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METODOLOGIA DA PESQUISA 1 A CIÊNCIA E SUAS CARACTERÍSTICAS E A IMPORTÂNCIA DA PESQUISA CIENTÍFICA A construção do pensamento científico remonta há pelo menos 40.000 anos com o surgimento do Homo sapiens, espécie que dá origem ao homem moderno, capaz de se comunicar com língua falada e também usufruir os recursos naturais, através de adaptações ao meio e também através da construção de utensílios primitivos que permitiam a sua sobrevivência. Talvez há quem discorde dessa afirmação, mas é preciso deixar clara esta conexão entre a evolução da consciência do homem e o pensamento científico. E é desta forma que se percebe a evolução da humanidade, principalmente em relação à utilização do meio ambiente no qual está inserida. Obviamente que isso envolve a adoção e o domínio de práticas e métodos, visando à sobrevivência, exploração e perpetuação da espécie, cuja experiência foi amadurecendo com o passar dos séculos. O psiquiatra Carl Gustav Jung (2008, p. 23) apresenta o processo de dissociação da consciência humana através da perda da “alma do mato”, fenômeno este que seria o responsável pela consciência do homem moderno e, consequentemente, do pensamento científico. A seguir serão abordados assuntos relativos ao surgimento da ciência, construção do pensamento científico, a revolução científica e de que forma esses acontecimentos moldaram e contribuíram de forma significativa para o desenvolvimento da sociedade. APRESENTAÇÃO Organização Elisabeth Penzlien Tafner Reitor da UNIASSELVI Prof. Hermínio Kloch Pró-Reitora do EAD Prof.ª Francieli Stano Torres Edição Gráfica e Revisão UNIASSELVI Autor Luis Augusto Ebert CURSO LIVRE - A CIÊNCIA E SUAS CARACTERÍSTICAS E A IMPORTÂNCIA DA PESQUISA CIENTÍFICA A CIÊNCIA E SUAS CARACTERÍSTICAS E A IMPORTÂNCIA DA PESQUISA CIENTÍFICA .01 INTRODUÇÃO A construção do pensamento científico remonta há pelo menos 40.000 anos com o surgimento do Homo sapiens, espécie que dá origem ao homem moderno, capaz de se comunicar com língua falada e também usufruir os recursos naturais, através de adaptações ao meio e também através da construção de utensílios primitivos que permitiam a sua sobrevivência. Talvez há quem discorde dessa afirmação, mas é preciso deixar clara esta conexão entre a evolução da consciência do homem e o pensamento científico. E é desta forma que se percebe a evolução da humanidade, principalmente em relação à utilização do meio ambiente no qual está inserida. Obviamente que isso envolve a adoção e o domínio de práticas e métodos, visando à sobrevivência, exploração e perpetuação da espécie, cuja experiência foi amadurecendo com o passar dos séculos. O psiquiatra Carl Gustav Jung (2008, p. 23) apresenta o processo de dissociação da consciência humana através da perda da “alma do mato”, fenômeno este que seria o responsável pela consciência do homem moderno e, consequentemente, do pensamento científico. A seguir serão abordados assuntos relativos ao surgimento da ciência, construção do pensamento científico, a revolução científica e de que forma esses acontecimentos moldaram e contribuíram de forma significativa para o desenvolvimento da sociedade. CURSO LIVRE - A CIÊNCIA E SUAS CARACTERÍSTICAS E A IMPORTÂNCIA DA PESQUISA CIENTÍFICA 1 O SURGIMENTO DA CIÊNCIA Posterior ao desenvolvimento do homem moderno e seu processo de adaptação e sobrevivência na natureza, uma das primeiras pessoas a estruturar suas ações em decorrência de métodos foi o francês René Descartes, nascido em 31 de março de 1596. Assim, o surgimento da ciência e/ou pensamento científico pode ser relacionado à vida e à obra do primeiro filósofo moderno da história, que, pela primeira vez, sentiu a necessidade de verificar, analisar, sintetizar e enumerar todas as coisas a que se dispunha entender. E, desta forma, contribui de maneira significativa para as ciências naturais, a física e a matemática. O francês também é conhecido como pai da fi losofia moderna e considerado um dos pensadores mais importantes da história. Muitos pesquisadores afirmam que a partir de René Descartes inaugura-se o racionalismo, oposto ao empirismo, ou seja, a ausência de métodos para se alcançar resultados. E, de certa forma, toda a sociedade moderna pôde, através da matemática, da física e da observação de fenômenos naturais, entender o seu papel no universo e como contribuiu para a perpetuação da espécie humana. Desde a utilização de tecnologias sofisticadas para a cura de doenças degenerativas e letais, até viagens espaciais, visando à descoberta de novas galáxias e planetas. Dessa forma, fica evidente que sem a sistematização das observações, assim como a coleta de informações e observação dos diversos fenômenos, nada disso seria possível. FIGURA 1 - RENÉ DESCARTES, O CIENTISTA PIONEIRO DO MOVIMENTO CIENTÍFICO FONTE: Disponível em: <https://seuhistory.com/etiquetas/rene-descartes>. Acesso em: 12 mar. 2017. CURSO LIVRE - A CIÊNCIA E SUAS CARACTERÍSTICAS E A IMPORTÂNCIA DA PESQUISA CIENTÍFICA É a inda at ravés da cor rente do pensamento rac iona l i s ta e do desenvolvimento do método matemático que muitos dos principais pensadores dos séculos XVI e XVII afirmam a capacidade do intelecto humano para a descoberta das verdades, fundada na convicção de que a razão constitui o instrumento fundamental para a compreensão do mundo. 1.1 O PENSAR CIÊNCIA De acordo com Pinker (1989), a evolução do homem teria produzido um cérebro capaz de realizar atividades especializadas, como já havia suposto Jung (2008), através da aquisição da consciência. Dessa forma, atividades complexas, como a matemática, a ciência e a arte, poderiam ser executadas e também aprimoradas. Pinker (1989) ainda se pergunta se tais habilidades poderiam conferir ao ser humano algum tipo de vantagem seletiva diante das outras espécies. Acredita-se que sim, pois dadas as condições morfológicas do próprio homem, ele não estaria no topo da cadeia alimentar caso não possuísse as habilidades acima mencionadas. Mas, como surgiu a ciência? Para Mithen (2002), a capacidade de pensar cientificamente se origina na mente humana a partir do momento em que três propriedades críticas aparecem e interagem, a seguir apresentadas: • Habilidade de gerar e testar hipóteses (uma propriedade presente não apenas em humanos, mas em outras espécies animais também); • Capacidade para desenvolver e utilizar ferramentas para resolver problemas (para os humanos primitivos essa capacidade torna-se ainda mais relevante com o uso de sistemas externos de memória, por exemplo, pinturas rupestres e entalhes em madeira, que serviam para preservar as informações); • Uso de metáforas e analogias comparativas. De acordo com Dennett (1991), esses atributos podem se restringir a um domínio apenas, mas se tornam muito mais poderosos quando ultrapassam os limites entre os domínios, como na associação de uma entidade viva com algo que é inerte, ou na geração de uma ideia sobre algo que é tangível. Ainda segundo Mithen (2002), a capacidade de interligar essas três propriedades e, em particular, de explorar o uso de metáforas e analogias envolvendo elementos de diferentes domínios, se tornou possível entre 100 e 30 mil anos atrás, quando a mente humana adquiriu o que ele chamou de “fluidez cognitiva” e consciência, como também observado e relatado anteriormente por Jung (2008). Vale destacar que a ciência não surgiu de repente ou foi inventada num dado momento da história. Como condição permanente da raça humana, a ciência evoluiu ao longo do tempo. Conforme as pessoas descobriam novas CURSO LIVRE - A CIÊNCIA E SUAS CARACTERÍSTICAS E A IMPORTÂNCIA DA PESQUISA CIENTÍFICA formas de viver, se relacionar, de utilizar o meio ambiente à sua volta, assim como usufruir os recursos naturais através de novas ferramentas e técnicas, também desenvolviam novas maneiras de pensar e explicar os fenômenos no seu entorno, fato este que continua evoluindo até os diasde hoje. No entanto, existem alguns autores que reforçam a ideia de que o pensamento científico estivesse dissociado da condição de evolução humana, e sim, atrelado a uma entidade mística ou espiritual. Assim, a origem do pensamento científico poderia ter sido causada por um processo de gênese divina. Esse fato poderia ser evidenciado através de exemplos históricos e mesmo arqueológicos, que poderiam indicar esse fenômeno. Mas, ainda assim, coloca-se em xeque esse tipo da condição humana, visto que essa necessariamente precisa estar separada da condição do pensar cientificamente, e que até hoje sustenta religiões e credos. Ou seja, o pensar científico e o pensar amparado por crenças místicas e religiosas são duas correntes filosóficas que não podem ser misturadas, e que continuam a existir. De acordo com o cientista e sociólogo Émile Durkheim (2003), o papel da religião é o de estruturar a sociedade, e para este mesmo autor, os rituais e práticas religiosas seriam mecanismos de manifestação da solidariedade e do espírito colaborativo. Já o pesquisador Rappaport (1999) vai mais além, e identifica o rito como responsável pelo surgimento da própria linguagem, característica essencial para a evolução humana. Ainda dentro desse mesmo contexto, alguns pensadores julgam ser necessário que a construção do conhecimento possa evoluir através da conectividade entre as duas correntes, ou seja, a religiosa e a científica. Em uma visão mais sistêmica e holística, ambos os pensamentos poderiam se conectar a ponto de favorecerem um ao outro. No entanto, esse curso quer apresentar a origem do conhecimento científico, e é isso que vamos detalhar em seguida. 1.2 A REVOLUÇÃO CIENTÍFICA O período compreendido entre os séculos XVI e XVIII denomina-se de Revolução Científica, e a Ciência, que até então estava atrelada à Filosofia, separa-se desta e passa a ser um conhecimento mais estruturado e prático, principalmente atrelado a metodologias e técnicas que permitiam a um pesquisador alcançar determinado objetivo. Os principais movimentos estão atrelados ao renascimento cultural, à imprensa, à Reforma Protestante e ao hermetismo. De acordo com Tosi (1998), a partir do século XVII, quando a tradição mágica ainda fazia um impacto substancial nas camadas populares, o prestígio desta linha de pensamento, do místico, tinha declinado fortemente na classe CURSO LIVRE - A CIÊNCIA E SUAS CARACTERÍSTICAS E A IMPORTÂNCIA DA PESQUISA CIENTÍFICA erudita. A razão dessa mudança fundamental provocada nas mentalidades é atribuída à Revolução Científica, decorrente da obra de Copérnico, das descobertas de Galileu e Kepler e do triunfo da filosofia mecanicista. Ainda segundo a mesma autora, esse triunfo foi duplo, pois envolvia a rejeição e o descrédito das duas filosofias aceitas até então: a escolástica e a magia natural. A convicção de que o universo estava sujeito a leis naturais acabou com a crença na eficácia de fórmulas de inspiração divina. O impacto mais decisivo foi dado pela filosofia cartesiana, ao estabelecer que não existem forças ocultas, nem simpatias ou antipatias; que os fenômenos naturais podem ser explicados em termos de tamanhos, formas e velocidades de partículas. Os fenômenos ocultos ou não são reais ou têm explicação mecânica. A matéria é inerte e desprovida de sensação e consciência. A mente humana e seu poder de raciocínio não são propriedades materiais. A mente humana, considerada um presente de Deus, é imaterial e imortal. A separação do mundo do espírito do mundo da matéria foi um passo fundamental para o desenvolvimento da ciência, pois deixava intacto o poder e a autoridade da religião no primeiro, e permitia utilizar a experimentação para investigar o segundo. A “filosofia cartesiana” ou “racionalismo cartesiano” é um pensamento estabelecido pelo filósofo René Descartes em suas obras o “Discurso do Método” (1637) e “Meditações Metafísicas” (1641), em que expressa sua preocupação com o problema do conhecimento. O ponto de partida é a busca de uma verdade primeira que não possa ser posta em dúvida, e por isso busca, através de um método, a verdade. O pensamento cartesiano pregava a utilização de um senso crítico mais elevado e uma maior atenção às necessidades humanas, ao contrário do teocentrismo da Idade Média, que pregava a atenção total aos assuntos divinos e, portanto, um senso crítico menos elevado. Este maior senso crítico exigido pelo humanismo permitiu ao homem observar mais atentamente os fenômenos naturais em vez de renegá-los à interpretação da Igreja Católica. Houve antes muitas teorias revolucionárias que diferem na intensidade com que influenciaram o pensamento humano. Algumas representaram profundas modificações na forma do homem examinar a natureza, por exemplo, a introdução de um tratamento matemático na descrição dos movimentos dos planetas, pelos babilônios e depois aperfeiçoada pelos gregos. Outras representaram microrrevoluções, como o sistema de classificação de seres vivos, introduzido por Aristóteles. CURSO LIVRE - A CIÊNCIA E SUAS CARACTERÍSTICAS E A IMPORTÂNCIA DA PESQUISA CIENTÍFICA Com esta revolução, a ciência mudou sua forma e sua função, passando a ser repensada nos moldes da nova sociedade que estava emergindo nesta época. Os objetivos do homem da ciência e da própria ciência acabaram sendo redirecionados para uma era livre das influências místicas da Idade Média. Lenzi e Brambila (2006) destacam o fato de ainda sermos influenciados por conceitos, métodos e pensamentos que hoje não são mais apropriados e adequados à complexidade do mundo atual. Dessa forma, ocorre uma quebra de paradigmas, necessitando-se de novas teorias e novos instrumentos que nos auxiliam na interpretação e na conceituação da vida pós-moderna. Na figura a seguir podem-se observar os principais eventos relacionados à revolução científica. FIGURA 2 - ALGUNS DOS PRINCIPAIS EVENTOS QUE DERAM ORIGEM À REVOLUÇÃO CIENTÍFICA FONTE: Disponível em: <https://pt.slideshare.net/HCA_10I/lumininsmo-a-revoluo- cientfica-e-o-iluminismo-na-europa>. Acesso em: 20 mar. 2017. O fato é que hoje não mais vivemos sem ciência. Muitas descobertas derivaram e ainda estão sujeitas às leis pensadas na época. Ou seja, foi a forma como concebemos estar aqui hoje e perpetuando a espécie humana. E a curiosidade através de métodos científicos nos fez pensar através de caminhos que permitissem isso. Basta olharmos para a Teoria da Evolução de Darwin, que explica a sucessão das espécies de plantas e animais na Terra, baseada na seleção natural. De acordo com Gleiser (2007), essas teorias poderiam ser suposições de ideias propostas com a intenção de explicar algo, com base em princípios ou leis que são independentes daquilo que está sendo explicado. E também, vale https://pt.wikipedia.org/wiki/Idade_M%C3%A9dia CURSO LIVRE - A CIÊNCIA E SUAS CARACTERÍSTICAS E A IMPORTÂNCIA DA PESQUISA CIENTÍFICA muito a intenção do cientista. Não importa se o mesmo está fazendo ciência teórica ou experimental, o que vale é o fato do seu comprometimento de explicar da melhor forma possível determinado fenômeno natural. E dessa mesma forma que nos seres humanos, caminhamos até os dias atuais. 2 O CONCEITO DA CIÊNCIA Definido o período de revolução científica e suas principais contribuições para a humanidade, vamos entrar agora no que vem a ser ciência. Por conceito e epistemologia da palavra, ciência deriva do latim “scientia”, que significa “saber” ou, ainda, “conhecimento”. Assim, podemos entender que é um conceito que abarca diversos tipos de saberes, e que todo o conhecimento gerado deriva de práticas e métodos de estudo, baseados em princípios certos. Muitas vezes está relacionada a teorias científicas, que são a comprovação de hipóteses, ou seja, ideias sobre o comportamento de “algo” em determinada área do conhecimento. Mas ciência vai muito mais além. E, por isso, a ausência de preconceitos e juízos de valor é tão importante parase alcançar o resultado esperado. Normalmente a ciência falha, por tentativa e erro, e em muitos casos, aquilo que é considerado correto hoje, pode não ser amanhã. E justamente é esse o ponto que faz com que a ciência evolua. Pois se existem evidências que comprovam determinado fenômeno hoje, mas não mais amanhã, toda a teoria e resultados observados devem ser revistos e, se possível, deve-se propor novas ideias. Dessa forma, a ciência não é dogmática, ou seja, não tem “verdades absolutas”, como a maioria das religiões assim descreve. 2.1 CIÊNCIA E FÉ Em aparente contradição, aos olhos de muitos cientistas, fé, religião e ciência se conectam de modo interdisciplinar e buscam a compreensão sistêmica e holística do universo. Porém, ainda existem muitas barreiras a serem ultrapassadas. Se, por um lado, a ciência explica boa parte dos fenômenos naturais, e através de leis universais da física se comprova parte da origem do universo, por outro lado, muitos aspectos relacionados à sua origem e expansão continuam sem explicação, e para isso, acreditar em um Deus parece ser a única explicação. Durante muitos anos, as ciências e as religiões se confrontam em ideias numa disputa sem razão alguma. Se pensarmos nos campos em que cada uma atua, veremos que ambas podem coexistir e discursar a respeito de um mesmo assunto. A religião tem por finalidade "ligar" o ser humano a Deus, divulgando uma vontade divina. Em razão disto, a Igreja deve sempre interagir CURSO LIVRE - A CIÊNCIA E SUAS CARACTERÍSTICAS E A IMPORTÂNCIA DA PESQUISA CIENTÍFICA sobre os mais diversos campos da sociedade para garantir que a vontade de Deus está sendo atendida pela humanidade. A religião vem também explicar o "porquê" das coisas, dos acontecimentos e de tudo o que nos cerca. Através dela sabemos que tudo que existe na natureza procedeu de Deus, foi uma vontade divina que deu origem ao nosso planeta, aos mares, às plantas, aos animais e aos seres humanos (LENZI; BRAMBILA, 2006). De acordo com os mesmos autores, para se fazer ciência é necessário testar várias vezes a mesma hipótese até que se possa dizer se ela é verdadeira ou não. Dentro dessa perspectiva, existem muitos pesquisadores que são devotos de uma ou outra religião, porém o que ocorre com os cientistas é que em suas pesquisas eles simplesmente ignoram a existência de Deus, mas isso não significa que eles neguem a sua existência. Os cientistas que creem em Deus sabem que os fatos se deram pela vontade de Deus, mas eles querem saber explicar determinado fenômeno. Existem ainda outras questões, quando aqueles devotos da corrente religiosa afirmam que Deus, como criador universal, poderia ser entendido como uma entidade que explicaria o porquê das coisas. Já cientistas estariam mais preocupados em saber como tudo no universo foi criado. Assim poderíamos ter a origem da Teoria do Big Bang, ou mesmo da evolução, de Charles Darwin. Dessa forma, o inconformismo entre religião e ciência deveria ter acabado há muito tempo, pois não há razões para esta disputa, sendo que ambas teriam processos de entendimento completamente distintos. Se ambos se respeitassem e ouvissem as ideias do outro, não teríamos tantas diferenças entre os próprios seres humanos. 3 CARACTERÍSTICAS DA CIÊNCIA E DO SEU PESQUISADOR No dia a dia, a vida de cientista depende muito do tipo de ciência que se deseja fazer e que se pratica. Existem aqueles que trabalham na indústria e que, portanto, usam a sua pesquisa para aprimorar processos ou produtos para a empresa que os abrigam. Isso pode ocorrer, por exemplo, com a indústria farmacêutica, que emprega biólogos e químicos, ou ainda, na indústria aeroespacial, que emprega físicos e engenheiros (GLEISER, 2007). Nesse tipo de trabalho existe muita prática experimental, e esse tipo de trabalho também é muito comum em universidades e centros de pesquisa. No entanto, nas instituições de ensino, normalmente busca-se aprofundar o conhecimento sobre determinada prática ou experimento, assim como nosso entendimento sobre o meio ambiente que nos cerca. E nas universidades vamos encontrar ainda os pesquisadores que, além de conduzirem seus experimentos práticos, dividem suas horas em sala de aula, dedicando-se ao ensino. Os mais teóricos tendem a trabalhar em suas salas, com ou sem CURSO LIVRE - A CIÊNCIA E SUAS CARACTERÍSTICAS E A IMPORTÂNCIA DA PESQUISA CIENTÍFICA computadores, sozinhos, ou mais comumente, em grupos de pesquisa. Discutem-se ideias, equações e gráficos, e têm como objetivos principais a validação de hipóteses, antes mesmo de testá-las em um laboratório. Os cientistas que trabalham nas universidades funcionam como um tipo de “controle de qualidade”. Isso para evitar que os cientistas experimentais percam o seu tempo com ideias que não têm a mínima chance de estarem corretas. E isso ocorre através da busca de erros matemáticos na formulação da teoria, ou ainda, por erros em programas de computadores e conceitos aplicados erroneamente. 3.1 A CIÊNCIA NO BRASIL Diferentemente de países do primeiro mundo, no Brasil a pesquisa se faz essencialmente nas universidades. Como vimos anteriormente, os docentes pesquisadores normalmente validam e testam ideias ou hipóteses, mas não é comum o desenvolvimento de produtos ou serviços. E dentro dessa ótica, o cientista da universidade deveria se aproximar das empresas, ou ainda, a indústria deveria investir mais em inovação. Ou seja, o cientista deveria encontrar muito mais espaço de trabalho nas empresas, e não buscar somente nas escolas espaços para seguir uma carreira profissional. Esse cenário é completamente diferente nos países desenvolvidos, onde as indústrias mais competitivas admitem pesquisadores para pensarem novos produtos, processos e serviços. E muitas dessas ideias poderiam ter origem na universidade, já testadas como protótipos e projetos, e se desenvolverem para a produção em escala nas empresas. O Brasil ainda adota uma postura passiva e prefere esperar a aquisição das tecnologias emergentes. Em suma, não desenvolve e paga por aquilo que outros países desenvolvem. Prova disso é que em muitos casos e áreas do conhecimento, sempre figura atrás em rankings de inovação e desenvolvimento. Outras áreas ainda podem ser consideradas inovadoras no Brasil, como é o caso da exploração de petróleo em águas profundas, mas são exceção à regra. Em nosso país, o “ouro negro” só existe em grandes profundidades, e para que esse recurso natural pudesse ser utilizado, se fez necessário o desenvolvimento de novas tecnologias que nem mesmo outros países dispunham. Ao que parece, as autoridades brasileiras sabem qual é o caminho a seguir para tornar o país mais competitivo. Nossos cientistas estão entre os mais proeminentes, porém ainda sem o prestígio que lhes deveria ser dado. Outros seguem carreira no exterior, nas mais prestigiosas empresas e universidades. Enquanto isso, nadamos contra a maré, em total desvantagem na corrida do desenvolvimento. CURSO LIVRE - A CIÊNCIA E SUAS CARACTERÍSTICAS E A IMPORTÂNCIA DA PESQUISA CIENTÍFICA Universidade: doutores que não chegam às empresas e à pesquisa na indústria do Brasil A maior parte dos pesquisadores brasileiros está nas instituições de Ensino Superior – 67,5% do total em 2010 –, enquanto nas empresas a proporção é de apenas 26,2%, bastante abaixo dos índices de Estados Unidos, Coreia, Japão, China, Alemanha, França e Rússia. Essa situação, reconhece o documento Balanço das Atividades Estruturantes 2011, do MCTI, é uma das causas da dissociação entre o avanço científico e a incorporação da inovação tecnológica à base produtiva, especialmente na indústria do Brasil. De acordo com o presidente do CNPq, Glaucius Oliva, uma pesquisa feita em 2008 com todos os doutores brasileiros formados entre 1996 e 2006 revelou que quase 80 mil deles estavam no Brasil, 97% empregados. Desse total, 80% atuavam no setor educacional. Outros 11% estavam na administraçãopública e menos de 5% nas empresas. Nos Estados Unidos, a proporção de doutores na indústria chega a 40%, informou Oliva. Segen Estefen, diretor do Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós-Graduação e Pesquisa de Engenharia (Coppe), da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), afirmou durante o seminário promovido pela CCT do Senado que, “no Brasil, os doutores não vão para as indústrias, com raras exceções, como as estatais, a Petrobras e algumas empresas do setor elétrico. As empresas privadas não criam núcleos para fazer interface com a universidade. Sem um grupo de doutores, não tem como fazer a interface”. Não é possível esperar que os menos de 50 mil cientistas que trabalham em pesquisa na indústria brasileira possam competir com os 166 mil que trabalham em empresas na Coreia do Sul e mais de 1 milhão de cientistas em empresas nos EUA, de acordo com Carlos Cruz, professor da Fapesp. “Mesmo que o Brasil tenha demonstrado alguns sucessos nessa área — como a Embraer, a Petrobras ou o agronegócio movido pela Embrapa —, falta-nos a capacidade de realizar isso repetida e continuamente”, alerta. Exigências para professores das universidades públicas do Brasil, como a dedicação exclusiva ou em tempo integral, foram consideradas por vários dos palestrantes como entraves à parceria com empresas e à participação desses pesquisadores em projetos inovadores fora do ambiente das universidades. A excessiva regulamentação, a falta de autonomia das universidades para firmar parcerias com a indústria e dispor do tempo dos professores e dos recursos completam o cenário inóspito para a pesquisa traçado pelos participantes do seminário. CURSO LIVRE - A CIÊNCIA E SUAS CARACTERÍSTICAS E A IMPORTÂNCIA DA PESQUISA CIENTÍFICA Glaucius Oliva cita o exemplo norte-americano: “O professor universitário nos Estados Unidos pode abrir uma empresa no seu departamento, sem que esteja violando a legislação do tempo integral e educação exclusiva. No Brasil não pode. Se abrir uma empresa, pode ser processado, porque está violando o tempo integral e você é um funcionário público”. “Nos Estados Unidos, um projeto entre uma empresa e uma universidade não passa pelo governo. Tem que ser feito dentro das linhas oficiais, mas não existe controle governamental sobre o que a indústria pode ou não fazer com a universidade. Se a Sloan Foundation, que dá muito dinheiro à pesquisa, resolve dar US$ 20 milhões para pesquisa em desenvolvimento de tecnologia de raios X espacial, por exemplo, várias universidades vão apresentar projetos para a fundação. É uma competição duríssima, completamente desligada do governo”, exemplifica o cientista Marcelo Gleiser. Eles têm carga horária de seis a 12 horas de aula por semana, devendo dedicar o restante do tempo à pesquisa. Fonte: BRASIL, 2010. Universidade: doutores que não chegam às empresas e à pesquisa na indústria do Brasil. Disponível em: <http://www.senado. gov.br/noticias/Jornal/emdiscussao/inovacao/universidade-doutores- empresas-pesquisa-na-industria-do-brasil.aspx>. Acesso em: 3 abr. 2017. 3.2 FINANCIAMENTO DOS PROJETOS DE PESQUISA NO BRASIL No Brasil, algumas agências de fomento à pesquisa atuam de forma expressiva. Normalmente, essas autarquias provêm recursos para que os pesquisadores, seja na indústria, ou ainda nas universidades, possam dar continuidade a suas pesquisas. Normalmente, a cada ano, os editais são lançados, e os cientistas precisam disputar parte dos recursos disponibilizados pelo governo federal. É o caso do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPQ), que todos os anos disponibiliza recursos para diversas modalidades de pesquisa, seja para acadêmicos ou pesquisadores seniores. O grande problema ainda é a dependência dos recursos públicos. Se houvesse maior integração entre os setores público e privado, as chances de caminharmos a passos mais largos seria maior. A dependência de aporte de recursos financeiros somente dos recursos públicos diminuiria e o desenvolvimento de produtos e processos pensados à necessidade das empresas alcançaria patamares expressivos. CURSO LIVRE - A CIÊNCIA E SUAS CARACTERÍSTICAS E A IMPORTÂNCIA DA PESQUISA CIENTÍFICA Fora o CNPQ, outras instituições financiam projetos. Não somente públicas, obviamente. Nos dias atuais é mais comum termos convênio entre empresas e universidades, para a prestação de serviços ou desenvolvimento de projetos com alguma necessidade específica, mas ainda longe do ideal. Fundações sem fins lucrativos e de diversas naturezas oportunizam a pesquisadores premiações distintas ou ainda valores significativos na busca de incentivar a pesquisa nos campos experimental e teórico. Outras autarquias públicas são as Fundações de Amparo à Pesquisa Estaduais (FAPESC, FAPESP etc.), ou ainda, a Financiadora de Estudos e Projetos (FINEP). Bolsas de pesquisa também são mais comuns entre professores-pesquisadores, e se comprovadas experiências na sua produtividade científica, recebem recursos para continuidade da pesquisa. A Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) também auxilia professores do Ensino Superior a realizarem seus trabalhos, seja com aporte de insumos financeiros e/ou bolsas para mestrado e doutorado. Em alguns casos essas bolsas levam o cientista para outros países, a fim de compartilhar experiências e fomentar o intercâmbio e desenvolvimento de uma área específica desses países. Em resumo, o Brasil, ainda que tenha proporcionado oportunidades aos seus pesquisadores, precisa perceber a necessidade de investir cada vez mais em pesquisa e desenvolvimento. Isso não implica necessariamente inventar a roda, mas de não depender única e exclusivamente de tecnologias importadas a um custo bem alto. Crescemos muito em nossa produção científica, ou seja, publicação de artigos em revistas científicas, mas ainda não somos referenciados por outros pesquisadores, justamente por não termos tradição nessa área. Como brasileiros, precisamos aprender a dar valor às ideias originadas em nosso país. Nas escolas e universidades precisamos entender que a pura repetição de conhecimento não leva a caminhos profundos de aprendizado. E assim, entender de uma vez por todas que nosso modelo de educação também está atrasado. Os acadêmicos e professores precisam ensinar através de projetos e em um ambiente em que o aluno seja o protagonista. Em uma era cada vez mais dependente de tecnologia, ainda caminhamos a passos muito lentos dentro de uma proposta robusta para o desenvolvimento científico e tecnológico, e muito há de ser feito. Precisamos acordar! 3.3 INÍCIO DA CARREIRA CIENTÍFICA Certamente, todo início da carreira de um cientista, não só no Brasil, começa com o seu envolvimento em projetos de pesquisa de caráter básico e experimental. E nessa frente o professor que orienta o acadêmico tem papel decisivo em estimular ou anular o futuro pesquisador. Digo isso, pois, muitas vezes, por pura vaidade, o professor-orientador apenas utiliza a “mão de obra aprendiz” para executar tarefas que ao cientista sênior já não interessam mais. CURSO LIVRE - A CIÊNCIA E SUAS CARACTERÍSTICAS E A IMPORTÂNCIA DA PESQUISA CIENTÍFICA E nessa etapa da educação universitária, os professores deveriam estimular todo e qualquer candidato que se proponha a desenvolver alguma ideia, por mais absurda que pareça. Obviamente que muitos dos acadêmicos surgem com projetos que precisam ser lapidados, e torná-los exequíveis é parte do processo de entendimento de que ciência se constrói de forma contínua. É preciso entender que às vezes nossas ideias são uma pequena porção de um todo. Todo o processo de construção de um projeto de pesquisa, assim como as possibilidades de financiamento, iremos ver mais adiante. Para agora, é preciso entender que as possibilidades existem, mesmo para alunos do início da faculdade. Normalmente, esse perfil de estudante irá seguir a carreira acadêmica, e posterior à graduaçãoinicia o seu mestrado, doutorado e pós- doutorado. Por exemplo, o CNPQ, citado anteriormente, tem um programa chamado de PIBIC, que auxil ia jovens em início de carreira científica, concedendo ao professor-orientador do projeto e também ao acadêmico, bolsas de iniciação científica. Alguns estados da federação também concedem esse tipo de benefício. É o caso do Estado de Santa Catarina com o programa UNIEDU, no qual acadêmicos podem desenvolver ideias e terem descontos em suas mensalidades. Enfim, as oportunidades existem. Porém, o que se observa nas universidades é que é cada vez menor o interesse do acadêmico pesquisador. Afinal de contas, você precisa dedicar parte do seu tempo à pesquisa que se propõe. E corroborando o fato de que estamos em um tempo onde a informação já não é mais o problema, afinal de contas, está em todos os lugares, gerar novo conhecimento é a grande chave para o sucesso profissional. É preciso entender que são atividades desse caráter que irão desenvolver e diferenciar cada acadêmico em sua trajetória profissional. É esse tipo de profissional, criativo e inovador, que pensa soluções para as suas necessidades e empresas, que terá as mais ricas experiências e oportunidades. CURSO LIVRE - A CIÊNCIA E SUAS CARACTERÍSTICAS E A IMPORTÂNCIA DA PESQUISA CIENTÍFICA LEITURA COMPLEMENTAR A ciência da fé “Como você professa sua fé?”, pergunta o médico Paulo de Tarso Lima a seus pacientes na primeira consulta. Conversar sobre isso virou rotina no setor de oncologia em um dos mais conceituados hospitais do Brasil, o Albert Einstein, em São Paulo, onde Lima é coordenador do Serviço de Medicina Integrativa. Se o doente vai à missa, ele anota na receita: aumentar a frequência aos cultos. Se deseja a visita de um padre, rabino ou pastor, o hospital manda chamar. Se quiser meditar, professores de ioga são convocados. No hospital, a fé é uma arma no tratamento de doenças graves. A Santa Casa de Porto Alegre também trabalha nesse sentido. O hospital está realizando uma pesquisa inédita, em parceria com a Universidade Duke, nos Estados Unidos, para mensurar os benefícios biológicos da fé. O objetivo é descobrir se os pacientes espiritualizados submetidos à cirurgia de ponte de safena têm menos inflamações no pós-operatório – hipótese já levantada por outros estudos. “Existe um marcador de inflamação que parece apresentar menores níveis em religiosos”, explica o cardiologista Mauro Pontes, coordenador do Centro de Pesquisa do Hospital São Francisco, um dos sete hospitais do complexo Santa Casa da capital gaúcha. Hoje, as principais faculdades de medicina americanas dedicam uma disciplina exclusiva ao assunto. E, na última década, uma série de estudos mostrou que os benefícios da fé à saúde têm embasamento científico. Devotos vivem mais e são mais felizes que a média da população. Após o diagnóstico de uma doença, apresentam níveis menores de estresse e menos inflamações. “O paciente com fé tem mais recursos internos para lidar com a doença”, diz Paulo Lima. Fé tem uma participação especial no que médicos e terapeutas chamam de coping: a capacidade humana de superar adversidades. “Não posso prescrever bem-estar, mas posso estimular que o paciente vá em busca de serenidade para encarar um momento difícil”, explica o médico. É por isso que mais profissionais têm defendido essa relação. “Atender às necessidades espirituais tem de ser, sim, tarefa do médico”, defende o cirurgião cardíaco Fernando Lucchese, que está escrevendo o livro A Revolução Espiritual com o psiquiatra americano Harold Koenig, autoridade no assunto. Há um século, o canadense William Osler, ícone da medicina moderna, já defendia isso. Em 1910, ele escreveu um artigo cheio de floreios elogiosos às crenças das pessoas: “a fé despeja uma inesgotável torrente de energia”. A designer Juliana Lammel, 33 anos, vivenciou isso. Em 2005, cansada de tantas operações sem sucesso para corrigir um estreitamento no ureter, canal que liga os rins à bexiga, ela resolveu fazer uma cirurgia espiritual, mesmo CURSO LIVRE - A CIÊNCIA E SUAS CARACTERÍSTICAS E A IMPORTÂNCIA DA PESQUISA CIENTÍFICA sem ter nenhuma ligação com o espiritismo. “Para mim, era sinônimo de filme de fantasma”, lembra. Ela topou – e sem ceticismo. Para ter resultado, Juliana teria de acreditar piamente, já que o tratamento espírita exige fé do paciente. Uma vez por semana, por um mês, na mesma hora, ela deitava na própria cama por 30 minutos, ao mesmo tempo em que o grupo espírita fazia a concentração. Ela em São Paulo, eles no Rio de Janeiro. No fim, Juliana voltou ao médico com novos exames. Ele viu os resultados e não conseguia explicar por que os componentes alterados do rim tinham voltado a níveis quase normais. Juliana foi operada mesmo assim, mas o procedimento foi bem menos agressivo do que o previsto, graças, segundo ela, à cirurgia espiritual. O episódio mudou a forma como a designer lida com a fé. “Antes, me forçava a acreditar em algo. Depois disso, passei a acreditar de verdade”. Vantagens no dia a dia Uma das maiores pesquisas feitas até hoje, divulgada em 2009, revisou 42 estudos sobre o papel da espiritualidade na saúde, que envolveram mais de 126 mil pessoas. O resultado mostrou que quem frequenta cultos religiosos pelo menos uma vez por semana tem 29% mais chances de aumentar seus anos de vida em relação àqueles que não frequentam. Não é intervenção divina. Não é feitiçaria. É comportamento. Os entrevistados que são religiosos apresentaram um comprometimento maior com a própria saúde. Iam mais ao dentista, tomavam direitinho remédios prescritos, bebiam e fumavam menos. A pesquisa confirmou ainda os dados de um estudo populacional feito em 2001 pelo Centro Nacional de Adição e Abuso de Drogas dos EUA: adultos que não consideram religião importante em suas vidas consomem muito mais álcool e drogas do que os que acham os credos relevantes. É a versão real dos Simpsons e seus exageros estereotipados. Homer faz pouco de qualquer fé, é obeso e alcoólatra. Já seu vizinho, o carola Ned Flanders, é regrado, tem saúde perfeita e corpo sarado. Andar na linha é mais comum entre os crentes, e a razão está no poder de autocontrole, dizem os cientistas. É o que defende o psicólogo Michael McCullough. Professor da Universidade de Miami e parceiro de Harold Koenig em pesquisas sobre espiritualidade, ele diz que a fé facilita a árdua tarefa de adiar recompensas, algo fundamental para muita coisa, de fazer dieta a estudar para concursos. A fé também tem uma relação íntima com a felicidade. Um estudo feito na Europa mostrou que pessoas espiritualizadas se dizem mais satisfeitas do que aquelas que não se consideram como tal. Parte disso se explica na natureza de ateus e céticos em geral. Quem não acredita em nada pode ter mais propensão ao pessimismo porque faz uma leitura objetiva da vida, sem CURSO LIVRE - A CIÊNCIA E SUAS CARACTERÍSTICAS E A IMPORTÂNCIA DA PESQUISA CIENTÍFICA crer em algo divino que mude as coisas. Por outro lado, a certeza da existência de uma recompensa divina muda a vida das pessoas. E não é questão somente de otimismo. Tem algo pragmático aí. Religiões estimulam algo essencial para o ser humano: o espírito de comunidade. Devotos normalmente não estão sozinhos, o que ajuda nos problemas da vida. Para Andrew Clark, um dos autores desse estudo europeu e professor da Escola de Economia de Paris, as religiões ajudam as pessoas a superar choques ou a pelo menos não se desesperar tanto com os tropeços da vida. Por exemplo, segundo a pesquisa, a queda no indicador de bem-estar foi menor entre os desempregados religiosos do que entre os não religiosos. “A religião oferece ‘proteção’ contra o desemprego”, diz Clark. Na hora do aperto, há sempre alguém para estender a mão. Outra pesquisa, feita pela Universidade de Michigan, EUA, comparou duas formas de amparo recebidas por idosos: o oferecido pelas igrejas e o proporcionado por serviços sociaisestatais. A discrepância a favor do suporte religioso foi tão significativa que o autor do estudo, o gerontologista Neal Krause, acredita haver algo de único nesse tipo de apoio. Até mesmo os ateus são beneficiados pelo espírito solidário oferecido pelas instituições religiosas. Um estudo feito por Clark investigou o efeito da religiosidade dos outros sobre o bem-estar de uma comunidade. A descoberta foi intrigante. As pessoas sem religião de regiões de maioria ateia são menos felizes do que aquelas sem religião de áreas onde a maior parte da população professa uma fé. “Isso não é nada bom para os ateus: eles parecem menos felizes e também fazem os outros menos felizes”, concluiu Clark. A explicação para isso pode estar na compaixão incentivada pelas religiões. A escritora e ex-freira inglesa Karen Armstrong, autora de mais de 20 livros sobre o tema, acredita que o princípio da compaixão está no centro de todas as tradições religiosas. É ela que nos leva a pensar no próximo e a fazer de tudo para aliviar o sofrimento e as angústias dele. Antônio Gilberto Lehnen, 78 anos de catolicismo ativo, sentiu os efeitos dessa rede de apoio após enfrentar duas cirurgias que quase lhe custaram a vida. Aos 67 anos, ele teve de passar por um transplante cardíaco. Na lista de espera por um novo coração, sem saber ao certo se aguentaria, sua atitude era de gratidão. “Lembro de ele me dizer, com toda a tranquilidade: ‘Planeja tudo aqui que o papai do céu está cuidando de mim’. Era uma atitude confiante”, lembra o cirurgião Fernando Lucchese, que fez a operação. Antônio é grato até hoje. “Não sei quem foi o doador, mas não deixo nem um dia de rezar por ele e pela felicidade da sua família”, diz. Na Antiguidade, as religiões eram essenciais para unir uma comunidade. “Nas sociedades primitivas, a religião sempre exigiu tanto esforço (de união) que não pode ser encarada só como um acidente evolutivo”, diz Nicholas Wade, autor de The Faith Instinct (“O instinto da fé”, sem edição no Brasil). Essa união CURSO LIVRE - A CIÊNCIA E SUAS CARACTERÍSTICAS E A IMPORTÂNCIA DA PESQUISA CIENTÍFICA foi questão de sobrevivência por milênios. É o que afirma Karen Armstrong em Os 12 Passos para uma Vida de Compaixão. Organizado em pequenos grupos, o homem primitivo precisava partilhar os parcos recursos a mão. Muito antes do surgimento das grandes religiões, altruísmo e generosidade já eram características primordiais a um bom líder tribal. A genética também ajuda a explicar a origem da fé. O geneticista americano Dean Hamer causou rebuliço no meio científico em 2004 ao anunciar a descoberta dos genes da fé – ou, como ele preferiu chamar, o gene de Deus. Batizado de VMAT2, trata-se de um conjunto de genes que ativam substâncias químicas que dão significado às nossas experiências. Eles atuam no cérebro regulando a ação dos neurotransmissores dopamina, ligada ao humor, e serotonina, relacionada ao prazer. Durante a meditação, por exemplo, esses neurotransmissores alteram o estado de consciência. “Somos programados geneticamente para ter experiências místicas. Elas levam as pessoas para algo novo, ouvem Deus falar com elas”, explica Hamer. O pesquisador aplicou um questionário para medir o grau de espiritualidade em um grupo de 1.001 voluntários. Desenvolvido pelo psiquiatra Robert Cloninger, da Universidade de Washington, o levantamento trazia perguntas ligadas a crenças e rituais. Hamer avaliou os genes dos voluntários e percebeu que as diferenças nas respostas estavam relacionadas com as variações no gene de Deus. Essas variações explicariam por que algumas pessoas são mais espiritualizadas que outras. Dá para visualizar isso, literalmente. Exames de neuroimagem mostram a atividade de crenças espirituais no cérebro. O time de cientistas liderado por Andrew Newberg, professor da Universidade da Pensilvânia, nos EUA, e autor do livro How God Changes Your Brain (“como Deus muda o seu cérebro”, sem edição no Brasil), demonstrou que Deus é parte da nossa consciência: quanto mais pensamos nele, mais nossos circuitos neurais são alterados. No primeiro de seus estudos a respeito, Newberg avaliou o impacto da fé ao analisar imagens cerebrais de freiras rezando e budistas meditando. Ele detectou aumento de atividade em áreas relacionadas às emoções e ao comportamento e redução na zona que dá senso de quem somos. A diminuição de trabalho nessa região específica, segundo Newberg, representa a possibilidade de atingir com a meditação um estado em que se perde a noção de individualidade, espaço e tempo. “Você se torna um único ser com Deus ou com o Universo”, escreveu. É o mesmo efeito descrito por Hamer. A ciência não pode provar que Deus existe, mas consegue medir os efeitos da crença no divino nas pessoas. Seria possível, então, transformar esses efeitos da fé em um botão no cérebro, que poderíamos ativar quando quiséssemos? O canadense Michael Persinger quis provar que sim ao criar o “capacete de Deus”. Trata-se de um aparelho que estimula uma área específica do cérebro, onde nascem pensamentos místicos e espirituais. Persinger queria saber se dava para simular CURSO LIVRE - A CIÊNCIA E SUAS CARACTERÍSTICAS E A IMPORTÂNCIA DA PESQUISA CIENTÍFICA a sensação de uma prece intensa ou da meditação apenas estimulando essa região cerebral. Ele recrutou voluntários religiosos e não religiosos para o teste. Depois de ficarem uma hora com o capacete, quatro de cada cinco pacientes relataram sentir um estado de transe, com uma sensação de deslocamento para fora do corpo. A maioria dessas pessoas tinha uma predisposição à fé, mas, mesmo assim, o aparelho conseguiu simular experiências religiosas em laboratório. Ou seja, com ele não é preciso rezar para sentir os mesmos efeitos benéficos descritos na reportagem. Da mesma forma que não é preciso seguir uma religião para ter esses benefícios. Como trabalhar sua fé Que fique claro, fé e religião são coisas diferentes. A religião é uma maneira institucionalizada para se praticar a fé, por meio de regras específicas e dogmas. Já a fé é algo pessoal, ligado à espiritualidade, à busca para compreender as respostas a grandes questões sobre a vida, o universo e tudo mais. Isso pode ou não levar a rituais religiosos. Você pode buscar essas respostas pulando sete ondinhas, acendendo velas, consultando o horóscopo da Susan Miller, pregando faixas de Santo Expedito ou investigando quilos de livros de física quântica. Cada um tem seu jeito próprio. Vale até ficar louco de cogumelo. Foi o que Roland Griffiths, professor da Universidade Johns Hopkins, nos EUA, propôs. Sua equipe deu a 36 voluntários cápsulas com altas doses de psilocibina, substância presente em cogumelos alucinógenos. O grupo deitou em sofás com olhos vendados ao som de música clássica. Depois de uma sessão de seis horas, passado o efeito, a maioria relatou ter experimentado uma forte conexão com os outros, um sentimento de união, amor e paz. Até aí, parecia papo de doidão. Mas o professor voltou a falar com os voluntários um ano depois. Eles disseram que se sentiam diferentes. A experiência os tornou pessoas melhores, o que foi confirmado pelas famílias deles. “Se a psilocibina pode causar sensações místicas idênticas àquelas que ocorrem naturalmente, isso prova que esse tipo de experiência é biologicamente normal”, disse Griffiths no fórum de palestras TED. Mais que isso: talvez, drogas alucinógenas tenham benefícios. Mesmo sem cogumelos alucinógenos ou um capacete de Deus, é possível atingir artificialmente as benesses da fé. Cientistas garantem que basta ter uma forte crença em algo – e nem precisa ser uma divindade ou força superior. Pode ser qualquer coisa realmente importante para a pessoa. “Se para os crentes é Deus, para os ateus pode ser família ou amigos”, diz Michael Shermer, diretor da Sociedade Cética e autor do livro The Believing Brain (“o cérebro crente”, sem edição no Brasil). “Teoricamente, um ateu pode ter uma poderosaexperiência mística”, endossa Andrew Newberg. O pai do gene de Deus, Dean Hamer, segue a mesma linha. “Algumas das pessoas mais espiritualizadas que conheço não acreditam em divindade nenhuma”, escreveu CURSO LIVRE - A CIÊNCIA E SUAS CARACTERÍSTICAS E A IMPORTÂNCIA DA PESQUISA CIENTÍFICA no trabalho em que relatou a descoberta genética. Outra grande autoridade no assunto, o psicólogo Kenneth Pargament, do Instituto de Espiritualidade e Saúde do Centro Médico do Texas, sugere cultivar a espiritualidade exercitando o que ele chama de santificação ateísta. Significa dar a algo importante da vida um status sagrado, mesmo sem acreditar em Deus. A foto do seu filho quando bebê pode ser muito mais sagrada para você que a imagem de Santo Antônio, por exemplo. Não se trata de banalizar a sacralização, mas o contrário: exercitar a fé dessa forma é uma postura antibanalização da vida, qualquer aspecto pode assumir um caráter divino. E esse hábito de sacralizar aspectos do cotidiano é capaz até de alterar nosso comportamento, segundo uma pesquisa que acompanhou recém-casados. Os casais que consideravam o casamento e o sexo sagrados estavam mais felizes – e transavam mais! No trabalho é a mesma história. Outro estudo, realizado no ano passado, avaliou 200 mães de família que haviam acabado de concluir uma pós-graduação. Apesar da dupla jornada, aquelas que encaravam a carreira como parte de algo maior (e não só a fonte de renda para pagar as contas do mês) se disseram muito mais felizes profissionalmente – e menos cansadas. Em tese, portanto, é possível usufruir de benefícios semelhantes aos proporcionados pelas crenças divinas apenas focando as energias naquilo que faz bem a você. O psicólogo Elisha Goldstein, autor do best-seller The Now Effect (“o efeito ‘agora'”, sem edição no Brasil), desenvolveu um método que consiste em cultivar momentos sagrados. Primeiro, você escolhe objetos que trazem boas lembranças. Valem fotos de infância, o relógio do avô, uma carta de amor, o primeiro gibi. Todos os dias, preste atenção a esse amuleto por no mínimo cinco minutos. Deixe que os pensamentos invadam sua mente. Relaxe. Após três semanas, avalie suas emoções. Segundo Goldstein, os voluntários que participaram do experimento relataram sentimentos de gratidão, humildade e empatia. Isso porque eles se reconectaram àquilo que realmente importa. Consequentemente, se sentiram menos ansiosos e pessimistas e mais dispostos a ajudar quem precisa. Isso sem ter de orar ou meditar seguindo preceitos religiosos. Esses benefícios dependem da intensidade da crença. Quem vai à igreja e fica jogando Candy Crush Saga no celular dificilmente vai usufruir das vantagens da fé. Newberg resolveu passar isso a limpo e pediu a um grupo de ateus que pensassem em Deus. Nenhuma mudança significativa ocorreu. Para eles, não fazia o menor sentido. Então, o melhor é se engajar em atividades em que você realmente acredita. Se seu negócio não é integrar uma igreja, o psicólogo Michael McCullough lembra que algumas ONGs têm regras de conduta e convivência semelhantes, reproduzindo os mesmos mecanismos das religiões que incentivam compaixão, autocontrole, senso de comunidade e comportamento ético. CURSO LIVRE - A CIÊNCIA E SUAS CARACTERÍSTICAS E A IMPORTÂNCIA DA PESQUISA CIENTÍFICA Da mesma forma que é possível ter os benefícios da fé mesmo sem religião, há ocasiões em que ela faz mal – e nem precisamos entrar no mérito das guerras religiosas. Atribuir a Deus poder milagroso pode levar pacientes a abandonar tratamentos. Há também um outro componente preocupante. Em algumas pessoas, ocorre o que os especialistas chamam de conflito religioso, sentimento que leva a acreditar que a doença ou os sofrimentos são punição divina. Nesses casos, a religião tem um efeito desastroso. Um estudo publicado na revista científica americana Archives of Internal Medicine mostrou que esse conflito está associado a depressão, ansiedade e maior índice de mortalidade. Se fosse bom, fé cega não teria esse nome. Fonte: REVISTA SUPERINTERESSANTE, 2015. A Ciência da Fé. Disponível em: <http://super.abril.com.br/ ciencia/a-ciencia-da-fe/>. Acesso em: 3 abr. 2017. CURSO LIVRE - A CIÊNCIA E SUAS CARACTERÍSTICAS E A IMPORTÂNCIA DA PESQUISA CIENTÍFICA REFERÊNCIAS GLEISER, M. Cartas a um jovem cientista: o universo, a vida e outras paixões. Rio de Janeiro: Elsevier, 2007. JUNG, C. J. O homem e seus símbolos. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2008. 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APRESENTAÇÃO Organização Elisabeth Penzlien Tafner Reitor da UNIASSELVI Prof. Hermínio Kloch Pró-Reitora do EAD Prof.ª Francieli Stano Torres Edição Gráfica e Revisão UNIASSELVI Autora Jeice Campregher CURSO LIVRE - MÉTODOS CIENTÍFICOS MÉTODOS CIENTÍFICOS .02 INTRODUÇÃO Realizar uma investigação, de qualquer natureza, sugere alguns cuidados. O primeiro deles é escolher, passo a passo, os rumos da investigação. Para isso, os métodos e técnicas se tornam essenciais tendo em vista os objetivos da pesquisa. Estudar esses caminhos, as possibilidades mais utilizadas em sua área, explorar possibilidades, analisar caminhos trilhados por outras pesquisas, enfim, tudo isso amplia o olhar do pesquisador. Não se trata de copiar. É nessa exploração que o investigador começa a delinear possibilidades e lapidar interesses que, a princípio, podem ser somente uma curiosidade, um tema de interesse, um assunto que o provoca de alguma forma. A presente unidade tem essa pretensão: apresentar alguns delineamentos possíveis à investigação. Antes disso, algumas questões gerais se fazem importantes. Voltar à história amplia a visão sobre o momento presente e aquilo que hoje se oferece à escolha. 1 MÉTODOS CIENTÍFICOS: QUESTÕES GERAIS Como foi visto na unidade anterior, no Brasil, as pesquisas são realizadas, essencialmente, nas universidades e centros de pesquisa. Estamos tão acostumados a pensar dessa forma – pesquisa se faz na universidade – que podemos considerar que sempre foi assim. Que as universidades sempre existiram, queestão sempre aí. Para desfazer esse senso comum, precisamos voltar e olhar um pouco a história. O que entendemos hoje como universidade é uma construção. Foi sendo materializada e, ainda, em nosso país, foi sendo inspirada pelo surgimento de universidades em outras partes do mundo. Precisaremos voltar até a CURSO LIVRE - MÉTODOS CIENTÍFICOS criação das primeiras “universidades, nos séculos XII e XIII, na Idade Média, como a Universidade de Bolonha, criada em 1190, a Universidade de Oxford, fundada em 1214, e a Universidade de Paris, criada em 1215” (PAULA, 2009, p. 71). Nesta origem, podemos ver forte relação com a Igreja – submetidas aos regulamentos e disciplina religiosa. O surgimento das primeiras universidades, na virada dos séculos XII e XIII, é um momento capital da história cultural do Ocidente medieval [...]. Pode-se compreender que ela comportou, em relação à época precedente, elementos de continuidade e elementos de ruptura. Os primeiros devem ser buscados na localização urbana, no conteúdo dos ensinamentos, no papel social atribuído aos homens de saber. Os elementos de ruptura foram inicialmente de ordem institucional. Mesmo que se imponham aproximações entre o sistema universitário e outras formas contemporâneas de vida associativa e comunitária (confrarias, profissões, comunas), este sistema era, no entanto, no domínio das instituições educativas, totalmente novo e original, [...] o agrupamento dos mestres e/ou dos estudantes em comunidades autônomas reconhecidas e protegidas pelas mais altas autoridades leigas e religiosas daquele tempo, permitiu tanto progressos consideráveis no domínio dos métodos de trabalho intelectual e da difusão dos conhecimentos, quanto uma inserção muito mais eficiente das pessoas de saber na sociedade da época (VERGER, 2001, p. 189-190, grifos nossos). A proximidade com o poder oportunizava que os intelectuais tivessem uma vida de atuação política e cultural dentro das cidades. Com isso, ganhavam espaço para desenvolver o pensamento – em relação aos saberes sagrados ou filosóficos. Falando dessa forma, ainda parece bastante distante da universidade que conhecemos na atualidade – fundada na tríade ensino-pesquisa e extensão. Atualmente, a universidade brasileira tem amadurecido – tanto na teoria quanto na prática, na realização de projetos – na compreensão de seu papel na sociedade brasileira. Amparada em muitas discussões oportunizadas por teorias e por experiências, hoje compreende-se que há um elo entre ensino-pesquisa-extensão. Por meio dessas três atividades, a universidade amplia sua inserção social. Caso centrasse suas atividades somente na pesquisa, esqueceria que a própria pesquisa necessita da sociedade para ser realizada – como poderá ser visto adiante, há pesquisas que se inserem, vão a campo, usam metodologias de observação para coletar dados. Em outras palavras, a universidade vai até os espaços sociais, as comunidades, extrai delas conhecimento e leva esse conhecimento para a forma de ensino – somente àqueles que ingressam e fazem parte daquela universidade. Sabemos que, atualmente, muitos podem fazer uma faculdade. Contudo, ainda é um grupo seleto, se considerarmos quantos seguem analfabetos, sem concluir o Ensino Fundamental ou Médio. CURSO LIVRE - MÉTODOS CIENTÍFICOS Ao compreender que a pesquisa só existe pela sociedade – e em virtude de melhorar a sociedade –, assim sendo, a universidade reduz as fronteiras por meio de atividades de extensão. Esta, podendo ser realizada de variadas formas: como projetos em que a comunidade é envolvida – descentralizando o conhecimento; levando-o ao maior número de pessoas possível. Nessa postura, entende-se que o conhecimento não é de um grupo – é um bem público (BOTOMÉ, 1996; NOGUEIRA, 2001). Como vimos na origem das universidades, não percebemos ênfase em pesquisa. De que forma podemos, então, observar a origem daquilo que hoje entendemos como universidade, debruçada sobre investigações e em conhecimento científico? Segundo Paula (2009, p. 72): Da França e da Prússia emergiram, no início do século XIX, as primeiras universidades modernas e laicas: a napoleônica, para formar quadros para o Estado, e a de Berlim, com ênfase na integração entre ensino e pesquisa e na busca da autonomia intelectual. Segundo Paula (2009), esses dois modelos influenciaram a formação universitária no Brasil. Do modelo francês, ainda segundo a autora, herdamos a formação profissionalizante, voltada para o mercado de trabalho. Do modelo alemão, a pretensão de uma formação humanística, geral, não pragmática, baseada no tripé francês: Filosofia, Ciências e Letras. Assim vemos surgir os modelos que chegam ao Brasil, construindo aquilo que entendemos como universidade na atualidade. Na Unidade 1, destacamos o papel do francês René Descartes – nascido em 31 de março de 1596 – na estruturação de métodos. O pensamento científico pode ser, portanto, relacionado a esse filósofo, que viu a necessidade de verificar, analisar, sintetizar e enumerar aquilo que se pretende entender. Contudo, como quase tudo na história, nada acontece instantaneamente. Descartes trouxe a sua visão e ela, aos poucos, consolidando-se e ligando- se ao que veio depois. Isso compreendemos ancorados em Foucault sobre a produção do conhecimento. Na fase genealógica, Foucault compreende que certo conjunto de crenças/saberes (aquilo que forma uma espécie de Arquivo) fica à disposição dos sujeitos (dos mesmos ou dos outros, no futuro). Foucault compreende que esses discursos não se deram suavemente, não são frutos de simples acordos ou arranjos/encaixes de saberes/verdades. Foucault passa a compreender que o conjunto de crenças que hoje temos, as verdades nas quais podemos hoje acreditar, são, antes de tudo, efeitos de muitas disputas ao longo da história – disputas para chegarem a ser aceitos (como um conhecimento válido). Muitos CURSO LIVRE - MÉTODOS CIENTÍFICOS daqueles que hoje são respeitados não chegaram a receber condecorações e/ou reconhecimento em vida. Por vezes, após muito tempo é que essas produções são aceitas e são citadas em outras teorias (umas fundamentando as outras) (FOUCAULT, 2002, p. 117). Por esse motivo, a ciência, hoje como ela é, foi lapidada, elaborada pela história e pelo embate e combate dos discursos. Essas universidades são apontadas como as primeiras, uma vez que estejamos estudando as origens da universidade brasileira. Enquanto há outros autores que apontam universidades mais antigas, em configurações diferentes. Há correntes que afirmam que a primeira universidade do mundo foi o Museu de Alexandria (ROSA, 2012), com mais de 500 mil rolos de papiro e 100 professores trabalhando nela. Caso o foco desta unidade fosse investigar a origem de todas as correntes e pensadores que contribuíram para a construção da ciência, esta unidade, de fato, ficaria bastante extensa e perderia seu foco. O interesse dessa discussão inicial está em compreender melhor a universidade brasileira hoje. Fazer ciência também é isso: não entender os fatos do presente como algo pronto e acabado, sem origem, sem história. Falar sobre ciência, modelos, técnicas, portanto, antes de tudo, é entender as influências dessas nossas práticas. Se hoje a universidade brasileira faz ensino, pesquisa e extensão – sendo essa a busca, aquilo que é defendido e discutido em congressos e eventos das mais variadas áreas –, faz-se necessário entender, ainda que brevemente, os modelos que seguimos e almejamos no presente. O modelo norte-americano também deixa marcas na organização e na estrutura da universidade brasileira. A reforma de 68 – durante o período militar – coloca a universidade mais vinculada ao mercado de trabalho. Afinal de contas, a educação também havia sido atrelada ao desenvolvimento econômico. Entre outras alterações estruturais feitas, Paula (2009, p. 77) destaca a incorporação da “ideia moderna de extensão universitária”. Contudo, citarextensão universitária dessa forma, a nosso ver, dá a impressão de que nada, anteriormente, estava sendo feito no país em termos de extensão universitária. Ainda que fossem práticas pontuais, a extensão já tinha uma história própria, já estava sendo desenvolvida em nosso país. Como vimos, no nascimento da universidade brasileira, podemos observar as atividades de pesquisa (mais fortemente valorizada no modelo alemão) e de ensino (valorizada no modelo francês). A partir disso, pode surgir uma pergunta: como surgiu então a extensão universitária no país? CURSO LIVRE - MÉTODOS CIENTÍFICOS A extensão, antes dessa reforma de 68, já havia sofrido algumas mudanças conceituais e práticas nas universidades brasileiras. A primeira instituição que iniciou um movimento extensionista no Brasil foi a Universidade Livre de São Paulo, entre 1911 e 1917, por meio de conferências e semanas abertas, cujos temas eram problemáticos sociais (não da própria comunidade) e problemas políticos da época. Segundo Fagundes (1985, p. 29, grifos no original): ao contrário do que ocorreu na universidade inglesa, berço da extensão – onde esta foi implementada a partir das pressões e reivindicações das massas marginalizadas no processo de educação e na fruição dos benefícios da cultura –, aqui as primeiras atividades extensionistas aconteceram mais por um ato de vontade ou “idealismo” de segmentos da comunidade acadêmica universitária do que em função ou a partir dos interesses e necessidades da população a que se destinavam, como se pode constatar na primeira universidade de São Paulo. As práticas e o conceito de extensão foram sendo alterados ao longo do tempo. Botomé (1996) considera que as ideias de Paulo Freire influenciaram alguns dos que elaboraram os documentos sobre a Extensão, na época da criação da Coordenação de Atividades de Extensão (CODAE). Essa talvez seja a primeira sinalização para uma das mudanças conceituais mais concretas apontadas por teóricos da Extensão: de via de mão-única para via de mão-dupla. Na primeira compreensão, via de mão-única, a universidade é a detentora de conhecimentos e, assim sendo, é capaz de levar, estender isso a todo o mais que não está dentro dela (BOTOMÉ, 1996). Na segunda, via de mão-dupla, criticou-se esse discurso, questionando se a universidade também não deveria aprender com a comunidade (FREIRE, 1971). Isso não quer dizer que não haja mais ações extensionistas de via de mão-única. O que há é uma defesa maior por ações que vão ao encontro desse conceito de Extensão: em via de mão-dupla. As ações de pesquisa, atualmente, são também pautadas por essas concepções. A extensão, portanto, trouxe contribuições ao ensino e à pesquisa – uma vez que professores e pesquisadores estão abertos às provocações feitas a partir da extensão universitária. Na visão atual de universidade, há um trânsito, uma comunicação, uma vinculação entre setores e grupos da sociedade e a universidade. Essa breve contextualização teve o objetivo de levar um outro olhar para a produção científica: compreendendo que não é um processo do dia para o outro e, ainda, que hoje a pesquisa é entendida como indissociável do ensino e da extensão. Essas compreensões, por sua vez, ajudam-nos a ampliar nossas ideias, projetos, perguntas de partida, objetivos, seleção de métodos. CURSO LIVRE - MÉTODOS CIENTÍFICOS Quanto mais a fundo se compreender a história da ciência e como ela hoje é entendida nas universidades brasileiras, com mais propriedade – e profundidade nas discussões –, as pesquisas podem ser realizadas. Desde a idealização do movimento investigativo, escolhas dos caminhos, métodos, organização de dados e redação do trabalho a ser apresentado. Pesquisar, portanto, é compreender a instituição na qual se investiga, a sociedade pesquisada e, também, como a pesquisa pode gerar impacto social e acadêmico. Essas reflexões iniciais podem contribuir, do início ao fim, à realização de pesquisas bem fundamentadas e com produção de conhecimento útil – tanto internamente, aos pares, àqueles que estão inseridos na instituição, assim como à sociedade como um todo. 2 ESCOLHA ADEQUADA DO MÉTODO Os métodos são particulares a uma ciência ou a um conjunto de ciências. São mais úteis em uma área do que seriam em outra. Os métodos, portanto, fazem sentido em pesquisas e em áreas específicas – não há um padrão de pesquisa que diga respeito a todos os campos do saber. As metodologias se constroem com base em métodos particulares, específicos e que fazem sentido dentro das ciências. Nisso, se vê diferenças específicas entre as ciências sociais e naturais, por exemplo (NUNES, 1993). O conhecimento científico é o exercício do pensamento humano sobre a realidade. Essa realidade é composta pela existência do homem em relação a esse mundo – integrante, constituinte. Em outras palavras, ao conhecer, o homem conhece a si mesmo. Lança um olhar sobre si (no mundo) (NUNES, 1993). O saber vem antes da ciência – ele é acumulado, organizado e estruturado. A ciência se desenvolve durante o caminhar, durante o exercício e as práticas realizadas na área, métodos seguidos desde o conteúdo até a produção das técnicas (NUNES, 1993). Por esse motivo, há caminhos e compreensões que são acumulativas em cada uma das áreas. Assim, inserir-se em uma área, estudar bases teóricas, conhecer perspectivas e abordagens costuma ser um dos primeiros movimentos investigativos de um pesquisador. Aqui chegamos a um ponto crucial deste tópico: para selecionar bem os caminhos é preciso conhecer bem a área, as práticas sociais, os objetos de interesse daquela área. Esse é um movimento inicial e essencial ao delineamento da pesquisa. Este não é feito apenas ao iniciar a pesquisa; é feito e refeito assim que alguma inconsistência seja percebida. Do início ao fim esse olhar sensível precisa ser parte da investigação. CURSO LIVRE - MÉTODOS CIENTÍFICOS Como decidir sobre esses métodos? Essa(s) escolha(s) exige(m) certo domínio do campo científico (saber o que é pesquisar, para que pesquisar) e, ainda, domínio naquela forma de investigar a partir de tal corrente. Convém, portanto, em início de caminhada, ser orientado por pesquisador mais experiente. Um pesquisador que conheça ferramentas, técnicas, métodos e a corrente teórica. Essa orientação não é feita de qualquer forma. A caminhada exige que o orientando vá caminhando passo a passo. Compreenda qual pesquisa está realizando. Caso só faça porque mandam, essa fragilidade irá aparecer em algum momento da caminhada investigativa. Aparece na redação – na firmeza da condução da linha de raciocínio – ou em alguma apresentação ou, ainda, ao exercer a profissão para a qual foi formado(a). Sobre o exercício do pensar, uma diferenciação se faz útil: divagar não é o mesmo que uma reflexão sistemática. Divagar é passear por alguns tópicos, falar sobre, fazer algumas conexões ou mudar de assunto – sem nenhum compromisso com ordenação ou lógica. O ato de raciocinar é coerente e segue um percurso. Duas formas de raciocínio comuns para conduzir o fio da discussão científica são a indução e a dedução. Vamos a elas. 3 MÉTODOS: PERCURSOS LÓGICOS Ao falar em método ou métodos, no plural, há algo pressuposto: a existência de uma(s) lógica(s) que permeia/permeiam as investigações. Em outras palavras, há procedimentos lógicos a serem seguidos tendo em vista objetivos da investigação, da natureza da investigação, dos recursos, da abrangência e da inspiração filosófica (autores de base) do pesquisador. Neste tópico serão apresentados métodos em sua essência. Interessa, nesse momento, compreender a lógica que move tais processos argumentativos. A partir disso, pode-se conversar com docente mais experiente para observar a aplicação desses caminhos – tendo em vista os objetivos e a natureza da investigação. 3.1 MÉTODO DEDUTIVO Dedução vem do latim (de + ducere, “extrair”, “diminuir”). Há um percurso de raciocínio queconsiste em apresentar uma ou mais proposições conhecidas (aceitas como verdadeiras) e, a partir delas, conclui-se uma proposição – até então – desconhecida. Há, portanto, uma relação de consequência. Esta não CURSO LIVRE - MÉTODOS CIENTÍFICOS somente como uma extensão da(s) primeira(s) proposição(ões). Acima de tudo, vai mais a fundo, lança um olhar mais sensível – constrói uma compreensão (sobre a natureza-propriedades) (GIL, 2008). Por vezes, a conclusão se apresenta mais geral do que as premissas. A conclusão se torna de difícil crítica, uma vez que parte de afirmações aceitas e que fazem sentido. Um exemplo de dedução é o silogismo. Dizer algo e extrair premissas ou conclusões dessa primeira afirmativa. A dedução: “Parte de princípios reconhecidos como verdadeiros e indiscutíveis e possibilita chegar a conclusões de maneira puramente formal, isto é, em virtude unicamente de sua lógica” (GIL, 2008, p. 9). Essa é uma característica que leva a dedução a apresentar fragilidades. A seguir, um exemplo de argumento dedutivo, a partir de Lakatos e Marconi (2007, p. 91). Exemplo de conclusão a partir do método dedutivo Todo mamífero tem um coração. Ora, todos os cães são mamíferos. Logo, todos os cães têm um coração. A partir do exemplo acima, observamos que o objetivo do método dedutivo é explicar o conteúdo presente nas premissas – essas consideradas universais (leis universais). Os argumentos dedutivos estarão incorretos caso partam de uma premissa falsa. Esses argumentos, portanto, alcançam os dois extremos: ou estarão corretos ou incorretos. O mesmo não ocorre com o método a seguir. 3.2 MÉTODO INDUTIVO No método indutivo, há argumentos que são mais ou menos coerentes. Esses são dependentes das premissas que sustentam a conclusão. CURSO LIVRE - MÉTODOS CIENTÍFICOS Tanto o método dedutivo quanto o indutivo procuram alcançar conclusões verdadeiras. Ponchirolli e Ponchirolli (2012) compreendem que os argumentos dedutivos alcançam tal objetivo, enquanto os indutivos conseguem somente apresentar uma afirmação que provavelmente está correta. Segundo os mesmos autores, desde Karl Popper essas fragilidades são discutidas. Karl Popper foi um influente filósofo da ciência muito respeitado no seu tempo. Austríaco de nascimento e britânico por opção, costumava dizer que uma teoria científica é um modelo matemático que descreve e codifica as observações que fazemos. Assim, uma boa teoria deverá descrever uma vasta série de fenômenos com base em alguns postulados simples, como também deverá ser capaz de fazer previsões claras, as quais poderão ser testadas. As premissas de um argumento dedutivo apresentam verossimilhança com a conclusão – mas não sustentam tal raciocínio, dando a sensação de que não se obtém dele uma conclusão sólida. Ponchirolli e Ponchirolli (2012) compreendem que o conhecimento é de fato imperfeito – seja este produzido por qualquer método. Eles consideram que o conhecimento está sujeito a revisões e que os erros podem ser corrigidos. Para eles, a maior incoerência ou inconsistência da indução é retirar de verdades particulares conclusões que se deseja produzir como se fossem gerais, aplicáveis de uma forma mais ampla. Essa é uma das críticas recebidas por essa forma de argumentar. Para Lakatos e Marconi (2007, p. 86), Indução é um processo mental por intermédio do qual, partindo de dados particulares, suficientemente constatados, infere-se uma verdade geral ou universal, não contida nas partes examinadas. Portanto, o objetivo dos argumentos indutivos é levar a conclusões cujo conteúdo é muito mais amplo do que o das premissas nas quais se basearam. Em outras palavras, pode-se dizer que uma afirmação (tida como verdadeira) é referência para a construção de outra ou outras, mais gerais. Por esse motivo, é considerado o método responsável pela generalização. De algo particular para algo mais geral. Segue um exemplo de argumento indutivo, a partir de Lakatos e Marconi (2007, p. 91). Há como aprimorar o uso dos argumentos indutivos. Por exemplo, pode- se acrescentar aos argumentos evidências adicionais. Dessa forma, observa-se mais materialidade na condução do pensamento e da argumentação. Sem CURSO LIVRE - MÉTODOS CIENTÍFICOS algo nesse sentido, a indução tenta compreender uma lei geral que rege os (ou alguns) casos observados – sem algo mais sólido, ela virá a falhar. Vamos observar algumas orientações dos autores: A indução possui as seguintes regras: (i) deve-se estar seguro de que a relação que se pretende generalizar seja verdadeiramente essência, isto é, relação causal quando se trata de fatos, ou relação da coexistência necessária de duas formas, quando se trata de seres ou coisas. Assim, sendo uma relação de dependência necessária a que une o calor à dilatação, tem-se o direito de gerenciar a lei segundo a qual o calor sempre dilata os corpos; (iii) é necessário que os fatos, a que se estende a relação, sejam verdadeiramente similares aos fatos observados e, principalmente, que a causa se torne no sentido total e completo (PONCHIROLLI; PONCHIROLLI, 2012, p. 62). Tomados esses cuidados, os argumentos indutivos tornam-se mais sólidos. Há pesquisas em que esses mecanismos terão de ser usados e há outras em que não – depende da natureza da investigação. Abaixo, vamos observar um argumento indutivo. Exemplo de conclusão a partir do método indutivo Todos os cães que foram observados tinham um coração. Logo, todos os cães têm um coração. Trata-se somente de um exemplo. Em uma pesquisa, a conclusão, portanto, deve ser conduzida da melhor forma – incluindo novas evidências e outros cuidados acima apontados. No exemplo acima, a partir das particularidades (os cães observados na pesquisa), parte-se para a generalização (todos os cães). Para Gil (2008, p. 10), “o método indutivo procede inversamente ao dedutivo: [no indutivo] parte do particular e coloca a generalização como um produto posterior do trabalho de coleta de dados particulares”. Para Gil (2008, p. 11), a dedução chega a conclusões mais acertadas, uma vez que parte de premissas tidas como verdadeiras. Já na indução, chega a conclusões que são prováveis. Na sequência, iremos analisar o método hipotético-dedutivo. CURSO LIVRE - MÉTODOS CIENTÍFICOS 3.3 MÉTODO HIPOTÉTICO-DEDUTIVO Este método surgiu com Karl Popper como crítica ao método indutivo. Para Popper, “o salto indutivo de ‘alguns’ para ‘todos’ exigiria que a observação de fatos isolados atingisse o infinito, o que nunca poderia ocorrer, por maior que fosse a quantidade de fatos observados” (GIL, 2008, p. 12). O método hipotético-dedutivo consiste na seguinte linha de raciocínio: [...] quando os conhecimentos disponíveis sobre determinado assunto são insuficientes para a explicação de um fenômeno, surge o problema. Para tentar explicar as dificuldades expressas no problema, são formuladas conjecturas ou hipóteses. Das hipóteses formuladas, deduzem-se consequências que deverão ser testadas ou falseadas. Falsear significa tornar falsas as consequências deduzidas das hipóteses. Enquanto no método dedutivo se procura a todo custo confirmar a hipótese, no método hipotético-dedutivo, ao contrário, procuram-se evidências empíricas para derrubá-la (GIL, 2008, p. 12). O método hipotético-indutivo, portanto, é um percurso investigativo iniciado com um problema ou uma lacuna deixada pelo próprio conhecimento científico. Depois desse movimento inicial, adiante, é produzida uma hipótese – segundo passo investigativo. A seguir, um esquema produzido por Gil (2008, p. 12): Problema → Conjecturas → Dedução de consequências observadas → Tentativa de falseamento → Corroboração Nesse método, as seguintes etapas são propostas (FERREIRA, 1998): - estudo de teorias existentes; - formulação de problemas a partir da(s) teoria(s) e do objeto estudado (experiência empírica). - elaboração de hipóteses, dedução das consequências a partir de
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