutar. 2. Recusar o reconhecimento de um direito. 3. Pôr em dúvida a veracidade de ou questionar (algo) a (alguém); negar. 4. Mostrar oposição ou contrariedade; opor-se, protestar. 5. Dizer como resposta; replicar, responder. 6. Atestar, confirmar. Outras diferentes palavras mantêm relação direta com o termo contestação, inclusive algumas sendo usadas como sinônimos e ideias afins. Eis alguns exemplos: antagonismo, argumentação, conflito, confronto, confutação, contradição, contraponto, controvérsia, crítica, debate, desacordo, desconstrução, discórdia, dissensão, dissonância, dúvida, falseabilidade, impugnação, incongruência, negação, objeção, oposição, polêmica, refutação, réplica. As ciências humanas, especialmente a Filosofia e a Pedagogia, apresentam diferentes teorias relevantes para o estudo das bases conceituais da contestação. O objetivo aqui, no entanto, não é aprofundar tais conceitos, mas enfatizar a existência de estreitas relações entre os mesmos e o tema aqui abordado. Eis a definição de quatro destes conceitos, de acordo com Houaiss e Villar (2001): Dialética Em sentido bastante genérico, oposição, conflito originado pela contradição entre princípios teóricos ou fenômenos empíricos. 1.1 no platonismo, processo de diálogo, debate entre interlocutores comprometidos profundamentecom a busca da verdade, através do qual a alma se eleva, gradativamente, das aparências sensíveis às realidades inteligíveis ou ideias. 1.2 no aristotelismo, raciocínio lógico que, embora coerente em seu encadeamento interno, está fundamentado em ideias apenas prováveis, e por esta razão traz sempre em seu âmago a possibilidade de sofrer uma refutação. 1.3 no kantismo, raciocínio fundado em uma ilusão natural e inevitável da razão, que por isto permanece no pensamento, mesmo quando envolvido em contradições ou submetido à refutação. 1.4 no hegelianismo, lei que caracteriza a realidade como um movimento incessante e contraditório, condensável em três momentos sucessivos (tese, antítese e síntese) que se manifestam simultaneamente em todos os pensamentos humanos e em todos os fenômenos do mundo material. Falseabilidade [...] possibilidade inerente a qualquer teoria científica de ser submetida a uma refutação parcial, decorrente de sua incapacidade constitutiva de refletir integralmente a natureza dos fatos; refutabilidade [para o filósofo austríaco Karl Popper, característica essencial do método científico, que por este critério antidogmático se distingue da irrefutabilidade metafísica ou pseudocientífica]. 17 Heurística 1 arte de inventar, de fazer descobertas; ciência que tem por objeto a descoberta dos fatos. 1.1 ramo da História voltado à pesquisa de fontes e documentos. 1.2 método de investigação baseado na aproximação progressiva de um dado problema. 1.3 método educacional que consiste em fazer descobrir pelo aluno o que se lhe quer ensinar. Maiêutica [...] 2 método socrático que consiste na multiplicação de perguntas, induzindo o interlocutor na descoberta de suas próprias verdades e na conceituação geral de um objeto. 3 método heurístico. O ato de contestar está entranhado nas relações humanas, pois ninguém é igual a ninguém e as pessoas compartilham de diferentes percepções da realidade. As histórias de vida e experiências pessoais, assim como o modo de pensar, sentir e agir de cada pessoa, se diversificam ao infinito, tornando inevitáveis as relações humanas divergentes e, consequentemente, opositivas. Observa-se, portanto, que tal aspecto da subjetividade humana não se exclui nem mesmo dentro da clínica de Psicologia, neste caso, atribuindo às contestações uma função de ajuda psicoterapêutica. Neste ponto, podemos questionar: existe psicoterapia sem contestação? É razoável presumir que, num momento ou noutro, a contestação se faça presente na relação de ajuda, independente da abordagem psicológica adotada. Entretanto, o objetivo deste trabalho não é analisar as contestações em outras abordagens que não seja a terapia cognitiva. O termo contestação ou contestar é largamente empregado pela maioria dos autores em terapia cognitiva e sua função prática – como importante procedimento psicoterapêutico – fica evidente em quase todas as obras. No entanto, muito pouco encontramos em termos de definição clara e específica deste conceito nas obras de referência consultadas. A explicação mais direta foi de McMullin (apud Abreu e cols., 2003, p. 64): As técnicas de contestação baseiam-se na lógica de que, quando o cliente discute repetidamente uma crença, esta se torna progressivamente mais fraca. As raízes dessas técnicas estão na filosofia: disputar, desafiar e discutir as ideias. As contestações são pensamentos que vão contra, que se opõem a uma crença irracional: “Isto não é verdade!”, “Ninguém aqui está prestando tanta atenção assim em mim!”. Com base nas obras consultadas, poderíamos definir a contestação das crenças disfuncionais na terapia cognitiva como o ato ou efeito de opor-se às interpretações, pensamentos ou pressupostos desadaptativos aceitos pelo paciente como verdades absolutas, colocando-as em dúvida e desconstruindo-as de diferentes maneiras, seja questionando, argumentando ou testando tais pensamentos com a realidade. McMullin (2005, p. 205) diz que “muitas vezes eles estão tão bem-resguardados que a argumentação racional não funciona. Nossa melhor chance para ajudar os pacientes é prescrever a eles o tipo de experiência que fará com que descubram a verdade por si mesmos”, ou seja, realizan- do a contestação de maneira indireta, por meio da experiência. A contestação na terapia cognitiva objetiva desconstruir concepções prévias disfuncionais do paciente por meio da reflexão – cogitando novas hipóteses, sugerindo outras explicações, indicando 18 ângulos de análise ainda não percebidos – e da testagem das mesmas na realidade, visando o aper- feiçoamento de determinada compreensão dos acontecimentos, dando lugar para uma visão renovada, ampla, realista, flexível e funcional capaz de aliviar os sintomas. Judith Beck (1997, p. 30) enfatiza que “em termos cognitivos, quando pensamentos disfuncionais são sujeitos à reflexão racional, nossas emoções em geral mudam”. Nesse sentido, Leahy (2006, p. 17) também comenta: Os terapeutas cognitivos engendram nos pacientes um pensamentos científico e racional ao pedir que sejam examinados os pressupostos que levam a estados depressivos ou ansiosos [...] Os terapeutas ajudam os pacientes a examinar a validade de certas afirmações, coletando evidências que as contradizem. Importa destacar que as contestações no universo da terapia cognitiva podem ser empregadas em quatro “direções”: do terapeuta para consigo mesmo; do terapeuta para com o paciente; do paciente para consigo mesmo; e do paciente para o terapeuta. Os focos principais deste trabalho, no entanto, é aprofundar a contestação realizada do terapeuta para o paciente e do paciente consigo mesmo. 5. TÉCNICAS A terapia cognitiva disponibiliza um leque diversificado de técnicas que podem ser utilizadas para contestar pensamentos e crenças disfuncionais, como veremos ao longo deste trabalho, segundo a ótica de vários autores que tratam do tema na prática terapêutica. Segundo Beck, Rush, Shaw e Emery (1997, p. 5): As técnicas terapêuticas são projetadas para identificar, testar a realidade e corrigir as conceituações distorcidas e as crenças disfuncionais (esquemas) por trás destas cognições. Reavaliando e corrigindo seu pensamento, o paciente aprende a dominar problemas e situações que ele previamente considerou insuperáveis. O terapeuta cognitivo ajuda o paciente a pensar e agir de forma mais realística e adaptativa em relação aos seus problemas psicológicos e, deste modo, reduz os sintomas [...] Diversas técnicas verbais são usadas para explorar a lógica subjacente e a base de cognições e pressuposições específicas [...] As cognições e pressuposições subjacentes são discutidas e examinadas em relação à lógica, validade, adaptatividade e aumento de comportamento positivo versus manutenção da patologia. Nesse sentido, a terapia cognitiva demonstra e enfatiza o poder dos pensamentos mais realistas, até onde se consegue conhecer a realidade, oferecendo métodos para “testar os próprios pensamentos em comparação com a realidade”. Ninguém sabe tudo ou possui todas as respostas, nem o terapeuta nem o paciente, ou seja, não existe um “manual de soluções ou respostas prontas”. Leahy (2006, p. 17) afirma que a “realidade” é um sistema aberto: [...] o modelo cognitivo é construtivista, na extensão em que o “conhecedor” – aqui, o terapeuta e o paciente – jamais terá todos os fatos. Não existe nenhum teste completo das informações. Conhecer, no mundo empírico, é mais uma afirmação de probabilidades do que de certezas. As previsões baseiam-se em informações incompletas – sempre. O reconhecimento de que o pensamento inferencial é sempre incompleto, indeterminado e probabilístico é um componente essencial da perspectiva do terapeuta 19 cognitivo. Kelly (apud Fadiman e Frager, 2004, p. 349) contribui: O que achamos que sabemos se ancora somente em nossas suposições, não nos alicerces da verdade propriamente dita, e o mundo que procuramos compreender permanece sempre nos horizontes denossos pensamentos. Entender esse princípio plenamente é aceitar que tudo que acreditamos existir nos parece como parece em função de nossas presentes construções. Assim, até as coisas mais óbvias deste mundo estão abertas à reconstrução no futuro. As técnicas cognitivas se diversificam de acordo com os objetivos específicos de reestruturação. Neste contexto, Judith Beck (1997) comenta que, após confirmar a crença mais intensa a ser modificada, o terapeuta “formula em seu próprio raciocínio uma nova crença mais funcional e menos rígida. Essa nova crença deve ser tematicamente relacionada à crença disfuncional anterior, e o terapeuta deve acreditar resultar tal substituição em uma maior satisfação para o paciente” (p. 160). Na terapia do esquema, segundo Young, Klosko e Weishaar (2008, p. 93), a fase de mudança envolve estratégias visando modificar esquemas, ajudando o paciente a contestar os próprios pensamentos e crenças disfuncionais de maneira mais saudável. O terapeuta auxilia o paciente a construir uma argumentação lógica e racional contra o esquema. Em geral, os pacientes não questionaram seus esquemas, e sim os aceitaram com algo dado, como verdades. Em seus mundos psicológicos internos, os esquemas reinaram incontestes, e não houve modo adulto saudável para se contrapor aos mesmos. Estratégias cognitivas ajudam os pacientes a distanciar-se do esquema e a avaliar sua veracidade. Os pacientes percebem que existe uma verdade fora do esquema e que podem combatê-lo com uma verdade mais objetiva e empiricamente consistente. O terapeuta terá que identificar os esquemas do paciente e poderá tratá-los com diferentes técnicas cognitivas e comportamentais. Para Young (2003, p. 51), “todas as vezes que vemos o esquema surgindo durante a sessão, o apontamos e ajudamos o paciente a contestá-lo”. Mas as contestações não se restringem somente ao momento da sessão. O autor diz que “sempre que ele surgir fora da sessão, ensinamos o paciente a escrever o que aconteceu e a dar uma resposta racional”. As técnicas cognitivas destinadas a desafiar as crenças disfuncionais do paciente, amplamente apresentadas na bibliografia especializada sobre terapia cognitiva, buscam demonstrar para o paciente, por exemplo, os seguintes aspectos listados a seguir, em contraposição às distorções cognitivas mais comuns: • As outras pessoas podem estar pensando algo diferente do que se presume. • O futuro da própria vida ou de uma situação em particular pode não ser tão desfavorável quanto se presume. • Um determinado acontecimento potencialmente desconfortável pode ser plenamente suportável. • Qualquer pessoa possui diferentes facetas maduras e imaturas coexistindo em sua personalidade, ou seja, ninguém é perfeito. 20 • Os fatos da vida em geral, mesmo aqueles relativamente aversivos, possuem aspectos positivos a serem levados em consideração. • Os fenômenos da existência humana, embora possam conter características comuns para muitas pessoas, possuem elementos específicos e únicos a serem levados em consideração. • A responsabilidade pela maioria dos acontecimentos da vida é dividida entre as pessoas participantes e não são culpa somente de alguém. • Cada pessoa possui um histórico de vida particular e aproveita as oportunidades de maneira diferente, em contextos diferentes, gerando níveis de desempenho diferentes. • Os acontecimentos do passado tiveram seu contexto próprio e são importantes para tirarmos lições deles, porém é no presente que agimos. • A vida e o mundo oferecem imensuráveis possibilidades de interpretação e desfechos para os acontecimentos. • Refletir, escolher e agir num dado sentido atribuído para a vida é uma opção de cada um no presente, inevitavelmente. • A maneira mais vantajosa de interpretar a realidade é por meio dos atributos da racionalidade e não das emoções. • Qualquer conclusão alcançada, por mais convicto que estejamos dela, pode ser livremente aperfeiçoada. • A vida é feita de incertezas, sendo impossível controlar tudo e todos. • Um pensamento negativo não é, necessariamente, verdadeiro. • Os fatos ruins que ocorrem conosco não refletem, necessariamente, o que somos enquanto pessoa. • O fracasso num desempenho é humano e inevitável para todos. • Eventuais emoções desagradáveis possuem um papel importante no desenvolvimento humano. • Nem tudo tem uma solução imediata e definitiva. Num outro sentido, McMullin (apud Abreu e cols., 2003, p. 64) chama a atenção para as contestações construídas a partir da própria visão de mundo do paciente: O cliente deve encontrar seu repertório específico de contestações já que, sendo argumentos presentes na sua própria organização cognitiva, certamente elas serão mais efetivas. É preciso que se procure afirmações alternativas baseadas em evidências concretas: “É impossível estar sempre certo”, “Não se pode ser querido por todos”, etc. Cartões escritos podem funcionar como lembretes das afirmações a serem usadas em momentos de ativação da crença irracional. Podemos aplicar diferentes técnicas de contestação objetivando desafiar o mesmo pensamento, crença ou distorção cognitiva; assim como a mesma técnica pode ser útil para desafiar diferentes pensamentos, crenças ou distorções cognitivas. Sobre isto, Leahy (2006, p. 20) inclusive recomenda que o terapeuta diversifique as técnicas utilizadas: “A vantagem na utilização de uma variedade de técnicas para testar ou contestar o mesmo pensamento negativo é que o paciente terá técnicas alternativas para uso futuro, caso sua contestação inicial não funcione”. Por outro lado, nem toda técnica com o objetivo de contestar gera o efeito da contestação; assim como nem todo efeito de contestação é provocado propositalmente por uma técnica. Neste 21 caso, é importante observar o perfil do paciente. Sobre este aspecto, Judith Beck (1997, p. 24) faz suas considerações: A terapia, no entanto, varia consideravelmente de acordo com o paciente individual, a natureza de suas dificuldades, suas metas, sua habilidade de formar um vínculo terapêutico forte, sua motivação para mudar, sua experiência prévia com terapia e suas preferências de tratamento. A ênfase no tratamento depende do transtorno(s) particular do paciente. As contestações também podem ser realizadas através da comunicação não-verbal que sugere ao paciente rever certa interpretação. Dentro da subjetividade da comunicação interpessoal, elas podem ser mais diretas (objetiva e explicitamente) ou indiretas. Um olhar e até mesmo o silêncio podem ser contestadores em determinada ocasião. Depende do objetivo da intervenção e seus efeitos. Por exemplo, uma simples expressão facial do terapeuta pode sinalizar o seguinte questionamento: “você tem certeza disto que acabou de afirmar?” Questionamento Socrático A tarefa de contestar as crenças dependerá fundamentalmente da colaboração do terapeuta que orientará, principalmente através do questionamento socrático, a análise das ideias do paciente, algo que ainda não é realizado em nível satisfatório pelo paciente sozinho. Uma série de perguntas cuidadosamente fraseadas, feitas no momento certo, pode ajudar o paciente a isolar e considerar cuidadosamente um tópico, decisão ou noção específica. Uma série de questões pode abrir o pensamento do paciente em torno de um tópico específico e por meio disso permitir-lhe consi- derar outras informações e experiências – quer recentes, quer passadas. A curiosidade do paciente pode ser estimulada por uma série de perguntas. Suas visões rigidamente firmadas tornam-se hipóteses experimentais. (Beck, Rush, Shaw e Emery, 1997, p. 52) É importante destacar que o questionamento socrático pode ser utilizado tanto para identificar pensamentos automáticos e crenças irracionais quanto para contestá-los. Beck, Rush, Shaw e Emery (1997, p. 50) afirmam que “a maior parte das verbalizações do terapeutaestão estruturadas na forma de perguntas”, e que estas são úteis para diferentes funções, sendo consideradas um instrumento terapêutico fundamental. A utilização de perguntas serve a uma ampla variedade de funções intrínsecas à terapia cognitiva. De fato, uma única pergunta pode simultaneamente tentar atrair a atenção do paciente para uma área particular, avaliar suas respostas a este novo tópico de levantamento, obter informações diretas referentes a este problema, gerar métodos para resolver problemas que foram considerados como insolúveis e, por fim, levantar dúvidas na mente do paciente sobre conclusões previamente distorcidas. (Beck, Rush, Shaw e Emery, 1997, p. 50) Eis alguns exemplos destes questionamentos (Rangé, 2001, p. 280): • Quais as evidências que apóiam esta ideia? • Quais as evidências que vão contra esta ideia? • Existe uma explicação alternativa? 22 • O que de pior pode acontecer? Você poderia superar isto? • O que de melhor poderia acontecer? • Qual o resultado mais realista? Por meio dos questionamentos, o terapeuta cognitivo precisa ter a habilidade necessária para ajudar o paciente a identificar os erros de interpretação e, mais importante ainda, indicar-lhe quais pensamentos são mais funcionais. Por meio do diálogo e do questionamento, o terapeuta auxilia a pessoa a perceber em que ponto seus pensamentos e crenças estão distorcidos e como isto está relacionado ao mal-estar. O objetivo é ajudar a descobrir a verdade sobre si mesmo, quem eu sou verdadeiramente, o que está sendo encoberto por essas crenças irrealistas, injustas e distorcidas. (Rangé, 2001, p. 282) Beck, Rush, Shaw e Emery (1997, p. 23) contribuem: O uso de perguntas é uma parte importante da terapia cognitiva. Pode ser fácil para o terapeuta apontar que o paciente distorceu suas experiências, que há um pensamento interveniente entre um evento e uma experiência emocional. Porém pouco progresso pode ocorrer. É importante que o terapeuta faça perguntas que elucidem a lógica fechada do paciente utilizando uma abordagem indutiva. Friedberg e McClure (2004) apontam pelo menos três tipos de questionamentos socráticos: os lógicos, que desafiam as crenças ilógicas e o raciocínio causal; os empíricos, que pedem dados da realidade; e os funcionais, que enfatizam custos e benefícios. É importante evitar questionar o paciente muito frequentemente, pois pode “viciá-lo” em responder, predispondo a ele perder a naturalidade ou espontaneidade, bem como a fluência verbal. Tal procedimento pode também criar um vínculo de dependência, desaconselhável na terapia cognitiva. [...] o questionamento aberto, às vezes, deixa o paciente na posição defensiva de tentar adivinhar o que o terapeuta “espera” como resposta. O momento de fazer as perguntas deve ser cuidadosamente considerado e elas devem ser fraseadas de modo a ajudar o paciente a reconhecer e considerar suas noções reflexivamente – a pesar seus pensamentos com objetividade. (Beck, Rush, Shaw e Emery, 1997, p. 53) Beck, Rush, Shaw e Emery (1997, p. 298) propõem a Lista de Verificação de Competência para Terapeutas Cognitivos, comonze itens para avaliação específica da prática de questionamentos, onde o terapeuta analisado deve assinalar “apropriadamente incluído ( √ )”, “inapropriadamente omitido (–)”, “opcionalmente omitido (0)” e “não aplicável (NA)”. Eis os itens: ___ a. Terapeuta habilmente combinou perguntas para extrair dados referentes a sintomas, situação de vida, experiências atuais, penasmentos, sentimentos e experiências passadas (quando aplicável). ___ b. Usou perguntas abertas apropriadamente. ___ c. Uso mínimo de perguntas requerendo respostas sim ou não. ___ d. Evitou questionamento “fogo rápido”. ___ e. Intercalou perguntas com afirmações reflexivas, exemplos ilustrativos ou resumos 23 breves. ___ f. Usou perguntas para mostrar incongruências ou inconsistências nas conclusões do paciente sem rebaixar o paciente. ___ g. Usou perguntas para ajudar o paciente a explorar as diversas facetas do problema. ___ h. Usou perguntas para examinar as conclusões e pressuposições arbitrárias do paciente. ___ i. Usou perguntas para eliciar modos alternativos de resolver um problema. ___ j. Usou perguntas para considerar explicações alternativas. ___ k. Usou perguntas para prever consequências positivas e negativas de uma ação proposta (por exemplo, fazer tarefas de casa, demitir-se de um emprego ou ter um confronto pessoal). Com o passar das sessões, tal procedimento de contestar será ensinado/treinado para que o próprio paciente teste a validade dos seus pensamentos por meio dos questionamentos (metacognição). Um dos principais objetivos na terapia cognitiva é treinar o paciente para que ele adquira a capacidade de efetuar, por si, as autocontestações. O sexto princípio da terapia cognitiva refere-se exatamente ao seu papel educativo ao ensinar o paciente a desempenhar o próprio terapeuta. Segundo Judith Beck (1997, p. 23): Um benefício adicional deste procedimento indutivo é que o paciente pode praticar este comportamento de autoquestionamento posteriormente, quando está sem o terapeuta. Ou seja, ele “ouve” a voz do terapeuta fazendo perguntas como “Quais as evidências?” “Qual é a coisa mais adaptativa que eu posso fazer agora?” Além disso, aprendendo a reconhecer e testar suas hipóteses, o paciente desenvolve um empiricismo saudável que serve como uma salvaguarda contra formação de conclusões irrealistas. Para Beck, Rush, Shaw e Emery (1997, p. 5) Um dos componentes poderosos do modelo de aprendizagem da psicoterapia é que o paciente começa a incorporar muitas das técnicas terapêuticas do terapeuta. Por exemplo, os pacientes frequentemente percebem-se, espontaneamente, assumindo o papel do terapeuta, questionando algumas de suas conclu- sões ou predições. Na visão de Leahy (2006, p. 138), quando o paciente evita as situações que ativam crenças disfuncionais ele perde uma grande oportunidade terapêutica consigo mesmo. O autor nos diz que, por exemplo, “você supôs que ninguém gostaria de você, então não interage com as pessoas ou se afasta delas tão logo se sente pouco à vontade. Como resultado, você teve poucas oportunidades de contestar os pensamentos negativos”. Debate Na TREC – terapia racional-emotivo-comportalmental, proposta por Albert Ellis, o funcionamento cognitivo está baseado no modelo “A-B-C”, onde “A” é o acontecimento ativador, “B” a crença pessoal sobre o acontecimento e “C” as consequências emocionais e comportamentais. Para o autor, a etapa de tentar mudar as crenças irracionais do cliente é o verdadeiro trabalho terapêutico e ocorre no “D”, de Debater: 24 Debater significa combater, desafiar o sistema de crenças irracionais do cliente e portanto, é um processo lógico-empírico no qual o paciente é ajudado a parar e pensar para poder internalizar uma nova filosofia que envolva uma solução elegante. Isso será feito por questionamentos de natureza cognitiva, imaginária e/ou comportamental. (Rangé, 2001, p. 43) A TREC consiste num tratamento essencialmente verbal, sendo propostas diferentes estratégias de debate objetivando desafiar o sistema de crenças irracionais do cliente. Para Campos (1999), o terapeuta se esforça para que “o cliente avalie de forma crítica e científica suas crenças racionais e irracionais. É a etapa em que o cliente passa a perceber seu funcionamento cognitivo e detecta as bases de sua irracionalidade”. Os argumentos são considerados importantes meios de persuasão, capazes de provocar e manter mudanças cognitivas significativas. As perguntas, especial- mente empregando “por ques”, são vistas como os mais úteis instrumentos nesse processo, pois incitam o cliente a procurar explicações lógicas para justificar suas crenças. A TREC, por sua vez, apóia-se no método científico e na observação empírica. Na prática da TREC, para cada crença expressapor uma pessoa uma pergunta adequada seria “Quais são as evidências de que esta crença é verdadeira?”. Tenta-se fazer dos clientes melhores cientistas de modo que eles possam adquirir informações corretas, usar as evidências logicamente e construir crenças solidamente embasadas. (Rangé, 2001, p. 35) As principais perguntas de combate lógico dividem-se em 3 grupos (Walen, Di Giuseppe e Dryden apud Rangé, 2001): 1. Racionalidade: Perguntas para testar a racionalidade, por exemplo: “Isso é uma lógica correta? Isso é verdade? Por que não? Por que é assim? Por que essa é uma informação não- verdadeira? Por que tem que ser assim? Por que você deve?” (p. 44) 2. Realidade: Perguntas para testar a realidade, por exemplo: “Qual é a prova? Onde está a evidência? Que aconteceria se...? Você pode aguentar? Vamos ser cientistas: o que os dados mostram? Por que ela deve fazer isso? Alguém tem que fazer? Você pode se sentir feliz mesmo se não conseguir o que quer?” (p. 44) 3. Valores: Perguntas para testar os valores hedônicos, por exemplo: “Na medida em que você acredita nisso, como você se sente? ‘Eu devo conseguir o que quer que seja.’ Aonde esse comando pode levar você? Vale a pena o risco? Como você se sente quando pensa desse jeito? E aonde isso leva você? Que acontece quando você pensa assim? Por que você mantém uma crença que lhe causa tanto sofrimento?” (p. 45) Além dos 3 grupos de questionamentos, a TREC apresenta outras 5 estratégias de debate cognitivo (Rangé, 2001, p. 45): • Didática: Uso de miniaulas, analogias e parábolas. • Humor: Uso de abordagens com efeito humorístico. • Modelação Vicária: Indicar que muitas pessoas passam pela mesma situação, sem manifestar reações emocionais exageradas pois não possuem as mesmas crenças irracionais. • Imagem: Imaginar-se passando pela situação negativa procurando modificar os 25 pensamentos e sentimentos vividos, ou comportando-se de maneira positiva e adequada. • Comportamental: Exercitar ações, no mundo real, de modo oposto às crenças irracionais. Técnicas de Oposição A contestação gera relações de oposição entre a ideia irracional manifesta e o novo modo de pensar, mais racional e apropriado, para compreender/lidar com a situação em foco, evidenciando incompatibilidades e dissonâncias cognitivas. Quando colocamos algo em dúvida, pressupomos a possibilidade da existência de um erro, falta ou insuficiência na constituição deste objeto. Nesse sentido, a contestação assume o caráter opositivo exatamente porque desafia a visão de uma realidade entendida equivocadamente, por parte do paciente, como indefectível, completa, perfeita ou definitiva. Na visão de McMullin (2005), a contestação das crenças e pensamentos irracionais pode ser realizada através de diferentes técnicas de oposição realizadas pelo próprio paciente com a ajuda do terapeuta, que consistem em argumentar persistentemente contra a ideia irracional a fim de enfraquecê-la. O autor divide as técnicas de oposição em pelo menos três tipos básicas: intensas; leves; e objetivas. 1. Intensas: Identificar o maior número possível de palavras, frases, sentenças ou posicionamentos filosóficos fortes que se oponham a cada pensamento irracional. De acordo com o autor, “a oposição intensa ideal é aquela que traz consigo uma hierarquia de valores, percepções e experiências, e expulsa o pensamento irracional na direção oposta” (p. 73). 2. Leves: Técnica de relaxamento e tranquilização, em muitos casos mais eficazes no desafio às crenças distorcidas, reduzindo a excitação emocional. “Em estado de relaxamento, a crença irracional é desafiada tanto pelo pensamento quanto pela emoção, provendo assim dois elementos de tratamento ativo.” (p. 102) 3. Objetivas: Requer a atuação do terapeuta na argumentação que possa persuadir o paciente a seguir o mesmo estilo. “A oposição objetiva postula que as crenças do paciente podem ser modificadas se o terapeuta ajudar-lhe a angariar mais evidências contrárias à crença do que aquelas evidências com as quais o paciente a apóia.” (p. 119) Ainda segundo o mesmo autor, as técnicas de oposição empregadas devem variar e serem mais ou menos eficazes de acordo com o perfil de cada paciente e as crenças manifestas. Pacientes deprimidos, particularmente, podem precisar de uma abordagem emocional mais suave para reforçar seus opositores, enquanto pacientes com transtorno de pânico frequentemente beneficiam-se com a estratégia de ataque da oposição intensa. A análise objetiva das crenças do paciente é uma abor- dagem terapêutica cristalina e elegante. Nossa experiência nos mostra, no entanto, que muitos clientes não valorizam a lógica na mesma medida do terapeuta. Para tais pacientes é necessário suplementar ou substituir a oposição objetiva. (McMullin, 2005, p. 119) Outras Técnicas 26 Leahy (2006, p. 53) apresenta pelo menos 9 técnicas de avaliação e contestação dos pensamentos: 1. Definição dos termos: Também chamada de “técnica semântica”, é usada para saber o significado do termo ou conceito da crença (por exemplo, fracasso) na visão do paciente. 2. Análise de custo-benefício: Avaliação das consequências positivas e negativas da crença (custos versus benefícios; vantagens versus desvantagens), oferecendo a opção ao paciente de escolher, posteriormente, por mantê-la ou substitui-la. 3. Exame das evidências: Avaliação das evidências contrárias e favoráveis da validade das crenças negativas, comparando-as e avaliando-as em termos psicológicos, ou seja, o quanto cada evidência convencem o paciente para um lado ou outro. 4. Exame da qualidade das evidências: Avaliar o quão boa são as evidências para o paciente, considerando a consistência, validade, lógica e os fatos capazes de comprová-las efetivamente, como se estivesse diante de um júri. 5. Advogado de defesa: Imaginar-se num julgamento onde os pensamentos automáticos são representados pela acusação, tendo que o paciente (réu), na posição de advogado de defesa, atacar as evidências e a lógica dos argumentos do acusador. 6. Dramatização de ambos os lados do pensamento: Paciente e terapeuta alternam-se na posição racional versus a postura negativa, tentando convencer-se mutuamente e revezando-se no apoio a cada papel, com o paciente identificando respostas e contestações mais úteis. 7. Distinção entre comportamentos e pessoas: Distinguir entre o comportamento errado e a pessoa por inteiro, procurando isolar enganos ou erros e separá-los de um julgamento global de si mesmo, sem personalização e hipergeneralizações. 8. Exame das variações do comportamento em diferentes situações: Focalizar para além de determinado momento, considerando mais os fatores situacionais que levaram ao comportamento e compreender seu contexto sem rotular os indivíduos (pensamento em termos de tudo-ou-nada). 9. Uso do comportamento para resolver o pensamento negativo: Usar a ação para iniciar a mudança, colocando o foco na solução ou aceitação do problema, procurando o que pode ser feito para melhorar habilidades (sociais, de comunicação, relacionadas ao trabalho), resolver problemas ou mudar a situação. Dentre as inúmeras técnicas apresentadas por Leahy (2006, p. 179), destacamos outros três exemplos de como realizar as contestações, neste caso, de pensamentos ilógicos: 1. Exame das contradições internas: O terapeuta questiona o paciente se ele possui dois pensamentos contraditórios, por exemplo, “Eu deveria ser perfeita, mas não quero me criticar” ou “Eu gostaria de conhecer tantas pessoas quanto possível, mas nunca quero ser rejeitado”. 2. Redução ad absurdum: Levar a lógica do argumento a um nível absurdo, por exemplo, “Se estou solteira, então não sou digna de amor”, sendo assim, “Todas as pessoas casadas foram solteiras outrora; portanto, todas são indignas de amor”. 3. Contestação da autocrítica recursiva: Ajudar o paciente a ver se não está preso num círculo de ser criticado por ser autocrítico, porexemplo, “Acho que sou um fracasso porque estou 27 deprimido, e estou deprimido porque acho que sou um fracasso”. 28 Leahy (2006, p. 280) ainda apresenta um formulário para contestação dos esquemas pessoais: Técnica Resposta Identifique o esquema pessoal Defina seu esquema Grau de crédito no esquema (0 a 100%) Emoções desencadeadas pelo esquema Que situações desencadeiam o esquema? Custo e benefício do esquema Custo Benefício Evidências contra e a favor A favor Contra Use a técnica do duplo-padrão. Você aplicaria isso a mais alguém? Por que este esquema é irreal? Imagine-se em um continuum – não em termos de tudo-ou-nada (por exemplo, avalie-se e os outros em uma escala de 0 a 100%) Atue contra o esquema (O que você pode fazer que se opõe a ele?) Reavalie a crença no esquema Não-contestação Na prática das contestações, o objetivo, obviamente, não é opor-se a pensamentos que se mostrem verdadeiros. Leahy (2006, p. 27) destaca que os pensamentos causadores de perturbações podem ser verdadeiros, falsos ou ter diferentes níveis de validade. Só porque acredito que algo seja verdadeiro, isso não significa que seja verdade. Pensamentos são hipóteses, descrições, perspectivas e até mesmo adivinhações. Eles podem revelar-se verdadeiros ou falsos. Os pacientes precisam aprender a identificar seus pensamentos e depois examinar os fatos. Além disso, Leahy (2006) destaca outras duas condições que não são contestáveis: 1. Pensamentos expressos como fatos: Por não serem testáveis, não são passíveis de refutação. “Se não existe maneira de refutar uma afirmação, então ela não tem significado. Eis um exemplo de afirmação que não é passível de refutação: 'Não importa o que eu faça, não tenho valor'.” (p. 136). A própria afirmação já descarta todas as evidências contrárias, sendo o mesmo que dizer “não tenho valor e nada do que você disser vai mudar essa crença”. 2. Sentimentos: Não contestamos sentimentos e sim os pensamentos que originam os sentimentos. Não teria sentido dizer a um paciente: “Você, na verdade, não está ansioso”. Isso seria equivalente a dizer, em essência, que o ferro quente não feriu realmente o paciente quando ele exclamou Ai!. “Ai!” é o relato da sensação – exatamente como as palavras “Estou feliz” ou “Estou triste” são relatos de senti- 29 mentos. (p. 25) Judith Beck (1997, p. 105) também faz suas considerações quanto às emoções do paciente: “Embora o terapeuta possa reconhecer a excessividade ou inadequação de uma emoção, ele se abstém de rotulá-la como tal, especialmente no início da terapia”. A autora recomenda, ao contrário, que o terapeuta reconheça e empatize “com o como o paciente se sente. Ele não desafia ou contesta as emoções do paciente, mas, antes, focaliza em avaliar os pensamentos e crenças disfuncionais por trás da sua aflição, a fim de reduzir a disforia”. Dois autores consideram a função das emoções no momento de analisar as situações perturbadoras para o paciente: O terapeuta não analisa todas as situações nas quais o paciente se sente disfórico; a terapia cognitiva visa reduzir a aflição emocional que está relacionada a interpretações errôneas de uma situação. Emoções negativas ‘normais’ são tanto uma parte da riqueza da vida quanto emoções positivas e servem a uma função tão importante quanto a dor física, nos alertando para um problema potencial que pode precisar ser abordado. (Beck, J.; 1997, p. 105) Pressão, estresse e sofrimento não são sempre necessariamente ruins. Mostram aos pacientes que há algo errado, alguma coisa está doendo. É preciso que os pacientes identifiquem de onde vem a dor, para que possam tratá-la, e não apenas aplacá-la. (McMullin, 2005, p. 82) Por fim, Judith Beck (1997, p. 156) alerta os terapeutas para não desperdiçarem tempo e esforço trabalhando sobre crenças tangenciais ou naquelas crenças menos fortalecidas pelo paciente. Eficácia Leahy (2006, p. 33) aponta a variação da força da crença como um indicativo de sua possível modificação e, nesse sentido, também como um instrumento de avaliação sobre o quanto esta crença já foi superada. Presumivelmente, o foco e a preocupação do paciente em relação à crença irão variar de acordo com o momento do dia, os acontecimentos e outros pensamentos. Essa variação reforça ainda mais a ideia de que uma crença fortemente mantida pode ser modificada. Além disso, esta crença pode variar durante a sessão. A avaliação de eficácia das contestações pode ser realizada por meio da checagem do quanto o paciente ainda enfatiza determinada crença. Sobre isso, Leahy (2006, p. 33) observa: Periodicamente, durante a sessão, conforme paciente e terapeuta se dedicam a contestar crenças e a planejar comportamentos, o terapeuta pode perguntar ao paciente quão forte está a crença naqueles diferentes momentos. Não é raro o paciente começar a sessão acreditando 90% em uma crença e aca- bar a mesma sessão acreditando 40%. Judith Beck (1997, p. 122) também indica outros parâmetros, nos dizendo que “Quão intensa a sua emoção é antes e depois do questionamento socrático, de modo que ele pode avaliar quão bem 30 esta intervenção funcionou”. E complementa: Usualmente não é possível e nem necessariamente desejável reduzir o grau de uma crença a 0%. Saber quando parar de trabalhar sobre uma crença é, portanto, uma questão de julgamento. Em geral, uma crença foi suficientemente atenuada quando o paciente a endossa de forma inferior a de 30% de quando ele tende a continuar a modificar seu comportamento disfuncional, apesar de ainda agarrar-se a um resquício dessa crença. (p. 160) 6. EXEMPLOS DE CONTESTAÇÕES Muitas manifestações humanas estão sujeitas à contestação como, por exemplo, valores pessoais, escolhas e até mesmo determinados objetivos do paciente ao aderir a um tratamento psicológico. A proposta desta pesquisa, no entanto, é apresentar as contestações aplicadas às crenças disfuncionais, também denominadas de errôneas, irracionais ou desadaptativas, no contexto da terapia cognitiva. Aqui reproduzimos as contestações de Ellis (apud Rangé, 2001, p. 40) às três crenças irracionais consideradas pelo autor como as mais importantes e comuns: Crença: Para mim, é absolutamente necessário ser amado e aprovado pelas pessoas que me são importantes. Contestações: 1. É possível que, mesmo que você consiga 100 vezes amor e aprovação em 100 tentativas, na vez seguinte alguém lhe negue isso? 2. É possível que, mesmo que você tenha obtido amor e aprovação, isto possa não ser suficiente, pois acabarão surgindo preocupações sobre o quanto você foi aprovado e amado, se ainda o consegue e até quando o conseguirá? 3. É possível que, pelos próprios preconceitos ou tendenciosidades do outro, você possa só receber indiferença ou reprovação, ao invés daquilo que deseja? 4. É possível que o gasto de energia para tentar agradar todas as pessoas faça com que reste muito pouca energia para seus outros objetivos na vida? 5. É possível que sua busca compulsiva de amor e aprovação acabe gerando um comportamento inseguro, que conduza mais à perda de aprovação e respeito do que ao seu ganho? 6. É possível que amar alguém, que é algo prazeroso e absorvente, possa ficar inibido e impedido de se expandir pela busca incessante de ser amado? 7. Não seria mais racional acreditar que: • Você deseja amor, e não precisa dele. • É muito mais prazeroso ser aprovado e amado pelas próprias realizações. Elas é que sustentam uma forte autoestima: é por nossas conquistas, principalmente as mais difíceis, que gostamos cada vez mais de nós mesmos. A necessidade (infantil) de ser amado incondicionalmente sustenta uma falsa e frágil autoestima, pois ela depende sempre de novas provas de amor e 31 aprovação em cada momento. Uma autoestima verdadeira e forte deriva de um comprometimento determinado em seguir os próprios objetivos, não de aprovações alheias. • É desagradávelnão receber amor ou aprovação de alguém importante, mas isso é catastrófico? • Suas ações devem ser guiadas pelos seus desejos, não pelo desejo dos outros. Afinal, de quem é a sua vida? • A melhor forma de ganhar amor é dar amor genuinamente. II. Crença: Para se ter valor, é necessário ser competente e bem-sucedido em todos os aspectos da vida. Contestações: 1. É possível ser competente em todos os aspectos da vida? Tentar ser competente em alguns aspectos pode se saudável e recompensador (prazer, dinheiro), mas ter a obrigação de ser extremamente competente é um caminho direto ao medo e à desvalorização, à ansiedade e à depressão. 2. É possível que uma busca desenfreada pelo sucesso ultrapasse os limites do corpo e provoque doenças psicossomáticas? 3. É possível que, ao fazer comparações dos seus sucessos com os dos outros, você esteja sendo guiado (a) por padrões externos, e não pelos seus objetivos pessoais? Se você pensa que tem que ter sucesso marcante, você não estará apenas se desafiando e testando suas próprias capacidades; está, invariavelmente, comparando-se com os outros e tentando superar os melhores. Assim, você passa a ser guiado (a) pelos outros mais do que por si mesmo (a). Desse modo, sem se dar conta, estabelece metas inalcançáveis, pois, mesmo que você possa ser extremamente destacado em algo, sempre poderá aparecer alguém melhor. Não faz sentido comparar- se aos outros, uma vez que não se pode ter controle sobre o comportamento dos outros, somente sobre os próprios. 4. É possível que a concentração na crença de ter que ser competente desvie você da meta principal da vida, que é ser feliz? Você já pensou que esta se alcança (1) experimentando e descobrindo quais são seus desejos mais gratificantes na vida e (2) gastando corajosamente (não importando o que os outros pensem) uma boa parte do pouco tempo que dura a sua vida perseguindo isso? 5. É possível que uma preocupação excessiva com a competência acabe resultando em muito medo de correr riscos, de errar, de falhar em certos empreendimentos e que estes próprios medos sabotem os objetivos que você quer alcançar pelo efeito negativo que produzem no desempenho? 6. Não seria mais racional acreditar que: • É melhor tentar fazer mais do que “se matar” para tentar fazer bem, assim como é melhor focalizar-se no processo mais do que no resultado. • Ao tentar fazer algo, é melhor fazer pelo prazer de fazer bem-feito mais do que para agradar alguém. • Uma coisa é tentar fazer bem alguma coisa pela satisfação que isso dá; outra é tentar fazer perfeitamente bem. Uma coisa é tentar o seu melhor; outra é tentar ser melhor do que os outros. • Os esforços valem pela realização em si ou pela realização com a satisfação que ela traz? 32 • Os erros, mais do que algo para se recriminar, são muito valiosos, pois é por meio deles que se aprende. Aceite a necessidade de ter que praticar muito se você quiser ter sucesso em alguma coisa, a necessidade de se forçar a fazer as coisas que você tem medo de fazer e o fato de que os seres humanos são limitados, e você, particularmente, tem suas limitações especificas. III. Crença: É terrível e catastrófico quando as coisas não acontecem do jeito que se quer. Contestações: 1. Não há motivos para que as coisas devam ser diferentes do que são, não importando o quanto elas sejam insatisfatórias ou injustas. É satisfatório quando as coisas acontecem do jeito que desejamos, mas isso não é necessário ou obrigatório. A ideia de um mundo justo é apenas um ideal social. 2. Sentir-se inconsolável frente a situações adversas não ajuda a transformar as coisas. O contrário é o mais provável: quanto mais afetada pelas circunstâncias adversas, mais ineficiente torna-se uma pessoa para tentar reverter as coisas e alcançar o que deseja. 3. Quando as coisas não são da forma que se quer, deve-se fazer o máximo para mudá-las; porém quando isso é impossível, momentaneamente ou para sempre, a única atitude saudável é resignar-se. 4. Mesmo havendo uma grande relação entre frustração e raiva, pode-se constatar que são nossas interpretações dos acontecimentos que geram a raiva. Uma pessoa só se sente necessariamente infeliz e irada se ela estabelece suas preferências em termos de necessidades. 5. Ao invés de manter-se desnecessariamente exaltado (a) diante de circunstâncias frustrantes ou de injustiças reais ou imaginárias, você pode tentar adotar as seguintes atitudes: • Será que estou exagerando a dimensão negativa daquilo que está me acontecendo? Se houver realmente aspectos negativos e desprazer não será melhor trabalhar racionalmente no sentido de alterar as circunstâncias e, se for impossível, resignar-me, ao invés de ficar irritado ou me lamentando da sorte ou da minha infelicidade? • Será que estou vendo como catastrófico, terrível ou fatal algo que é apenas desagradável? • De que modo posso aprender com essa experiência frustrante, usá-la como um desafio e integrá-la de modo útil à minha vida? Será que não estou duplicando meu sofrimento ao me irritar com a própria irritação? Beck, Rush, Shaw e Emery (1997) nos apresentam três exemplos de contestações por meio da contra-argumentação: Exemplo 1 (p. 195): Paciente: Eu penso que qualquer um que não esteja preocupado com o que os outros pensam seria socialmente atrasado e estaria funcionando em um nível bastante baixo. Terapeuta: Quem são as duas pessoas que você mais admira? P: Meu melhor amigo e meu chefe. T: Estes dois estão superpreocupados com as opiniões dos outros? P: Não, eu não acho que nenhum deles se preocupe em absoluto com o que os outros pensem. 33 T: Eles são socialmente atrasados e ineficientes? P: Eu entendo o que você quer dizer. Ambos têm boas habilidades sociais e funcionam em níveis elevados. Exemplo 2 (p. 195): P: O único modo pelo qual eu alguma vez seria feliz é se eu pudesse ser uma grande escritora. T: Que nível de qualidade literária você teria que atingir? P: Eu teria que ser tão boa quanto (a paciente citou uma poetiza). T: Esta poetiza atingiu grande felicidade? P: Não, eu acho que não. Ela se matou. Exemplo 3 (p. 197): T: Quanto dinheiro você precisaria para ser feliz? P: Eu não sei, mais do que eu tenho agora. T: Anteriormente na sua vida você pensou que se você tivesse tanto quanto tem agora você seria feliz? P: Provavelmente sim. T: Sucessos, conquistas, dinheiro, tudo isso é aberto. Não é como pintar uma parede ou construir uma mesa. Não há ponto final. P: Mas eu acredito que se eu pudesse conseguir a quantia de dinheiro que eu preciso, eu ficaria contente. T: Isso é uma necessidade real? Se você acreditasse que precisa de algo que você realmente não precisa, você jamais seria capaz de conseguir suficiente disso. Você não pode conseguir o suficiente de algo que você não precisa, mas acredita que precisa. Reproduzimos aqui alguns exemplos de intervenções úteis, sugeridas por Leahy (2006, p. 308-321), para contestar as principais distorções cognitivas: 1. Leitura mental: “Ele acha que sou um perdedor”. Você acha que a leitura mental lhe proporciona informações valiosas? Como você poderia provar que seu pensamento está errado? Ele é testável? Se alguém não gostar de você, o que vai acontecer? Que coisas continuarão sendo as mesmas? Não importa o que você faça, algumas pessoas não vão gostar de você. Atue contra o pensamento fazendo algo positivo em relação à pessoa que você pensa não gostar de você. 2. Previsão do futuro: “Não vou conseguir o emprego”. Você acha que a preocupação o protege e o prepara? Não importa o que você faça, é sempre possível que algo ruim aconteça. 34 Quantas vezes você fez previsões erradas? Qual é o pior, o melhor e o mais provável desfecho? Descreva em detalhes três desfechos positivos. 3. Catastrofização: “Seria terrível se eu fracassasse”. Quantas vezes você fez previsões erradas? O que exatamente tornaria esse acontecimento
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