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Reflexão "O Silêncio dos Homens" e a Psicologia Jurídica

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UNIVERSIDADE PAULISTA – UNIP
CURSO DE PSICOLOGIA JURÍDICA
ARTIGO
	O presente artigo busca fazer uma reflexão entre o documentário “O Silêncio dos Homens”, utilizando o que foi apresentado na disciplina de Psicologia Jurídica oferecida pela Universidade Paulista UNIP e nos artigos referentes ao estágio nesta mesma área afim de compreender os aspectos sociais, culturais e econômicos que influem sobre a violência de modo geral e na violência contra a mulher. 
	O documentário, disponível integralmente e gratuito no Youtube traz um estudo feito com mais de 20.000 participantes onde busca-se compreender os motivos do porquê a maioria dos homens evita falar sobre questões aflitivas, como suas inseguranças, medos e emoções com amigos próximos ou parentes. Este documentário também traz dados sobre a violência familiar e a ausência de figura paterna na maioria dos lares brasileiros. Um dos objetivos apresentados no vídeo é compreender aspectos que fazem parte da construção da masculinidade do homem atual, de onde essas construções vem e quais as consequências delas sobre a saúde psicológica, física e emocional desses homens. 
	No texto de Moreira e Prieto (2010) temos em um primeiro momento a apresentação do ciclo da violência, pontuando que a violência física é precedida pela violência psicológica, na qual o agressor impõe à vítima diversas formas de violência. É preciso entender como a violência psicológica age na relação para então entender os mecanismos que instauraram a violência física. A violência psicológica acontece de diversas formas, seja por meio de humilhações, questionamento da competência da(o) companheira(o), isolamento social, ciúme patológico, ameaças, entre outros. Esse tipo de violência tem como objetivo controlar a vítima, seja de forma direta ou utilizando o ponto fraco da pessoa para manipulá-la. 
	Os autores apontam também que é nas relações familiares que as crianças aprendem que aqueles que amam e são amados também são aqueles que batem. A visão da família como algo sagrado gerou uma barreira de proteção à violência doméstica, mesmo que esta tenha ganhado espaço público na década de 80 e na posterior criação da Lei Maria da Penha em 2006 ainda se tem registros de inúmeros casos de violência dentro das casas direcionada tanto à mulher quanto à crianças e idosos. 
O documentário “O Silêncio dos Homens” também retratam através de depoimentos de voluntários questões relacionadas à violência familiar presenciada na infância e orientações vindas das poucas figuras paternas presentes no que se refere a forma de se comportar, como por exemplo, não agir de forma considerada feminina, mesmo que para as crianças essas distinção não seja feita de forma tão clara, sendo a orientação dos adultos o parâmetro a ser considerado. É dentro de casa que um menino aprende o que é ser homem, a partir das orientações de pais, mães, avós e tios, e a partir do exemplo dado por estes nas situações relacionais.
	A violência contra a mulher é citada no documentário como fruto das orientações dadas aos meninos e aos exemplos obtidos em casa. A violência domiciliar é um fenômeno que advém de uma cultura patriarcal onde o espaço de atuação social da mulher é restrita à expectativa de ser boa cuidadora e boa amante, sendo subordinada às ordens de pais, irmãos e maridos que são criados afim de perpetuar condutas controladoras, onde há a obrigação de serem provedores e protetores sem que sejam também, cuidadores afetuosos e é nesse ponto que o documentário se aprofunda, trazendo falas de pessoas reais que não foram orientadas a saber amar, cuidar, acarinhar e escutar, mas sim a se impor, pois um homem que não se impõe, mesmo que pela força, não é credibilizado na sociedade, ao menos, é isso que lhes é ensinado.
	Jaeger (0000) nos apresenta o conceito da perspectiva relacional, onde a mulher é tomada como cúmplice da situação de violência, sendo esta uma fonte de comunicação estabelecida entre homens e mulheres. Esta perspectiva critica a forma fixa e dualista dos papéis de gênero, rejeitando explicações biológicas das desigualdades de poder entre os sexos, afirmando que há uma construção cultural sobre os papéis adequados a cada gênero, dando significado às relações de poder. No documentário “O Silêncio dos Homens” vê-se presente nos relatos dos participantes essa forma relacional de ensinar os papéis de cada indivíduo na sociedade onde se a pessoa se apresenta como A, não pode nunca se apresentar com comportamentos de B se for preciso. Um exemplo disto é a orientação dada dentro do âmbito familiar de que homens de verdade não expressam sentimentos e são sempre fortes como pedras, cabendo à mulher o papel sentimental da vivência em coletivo. 
A autora também traz aspectos históricos da construção dos papéis de gênero na sociedade moderna, explicando que durante o domínio da classe burguesa as funções de cada segmento hierárquico da família foram impostas, levando homens, mulheres e crianças a assumirem determinados papéis e funções compondo as normas sociais. No século XVIII cartilhas foram distribuídas afim de servir como manual para um comportamento mais adequado de cada indivíduo dentro de suas casas, onde o homem nunca deveria ocupar espaços e exercer funções domésticas, pois seu papel era trazer o sustento daquela família, já à mulher lhe caberia cuidar de todos os aspectos domésticos juntamente do cuidado dos filhos, e as crianças deveriam corresponder ao mundo infantil que os adultos lhes determinavam, somente se preparando para assumir seus papeis de homem ou mulher no futuro, claro, sempre de acordo com o manual de como ser um adulto adequado. Mesmo com o estabelecimento de novas configurações familiares, muitas doutrinas impostas em séculos passados ainda são perpetuadas atualmente pois fazem a manutenção efetiva de um sistema sócio relacional que oprime todos os seus integrantes, muitas vezes impedindo relações saudáveis entre os membros de uma sociedade.
As imagens de homens e mulheres propagadas na mídia além de induzirem mudanças nos modelos relacionais de convivência, também servem como manutenção de modelos hoje vistos como inadequados nas relações interpessoais e familiares. A partir do momento que modelos são reforçados ou descontruídos nos veículos de mídia a população como um todo começa a tomar esse modelos como reais a passos mais rápidos ou mais lentos, dependendo da história de vida de cada sujeito e de como sua subjetividade é estabelecida e reestabelecida ao longo das vivências relacionais. 
É imperativo que homens e mulheres tomem conhecimento dos tipos de violência aos quais podem estar sujeitos e tomem consciência de que suas vidas não podem depender do bom humor de um parceiro(a) abusivo. Conhecendo os conceitos de violência a capacidade de distinção se torna presente fazendo com que as agressões não se agravem e nem sejam perpetuadas, pois, além daquela mulher ou homem que sofre violência estão crianças que por meio da exposição entorpecem os sentidos e passam a tratar a violência com normalidade e como ferramenta de manipulação. 
Referências:
JAEGER, F. P. Violência de Gênero Intrafamiliar: Compreendendo e Enfrentando o Fenômeno. In: Família e Violência – Conceitos, Práticas e Reflexões Críticas. Curitiba: Juruá Editora, 2013. Pg 11-28.
MOREIRA, M.M.N.; PRIETO, D. (2010). “Da sexta vez não passa”: violência cíclica na relação conjugal.  
Morgado, R. (2004). Mulheres em situação de violência doméstica: limites e possibilidades de enfrentamento. In: Gonçalves, H.S.; Brandão, E.P. Psicologia Jurídica no Brasil.  
Documentário: O Silêncio dos Homens. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=NRom49UVXCE&list=PLc0-Y0RbU8nK4M_OLWRVmXVxFuoqsVk-b&index=3&t=0s Acesso em: 02/04/2020
Werlang, B.S.G.; Sá, S.D.; Borges, B.R. (2009) Violência doméstica contra a mulher e a lei Maria da Penha. In: Rovinski, S.L.R.; Cruz, R.N. Psicologia Jurídica: perspectivas teóricas e processos de intervenção.

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