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Tópicos de atuação profissional

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A disciplina Tópicos de Atuação Profissional serve para a sistematização do conhecimento teórico adquirido no decorrer do curso, aliando as perspectivas da prática profissional do Licenciado em Letras – Língua Portuguesa e Língua Inglesa ou Língua Portuguesa e Língua Espanhola. A proposta é o favorecimento da síntese dos conteúdos estudados que propicie o entendimento da profissão inserida na dinâmica da sociedade, com base no estudo e na reflexão sobre os conhecimentos referentes a aspectos da realidade social e da ação profissional.
Essa atuação pode referir-se à atividade docente com os alunos do Ensino Fundamental ou Médio, bem como à de crítico literário, pesquisador, resenhista, tradutor, agente literário e revisor de textos.
Sendo assim, o objetivo geral é relacionar os conhecimentos adquiridos na área de língua materna e língua estrangeira às possíveis e variadas profissões dentro da nossa área. Quanto aos objetivos específicos, são eles: realizar didáticas na escola de ensino de língua materna e língua estrangeira, realizar atividades de crítica literária, de tradução e de revisão de textos.
Esta disciplina delimita-se às possibilidades de atuação profissional que o curso pode proporcionar ao graduando. Nesse sentido, nosso material  está dividido em oito partes, abrangendo as profissões da nossa área.
As três primeiras partes tratam de:
· O  trabalho docente – O graduando pode exercer sua profissão na área da docência, sendo professor no ensino básico em Língua Portuguesa e/ou Língua Estrangeira (Inglesa).
O grande foco do curso de Letras é a docência e, por isso, há mais partes voltadas ao trabalho docente, havendo necessidade de discorrer sobre o papel da educação, do professor e de determinadas situações, tais como a inclusão.
Além dos primeiros momentos de reflexão, discutimos o ensino básico, em especial o ensino de língua(s) e o de literatura. No caso do ensino de língua, reforço a proposta atual de ensino, que precisa ser voltado para o texto e não para a gramática descontextualizada. Sobre literatura, existe proposta atual para abarcando tanto o ensino fundamental (em que não há sistematização de ensino de leitura literária) quanto o ensino médio.
O graduando que não visa à docência tem outros campos de atuação. Assim, este material apresenta outras possibilidades:
·  O trabalho da resenha e da crítica – O graduando pode especializar-se e tornar-se um crítico literário ou vincular-se a uma revista, ou jornal, ou site, e tornar-se resenhista.
O graduando pode dar continuidade aos seus estudos, especializando-se em Literatura e tornar-se um crítico literário, estudando, analisando e publicando seus textos sobre obras literárias, com o aval de uma instituição acadêmica.
Ele pode, também, sem necessariamente dar continuidade aos seus estudos, vincular-se a uma mídia (revista, jornal, site...) e tornar-se um resenhista ao escrever sobre os últimos lançamentos livrescos.
A outra parte deste material trata de:
· O trabalho da escrita – Nesse caso, o graduando já é ou desenvolve durante o curso seu talento para ser escritor.
Muitos graduandos ingressam-se no curso de Letras, porque gostam de ler e produzir textos literários. O curso colabora com conhecimentos sobre língua e literatura para o desenvolvimento do aluno como escritor.
Aqui, a produção escrita é abordada de forma geral, uma vez que o graduando pode produzir, por exemplo, resenha e textos acadêmicos (em sua continuidade formativa) e abordada, também, em sua forma criativa, para mostrar ao graduando a possibilidade de ser escritor literário.
· O trabalho da revisão – O graduando pode tornar-se revisor de texto, incluindo nessa função a do editor.
O graduando pode tornar-se revisor de texto ao corrigir trabalhos acadêmicos, por exemplo, e trabalhar informalmente na área, ou trabalhar em uma empresa, fazendo, justamente, revisão dos textos internos.
·  O trabalho da tradução – O graduando pode tornar-se tradutor, incluindo nessa função a do intérprete, dependendo de seu conhecimento e interesse na língua inglesa ou espanhola.
· O trabalho da pesquisa – O graduando, com a finalização do bacharelado/licenciatura, pode dar continuidade aos seus estudos em cursos de Especialização e em Mestrado/Doutorado e tornar-se um pesquisador.
A área da pesquisa serve para a melhoria de sua atuação em sala de aula, bem como para abrir mais um caminho na área profissional: ser pesquisador com aval de uma instituição acadêmica.
De forma geral, esta disciplina serve para mostrar a diversidade profissional de um graduado em Letras. Afinal, nada impede um profissional na nossa área exercer mais de uma função ao mesmo tempo. Você, caro aluno, poderá exercer, por exemplo, a função docente e a de revisor em concomitância. Dependerá de seus conhecimentos na área, dos planos traçados e, também, da sua disposição.
A disciplina Tópicos de Atuação Profissional proporciona aos formandos uma oportunidade para visualizar de forma mais ampla as possibilidades de campo de trabalho.
O TRABALHO DA DOCÊNCIA: ENSINO DE LÍNGUA
 
 
 
 
1. Método, língua & CIA
 
 
Você sabe quais são as cinco coisas que todo professor de português tem a obrigação de saber? Na concepção de Oliveira (2010), são:
1.    O que é ensinar;
2.    O que é método de ensino;
3.    O que é língua;
4.    O que significa saber português;
5.    A razão pela qual se ensina português a brasileiros.
Frente à pergunta “O que é ensinar?”, é preciso conhecer as concepções de aprendizagem, que são três: inatista, behaviorista e interacionista.
O inatismo parte do pressuposto de que após o nascimento da pessoa os eventos ocorridos com ela não interferem no seu desenvolvimento, pois o ser humano já nasce com determinadas características, as quais não mudam no decorrer da vida do indivíduo. O ambiente social, por exemplo, não exerce influência sobre a pessoa, e, nessa perspectiva determinista, as pessoas não têm chance de mudança.
Seguindo essa concepção, o papel do professor não tem importância, porque o professor, assim como qualquer elemento posterior ao nascimento da pessoa, não exercerá nenhuma influência no aluno no desencadeamento do processo de aprendizagem. Nessa mesma perspectiva, os alunos que são bem sucedidos na vida acadêmica devem à sorte de nascer com o aparato necessário que permite o desenvolvimento de sua aprendizagem; os que não são bem sucedidos não trazem elementos necessários de seu nascimento para aprenderem.
O inatismo passou a ser questionado por psicólogos e educadores, fazendo surgir o behaviorismo. De acordo com essa nova concepção, popularizada por Skinner, o ser humano aprende por meio de estímulos, repostas, reforço positivo (recompensa) e reforço negativo (punição). Esse mecanismo leva o aprendiz a adquirir um conjunto de bons hábitos, que contribuem para o sucesso na aprendizagem, ou de maus hábitos, que contribuem para o insucesso na aprendizagem. O meio ambiente passa a ser, então, o único elemento responsável por esse processo.
Nessa concepção, se o ser humano aprende exclusivamente com base em estímulos do meio ambiente, a pessoa é um ser passivo perante o processo de aprendizagem, pois necessita de algo ou alguém que origine os estímulos. O professor passa ser aquele que sabe tudo e preenche a mente vazia do aluno, metaforizada pelo termo latino de tabula rasa, uma superfície vazia a ser preenchida. Cabe ao aluno repetir o que o professor disser e fazer.
Enfim, parte-se do pressuposto de que os alunos não sabem nada, cabendo ao professor transferir conhecimentos para eles; o ensino, por consequência, é sinônimo de transferir conhecimentos.
No entanto, se fosse apenas uma transferência de conhecimentos, todos os quarenta alunos em uma sala de aula teriam seu aprendizado uniforme, uma vez que o livro didático, as aulas e o professor são os mesmos para todos. Stephen Hawking, por exemplo, poderia vir ao Brasil, dar aulas em uma escola ou universidade e os alunos sairiam das aulas com todo o conhecimento construído por esse grande físico sobre os buracos negros.
Contudo, aaprendizagem não ocorre de maneira uniforme, porque simplesmente os alunos são pessoas diferentes, com história de vida distinta. O estudante é o grande responsável pela construção dos seus conhecimentos, podendo, obviamente, optar por aprender ou não aprender algo. Mas se decide participar do processo, assume papel cognitivo ativo.
Considerando o papel ativo do aluno no processo de aprendizagem, é disseminada terceira perspectiva: o interacionismo, o que vê o aprendizado como um processo de interação.
Esse processo envolve três fatores: o aprendiz, os elementos de sua natureza biológica e o meio sociocultural em que ele está inserido.
Ensinar passa a significar facilitar a aprendizagem dos alunos e entender o aprendizado como fenômeno sociocultural. Cabe ao professor propiciar ambiente e meios necessários aos alunos para que eles construam seus conhecimentos. O professor precisa em sua prática pedagógica:
·         criar uma atmosfera afetiva (emocional e psicológica) favorável na sala de aula para facilitar o aprendizado dos alunos. Isso significa que o professor não assume a atitude de falsa erudição, de arrogância, do sabe-tudo, que o leva a menosprezar os alunos;
·         dar espaço para a voz do aluno, para que este possa constituir-se como sujeito de sua aprendizagem. Isso conduz à formação de uma consciência crítica, que o professor precisa fomentar;
·         sugerir estratégias de aprendizagem;
·         recomendar leituras de textos e livros que contribuem para a construção dos conhecimentos dos alunos;
·         continuar estudando, participando de congressos e encontros, lendo, para se manter informado e, assim, estar preparado para fornecer informações atualizadas aos alunos e repensar suas crenças teóricas.
 
Frente à pergunta “O que é método de ensino?”, o professor precisa ter consciência de que ensinar requer um método. Entre outras definições viáveis, método é conjunto de princípios teóricos, princípios organizacionais e ações práticas norteador da estruturação de um curso, bem como envolve planejamento das aulas, avaliação da aprendizagem e a escolha de materiais didáticos. O conceito de método, segundo Richards e Rodgers (OLIVEIRA: 2010), constitui-se de três partes: abordagem, projeto e procedimento.
Abordagem é formada por uma teoria da língua e dá base para o professor tomar decisões pedagógicas, selecionar materiais didáticos e avaliar políticas educacionais. O projeto, por sua vez, constitui-se no delineamento organizacional do curso ou da disciplina. No projeto (ou plano de disciplina), são explicitados os objetivos da disciplina, o conteúdo, os tipos de atividades em aula, os papeis que alunos, professores e materiais didáticos desempenham no processo de ensino e aprendizagem. O procedimento é o conjunto de ações práticas implementadas no projeto, esclarecidos as técnicas didáticas, as práticas docentes e os comportamentos esperados dos alunos.  
Frente à pergunta “O que é língua?”, exige do professor saber que conceito de língua ele adota, porque o conceito determina a maneira como ele ensina português. Temos duas grandes correntes teóricas que polarizam as discussões acerca do conceito de língua: estruturalista e interacionista.
Para a concepção estruturalista, a língua é um sistema formado por estruturas gramaticais inter-relacionadas. O princípio teórico dessa corrente é a exclusão do uso linguístico e, por consequência, do sujeito usuário da língua, bem como a exclusão das variações linguísticas provocadas pelos sujeitos.
Sem sujeito não existe língua nem uso da língua. Um professor não pode ignorar esses elementos quando se trata de ensino de língua, pois torna o ensino problemático: as estruturas gramaticais são abordadas, mas não se fala sobre os usos que se fazem delas nem se trata das variações linguísticas de forma racional, tranquila e sem preconceito.
A outra corrente teórica – interacionista ou sociointeracionista – concebe a língua como um meio de interação sociocultural, que obviamente está estreitamente ligada à concepção interacionista de aprendizagem. Interação pressupõe a presença do sujeito que fala ou escreve, do sujeito que ouve ou lê, das especificidades culturais desses sujeitos, do contexto da produção e da recepção dos textos.
Nessa perspectiva, o professor de língua deve orientar seu trabalho em sala de aula por uma perspectiva semântico-pragmática, que relaciona os elementos gramaticais aos usos da língua e aos significados que esses elementos ajudam a produzir. O eixo em torno do qual as aulas de língua giram é a razão de ser da língua: o texto.
Enfim, a língua precisa ser concebida como um conjunto de estruturas gramaticais e lexicais à disposição dos falantes-ouvintes e dos escritores-leitores para que eles possam interagir socialmente em encontros culturalmente marcados.
Frente à pergunta “O que significa saber português?”, o professor de língua precisa ter em mente que todos os brasileiros sabem português e, portanto, todos os seus alunos (brasileiros) conhecem a língua portuguesa.
Quando uma pessoa, inclusive escolarizada, declara não conhecer português, quer, na verdade, declarar seu desconhecimento das regras gramaticais normativas.
Saber a língua portuguesa
X
Dominar a gramática normativa
 
 
Saber português significa:
·         ter domínio inconsciente das estruturas gramaticais da língua;
·         ter domínio inconsciente das regras que regem essas estruturas;
·         ter domínio do léxico da língua;
·         ter domínio de normas socioculturais de comportamento que possibilitam a interação com o outro.
Frente à pergunta “Para que ensinar português a brasileiros?”, o professor precisa ter consciência de função da sua disciplina/curso de língua, uma vez que todos os brasileiros conhecem a própria língua e todo estudante brasileiro que vai à escola sabe português.
Ensinar português serve para mostrar ao aluno como interagir em situação comunicativa ainda não dominada por ele. Por exemplo, o aluno pode aprender como se comportar linguisticamente em uma entrevista de emprego, saber redigir um currículo ou produzir um anúncio para vender filhotes de sua cachorra perdigueira.
Ajudar o aluno a aprender a se comportar linguisticamente, desenvolvendo sua competência comunicativa, em diversas situações de interação social é o objetivo principal das aulas de língua.
Competência comunicativa, proposta por Hymes, abrange quatro aspectos: possibilidade formal, exequibilidade, adequação contextual e possibilidade de ocorrência.
Possibilidade formal corresponde à gramaticalidade, ou seja, à boa formação da sentença, que segue as regras da língua. Nos exemplos,
“O porta está aberto” e
“Eu não estudaram a lição”,
não temos sentenças formalmente possíveis em português.
Exequibilidade é saber criar sentenças que não causem problemas no ato de comunicação por serem muito longas e muito complexas. Uma sentença longa demais, com muitos encaixes, pode ser formalmente possível, mas pode se tornar inexequível.
A competência comunicativa possui, também, uma parte sociocultural que estabelece regras para o uso das frases de acordo com o contexto em que eles se encontram. Trata-se do que Hymes chama de adequação. Mesmo que uma frase seja formalmente possível e exequível, ela tem de ser utilizada de acordo com o contexto social e cultural no qual ela é produzida; ela tem de ser adequada.
Por fim, o último aspecto importante do conceito de competência comunicativa: a possibilidade de ocorrência. Uma frase pode ser possível, exequível e adequada ao contexto e, mesmo assim, não ocorrer. Por exemplo, a sentença “Eu trouxe o faisão que Vossa Majestade pediu” é possível, exequível, adequada e pode realmente ocorrer se o falante for o mordomo da rainha da Inglaterra e estiver comunicando-lhe que fez o que foi solicitado. Se o falante for eu, a possibilidade de ocorrência dessa sentença é zero.
Fica clara a ideia, então, de que o conhecimento da língua só é útil se o indivíduo que o possui também tiver a habilidade de utilizá-lo em situações concretas.
A propostade competência comunicativa feita por Hymes tem adesão de professores/teóricos tanto para o ensino de língua materna quanto para o ensino de língua estrangeira.
 
 
2. Análise linguística no ensino básico
 
 
O ensino de gramática constitui um dos mais fortes pilares das aulas de português (e de línguas estrangeiras, de forma geral) e esse modelo de ensino passou a ser questionado, uma vez que:
·         a ênfase à gramática não melhorou os resultados são insatisfatórios, pois as habilidades básicas de leitura e escrita não foram potencializadas, ficando estas, na verdade, em segundo plano;
·         a constatação de que a gramática normativa apresenta inconsistências teóricas. Por exemplo, a classificação do sujeito mistura aleatoriamente critérios semânticos, sintáticos e pragmáticos, além de não descrever adequadamente a norma-padrão contemporânea, já apontado por Oswald de Andrade no início do século XX:
Pronominais
Dê-me um cigarro
Diz a gramática
Do professor e do aluno
E do mulato sabido
Mas o bom negro e o bom branco
Da Nação Brasileira
Dizem todos os dias
Deixa disso camarada
Me dá um cigarro
ANDRADE, Oswald. Poesias reunidas. 5. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1978, p. 80.
 
Quando se trata de sala de aula, não há padrões inflexíveis nem modelos fixos de ensino; na verdade, o professor recorre a diversos caminhos teórico-metodológicos em sua prática cotidiana. Mesmo porque há muitos conflitos no processo de ensino-aprendizagem com os alunos a perguntar “Por que a gente tem de estudar isso?”, “Pra que serve a diferença entre complemento nominal e adjunto adnominal?”. O problema não é o questionamento, desejável para a aprendizagem, mas a ausência de respostas convincentes na grande maioria dos casos.
A escola não tem de formar gramáticos ou linguistas descritivistas, mas pessoas capazes de agir verbalmente de modo autônomo, seguro e eficaz, tendo em vista os propósitos das múltiplas situações de interação em que estejam engajadas. Por isso, surge a proposta da prática de análise linguística (AL) (BUNZEN; MENDONÇA: 2006).
O termo análise linguística denomina uma nova perspectiva de reflexão sobre o sistema linguístico e sobre os usos das línguas, com vistas ao tratamento escolar de fenômenos gramaticais, textuais e discursivos. Foi cunhado por Geraldi no artigo “Unidades básicas do ensino de português”, na coletânea O texto na sala de aula, lançado em 1984. AL explícita e sistemática é uma prática que nasceu na escola, sendo, portanto, parte dos eventos de letramento escolar.
AL não elimina a gramática das salas de aula, mesmo porque é impossível usar a língua ou refletir sobre ela sem gramática. A AL engloba os estudos gramaticais, mas em um paradigma diferente.
Numa perspectiva sociointeracionista de língua, AL constitui um dos três eixos básicos do ensino de língua, ao lado da leitura e da produção de textos. Os estudos dos fenômenos linguísticos em si mesmos perdem sentido, pois se considera que a seleção e o emprego de certos elementos e estratégias ocorrem em consonância com as condições de produção dos textos, de acordo com quem diz o que, para quem, com que propósito, em que gênero, em que suporte etc.
Para melhor compreensão das diferenças básicas entre ensino de gramática e AL, Márcia Mendonça (In: BUNZEN; MENDONÇA: 2006: 207) elaborou a tabela ilustrativa abaixo.
 
Tabela: Diferenças entre ensino de gramática e análise linguística
 
	Ensino de gramática
	Prática de análise linguística
	Concepção de língua como sistema, estrutura inflexível e invariável.
	Concepção de língua como ação interlocutiva situada, sujeita às interferências dos falantes.
	Fragmentação entre os eixos de ensino: as aulas de gramática não se relacionam com as de leitura e produção textual.
	Integração entre os eixos de ensino: a AL é ferramenta para a leitura e produção textual.
	Metodologia transmissiva, baseada na exposição dedutiva (do geral para o particular, isto é, das regras para o exemplo) + treinamento.
	Metodologia reflexiva, baseada na indução (observação dos casos particulares para a conclusão das regularidades/regras).
	Privilégio das habilidades metalinguísticas.
	Trabalho paralelo com habilidades metalinguísticas e epilinguísticas.
	Ênfase nos conteúdos gramaticais como objetos de ensino, abordados isoladamente e em sequência mais ou menos fixas.
	Ênfase nos usos como objetos de ensino (habilidades de leitura e escrita), que remetem a vários outros objetos de ensino (estruturais, textuais, discursivos, normativos), apresentados sempre que necessário.
	Centralidade da norma-padrão.
	Centralidade dos efeitos de sentido.
	Ausência de relação com as especificidades dos gêneros, uma vez que a análise é mais de cunho estrutural e, quando normativa, desconsidera o funcionamento desses gêneros nos contextos de interação verbal.
	Fusão com o trabalho com os gêneros, na medida em que contempla justamente a intersecção das condições de produção dos textos e as escolhas linguísticas.
	Unidades privilegiadas: a palavra, a frase e o período.
	Unidade privilegiada: o texto.
	Preferência pelos exercícios estruturais, de identificação e classificação de unidades/funções morfossintáticas e correção.
	Preferência por questões abertas e atividades de pesquisa, que exigem comparação e reflexão sobre adequação e efeitos de sentido.
 
Notamos que no lugar de classificação e identificação, a reflexão ganha espaço na proposta da AL. Com base na atividade linguística (leitura/escuta e produção oral e escrita) e epilinguísticas (comparar, transformar, reinventar, enfim refletir sobre construções e estratégias linguísticas e discursivas), os alunos familiarizam-se com os fatos da língua.
Quanto à organização das atividades de AL, Mendonça (In: BUNZEN; MENDONÇA: 2006: 209) apresenta três possibilidades válidas, mas que supõem metas distintas. Outras organizações podem ser pensadas.
 
Análise linguística na relação com os eixos de leitura e de produção
	Ordem das atividades
	objetivos
	Leitura
	Produção
escrita
	AL
	Reescrita
	Analisar a produção textual, para detectar os problemas e, então, decidir o que será objeto de AL na sala de aula.
	 
	
	
	
	
	
	
	
	
	USO
	REFLEXÃO
	“O ensino de gramática não deve ser visto como um fim em si mesmo, mas como um mecanismo para a mobilização de recursos úteis à implementação de outras competências, como a interativa e a textual” (proposta dos PCN, para desenvolver competências de leitura/ escuta e escrita).
	Leitura e
Escrita
	Produção
de textos
orais e
escritos
	 
AL
	Reescrita do texto oral
	
	 
	
	
	
	
	
	
	
	
	Leitura
e
escrita
	Produção de textos orais e escritos
	 
AL
	Reescrita do texto oral
	Analisar os gêneros lidos, para conhecer as suas características e, então, produzi-los, na proposta de Dolz, Noverraz e Schneuwly: segundo a qual se deve conhecer o gênero, lendo-o e analisando-o, para depois produzi-lo e, então, reelaborá-lo após (auto) avaliação, por meio de AL.
	 
	
	
	
	
	
	
	
	
 
Nessas três perspectivas, a AL constitui ferramenta, auxílio, para as práticas de leitura/escuta e de escrita. Mendonça (In: BUNZEN; MENDONÇA: 2006: 210-211) apresenta exemplo de como trabalhar em conformidade com AL.
 
Análise linguística e leitura
 
Leitura: ensino de gramática e análise linguística
 
	ENSINO DE GRAMÁTICA
	Objeto de ensino
	Estratégia mais usada
	Habilidade esperada
	Advérbios, locuções adverbiais e orações adverbiais
	Exposição de frases e períodos (ora inventados, ora retirados dos textos de leitura) para identificação e classificação dos termos.
Uso das explicações das gramáticas como texto didático de base para a abordagem do assunto.
	Identificar e classificar os termos em orações e períodos.
Transformar advérbios em locuções adverbiais.
Fazer a correspondência, em exercícios escolares, entre locuções adverbiais e advérbios, resultando, algumas vezes, em construções que não se equivalem pragmaticamente.
	Adjetivos, locuções adjetivas e orações adjetivas
	-Exposição de frases e períodos
(ora inventados, ora retirados dos textos deleitura) para identificação e classificação dos termos.
-Exposição de listas de adjetivos relativos a certas locuções, a serem memorizadas.
-Uso das explicações das gramáticas de base para a abordagem do assunto.
	Identificar e classificar os termos em orações e períodos.
-Transformar adjetivos em locuções adjetivas.
-Conhecer e reproduzir, em exercícios escolares, a correspondência entre locuções adjetivas e adjetivos, geralmente de uso menos comum (de gelo = glacial; de chumbo = plúmbeo).
	ANÁLISE LINGÜÍSTICA
	Objeto de ensino
	Sugestão de estratégias
	Competência esperada
	Expressões adverbiais, indicadores de circunstâncias
	-Leitura e comparação de gêneros diversos; observação de casos particulares para se chegar a conclusões mais gerais.
Consulta a manuais, gramáticas e dicionários para ampliar as discussões e o próprio repertório de expressões etc.
	Perceber que:
-as circunstâncias podem ser sinalizadas – por meio dos adjuntos adverbiais e de outros recursos construindo-se expectativas de leitura e matizes de sentido relevantes para a compreensão global (ex.: o uso de Na verdade, indicando a posição do locutor);
-em diferentes gêneros, há usos específicos desses recursos para atender a propósitos distintos (ex.: notícia e fábula).
	Processos de
adjetivação/ qualificação
	-Leitura e comparação de gêneros diversos; observação de casos particulares para se chegar a conclusões mais gerais.
-Consulta a manuais, gramáticas e dicionários para ampliar as discussões e o próprio repertório de expressões etc.
	Perceber que:
-a adjetivação pode ser construída por meio de várias estratégias e recursos, criando diferentes efeitos de sentido;
-gêneros diferentes admitem certas adjetivações e não outras, como as notícias com descrição mais “contidas” que uma fábula ou um artigo de opinião;
-os processos de adjetivação/ qualificação, incluídos numa descrição, podem estar além do uso dos adjetivos, revelando-se na escolha dos verbos (esbravejou no lugar de afirmou, por exemplo).
 
No poema a seguir, o processo de adjetivação é a chave para a construção da representação do eu lírico feminino:
 
 
Estas mãos
Olha para estas mãos
de mulher roceira,
esforçadas mãos cavouqueiras.
Pesadas, de falanges curtas,
sem trato e sem carinho.
Ossudas e grosseiras.
Mãos que jamais calçaram luvas.
Nunca para elas o brilho dos anéis.
Minha pequenina aliança.
Um dia o chamado heroico emocionante:
- Dei Ouro para o Bem de São Paulo.
Mãos que varreram e cozinharam.
Lavaram e estenderam
roupas nos varais.
Pouparam e remendaram.
Mãos domésticas e remendonas.
Íntimas da economia,
do arroz e do feijão
da sua casa.
Do tacho de cobre.
Da panela de barro.
Da acha de lenha.
Da cinza da fornalha.
Que encestavam o velho barreleiro
e faziam sabão.
Minhas mãos doceiras...
Jamais ociosas.
Fecundas. Imensas e ocupadas.
Mãos laboriosas.
Abertas sempre para dar,
ajudar, unir e abençoar.
Mãos de semeador...
Afeitas à sementeira do trabalho.
Minhas mãos raízes
procurando a terra.
Semeando sempre.
Jamais para elas
os júbilos da colheita.
Mãos tenazes e obtusas,
feridas na remoção de pedras e tropeços,
quebrando as arestas da vida.
Mãos alavancas
na escava de construções inconclusas.
Mãos pequenas e curtas de mulher
que nunca encontrou nada na vida.
Caminheira de uma longa estrada.
Sempre a caminhar.
Sozinha a procurar
o ângulo prometido,
a pedra rejeitada.
CORALINA, Cora. Meu livro de cordel. Goiânia: Cultura Goiana, 1976, p. 59-60.
 
Pela ótica da AL, o objetivo de uma análise da leitura do poema é levar à reflexão sobre:
·         por que, no poema, a descrição das mãos é o mote para tematizar as características do eu lírico e os percalços de sua vida;
·         com que recursos essas descrições são realizadas.
Assim, podemos dizer que a AL é uma ferramenta importante nas aulas de literatura, pois contribui para desvelar traços da criação literária.
Vários outros aspectos são relevantes para a compreensão do texto e para o funcionamento do gênero nessa situação específica de interação.
 
 
3. Prática social e gênero
 
Os PCN dão continuidade a uma tradição já estabelecida na reflexão sobre o ensino de língua portuguesa na escola, segundo a qual a unidade mais importante de ensino é o texto, que não deve dar como pretexto para outras atividades de ensino ou sobre escrita, mas que se constitui em objeto de estudo, por si mesmo.
Estudar o texto em suas propriedades formais e estilísticas particulares é ver o texto como um exemplo de gênero do discurso. Afinal, os gêneros intermediam e integram as práticas às atividades de linguagem. Os gêneros são referências fundamentais para a construção das práticas de linguagem.
Na linha de Bakhtin, os gêneros do discurso apresentam três dimensões indissociáveis:
·         Os temas – conteúdos ideologicamente conformados – que se tornam comunicáveis por meio do gênero;
·         Os elementos das estruturas comunicativas e semióticas compartilhadas pelos textos pertencentes ao gênero (forma composicional);
·         As configurações específicas das unidades de linguagem, traços da posição enunciativa do locutor e da forma composicional (marcas linguísticas ou estilo). 
 
Os gêneros não podem ser compreendidos, produzidos ou conhecidos sem referência aos elementos de sua situação de produção. São elementos essenciais da situação social mais imediata os parceiros da interlocução, o locutor e o interlocutor, a que a palavra do locutor se dirige. São as relações sociais, institucionais e interpessoais dessa parceria, vistas com base no foco da apreciação valorativa do locutor, que determinam muitos aspectos temáticos, composicionais e estilísticos do texto ou discurso.
Ao tratar da produção de sentido, há uma extensão quase automática com a questão da leitura. Existe nessa correlação uma aproximação conceitual, uma vez que a produção de sentido reporta ao funcionamento da língua e a leitura representa uma estratégia possível para a produção de sentido. Além disso, a correlação se dá pelo fato de a leitura – por ser uma estratégia de leitura – ser também a atividade de um sujeito que precisa mobilizar recursos físicos, mentais, cognitivos, linguísticos, sociais para dar conta da compreensão do texto.
A produção de sentido desdobra-se em processos e produtos. Os processos relacionam-se com os procedimentos linguísticos, que representam as condições linguísticas para a produção. Tais condições, por sua vez, representam operações com o sistema da língua. Os produtos apontam para os efeitos de sentido, ou seja, para o resultado da produção de sentido.
Os planos acima são determinantes em qualquer dimensão da leitura. O mais desavisado dos leitores mobiliza recursos para perceber aspectos emocionais de uma interação, recursos prosódicos que permitem detectar alteração na fala do interlocutor, e assim por diante.
O gênero funciona como matriz a priori, enquanto a enunciação e a intencionalidade assumem dimensão a posteriori. Isto é, quando a pessoa lê, o fato de ela identificar o gênero do texto antes da leitura em si, o gênero passa a ser uma das diretrizes para a compreensão do texto.
Por exemplo, ao dispor a priori do gênero reportagem como estratégia de leitura, criamos expectativa da descrição de um acontecimento, com informações sobre pessoas, lugares, tempo de ocorrência etc.. Quando dispomos do gênero editorial, acionamos estratégias para compreender avaliações críticas, julgamentos, tomada de posição. Os dois procedimentos são tomados aprioristicamente e indicam para o leitor certa orientação de expectativa para a leitura.
Temos, assim, o que é comumente denominado conhecimento prévio. Ressalto, porém, que tudo exige conhecimento prévio: para andar, escovar os dentes, tirar dinheiro em um caixa eletrônico, chupar jabuticaba, assistir a um jogo de futebol. A mobilização de mecanismos para a leitura torna-se, então, necessária.
 A noção de gênero vem assumindo ao longo das últimas décadas importância central nas ciências da linguagem. Afinal, o gênero é um dos parâmetros mais importantes de leitura,orientando a atividade sociocognitiva de qualquer leitor.
 
 
4. Retextualização
 
Em gêneros escritos, o professor de língua encontra, geralmente, a influência da oralidade. Os alunos, ao produzirem seus textos na modalidade escrita, marcam seus textos com características da oralidade. Nesse caso, o professor pode trabalhar com a retextualização.
Retextualização é um processo de operações, que envolvem tanto a língua quanto o sentido do texto original (o texto oral). Marcuschi, na obra "Da fala para a escrita", ressalta que “a passagem da fala para a escrita não é a passagem do caos para a ordem; é a passagem de uma ordem para outra ordem.
 
A relação entre a oralidade e a escrita se encontra em quatro níveis:
 
1.    nível da substância da expressão: materialidade da língua (letra e som se correspondem).
2.    Nível da forma da expressão: signos falados e escritos (distinção entre grafia e pronúncia).
3.    Nível da substância do conteúdo: uso situacional e contextual.
4.    Nível da forma do conteúdo: relação entre as unidades significantes orais e escritas.
 
A adaptação de um texto oral para texto escrito exige uma transformação, retextualização. As transformações ocorridas são:
 
·         O propósito da retextualização pode mudar o nível da linguagem (pode passar de informal para formal).
·         A relação entre o produtor e o transformador é difícil de ser disfarçada, porque é difícil disfarçar a origem oral do texto.
·         A relação tipológica é menos drástica, porque a transformação, por exemplo, de uma narrativa oral para narrativa escrita, é manter no mesmo tipo de texto
 
 
	Quadro 1: Possibilidades de Retextualização
	1. Fala => Escrita (entrevista oral => entrevista impressa)
	2. Fala => Fala (conferência => tradução simultânea)
	3. Escrita => Fala (texto escrito => exposição oral)
	4. Escrita => Escrita (texto escrito => resumo escrito)
 
O autor dá um modelo das operações de retextualização:
 
· 1ª. operação: Eliminação de marcas estritamente interacionais, hesitações e partes de palavras.
 
Por exemplo: “eh...eu vou falar sobre a minha família... sobre os meus pais...o que eu acho deles...como eles me tratam...bem...eu tenho uma f família...pequena...ela é composta pelo meu pai... pela minha mãe... pelo meu irmão... eu tenho um irmão pequeno de ... dez anos... eh... o meu irmão não influencia em nada... minha mãe é uma pessoa superlegal...sabe?” Nesse texto percebem-se as hesitações como: eh..., de...; a marca interacional, como: sabe?
 
· 2ª. operação: Introdução da pontuação.
 
· 3ª. operação: Retirada de repetições, reduplicações e redundâncias.
 
Se forem efetuadas essas operações, o texto acima poderá ficar assim, dependendo da decisão que for tomada: Vou falar de minha família e de como eles me tratam. Minha família é pequena – meu pai, minha mãe e um irmão pequeno de 10 anos que não influencia em nada. Minha mãe é legal.
 
· 4ª operação: Introdução de parágrafos e pontuação detalhada.
 
· 5ª operação: Introdução de marcas metalinguísticas (as reformulações feitas).
 
· 6ª operação: Reconstrução de estruturas truncadas.
 
· 7ª operação: Tratamento estilístico com novas estruturas sintáticas e lexicais.
 
· 8ª operação: Reordenação do texto e da sequência argumentativa.
 
· 9ª operação: Agrupamento de argumento condensado às ideias.
 
Existe um trabalho esclarecedor de retextualização feito por alunos a partir da história em quadrinho “O trabalho enobrece”, com o personagem Chico Bento. O resultado é:
        
 
      Texto original                   Retextualização A            Retextualização B
 
1.    Eliminação de marcas estritamente interacionais: hesitações
 
	Chicoooo! Ei, Chico!
Chico!!!
 
	Rosinha soltou um grande grito.
	Rosinha deu um grito com Chico.
	ronc... ronc...
	Ao se aproximar escutou um ronco.
	Escutou alguns roncos.
 
2.    Onomatopeias
 
	ronc... ronc...
	Ao se aproximar escutou um ronco.
	Escutou alguns roncos.
 
3.    Eliminação de pontuação
 
	Ei, Chico! Chico!!
	Rosinha chamou ele umas duas vezes e nada dele acordar.
	Rosinha ficou tentando acordá-lo.
 
4.    Retirada de repetições e redundância
 
	drumindo...
drumindo...
	Rosinha saiu irritada e disse que parecia que a única coisa que Chico sabia fazer era dormir.
	Rosinha saiu brava falando que parecia que era a única
coisa que ele sabia fazer.
 
5.    Reconstrução de estruturas truncadas, concordâncias, reordenação sintática, encadeamentos
 
	Oi, Tonico! Ocê vai trabaiá?
Pois é! Começo logo cedo!
	Rosinha perguntou a Tonico se ele iria trabalhar. Tonico respondeu que começava bem cedo.
	A Rosinha encontra o Tonico e pergunta se ele já ia trabalhar. O Tonico respondeu que estava indo logo cedo.
 
6.    Pronomes egóticos
 
	Bão...eu tava drumino, uai!
	Ele respondeu que estava dormindo.
	Chico respondeu que estava dormindo.
 
7.    Pronome dêitico
 
	É! Os minino aqui da roça começa a trabaiá cedo mermo!
	... e pensou consigo mesma, na roça os meninos começam a trabalhar bem cedo.
	... viu que os amigos de Chico iam trabalhar cedo mesmo.
 
8.    Tratamento estilístico com seleção de novas opções léxicas
 
	Ai... o meu fofo vai
trabaiá!
	Então Rosinha ao ver seu namorado Chico indo para o trabalho fica muito feliz.
	A Rosinha espiando o Chico ficou surpresa com ele porque ele foi trabalhar.
 
 
ANDRADE, Eliene Peres de Oliveira, MACHADO, Gisélia dos Santos Silva, SILVA, Sílvio Ribeiro da. Retextualização de uma história em quadrinhos por alunos de meios letrados.Linguagem & Ensino. V.9,n.2, jul./dez. 2006.
 
 
 
Oralidade e escrita, assim, são práticas e usos da língua com características próprias, mas não suficientemente opostas para caracterizar dois sistemas linguísticos distintos. Ambas permitem a construção de textos coesos e coerentes, ambas permitem a elaboração de raciocínios abstratos e exposições formais e informais, variações estilísticas, sociais e dialetais.
 
 
O TRABALHO DA DOCÊNCIA: ENSINO DE LEITURA LITERÁRIA
 
 
1. Problemas no ensino de leitura literária no ensino básico
 
O desinteresse pela literatura não perpassa apenas nos alunos do ensino básico; afinal, é fato incontestável que grande parte dos brasileiros não possui o hábito da leitura. Muitos deles mal podem interpretar um texto (literário ou não), tendo apenas a habilidade de decodificar frases, não as compreendendo dentro do contexto.
Ler passa a ser, por conseguinte, um problema para muitas pessoas. Às vezes, percebemos o drama e o pavor da quantidade de páginas que torturam os alunos levados ao “esforço” de ler somente pela necessidade de preencher as fichas de leituras, assim como o medo que sentem de nada compreenderem.
Mas o que surpreende é que tal situação é gerada, enraizada no lugar aparentemente mais propício ao incentivo e estímulo a leitura: a própria escola. O quadro atual de não leitores tem sido o reflexo daquilo que vem acontecendo dentro da sala de aula, quando a maioria dos alunos rejeita qualquer tipo de leitura.
“Obrigação” seria o termo empregado corretamente em tal contexto? Muito provavelmente é o que tem ocorrido em salas de aula. O aluno não lê e consequentemente o professor o obriga. Ou seria o contrário: o professor obriga a leitura gerando dessa forma repulsa por parte do aluno?                                                         
Na concepção dos pais, por sua vez, o filho crescido pode ler sozinho, caminhar sozinho no território dos signos. A responsabilidade agora é atribuída à escola. Os pais acreditam que agora a escola vai assumir o seu papel e poderá realizá-lo de maneira ainda melhor, ou querem passar essa tarefa a outros, talvez por considerá-la algo sem importância. Os pais estão não só perdendo uma oportunidade ímpar de criar vínculos com seus filhos, mas, também, de passar-lhes lições de vida. Além de estar cultivando o gosto pelas histórias e consequentemente pela leitura.
Então, previsivelmente, o leitor prematuro começa a desgarrar-se da leitura, e o que antes fora um prazer incondicional torna-se para o adolescente um castigo, mesmo este tendoconsciência de que é precioso ler, mas por algum motivo sente repugnância por aquilo que lhe deveria ser um prazer. É nesse contexto que entra a figura do professor, mediador da reversão do processo leitor-não leitor-leitor.
Já diziam Bordini e Aguiar, na obra de 1993, que “as pessoas, desde a infância, são leitoras em formação, uma vez que estão constantemente atribuindo sentidos às mais diversas manifestações da natureza e da cultura” (1993: 11). Dessa forma, o ato de ler se inicia muito cedo e é comum a todos, basta, então, estimular o aluno para que ele volte a ter o prazer de ler como tivera na infância, quando sua “leitura” era feita por meio das histórias que lhes eram contadas:
 
Se, entretanto, o prazer de ler ficou perdido (se, como se diz, meu filho, minha filha, não gostam de ler) ele não se perdeu assim tão completamente. Desgarrou-se apenas. Fácil de ser encontrado (PENNAC: 1998: 43).
 
Se, de fato, o “desgarrado leitor” não se perdeu assim tão completamente e é fácil de ser encontrado, como fazer para resgatá-lo, uma vez que o elo que mantinha ligado ao prazer da leitura foi rompido abruptamente? A partir daí, por outro lado, entra a escola que se esforça para realizar o seu trabalho, desempenhar o seu papel de mediadora entre homem e sociedade, e é nesse contexto que entra a figura do professor, responsável direto pelo resgate desse “ex-leitor’.
Para essa difícil tarefa, verificam-se, distintamente, continuadores do sistema e os professores. Quem são os continuadores do sistema e quem são os professores? Os continuadores do sistema “são aqueles maciçamente acomodados ante o problema da leitura, refazendo práticas consagradas pela tradição cultural” (BORDINI; AGUIAR: 1993: 40). Aqueles que, não se importando com a real necessidade de seus educandos, deixam de preencher os espaços carentes que só a leitura pode suprir, sendo eles próprios, provavelmente, os “ex-leitores” não resgatados até então e, por isso, o seu não comprometimento com a importância do ato de ler.
Professor é aquele que busca
 
restituir no aluno as possibilidades de que ele estabeleça o seu próprio vínculo com a matéria ficcional, pesquisando, sobretudo na prática, soluções para vencer problemas já crônicos como a indiferença, o desânimo e a falta de familiaridade com a cultura letrada (BORDINI; AGUIAR: 1993: 40).
 
São estes, os professores, os verdadeiros responsáveis pela continuidade do processo de reintegração do aluno ao universo da leitura. É preciso buscar meios para sanar a carência existente em relação ao pouco acesso às informações acerca de metodologias relativas à sua área, que devem ser obtidas já na graduação, e mudar o histórico de alunos desmotivados e distantes do universo literário.
Ao transpor os difíceis obstáculos, passamos a percebem o professor verdadeiramente comprometido com a sua função, buscando novos caminhos que propiciem o resgate do leitor.
É a grande diferença entre os continuadores do sistema e os professores. Ambos estão diante de uma mesma situação caótica, mas o que os difere é a postura que tomam diante dessa realidade. Os primeiros ignoram o problema tornando-o ainda maior, enquanto que, os outros, mesmo com todas as dificuldades, encaram a situação de frente gerando ao menos sempre uma nova expectativa.
Outra questão a ser levantada é o professor no papel de leitor. Será que os professores de língua atuantes em sala de aula gostam de ler textos literários? Será que os professores têm um quadro diferente do restante dos brasileiros no que diz respeito à leitura? Enfim, são apaixonados pela literatura?
Muitos estudiosos sobre a importância da literatura na formação de professores já repetiram a ideia de que professor que não lê não transmite o gosto pela leitura.
A formação recebida nos cursos de Letras propicia uma bagagem de conteúdos relacionados à literatura que deveria sustentar um ensino mais eficiente. Entretanto, parece não resolver a crise, pois, ainda que eventualmente de posse de todas as referências necessárias, o professor vê-se desorientado quanto ao modo de organizar experiências a elas atinentes em sala de aula.
Ou seja, por mais que o curso ofereça aos graduandos todo o conhecimento possível e orientação em relação à apreensão dos conhecimentos, é imprescindível que o futuro professor acima de tudo seja interessado e estimulado a trabalhar com novas metodologias que visem tornar suas aulas mais criativas e produtivas.
O professor precisa ser, principalmente, leitor!
 
 
2. Propostas de ensino de leitura literária no ensino fundamental
 
 
O que observo no ensino da literatura é que o professor muitas vezes encontra dificuldades para colocar em prática todos os conhecimentos adquiridos na graduação, e, principalmente, em despertar no seu aluno o gosto pela leitura, em especial, pela leitura literária.
Indico aqui, então, a proposta de ensino de leitura literária de Juracy Assmann Saraiva e Ernani Mügge (2006). 
Os autores propõem uma metodologia de leitura literária, a qual se fundamenta na Estética da Recepção, especificamente nos estudos desenvolvidos por Hans Robert Jauss. A metodologia constitui-se de etapas distintas de percepção: entender, interpretar e aplicar, que, na verdade, formam um processo hermenêutico único. Conforme os autores, as etapas são separadas apenas como procedimento operatório, apoiando-se no caráter estético dos textos e envolvem atividades diversificadas.
As etapas metodológicas propostas por Saraiva e Mügge (2006) são:
1ª etapa ou leitura compreensiva
- leitura integral do texto;
- exercícios de leitura para ajudar na compreensão;
- trabalho de análise para entender a plurissignificação do texto literário, o qual privilegie o plano da expressão e o do conteúdo. Ao final, o leitor deverá estar apto a responder: “Como o texto diz aquilo que diz?”
2ª etapa ou leitura interpretativa
- resulta da sobreposição de leituras (confronto da análise crítica com as impressões iniciais);
- momento em que se estabelece a relação entre texto e experiência de mundo do leitor;
- leitura crítica: reflexão e recriação (atuação do texto sobre o leitor). O leitor conseguirá responder: “Qual é o sentido do texto?”
3ª etapa ou etapa de aplicação
- ampliação da experiência literária (relação entre manifestações do presente e do passado);
- horizontes de recepção e produção (contexto estético-histórico-cultural e percepção do texto como ponto de convergência de valores e ideologias). O leitor deverá responder: “Que diálogo há entre o texto e o contexto estético-histórico-cultural atual e o momento de sua produção?”
A proposta de Saraiva e Mügge (2006) traz a convergência de processos entre língua e literatura em uma relação de unidade e de harmonia: a aquisição de um corpus lexical, o domínio gradativo de formas gramaticais e de estruturas sintáticas, a assimilação de noções de coesão e coerência, utilização de coordenadas espaço-temporais, representação da interlocução inerente aos atos de linguagem e a reflexão metalinguística presente nos processos da aquisição da língua e de criação da literatura.
A proposta é contrária à separação entre o ensino da língua e o da literatura e à perspectiva que visualiza o texto literário como objeto de veneração, cuja inviolabilidade deve ser preservada e, ao mesmo tempo, toma o texto como modelo a ser seguido, sustentando o “escrever bonito”. A proposta desses estudiosos é apontar para a identificação em comum entre língua e literatura, centralizando-se o ensino na relação texto-leitor.
Com base em tal proposta, o livro Literatura na escola, de Saraiva e Mügge (2006), apresenta um roteiro para diversas atividades. Os autores reforçam que para o sucesso das atividades, o professor deve:
·         ler previamente o texto literário e verificar sua adequação aos alunos;
·         analisar as atividades do roteiro para proceder a eventuais adaptações ou inovações;
·         divulgar, na escola, os trabalhos dos alunos resultantes da aplicação do roteiro, reforçando, assim, a motivação para a leitura e a produção textual;·         selecionar produções para divulgar o trabalho fora do ambiente escolar;
·         registrar os resultados das atividades e as alterações consideradas interessantes para inovar e melhorar o roteiro, tendo em vista aplicações futuras;
·         selecionar novos textos e, a partir dos modelos de roteiro, elaborar questões interessantes e desafiadoras para os alunos, transcendendo as propostas constantes no livro.
O livro está dividido em seções por série do ensino fundamental:
·         1ª série: poema Moda da menina trombuda, de Cecília Meireles;
·         2ª e 3ª séries: poema O vestido de Laura, de Cecília Meireles; o livro História meio ao contrário, de Ana Maria Machado; o livro A curiosidade premiada, de Fernanda Lopes de Almeida;
·         2ª, 3ª e 4ª séries: o livro O menino maluquinho, de Ziraldo;
·          3ª e 4ª séries: o poema Paisagem muito viva, de Sérgio Capparelli; o livro Atrás da porta, de Ruth Rocha; o livro Bisa Bia, Bisa Bel, de Ana Maria Machado;
·         4ª e 5ª séries: o livro O mágico de Oz, de Frank Baum; o livro O sofá estampado, de Lygia Bojunga Nunes; o livro A bolsa amarela, de Lygia Bojunga Nunes;
·         5ª e 6ª séries: o livro Do outro mundo, de Ana Maria Machado; o livro Tom Sawyer detetive, de Mark Twain;
·         6ª e 7ª séries: o poema Escola, de José Paulo Paes;
·         7ª e 8 séries: Eu e os bombons, de Sérgio Capparelli; o poema Excursão, de Sérgio Capparelli; o livro Alê, Marcelo, Ju & eu, de Jane Tutikian; os contos Um dia de glóriae Domingo no parque, de Sérgio Faraco; o livro O colar de diamantes, de Guy de Maupassant; o livro A ilha do tesouro, de Robert Louis Stevenson;
·         8ª série: o livro Frankenstein ou o Prometeu moderno, de Mary Shelley.
Para cada texto literário selecionado, há uma sequência de atividades já aplicadas por um grupo de professores sob a coordenação dos autores. Destaco uma dessas seções com a finalidade de dar um exemplo e convidar, você, aluno, a conhecer a obra, conhecer mais uma forma de trabalhar leitura literária no ensino fundamental com base metodológica.
 
 
3. Propostas de ensino de leitura literária no ensino médio
 
 
No ensino médio, a prática de ensino de literatura mais comum hoje consiste, no 1º ano, na construção de conceitos básicos sobre teoria literária e teoria da comunicação existe metodologia clara sobre como ensinar a literatura. Conforme o levantamento de Cereja (2005), tais conceitos, no geral, são:
·         da teoria literária: linguagem literária/linguagem referencial, gêneros literários, verso e prosa, noções de versificação, ponto de vista narrativo etc.;
·         da teoria da comunicação e da linguística: componentes do ato da fala (emissor, receptor, código, canal, mensagem, referente), funções da linguagem, signo/significante/significado, denotação e conotação, polissemia etc.
Construídos esses conceitos, considera-se o aluno preparado para lidar com o texto literário de época, visto agora de forma sistematizado e de acordo com a perspectiva histórica. A partir daí, tem início o estudo da história da literatura, que perdura até o fim do ensino médio.
A abordagem historicista da literatura sustenta-se na apresentação panorâmica dos movimentos literários ou estilos de época e dos principais autores e obras em uma linha temporal. Quanto à metodologia, consiste na breve apresentação do movimento literário, com datas limítrofes e indicação dos principais autores, contexto histórico, características do movimento literário em foco, apresentação dos principais autores, com biografia, e leitura na integra ou em partes de alguns textos. Quanto à forma de transmissão dos conteúdos, geralmente é feita de modo oral e expositivo pelo professor com a mediação do livro didático.
Enfocar a história da literatura começou com a historiografia literária na década de 1830, na regência de D. Pedro II. Ressalto que são duas coisas diferentes: o ensino da história da literatura e historiografia literária, mas aquele é influenciado por esta.
A história da literatura surgiu no Brasil para cumprir a dois objetivos: a de definir e documentar as expressões da identidade nacional, porque os acadêmicos passaram a participar do projeto nacionalista da época do Romantismo; a de formar, na escola, jovens brasileiros a partir de textos considerados fundadores da cultura brasileira.
Assim, os primeiros estudos literários procuraram verificar as relações entre literatura e sociedade em um enfoque histórico e, a partir do século XX, tal enfoque foi desenvolvido paralelo ao da crítica literária, formando o quadro a seguir:
 
	Comparação entre historiografia e crítica brasileiras nos séculos XIX e XX
	 
	Romantismo
	Naturalismo
(Sílvio Romero)
	Concepção de historicidade
	Historicismo nacionalista
	Historicismo sociológico
	Concepção de literatura
	Literatura como documento de manifestações particulares que caracterizam a nacionalidade
	Literatura como documento das manifestações da formação étnica
	Concepção de tempo e historicidade
	Conceito cumulativo de tempo
Concepção linear da história
	Conceito cumulativo de tempo e evolução
Concepção linear da história, que caminharia para o aperfeiçoamento
	Enfoque
	Enfoque nacional da literatura e da cultura, com vistas a caracterizar o espírito nacional
	Enfoque sociológico da literatura e da cultura, com vistas a caracterizar as particularidades da raça
	Papel da historiografia e da crítica
	Historiografia e crítica comprometidas com o projeto de construção da identidade nacional
	Concepção militante, comprometida com o progresso social e cultural
 
	Comparação entre historiografia e crítica brasileiras nos séculos XIX e XX
	 
	Impressionismo
(José Veríssimo)
	New Criticism
(Afrânio Coutinho)
	Concepção de historicidade
	Historicismo impressionista
	Historicismo estético
	Concepção de literatura
	Literatura como objeto estético
	Literatura como objeto estético
	Concepção de tempo e historicidade
	Concepção não linear da história
Desatreladas das influências do meio, as obras podem dar “saltos” estéticos por mérito dos escritores
	Concepção não linear da história
Desatreladas das influências do meio, as obras podem dar “saltos” estéticos por mérito dos escritores
	Enfoque
	Preferência pela abordagem individualizante da obra, em detrimento de análises coletivas
	Preferência pela abordagem individualizante da obra, em detrimento de análises coletivas
	Papel da historiografia e da crítica
	Texto como entidade cujo valor estético independe da situação de produção
	Compromisso com a análise imanente da obra literária
 
	Comparação entre historiografia e crítica brasileiras nos séculos XIX e XX
	 
	Sociologia da cultura
(Antonio Candido e Otto Maria Carpeaux)
	Concepção de historicidade
	Historicismo dialético
	Concepção de literatura
	Literatura como produto da confluência de elementos estéticos e sociais, mediados pela cultura
	Concepção de tempo e historicidade
	Uso do critério cronológico e reconhecimento de contradições nos períodos e nos autores
Visão dinâmica das relações entre a produção literária e a cultura e reconhecimento de inter-relações como o passado e o presente
	Enfoque
	Literatura como subsistema de um sistema cultural mais amplo; não despreza os aspectos psicológicos ou particulares de cada autor
	Papel da historiografia e da crítica
	Concepção militante, comprometida com a superação da dicotomia entre formalismo e sociologismo, com vistas a possibilitar intervenções mais producentes no processo cultural
(CEREJA: 2005: 138)
 
A linguagem didática do professor e o livro didático inspiram-se nos estudos historiográficos de literatura, contudo encontramos, hoje, os seguintes aspectos:
·         a escola não conseguiu acompanhar o desenvolvimento desses estudos historiográficos, tornando-se alheia a eles. Os alunos do ensino médio não conhecem, por exemplo, as concepções literárias do notório Antonio Candido;
·         o livro didático passou a determinar a linha teórica e a metodologia a serem utilizadas na escola: o conteúdo (conjuntode autores literários, estilo de época etc.) da história é enfocado de forma simplista;
·         os alunos não são preparados para produzir o gênero textual historiográfico, mesmo tendo um ensino pautado na história.
Ao ver de Cereja (2005: 141),
 
a historiografia literária, em si, não constitui o problema central do ensino de literatura em nosso país. Ela pode trazer contribuições importantes para a compreensão de determinados textos, autores e épocas, da mesma forma que conhecimentos, de outras áreas, como história, filosofia, psicologia, sociologia, análise do discurso etc. O problema é que, transformando-se no principal objeto e no principal objetivo do curso de literatura no ensino médio, ela vem centralizando, desde o último quartel do século XIX, a maior parte das atividades da disciplina, não dando espaço para outros tipos de abordagem da literatura, mais condizentes com a realidade e com os objetivos da educação oficial hoje.
 
Acreditando ser possível preservar a historicidade do texto literário sem perder sua especificidade estética, Cereja (2005) parte da visão histórica de Antonio Candido, da concepção de dialogismo de Mikhail Bakhtin, para quem um texto mantém relação dialógica com outros textos, verbais e não verbais, literários e não literários, da mesma época ou de outras épocas, e da perspectiva de Jauss, para quem a literatura revela os pontos de intersecção entre a diacronia e sincronia, ou seja, é possível uma história da literatura que seja aberta tanto para os elementos externos do texto – contexto histórico-social e cultural, relações com outras artes e linguagens, grupo de escritores, estilo de época, público leitor etc. (a sincronia) – quanto para as relações dialógicas presentes na grande temporalidade (diacronia não linear).
Seguindo essa ideia de Jauss, a intersecção pode ocorrer por meio da intersecção temática: nacionalidade, natureza, amor, mulher, negro, seca, campo, alteridade, o fazer poético e tantos outros temas; por intersecção por gêneros: o conto segundo Poe, Machado de Assis, Dalton Trevisan, o romance segundo Alencar, Machado de Assis, Guimarães Rosa e assim por diante; por intersecção pela tradição ou pelo projeto estético: o confronto entre a poesia de Alvares de Azevedo, Manuel Bandeira e Drummond, para observar semelhanças e diferenças quanto à abordagem do cotidiano ou tantas outras opções.
No livro de Cereja (2005), há propostas discutidas pelo autor, que alerta que sua finalidade foi mostrar como um trabalho didático em literatura poderia ser feito com base em uma perspectiva dialógica. Outro alerta é sobre a metodologia; a atividade pode ser temática, histórica etc., desde que o texto seja o centro das aulas da literatura. Afinal, o texto literário desenvolve em nós a quota de humanidade na medida em que nos torna mais compreensivos e abertos para a natureza, a sociedade, o semelhante, na linda afirmação de Antonio Candido (apud CEREJA: 2005: 188).
 
O TRABALHO DA CRÍTICA LITERÁRIA E DA RESENHA
 
 
1. Mapeamento da crítica brasileira e a escrita crítica
 
 
Você conhece um colega de curso que declara ter planos para ser crítico literário? Grande parte da produção intelectual brasileira está circunscrita aos limites e às fronteiras da academia e circula apenas nos ambientes universitários.
O fato é que a produção acadêmica encontra grande dificuldade de divulgação em outros meios além das publicações internas. As divulgações restringem-se a revistas e cadernos das instituições, sobretudo quando os autores são graduandos no Mestrado ou Doutorado, bem como restringem-se ao ambiente de congressos e das bancas examinadoras de teses e dissertações.
Frente a essa realidade, leva-nos a perguntar se a crítica literária brasileira se profissionalizou. Não podemos falar, certamente, que um intelectual faz da crítica sua atividade mais importante, exercida em órgãos de comunicação de onde tira seus rendimentos. Se há um crítico literário que pode sobreviver – pagar suas contas mensais – exclusivamente da crítica, constitui exceção das exceções.
É inegável o papel do ensino universitário no Brasil, pois contribui decisivamente para essa profissionalização que se consolidou como especialização.
O programa Rumos Literatura 2007-2008 (MIRANDA et al: 2008), lançado pela Universidade Federal de Santa Catarina, sob mediação do professor Alckmar Luiz dos Santos, teve, entre outros objetivos, como incentivar a escrita de novas reflexões críticas, mapear os críticos literários brasileiros contemporâneos.
O programa recebeu um total de 577 inscrições provenientes de 24 estados brasileiros. Acre, Rondônia e Roraima não apresentaram registro de inscrição. Os cinco estados de onde vieram os maiores números do total de inscrições foram: São Paulo (180), seguido por Rio de Janeiro (82), depois Minas Gerais (47), Rio Grande do Sul (42) e Paraná (41). Os demais estados apresentaram os seguintes números de inscritos: Alagoas (5), Amapá (1), Amazonas (7), Bahia (26), Ceará (20), Distrito Federal (21), Espírito Santo (7), Goiás (25), Maranhão (2), Mato Grosso do Sul (12), Mato Grosso (4), Pará (4), Paraíba (2), Pernambuco (17), Piauí (4), Rio Grande do Norte (3), Santa Catarina (19), Sergipe (4) e Tocantins (2).
Depois do processo de triagem e exclusão de trabalho que por um motivo ou outro não atendiam às exigências do edital, foram encaminhados aos membros da comissão de seleção 269 projetos. A leitura desses trabalhos aponta, entre os diversos aspectos a serem analisados, para a valorização do crítico, que reflete sobre o objeto literário e exerce uma função histórica, devendo, portanto, estar em sintonia com seu próprio tempo, ainda que se articule no silêncio de uma atividade solitária.
Afinal, o crítico contemporâneo é contemporâneo de si mesmo? O que se espera do crítico diante das inovações sofridas pelo texto e seus suportes ao longo das últimas décadas? Qual é o estatuto da crítica: arte, ciência, literatura? Como essa mesma crítica é capaz de separar o literário, o que fica na história dos tempos, e o descartável, que hoje é moda, mas vai se dissolver amanhã?
A maior parte das propostas busca entender aspectos tão diversos e genéricos quanto os temas: as categorias da crítica literária contemporânea, a crítica feminista, as tendências da crítica na reavaliação do texto em prosa, os alicerces da crítica na contemporaneidade, o mercado editorial, o manguescience pela ecocrítica, a crítica literária e a internet, a recepção crítica da literatura marginal e a crítica literária dos anos 1980.
Alguns nomes que fundaram a crítica moderna no Brasil são bastante citados nas bibliografias desses trabalhos enviados ao programa. São eles: Alfredo Bosi foi citado em todos os trabalhos, Antonio Candido, Silviano Santiago, Flora Sussekind, Roberto Schwarz, Davi Arrigucci Jr., Luiz Costa Lima. Entre os nomes estrangeiros citados nos trabalhos, constam: Walter Benjamin, Terry Eagleton, Stuart Hall, Mikhail Bakhtin, Erich Auerbach, Aristóteles, Roland Barthes, Ítalo Calvino, Jacques Derrida.
Tais autores são referências imprescindíveis para o estudo da literatura. Entretanto, esses críticos pensam a contemporaneidade literária de forma contemporânea? Os critérios que a maioria deles adotou até a modernidade ainda se sustentam diante do que se produz hoje nos vários suportes nos quais a literatura se apresenta? São algumas questões, que merecem uma atenção maior de sua parte, caro aluno, uma vez que os trabalhos da crítica literária tomam outros rumos/fronteiras e, com isso, avançam no sentido de aguçar novas discussões.
Dos trabalhos apresentados, há um total de 10 voltados para o tema da literatura virtual em seus diversos aspectos e gêneros, tais como a revolução eletrônica e o código literário, as características da ciberpoesia, a nova ficção científica na era da internet, a interatividade na produção online, os blogs e a produção literária que surge da rede, como a da Clara Averbuck, João Paulo Cuenca, Joca Terron e Cecília Gianetti, estudos sobre sites, sendo um deles o “Escritorassuicidas” e o outro “Overmundo”.
Outro aspecto a ser considerado nesse mapeamento é a reflexão sobre temas ligados à sexualidade, erotismo, obsceno e à questão do gênero (o papel da mulher na sociedade). O elemento em comum a todos esses trabalhos é a procura de aspectos capazes de postular se existe ou não um olhar diferenciados ou uma forma de escrever que caracterize a marca de uma sexualidade na literatura.
Aproximadamente 60% das propostas enviadas ao programa Rumos Literatura 2007-2008 giram em torno do romance em seus diferentes suportes: livro, música, internet. Um desses trabalhos toca em ponto crucial: como o romance se sustenta na contemporaneidade? Afinal, qual é o lugar do romance na literatura brasileira contemporânea?
Ainda no que se refere aos gêneros, foi constatado um grande interesse observado nos trabalhos enviados sobre poesia. Ressalta-se a diversidade na seleção de autores e obras nos suportes do livro: Mário Quintana, Manoel de Barros, Ferreira Gullar, Ana Cristina César, Augusto de Campos, Glauco Mattoso, Helena Armond. Há enfoque também para a ciberpoesia, as múltiplas dimensões da ordem poética de Arnaldo Antunes e para o trabalho original de Marcelino Freire em sua constante interação entre música e poesia.
Não é possível – nem é um propósito – fechar esse mapeamento, mas serve para mostrar algumas de muitas possibilidades do trabalho da crítica literária.
 
Em relação à escrita do crítico, diante dos textos literários modernos, dos textos-limites da vanguarda, no começo do século XX, a crítica se viu forçada a abandonar qualquer pretensão a uma interpretação unitária e exclusiva. Segundo Perrone-Moisés (2005: 19), a crítica se viu igualmente obrigada a renunciar aos estudos voltados para o autor, sua personalidade, sua biografia, uma vez que nos textos o sujeito é apenas um sujeito da enunciação, fator e produto do próprio enunciado.
A obra crítica tradicional consiste em um discurso dissertatio, em que se desenvolvem considerações sobre uma questão precisa, no caso uma obra poética. Esse tipo de discurso – a dissertação – implica racionalidade, distância, objetividade, fidelidade e dependência com relação ao objeto tratado.
Optando pela modernidade, restam à crítica dois caminhos. O primeiro é o científico. O crítico literário busca aparato conceitual e metodológico para a análise dos textos literários e, como efeito, temos uma metalinguagem cada vez mais formalizada. Outro caminho é o da escritura, que privilegia a produção de novos sentidos, ou seja, a escrita do crítico não ajuda apenas o leitor a ler o texto literário nem é uma metalinguagem, mas dá à leitura do texto literário um novo ciframento e tem a mesma condição de igualdade do discurso poético. De certo modo, a crítica oscila entre o polo da ciência e da arte.
A modernidade está operando profundas revoluções em todos os campos, e o resultado é que esses campos não podem mais ser separados em compartimentos estanques como antigamente, mas se revelam intercomunicantes e orientados de modo similar. Se no nosso campo vemos o desaparecimento da literatura e da arte em geral, os cientistas também se dão conta de que a velha ciência morreu; os cientistas avançam para essa outra coisa que tomou o lugar da ciência.
Para os críticos literários, a questão não é mais a de descobrir, objetivamente, realidades substanciais, mas de inventar relações na “realidade” da obra literária analisada. A escrita do crítico literário é, também, uma criatividade e uma invenção. Trata-se de uma crítica que:
·         se dá a ler como texto de modo mais novo e mais rico,
·         conserva uma função metalinguagem, mas é também linguagem,
·         inventa, no outro texto (o literário) novos valores,
·         é um fenômeno de enunciação ao mesmo tempo que enuncia outra coisa.
Enfim, o texto do crítico pode ser híbrido, paradoxal, inclassificável, como o sujeito que o produz: sujeito entre dois campos – literatura e crítica – entre dois mundos – da obra literária e do simbólico de seu próprio texto; sujeito em crise, ou: crítico = escritor em crise.
Quando o crítico entra na produção, deixa de ser vigia e passa a ser vigiado. O crítico-escritor é perigoso como qualquer escritor e um meio para desarmá-lo é aplicar contra ele a boa velha crítica.
Mas não há razões para se inquietar. Por enquanto, a crítica-escritura é uma utopia. A literatura ainda existe e a crítica continua permitida. Enquanto tudo continua em seu lugar, o ofício de crítico literário ainda é promissor.
 
 
 
2.    Retrato do resenhista: um exemplo
 
Resenha é um gênero textual, que pode ser produzida por diversos grupos sociais: alunos no ensino básico, pesquisadores, jornalistas, entre outros. A resenha distingue-se em subgênero como resenha acadêmica e resenha de divulgação.
Neste livro-texto, resenha está relacionada ao profissional que, vinculado a uma mídia – revista, jornal, sites –, publica periodicamente, tornando a resenha uma das suas fontes de trabalho e tornando-se, por conseguinte, um resenhista. A função do resenhista é produzir resenha de divulgação sobre obras literárias ou não literárias publicadas recentemente.
No âmbito social, existe um distanciamento entre resenhista e crítico literário. A resenha traz um imediatismo muito maior do que a da crítica literária; não há o aprofundamento de conteúdo na resenha, como é esperado em texto de crítica literária. Além disso, a resenha está intrinsecamente ligada à indústria cultural ou cultura de massa, causando preconceito entre os acadêmicos e professores de forma geral contra os resenhistas.
Hoje, na verdade, questiona-se que o resenhista está substituindo os críticos literários.
Existem resenhistas sérios e notórios, com vínculos empregatícios com jornais e revistas. Um deles é o falecido Daniel Piza, que foi colunista durante anos no jornal O Estado de S. Paulo.
Outro exemplo de resenhista é Bernardo Carvalho, do jornal Folha de S. Paulo. O papel do resenhista é comentar uma obra recém-publicada, indicando-a positiva ou negativamente aos leitores, e seus comentários, sua forma de escrever, criam um perfil no imaginário do leitor do jornal. O resenhista pode causar boa impressão ou não no leitor, pode adquirir credibilidade àquilo que resenha. O efeito positivo e impressionante foi causado no estudioso Antonio Marcos Pereira (MIRANDA et al: 2008), que se apegou à coluna de Carvalho. Trata-se de um crítico literário (Pereira) tomando como objeto de estudo os textos de um resenhista (Carvalho).
Pereira inicia seu estudo, apresentando a indagação de que, se os textos de Carvalho apresentam tal voltagem particular, é vão separar a crítica acadêmica da crítica jornalística. Com tal indagação, ele ajuda a romper essa dicotomia entre crítica e resenha. A produção crítica de Carvalho leva Pereira a ler na biblioteca e no ponto de ônibus, comentar as leituras na sala de aula e na mesa do bar, dirigir seu consumo a itens apresentados nos textos. Pereira passou a buscar os autores mencionados nas resenhas, recuperar leituras já realizadas, agora com nuances outras de atenção, refletir sobre os produtos culturais e suas relações de consumo.
Ao pesquisar um pouco mais sobre esse resenhista, descobrimos sua versatilidade no mundo da literatura, tal como noticiado a seguir:
 
 
Bernardo Carvalho reúne resenhas e ficções em "O Mundo Fora dos Eixos"
da Folha Online
 
Ao longo de uma década, o jornalista e colunista Bernardo Carvalho discutiu temas ligados à cultura, literatura, teatro e artes. Publicados desde 1995 na Folha, seus textos estão reunidos no nono livro do escritor O mundo fora dos eixos,  Publifolha.
As dez resenhas selecionadas fizeram parte da coluna "Resenha da Semana", da Ilustrada. Já as seis ficções foram escritas para edições temáticas do jornal, com a participação de outros escritores.
Em "Nunca Tive Tanto Orgulho de Ser Ateu", a crônica que abre o livro, Carvalho descreve a noite que passou em um vale, em viagem à Mongólia.
A experiência antecipou o livro "Mongólia", que lhe daria o Prêmio Jabutiem 2004 na categoria romance. Com a obra "Nove Noites" o escritor ganhou o Prêmio Portugal Telecom, em 2003.

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