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IM UN OL OG IA 94 Quando se fala em imunologia o termo anticorpo vem à mente quase que instantaneamente. Isso porque as imunoglobulinas são, de fato, moléculas essenciais para o adequado funcionamento do sistema imunológico. Sua natureza proteica nos remete ao dogma da biologia, o qual pontua os eventos replicação, transcrição e tradução como pontos centrais nos organismos vivos. Portanto, a partir de agora, é hora de compreendermos como as células B utilizam o código genético para produzir uma gama enorme de anticorpos com as mais distintas especificidades. RELEMBRANDO A MOLÉCULA DE IMUNOGLOBULINA No início de nosso curso, mais precisamente na aula 2, vimos em detalhes a estrutura dos anticorpos. A molécula de imunoglobulina é formada por uma combinação de cadeias leves e pesadas, ambas possuindo regiões variáveis e constantes. A figura 1 traz uma representação esquemática de uma molécula de anticorpo. Por se tratar de uma molécula bioquimicamente classificada como glicoproteína, portanto possuindo um componente proteico, as BASE GENÉTICA DOS ANTICORPOS Representação esquemática de uma molécula de anticorpo. A cadeia pesada é representada pela cor verde, enquanto a cadeia leve na cor amarela. As regiões variáveis das cadeias leve e pesada encontram-se nas porções superiores da figura (listrado) e as regiões constante na porção inferior. A cauda transmembrana, a qual mantem o anticorpo ancorado à superfície da célula B, formando o BCR, não está representada na figura. imunoglobulinas são sintetizadas a partir de processos que se iniciam no núcleo celular. O material genético, o nosso DNA, armazena as informações necessárias para a formação dos diferentes anticorpos. De maneira simplificada, o processo de transcrição transcreve o DNA em RNA, sendo este último traduzido em proteína no citosol. Porém, aqui não podemos ficar no superficial. Vamos, portanto, mais a fundo nesse conteúdo. Onde estão as informações genéticas para a síntese dos anticorpos? Os anticorpos são formados por cadeias leves e pesadas. As cadeias leves que formam os anticorpos podem ser de dois tipos: cadeia κ (kappa) e cadeia λ (lambda). Já as cadeias pesadas podem ser do tipo µ (mi), δ (delta), γ (gamma), ε (épsilon) e α (alfa). Importante relembrarmos que são as cadeias pesadas que determinam qual o isotipo de anticorpo. Nesse sentido temos: • IgM formada por cadeia pesada do tipo µ; • IgD formada por cadeia pesada tipo δ; • IgG formada por cadeia pesada do tipo γ; • IgE formada por cadeia pesada tipo ε; • IgA formada por cadeia pesada do tipo α. Tão importante quanto relembrarmos que são as cadeias pesadas que determinam qual o isotipo de anticorpo é relembrarmos que a especificidade destas moléculas se dá na região variável das cadeias leve e pesada. As informações genéticas para todas estas cadeias acima mencionadas estão armazenadas em cromossomos distintos, no núcleo celular. No cromossomo 2 se encontra o locus contendo as informações genéticas para a cadeia leve do tipo Adaptados de Janeway’s Immnunobiology, Bed. (© Garland Science 2012) 95www.biologiatotal.com.br IM UN OL OG IA κ, enquanto que o locus da cadeia leve do tipo λ se encontra no cromossomo 22. Já o locus das cadeias pesadas se encontra no cromossomo 14. COMO SÃO OS LOCI DAS CADEIAS DE ANTICORPOS? Já sabemos onde estão armazenadas as informações genéticas que formarão as diferentes cadeias que constituem uma molécula de imunoglobulina. Porém, os loci das diferentes cadeias possuem características distintas. Vamos a elas. O locus da cadeia leve κ é formado por 38 segmentos gênicos “variáveis” distintos, denominados de Vκ1 a Vκ38, cada um deles precedido de uma sequência líder. Após as sequências de segmentos variáveis são encontrados cinco segmentos “juncionais”, denominadas Jκ1 a Jκ5. E, por fim, uma única sequência gênica “constante” denominada Cκ. O locus da cadeia leve λ é formado por 30 segmentos gênicos variáveis distintos denominados Vλ1 a Vλ30, precedidos de sequência líder tal qual os segmentos gênicos da cadeia κ. Após os 30 segmentos gênicos dos domínios variáveis, são observados quatro segmentos gênicos juncionais, denominadas Jλ1 a Jλ4, e quatro segmentos gênicos constantes, denominadas Cλ1 a Cλ4. Porém, diferente do que se observa na cadeia κ, as sequências Jλ e Cλ são encontradas de modo alternado dentro do cromossomo (primeiramente a sequência Jλ1 seguida da sequência Cλ1, depois a sequência Jλ2 seguida da sequência Cλ2, e assim para as outras duas cadeias). O locus da cadeia pesada é formado por 40 segmentos gênicos variáveis distintos denominados VH1 a VH40, cada um precedido de uma sequência líder. Uma peculiaridade da cadeia pesada é a ocorrência de 23 segmentos gênicos de “diversidade”, denominados DH1 a DH23. Após estes segmentos gênicos diversidade, é possível observar seis segmentos juncionais, denominados JH1 a JH6. Os segmentos gênicos constantes são encontrados após os segmentos J. Como as cadeias pesadas são diferentes em cada isotipo de anticorpo, os segmentos gênicos que formam os isotipos distintos são encontrados na seguinte sequência: um segmento gênico constante µ (Cµ), um segmento δ (Cδ), dois segmentos γ (Cγ3 e Cγ1), um segmento α (Cα1), mais dois segmentos gênicos γ (Cγ2 e Cγ4), um segmento gêncio ε (Cε) e, por fim, mais um segmento gênico α (Cα2). O esquema a seguir ilustra a disposição dos distintos segmentos gênicos das cadeias leve e pesadas. A SÍNTESE DA MOLÉCULA DO ANTICORPO Já sabemos onde se encontram as informações genéticas para a produção de anticorpos, agora precisamos “sintetizá-los”. O processo é simples, Organização dos genes das cadeias leves e da cadeia pesada. Na parte superior está apresentado o locus da cadeia leve λ, com os segmentos gênicos V (variável), J (junção) e C (constante). No centro da figura está representado o locus da cadeia leve κ, também com os seus segmentos V, J e C. Já parte inferior da figura está representado o locus da cadeia pesada, com os segmentos V, D (diversidade), J e C. Importante: nesta representação do locus da cadeia pesada apenas o segmento Cµ é apresentado, o qual codifica a cadeia pesada para isotipo IgM. Os demais segmentos foram suprimidos da figura. IM UN OL OG IA 96 tal qual as demais sínteses proteicas realizadas por células eucarióticas. Comecemos pela cadeia leve. Primeiramente, através de um processo de recombinação somática no núcleo celular, os segmentos V e J de uma cadeia leve são unidos. Após a recombinação somática, o material genético passa pelo processo de transcrição, formando o chamado transcrito primário, o qual deixa de ser uma fita dupla de DNA e passa a ser uma fita simples de RNA. O transcrito primário de RNA é, então, processado para poder sair do núcleo celular e, finalmente, ser traduzido em proteína nos ribossomos. Neste processamento de RNA observa-se um evento chamado splicing, no qual os íntrons são removidos da fita de RNA e os éxons são unidos. Com isso, o segmento VJ se une com o segmento C, formando um segmento VJC completo. Outros dois eventos são observados no processamento do RNA: um deles é a adição de uma estrutura chamada de “cap” e outro é a adição de uma calda “poli-A” – deixemos isso para a biologia molecular! Uma vez processado, o RNA mensageiro deixa o núcleo com os segmentos VJC para o citoplasma onde é traduzido em proteína. Este é o processo no qual se forma a cadeia leve de uma molécula de anticorpo. Mas e a cadeia pesada? O processo é muito semelhante ao que se observa na síntese da cadeia leve. Inicialmente, a recombinação somática une os segmentos D e J, formando um segmento DJ. Subsequentemente se observa a união do segmento V ao segmento DJ, formando um segmento VDJ. Observa-se a transcrição do DNA, formando um transcrito primário. Após o processamento, incluindo splicing, o segmento VDJ se une com os segmentos C, formandoo RNA mensageiro que possui a sequência para a cadeia pesada da molécula do anticorpo. Um esquema resumido é apresentado na figura 3. Diferença entre BCR e anticorpo sérico É bom lembrarmos que os anticorpos podem formar os receptores de célula B (BCR, sigla em inglês para B cell receptor) ou serem secretados. Para que um anticorpo se mantenha ancorado à membrana plasmática, formando o BCR, é necessário que o segmento gênico C da cadeia pesada seja transcrito com os éxons M1 e M2. Estes éxons codificam a porção transmembrana e a calda citoplasmática do anticorpo. Porém, quando uma célula B se ativa e se diferencia em plasmócito faz-se necessário a secreção dos anticorpos. Neste momento, portanto, a célula plasmática deixa de transcrever os segmentos gênicos M1 e M2, substituindo tais segmentos pela sequência codificadora de secreção – chamada de SC. A partir de então, os anticorpos não mais se manterão ancorados à membrana plasmática, sendo destinados às vias de secreção celular. UNIÃO DOS SEGMENTOS GÊNICOS Já conhecemos a estrutura da molécula do anticorpo e os segmentos gênicos que as formam. É hora de uma abordagem um pouco mais aprofundada sobre o processo pelo qual os segmentos gênicos são unidos para formar os RNA que será traduzido em cadeia polipeptídica para a formação da molécula de imunoglobulina. Síntese de uma molécula de anticorpo a partir da informação contida no material genético. Importante esclarecer que o segmento D só é encontrado nas cadeias pesadas. 97www.biologiatotal.com.br IM UN OL OG IA A figura 3 nos traz uma representação muito simplificada dos eventos que coordenam o processo no qual os segmentos gênicos são reorganizados, porém não menciona as moléculas envolvidas nos processos. Comecemos o detalhamento pela união dos segmentos gênicos de uma cadeia leve. A cadeia leve, seja ela κ ou λ, é formada por dois segmentos gênicos, um segmento gênico V e um segmento gênico J, os quais se encontram organizados de maneiras distintas em seus loci. Se olharmos a figura 2 mais com mais detalhes, é possível perceber que entre os segmentos gênicos que formarão a cadeia leve há uma grande região de material genético – representada pelas linhas paralelas que não possuem caixas coloridas – que precisam ser removidas para que os segmentos gênicos V e J se unam. Portanto, faz-se necessário a clara indicação do ponto onde o material genético deve ser cortado e, subsequentemente, reunido. Encontrado de modo adjacente aos segmentos gênicos V e J, existe uma região conservada de DNA não codificante que sinaliza o ponto exato onde o material genético deve ser clivado. Esta região é chamada de “sequência sinais de recombinação” (RSS, sigla em inglês para recombination signal sequences). As RSSs são formadas por um heptâmero (CACAGTG) e um nonâmero (ACAAAAACC), separados entre si por um espaçador de 12 ou 23 pares de bases (figura 4). O fato de termos espaçadores de 12 ou 23 pares de base garante o adequado rearranjo genético. Um segmento gênico V sucedido por uma sequência RSS formada por um espaçador de 12 pares de base se ligará a um segmento gênico J precedido por um RSS composto por um espaçador de 23 pares de base. A isso chamamos de regra 12/23. NOTA: Embora tenhamos mencionado até o momento o rearranjo de uma cadeia leve, na qual um segmento V se une a um segmento J, o mesmo processo se dá nas cadeias pesadas. Um segmento V, sucedido por um RSS, deverá se unir com um segmento D, o qual é precedido por um RSS. Além disso, este segmento D, sucedido por um RSS, deverá se unir a um segmento J, o qual é precedido por um RSS. A regra 12/23 também se aplica no rearranjo das cadeias pesadas. Uma vez conhecidos os segmentos gênicos e seus pontos de corte, é chegada a hora das enzimas trabalharem. Vamos conhecer o rearranjo da região variável de um anticorpo. Um complexo de proteínas contendo RAG1 e RAG2, chamado recombinase V(D)J, atua na recombinação dos segmentos gênicos V(D) J, possibilitando a subsequente transcrição do DNA em RNA. Inicialmente, o complexo RAG se liga a um RSS que esteja ladeando o segmento gênico V. Após esta ligação, o complexo RAG recruta o outro RSS, o qual está ao lado do segmento gênico a ser unido à região V. Por fim, o DNA é clivado pela ação de endonuclease do próprio complexo RAG, deixando as duas extremidades do material genético em forma de grampo e liberando a sequência de DNA que se encontrava entre os segmentos a serem unidos. As duas extremidades de DNA em forma de grampo precisam ser reunidas (figura 5). Nesse momento, proteínas de reparo, chamadas Ku70:Ku80, se ligam nos grampos de DNA. Na sequência, complexo proteico DNA- PK:Artemis se ligará ao complexo Ku70:Ku80, fazendo com que os grampos de DNA sejam abertos. A enzima TdT (sigla em inglês para terminal deoxynucleotidyl transferase) se encarrega de adicionar nucleotídeos nas As sequências sinais de recombinação (RSS) sinalizam o local onde deve ocorrer o rearranjo gênico. Importante notar a regra 12/23: os segmentos gênicos que se unirão para formar o RNA a ser traduzido devem possuir espaçadores diferentes, um com 12 e outro com 23 pares de base. Adaptados de Janeway’s Immnunobiology, Bed. (© Garland Science 2012) IM UN OL OG IA 98 extremidades do DNA, unindo as duas porções de DNA anteriormente separadas pela ação de endonuclease do complexo RAG. O resumo destes eventos está esquematizado na figura 6. IMPORTANTE! Sempre bom lembrar, se estivermos analisando uma o rearranjo gênico em uma cadeia leve, o segmento gênico V se unirá ao segmento gênico J. Caso estejamos analisando uma cadeia pesada, o segmento V se unirá com um segmento D, o qual se unirá com um segmento J, formando a sequência VDJ. Pronto! Os segmentos gênicos da região variável de um anticorpo se encontram rearranjados e prontos para serem transcritos e, finalmente, traduzidos. TROCA DE ISOTIPO DE ANTICORPO Já vimos que os anticorpos são moléculas de suma importância para o adequado funcionamento do sistema imunológico. E vimos, também, que diferentes isotipos de anticorpos desempenham funções distintas para garantir a proteção do hospedeiro frente a diferentes patologias. Agora precisamos saber como se dá a troca de isotipo de anticorpos. As células B virgens possuem um anticorpo ancorado à membrana plasmática atuando como BCR, sendo que nestes linfócitos virgens o anticorpo será do isotipo IgM ou IgD. Contudo, a partir da ativação celular, os linfócitos B virgens podem mudar a classe de anticorpos que serão secretados. Esta mudança de classe de anticorpo, também chamada de troca de isotipo, garante que as diferentes funções desempenhadas pelas imunoglobulinas secretadas se tornem possíveis. Os principais responsáveis por sinalizar qual classe de anticorpo deve ser produzida pelos linfócitos ativados são as citocinas. E como se dá este processo de troca após a sinalização com diferentes citocinas? Do mesmo modo que ocorre na recombinação V(D)J, a mudança de isotipo de anticorpo é estritamente regulada por ação de diferentes enzimas. E, de modo semelhante, estas enzimas atuam diretamente sobre o material genético das células B. Quando uma célula B é ativada, uma enzima chamada citidina desaminase induzida por ativação (AID, sigla em inglês para activation- induced cytidine deaminase) inicia o processo de troca de isotipo de anticorpo. Esta enzima só é produzida em células B ativadas – isso nos ajuda a entender porque somente células B que tenham sido previamente ativadas possuem classes de anticorpos diferentes de IgM e IgD. Uma vez que o DNA se encontra desenrolado, já que a célula está ativada, regiões de DNA fita simples são alvos da enzima AID a qual troca uma citidina por uridina. A uridina não faz parte do DNA normal, portanto um processo de reparo deste DNA se faz necessário. Representação do corte da dupla-fita de DNA na recombinação V(D) J.No quadro superior está a representação do grampo de DNA nas duas extremidades após a ação do complexo RAG. No quadro inferior está representada a abertura dos grampos por ação do complexo DNA-PK:Artemis. A sequência dos eventos envolve a união das duas extremidades – não apresentada na figura. Esquema resumido da recombinação V(D)J. 99www.biologiatotal.com.br IM UN OL OG IA REPARO DO DNA APÓS A AÇÃO DA ENZIMA AID A “lesão” causada no DNA de fita simples por ação da enzima AID levará a um processo de reparo do material genético. Outras enzimas auxiliarão nas etapas subsequentes. A substituição de uma citidina por uridina pode ser detectada por proteínas de reparo (MSH2 e MSH6) que recrutam nucleases que retiram a base uridina, bem com as bases no seu entorno. Na sequência, a DNA-polimerase adiciona novas bases reparando a fita de DNA danificada pela AID. Este processo é observado na hipermutação somática! A conversão de citidina por uridina pode ser detectada, também, pela enzima uracila-DNA- glicosidase (UNG, sigla em inglês para uracil- DNA glycosylase). Esta enzima retira a base uridina deixando um espaço vazio, chamado de sítio abásico. Este sítio abásico pode ser alvo de outras duas enzimas: a enzima REV1 ou APE1. A primeira enzima direciona para o processo de hipermutação somática, ao passo que a segunda permitirá que o processo de troca de classe seja concluído. A ação da enzima APE1 (sigla em inglês para apurinic/apyrimidinic endonuclease 1) resulta na remoção do resíduo ribose na fita de DNA, podendo levar à quebra da dupla fita de DNA. Como estas quebras são em regiões C das imunoglobulinas, o desfecho deste processo é a troca da classe de anticorpo, como ilustrado na figura 7. A última peça deste quebra-cabeça da troca de isotipo é entender como as enzimas se ligam no local exato no material genético, garantindo que a célula B troque a classe de anticorpo a ser secretado quando se diferenciar em plasmócito. Estes locais são chamados de regiões de troca. No íntron localizado entre os segmentos gênicos JH e Cµ se localiza a região de troca de isotipo chamada Sµ. De modo semelhante, precedendo os segmentos gênicos C para as cadeias γ, ε e α, existem regiões de troca. Sendo assim, quando a célula B se torna ativada e inicia a transcrição do material genético, abre-se a fita dupla do DNA, expondo as regiões de troca, permitindo que as enzimas apresentadas na figura 7 realizem a troca de isotipo de anticorpo. Hipermutação somática e maturação da afinidade Quando as células B se tornam ativadas é comum observar que os anticorpos produzidos pelos plasmócitos resultantes desta ativação apresentem uma maior afinidade para com os antígenos. Este aumento da afinidade dos anticorpos é denominado de maturação da afinidade, sendo, também, desencadeado pela ação da enzima AID. Na maturação da afinidade, no entanto, a enzima AID se liga a segmentos gênicos V, tanto da cadeia leve como da cadeia pesada. Como resultado, a hipermutação somática levará mutações nas regiões determinantes de complementariedade (CDR, sigla em inglês para complementarity-determining regions), podendo formar anticorpos com afinidades ainda maiores aos antígenos que deflagraram a ativação da célula B. Processo de troca de isotipo de anticorpo. A sequência de eventos se inicia pela ação da enzima AID, seguido das enzimas UNG e APE1. 100 EX ER CÍ CI OS EXERCÍCIOS 1 2 3 4 5 6 7 8 A molécula do anticorpo é um homodímero formado por cadeias leves e pesadas. Quais são as cadeias leves e pesadas encontradas nos anticorpos humanos? Como os segmentos gênicos V e J da cadeia são unidos para a formação de um éxon a ser traduzido? O que leva uma célula B virgem a mudar a classe de anticorpo a ser produzido quando esta célula se diferencia em plasmócito? Como se dá a o mecanismo genético envolvido na troca de classe de anticorpos? A enzima citidina desaminase induzida por ativação (AID) é encontrada apenas em células B, tendo papel importante no processo de troca de classe de anticorpos, bem como em hipermutação somática. Como esta enzima desencadeia o processo de hipermutação somática? Os loci que armazenam a informação genética das cadeias que compõe os anticorpos são encontrados em quais cromossomos? Quais são os segmentos gênicos para cada uma das cadeias que formarão uma molécula de anticorpo? A partir do DNA até tradução em proteína, como se dá formação da cadeia pesada de uma imunoglobulina? As células B possuem uma imunoglobulina ancorada à membrana plasmática atuando como receptor celular – o BCR. No entanto, quando a célula B se ativa e se diferencia em plasmócito os anticorpos precisam ser secretados, não sendo mais mantidos como BCR. Qual a diferença entre a produção de um anticorpo que permanecerá ancorado à membrana daquele que será secretado? 9 101www.biologiatotal.com.br EX ER CÍ CI OS ANOTAÇÕES Ainda sobre a ação das enzimas envolvidas nos processos de produção de imunoglobulinas, como as enzimas AID, UNG e APE1 atuam para realizar o processo de troca de classe de anticorpos? 10 IM UN OL OG IA 102 GABARITO DJOW 1- Existem dois tipos de cadeia leve, a cadeia leve κ e a cadeia leve λ. Por se tratar de um homodímero, um anticorpo sempre apresentará as duas cadeias iguais, sendo só cadeias leves κ ou só cadeias leves λ, nunca uma de cada cadeia leve em uma mesma molécula. Já as cadeias pesadas podem ser de cinco tipos: cadeia pesada α, cadeia pesada δ, cadeia pesada ε, cadeia pesada γ e cadeia pesada µ. Estas cadeias pesadas são as responsáveis pela classificação dos isotipos de anticorpo IgA, IgD, IgE, IgG e IgM, respectivamente. Tal qual o mencionado para as cadeias leves, uma molécula de anticorpo terá duas cadeias pesadas idênticas. 2- O locus gênico da cadeia leve κ é encontrado no cromossomo 2, o locus da cadeia leve λ se encontra no cromossomo 22, e o locus da cadeia pesada se encontra no cromossomo 14. 3- A cadeia leve κ é formada por aproximadamente 38 segmentos gênicos V (variável), 5 segmentos gênicos J (junção) e um segmento gênico C (constante). A cadeia leve λ é formada por aproximadamente 30 segmentos gênicos V, 4 a 5 segmentos gênicos J, e 4 a 5 segmentos gênicos C. Já a cadeia pesada possui aproximadamente 40 segmentos V, 23 segmentos D (diversidade), 6 segmentos J e 9 segmentos C. 4- Inicialmente, através de um processo de recombinação somática, os segmentos gênicos D e J são unidos e, posteriormente, o segmento V se ligará ao segmento DJ, formando o segmento VDJ da cadeia pesada. A etapa de transcrição ocorre após o rearranjo de VDJ, formando um transcrito primário de RNA com o segmento VDJ seguido dos segmentos C da cadeia pesada. Este transcrito primário tem que ser processado para que os íntrons sejam eliminados e os éxons sejam unidos, formando assim o RNA mensageiro. Por fim, o mRNA será traduzido e a molécula de imunoglobulina poderá ser produzida. 5- Após o último segmento gênico C da cadeia pesada, há uma sequência codificadora de secreção (SC) sucedida de um sítio de poliadenilação (poli-A). Após este sítio de poli-A há uma sequência codificadora transmembrana (MC1) e uma sequência codificadora da cauda citoplasmática (MC2), também seguida de um sítio poli-A. Quando a célula B não está se diferenciando em plasmócito, o transcrito primário será processado unindo o último segmento gênico C com os éxons que codificam MC1 e MC2. Esse processamento removerá a sequência SC, fazendo com que o mRNA seja subsequentemente traduzido em imunoglobulina transmembrana. Quando o linfócito B se torna ativo e se diferencia em plasmócito, o transcrito primário é processado removendo as sequências MC1 e MC2, resultando em anticorpo secretado. 6-Existem sequências especiais denominadas “sequências sinais de recombinação” (RSS), sendo formadas por um heptâmero composto pelos nucleotídeos CACAGTG, um espaçador 12 ou 23 pares de bases,e um nonâmero composto pelos nucleotídeos ACAAAAACC. Estas sequências indicam o local da recombinação gênica, garantindo que na cadeia leve, seja ela κ ou λ, um segmento gênico V se una com um segmento gênico J. A regra 12/23 garante que o rearranjo seja correto: um segmento Vλ ladeado por um RSS com espaçador de 23 pares de base só poderá se ligar a um segmento Jλladeado por um RSS com espaçador de 12 pares de base 7- Células B virgens inicialmente expressam imunoglobulinas da classe IgM e IgD, ambas ancoradas à membrana plasmática atuando como receptores de célula B – o BCR. No entanto, quando uma célula B encontra o antígeno e inicia o processo de multiplicação e diferenciação celular, as células plasmáticas poderão produzir anticorpos de classes distintas. As citocinas são responsáveis por orquestrar a troca de isotipo de anticorpos. Alguns exemplos: na presença de IL-4 observa-se uma maior produção de anticorpos IgG1 e IgE, a citocina IL-5 aumenta a produção de IgA, já a citocina IFN-γ induz a produção de IgG2a e IgG3, enquanto TGF-β leva a produção de IgG2b e IgA. 8- Precedendo os segmentos gênicos C nos loci das cadeias pesadas existem regiões de troca e sequências repetidas de DNA que sinalizam a troca de classe. Para melhor entendimento, após o segmento VDJ da cadeia pesada há o segmento C µ, mais afastado no mesmo locus há o segmento Cδ, seguido de Cγ, Cε e Cα. Com o início do processo de transcrição mediado pela enzima RNA polimerase, observa-se a formação de regiões estendidas de DNA de fita simples devido às sequências repetidas encontradas nas regiões de troca que precedem os segmentos gênicos C. Este DNA de fita simples serve como alvo para ação das enzimas AID, UNG e APE1, que iniciam quebras na fita do DNA. Subsequentemente, observa-se o reparo do DNA, removendo a sequência de DNA que se encontrava entre as duas sequências de troca que deflagraram o processo mediado por AID, UNG e APE1. Com isso, observa-se a aproximação da sequência VDJ com um novo segmento gênico C, por exemplo, o segmento gênico VDJ seguido de Cα. 9- A AID atua sobre uma citidina no DNA de fita simples. Esta enzima inicia um ataque nucleofílico no anel citosina, desaminando a citidina para formar uma uridina. Este nucleotídeo trocado é posteriormente reparado por ação de proteínas de reparo de nucleotídeos errados ou por ação da enzima uracila-DNA- glicosilase (UNG). A ação destas duas podem resultar no processo de hipermutação somática, o qual leva ao surgimento de mutações nas regiões variáveis dos anticorpos o que aprimora a ligação do anticorpo ao antígeno. 10- Como mencionado na questão anterior, a enzima AID se liga a uma citidina no DNA de fita simples produzido pelo processo de transcrição. A ação da citidina resultará na substituição da citidina por uridina. A enzima UNG remove o anel uracila da primeira uridina inserida por ação de AID criando um sítio abásico. Por fim, a APE1 retira a ribose do sítio abásico, o que resulta na quebra da fita de DNA. O processo se conclui com a ação de proteínas de reparo de quebras da fita de DNA. BASE GENÉTICA DOS ANTICORPOS REFERÊNCIAS 1. MURPHY, Kennet, WEAVER, CASEY. Janeway’s Immunobiology. 9. ed., New York: LCC, 2016. 2. ABBAS, Abul K., LICHTMAN, Andrew H., PILAI, Shiv, Imunologia Celular e Molecular, Elsevier, 8. Ed. 2015. 3. ABBAS, Abul K., LICHTMAN, Andrew H., PILAI, Shiv, Imunologia básica: funções e distúrbios do sistema imunológico, Elsevier, 5. Ed. 2017.
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