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CONTENTS 1. Introdução e Definição ............................................. 3 2. Epidemiologia .............................................................. 5 3. Etiologia ........................................................................ 7 4. Fisiopatologia .............................................................. 7 5. Quadro Clínico ............................................................. 9 5. Diagnóstico ................................................................12 6. Tratamento .................................................................13 Referências Bibliográficas .........................................18 3COLITES PSEUDOMEMBRANOSAS 1. INTRODUÇÃO E DEFINIÇÃO NA PRÁTICA: JRO, masculino, 68 anos, em atendimento ambulatorial, com quei- xa de diarreia há 18 dias, com fezes líquidas e sem sangue, pus ou restos alimentares. Relata em torno de 5 eva- cuações por dia e discreto desconforto em abdome inferior. Fez tratamento para H. pylori com amoxicilina-clavulanato e IBP, por 21 dias. E tratou sinusite bac- teriana em duas ocasiões nos últimos 2 meses, com clindamicina. Ao exame físico: bom estado geral, afebril, sem si- nais de desidratação. Abdome globoso, RH aumentados, sem sinais de defesa abdominal. Sem alterações em outros sistemas. A colite pseudomembranosa é uma patologia que cursa com diarreia – po- dendo ser autolimitada ou de duração mais extensa – e associada à infecção pelo Clostridium difficile. O C. difficile uma bactéria anaeró- bia, gram-positiva, formadora de esporos e produtora de toxinas. É altamente resistente à agressões externas como calor, meio ácido, anti- bióticos e à maioria dos desinfetantes mais comuns. A formação de esporos lhe confere a persistência dessa bac- téria em ambiente hospitalar e a difi- culdade em eliminá-las por meios de descontaminação. Sua transmissão ocorre via fecal-o- ral: o contato com objetos e utensílios contaminados é o mecanismo mais comum, sendo os esporos encontra- dos em superfícies, mesas, cadeiras, cama, etc. Equipamentos médicos como estetoscópio e termômetro também são fontes impotantes de infecção no contexto hospitalar e de cuidados à saúde. As fontes de infecção por CD são representadas pelos indivíduos do- entes e por aqueles infectados as- sintomáticos, que eliminam espo- ros nas fezes. SE LIGA! Os esporos do C. difficile são altamente resistentes e difíceis de serem eliminados. Profissionais de saúde estão constantemente expostos e frequente- mente carregam nas mãos e nos seus acessórios os esporos da bactéria. Por isso, medidas de biossegurança se tor- nam de extrema importância para evitar a disseminação do patógeno. Vale res- saltar que o C. difficile dificilmente é eli- minado com o uso de álcool em gel para as mãos, sendo a lavagem das mãos mais eficiente para evitar a transmissão. Além disso, indivíduos infectados de- vem evitar contato com outros leitos, bem como os acompanhantes desses indivíduos. Após a alta, seu leito deve ser esterilizado com cautela. 4COLITES PSEUDOMEMBRANOSAS É importante ressaltar que o termo “colite pseudomembranosa” re- presenta a infecção que cursa com colite associada a “pseudomem- branas” na colonoscopia ou retos- sigmoidoscopia. No entanto, essa apresentação está presente em apenas cerca de 50% dos casos, sendo o termo “doença causada pelo C. difficile” (DCd) mais abrangente, abarcando a diarreia associada a esta infecção que não necessariamente apresenta as pseudomembranas. E o que são pseudomembranas? Quando infecções atingem superfí- cies ou mucosas, há formação de ex- sudato que confere o aspecto laminar de uma membrana. Diz-se, então, que uma pseudomembrana é forma- da por bactérias, leucócitos mortos, tecido necrótico e outras substâncias. Já a membrana, em princípio, é for- mada por tecido vivo, e exsudato não é tecido vivo. Por isso, chama- mos de “pseudomembrana”. Quase a totalidade dos casos está associada ao contato com ambien- te nosocomial e aos cuidados de saúde, bem como ao uso recente de antimicrobiano. A CDc responde por cerca de 15% a 20% dos casos de diarreia associada ao uso de an- tibióticos. Grande parte dos pacien- tes adquirem a infecção no contexto hospitalar, mas a ocorrência infecção na comunidade vem crescendo nos últimos anos vertiginosamente, o que acredita-se ser atribuido ao surgi- mento de cepas hipervirulentas e de mais fácil disseminação. No geral, qualquer antibiótico pode precipitar um quadro de doença associada ao Clostridium difficile, mas os mais frequentemente asso- ciados são as ampicilinas, quinolo- nas, cefalosporinas, clindamicina e Figura 1: Imagem de microscopia eletrônica de esporo do C. difficile. Fonte: Nature Reviews Gastroenterology & Hepatology, 2019. 5COLITES PSEUDOMEMBRANOSAS as penincilinas de largo espectro. Ao fazer uso desses medicamentos, bactérias que colonizam o trato gas- trointestinal acabam sofrendo ação da droga e sendo eliminadas ou tendo sua população destruída. Acontece PRINCIPAIS ANTIBIÓTICOS ENVOLVIDOS NA INFECÇÃO POR C. DIFFICILE Comumente envolvidos Ocasionalmente envolvidos Raramente envolvidos Fluoroquinolonas Macrolídeos Aminoglicosídeos Cefalosporinas Trimetroprima Vancomicina Clindamicina Sulfonamidas Metronidazol Penincilina de largo espectro Cloranfenicol Ampicilinas Tetraciclinas que essas bactérias são uma espécie de “resistência” ao supercrescimento da C. difficile, então sua eliminação acaba favorecendo este supercresci- mento. SE LIGA! O risco, após terapia com anti- biótico, permanece aumentado por cer- ca de três meses. Os antibióticos mais implicados tendem a ter excreção biliar significativa, com boa concentração no lúmen intestinal e resistência do C. diffi- cile a eles. Agem contra gram-negativos e aeróbios, diminuindo a resistência à colonização pelo clostrídio. 2. EPIDEMIOLOGIA A DCd é atualmente uma das prin- cipais causas de diarreia associada ao uso de antibióticos e está forte- mente relacionada com cuidados hospitalares. Nos EUA, são cerca de 500 mil casos por ano, com 20 mil óbitos. No Brasil, os dados epide- miológicos exatos são escassos, mas acredita-se que os casos sejam sub- diagnosticados. No início dos anos 2000, foi descrita uma nova cepa hipervirulenta deno- minada NI/NAP1/027. Essa cepa se disseminou pela Europa e América do Norte e foi responsável pelo aumen- to da gravidade, complicações, inter- nações em UTI e da mortalidade pela DCd. Inclusive, em algumas regiões, como EUA e Canadá, os casos au- mentaram mais de duas vezes. 6COLITES PSEUDOMEMBRANOSAS Quanto ao perfil do paciente, geral- mente a DCd atinge com maior fre- quência faixas etárias mais avan- çadas, embora possa ocorrer em qualquer idade. Mais de 70% dos afe- tados têm idade maior que 65 anos, como é o caso do nosso paciente. De 80% a 90% dos doentes pos- suem pelo menos um dos fatores de risco para a doença, os quais se- rão enumerados a seguir. O uso re- cente de antibióticos é identificado em até 96% dos casos. • Idade > 65 anos • Internações prolongadas • Asilos • Antibioticoterapia no geral • Antibioticoterapia prolongada • Associação antibiótica • Imunossupressão/imunodeficiên- Figura 2: Indicência da infecção nosocomial por C. difficile nos EUA, de acordo com a idade. cias • Uso de IBP’s • Uso de antagonistas dos recepto- res H2 • Quimioterapia antineoplásica • Tratamento domiciliar • Ingestão de carne processada • Cirurgia gastrointestinal • Endoscopia digestiva • Sonda nasogástrica • Gastrostomia • Jejunostomia • Comorbidades em geral • Neoplasias sólidas • Neoplasias hematológicas • Fibrose cística 7COLITES PSEUDOMEMBRANOSAS • Diabetes mellitus • Cirrose hepática • Doença renal crônica • Doença inflamatória intestinal • Desnutrição • Hipoalbuminemia Perceba que nosso paciente tem 68 anos e ainda fez tratamento com amoxicilina-clavulanato e dois cursos de tratamento com clindamicina. To- dos esses fatores colaborarampara o desenvolvimento da doença. Mas por que ter tomado antibiótico contribuiu para que JRO desenvol- vesse a diarreia? Veremos adiante. 3. ETIOLOGIA O gênero Clostridium é formado por um grupo heterogêneo de bacilos anaeróbicos e formadores de esporos. O caráter formador de esporos con- fere a esses microorganismos uma imensa capacidade de resistência no meio ambiente aos esforços de des- contaminação, o que torna fácil sua disseminação. Patógenos importantes historica- mente, como Clostridium tetani e Clostridium botulini, foram respon- sáveis respectivamente pelo téta- no e pelo botulismo. Nesse resumo, falamos do C. difficile, que, como já citado, se trata de um bacilo pro- dutor de esporos anaeróbio estri- to e gram-positivo. Foi isolado pela primeira vez em 1935, na flora fecal de recém-nascidos saudáveis. Sua associação com enterocolite pseudo- membranosa ou diarreia, no entanto, foi feita pela primeira vez apenas em 1978. Postulou-se que bebês pos- suíam a bactéria sem desenvolver a doença devido à ausência de recep- tores no organismo ainda imaturo às toxinas produzidas pelo bacilo. Isso ajudou a elucidar a interação entre o hospedeiro e o Clostridium. Nos anos 2000, foi descoberta a cepa hipervirulenta NAP1/B1. Essa cepa possui uma produção mais intensa de toxinas e, além disso, produz também uma terceira toxina, ou toxina bi- nária, resistente à fluoroquinolonas. Essa cepa contribuiu para a dissemi- nação dos casos e o aumento da mo- bimortalidade relacionada à doença. 4. FISIOPATOLOGIA Como já mencionamos, o uso de an- tibióticos podem reduzir a flora bac- teriana do trato gastrointestinal que serve de barreira para o supercres- cimento de bactérias patogênicas. Logo, em condições favoráveis – como o uso de antibióticos - e em contato com a bactéria, os esporos dormen- tes se tranformam em formas ve- getativas, que produzem toxinas. Os esporos do C. difficile são resis- tentes ao pH do suco gástrico – em- 8COLITES PSEUDOMEMBRANOSAS bora o uso de IBPs e antagonistas de H2 se associem à maior ocorrência de DCd. Ao chegar no intestino del- gado, com a presença de sais bilia- res, o C. difficile começa a germinar e se transformar nas formas vege- tativas. Estas, quando chegam ao cólon, se encontrarem condições favoráveis, colonizam a mucosa e produzem as toxinas A e B. Ambas agem por glicosilação, rompendo o citoesqueleto e causando arredonda- mento celular do cólon epitelial, ge- rando fuga de fluido e morte celular. As cepas toxinogênicas possuem os genes TcdA, TcdB, TcdC,TcdE e TcdR. Os dois primeiros produzem as toxi- nas A e B. O TcdR é um regulador positivo da produção e, o TcdC, um regulador negativo. O TcdE produz os poros que permitem a passagem das toxinas. Produzida, a toxina A se fixa em receptores da célula intestinal. As toxinas são ativadas e se internalizam, atuando como enterotoxinas e citotoxinas. A toxina B interrompe as fibras de actina do citoesqueleto, causan- do destruição epitelial. A toxina A, por sua vez, estimula a produção de quimiocinas, citocinas e a ativação de neutrófilos e macrófagos, oca- sionando um processo inflamató- rio que agrava as lesões celulares, causando perda de líquido, diarreia, ulcerações e formação de exsudato pseudomembranoso. As cepas mais virulentas produzem mais toxinas e parecem ter menor participação do gene TcdC, um regulador negativo. 9COLITES PSEUDOMEMBRANOSAS 5. QUADRO CLÍNICO O quadro clínico da infecção pode variar de quadros assintomáticos a colites fulminantes eventualmente fatais, sendo que estas correspondem a cerca de 10% a 15% dos casos. A doença pode ter início de dias a poucos meses após o uso de antibió- ticos. 95% dos pacientes têm histó- rico de uso recente de terapia anti- microbiana. Quando se analisam os três últimos meses, o histórico de uso chega a 100% dos doentes. Comu- mente, a doença aparece de 5 a 10 dias após o término do antibiótico, ou mesmo durante o seu uso. Na doença leve, a diarreia é a princi- pal manifestação, geralmente com menos de 3 a 5 evacuações por dia, aquosa, com eventual presença de muco. A pesquisa de sangue ocul- to geralmente é positiva, mas é bem infrequente a visualização de san- gue nas fezes macroscopicamente. Dor abdominal em cólica é comum, especialmente na parte inferior do abdome, e o abdome encontra-se difusamente doloroso à palpação difusa. O quadro se resolve em cerca de 10 dias com frequência, podendo ainda arrastar-se para cerca de 18 dias. Os casos moderados se apresen- tam como diarreia moderada e não- -sanguinolenta, dor e sensibilidade abdominal moderadas, náusea com vômitos ocasionais, desidratação, leucocitose <15.000/mm³ e creati- nina elevada. FLUXOGRAMA DA FISIOPATOLOGIA C. difficile Transmissão via fecal-oral Estômag Chega ao intestino delgado Germina e origina formas vegetativas Chegam ao cólon Colonizam e produzem toxinas A e B Destruição epitelial e liberação de substâncias inflamatórias Perda de líquido, diarreia, inflamação e exsudato pseudomembranoso 10COLITES PSEUDOMEMBRANOSAS Já os casos graves evoluem geralmen- te com febre alta (>38,5ºC), diarreia com >10 evacuações diárias, aquo- sa, mucosa e eventualmente san- guinolenta. Desidratação e distúr- bios hidroeletrolíticos são comuns. A dor abdominal é mais intensa e difusa, podendo ocorrer espontanea- mente. Há febre alta, frequentemen- te acima dos 38,7ºC. Diminuição do apetite, náuseas e vômitos são bem mais frequentes e a leucocitose está acima de 15.000/mm³. Além disso, os níveis de albumina diminuem para <3g/dL e há insuficiência renal aguda. A IDSA (Infectious Disease Socie- ty of America) define como critérios de infecção grave a dor abdominal, creatinina aumentada em 1,5 ve- zes, hipoalbunemia <3g/dL e leuco- metria >15.000/mm³ com desvio à esquerda. A PCR está elevada e a acidose lática pode estar presente. Megacólon tóxico, febre alta, insu- ficiência renal, hipotensão, acidose lática (>5mmol/L) e níveis extrema- mente altos de leucócitos (>50.000/ mm³) indicam forma fulminante e possivelmente fatal. PRINCIPAIS SINTOMAS Doença leve Doença moderada Doença grave Febre, dor abdominal. Diarreia, dor abdominal, náuseas e vômitos ocasionais, desidratação. Diarreia, dor abdominal intensa, febre alta, hiporexia, náuseas e vômitos. 11COLITES PSEUDOMEMBRANOSAS MAPA MENTAL RESUMO/QUADRO CLÍNICO Forma grave Forma fulminante Forma leve Diarreia moderada Forma moderada Creatinina elevada Desidratação Náusea, vômitos Leucocitose (até 15 mil) Dor abdominal Dor abdominal Desidratação /DHE Diarreia *IDSA: dor abdominal, creatina >1,5x valor basal, hipoalbuminemia (<3g/dL) e leucocitose >15 mil/mm³ com desvio à esquerda. Hiporexia, náuseas e vômitos Febre alta Dor abdominal Diarreia 3-5 evacuações/ dia Aquosa Eventual muco Febre baixa/ moderada Leucócitos >50.000/mm³ Megacólon tóxico Febre alta Acidose lática Hipotensão Insuf. renal >10 evacuações/ dia >10 evacuações/ dia >10 evacuações/ dia >10 evacuações/ dia 12COLITES PSEUDOMEMBRANOSAS Voltando ao nosso paciente: seu qua- dro clínico é compatível com a forma leve da doença, certo? Temos diar- reia com 5 evacuações ao dia, com dor abdominal, afebril, sem náuseas, vômitos ou alterações laboratoriais. Como iremos confirmar o diagnóstico e tratar? Abordaremos isso a seguir. 5. DIAGNÓSTICO A DCd está dentro do espectro de diagnósticos diferenciais da diar- reia. Como pode estender-se ao lon- go de semanas, não podemos dizer que se trata de uma diarreia aguda ou crônica, já que isso irá variar a cada paciente a depender da sua resposta imunológica. Alguns terão curso auto- -limitado e muito leve da doença, in- clusive com cessação do quadro após término da terapia antimicrobiana; outros podem cursar com a diarreia mesmo após a interrupção do medi- camento, desenvolvendo o quadro ao longo de semanas. A intensidade do quadro dependerá da respostaindi- vidual da imunidade do hospedeiro: pacientes idosos e imunossuprimi- dos têm maior tendência a apresen- tar quadros sintomáticos e severos. Os títulos de anticorpos IgG contra o patógeno também estão associados a diferentes respostas, com títulos maiores conferindo maior proteção. De uma forma ou de outra, iremos avaliar o paciente a partir da sua quei- xa de diarreia. O diagnóstico de diarreia por infec- ção pelo C. difficile deve ser suspei- tado sempre que houver diarreia associado ao uso atual ou recente de antimicrobianos. É possível que o paciente desenvolva o quadro até cerca de três meses após o uso, sen- do portanto necessário o questiona- mento ao colher a história. O diagnóstico é estabelecido a partir do exame de fezes ou da colonos- copia/retossigmoidoscopia. No pri- meiro caso, o exame mais utilizado é a pesquisa de toxinas A e B nas fezes – e é importante avaliar a pre- sença das duas toxinas – fechando- -se o diagnóstico se a pesquisa vier positiva. O importante de pesquisar ambas as toxinas é que raramente há presença isolada da toxina A ou B. A colonoscopia/retossigmoidos- copia, por sua vez, será diagnóstica quando evidenciar presente de co- lite com pseudomembranas na mu- cosa colônica. Quando há presença de colite pseu- domembranosa na colonoscopia, o cólon é recoberto por pseudomem- branas brancas ou amareladas, salteadas a confluentes. Como já abordamos lá em cima, as pseudo- membranas são tecidos necróticos, bactérias, material proteico e leucó- citos mortos, além de outras subs- tâncias, formando uma “lâmina”. A presença de pseudomembrana ca- racteriza a colite pseudomembranosa 13COLITES PSEUDOMEMBRANOSAS em si, e a colite pseudomembranosa é uma das apresentações da doença causada pelo C. difficile – inclusive, está no espectro mais “grave” da do- ença. À histologia, mostra-se infiltrado in- tenso de neutrófilos, com necrose de mucosa e lesões em forma de vulcão. SE LIGA! A colonoscopia e retossigmoi- doscopia, no entanto, não são recomen- dadas rotineiramente – devido ao risco de perfurações durante o procedimen- to – ficando reservadas para casos de dúvidas diagnósticas. Um exemplo é quando o paciente possui alguma con- dição sobreposta que possa dificultar ou confundir o diagnóstico, como doença inflamatória intestinal. Figura 2. Colite pseudomembranosa na colonoscopia. Fonte: F. Barbut; J.-L. Meynard; C. Eckert. 2011. Figura 3. Aspecto da colite pseudomembranosa à colonoscopia. Fonte: Microbiologia Médica – Murray, PR; Rosenthal, KS; Pfaller, MA. 7ed. 2014. A coprocultura para anaeróbios em meios seletivos é o meio tradicional de isolamento da bactéria, mas não é capaz de diferenciar aquelas produ- toras de toxinas e as não-produtoras. Além disso, a demora em sair o resul- tado gera um incoveniente, conside- rando o quadro de diarreia. Por este motivo, esse exame é mais utilizado em estudos epidemiológicos. 6. TRATAMENTO O tratamento da doença causada por C. difficile é feito, primeiramente, com a retirada do antibiótico em uso – caso o paciente ainda esteja fazendo uso deste. Se a retirada do antibiótico não for possível, troca-se por um de espectro mais curto. Avaliar também retirada ou troca do imunossupressor, quimioterápico e do IBP. Narcóticos e inibidores de motilidade intestinal de- vem ser evitados. 14COLITES PSEUDOMEMBRANOSAS um derivado 5-nitroimidazólico muito ativo contra bactérias e protozoários anaeróbios. Tem mecanismo bacteri- cida, formando produtos intermediá- rios após adentrar a bactéria, que se ligam ao DNA e inibem a replicação e a síntese de enzimas. A presença de proteínas que reduzem o metronida- zol nos anaeróbios e que faltam nos aeróbios é a causa da sua seletividade sobre anaeróbios. É importante reco- mendar que o paciente não beba até 24h após o término do medicamento, devido à reação “dissulfiram-like”. A ausência de resposta à retirada do antibiótico irá requerer tratamento com antibióticos que objetivam erra- dicar a bactéria. SE LIGA! Pacientes assintomáticos não devem ser tratados. Não foi demonstra- do benefício no tratamento das formas assintomáticas. Para casos leves a moderados da doença, utilizaremos metronidazol via oral, 500mg, de 8h/8h, duran- te 10 a 14 dias. O metronidazol é SAIBA MAIS O dissulfiram é um medicamento utilizado no tratamento de pacientes dependentes de álco- ol. Ele inibe a oxidação do acetaldeído em ácido acético, por meio do bloqueio da enima alde- ído desidrogenase, que catalisa essa reação. Isso causa acúmulo de acetaldeído na corrente sanguínea, causando rubor, náusea, taquicardia e hiperventilação. O efeito “dissulfiram-like” se refere a uma consequência do uso de alguns medicamentos – como o metronidazol – com o álcool: o medicamento inibe a conversão do acetaldeído em ácido acético e também oca- siona o acúmulo de acetaldeído no sangue. Por isso, não é aconselhável o consumo de álcool concomitante ao uso desses fármacos. Em casos moderados, iremos consi- derar internamento para tratamento hospitalar. Hidratação, monitoração e adminitração de metronidazol oral – no mesmo esquema anterior – ou vancomicina via oral, de 6h/6h, por 14 dias. Casos graves serão internados e tra- tados com vancomicina oral ou por sonda nasogástrica, 500mg, de 6h/6h, associada ou não a metroni- dazol intravenoso na mesma po- sologia anterior ou findaxomicina via oral, 200mg de 12h/12h, por 10 dias no lugar da vancomicina se o risco de recorrência for alto – no en- tanto, a findoxamicina não está dis- ponível no Brasil. A vancomicina é da classe dos glicopeptídeos, ativo con- tra cocos e bacilos gram-positivos, aeróbios e anaeróbios. Inibe a sínte- se da parede celular, causando lise osmótica – o que o caracteriza como bactericida. Por via oral, quantida- 15COLITES PSEUDOMEMBRANOSAS des muito pequenas são absorvidas, tornando-o excelente para tratar a infecção pelo C. difficile/colite pseu- domembranosa. Se o caso for grave e não houver a disponibilidade de vancomicina, usa-se o metronidazol, 500mg, de 6h/6h, por 10 a 14 dias. Formas graves complicadas são tra- tadas com vancomicina, 125mg, de 6h/6h, VO, por 10 a 14 dias asso- ciada ao metronidazol, 500mg, EV, de 8h/8h, por 10 a 14 dias, e iremos considerar abordagem cirúrgica. A cirurgia deve ser considerada em casos que não respondem à antibio- ticoterapia, bem como nos seguin- tes casos: choque; sepse; alterações mentais; reação leucemoide com mais de 50.000 leucócitos/mm³; lac- tato maior igual a 5mmol/L; íleo para- lítico; evolução fulminante; perfuração intestinal; megacólon tóxico não res- ponsivo e enterite necrotizante. Em caso de recorrência, as primeiras recorrências são ainda tratadas com esquema de vancomicina ou fidaxo- micina. A partir da terceira recorrên- cia, iremos considerar transplante de microbiota fecal. SAIBA MAIS O transplante de microbiota fecal é uma prática realizada pela medicina chinesa desde o 4º século. Embora muito antigo, nos anos 1950 foi cientificamente relatado pela primeira vez, quando foi realizado com sucesso para tratamento de quatro casos de colite pseudomem- branosa. No entanto, apenas noos últimos dez anos foi realmente introduzido e realizado em maior escala na prática clínica. Qual é a ideia do transplante de microbiota fecal? Restabelecer o equilíbrio da flora de indi- víduos afetados. Geralmente, o doador é um familiar ou um conhecido do paciente, e passa por uma inves- tigação detalhada de possíveis patógenos nas fezes, de modo a evitar sua transmissão. Exitem várias vias de administração do transplante: nasojejunal, nasogástrica, endoscópica, por enemas ou colonoscópica. A via utilizada irá depender da preferência do paciente, expe- riência do profissional, da viabilidade e da avaliação clínica. A via colonoscópica, geralmente, é a mais utilizada, pela melhor visualização e oportunidade de infusão de grande quantida- de do material. Embora seja uma técnica eficaz e de baixo custo,ainda tem pouca recomendação clínica e muitas barreiras para o seu uso: a inexperiência dos profissionais com essa técnica e o preconceito e repugnância por parte dos pacientes. No futuro, espera-se que seja mais aceita entre a população e que essa terapia inovadora possa beneficiar muitas pessoas com transtornos gastrintestinais. 16COLITES PSEUDOMEMBRANOSAS MAPA MENTAL DE TRATAMENTO Casos moderados Casos leves Se possível, suspender ou trocar o antibiótico Casos graves Recorrências Casos complicados Metronidazol 500mg 8h/8h VO 10 a 14 dias Metronidazol 500mg 8h/8h VO 10 a 14 dias Vancomicina VO 125mg 6h/6h 10 a 14 dias Abordagem cirúrgica Antibioticoterapia Transplante fecal Metronidazol 500mg 8h/8h IV 10 a 14 dias Vancomicina VO ou NG 500mg 6h/6h 10 a 14 dias Fidaxomicina VO 200mg de 12h/12h 10 dias Se alto risco de recorrência MEDICAMENTOS OU OU 17COLITES PSEUDOMEMBRANOSAS Por fim, como trataremos o paciente do caso clínico? Vimos que ele apre- senta forma leve da doença. Além disso, já houve a cessação do anti- biótico e mesmo assim o paciente mantém o quadro. Qual medicamen- to podemos tentar? Nesse caso, fare- mos metronidazol via oral, 500mg, de 8h/8h, durante 10 a 14 dias, por ser uma doença de características leve e não recorrente. DIARREIA DIAGNÓSTICO Colonoscopia Histologia Uso de antimicrobiano há 3 meses ou menos Fezez Colie com pseudomembranas na mucosa Infiltrado neutrofilico, necrose de mucosa e lesões em forma de vulcão Coprocultura anaeróbios em meio seletivo (demorado e difícil) Toxina A e B nas fezes Pseudomembranas brancas ou amarelas Salteadas a confluentes 18COLITES PSEUDOMEMBRANOSAS REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Daniel A. Leffler, M.D., and J. Thomas Lamont, M.D.; Clostridium difficile Infection; N Engl J Med 2015; 372:1539-1548. P.G. Nelson; Infecção pelo Clostridium difficile; Jornal Brasileiro de Medicina; vol. 102, nº 5, 2014. 3. GOLDMAN, Lee; AUSIELLO, Dennis. Cecil Medicina Interna. 25. ed. Saunders Elsevier, 2018. Zaterka S, Eiseig JN. Tratado de Gastroenterologia da Graduação à Pós-graduação. 2ª edição - Editora Ateneu, 2016 Microbiologia Médica – MURRAY; ROSENTHAL, PFALLER. 8 ed. 2017. Sleisenger & Fordtran’s Tratado Gastrointestinal e Doenças do Fígado, 9 ed. 2013. Messias, B.A. et al. Transplante de microbiota fecal no tratamento da infecção por Clostri- dium difficile: estado da arte e revisão de literatura. Rev Col Bras Cir. 2018; 45(2):e1609. Farmacologia ilustrada – Whalen, K; Finkel, R; Panavelil, T.A. – 6 ed. Porto Alegre. Artmed, 2016. 19COLITES PSEUDOMEMBRANOSAS