Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Brasília-DF. Doenças CarDiovasCulares, Do sistema reproDutivo e Do trato urinário De equinos Elaboração Jhônatas Luís Knaut Produção Equipe Técnica de Avaliação, Revisão Linguística e Editoração Sumário APRESENTAÇÃO ................................................................................................................................. 4 ORGANIZAÇÃO DO CADERNO DE ESTUDOS E PESQUISA .................................................................... 5 INTRODUÇÃO.................................................................................................................................... 7 UNIDADE I SISTEMA CARDIOVASCULAR ................................................................................................................... 9 CAPÍTULO 1 ANATOMOFISIOLOGIA DO SISTEMA CARDIOVASCULAR ............................................................. 9 CAPÍTULO 2 ENFERMIDADES DO SISTEMA CARDIOVASCULAR ..................................................................... 16 UNIDADE II SISTEMA REPRODUTOR FEMININO ........................................................................................................ 35 CAPÍTULO 1 ANATOFISIOLOGIA DO SISTEMA REPRODUTOR FEMININO ........................................................ 35 CAPÍTULO 2 ENFERMIDADES DO SISTEMA REPRODUTOR FEMININO............................................................. 60 UNIDADE III SISTEMA REPRODUTOR MASCULINO ..................................................................................................... 90 CAPÍTULO 1 ANATOMOFISIOLOGIA DO SISTEMA REPRODUTOR MASCULINO ............................................... 90 CAPÍTULO 2 ENFERMIDADES DO SISTEMA REPRODUTOR MASCULINO ......................................................... 96 UNIDADE IV SISTEMA URINÁRIO ............................................................................................................................. 119 CAPÍTULO 1 ANATOMOFISIOLOGIA DO SISTEMA URINÁRIO ....................................................................... 119 CAPÍTULO 2 ENFERMIDADES DO SISTEMA URINÁRIO ................................................................................. 126 REFERÊNCIAS ................................................................................................................................ 142 4 Apresentação Caro aluno A proposta editorial deste Caderno de Estudos e Pesquisa reúne elementos que se entendem necessários para o desenvolvimento do estudo com segurança e qualidade. Caracteriza-se pela atualidade, dinâmica e pertinência de seu conteúdo, bem como pela interatividade e modernidade de sua estrutura formal, adequadas à metodologia da Educação a Distância – EaD. Pretende-se, com este material, levá-lo à reflexão e à compreensão da pluralidade dos conhecimentos a serem oferecidos, possibilitando-lhe ampliar conceitos específicos da área e atuar de forma competente e conscienciosa, como convém ao profissional que busca a formação continuada para vencer os desafios que a evolução científico-tecnológica impõe ao mundo contemporâneo. Elaborou-se a presente publicação com a intenção de torná-la subsídio valioso, de modo a facilitar sua caminhada na trajetória a ser percorrida tanto na vida pessoal quanto na profissional. Utilize-a como instrumento para seu sucesso na carreira. Conselho Editorial 5 Organização do Caderno de Estudos e Pesquisa Para facilitar seu estudo, os conteúdos são organizados em unidades, subdivididas em capítulos, de forma didática, objetiva e coerente. Eles serão abordados por meio de textos básicos, com questões para reflexão, entre outros recursos editoriais que visam tornar sua leitura mais agradável. Ao final, serão indicadas, também, fontes de consulta para aprofundar seus estudos com leituras e pesquisas complementares. A seguir, apresentamos uma breve descrição dos ícones utilizados na organização dos Cadernos de Estudos e Pesquisa. Provocação Textos que buscam instigar o aluno a refletir sobre determinado assunto antes mesmo de iniciar sua leitura ou após algum trecho pertinente para o autor conteudista. Para refletir Questões inseridas no decorrer do estudo a fim de que o aluno faça uma pausa e reflita sobre o conteúdo estudado ou temas que o ajudem em seu raciocínio. É importante que ele verifique seus conhecimentos, suas experiências e seus sentimentos. As reflexões são o ponto de partida para a construção de suas conclusões. Sugestão de estudo complementar Sugestões de leituras adicionais, filmes e sites para aprofundamento do estudo, discussões em fóruns ou encontros presenciais quando for o caso. Atenção Chamadas para alertar detalhes/tópicos importantes que contribuam para a síntese/conclusão do assunto abordado. 6 Saiba mais Informações complementares para elucidar a construção das sínteses/conclusões sobre o assunto abordado. Sintetizando Trecho que busca resumir informações relevantes do conteúdo, facilitando o entendimento pelo aluno sobre trechos mais complexos. Para (não) finalizar Texto integrador, ao final do módulo, que motiva o aluno a continuar a aprendizagem ou estimula ponderações complementares sobre o módulo estudado. 7 Introdução Um dos pilares que garantem o sucesso da criação equina é a sanidade do rebanho. Desempenhando um papel fundamental nesse quesito, encontra-se o médico veterinário. Um bom clínico de cavalos garantirá baixas taxas de enfermidades no plantel, tratará com eficiência animais acometidos por doenças e impedirá que as patologias que venham a ocorrer acometam outros animais. Para um médico veterinário tornar-se um bom clínico de equinos, é essencial que ele conheça os aspectos anatomofisiológicos normais da espécie para que possa saber quando está diante de uma situação patológica. Os conhecimentos sobre as enfermidades e seus efeitos fisiopatológicos também são fundamentais, além da terapêutica adequada para cada doença. Diante desse cenário, esta apostila se propõe a tratar dos aspectos anatomofisiológicos dos sistemas cardiovascular, reprodutor e urinário, bem como das enfermidades que acometem esses aparelhos. A fisiopatologia e as terapias das doenças tratadas neste material também serão descritas. Objetivos » Descrever a anatomia dos sistemas cardíaco, reprodutor e urinário. » Discutir a fisiologia dos sistemas cardíaco, reprodutor e urinário. » Apresentar as patologias que afetam os sistemas cardíaco, reprodutor e urinário. » Descrever como o médico veterinário deve tratar as enfermidades dos sistemas cardíaco, reprodutor e urinário. 8 9 UNIDADE ISISTEMA CARDIOVASCULAR A base de um tratamento efetivo para alguma enfermidade é conhecer a anatomia e a fisiologia do sistema em questão. Por conta disso, antes de abordarmos as principais patologias do aparelho cardiovascular, vamos estudar a anatomofisiologia desse sistema. CAPÍTULO 1 Anatomofisiologia do sistema cardiovascular A função do sistema cardiovascular consiste em transporte de substâncias essenciais para a vida e produtos metabólicos. Garantir uma circulação adequada de sangue equivale a dizer que os nutrientes devem ser entregues e os produtos do metabolismo removidos, mantendo um ambiente homeostático celular. Dessa forma, o sistema cardiovascular é vital, e a sua compreensão é essencial para o clínico veterinário. A função normal dos tecidos corporais depende do fluxo sanguíneo adequado, assim sendo, quanto maior a taxa metabólica de um tecido, maior a necessidade de sangue. Quando ocorre a ineficiência do fluxo sanguíneo, há geração de isquemia. A isquemia persistente leva à lesão tecidual permanente, isto é, infarto do tecido. Como exemplo, trinta segundos com o coração parado são suficientes para causar danos irreversíveis ao sistema nervoso central. O sangue transporta oxigênio, glicose, aminoácidos, ácidos graxos, lipídios, hormônios, eletrólitos, dióxido de carbono, ácido lático, resíduosnitrogenados do metabolismo e calor para a superfície corpórea. Para que ocorra difusão dos nutrientes, hormônios e gases entre o sangue e os tecidos, cada célula metabolicamente ativa do corpo deve estar próxima de um capilar. 10 UNIDADE I │ SISTEMA CARDIOVASCULAR Para cumprir o objetivo de transporte do sangue para todo o organismo, o sistema cardiovascular possui duas unidades funcionais: o coração e os vasos sanguíneos. Podemos caracterizar essas estruturas como uma bomba (o coração) e um circuito (vasos sanguíneos e sangue). Envolvendo o coração, existe o pericárdio, saco fibrosseroso que, além de circundar o coração, envolve parte dos grandes vasos que se conectam ao coração. Como toda membrana serosa, o pericárdio é formado por uma lâmina parietal e uma lâmina visceral, que possuem um fluido seroso e translúcido entre elas, o líquido do pericárdio. A lâmina visceral do pericárdio, por estar em contato direto com a musculatura cardíaca, pode ser chamada de epicárdio. O pericárdio faz contato com os pulmões, lateralemte, e com a parede torácica, ventralmente. Com formato irregular de cone e um tanto achatado, o coração equino pesa aproximadamente 4kg e ocupa a maior parte do espaço mediastínico médio. Ele está inserido em sua base pelos grandes vasos, porém o resto do órgão encontra-se inteiramente livre dentro do pericárdio. O ápice cardíaco (ponto final do ventrículo esquerdo) situa-se centralmente dorsal à última estérnebra, estando 1 centímetro dorsal ao esterno e aproximadamente 2 a 3 centímetros da parte esternal do diafragma. A parede do coração consiste essencialmente em músculo estriado cardíaco, ou seja, o miocárdio. O miocárdio é revestido externamente pelo epicárdio, que nada mais é do que a lâmina visceral do pericárdio. O epicárdio consiste em uma lâmina de células poligonais planas, que repousam sobre uma membrana de fibras colágenas e elásticas. O revestimento interno das paredes cardíacas é chamado de endocárdio. O endocárdio, em sua superfície livre, é liso e brilhante. A composição do endocárdio é uma lâmina de células endoteliais que repousa sobre uma fina lâmina de tecido fibroelástico que se liga ao miocárdio por meio de um tecido fibroelástico subendocárdico contendo vasos e nervos. O coração é dividido em quatro câmaras: dois átrios dorsais e dois ventrículos ventrais. O sulco coronário indica a divisão entre os átrios e os ventrículos e circunda quase que completamente o coração. Internamente, o miocárdio dos átrios e dos ventrículos é separado quase completamente por anéis fibrosos, que impedem que o impulso elétrico dos átrios passe para as células musculares dos ventrículos. O átrio direito forma a parte cranial direita da base do coração, situando-se dorsalmente no ventrículo direito. O átrio direito consiste em um seio das veias cavas. O ventrículo direto possui formato um tanto triangular e forma a maior parte do lado diretiro do coração, porém não atinge o ápice cardíaco, que é formado inteiramente pelo ventrículo esquerdo. O átrio esquerdo está 11 SISTEMA CARDIOVASCULAR │ UNIDADE I situado caudalmente no tronco pulmonar e na aorta ascendente e dorsalmente no ventrículo esquerdo. Por fim, o ventrículo esquerdo é a maior das quatro cavidades e a de parede mais grossa também. Em um animal morto, é possível que a cavidade do ventrículo direito pareça maior, porém isso ocorre devido a maior contração da parede do ventrículo esquerdo. O septo interventricular é a parede que separa os dois ventrículos, sendo uma estrutura convexa para o lado direito e côncava para o lado esquerdo. Separando o átrio direito do ventrículo direito, existe a válvula atrioventricular direita, também chamada de válvula tricúspide. Além de se comunicar com o átrio direito, o ventrículo direito se comunica com a artéria pulmonar por meio da válvula pulmonar. O sangue que passa do átrio esquerdo para o ventrículo esquerdo o faz por meio da válvula atrioventricular esquerda, também chamada de bicúspide ou mitral. Essa vávula é dona de cúspides maiores e mais espessas que as do lado direito, inclusive suas cordas tendíneas são maiores também que as do lado direito, porém as cordas tendíneas esquerdas são menos numerosas. E por fim, entre o ventrículo esquerdo e a aorta, existe a válvula aórtica. Juntas, válvula pulmonar e aórtica, são chamadas de válvulas semilunares. O coração recebe um grande suprimento sanguíneo por meio das artérias coronárias direita e esquerda (ramos da aorta). Logo é a rede de artérias coronárias que fornece sangue oxigenado para o músculo cardíaco. A maior parte do sangue que irriga o coração é devolvida para as veias coronárias que se abrem dentro do átrio direito, porém algumas veias se abrem diretamente nas outras cavidades cardíacas (átrio esquerdo e ventrículos). Para funcionar como bomba, o músculo cardíaco precisa contrair. As contrações das células do miométrio são desencadeadas por meio de potenciais de ação elétricos. As células de músculo cardíaco são ligadas eletricamente entre si, o que faz com que elas se contraiam e relaxem em sincronia, executando uma sístole e uma diástole respectivamente. As contrações cardíacas são iniciadas por potenciais de ação que surgem espontaneamente em células marca-passo especializadas, localizadas no nó sinoatrial. As células do marco-passo são capazes de se despolarizarem espontaneamente, causando o batimento cardíaco. Consequentemente, elas determinam o ritmo e a frequência dos batimentos. A única ligação elétrica entre as células atriais e as ventriculares é o feixe atrioventricular. Esse feixe transporta o impulso elétrico produzido no nó sinoatrial de forma lenta para os ventrículos, sendo responsável pelo padrão do batimento cardíaco que se inicia com a contração atrial e depois gera a contração dos ventrículos. 12 UNIDADE I │ SISTEMA CARDIOVASCULAR O sangue é bombeado do ventrículo esquerdo para a aorta. A aorta se divide e subdivide para levar sangue para todos os órgãos do corpo, exceto pulmão. No órgão de destino, formam-se os capilares que permitem a troca de susbtâncias entre o sangue e o interstício celular. Seguindo o circuito, os capilares confluem em vênulas, estas se juntam em veias e, por fim, surge a veia cava que deságua no átrio direito. Essa é a circulação sistêmica. Do átrio direito, o sangue passa para o ventrículo direito, então, é bombeado para o pulmão, via artéria pulmonar. Após a formação dos capilares pulmonares, onde o oxigênio é incorporado novamente nas hemoglobinas, o sangue chega ao átrio esquedo pela veia pulmonar. Essa é a circulação pulmonar. Do átrio esquedo, o sangue segue para o ventrículo esquerdo, completando o circuito (figura 1). Figura 1. Representação esquemática do fluxo sanguíneo dentro do coração. As setas indicam a direção do fluxo sanguíneo. A – Aorta; AD – Átrio Direito; AE – Átrio Esquerdo; AP – Artéria Pulmonar; VCA – Veia Cava Anterior; VCP – Veia Cava Posterior; VD – Ventrículo Direito. VE – Ventrículo Esquerdo. VCA VCP AD A AP AE VD VE Fonte: (REECE et al., 2017). O termo débito cardíaco se refere ao volume de sangue bombeado por um ventrículo em um minuto, que é o mesmo que a frequência cardíaca multiplicada pelo volume ejetado na aorta a cada sístole ventricular. Ou seja, as formas para se aumentar o débito cardíaco se dão pelo aumento da frequência dos batimentos, aumento do volume ejetado ou ambos. Ressalta-se que há um limite para que a elevação da frequência cardíaca cause um aumento do débito cardíaco, pois chega um momento em que aumentar muito a frequência dos batimentos impede que o ventrículo se encha de sangue e, dessa forma, ocorre uma redução do volume ejetado. 13 SISTEMA CARDIOVASCULAR │ UNIDADE I A porção vascular do sistema cardiovascular é formada por artérias, arteríolas, capilares, vênulas e veias. A aorta e as grandes artérias possuem em suas paredes grande quantidade de material elástico junto com músculoliso, sendo, por isso, chamadas de vasos elásticos. Já nas arteríolas, há menos tecido elástico, predominando músculo liso, sendo por isso, chamadas de vasos musculares. A parede dos capilares consiste de uma única camada de células endoteliais. As vênulas e veias possuem paredes formadas por músculo liso e material elástico, porém não são tão espessas quanto os correspondentes arteriais. A função das veias é servir como vasos reservatórios de sangue. Os capilares são os menores vasos sangíneos e é neles que ocorre a troca de água e de solutos entre a corrente sanguínea e o líquido intersticial. Via de regra, há apenas um leito capilar no circuito sanguíneo, porém existem três exceções. A primeira delas é a veia porta que passa para o fígado formando um segundo leito capilar. Essa anatomia é chamada de sistema porta esplâncnico e permite que os nutrientes absorvidos pelo trato gastrointestinal sejam levados diretamente ao fígado. A segunda exceção à regra ocorre nos rins. Os rins usam o sistema porta renal para ajustar as quantidades de água, eletrólitos e outros solutos no sangue. E por fim, a terceira exceção é o sistema porta hipotálamo-hipófise, que controla da secreção hormonal conduzindo os hormônios hipotalâmicos para a adeno-hipófise. Todo esse sistema de vasos transporta o sangue para as partes do corpo, por meio do impulso gerado pela contração cardíaca. O sangue é uma suspensão de células (hemácias, leucócitos e plaquetas) em um líquido extracelular (plasma). O plasma é formado por 93% de água e por 5 a 7% de proteínas sintetizadas pelo fígado. Além disso, o plasma contém eletrólitos, gases, glicose, aminoácidos, lipídios, vitaminas, hormônios e produtos do metabolismo. A maior parte do oxigênio do sangue é carreada em combinação química com a proteína hemoglobina no interior das hemácias. Para garantir que o sangue leve oxigênio para todas as células do organismo, existem mecanismos neuro-humorais que regulam a pressão e o volume sanguíneo. Esses mecanismos também possuem influência na frequência e na contratilidade cardíacas. A pressão sanguínea arterial é monitorada pelas terminações nervosas sensíveis à pressão, conhecidas como barorreceptores, localizadas nas paredes das artérias carótidas e do arco aórtico. Os baroreceptores enviam impulsos aferentes ao sistema nervoso central, o que, de forma reflexa, altera o débito cardíaco e a resistência vascular para manter a pressão sanguínea em um ponto fixo. Essse mecanismio de controle é chamado de reflexo barorreceptorarterial. Assim sendo, 14 UNIDADE I │ SISTEMA CARDIOVASCULAR uma redução da pressão sanguínea provoca redução na atividade barorreceptora que resultará no aumento da atividade simpática e redução da parassimpática, assim sendo, ocorre vasoconstrição, aumento da contratilidade do miocárdio e elevação da frequência cardíaca. Quando ocorre um aumento da pressão sanguínea, a atividade barorreceptora aumenta, provocando os efeitos opostos, ou seja, ativação do parassimpático e redução do simpático. Existe ainda um outro reflexo, chamado de reflexo do receptor de volume atrial, que é iniciado por terminações nervosas sensoriais especializadas, localizadas principalmente nas paredes dos átrios direito e esquerdo. Eles detectam variação de volume sanguíneo dentro dos átrios. O efeito reflexo é o mesmo que os dos barorreceptores, ou seja, ao reduzir o volume sanguíneo nos átrios, ocorre aumento da atividade simpática e redução da parassimpatica. Quando ocorre aumento do volume de sangue dentro dos átrios, o efeito no sistema nervoso autônomo é o oposto. Além de agir via sistema nervoso autônomo, o reflexo do receptor de volume atrial atua via hipotálamo para aumentar a sensação de sede, via hipófise para aumentar a liberação do hormônio antidiurético (ADH) que age no rim reduzindo a produção de urina e, por fim, via renal, ao estimular a secreção de renina pelos rins, que desencadeia uma cascata de reações que culmina na redução do sódio excretado pelos rins. A ação do sistema nervoso autônomo sobre o sistema cardiovascular ocorre por meio dos nervos simpáticos e parassimpáticos. Lembrando que as terminações simpáticas liberam norepinefrina, enquanto que as parassimáticas liberam acetilcolina em suas terminações nervosas. No coração, esses nervos autonômicos atuam nas células marca-passo cardíacas, aumentando ou diminuindo a frequência cardíaca, ação desencadeada pela norepinefrina e acetilcolina, respectivamente. Além desse mecanismo sobre as células do marca-passo cardíaco, o sistema nervoso autômono simpático estimula as glândulas suprarrenais a liberarem epinefrina e norepinefrina que exercem influência nas células cardíacas e nas células musculares lisas dos vasos sanguíneos, via circulação sanguínea. Nos vasos sanguíneos, os hormônios liberados pelas suprarrenais provocam vasocontrição que eleva a pressão sanguínea. Epinefrina e norepinefrina aumentam a frequência e a contratilidade do coração, dilatam vasos sanguíneos da musculatura esquelética e aumentam a pressão arterial. O coração normal tem a capacidade de aumentar a saída de sangue pelo ventrículo a cada batimento. Esse aumento de volume pode ser aumentado em várias vezes o valor basal e ocorre em resposta a demandas fisiológicas normais, como as criadas pelo exercício físico, prenhez, lactação, digestão e temperatura ambiental alta. Coletivamente, essas respostas compensatórias compreendem a reserva cardíaca. Há 15 SISTEMA CARDIOVASCULAR │ UNIDADE I uma grande quantidade de reserva cardíaca na elevação da frequência cardíaca, sendo ela um fator significativo no aumento do débito cardíaco em um cavalo submetido a exercício. Como já dito anteriormente, a limitação do aumento da frequência cardíaca é que com o aumento da frequência, diminui o tempo de enchimento diastólico. Assim sendo, em frequências cardíacas excessivas ocorre queda do volume sitólico. A reserva de frequência cardíaca efetiva pode ser aumentada com o treinamento físico e a frequência cardíaca máxima de cavalos treinados é de seis a sete vezes o valor de descanso. Outra forma de utilizar a reserva cardíaca é alterando a eficiência da contração do músculo cardíaco. A ação inotrópica do coração (poder de contração) é grandemente aumentada pela elevação do retorno venoso associado ao exercício e ao aumento da atividade simpática. A contratilidade também é influenciada pela atividade adrenérgica por meio das catecolaminas circulantes. As alterações cardíacas também podem acarretar seus efeitos nas paredes dos vasos, principalmente os arteriais. O aumento do volume ejetado pelo ventrículo esquerdo aumenta a pressão de pulso. A diminuição da frequência cardíaca também aumenta a pressão de pulso. O enrijecimento das artérias (como no envelhecimento) é o terceiro fator que aumenta a pressão de pulso. O quarto fator que aumenta a pressão de pulso é a vasoconstrição. Logo, quando o clínico veterinário notar o aumento na pressão de pulso durante o exame físico, ele pensará nessas quatro possíveis causas. Além dos mecanismos de regulação via sistema nervoso autônomo, outros mecanismos de controle exercem sua influência sobre o aparato cardiovascular. Um exemplo é o sistema renina-angiotensina-aldosterona, que é ativado quando ocorre uma diminuição da perfusão renal que resulta na liberação de renina pelas células justaglomerulares do rim. A renina faz a conversão de angiotensinogênio para angiotensina I. A angiotensina I, por sua vez, é convertida em angiotensina II nos pulmões. A angiotensina II é um poderoso vasoconstritor que promove o efeito da norepinefrina. A angiotensina II também estimula a liberação de aldosterona no córtex adrenal, que age para aumentar a retenção de sódio pelo rim com consequente expansão do fluido intersticial e do volume de sangue. O entendimento desses mecanismos de controle e regulação do sistema cardiovascular é importante para o veterinário, uma vez que eles servemde mecanismos compensatórios para animais com problemas no aparelho cardíaco, além de que muitos medicamentos possuem seus efeitos centrados na manipulação desses mecanismos regulatórios. 16 CAPÍTULO 2 Enfermidades do sistema cardiovascular Uma circulação sanguínea inadequada interfere na entrega de nutrientes e na remoçãodos produtos residuais. A circulação pode ser afetada por um defeito no coração (comprometimento na capacidade de bombear sangue) ou por um defeito nos vasos sanguíneos (falha em retornar o volume de sangue para o coração). A falha na capacidade do coração em bombear sangue decorre de arritmia cardíaca, disfunção contrátil ou anormalidades anatômicas. As causas de comprometimento no retorno do sangue são fluxo obstruído, hemorragia ou preenchimento inadequado. Uma estimativa clínica da reserva cardíaca com base no exame físico é importante quando um prognóstico deve ser feito para um animal com doença cardíaca. Alguns dos importantes critérios utilizados para fazer essa avaliação incluem a frequência cardíaca, a intensidade dos sons do coração, o tamanho do coração, as características do pulso e a tolerância ao exercício. Uma frequência cardíaca em repouso acima do normal indica perda de reserva cardíaca. A intensidade absoluta dos sons cardíacos sugere a força de contração do ventrículo, sendo som suave indicativo de contrações fracas e som mais forte sugestivo de dilatação cardíaca e, possivelmente, hipertrofia. Ressalva-se que derrame pleural e pericárdico interferem na audibilidade dos sons do coração. A amplitude de pulso aumentada ocorre quando o volume cardíaco é aumentado, mas uma amplitude de pulso diminuída pode resultar de retorno venoso reduzido, bem como de redução do poder contrátil do músculo cardíaco. A tolerância ao exercício é um excelente guia para reserva cardíaca sendo mais bem avaliada medindo a frequência cardíaca máxima atingida após um teste de exercício padrão e o tempo necessário para a frequência cardíaca voltar ao normal. Cardiomiopatia As doenças do miocárdio podem ser de causa bacteriana, viral, parasitária, de algumas deficiências nutricionais ou de intoxicações. Independentemente da causa, o miocárdio sofre inflamação, necrose ou degeneração. As lesões no miocárdio frequentemente provocam arritmias nos batimentos cardíacos. A redução da reserva cardíaca causa intolerância ao exercício, pode haver arritmia cardíaca (particularmente taquiarritmias), culminando em insuficiência cardíaca aguda ou crônica. O aumento da frequência cardíaca e o aumento do coração, vistos por 17 SISTEMA CARDIOVASCULAR │ UNIDADE I ecocardiografia, também são sinais clínicos comuns. Nos estágios finais, ou em casos com lesão miocárdica grave, pode haver morte súbita ou ataques de síncope cardíaca causados por insuficiência cardíaca aguda. Quando causa insuficiência cardíaca congestiva, há dispneia e edema generalizado. Infarto do miocárdio e necrose podem ser diagnosticados pela determinação das enzimas LDH, creatina-quinase e aspartato amino-transaminase no soro. A necropsia revela miocardite e/ou degeneração miocardial. Pode-se encontrar discretos abscessos no miocárdio quando a causa é bacteriana. Quando a causa é viral, tóxica ou por deficiência nutricional ocorre uma palidez na musculatura cardíaca. Casos crônicos revelam tecido fibroso substituindo o miocárdio. O tratamento vai depender da causa. Associado a isso, realizar tratamento paliativo para as alterações cardíacas consequentes. Ressalta-se que animais com arritmias evidentes durante o repouso não devem ser exercitados nem colocados em situações de excitação. Defeitos septais ventriculares Trata-se da alteração congênita mais comum em potros. Comumente são defeitos subaórticos ocorrendo no alto do septo, que resulta no desvio de sangue do ventrículo esquerdo para o direito. Na auscultação, há um sopro alto pansistólico, sendo um dos sopros mais altos encontrados. Frêmito precordial é frequentemente palpável em ambos os lados, esquerdo e direito. Quando o defeito é grande, o animal pode morrer ao nascer ou mostrar sinais clínicos em algumas semanas a alguns meses de idade. A principal apresentação clínica é um potro de crescimento lento apresentando dispneia ao realizar exercício. Entretanto, se o defeito for pequeno, sinais clínicos podem aparecer apenas com o desenvolvimento de alterações secundárias, podendo, ainda, ser apenas um achado de necropsia. No geral, esses animais têm menor expectativa de vida devido à alta probabilidade de desenvolverem insuficiência cardíaca congestiva. Às vezes, o defeito de septo ventricular pode vir associado a outras anomalias primárias resultando na tetralogia de Fallot, que é letal para grandes animais. Doenças valvulares e sopros cardíacos As doenças valvulares podem ser congênitas ou adquiridas, sendo a endocardite a causa mais comum. Entre as causas congênitas, citam-se a estenose da valva 18 UNIDADE I │ SISTEMA CARDIOVASCULAR pulmonar e a fenestração das válvulas aórtica e pulmonar. Ressalta-se que as causas congênitas costumam causar estenoses nas válvulas. As causas adquiridas de doenças valvulares são endocardite, endocardiose, ruptura das cordas tendíneas (seja espontânea ou secundária à endocardite), laceração ou descolamento da valva aórtica (espontâneos ou secundários à endocardite) e doenças miocárdicas. Embora alguns sopros sejam funcionais e não indiquem doença, sendo inclusive comuns em equinos, um dos sinais clínicos de doença valvular é a presença de sopro cardíaco definido por localização, tempo, caráter, intensidade e radiação. Os sopros não funcionais possivelmente se relacionam com frêmito precordial, comprometimento cardíaco e, em casos graves, insuficiência cardíaca congestiva. Importantes indicações clínicas de doença valvular são sopros audíveis e frêmitos precordiais palpáveis. Os sopros podem ocorrer em qualquer fase do ciclo cardíaco e são causados pelas vibrações do fluxo turbulento de sangue transmitido para a superfície do tórax. Vibrações de forte intensidade também podem resultar em vibrações palpáveis na superfície do peito. A gravidade da turbulência e, portanto, do sopro pode ser aumentada pela maior velocidade de fluxo, como ocorre durante o exercício e por fatores que diminuem a viscosidade do sangue, como anemia ou hipoproteinemia. O diagnóstico exige uma boa auscultação cardíaca e, quando um sopro for detectado, ele deve ser categorizado em sistólico ou diastólico, contínuo ou interrompido, classificado quanto a intensidade em grau I, II, III, IV ou V e dividido quanto ao caráter em crescente, crescente-decrescente, decrescente ou sopro em platô. Sopros sistólicos estão associados com estenose das válvulas de saída ou insuficiência das válvulas atrioventriculares. Sopros sistólicos são classificados em precoce, tardio, holossistólico ou pansistólico. Sopros diastólicos estão associados à insuficiência das válvulas de saída ou estenose das válvulas atrioventriculares. Sopros diastólicos são classificados em precoce, holodiastólico ou presistólico. Um sopro contínuo ou aquele que ocorre durante a sístole e diástole pode estar associado a estenoses e insuficiência da mesma válvula ou a múltiplas lesões valvares, mas esse tipo de sopro geralmente resulta do fluxo turbulento de sangue de um sistema de alta pressão para um sistema de baixa pressão sem envolvimento da válvula, como ocorre com um ducto arterial persistente. Como regra, todos os sopros mitrais e tricúspides pansistólicos, todos os sopros holodiastólicos, todos os sopros do lado direito e todos os sopros com frêmito precordial palpável devem ser considerados patológicos. 19 SISTEMA CARDIOVASCULAR │ UNIDADE I A insuficiência da válvula atrioventricular direita (tricúspide) pode manifestar sopro, porém com pouca evidência de desempenho prejudicado. O sopro é em platô, holossistólico ou pansistólico, sendo geralmente acompanhado por um componente sistólicoexagerado no pulso jugular. A insuficiência da válvula atrioventricular esquerda gera sopro alto holossistólico ou pansistólico. Em casos graves também pode ser ouvido do lado direito. Sopro crescente sistólito tardio é associado com insuficiência da válvula mitral. O pulso não é afetado até o estágio de insuficiência cardíaca. Ocorre intolerância ao exercício. Insuficiência de mitral pode predispor o animal à fibrilação atrial. A ruptura das cordas da válvula mitral causa insuficiência cardíaca aguda. A regurgitação mitral é a doença valvular mais associada à fibrilação atrial, arritmias ventriculares e insuficiência cardíaca congestiva. A insuficiência da vávula aórtica causa sopro holodiastólico alto acompanhado por frêmito. O sopro geralmente é decrescente. O pulso arterial tem alta amplitude, devido a alta pressão sistólica e a baixa pressão diastólica do sangue. A estenose de válvula aórtica causa um sopro sitólico severo, geralmente crescente-decrescente. Frêmito sistólico pode ser palpado na base do coração. Pode levar a síncope. A estenose e a insuficiência da válvula pulmonar causam sopro holodiastólico alto, geralmente decrescente e não há anormalidades no pulso arterial. A estenose das válvulas atrioventriculares direita ou esquerda causa sopro diastólico, podendo acentuar o componente atrial do pulso jugular. Estenoses nas válvulas cardíacas de saída resultam em hipertrofia compensatória concêntrica. Insuficiência nas válvulas semilunares, aórtica ou pulmonar produz dilatação compensatória e hipertrofia excêntrica. Se as válvulas do lado esquerdo do coração são afetadas, especialmente a válvula aórtica, ocorre alteração no pulso periférico. Envolvimento da válvula tricúspide produz mudanças no pulso jugular. Se a causa da lesão não puder ser determinada a partir da ausculta, exames complementares podem ser executados, como a ecocardiografia. Ressalta-se que a presença de sopro cardíaco é muito mais importante no cavalo atleta do que no animal destinado à reprodução, pois a doença valvular diminui a reserva cardíaca. Durante a necropsia, a abertura do coração deve ser feita com cuidado para analisar as válvulas, e as lesões variam com a causa originária. A confirmação diagnóstica ocorre por ecocardiografia, e a hemocultura é útil nos casos de endocardite. Não há 20 UNIDADE I │ SISTEMA CARDIOVASCULAR tratamento específico para doenças valvulares, cabendo ao veterinário tratar a causa e as consequências das alterações valvulares. Endocardite Causada, em sua grande maioria, por infecções bacterianas. Menos frequentemente, a causa é infecção parasitária. Os principais agentes envolvidos na endocardite são: Actinobacillus equuli, Streptococcus spp., Pasteurella spp., Actinobacillus spp., Pseudomonas spp. e migração da larva de Strongylus spp. As principais anormalidades clínicas associadas com a endocardite resultam na função cardíaca, devido às lesões valvulares, e nos efeitos dos êmbolos de microrganismos liberados na circulação, que podem levar ao infarto ou infecção em outros locais do corpo. Por conta disso, os achados clínicos revelam sopro (o tipo de sopro depende da válvula afetada), nefrite embólica, artrite, tenossinovite, miocardite, entre outros. A bacteremia causa febre. Se ocorrer o rompimento das cordas tendíneas do coração, pode ocorrer insuficiência cardíaca aguda, embora a crônica seja mais comum na evolução de casos de endocardite. A patologia clínica revela anemia não regenerativa, leucocitose, neutrofilia, hiperfibrinogenemia e hiperglobulinemia. Quando afeta rins e fígado, pode haver aumento de enzimas específicas. O diagnóstico é obtido por cultura de sangue para evidenciar bacteremia e ecocardiografia a fim de mostrar as lesões valvulares. A cultura de sangue deve ser feita em três locais de punção venosa diferentes. A necropsia revela lesões nas válvulas cardíacas e lesões embólicas em outros órgãos. As alterações valvulares comuns são vegetativas, ou seja, lembram o aspecto de “couve-flor”. Casos crônicos revelam válvulas pequenas, fibrosadas e com as bordas espessas. O tratamento é realizado com antimicrobianos baseado na cultura de sangue realizado, entretanto a terapia é prolongada e nem sempre eficaz. Tratamento suporte deve ser realizado para as anormalidades cardíacas e demais órgãos afetados pelos êmbulos. Fibrilação atrial Essa arritmia frequentemente ocorre em equinos jovens na ausência de patologia atrial significativa. Ao mesmo tempo, doença cardíaca subjacente predispõe ao desenvolvimento de fibrilação atrial durante uma corrida. O aumento do peso corporal também é um fator de risco para fibrilação atrial. 21 SISTEMA CARDIOVASCULAR │ UNIDADE I Cavalos com fibrilação atrial são divididos em duas categorias. A primeira delas é chamada de “fibrilação atrial isolada” e não há evidências de doença cardíaca subjacente, enquanto na segunda categoria, chamada de “fibrilação atrial secundária”, há evidências de doença cardíaca. Fibrilação atrial isolada Nos casos de fibrilação atrial isolada, o tônus vagal pode ser alto e a condução por meio do nódulo atrioventricular é suprimida, resultando em frequências cardíacas na região de aproximadamente 26 a 48 batimentos/min. Nesse ritmo, não há sinais de insuficiência cardíaca, e os parâmetros hemodinâmicos são normais. O cavalo pode elevar sua frequência cardíaca com o exercício para permitir um desempenho moderado, porém não em exercício intenso, como é o caso de um cavalo de corrida. Esta é a manifestação mais comum nos equinos e é caracterizada por uma irregularidade grosseira na frequência, ritmo e intensidade dos sons do coração e pela ocorrência, em repouso, de períodos ocasionais sem atividade ventricular que duram de 3 a 6 segundos. Quando as frequências são muito baixas, pode ocorrer síncope periódica. A forma isolada de fibrilação atrial é mais comum em cavalos de corrida e, ocasionalmente, em cavalos de tração. A intolerância ao exercício é o histórico clínico mais comum, como, por exemplo, “o cavalo correu bem durante os primeiros 200 a 300m, mas depois perdeu desempenho e terminou muito atrás do campo”. Os cavalos mostram frequência e ritmo cardíacos irregulares, porém, durante o repouso, esses valores costumam ser normais. Pode ocorrer hipertensão pulmonar induzida pelo exercício. Fibrilação atrial secundária Cavalos podem desenvolver fibrilação atrial secundária em resposta à doença cardiovascular subjacente, como insuficiência da valva mitral, insuficiência da valva tricúspide ou uma combinação de ambos, mas qualquer lesão adquirida ou congênita que resulte em hipertrofia atrial tem risco de causar fibrilação atrial. Nesse tipo de fibrilação atrial, em que há doença cardíaca subjacente, a frequência ventricular em repouso é muito maior, e a arritmia se apresenta como uma taquicardia. Tem sido sugerido que uma frequência cardíaca maior que 60 batimentos por minuto é indicativa de doença cardíaca subjacente em casos de fibrilação atrial. Em equinos com fibrilação atrial, o enchimento ventricular está comprometido em frequências cardíacas acima de 70 22 UNIDADE I │ SISTEMA CARDIOVASCULAR batimentos por minuto. Na presença de frequências cardíacas de repouso entre 80 a 100 batimentos/min, há ineficiência cardíaca grave, e o animal rapidamente desenvolve sinais de insuficiência cardíaca. Nos casos de frequências cardíacas aceleradas, a fibrilação atrial apresenta uma síndrome clinicamente semelhante à taquicardia ventricular associada a múltiplas sístoles extraventriculares, e a diferenciação eletrocardiográfica é necessária. Tratamento da fibrilação atrial Cavalos com fibrilação atrial manifestando frequências cardíacas altas sustentadas geralmente não são tratados com sucesso, porque uma patologia aguda e grave geralmente está presente (fibrilação atrial secundária). A decisão de tratar um equino com fibrilação atrial de frequências cardíacas baixas depende da exigência do animalpara realizar o trabalho, porque os cavalos com essa arritmia podem ser aposentados e viverão por vários anos. Eles podem ser usados com sucesso como éguas de cria. Quando se opta pelo tratamento, ele é feito com digoxina e sulfato de quinidina. O sulfato de quinidina oral é o tratamento inicial de escolha para a correção da fibrilação atrial, com eficácia variando de 65 a 90%. Realiza-se administração de uma dose oral de sulfato de quinidina de 22 mg/kg, a cada 2 horas, até a reversão do quadro. Na maioria dos casos, a correção ocorrerá antes que a dose total exceda 40g. A toxicidade é provável quando a dose total excede 60g. Entre as reações adversas,destacam-se: depressão, cansaço, anorexia, urticária, congestão das membranas mucosas, cólica e morte. Os efeitos tóxicos da quinidina podem ser corrigidos pela administração intravenosa de bicarbonato de sódio. Há uma taxa de sucesso muito maior em equinos jovens e quando se descobre a arritmia no início. Alguns médicos administram corticosteróides (como a prednisolona oral) depois da correção do problema (visto que ele pode corrigir sozinho), com base no fato de que a fibrilação atrial pode ter sido induzida por miocardite, e os corticosteróides podem diminuir os focos inflamatórios no miocárdio. Opção para animais que não respondem ao tratamento com quinidina ou que manifestam toxicidade ao fármaco é o uso de cardioversão elétrica transvenosa bifásica ou monofásica. O objetivo é administrar um choque elétrico no tecido miocárdico atrial para sincronizá-lo e restabelecer o ritmo sinusal. Hemangioma e hemangiossarcoma O crescimento anormal dos vasos sanguíneos, hemangiomas, costuma ocorrer na pele e é mais comum em cavalos com menos de 1 ano, o que fomenta a possibilidade 23 SISTEMA CARDIOVASCULAR │ UNIDADE I de serem congênitos. O local mais comum de manifestação em cavalos é a pele do membro distal. Clinicamente, as lesões geralmente são solitárias, firmes a flutuantes e de cor azulada a preta. Os tumores crescem com a idade, aqueles na pele podem ulcerar e sangrar, sendo necessária aeutanásia. Tumores semelhantes podem ocorrer na boca como massas granulares pedunculados de cor rosa que ulceram e sangram. Hemangiomas locais na pele e na boca podem responder à excisão cirúrgica, termocautério ou radiação. Apesar de a neoplasia maligna do endotélio, hemangiossarcoma, ocorrer em cavalos, ela não é um tumor comum. É mais prevalente em animais de meia idade e mais velhos. Cavalos afetados podem apresentar massas subcutâneas sangrantes. Hemangiossarcomas disseminados causam anemia devido à hemorragia causada pelo tumor. Além disso, há fraqueza, perda de peso, mas bom apetite. A metástase ocorre no pulmão, miocárdio, cérebro, retroperitônio e músculo esquelético. As lesões no miocárdico podem levar a arritmias cardíacas. Dependendo da localização, pode-se proceder à remoção cirúrgica. Insuficiência cardíaca A falha do coração em desempenhar sua função de bomba pode resultar de um defeito de enchimento do coração, uma anormalidade na geração ou condução da onda elétrica de despolarização, uma anormalidade na função contrátil, excesso da carga de trabalho, anormalidades anatômicas ou combinações de uma ou mais anormalidades. É comum dividir a insuficiência cardíaca em dois tipos: insuficiência cardíaca aguda e insuficiência cardíaca congestiva (crônica). Se a falha cardíaca se desenvolver de forma suficientemente lenta, despertando mecanismos compensatórios, que além da falha do coração em si como uma bomba, resultar em um aumento da pressão venosa, estaremos diante de insuficiência cardíaca congestiva. Os principais mecanismos compensatórios da insuficiência cardíaca são: aumento da frequência cardíaca, aumento no volume de ejeção e redistribuição do fluxo sanguíneo para órgãos vitais. Mecanismos esses regulados em sua maior parte pelo sistema nervoso simpático. A reserva esplênica de células vermelhas também é importante no cavalo como mecanismo compensatório. Se, por outro lado, houver uma redução do débito cardíaco, como é causado em uma cessação súbita do batimento cardíaco, o efeito é a privação dos tecidos de seus suprimentos de oxigênio, e a síndrome de insuficiência cardíaca aguda se desenvolve. 24 UNIDADE I │ SISTEMA CARDIOVASCULAR A insuficiência cardíaca pode ser do lado esquerdo, direito ou ambos. A insuficiência cardíaca do lado esquerdo causa um aumento da pressão diastólica final no ventrículo esquerdo, da pressão atrial esquerda média e da pressão venosa pulmonar. A depender da gravidade do quadro, ocorre edema pulmonar intersticial, dispneia e morte. Insuficiência cardíaca no lado direito provoca aumento da pressão diastólica final no ventrículo direito, da pressão atrial direita média e da pressão venosa jugular. A depender da gravidade do quadro, ocorre distensão venosa (facilmente detectado nas veias jugulares), ascite e hepatomegalia. Insuficiência cardíaca aguda A insuficiência cardíaca aguda pode ocorrer quando há defeito grave no preenchimento sanguíneo, como quando o coração falha como bomba (taquicardia grave, bradicardia ou arritmia). Isso pode acontecer também quando há um aumento repentino na carga de trabalho. A ocorrência súbita de taquiarritmias associadas à excitação libera catecolaminas exacerbadamente, o que é grave o bastante para causar insuficiência cardíaca aguda. Ruptura de vaso ou válvula cardíaca e tamponamento pericárdico também podem levar a quadros de insuficiência cardíaca aguda. Essa doença também pode ocorrer na ausência de doença cardíaca primária sob a influência de agentes farmacológicos que afetam a condução cardíaca. Estes estão associados com a ingestão de certas plantas venenosas. Ainda como causas de insuficiência cardíaca aguda, há tamponamento pericárdico, miocardite, miopatia por deficiência nutricional, electrocussão, relâmpago, anafilaxia aguda e causas iatrogênicas. Com taquicardia excessiva, o preenchimento dos ventrículos está prejudicado e o débito cardíaco é grosseiramente reduzido. Na fibrilação ventricular, contrações ocorrem e não há sangue ejetado do coração. O débito cardíaco é também seriamente reduzido quando a frequência cardíaca diminui para além de um ponto crítico. Em todas estas circunstâncias, há um grau severo de isquemia tecidual, sendo o cérebro o órgão mais sensível, logo os sinais são principalmente neurológicos. A palidez também é um sinal proeminente na insuficiência cardíaca aguda por causa da redução no fluxo sanguíneo. Em casos menos agudos, o desconforto respiratório é mais óbvio por causa do edema pulmonar e, embora esses possam ser classificados como insuficiência cardíaca aguda, eles são mais precisamente descritos como insuficiência cardíaca congestiva aguda. 25 SISTEMA CARDIOVASCULAR │ UNIDADE I A síndrome aguda pode ocorrer enquanto o animal está em repouso, mas é mais comum durante períodos de excitação ou atividade. O animal geralmente mostra dispneia, cambaleia e cai. A morte geralmente acontece dentro de segundos ou minutos dos primeiros sinais. Há palidez marcada das mucosas. Embora as convulsões clônicas possam ocorrer, nunca são graves e consistem principalmente em movimentos incoordenados esporádicos dos membros. A morte é geralmente precedida por suspiros profundos de asfixia. Se houver tempo para exame físico, encontrar-se-ão pulso fraco ou ausente, bradicardia ou taquicardia. Insuficiência cardíaca aguda é a causa da morte em uma proporção significativa de cavalos que morrem de repente e inesperadamente durante o treinamento ou corrida. Geralmente, não há tempo para realizar testes laboratoriais antes que o animal morra. Quando realizado exame sanguíneo, há elevada concentração sérica de troponina I. O diagnóstico é baseado principalmente sobre os achados de necropsia de doença pulmonar, hemorragia e edema, embora patologias de miocárdico estejam ausentes na maioria dos casos. Em casos agudos típicos, a necropsia pode revelaro ingurgitamento das veias viscerais se o ataque durou alguns minutos. Entretanto, é comum não haver lesões macroscópicas características de insuficiência cardíaca aguda. O exame de necropsia microscópico pode mostrar evidência de congestão pulmonar e edema pulmonar. Em casos mais prolongados, o ingurgitamento venoso com congestão pulmonar e edema são evidentes juntamente com hidrotórax, mas estes são mais precisamente descritos em casos de insuficiência cardíaca congestiva aguda. A causa primária pode ser evidenciada por lesões macroscópicas ou microscópicas do miocárdio. Animais eletrocutados têm hemorragias visíveis no epicárdio, miocárdio e endocárdio. A insuficiência cardíaca aguda deve ser sempre considerada como uma possível causa de morte súbita, especialmente quando a morte está associada a esforço ou à excitação. Epilepsia e narcolepsia são geralmente transitórias e repetitivas e possuem um padrão característico de desenvolvimento, o que as diferencia de insuficiência cardíaca aguda. O tratamento da insuficiência cardíaca aguda geralmente não é possível ou prático de ser realizado, por causa do curto curso da doença. Mortes causadas por parada cardíaca súbita ou fibrilação ventricular sob anestesia podem ser evitadas de forma limitada por compressão cardíaca externa ou interna, ou por estimulação de conversão elétrica. Injeções intracardíacas com doses muito pequenas de epinefrina em conjunto com compressão cardíaca externa, pulando de joelhos sobre o tórax do cavalo, pode obter sucesso ocasional. 26 UNIDADE I │ SISTEMA CARDIOVASCULAR Insuficiência cardíaca congestiva (crônica) As causas de insuficiência cardíaca congestiva podem decorrer de doença valvular, doenças miocárdicas, defeitos anatômicos congênitos que produzem desvios sanguíneos, hipertensão, entre outros. Entre as doenças valvulares, destacam-se: endocardite que resulta em estenose valvular ou insuficiência valvar, defeitos valvulares congênitos e ruptura da válvula ou cordas da válvula. Entre as doenças miocárdicas, destacam-se: miocardite (bacteriana, viral, parasitária ou tóxica), degeneração miocárdica (nutricional ou tóxica), cardiomiopatia hereditária ou toxinas que afetam a condução cardíaca. Entre os defeitos anatômicos congênitos que produzem comunicação sanguínea, destacam-se: defeitos do septo interatrial, tetralogia de Fallot e persistência do canal arterial. Entre as hipertensões, destaca-se: hipertensão pulmonar (cor pulmonale) ou hipertensão sistêmica. Doenças pericárdicas, como pericardite e tamponamento pericárdico podem resultar na insuficiência cardíaca por interferir com enchimento diastólico. Arritmias são uma causa rara de insuficiência cardíaca congestiva, mas uma causa comum de insuficiência cardíaca aguda. Na insuficiência cardíaca, o defeito principal está no estado contrátil do miocárdio. Na insuficiência precoce, o débito cardíaco pode ainda ser mantido no intervalo normal pelos mecanismos compensatórios fazendo com que a pressão diastólica final aumente somente no exercício. O animal é comparativamente normal em repouso, mas é incapaz de realizar exercício ou responder apropriadamente a um estressor fisiológico, como a gestação tardia ou ser alojado em temperatura ambiente quente. Nesses casos é possível perceber que o retorno da frequência cardíaca e do pulso demora para se reestabelecer. Com a evolução do problema, a pressão diastólica final torna-se aumentada mesmo no repouso, assim como a frequência cardíaca. Nesse estágio, pode haver perda de peso. A insuficiência cardíaca afeta a perfusão renal, resultando na liberação de renina pelo rim. Desse modo, ocorre a ativação do sistema renina-angiotensina-aldosterona que resulta no aumento do volume e pressão sanguíneos. Na insuficiência cardíaca congestiva do lado direito, a congestão venosa manifesta-se na circulação sistêmica, apresentando como sinal clínico a distensão venosa generalizada. As veias superficiais são ingurgitadas e isso é mais facilmente detectado pela presença de distensão da veia jugular bilateralmente. Há edema no subcutâneo e, em casos mais graves, ocorre ascite. Em cavalos, o edema é inicialmente mais proeminente na região 27 SISTEMA CARDIOVASCULAR │ UNIDADE I peitoral entre os membros dianteiros, na parede abdominal ventral, no prepúcio e nos membros. A ascite precisa ser diferenciada de outras causas da distensão abdominal, porém a detecção por palpação transretal de vísceras flutuando em um meio fluido e a presença de uma onda fluida no balonamento abdominal são altamente sugestivos de ascite. Hidrotórax e hidropericárdio podem também ser clinicamente detectados em animais com ascites. Cuidado deve ser levado para diferenciar ascites de uroabdomen. O peso corporal pode aumentar por causa do edema. Na insuficiência cardíaca congestiva do lado direito, a frequência cardíaca é quase sempre aumentada. A respiração é mais profunda, e sua frequência pode estar ligeiramente aumentada. Pode ocorre epistaxe (sangramento nasal). Nos rins, a saída de urina é reduzida, concentrada e com pequena quantidade de proteína. No fígado, a congestão se estende para o sistema portal, que dificulta a absorção e, terminalmente, causa diarréia. O fígado aumentado pode ser detectado por ultrassonografia. A atitude e o comportamento do animal são de indiferença e depressão. Exercício é realizado com relutância, e a marcha é embaralhada e sugestiva de fraqueza. A insuficiência cardíaca congestiva do lado esquerdo provoca dificuldade respiratória e intolerância ao exercício. A frequência cardíaca aumenta e existe um aumento na taxa e profundidade da respiração em repouso, sendo que pode ocorrer tosse. Aparecem crepitações na base dos pulmões durante a auscultação e aumento do embotamento na percussão das bordas ventrais dos pulmões. Terminalmente, há dispneia e cianose severas. A tosse “cardíaca” associada à formação de edema raramente é observada, com relatos de aparecimento em cavalos com regurgitação valvar mitral. Em síndromes de insuficiência crônica, o desenvolvimento de um sistema de drenagem linfática hábil limita a ocorrência de manifestações clínicas pulmonares, por isso que, em cavalos, o edema pulmonar geralmente se limita à insuficiência cardíaca aguda. Em casos de insuficiência cardíaca não compensada, a tensão venosa de oxigênio cai abaixo de 40 mmHg (atingindo de 15 a 25 mmHg em casos graves de choque) e a diferença de oxigênio venoso e arterial aumenta. Há também uma redistribuição do fluxo sanguíneo para os órgãos vitais. Os achados clínicos de insuficiência cardíaca são predominantemente no lado direito, com exceção da falha cardíaca causada por doença da válvula mitral. A patologia clínica detecta o aumento plasmático de troponina cardíaca I, uma enzima específica do coração que funciona como biomarcador de lesão 28 UNIDADE I │ SISTEMA CARDIOVASCULAR miocárdica. Exames laboratoriais também podem ser feitos para determinar a origem de acumulações de líquidos nas cavidades corporais. A proteinúria está frequentemente presente devido aos danos no glomérulo induzidos por pressão. Os achados de necropsia para animal com o lado direto afetado inclui edema de subcutâneo, ascite, hidrotórax, hidropericárdio, aumento e ingurgitamento do fígado. Cavalos com o lado esquerdo comprometido mostrarão edema pulmonar. Pode-se encontrar lesões da doença específica que originou a insuficiência cardíaca. Os diagnósticos diferenciais para insuficiência cardíaca congestiva são doenças que causam edema e doenças que causam dispneia. O prognóstico é ruim. A possibilidade de recuperação existe com arritmia, tamponamento de pericárdico ou pericardite, mas quando envolve o epicárdio, miocárdio ou endocárdio raramente ocorre recuperação e, se alguma vez ocorrer, o animal pode sobreviver com uma reserva cardíaca reduzida permanentemente. O tratamento da causa que originou a insuficiência cardíaca acaba sendo muitas vezes malsucedido.Exceções são os casos provocados por pericardite ou tamponamento pericárdico, cujo tratamento consiste em remover o líquido pericárdico e prevenir seu retorno. Para controle do quadro, utilizar diuréticos, fazer restrição de sal, minimizar a atividade. Tratamentofarmacológico: digoxina (inotrópico positivo) ou dobutamina. O tratamento com diurético (furosemida, acetazolamida ou clorotiazida) é importante porque mobiliza e elimina o excesso de fluidos corporais. Furosemida é mais usado porque é o diurético mais potente disponível, é barato, e os parâmetros farmacocinéticos foram determinado para grandes animais. Furosemida deve ser administrada por via intravenosa (IV) na dose de 0,25 a 1 mg/kg de PV para cavalos. Múltiplas doses de furosemida induzem a alcalose metabólica hipocaliêmica hipoclorêmica, por isso é importante monitorar o potássio sérico e as concentrações de cloretos durante o tratamento. O acesso ao sal livre deve ser interrompido e, se possível, formular uma dieta restrita em sal. Doses orais únicas de benazepril (0,5 mg/kg) também podem ser utilizadas por inibirem o sistema renina-angotensina-aldosterona. Repouso em um ambiente termoneutro também é um requisito importante. O parto pode ser induzido eletivamente no final gestação para prevenir hipóxia fetal no útero. O tratamento com agentes inotrópicos positivos (dobutamina, cálcio e glicosídeos cardíacos) também pode ser empregado na insuficiência cardíaca 29 SISTEMA CARDIOVASCULAR │ UNIDADE I congestiva. A dobutamina é o agente inotrópico positivo mais comumente usado em cavalos. Em baixas doses (1 [μg/kg]/min IV), causa um pequeno aumento na pressão arterial média. Em doses intermediárias (2.5 a 7.5 [μg/kg]/min IV), o principal efeito da dobutamina é a contração cardíaca aumentada, e esse deve ser o intervalo de dose-alvo para animais necessitando de suporte inotrópico. A digoxina é o glicosídeo cardíaco mais comumente usado em cavalos, podendo ser administrada por via intravenosa ou oral (por via intramuscular causa necrose muscular severa). A dose inicial de digoxina é de 0,01 a 0,015 mg/kg de peso vivo IV, seguida de uma dose de manutençãode 0,005 a 0,0075 mg/kg de peso vivo IV a cada 24 horas. Se a administração for oral, utilizar dose inicial de 0,07 mg/kg, seguida de dose de manutenção oral diária de 0,035 mg/kg. Nenhum regime de dosagem é absoluto, e a dose pode necessitar de ajuste com base na resposta, evidência de toxicidade ou medindo a concentração plasmática de digoxina. Se os animais tratados não estiverem comendo, realizar administração oral de 30g de KCl e efetuar monitoramento das concentrações séricas de potássio, porque os efeitos tóxicos da digoxina são afetados pela concentração sérica de potássio. Neoplasias cardíacas Neoplasia primária no coração é extremamente rara, e as secundárias oriundas de metástase ocorrem com pouca frequência. Tumores primários descritos são adenoma aórtico, fibrossarcoma cardíaco, mesotelioma pericardial e rabdomiossarcoma. Entre os tumores metastáticos, relatam-se linfossarcoma, melanoma, hemangiossarcoma, carcinoma embrionário testicular, carcinoma de células escamosas e lipoma. Angiomas e tumores vasoformativos benignos podem ocorrer e obstruir o fluxo sanguíneo, produzindo insuficiência cardíaca. Pericardite A causa da inflamação do pericárdio pode ser infecciosa ou traumática. Na maioria dos casos de pericardite em cavalos, não há um agente causador isolado, sendo geralmente associado a doenças no trato respiratório superior ou inferior. Os principais agentes envolvidos são Streptococcus spp., Corynebacterium pseudotuberculosis e Actinobacillus equuli, podendo haver associação com o herpes vírus EHV-1 . Os sinais clínicos iniciam com dor, relutância em se movimentar, abdução dos cotovelos e temperatura corporal elevada. Sinais associados de pleurite, pneumonia ou peritonite podem estar presentes. Dependendo da bactéria 30 UNIDADE I │ SISTEMA CARDIOVASCULAR presente, a frequência cardíaca é marcadamente aumentada e ocorre toxemia grave. A auscultação revela fricção sonora, seguida de abafamento dos sons cardíacos. Ocorre congestão venosa, diminuição da pressão de pulso e, por fim, insuficiência cardíaca congestiva. Exames clínicos podem incluir pericardiocentese, ecocardiografia e radiografia. A necropsia revela inflamação, fibrina e fluido dentro do saco pericárdico. O tratamento é feito por antimicrobianos com base na cultura do líquido pericárdico. Caso não seja possível realizar cultura bacteriana, uma combinação de penicilina com gentamicina garante uma boa cobertura antibiótica. Drenagem do líquido contido no pericárdio e lavagem abundante com solução de NaCl a 0,9% aquecida também são indicadas por reduzirem a pressão sobre o coração. Realizar tratamento de suporte. O prognóstico é ruim. Persistência de ducto arterioso Entre os defeitos congênitos mais comuns em equinos, a persistência de ducto arterioso resulta de uma falha no fechamento do ducto arterior após o nascimento. O ducto arterioso é um vaso fetal que conecta a artéria pulmonar à aorta descendente durante a vida fetal. Clinicamente, sopros cardíacos associados a um ducto arterioso patente podem ser ouvidos em potros normais até 5 dias após o parto. O esperado é que o ducto se feche 2 ou 3 dias após o nascimento. Em potros que o ducto persiste, é possível realizar a correção cirúrgica. Púrpura hemorrágica Refere-se à deposição de complexos imunes nas paredes dos capilares com subsequente vasculite e extravasamento do plasma. É uma doença aguda e não contagiosa. Frequentemente associada com doença do trato respiratório, especialmente com infecção por S. equi. Os sinais clínicos incluem inchaços de cabeça, membros e corpo, que geralmente são assimétricos, frios e não dolorosos à palpação. Os inchaços podem aparecer de repente ou se desenvolverem ao longo de vários dias. Taquicardia e taquipnéia são sinais característicos. Petéquias estão presentes nas mucosas superficiais. O animal apresenta-se deprimido e com apetite reduzido, se não ausente. Em 60% dos casos, a temperatura está elevada. A pele dos membros fica fraca, podendo esfolar e formar feridas. 31 SISTEMA CARDIOVASCULAR │ UNIDADE I O curso da doença é de 1 a 2 semanas e é comum acabar em morte. O diagnóstico definitivo é por meio de histopatologia de pele. O tratamento ocorre por meio de corticosteroides (como dexametasona) e antibióticos, além de cuidados de suporte. Pode-se utilizar dexametasona (0,05– 0,2 mg/kg, IV ou IM a cada 24 horas) ou prednisolona (0,5 a 1 mg/kg, IV ou IM a cada 24 horas), porém ressalva-se que a prednisolona pode não ser tão eficaz quanto a dexametasona. A dose de corticosteroide pode ser gradualmente reduzida à medida que os sinais clínicos regridem e a droga pode ser dada oralmente. AINEs como fenilbutazona 2,2 mg/kg por via oral ou IV a cada 12 horas, ou flunixin meglumine 1,1 mg/kg por via oral ou IV a cada 12 horas, reduzem a inflamação e fornecem alguma analgesia. Pela relação com S. equi, os cavalos afetados por púrpura geralmente são tratados também com penicilina G (20.000 UI/kg, por via intramuscular a cada 12 horas) ou penicilina potássica G (20.000 UI/kg, IV a cada 6 horas) até os sinais clínicos desaparecerem. O tratamento com antibióticos pode ser estendido por até 20 dias. Cuidados de suporte incluem bandagem de membros inchados, cuidados de feridas, hidroterapia e administração de fluidos IV. Inchaço de cabeça e faringe podem necessitar de colocação de sonda nasogástrica para permitir alimentação enteral de cavalos disfágicos. Angústia respiratória pode se desenvolver muito rapidamente, e traqueotomia de emergência pode ser necessária para aliviar o desconforto respiratório e prevenir asfixia. Taquicardia ventricular A taquicardia ventricular pode produzir uma frequência cardíaca regular ou uma frequência e ritmo cardíacos irregulares. A taquicardia ventricular pode se manifestar poruma irregularidade grosseira no ritmo. Essa anormalidade é facilmente negligenciada clinicamente, mas deve ser suspeitada em qualquer cavalo em que a frequência cardíaca exceda 90 batimentos por minuto, sendo que é frequentemente a causa do problema cardíaco quando a frequência está acima de 120 batimentos/min. A taquicardia ventricular também deve ser suspeitada quando a frequência cardíaca é maior do que a esperada pela condição clínica do animal. O diagnóstico também é confirmado por eletrocardiograma, que revela impulsos extrassistólicos intercalados com complexos normais, podendo haver fusão de ambos os batimentos. A detecção de taquicardia ventricular por eletrocardiograma é evidência de doença cardíaca grave e geralmente vem acompanhada por sinais clínicos de insuficiência cardíaca aguda. 32 UNIDADE I │ SISTEMA CARDIOVASCULAR A origem da taquicardia ventricular pode ser de miocardite primária, cardiomiopatia nutricional ou neoplasia miocárdica, ou ainda ser secundária a doença valvular e isquemia miocárdica. Arritmias ventriculares são comuns em certas intoxicações por plantas e outras intoxicações, em distúrbios graves de eletrólitos e equilíbrio ácido-base, bem como em estágios finais de insuficiência cardíaca. Se não for corrigida, a taquicardia ventricular pode levar a fibrilação ventricular e morte. Frequência cardíaca superior a 120 batimentos/min em repouso requer tratamento imediato. Frequentemente, a terapia antiarrítmica específica é indicada durante o período em que a causa principal está sendo corrigida. A lidocaína é a droga de primeira escolha para o tratamento de arritmias ventriculares. Administra-se lidocaína a 2% em bolus IV a 0,5 a 1,0 mg/kg de peso corporal, a cada 5 minutos, em um total de quatro tratamentos (dose total 2-4 mg/kg PV). Um protocolo de tratamento alternativo é a administração IV de lidocaína a 2% a 0,6 mg/kg em 15 minutos ou uma infusão IV em velocidade constante a 0,05 (mg/kg) / min. Entre as vantagens da lidocaína está a sua baixa toxicidade cardiovascular, e entre as desvantagens encontra-se a sua curta duração (meia-vida de 40 minutos).O sinal inicial mais comum de toxicidade são as fasciculações musculares. Rápido piscar de olhos, excitação, sudorese e convulsões ocorrem em intoxicações com doses mais altas. Sulfato de quinidina é o fármaco de segunda escolha para uso em equinos. Uma dose inicial de 20 mg/kg é administrada por via oral, seguida por uma dose de 10 mg/kg, administrada a cada 8 horas. A fenitoína sódica é uma alternativa e tem sido eficaz no tratamento de arritmias ventriculares em equinos. O protocolo de fenitoína requer uma dose oral inicial de 20 mg/kg de PV seguida por 3 doses doses orais de manutenção de 10 a 15 mg/kg de PV a cada 12 horas. A vantagem da fenitoína é a sua longa duração de ação, e a desvantagem é a longa duração para começar a fazer efeito (2 a 6 horas). A gravidade da taquicardia ventricular é aumentada por fatores que aumentam o tônus simpático e, portanto, os animais afetados devem ser mantidos em um ambiente calmo. Trombose arterial Arterite que leva à formação de trombo provoca isquemia dos tecidos supridos pela artéria afetada. Lesão no endotélio vascular, alteração no fluxo sanguíneo normal e 33 SISTEMA CARDIOVASCULAR │ UNIDADE I alterações de coagulação predispõem à trombose. Parasitas também podem estar envolvidos na patogenia da doença. É comum ocorrer a ruptura da aorta em cavalo Friesian devido ao trombo na artéria. É comum a formação de trombos na artéria aortoilíaca, sendo mais frequente em cavalos de corrida. É uma doença de cavalos com mais de três anos, que envolve um, ou até mesmo os dois membros posteriores, levando à isquemia desses membros. Os sinais iniciam com claudicação durante o exercício e evoluem para fraqueza do membro acometido, que se torna frio. A dor é grande, fazendo o animal entrar em decúbito. Os achados clínicos da trombose arterial baseiam-se na função reduzida ou necrose isquêmica dos órgão afetados pela obstrução, porém, esses só aparecem quando o trombo compromete mais de 75% da irrigação sanguínea. Pode ocorrer hemorragia aguda em casos de ruptura da artéria. A patologia clínica indica leucocitose, hiperfibrinogenemia e concentrações elevadasde enzimas musculares no soro são vistas em alguns casos. O exame de ultrassonografia é útil para o diagnóstico. A necropsia revela trombose, lesões de embolia, isquemia e necrose das regiões afetadas. Quando ocorre ruptura arterial, visualiza-se a hemorragia. O tratamento pode ser feito por enzimas fibrinolíticas ou remoção cirúrgica do trombo. O uso de anticoagulantes pode ajudar a impedir a formação de novos trombos. Um exemplo é o uso de varfarina (0,018 mg/kg por via oral a cada 24 horas). Ivermectina e fenbendazol são comumente administrados em cavalos para tratar trombos causados por S. vulgaris. Um programa gradativo e crescente de exercício pode ajudar a melhorar a circulação. Trombose venosa O desenvolvimento de trombos nas veias pode resultar em obstrução local na drenagem venosa, na liberação de êmbolos que se alojam nos pulmões, fígado ou outros órgãos e no desenvolvimento de septicemia ou de endocardite. A tromboflebite é a inflamação da parede da veia acompanhada da presença de trombose. A tromboflebite tipicamente envolve a clássica tríade de trauma no vaso sanguíneo, estase do fluxo sanguíneo e estado hipercoagulável. A veia jugular é mais frequentemente afetada em animais de grande porte, porque é a veia geralmente usada para injeções IV e colocação de cateter. 34 UNIDADE I │ SISTEMA CARDIOVASCULAR Os sinais clínicos de trombose venosa são ingurgitamento da veia, dor à palpação e edema local. Pode ocorrer ruptura causando hemorragia seguida de morte. Se a trombose venosa for periférica em um membro, ela pode ser evidenciada por meio de claudicação e inchaço distal ao trombo. Enorme tromboembolismo pulmonar pode estar associado com taquipneia aguda, febre e colapso. Sinais de obstrução venosa local assimétrica são edema quente e doloroso ao toque. Veias com tromboflebite são geralmente firmes e resistem acompressão. Exame ultrassonográfico auxilia no diagnóstico. Cultura bacteriológica deve ser tentada, de preferência, a partir da ponta do cateter removido. Na necropsia, o vaso obstruído e o trombo geralmente são de fácil localização pela situação de edema e de hemorragia local. O tratamento é parenteral com agentes antimicrobianos, e o uso de compressas quentes sobre as veias externas ajuda na drenagem do material purulento. Opção para as compressas quentes é o tratamento tópico com antiinflamatório a 50% dimetil sulfóxido. Cateteres devem ser imediatamente removidos. Se a trombose venosa for extensa, utilizar o mesmo tratamento para trombose arterial. Exames ultrassonográficos seriados são muito úteis no monitoramento da recanalização da veia trombosada. O resultado em longo prazo da tromboflebite é variável. A veia geralmente se torna recanalizada e vários graus de fluxo sanguíneo são restabelecidos. No entanto, o trombo pode fibrosar sem recanalização, restringindo o retorno venoso e causando o desenvolvimento de circulação colateral. 35 UNIDADE IISISTEMA REPRODUTOR FEMININO Nesta unidade, falaremos do aparelho reprodutor da égua e as principais enfermidades que acometem os genitais das fêmeas. Iniciaremos nosso estudo pela anatofisiologia normal do sistema reprodutivo, para depois avançarmos para as patologias que acomentem esses órgãos. CAPÍTULO 1 Anatofisiologia do sistema reprodutor feminino Os órgãos femininos da reprodução são compostos de ovários, ovidutos, útero, cérvix uterina, vagina e genitália externa. O vestíbulo, os lábios vulvares, o clitóris e as glândulas vestibulares constituem a genitália externa. O ovário tem duas funções principais: a produção cíclica de oócitos fertilizáveis e a produção de hormônios esteroides em proporções balanceadas. Esses hormônios atuamno desenvolvimento do trato genital e facilitam a migração de embriões nas fases iniciais do seu desenvolvimento, incluindo a implantação no útero. Os ovários são os principais produtores de hormônios esteroides, embora as adrenais e a placenta também secretem certa quantidade desses hormônios. A atividade secretora de hormônios esteroides pelas gônadas está sob controle endócrino da hipófise anterior. Os ovários da égua têm formato de feijão e medem cerca de 7 a 8 centímetros de comprimento por 3 a 4 centímetros de espessura. O peso das gônadas femininas giram ao redor de 70 a 80 gramas. Entretanto, o tamanho varia muito entre as éguas e normalmente são maiores em fêmeas jovens do que em éguas idosas. Comumente, um ovário é maior que o outro dentro do próprio animal. Além disso, o ovário muda de forma e tamanho a depender da fase do ciclo estral em que a égua se encontra. 36 UNIDADE II │ SISTEMA REPRODUTOR FEMININO Durante a vida fetal, o tecido cortical do ovário reveste totalmente a porção medular. Durante a vida neonatal, o tecido cortical se torna confinado na região central e é praticamente circundado pelo tecido medular. Por conta disso, os folículos só podem ovular na superfície do ovário adjacente ao tecido cortical (“fossa de ovulação”). Essa inversão das regiões corticais e medular que ocorre no início do desenvolvimento da potra, também é responsável pelo formato de “feijão” do ovário equino. O epitélio superficial do ovário é formado por uma camada de epitélio frouxo, conhecido incorretamente como epitélio germinativo. A túnica albugínea é densa, sendo constituída por tecido conjuntivo fibroso cobrindo todo o ovário. O córtex ovariano (que na égua está no interior do ovário) contém vários folículos primários, com oócitos em estágio quiescente, e poucos folículos grandes. Durante cada ciclo estral, um número variável de folículos passa por um rápido crescimento e desenvolvimento, culminando no processo da ovulação. A medula do ovário (que é externa na égua) é formada por tecido conjuntivo frouxo contendo nervos, vasos linfáticos e sanguíneos tortuosos de parede fina, fibras colágenas e elásticas e fibroblastos. O estroma ovariano é pobremente diferenciado e possui células parecidas com as embrionárias mesenquimatosas, capazes de sofrer alterações morfológicas complexas durante a vida reprodutiva. Células musculares lisas estão presentes em todo o ovário, especialmente no estroma cortical. As células mióides ovarianas são similares às células musculares lisas de outros tecidos. Grande número de microfilamentos está disposto em feixes característicos. Células musculares lisas e elementos nervosos estão diretamente envolvidos na ovulação, uma vez que as células musculares lisas encontram-se nas regiões perifoliculares e executam a “compressão do folículo” para extrusão do oócito. Os ovários da égua estão situados na região sublombar pela parte cranial do ligamento largo do útero e são, normalmente, ventrais à quarta ou quinta vértebras lombares. Essas gônadas estão frequentemente em contato com a parede lombar do abdômen. A distância média entre os ovários e o orifício vulvar é na faixa de 50 a 55 centímetros em uma égua de tamanho médio. O ovário esquerdo é geralmente mais caudal que o direito, como resultado da posição mais caudal do rim esquerdo durante o desenvolvimento. O ligamento largo que “segura” os ovários permite a mobilidade das gônadas, o que faz com que a posição dos ovários seja muito inconstante. Cada ovário 37 SISTEMA REPRODUTOR FEMININO │ UNIDADE II pode ser desviado transversalmente em qualquer direção até o limite integral permitido pelo mesovário, que é a parte do ligamento largo que se conecta com as gônadas da égua. As superfícies medial e lateral podem estar dorsal e ventral ou vice-versa, dependendo da deflecção do ligamento largo. Quanto às variações no eixo longitudinal, o ovário direito costuma estar 15 centímetros caudal ao rim correspondente, porém a distância entre eles pode variar entre 5 e 30 centímetros. O mesmo acontece com o ovário esquerdo, porém este costuma estar a 10 centímetros caudais do rim esquerdo. Os ovários também podem estar em contato com a extremidade do corno uterino correspondente ou até 5 centímetros afastados dele. O mesovário, que é a porção do ligamento largo do útero onde se insere os ovários, tem aproximadamente 8 a 10 centímetros de largura medidos do ovário até a inserção parietal. Uma faixa de músculo liso presente entre as camadas do ligamento largo e que conecta a extremidade uterina do ovário à extremidade do corno uterino ipsilateral é chamada de ligamento próprio do ovário. A maior parte da superfície do ovário é coberta pelo peritônio, sendo que é a borda inserida por onde penetram vasos e nervos, em que a cobertura peritoneal está ausente. Essa área da borda inserida, desprovida de peritônio, é chamada de hilo do ovário, apesar de não ser uma depressão. A fossa de ovulação é coberta por uma camada de células poligonais curtas, que é um remanescente do epitélio germinativo primitivo. O estroma do ovário é uma rede de tecido conjuntivo. Nas malhas do estroma, há folículos vesiculosos ovarianos contendo oócitos em vários estágios de desenvolvimento. A quantidade desses folículos é maior nas fêmeas jovens. Os oócitos imaturos estão circundados por uma camada de células foliculares, enquanto os oócitos mais avançados no desenvolvimento ficam circundados por cinco a oito camadas de células foliculares, formando o estrato granuloso. Esses oócitos mais maduros são revestidos, externamente ao estrato granuloso, por uma condensação do estroma que recebe o nome de teca folicular. Ao longo do desenvolvimento do oócito, vai ocorrendo acúmulo de líquido folicular entre as células foliculares. À medida que o acúmulo de líquido folicular separa grande parte da camada granulosa do oócito, passa-se a denominar as células que envolvem o oócito de células do cumulus, e o pedúnculo que conecta o complexo cumulus-oócito ao resto da zona granulosa (granulosa mural) de cumulus oophorus. As camadas mais internas das células do cumulus, aquelas que envolvem o oócito, formam a chamada corona radiata. 38 UNIDADE II │ SISTEMA REPRODUTOR FEMININO O crescimento dos folículos vesiculosos do ovário chega a ponto de se tornar visível ao olho humano, tais folículos revelam-se como vesículas com diâmetros que chegam a medir mais de três centímetros. Os folículos maduros, devido ao seu tamanho, podem se projetar da superfície da gônada. Os folículos se distribuem por todo o interior da glândula, e a zona vascular é superficial (figura 2). O folículo é a estrutura ovariana que permite ao ovário desenvolver suas duas funções, que são a gametogênese e a esteroidogênese. Figura 2. Representação esquemática de um ovário equino. Nervo vegetativo Artéria ovariana Mesovário Folículo terciário Fossa ovariana Folículo secundário Folículo primário Vaso linfático Veia ovariana Corpo lúteo Fonte: König e Liebich (2014). O crescimento folicular é classificado em folículo primordial, primário, secundário, terciário e atrésico, conforme as características morfológicas. O folículo primordial é aquele cujo ovócito primário está envolvido por uma única camada de células epiteliais achatadas. Esse folículo primordial originou-se durante o desenvolvimento fetal da potra, quando o hipotálamo secreta o hormônio liberador de gonadotrofinas (GnRH), que estimula a secreção das gonadotrofinas (hormônio folículo estimulante, FSH, e hormônio luteinizante, LH). As gonadotrofinas agem no ovário estimulando as oogônias a multiplicarem-se por mitose e, em seguida, sofrem a primeira divisão meiótica, formando vários milhões de oócitos I. A secreção hormonal regride temporariamente, e os níveis de gonadotrofinas permanecem baixos até o início da puberdade, mantendo o oócito I estacionado na prófase I. 39 SISTEMA REPRODUTOR FEMININO │ UNIDADE
Compartilhar